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SÉRIE ANTROPOLOGIA

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A CONDIÇÃO DA TRANSNACIONALIDADE

Gustavo Lins Ribeiro

Brasília
1997
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A CONDIÇÃO DA TRANSNACIONALIDADE

Gustavo Lins Ribeiro

Introdução

À medida que a globalização desenvolve sua dinâmica seletiva reproduzindo ou


criando poderosas elites e que o capitalismo transnacional mais e mais dita regras para os
Estados nacionais, cresce a necessidade dos cidadãos em todo o mundo de se localizarem
em novos cenários e de encontrarem maneiras de contrabalançar novas tendências
hegemônicas. Discutir a condição da transnacionalidade é levantar a possibilidade de
modificar nossas concepções sobre cidadania para encompassar uma clara sensibilidade e
responsabilidade com relação aos efeitos de ações políticas e econômicas em um mundo
globalizado. É o reconhecimento de que qualquer novo movimento que se alça sobre o
horizonte necessita ser regulado por um contrário. Esta é a única garantia que temos de que
uma só tendência não colonizará, de maneira totalizante, todo o espaço que possa
encontrar.
As questões que quero tratar transcendem as fronteiras de qualquer área do mundo.
O que o reino do capitalismo transnacional e da globalização significará para diferentes
regiões é objeto de muito debate. Mas está claro que estas forças redefinem as relações
regionais internas e externas, em muitos aspectos. É claro, também, que o mundo passa por
fortes realinhamentos econômicos e políticos, exemplificados pelo fim da União Soviética,
a posição proeminente da China no comércio mundial, a emergência de poderosas
economias capitalistas no Pacífico e pela presença de entidades políticas e econômicas
como a União Européia ou o Mercosul.
O transnacionalismo tem fronteiras e similaridades com temáticas como
globalização, sistema mundial e divisão internacional do trabalho. Mas sua própria
particularidade reside no fato da transnacionalidade apontar para uma questão central: a
relação entre territórios e os diferentes arranjos sócio-culturais e políticos que orientam as
maneiras como as pessoas representam pertencimento a unidades sócio-culturais, políticas
e econômicas. Isto é o que denomino modos de representar pertencimento a unidades
sócio-culturais e político-econômicas. Estes modos são centrais para a definição de alianças

1. Este artigo é a versão final de um texto programático escrito em 1994. Nos anos seguintes beneficiei-me das
críticas, sugestões e incentivos de muitos estudantes, colegas e amigos, em várias ocasiões e cenários institucionais,
como cursos de pós-graduação dados na Universidade de Brasília, na Universidad Nacional de Misiones
(Argentina) e na Johns Hopkins University (EUA); em palestras e conferências na América Latina e nos Estados
Unidos. A lista completa de pessoas deveria ser muito maior do que a que segue, mas quero reconhecer a força
dada por Gabriel Álvarez, Henyo Trindade Barreto, Leopoldo Bartolomé, Rafael Bastos, Lanfranco Blanchet, Rob
Borofski, Roberto Cardoso de Oliveira, Arturo Escobar, Aníbal Ford, Néstor García Canclini, Ulf Hannerz,
Myriam Jimeno, Paul E. Little, Italo Moriconi Jr., Renato Ortiz, Jane Schneider, Luís Eduardo Soares, Hernan
Vidal, Eduardo Viola e Eric R. Wolf. Não poderia ter escrito este trabalho sem a presença e interlocução de Flávia
Lessa de Barros. Como sempre, a responsabilidade pelo seu conteúdo é exclusivamente minha.

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em múltiplos contextos de cooperação e conflito. São precisamente as formas através das
quais nos integramos nestes guarda-chuvas simbólicos que estão mudando rapidamente
com a globalização.
O transnacionalismo coloca em perigo a lógica e eficácia de modos pré-existentes
de representar pertencimento sócio-cultural e político. Apesar de podermos falar
claramente de transnacionalismo enquanto fenômeno econômico, político e ideológico, a
transnacionalidade enquanto tal, isto é a consciência de fazer parte de um corpo político
global, mantém, em muitos sentidos, características potenciais e virtuais. Esta é a razão
porque prefiro considerar a condição da transnacionalidade do que a sua existência de fato.
Explorarei este tópico apresentando sete conjuntos de condições que são separáveis apenas
por motivos analíticos e expositivos, uma simplificação que faço conscientemente para
ganhar clareza na minha argumentação.

(1) Condições Integrativas.

Transnacionalidade faz parte de uma família de categorias classificatórias através


das quais as pessoas se localizam geográfica e politicamente. Os modos de representar
pertencimento a unidades sócio-culturais aumentaram em complexidade no tempo através
de processos de integração de pessoas e territórios em entidades cada vez maiores.
Historicamente as relações entre populações e territórios têm resultado em formas de
representações coletivas associadas com identidades sociais, culturais e políticas, através
das quais as pessoas podem reconhecer seu pertencimento a uma unidade e podem aceitar,
por meios pacíficos ou violentos, a autoridade de símbolos, indivíduos ou entidades
políticas que pretensamente representam um território, seus habitantes, natureza, herança
cultural, etc. Os sujeitos coletivos - sejam famílias, linhagens, clãs, segmentos, metades,
tribos, cacicazgos, reinos, impérios, Estados nacionais - são sempre um “nós” imaginado,
coletividades imaginadas com graus variáveis de coesão e eficácia simbólica. Apesar de
muitas das formas de identificação com essas coletividades se construírem através de meios
culturais/ideológicos consensuais e pacíficos (totens, bandeiras, hinos, educação pública), a
transgressão ou a ambivalência de lealdades são, no mais das vezes, fortemente punidas.
A sequência acima de “sujeitos coletivos” não significa que concorde com visões
evolucionistas da história. Mas o intercalamento de segmentos étnicos sob uma mesma
unidade política tem aumentado com o decorrer do tempo, causando relações cada vez mais
complicadas entre forças de homogeneização e heterogeneização. Os antropólogos com
frequência procuraram elaborar ferramentas heurísticas para interpretar a dialética entre
semelhança e diferença, entre realidades locais e supralocais, continuidade e mudança,
contiguidade e disjunções. Steward (1972 [1951]), por exemplo, provê um exemplo
clássico e útil de um antropólogo lidando com a complexidade crescente de unidades sócio-
culturais. Seu objetivo principal era compreender fenômenos sócio-culturais ocorrendo nos
quadros das “nações modernas”2. O conceito de Steward de níveis de integração socio-

2. O diálogo de Steward com seus interlocutores acadêmicos, trabalhando com “conceitualizações inadequadas”
(como padrões de características culturais internas e persistentes) inspiradas na análise de “sociedades tribais”,
explica, parcialmente, o que hoje podemos considerar um esquema analítico muito rígido (especialmente se
pensamos em suas noções de grupos subculturais e subsociedades).

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cultural fornece uma base a partir da qual se pode construir instrumentos interpretativos
para lidar com a natureza aberta e cambiante da imersão/exposição de pessoas, segmentos e
classes em/a vários contextos sociológicos locais e supralocais com diferentes poderes de
estruturação. Tenho particular interesse na capacidade deste conceito em correlacionar
agentes individuais e coletivos com diferentes unidades espaço-sócio-culturais que
possuem variadas expressões institucionais e territoriais. Níveis de integração sócio-
cultural podem se referir ao “nível nacional”, isto é a instituições que “têm aspectos de
alcance nacional e internacional” (Steward 1972: 47), ou a “segmentos sócio-culturais”,
que, por sua vez, são grupos localizados ou horizontais como castas, classes e divisões
ocupacionais que “recortam localidades em alguma medida” (idem: 48). Níveis de
integração são um conceito plástico que pode se referir a outras configurações como a
“família nuclear” e o “Estado” (ibidem: 54).
A minha concepção de níveis de integração é também informada por uma fusão
heterodoxa de análise regional com uma compreensão fluída das relações entre parte e todo
de qualquer sistema organizativo ou classificatório. Interpreto-os como um espectro
formado pelos níveis local, regional, nacional, internacional e transnacional. Limites reais
entre estes níveis são quase sempre difíceis de serem encontrados (problema comum a toda
noção analítica, tendo em vista o caráter aberto, condensado da vida social e os valores
sócio-culturais embutidos nas classificações espaciais) e, pode se argumentar, outras
escolhas poderiam ser feitas. Mas, para ser claro e simples, faço a seguinte equação. O
nível local corresponde à localização imediata de experiências fenomenológicas diárias,
isto é, ao conjunto de loci onde uma pessoa ou grupo conduz atividades cotidianas
regulares, interagindo com, ou sendo expostos a diferentes redes sociais e instituições. Pode
variar de um conjunto de áreas do campo ou de uma grande cidade, a toda uma cidade. O
nível regional corresponde à definição cultural/política de uma região dentro de uma nação,
como o Sul, nos Estados Unidos, ou a Galícia, na Espanha. Os níveis nacional,
internacional e transnacional referem-se à existência do Estado-nação e às suas relações
internas e externas.
Os níveis de integração têm poderes diferentes sobre a estruturação das capacidades
de agentes coletivos e individuais. São, portanto, instâncias fundamentais de formação
identitária. Uma pessoa pode ser de Posadas, do nordeste da Argentina, da América Latina
ou um argentino transmigrante na cidade de Nova Iorque. As relações entre os diversos
níveis de integração não são unilineares, mas marcadas por disjunções e poderes de
estruturação circunstanciais e desiguais. Também implicam uma lógica de inclusividade,
isto é, quanto mais distantes do nível local, mais abstratas, ambíguas e sujeitas a
estereotipificação as categorias se tornam.
É importante relembrar, em sintonia com autores como Elias (1994), que integração não
significa necessariamente inclusão em nenhum sentido positivo. Muito ao contrário,
historicamente, o advento de um novo nível de integração tem significado a exclusão ou
perda relativa de poder de diferentes segmentos sociais. Tem também significado
mudanças radicais nos modos de representar indivíduo, comunidade, sociedade, espaços
públicos e privados. Integração é, de fato, uma metáfora sobre a crescente quantidade de
território e pessoas englobada por sistemas sócio-culturais, políticos e econômicos. Quando
nos referimos à integração, estamos tratando de processos complexos de lutas por
hegemonia que não podem ser simplificados. Os resultados reais destes processos são
sempre derivados do encontro de forças políticas diferentes e frequentemente opostas.

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(2) Condições Históricas

Em muitas maneiras o transnacionalismo não é fenômeno novo. Consideremos, por


exemplo, os papéis desempenhados na história do Ocidente por instituições e elites
intelectuais, religiosas e econômicas, com suas visões e necessidades cosmopolitas. Mas o
desenrolar completo do transnacionalismo supõe o entrelaçamento de duas grandes forças.
Primeiro, o amadurecimento do sistema de Estados-nações, um acontecimento do século
XX que alcançou sua plenitude após a Segunda Guerra Mundial, com o processo de
descolonização. Segundo, o exacerbamento de processos de globalização, algo que poderia
atingir o presente nível apenas após os avanços tecnológicos nas indústrias de comunicação
e transportes ocorridos nas últimas duas ou três décadas.
Este não é o lugar para delinear a história do sistema mundial nem a dos diferentes
modos de representar pertencimento a unidades sócio-culturais. Mas transnacionalidade
necessita ser compreendida em relação a processos históricos que evoluem notadamente
desde o século XV quando a Europa começou uma expansão política, econômica, social,
cultural e biológica que sedimentou progressivamente o sistema mundial com diferentes
graus históricos e geográficos de integração (Wallerstein 1974). A expansão européia
coincide amplamente com a expansão capitalista e as diferentes realidades interconectadas
que esta criou ao redor do planeta (Wolf 1982). Modernidade é um rótulo frequentemente
associado a este processo, um processo no qual o crescimento das forças produtivas,
especialmente das indústrias de comunicação, informação e transportes, provocou um
“encolhimento do mundo” (Harvey 1989). Assim, heterogeneidade cada vez mais se
produz na presença de processos de homogeneização.
A natureza do presente estado da integração do sistema mundial é altamente
discutida. Mudanças recentes na economia política capitalista impactaram a divisão
internacional do trabalho e alguns dos principais atores nesta arena. Um ponto
particularmente controvertido relaciona-se ao futuro do Estado-nação (Mann 1996, Nairn
1996, Verdery 1996), o último nível de integração a emergir completamente e dentro do
qual a existência política de quase todos os atores individuais e coletivos se define no
presente. O conhecimento sobre processos de construção da nação tornou claro tratar-se de
um processo seletivo, liderado por elites quase sempre identificadas com uma “tradição” ou
passado étnico que é elevado ao status de cânone standard para todos os cidadãos a
despeito da existência de outras raças, línguas e culturas (veja, por exemplo, Balakrishnan
1996, Williams 1989).
O Estado-nação provê um cenário histórico exemplar para desenvolver mais ainda
meus argumentos. Primeiro, mostra como comunidades imaginadas dependem de uma
instância homogeneizante para unificar seus membros, ao arrepio das diferenças existentes.
Esta é a armadilha do “nós”, embutida na construção de qualquer sujeito coletivo. O “nós”
pode ser construído através de meios simbólicos ou classificatórios (totens, línguas, por
exemplo). Neste nível, funciona como um aparato classificatório sócio-psicológico que
localiza as pessoas, ao mesmo tempo que as transforma em seres políticos ao conferir-lhes
características e posições supra-individuais. O que está em jogo é a relação entre parte e
todo, segmento e totalidade, bem exemplificada na análise de Evans-Pritchard (1940) sobre

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o segmentarismo Nuer. O “nós” pode ser construído também através da autoridade do pai,
ou da mãe, que fala em nome da família; através da autoridade do líder, do partido, da
instituição, que falam em nome de seus membros e representados. Aqui, é um sequestro da
voz o que ocorre, isto é, uma obliteração parcial ou total da capacidade de representar a si
mesmo, de ser um sujeito. O problema surge, assim, quando forças de homogeneização,
implícitas em qualquer unidade social baseada em comunalidades reais ou atribuídas,
performam, como no caso de construção da nação, ventriloquismo político.
A segunda questão engatilhada pela consideração do Estado-nação enquanto nível
de integração, trata da relação entre heterogeneidade e homogeneidade. Atores sociais
podem ser membros de muitas unidades sócio-culturais e políticas ao mesmo tempo. A
definição simultânea de inclusão e exclusão é uma operação realizada pela lógica do
sistema classificatório, um truque possível graças à coexistência de diferentes níveis de
integração. Ser membro de totalidades mais amplas e complexas, supõe pertencimento a
segmentos menores. Até mesmo a presença de uma potente força de unificação, como o
Estado-nação, não é suficientemente poderosa para anular todos os segmentos
heterogêneos pré-existentes ou a produção de novos. Este reconhecimento é
particularmente importante pois leva a ver que, de formas contraditórias e frequentemente
violentas, forças homogêneas e heterogêneas coexistem. O mesmo ocorre, porém com
maior intensidade, no nível transnacional de integração, razão porque metáforas de
disjunções e hibridismo são tão frequentes na literatura sobre o assunto. Em consequência,
não é necessário que o Estado-nação desapareça para que o nível de integração
transnacional exista.
O transnacionalismo causará mais mudanças nas relações entre Estado e nação,
dando forma a novas configurações. Para Rosenau (1990), em uma época de turbulência na
política mundial onde forças multicêntricas e Estado-cêntricas coexistem, existem atores
“amarrados em soberania” e atores “livres de soberania”. Hannerz (1996a: 81) considera
que os Estados “podem, presumivelmente, encontrar formas de existir sem a nação”, mas
ele conclui (idem: 90) que a “nação e sua cultura (...) não estão sendo substituídas por
nenhuma ‘cultura transnacional’ única (...) é um processo de fragmentos, de desajustes,
frequentemente não planejado (mas às vezes sim) em várias grandes e pequenas escalas,
que já podemos observar”. Habermas (1996: 293) acha que “devemos tentar salvar a
herança republicana, transcendendo os limites do Estado-nação. Nossas capacidades para a
ação política devem manter o passo com a globalização de sistemas e redes auto-
reguláveis. O que em geral parece ser necessário é o desenvolvimento de capacidades para
ação política em um nível acima e entre os Estados nacionais”. Em sua análise de processos
de formação individual e coletiva induzidos por forças contemporâneas de integração
global, Elias (1994: 139) considera que “a difusão de um sentimento de responsabilidade
entre os indivíduos pelo destino de outros que estão muito além das fronteiras de seu país
ou continente” é sinal da emergência de um nível global de integração. Para ele (idem:
148), a transição para um novo nível de integração total da humanidade, com uma
organização humana mais abrangente e complexa, gera, como em outras situações prévias,
“conflitos de lealdade e consciência” dadas, entre outras coisas, a resultante instabilidade
institucional e representacional, tanto quanto a presença concomitante de processos de
desintegração e de transferência de poder de um nível de integração para outro.

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(3) Condições Econômicas

O alcance global do capitalismo atual é auto-evidente. O Banco Mundial, após a


admissão de antigos países da União Soviética, agora pode afirmar ter “um quadro de
membros quase universal” (World Bank Group 1995: 14). Historicamente, muito da
eficácia da expansão capitalista baseou-se em formas de produção, verdadeiras cabeças-de-
ponte responsáveis durante tempos coloniais e imperiais pelo domínio de novos territórios
e populações, tanto quanto pelo estabelecimento de diversos fluxos de pessoas, capital,
mercadorias e informações. Plantations, minas, grandes projetos, zonas de processamento
para exportação, são alguns exemplos de poderosos empreendimentos que transformaram
localidades em fragmentos do sistema mundial, dramaticamente aumentando as
interconexões entre diferentes áreas (Wolf 1982). Fronteiras econômicas em expansão,
sobretudo as vinculadas à agricultura e pecuária, igualmente tiveram um importante papel
na incorporação de novos territórios e populações.
O processo histórico de integração política e econômica capitalista foi viabilizado
militarmente de diversas formas. Mais recentemente, bombas nucleares, por exemplo, com
sua capacidade de destruir o globo, provocaram sentimentos de pertencer a um mesmo
planeta e modificaram a configuração do sistema mundial. Contudo, os militares têm meios
menos letais de exercer influência sobre o desenvolvimento econômico
nacional/internacional e o avanço científico-tecnológico. Myosihi (1996: 84), citando
Melman (1991), afirma que o orçamento do Departamento de Defesa dos Estados Unidos,
em todos os anos de 1951 a 1990, foi maior do que os lucros líquidos combinados de todas
as corporações norte-americanas. O poder da “economia militar” nos EUA espraia-se em
incontáveis contratos com empreiteiras e subempreiteiras, de tal forma que Miyoshi (idem)
conclui que o “Pentágono ... planeja e executa uma politica econômica centralmente
organizada” que transforma a segurança nacional americana em uma questão de natureza
essencialmente econômica, arrastando, com o seu peso, as tendências da economia
mundial3.
O capital sempre desrespeitou fronteiras políticas e expandiu-se através de
movimentos de centralização e descentralização (Marx 1977). Não são novas as redes
supranacionais de instituições financeiras. Ondas de colonialismo e imperialismo criaram
as condições inter-nacionais - como os estabelecimento de elites econômicas e
administrativas que compartilham objetivos, ideologias, planos estratégicos, cenários
institucionais, esquemas operacionais - que precederam o advento do capitalismo
transnacional. Condições político-econômicas cambiantes requereram diferentes teorias e
ideologias em diversos momentos. Marx, por exemplo, entendeu o poder transformativo
globalizante que o capital tinha na criação de um mundo radicalmente novo. Para ele o
proletariado seria a força contra-hegemônica global a defrontar-se com os capitalistas. A
implicação política óbvia era um apelo para que os trabalhadores do mundo se unissem.
Hoje, após o fim do “socialismo realmente existente”, podemos entender esta afirmação
como um chamamento para uma cidadania global, já que “no domínio internacional, onde
os Estados são fracos e os mercados dominantes, a sociedade civil pode oferecer uma

3. Abaixo do presidente americano, “o principal funcionário da administração da economia militar”, estão os


“gerentes de 35.000 das maiores firmas empreiteiras e ao redor de 100.000 subempreiteiras. O Pentágono usa
500.000 pessoas em sua própria rede de compras no seu Escritório Administrativo Central” (Miyoshi 1996: 84).

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identidade alternativa a pessoas que, de outro modo, seriam apenas clientes, consumidores
ou espectadores passivos de tendências globais contra as quais nada podem fazer” (Barber
1996: 285).
É preciso distinguir o capitalismo transnacional do capitalismo internacional e
multinacional. O primeiro involve uma lógica diferente de estruturação de agentes
econômicos e políticos, levando à emergência de uma nova hegemonia. O capitalismo
internacional supõe a operação ampla da divisão internacional do trabalho, existente no
jogo entre diferentes Estados nacionais soberanos, atuando enquanto poderosos agentes
políticos e econômicos. O capitalismo multinacional supõe a associação de capitais com
diferentes origens nacionais no mesmo empreendimento. Neste caso, ainda é possível
identificar, em maior ou menor grau, a composição do capital e sua responsabilidade
política em termos de nacionalidade. O capitalismo multinacional é o terreno sobre o qual
cresce o capitalismo transnacional (Miyoshi 1996). Neste último, é impossível traçar as
origens do capital, dada a volatilidade e flexibilidade do capital financeiro e industrial sob
regimes de acumulação flexível (Harvey 1989). As corporações transnacionais (CTN)
embaralham a lógica das relações entre os diferentes níveis de integração promovendo a
existência de redes globais com novos sentidos de pertencimento e lealdade. A relação
entre territorialidade e responsabilidade política encontra-se, agora, passível de ser ocultada
sem um plano pré-estabelecido ou sem necessariamente recorrer à violência. O capital está
completamente desterritorializado em seu fluxo planetário e fragmentação global.
Sklair (1991: 6) acertadamente considera a corporação transnacional como o
principal locus de práticas econômicas transnacionais. Miyoshi (1996) enfatiza a
segmentação étnica dos mercados de trabalhos das CTNs, um assunto que explorei
etnograficamente estudando a construção de uma hidroelétrica na fronteira da Argentina
com o Paraguai (Ribeiro 1991, 1994). No contexto etnicamente segmentado de um
mercado de trabalho de um grande projeto, as CTNs desempenhavam o papel de uma
importante agência de formação de identidade transnacional. Para Miyoshi o
multiculturalismo destas corporações é uma forma de quebrar mais ainda os elos entre
empregados e respectivas lealdades nacionais. É importante, assim, reter que o
embaralhamento dos diferentes níveis de integração promovido pelas CTNs tem
consequências que vão além das políticas e econômicas, impactando, por exemplo,
processos de formação identitária.
As corporações transnacionais operam em um ambiente co-habitado por outras
agências interessadas em supranacionalismo e que têm funções importantes na economia
política do presente. Entre elas estão novas (e não tão novas) entidades com diferentes
graus de institucionalização e poder. Incluem o G-74; o Clube de Paris; bancos regionais e
multilaterais (Banco Mundial; Banco Interamericano de Desenvolvimento; e outros);
agências e organizações multilaterais (Organização das Nações Unidas; Fundo Monetário
Internacional; Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio; Organização Mundial do Comércio;
e outras); blocos econômicos e políticos como a União Européia, o Acordo de Livre
Comércio do Atlântico Norte (NAFTA) e o Mercosul. As lutas e dramas políticos destas
entidades se desenrolam em diferentes loci, como, por exemplo, suas sedes mundiais,

4. As nações industrializadas “mais ricas” que formam o G-7 são: Alemanha, Canadá, França, Estados Unidos,
Grã-Bretanha, Itália e Japão. Após 1991, com o fim da União Soviética, a Rússia começou a participar no que
agora é conhecido como a “Cúpula dos Oito”.

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parlamentos nacionais, conferências internacionais/globais, e através da mídia. Também
estimulam novas ideologias, legislação, políticas e burocracias. O Mercosul, por exemplo,
está no processo de criar sua própria comunidade imaginada através da construção de um
passado comum, frequentemente organizado ao redor de rituais supranacionais de
integração (Álvarez 1995).
O capitalismo transnacional é altamente relacionado com o desenvolvimento do
capitalismo flexível pós-fordista. Existem duas características do capitalismo pós-fordista
que desejo destacar. Primeiro, a integração dos maiores mercados financeiros do mundo em
uma corrida planetária por lucros. Esta é uma das principais forças subjacentes à
impossibilidade de atribuir rótulos nacionais a transações econômicas transnacionais.
Segundo, a fragmentação de um mesmo processo produtivo por diferentes áreas do mundo.
Esta disseminação maximiza o uso que os empresários capitalistas podem fazer de força de
trabalho e recursos naturais baratos em escala planetária, ao mesmo tempo que dificulta
enormemente a articulação de trabalhadores, normalmente representados por entidades
operando nos quadros do Estado-nação. Ambas tendências, se alimentam do que Castells
chama a revolução da tecnologia de informação, “um acontecimento histórico tão
importante quanto a Revolução Industrial do século dezoito, induzindo um padrão de
descontinuidade na base material da economia, sociedade e cultura” (Castells 1996: 30).
Estados e comunidades tecno-científicas tiveram um papel fundamental em desatar o novo
“modo informacional de desenvolvimento”, um contexto onde a passagem do
industrialismo para o informacionalismo ocorre e onde a economia informacional global e
a sociedade informacional prosperam. Para Castells (idem: 21) “o termo informacional
indica o atributo de uma organização social específica na qual a geração, o processamento e
a transmissão de informação tornaram-se as fontes fundamentais de produtividade e
poder”.

(4) Condições Tecnológicas

O encolhimento do mundo se dá através de um processo que Harvey (1989)


denominou de “compressão do espaço-tempo”. Dois tipos de desenvolvimento tecnológico
são os mais importantes aqui. Aqueles relacionados ao crescimento das indústrias de
transporte e de comunicação, ao incremento da velocidade e da simultaneidade. Aparatos
de compressão do espaço-tempo têm suas próprias genealogias e contribuem para a
aniquilação do espaço através do tempo, criando a possibilidade de experimentarmos o
mundo como uma entidade menor, mais fragmentada e mais integrada. Estes aparatos são
o hardware que amarra a rede global.
Após a revolução industrial, a velocidade aumentou significativamente e tornou-se
tão capilar que se encontra naturalizada no presente. Os aparatos da velocidade fazem parte
de uma geneologia que inclui locomotivas, barcos a vapor, carros, motocicletas, aviões.
Todos, em maior ou menor grau, símbolos de modernidade em si mesmos (Berman 1987,
Foot Hardman 1988, veja também Virilio 1986). A naturalização da simultaneidade é
igualmente verdadeira. Desde o telégrafo, os aparatos da simultaneidade incluem o
telefone, rádio, televisão, fax e redes de computadores. Se a velocidade transforma o
espaço em uma entidade obviamente relativa, a simultaneidade virtualmente aniquila

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espaço e tempo. Na era dos satélites, comunicar-se de Brasília com Tóquio dissolve vários
fusos horários. É o fim do espaço absoluto, o império do espaço relativo na teia global que
facilita e energiza a mistura hipercomplexa de pessoas, capital e informações. Para Paul
Virilio “não existe globalização, existe apenas virtualização. O que está sendo efetivamente
globalizado pela instantaneidade é o tempo. Tudo agora acontece dentro da perspectiva do
tempo real: a partir de agora julga-se que vivemos em um ‘sistema de tempo-único’. Pela
primeira vez, a história se desenrolará dentro de um sistema de um só tempo: o tempo
global” (1995: 2).
Esta situação deve ser compreendida em relação às posições cambiantes dos
diferentes setores do sistema industrial. A existência do modo de desenvolvimento
informacional sob o capitalismo flexível implica em novas posições hegemônicas para as
indústrias eletrônicas e de informática. A centralidade da comunicação e da informação
provoca ou reforça a reestruturação da organização da produção, das ideologias gerenciais,
das características do mercado de trabalho, da cultura de consumo, e de muitas instituições
relacionadas ao establishment militar, médico, educacional e político. Ao mesmo tempo, a
obsolescência planejada na eletrônica e na informática acontece em uma grandeza à altura
da volatilidade do capital e das taxas de retorno.
As redes globais de comunicação tornaram-se um redemoinho redefinidor de
funções político-econômicas, de atribuições e representações coletivas, dissolvendo, ao
redor do planeta, linhas entre diferentes níveis de integração. A televisão global e as redes
de computadores dão vida ao principal suporte simbólico e ideológico para a emergência
da cultura e representações transnacionais.
A TV global está sendo crescentemente popularizada através dos serviços de
diferentes canais à cabo. Canais como ESPN, MTV, HBO estão altamente disseminados.
Entre estes, a Cable News Network (CNN) é arquetípica. O mundo pode agora assistir,
simultaneamente, a selecionadas visões homogêneas que imprimem poderosos
mídiapanoramas na cultura global5. Uma rede de telejornalismo global é, sem nenhuma
dúvida, um poderoso fator na formação da opinião pública transnacional. Ainda é cedo para
saber quais são os impactos desta força homogeneizadora, estudos sobre diferentes
recepções da CNN ao redor do mundo ainda precisam ser feitos. Eis terreno fértil para o
trabalho de antropólogos e linguistas que podem avaliar como imagens e tópicos globais
passam a ser parte do imaginário e da pragmática da vida cotidiana. Mas, podemos supor
que a TV global cria tópicos comuns para muitos espectadores no mundo tanto quanto
sentimentos de pertencer à mesma cadeia de eventos, de estar sob as asas do tempo global.
O que está sendo elaborado aqui é uma matriz de sentidos, de formas de representação e de

5. “Mídiapanoramas referem-se tanto à distribuição da capacidade eletrônica de produzir e disseminar informação


(...), que agora se encontra disponível para um número crescente de interesses públicos e privados ao redor do
mundo, quanto às imagens do mundo criadas por essa mídia” (Appadurai 1990: 9). Uma amostra dos programas de
TV, filmes, músicas e livros de não-ficção mais populares no Brasil, Inglaterra, Alemanha, Egito, Israel, África do
Sul, Índia, Hong Kong e Japão, traçou um quadro heterogêneo do consumo de mass media (“The Media Business:
What is Playing in the Global Village”, The New York Times, 26 de maio de 1997, D4-5). Música, TV e livros
localmente produzidos (frequentemente marcados por estilos norte-americanos) prevalesceram em todos estes
países. O cinema americano dominou estes mercados com a exceção do Egito e Índia. Estes resultados são
marcados por diferentes fatores como custos relativos de produção e a política cultural em cada país (incluindo
censura). Mas também indicam “que ao menos tão rapidamente quanto são trazidas para novas sociedades, as
forças de várias metrópoles tendem a ser indigenizadas de uma forma ou outra” (Appadurai 1990: 5).

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construção de identidades, tanto quanto de uma história compartilhada, processos centrais
para a construção de qualquer comunidade imaginada.
As redes globais de televisão à cabo frequentemente supõem outro importante
fenômeno linguístico - a hegemonia do inglês enquanto créole do sistema mundial. Mais do
que nunca, é clara a predominância do inglês enquanto meio linguístico de intercâmbio
internacional e transnacional. Estudos sócio-linguísticos sobre as relações entre poder e
língua se defrontam, igualmente, com novos cenários para explorar. Tal tendência também
é perceptível internamente à grande rede de computadores que articula o mundo em escala
global.
Desenvolvida primeiramente como parte de um projeto norte-americano de defesa,
a Internet, a rede das redes, atualmente interconecta muitos milhões de pessoas em todo o
globo, tornando-se um poderoso multimeio de troca simbólica transnacional e comunicação
interativa. Dado que a fronteira eletrônica está sempre expandindo-se, as possibilidades,
uma vez mais na história humana, parecem infinitas. No ciberespaço pessoas sem rosto
comunicam-se em um mundo virtual “paralelo”, on-line, onde tempo, espaço e geografia
inexistem ou não têm importância (Benedikt 1994; Featherstone and Burrows 1995; Jones
1995; Stone 1992, 1995). Anderson (1991) mostrou, retrospectivamente, a importância do
capitalismo literário para a criação de uma comunidade imaginada que se tornaria um
Estado-nação. Frente à existência da Internet com o seu inglês-de-computador e seus
cibercompanheiros; do tempo global; de processos de virtualização que perturbam a
percepção da realidade e do self criando novas posições para os sujeitos e novas formações
de identidades; sugiro que o capitalismo eletrônico-informático é o ambiente necessário
para o desenvolvimento de uma comunidade transnacional imaginada-virtual e a Internet a
sua base tecno-simbólica6.
O transnacionalismo atravessa diferentes níveis de integração de tal forma que é
altamente difícil relacioná-lo a algum território circunscrito. Seu espaço só pode ser
concebido como difuso e disseminado em uma teia. O nível de integração transnacional,
desta forma, não corresponde a realidades espaciais como os outros níveis. De fato, o
transnacionalismo manifesta-se tipicamente através de uma articulação diferente do espaço
real e da criação de um novo domínio de contestação política e de ambiência cultural que
não são equivalentes ao espaço que normalmente experimentamos - são os assim chamados
ciberespaço e cibercultura (Escobar 1994).
Ciberespaço é o universo que um usuário experimenta quando ele/a entra em uma
rede. Aí não apenas sentirá estar em um mundo virtual high-tech, mas também encontrará
outros usuários, normas, visões de mundo, procedimentos e discursos que conformam uma
cibercultura subdividida em muitos segmentos diferentes. Os “internautas” são expostos às
proezas da velocidade, simultaneidade e virtualidade, à consciência do experimentar
imediato do encolhimento do mundo, à sensação de acesso à infinita disponibilidade de
informação e interlocução. A cibercultura leva ao paroxismo algumas das mais poderosas
promessas da modernidade, incluindo a suposição de uma comunidade global diversificada,
existente em tempo real, ali, em uma dimensão paralela, com os seus muitos fragmentos,
unificados apenas através de abstrações e implodindo sobre as cabeças dos atores
perseguidos por antigas pretensões a identidades orgânicas e resolvidas. A reconfiguração

6. O argumento completo sobre este assunto pode ser encontrado em Ribeiro (1996, 1997, no prelo a).

11
de corpos e identidades - tornada possível pela multidão global virtual e pelo espaço
fragmentado, descentrado, global, virtual - potencializa a experiência anônima cosmopolita
internamente ao ciberespaço . Manipulação de identidade agora é tão fácil quanto jogar
com video-games, algo que parcialmente explica o número expressivo de adolescentes na
Internet.
Virtualidade é um conceito chave para entender o tipo de cultura da comunidade
transnacional. Sensibilidade à virtualidade é uma característica geral dos seres humanos, já
que somos capazes de ser simbolicamente transportados para outros lugares, imaginar o
que não está aqui e, mais ainda, criar realidades de estruturas que são puras abstrações
antes de tornarem-se fatos empíricos. Comunidades virtuais existiram antes da rede de
computadores. Espectadores de cinema, ouvintes de rádio, telespectadores, rádio amadores
são alguns exemplos prévios. Um resultado do desenvolvimento tecnológico tem sido o
incremento quantitativo e qualitativo do universo virtual.
Ideólogos da comunidade transnacional imaginada-virtual têm opiniões
hiperbólicas sobre seu papel no mundo real. Filhos tanto do globalismo quanto da era dos
computadores, vêem a si mesmos como criadores de uma nova situação onde acesso à rede
é ao mesmo tempo uma espécie de liberação pós-moderna (no sentido de que uma vez no
ciberespaço estariam livres dos constrangimentos da territorialidade, da política e da
cultura) e um novo meio democrático que permite as pessoas inundarem o sistema mundial
com informação, checando, assim, os abusos dos poderosos. Organizações não-
governamentais em todas as partes exaltam este potencial de liberação.
Mas toda inovação tecnológica é ambígua, contendo tanto um potencial utópico
quanto distópico (Feenberg 1990). A Internet não se ajusta à imagem de um mercado livre,
sem controle, ou que responda apenas à manipulação individual. Cocco (1996: 23), em um
artigo sobre as relações entre informação, comunicação e novas formas de acumulação
capitalista, afirma que a Information Superhighway “pode ser interpretada como uma
tentativa de transformar a vantagem parcial acumulada pelos Estados Unidos na primeira
fase da emergência da economia da informação em um novo projeto hegemônico nos
níveis industriais, políticos e culturais”7. O domínio americano da indústria de satélites e de
informação tem suas raízes na pragmática da geopolítica imperial. Schiller (1996: 93) nota
que o “controle da instrumentação de informação, invariavelmente, anda junto com o
controle do fluxo de mensagens, do seu conteúdo, capacidade de monitoramento e de todas
as formas de capacitação para a informação”. Ele conclui que “a força, flexibilidade e
alcance da atividade econômica global, já notável, o será ainda mais (...) [o poder estatal]
diminuirá mais. Isto pode estar parcialmente obscurecido por um tempo porque o Estado de
Segurança Nacional terá à sua disposição uma capacidade aprimorada, militar e de
inteligência, derivada das novas tecnologias de informação. Por essa razão, o Estado
americano será o menos vulnerável, por um período, às forças minando os Estados em
todas as partes” (Schiller 1996: 103).
Kroker e Weinstein (1994) chamam a atenção para o advento de novos fetiches e
sistemas de poder, para o “corpo ligado”, para o que denominam a “classe virtual”, a versão
da classe dominante na era eletrônica e dos computadores. As possibilidades democráticas

7. Para mais uma posição crítica veja Stallabrass (1995: 29): “é provável também que o ciberespaço seja, em
flagrante contradição com os seus apologistas pós-modernos, a corporificação do sistema totalizante do Capital”.

12
da Internet são a sedução inicial para a construção da infovia digital e para a subordinação
da rede aos “interesses comerciais predatórios” da classe virtual. Dada a importância da
tecnologia eletro-magnética para a manutenção e reprodução do establishment político,
econômico e militar, podemos antecipar que a luta política pelo controle do ciberespaço irá
se intensificar8. Mais do que nunca é preciso estar alerta contra o ciberpanopticismo. O
receio de controle governamental crescente levou à criação de um Internet Government
(InterGov). “Netidãos” votam, por exemplo, para determinar que “a comunidade da
Internet torne-se uma nação independente, com seu governo próprio, sem regulação
externa”.
Compartilho as preocupações de Virillio (1995) sobre a ciberdemocracia. Escrevi
em outro texto que “uma ampla e total democracia eletrônica direta é uma possibilidade
fascinante. Mas pode também transformar o processo democrático, um processo baseado
em inúmeras negociações de poder e jogos retóricos que qualificam atores políticos
individuais e coletivos, em uma corrente de referendos monótonos, às vezes sem sentido,
realizados não na cena pública aberta mas em lares eletrônicos individuais, protegidos e
ascéticos. O frenesi da escolha, típico da cultura do consumo, migra para o ‘mercado
político’. Basta apertar algum botão e você estará particip-escolhendo. O núcleo central da
democracia, a mediação transformativa, discursiva e , espera-se, informada, dos conflitos e
interesses, pode ser reduzido a um evento técnico e numérico. Se esse tipo de simulação de
democracia (simdemo) for alguma vez instalada, certamente representará uma maneira
altamente eficiente de reproduzir o status quo” (Ribeiro no prelo). Outros fatores também
limitam a implementação da democracia virtual: o custo dos computadores, equipamentos e
serviços correlatos; acesso e conhecimento a/dos códigos da rede; educação; conhecimento
do inglês; o controle do funcionamento do sistema por muitos centros de computação9.
Inoue (1995: 79) cita uma passagem de Tehranian (1990: xiv, xv) que sumariza o
papel paradóxico e dual que as novas tecnologias de comunicação têm, já que “podem
estender e aumentar nossos poderes - para o bem ou para o mal, para melhor ou pior, para a
democracia ou para a tirania. (...) Por um lado, elas provêem as ferramentas e canais
indispensáveis para a centralização de autoridade, controle e comunicação, típica do Estado
industrial moderno. Mas, por outro lado, têm também suprido canais alternativos de

8. Um grupo de ciberativistas, o Critical Art Ensemble (1994), propõe uma nova interpretação da dinâmica do
poder no presente, o “poder nomádico”, e um modo de contrapor-se, “a perturbação eletrônica”. Dada a grande
quantidade de pornografia que circula na rede, a maioria dos conflitos sobre o ciberespaço relaciona-se com
questões relativas à liberdade de expressão. Contudo, David Corn (1996) comenta um trabalho escrito por um
funcionário do Departamento de Defesa dos Estados Unidos que chama a atenção para “esquerdistas ciber-
espertos” e para o uso potencial da Internet para contra-inteligência e desinformação. Os Zapatistas, na América
Latina, usaram eficazmente a Internet para colher a simpatia política da comunidade transnacional imaginada-
virtual. Na Alemanha, um “ciberpelotão” foi criado pela polícia. Surfa a rede para controlar pedofilia e terrorismo
(Andrews 1997). Muitos acham tratar-se de uma iniciativa sem sentido dada a natureza incontrolável da Internet.
Para assuntos correlatos veja Schwartau (1995).

9. Concordo com Barber (1996: 228) para quem a “tecnologia pode nos permitir reconstruir distritos eletrônicos e
teleassembléias unindo vizinhos distantes. Mas isto acontecerá apenas se não deixarmos aos mercados a
determinação de como estas tecnologias serão desenvolvidas e distribuídas, e se a comunicação global for
disciplinada por deliberação e civilidade prudentes. Como construir a sociedade civil no meio internacional é um
desafio extraordinário. Reconhecer que ela necessita ser construída é, entretanto, o primeiro passo para garantir um
lugar para uma democracia forte no mundo do McWorld”.

13
resistência cultural e mobilização ideológica de forças oposicionistas”. A discussão sobre o
papel das novas tecnologias de comunicação e informação está destinada a durar e
provocar muitas trocas entre “apocalíticos” e “integrados” (Eco 1976). Mas Lévy (1995:
12) está certo quando, em seu livro sobre as “tecnologias da inteligência”, afirma que
“infelizmente, a imagem da técnica como potência má, inelutável e isolada revela-se não
apenas falsa, mas catastrófica; ela desarma o cidadão frente ao novo príncipe, o qual sabe
muito bem que as redistribuições do poder são negociadas e disputadas em todos os
terrenos e que nada é definitivo”. Este o motivo porque elaborei as noções de “testemunho
à distância” e de “ativismo político à distância” (Ribeiro 1997 e no prelo a), duas
características intimamente relacionadas ao desenvolvimento das telecomunicações e ao
florescente poder político da comunidade transnacional imaginada-virtual.

(5) Condições Ideológicas e Culturais

A despeito de pretensões de pureza, organicidade, coerência, estabilidade,


centralidade e outras semelhantes, as culturas sempre foram híbridas, instáveis,
multifacetadas, entidades fractais formadas pelas contribuições desiguais de indivíduos e
povos existentes no presente, no passado, e em diferentes locais. A globalização,
certamente pelo aumento em complexidade cultural que gera, transformou em cânone a
crítica a noções “essencialistas” de cultura. Debates sobre pós-modernidade e globalização,
sempre ressaltaram a natureza mesclada, entrelaçada dos fenômenos culturais. Fluxos,
fragmentos, malhas, hibridização, desterritorialização, glocalização, metáforas de
disseminação, dispersão, informam o que no presente é uma abordagem padrão sobre a
cultura em geral e a “cultura global” em particular10.
Tendo em vista o papel desempenhado por diversos segmentos industriais na
mercantilização da cultura (que ocorre em uma conjuntura dominada pela propensão à
fusão dos conglomerados da mídia) e da existência da cultura de consumo global, o “maior
locus de práticas ideológicas-culturais transnacionais” Sklair (1991: 6), creio ser importante
considerar não apenas as relações entre processos de homogeneização e de
heterogeneização mas também o que Sassen (1991) chamou de descentralização com
centralização, um paradoxo que introduz, neste cenário, a questão do poder. Além disto, é
necessário justapor noções pós-modernas de cultura às informadas por um sentido mais
forte de delimitações e pertencimento, já que os atores sociais experimentam suas vidas
culturais imersos em universos que se parecem a compostos contraditórios de elementos
simbólicos e categorias classificatórias híbridos e essencialistas. De fato, os processos de
auto-identificação são atravessados por diferentes lealdades a diferentes níveis de
integração.

10. A literatura sobre essas questões cresceu rapidamente nos anos 90. Veja, por exemplo, Featherstone (1990,
1995); Featherstone, Lash e Robertson (1995); King (1991); Robertson (1992); Wilson e Dissanayake (1996). Na
América Latina estão os trabalhos de García Canclini (1990, 1995), Ianni (1995), Ortiz (1994) e antologias como
as organizadas por Monetta (1994), Rapoport (1994) e Santos et al (1994). Os antropólogos estão claramente
engajados nesta discussão (Appadurai 1990, 1991; García Canclini 1990, 1995; Foster 1991; Gupta 1992; Hannerz
1992, 1996; Kearney 1995; Ong 1983; Rothstein e Blim 1992; Ruben 1995, por exemplo). Os trabalhos de autores
como Wolf (1982) e Nash (1981, 1983) foram pioneiros neste campo de investigação dentro da antropologia.

14
A crítica ao essencialismo entra em um beco sem saída se parar na demonstração de
como categorias homogêneas são construídas/inventadas. Necessitamos interpretar os
processos contraditórios, muitas vezes paradoxais, de formação identitária no seu
dinamismo e não transformá-los em construtos ideológicos que são, em última instância,
frágeis e circunscritos. Diferença não é um fim em si mesmo, é um objetivo apenas quando
igualdade e fortalecimento democrático são propósitos finais. Uma implicação da crítica
reificada do essencialismo é, sob uma retórica aparentemente progressista, a transformação
de atores reais em fantoches de ideologias nacionais/étnicas alienadas ou em profetas de
fundamentalismos. O analista qualifica textualmente sua autoridade ao mesmo tempo em
que rouba o poder de ser sujeito da maioria dos agentes sociais. Falsas expectativas e
problemas só podem derivar destes tours de force literários. Subestimar o hibridismo leva a
um acordo cego com formulações ideológicas que intencionam obliterar a coexistência
democrática das diferenças. Mas, subestimar organicidade e limites, algo que muitos
antropólogos pré-pósmodernos superestimaram, é também problemático porque pode criar
a impressão que identidades culturais, sociais e políticas são entidades soltas no ar, uma
impressão que satisfaz e coincide amplamente com as necessidades do capital/ista
transnacional por cinismo e apatia.
Após o impacto do “pós-”, é hora de explorar a crítica a perspectivas baseadas em
hibridismo, “criolização” e disjunção, ao menos no que se refere aos seus aspectos mais
puramente “culturalistas”11. Friedman, por exemplo, afirma que “se o mundo é entendido
como amplamente criolizado no presente, isto expressa a identidade do classificador que
experimenta a trangressão de fronteiras culturais, isto é, étnicas, como um fenômeno global
(...) O problema é que mudaram as condições de identificação do self e do Outro. As
culturas não fluem juntas e se misturam umas com as outras. Ao contrário, certos atores, no
mais das vezes atores estrategicamente posicionados, identificam o mundo nestes termos
como parte da identificação do seu próprio self” (1995: 83-84). Friedman continua e diz
que o “conceito de disjunção parece sugerir uma certa desestabilização de um mundo
anteriormente sistemático. Mas o que parece desorganização e frequentemente verdadeira
desordem não é, por isso, menos sistêmico e sistemático. Eu poderia aventurar-me e sugerir
que a desordem não tem a ver com a introdução de aleatoriedade ou caos na arena global,
mas com a combinação de dois processos: primeiro, a fragmentação do sistema global e a
consequente multiplicação de projetos locais e de estratégias de localização; segundo, uma
globalização simultânea das instituições políticas, associações de classe e de representações
midiáticas comuns” (1995: 84-85). Teóricos do hibridismo, como García Canclini (1996),
estão avançando estes diálogos críticos visando alcançar formulações políticas mais
aperfeiçoadas.
A “política ciborg” (um termo associado com o trabalho de Donna Haraway), ou a
“política transversal” parecem formular as relações entre diferença e democracia em um
mundo globalizado de uma forma também adequada para começar a pensar a democracia
transnacional. Reproduzirei o que Werbner (1997: 8) escreveu sobre isto: “A política
ciborg - ou política ‘transversal’ como Nira Yuval-Davis a denomina - trata de abrir e
manter diálogos através de diferenças de ideologia, cultura, identidade e posição social. O
reconhecimento do direito a ser diferente anima e sustenta estes intercâmbios, apesar de

11. O livro editado por Wilson e Dissanayake (1996) traz críticas sobre o pós-colonialismo. Veja também
Werbner e Modood (1997).

15
percepções conflitivas e acordos parciais. O que é aceito, em outras palavras, é a enorme
potencialidade da comunicação imperfeita. A política transversal, assim, organiza e dá
forma à heteroglossia sem negá-la ou eliminá-la”.
Mas as dinâmicas culturais/ideológicas globais são também fortemente baseadas na
difusão de discursos universais homogeneizantes que estão construindo diversos sentidos
de transnacionalismo, isto é, formas de identicação que atravessam todos os outros
diferentes níveis de integração. Este processo está certamente afetando a geração e
distribuição de “ressonância cultural” no mundo (Hannerz 1996a: 83, 88)12. Wilson e
Dissanayake (1996: 6) consideram a existência de um imaginário transnacional “o ainda
não totalmente incorporado horizonte de produção cultural contemporânea através do qual
identidades/espaços nacionais de lealdade e regulação econômica estão sendo desfeitos e
comunidades imaginadas da modernidade estão sendo reformatadas nos níveis
macropolítico (global) e micropolítico (cultural) da existência cotidiana”.
Muitas ideologias transnacionais coincidem com o que Appadurai chama de
ideopanoramas “elementos da visão do mundo do Iluminismo que consistem da
concatenação de idéias, termos e imagens, incluindo ‘liberdade’, ‘bem-estar’, ‘direitos’,
‘soberania’, ‘representação’ e o termo matriz ‘democracia’” (1990: 9-10). De fato, a
difusão global do Estado-nação foi amplamente acompanhada pela disseminação de formas
republicanas de governo com concepções similares de organização do poder e da
administração pública. Se por um lado as leis são quase sempre criadas internamente aos
Estados nacionais, por outro, existem muitas noções jurídicas que são de apelo universal
(as relacionadas com direitos humanos, por exemplo) ou têm sido historicamente
influenciadas por discursos supranacionais como o direito romano. Hoje a globalização das
atividades criminosas, comerciais e políticas traz novas discussões sobre
“extraterritorialidade” e jurisdição, por exemplo. A necessidade de novas concepções
legais, aparatos e leis, implica em difíceis desafios para as ideologias jurídicas e políticas
que herdamos.
Surgem questões concernentes ao tráfico internacional de drogas, corrupção,
grandes negócios entre corporações oligopólicas, problemas ambientais e a Internet. O
Ministro para a Competição da Comissão Européia, a mais alta autoridade européia
antitrust, causou ansiedade política e econômica nos Estados Unidos quando levantou
objeções contra a fusão Boeing/Mc Donnel Douglas porque impactaria as operações da
Airbus Industrie, o consórcio de fabricação de aviões localizado em Paris. De acordo com o
seu porta-voz: “se um negócio tiver efeito sobre o mercado europeu, então a jurisdição é no
nosso território (...) Extraterritorialidade não nos importa nem um pouco” (Andrews 1997a:
D1)13. Por outro lado, os esforços de autoridades alemãs de bloquear o acesso a um website

12. Nunca é demais reiterar que estas tendências acontecem dentro de contextos contraditórios onde formulações e
interesses hegemônicos podem encontrar forças complexas de resistência. Na Índia, partidos políticos variando do
Marxista ao nacionalista Hindú, em conjunto com feministas, organizaram manifestações de rua contra o concurso
de Miss Mundo. Este foi tido por muitos como “uma degradação das mulheres e contrário à cultura e valores
indianos”. Um homem suicidou-se em chamas para protestar contra o concurso de beleza cujo objetivo era chamar
a atenção mundial para a India e promover o turismo (The New York Times, 15 de novembro de 1996, A12; The
Washington Post, 22 de novembro de 1996, D1/ D4).

13. “Experts dizem ..[isto] é um resultado dos choques inevitáveis que ocorrem com o aumento do comércio
internacional. Seja os EUA tentando impedir companhias européias de fazerem negócios com Cuba ou Irã, seja a
Europa tentando banir internamente carne de vaca americana tratada com hormônio, as disputas internacionais

16
holandês em cuja home page estão dicas sobre bombas e descarrilhamento de trens,
defrontaram-se com uma reação de ciberativistas que “rapidamente estabeleceram muitas
novas formas de acesso. Copiaram o acesso em pelo menos 58 outros websites” (Andrews
1997: C2). Uma “lei da multimídia”, proposta pelo governo alemão para regular o
ciberespaço, é negativamente avaliada por empresários: “advogados dizem que a situação
aqui [na Alemanha, GLR] foi apenas o começo de uma briga maior entre governos
nacionais e a Internet sem-nação. ‘A Internet criou uma jurisdição universal, de forma que
uma vez que você entra na Internet está sujeito às leis de todos os países do mundo’, diz
Chris Kuner, um advogado americano em Frankfurt que segue de perto questões do
ciberespaço alemão. ‘A Internet fêz surgir problemas de jurisdição que nunca aconteceram
antes’” (idem).
Uma discussão completa sobre os panoramas culturais e ideológicos transnacionais
teria que incluir a elaboração da idéia de humanidade (Robertson 1992); o papel utópico
quase intocado da matriz discursiva tecno-científica com o consequente avanço da razão
instrumental; a prevalência do inglês como créole do sistema mundial; a cultura do
consumo (Sklair 1991); a cultura pop internacional (Ortiz 1994); e diferentes discursos
políticos e religiosos que dão forma a comunidades transnacionais sagradas e leigas.
Porém, no restante desta seção, das muitas ideologias centrais para encarar ao mundo como
uma única entidade, mencionarei brevemente apenas duas, desenvolvimento e
ambientalismo. São forças poderosas na criação da modernidade e do mundo
contemporâneo tanto quanto na estruturação de discursos utópicos sobre o destino da
humanidade.
Desenvolvimento como ideologia e utopia opera como uma verdadeira matriz
cimentando sociedades e culturas não-ocidentais ao redor de racionalidades e objetivos
políticos e econômicos do Ocidente (Dahl e Hjort 1984). Provê terreno aparentemente
neutro para as pessoas trabalharem juntas por um futuro melhor, ao mesmo tempo em que
explica as diferenças entre países e oferece receitas de como atingir poder material e
felicidade. Para Escobar (1995: 5), após a Segunda Guerra Mundial “desenvolvimento
adquiriu o status de certeza no imaginário social. (...) A realidade ... tinha sido colonizada
pelo discurso do desenvolvimento, e aqueles que não estivessem satisfeitos com este estado
de coisas tinham que lutar por pequenos pedaços de liberdade dentro dele, na esperança que
neste processo uma diferente realidade pudesse ser construída”.
A eficácia discursiva do desenvolvimento é uma das razões porque tem sobrevivido
muitas conjunturas através da adição estratégica de adjetivos que qualificariam diferentes
tendências. O último adjetivo é “sustentável”. Argumentei em outro artigo (Ribeiro 1992),
que o desenvolvimento sustentável representa um acordo, sintomático da transição histórica
atual, entre agentes interessados puramente em crescimento econômico e ambientalistas,
um acordo que permite, numa era de crise política e ideológica, a criação de novos
discursos utópicos tanto quanto de novas alianças políticas (veja também Escobar, 1995:
192 e ss). Muitas das compatibilidades que estas novas ou reformadas elites possuem são
construídas ao redor de noções como integração global, humanidade e biosfera. É clara,
entre ambientalistas, a concepção do planeta enquanto uma entidade única que pode sofrer

sobre políticas nacionais conflituosas estão se acumulando. E existem poucos precedentes que sirvam de exemplo,
‘Toda esta questão da extraterritorialidade é uma área de fricção, e só vai ficar pior”, disse Michael Hodges,
professor titular de relações internacionais na London School of Economics” (Andrews 1997: D4).

17
impactos transnacionais. Ross (1991) mostrou como a climatologia e discussões sobre o
aquecimento global têm papéis importantes na construção de um sentido de globalização.
Wapner (1995) cunhou o termo “grupos transnacionais de ativistas ambientais” para
designar a ação de grandes organizações não-governamentais. O relacionamento entre
agências multilaterais - como a Organização das Nações Unidas e o Banco Mundial - e
ambientalistas é altamente visível. Milton (1996: 142) conclui que se “um fenômeno
cultural pode ser apropriadamente chamado de ‘global’, este fenômeno certamente é o
ambientalismo”14.
Neste sentido, não é uma coincidência o fato do ambientalismo ter se tornado um
discurso político altamente eficaz na contemporaneidade. Não é, tampouco, uma
coincidência que os ambientalistas sejam altamente interessados em transnacionalismo, no
uso de meios simbólicos transnacionais (como redes eletrônicas), e no incremento dos
mega rituais globais que reforçam a emergência da cidadania transnacional. Os elos entre
ambientalismo e o empresariado do capitalismo eletrônico-informático estão cada vez mais
claros. Os novos milionários da informática têm demonstrado concretamente seu interesse
e simpatia política, ao transformarem meio-ambiente na segunda prioridade (a primeira é
educação) dos seus investimentos filantrópicos (Goldberg 1997).

(6) Condições Sociais

Nenhuma forma de representação social e de organização política pode


desenvolver-se totalmente sem agentes sociais que encarnem seus objetivo. De fato, a
emergência de um novo nível de integração supõe a existência de uma elite que impulsiona
a consolidação de condições institucionais e ideológicas apropriadas. O transnacionalismo
não é uma exceção. Agentes sociais interessados na transnacionalização do planeta são
portadores e promotores deste tipo de visão do mundo. São, em geral, representantes de
setores de ponta da economia-política contemporânea e constituem uma elite mundial.
Membros típicos desta alta classe são os capitalistas financeiros globais, seguidos por
aqueles nas elites “nacionais” guiados pelo capitalismo flexível pós-fordista e propagadores
de ideologias neo-liberais de globalização. Executivos de poderosas corporações trans,
multi ou inter-nacionais; corretores e operadores de bolsas de valores; funcionários de
agências multilaterais; diplomatas; jornalistas; acadêmicos e ativistas globais também
formam uma parte importante deste grupo. O cosmopolitanismo galvaniza estes segmentos
em diferentes formas e graus15. Acredito, com outros autores, que já podemos falar da

14. A plasticidade do ambientalismo enquanto ideologia lhe dá uma grande diversidade interna. Muitas forças
opostas podem ser encontradas sob este rótulo, de socialistas a fascistas, de forças que impulsionam a
administração global de problemas àquelas favoráveis ao saber local e ao fortalecimento do poder local (veja
Barros 1996, Bramwell 1989, Milton 1996, Viola 1995).

15. Hannerz (1996b: 103) provê uma útil definição de trabalho do cosmopolitanismo. É uma “orientação, uma
vontade de engajar-se com o Outro. Implica uma abertura intelectual e estética com relação a experiências culturais
divergentes, uma busca por contrastes mais do que por uniformidade. (...) Cosmopolitas podem ser diletantes tanto
quanto connaisseurs, e comumente são ambas as coisas, em momentos diferentes. (...) Cosmopolitanismo tem,
frequentemente, um lado narcisista; o self se constrói no espaço onde as culturas se espelham”. Para Hannerz
(idem: 104), a proliferação e crescimento de redes e culturas transnacionais são as causas principais da geração “de
mais cosmopolitas no presente do que em qualquer outro momento”.

18
existência de uma classe transnacional ancorada no capitalismo transnacional (Sklair 1991,
Miyoshi 1996).
Internamente às corporações transnacionais, e em outros “centros físicos” da
cultura transnacional (Hannerz 1996b) etnicamente segmentados como as Nações Unidas e
o Banco Mundial, identidades, solidariedades e redes transnacionais são comumente
forjadas de forma a fazer prevalescer lealdades desterritorializadas e supranacionais.
Contudo, interesses pragmáticos, econômicos e políticos, rapidamente se impõem nestes
meios transnacionais onde as únicas estruturas compartilhadas por todos os segmentos
étnicos são hierarquias, regras e objetivos planejados, típicos do modo burocrático de
dominação com os seus jogos de poder e alianças. Isto não significa que nestas arenas não
se desenvolvam dramas de identidades e lealdades híbridas. Estes cenários, contudo,
transforma-se-ão, mais provavelmente, em trans-estados do que em trans-nações. Mas,
frente a suas diversidades linguísticas e culturais e de suas necessidades de administrar a
sinergia entre heterogeneidade e homogeneidade, estes “centros físicos” são altamente
ilustrativos da presença e operação das “unidades sociais” das formas transnacionais de
sociabilidade: redes extensas e multisituadas de agentes individuais e coletivos
desterritorializados que perpassam diferentes níveis de integração. A sua dinâmica interna
pode ser chamada de networking16.
As organizações não-governamentais são agentes coletivos que ilustram
perfeitamente este raciocínio. De fato, em meio a uma crise do poder relativo de atores
tradicionais, as ONGs parecem ser representativas de uma nova sociedade civil ou de um
tipo diferente de sujeito político. Concordo com Barber (1996: 285) que o grande problema
no debate contemporâneo sobre a globalização é a criação de uma cidadania global (veja
também Fernandes 1995, Leis 1995). É, assim, importante enfatizar o papel das
organizações não-governamentais. Elas são os loci onde se encontram muitos atores
políticos interessados em proposições universais e em transnacionalismo (tais quais grupos
ambientalistas e de direitos humanos). São também os meios através dos quais redes sócio-
políticas reais vêm à luz17. Apesar de que o que segue estar baseado na minha interpretação
das atividades políticas de ONGs ambientalistas, uma escolha coerente com o papel
proeminente que têm na difusão do transnacionalismo, certamente se aplica a ONGs em
geral.
As ONGs ambientalistas atuam comumente como intermediárias entre diferentes
atores envolvidos no drama desenvolvimentista. Populações locais; movimentos sociais;

16. Para Manuel Castells (1996: 469) “As redes constituem a nova morfologia social de nossas sociedades, e a
difusão da lógica do networking modifica substancialmente a operação e os resultados em processos de produção,
experiência, poder e cultura. É certo que a forma networking de organização social existiu em outros tempos e
espaços. Mas o novo paradigma da tecnologia da informação provê a base material para a sua expansão capilar
através de toda a estrutura social”.

17. “Grupos ambientalistas, de justiça social e direitos humanos estão formando entre si e ao redor do globo, redes
densas, flexíveis, ricas em informação, sistemas auto-organizativos que possuem suas próprias dinâmicas
evolutivas. Estes movimentos de base, com todas suas limitações, surgiram como antídotos culturais e políticos
para os perigos do nihilismo tecnológico e da burocracia sem responsabilidade política. Personificam um poder
salvador em um momento de grande perigo - um sentido de responsabilidade planetária enraizado e crescendo a
partir de preocupações locais específicas. Esta capacidade política concreta de ligar o local ao global é a pedra
fundamental da emergente sociedade civil global” (Rich 1994 : 285). Veja também Wapner (1995).

19
órgãos municipais, estaduais e federais; partidos políticos; sindicatos; igrejas e agências
multilaterais são parte do campo político onde as ONGs operam. Estas organizações são
conhecidas por suas capacidades de estabelecer diferentes coalisões (frequentemente ad
hoc), costurando vários atores do campo sócio-político onde intervêm. O pragmatismo da
formação de redes, do networking, é um instrumento eficaz que redunda na forte habilidade
que as ONGs têm de moverem-se de cenários locais, a nacionais, internacionais e
transnacionais, mas, engendra, igualmente, uma perda relativa de homogeneidade dos
sujeitos políticos resultantes, os quais frequentemente existem como coalisões orientadas
para certas tarefas, coalisões que se desfazem uma vez que os objetivos são alcançados.
Assim, as ONGs e suas redes podem ser caracterizadas como atores políticos pragmáticos,
fragmentados, disseminados, circunstanciais e até mesmo voláteis. Sua força vem destas
características que as capacitam a fazer frente ao campo político cambiante de forma mais
eficiente do que atores políticos tradicionais que, em geral, se encontram limitados pela
necessidade de coerência e coesão ideológica, organizativa e política (com os consequentes
pesos e investimentos de energia institucional) que atuam como uma identidade externa e
qualifica-os enquanto representantes de um segmento, corporação ou de interesses
delimitados. Com efeito, as ONGs e suas redes criam novas formas de ação e impasses para
mecanismos mais antigos de representação e ação política. Podem ser um eficaz sujeito
político fragmentado, descentrado, em um mundo transnacional, mas o preço da
flexibilidade, do pragmatismo e da fragmentação pode ser uma baixa capacidade de
promover mudanças radicais.
A formação de redes no mundo real parece encontrar um espelho ideal nas muitas
possibilidades de networking no ciberespaço onde coalisões podem ser feitas com vários
atores operando em diferentes níveis de agência e comunicações e alianças transnacionais
tornam-se efetivas com pouco ou nenhum controle dos Estados nacionais. De fato, visto
que o nível transnacional de integração atravessa todos os outros, coalisões e redes da
sociedade civil global necessitam realizar este mesmo movimento para efetivamente
contraporem-se a poderosas forças transnacionais (Ribeiro e Little 1997). Em síntese, redes
reais ou virtuais são a matéria prima da qual a política transnacional é feita.
Mas a aceleração e intensificação do fluxo de pessoas em escala global não
envolvem apenas atores grandiosos e com uma inclinação consciente para o
transnacionalismo. Elas também criam um mundo onde uma quantidade maior de
alteridades pode ser experimentada por atores sociais que não são necessariamente
membros de elites econômicas e políticas. Entre estes destacam-se os turistas
internacionais, os migrantes internacionais e os transmigrantes.
Turismo é uma “indústria” de crescimento rápido, uma das maiores no mundo
atual. À medida que os sistemas de comunicação e transportes se desenvolvem e seus
custos relativos diminuem, o turismo se espalha e prospera. Com novas denominações,
como turismo de aventura e eco-turismo, existem poucos lugares fora do alcance de
outsiders que mantêm contatos temporários com populações nativas. São encontros
desiguais onde habitantes locais tornam-se objeto de um impulso consumista guiado, no
mais das vezes, pelo exoticismo e por uma busca por autenticidade (veja Rossel 1988,
Crick 1989, Ribeiro e Barros 1995). O turismo tem um papel ambíguo; reafirma a certeza
que se tem sobre o próprio lugar (turistas sempre voltam para casa), ao mesmo tempo que
cria um sentido de relatividade sobre os lugares. Esta ambiguidade facilita o contato no
futuro com outras identidades étnicas e sociais, seja no próprio lugar onde se vive ou no

20
exterior, promovendo mais intercâmbios internacionais.
Já a migração internacional expõe claramente a lógica prevalescente da
globalização. Enquanto os fluxos de capitais experimentam maior liberdade, os fluxos de
trabalho continuam encontrando muitas restrições. Não obstante esta situação, a
intensificação da migração global tem consistentemente engajado novas populações. Pela
primeira vez na história, a Irlanda, por exemplo, está “sofrendo um problema de
imigração”, imigrantes vêm de países como Romênia, Congo e Somália (Clarity 1997). Os
brasileiros são outros recém-chegados a este cenário. A primeira avaliação feita pelo
Ministério das Relações Exteriores do Brasil aponta para uma cifra de 1.5 milhão de
brasileiros vivendo em mais de 33 países (Klintowitz 1996). As maiores concentrações se
encontram nos Estados Unidos (610.130), Paraguai (325.000), Japão (170.000) e Europa
(126.828). Um dos motivos do interesse crescente do governo brasileiro nos emigrantes
relaciona-se diretamente (como em outros casos) com as grandes quantidades de fundos
que remetem para casa. Em 1995, o Ministério da Fazenda brasileiro estimou em US$ 4
bilhões as remessas dos emigrantes para o Brasil (Brazil Watch 1996).
Os Estados Unidos provêem o melhor exemplo de um Estado-nação moderno com
uma segmentação étnica altamente complexa criada pela migração internacional (veja, por
exemplo, Portes e Rumbaut 1990). De acordo com o Departamento do Censo do governo
americano, em 1994, os dez maiores segmentos de residentes estrangeiros legais eram os
seguintes: 6.264.000 mexicanos; 1.033.000 filipinos; 805.000 cubanos; 718.000
salvadorenhos; 679.000 canadenses; 625.000 alemães; 565.000 chineses; 556.000
dominicanos; 553.000 coreanos e 496.000 vietnamitas (US News & World Report, 1995:
8). Mas pequenos segmentos também criam situações transculturais. O número de
brasileiros vivendo legalmente nos EUA não impressiona quando comparado àqueles de
outras nacionalidades. Margolis (1994: 13), baseada em dados do Immigration and
Naturalization Service, menciona, para 1991, a existência de 8.133 imigrantes brasileiros
legais nos EUA. Contudo, no momento, se encontram várias Escolas de Samba nos Estados
Unidos e em países tão diferentes quanto Alemanha, Áustria, Finlândia, Inglaterra, Japão,
México e Suécia.
Apesar do fato dos migrantes transnacionais serem ainda um segmento novo e
pequeno, representam um movimento migratório importante. Transmigrantes são
“imigrantes que desenvolvem e mantêm relações múltiplas - familiares, econômicas,
sociais, organizacionais, religiosas e políticas - que cruzam fronteiras” (Basch, Glick
Schiller e Szanton Blanc 1994: 7). Neste contexto o transnacionalismo é definido como
“processos pelos quais os imigrantes forjam e sustentam relações sociais multi-entrelaçadas
que unem suas sociedades de origem com a de residência” (idem). Interessados ao menos
em dois países, esses transmigrantes podem usar suas identidades ambíguas para provocar
mudanças culturais, sociais, políticas e econômicas tanto no país onde nasceram quanto
naquele para onde migraram. Basch, Glick Schiller e Szanton Blanc (1994) citam como
típicas as situações dos haitianos, granadinos e filipinos.
Descrevi, em outros textos, as características de um migrante verdadeiramente
transnacional: o “bicho-de-obra” (Ribeiro 1991, 1992a). Trata-se de profissionais ou
trabalhadores especializados de grandes projetos que migram em escala mundial, de projeto
a projeto, seguindo os investimentos e empregos de corporações transnacionais. Uma elite
técnica que vive em acampamentos de grandes projetos, as pequenas aldeias dos sistema
mundial, seus membros identificam-se como expatriados desenraizados, ciganos e cidadãos

21
do mundo. Sua identidade é fragmentada e permanentemente ambígua. Já existem gerações
de bichos-de-obra, outro segmento que desenvolve uma visão desterritorializada do mundo.

(7) Condições Rituais

O papel de intermediário de há muito é fonte de prestígio e poder. Elites nacionais


frequentemente atuam desta forma. De fato, em geral, as elites nacionais são também inter-
nacionais. Não são novos os rituais de integração de cosmopolitas ricos e poderosos. Festas
privadas, eventos de esportes e de “alta cultura”, ou acontecimentos maiores como feiras
mundiais, provêem ocasiões para membros destas elites encontrarem-se com seus pares de
outras nacionalidades, criarem redes e difundirem suas realizações. Alguns destes
encontros são organizados periodicamente de forma a criar tanto o ambiente apropriado
para que indivíduos-chave conheçam uns aos outros, quanto exibições exemplares de
enorme concentração de riqueza e poder.
Exemplos contemporâneos destes rituais incluem as reuniões da “Cúpula dos Oito”
(ex-G-7) e do Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça. Se a Cúpula dos Oito
representa uma ocasião para líderes de Estados nacionais equalizarem suas visões sobre a
política-econômica global, Davos foi desenhado para colocar juntos a elite política e
econômica global. Este evento é descrito como “uma reunião de quem faz as coisas
acontecerem no mundo de negócios e da política de todo o planeta. Os encontros e foruns
menores na África, Ásia, América do Sul e em outros lugares, tornaram-se, durante o ano,
poderosas atrações para centenas de líderes de firmas que pagam US$ 20.000,00 por
companhia para ir a Davos para confraternizar. Para muitos críticos, Davos, com suas
reuniões de executivos a portas-fechadas à procura de contratos e contatos com políticos de
alto escalão e estrelas acadêmicas, simboliza a nova ortodoxia econômica do fim do século
XX” (Whitney 1997). As companhias presentes na conferência de 1997 representavam um
total estimado de US$ 4.5 trilhões de negócios por ano, uma quantia suficientemente
poderosa para atrair um espectro diverso de celebridades, variando de Bill Gates, o
presidente da Microsoft, até Yasir Arafat, o líder palestino (idem).
Porém, existem mega rituais globais que são mais representativos da necessidade
que a comunidade transnacional virtual-imaginada tem de transformar sua virtualidade em
realidade. Baseados em co-presença real, são terreno fértil para o desenvolvimento de
sentimentos e companheirismo transnacionais. Existem ao menos três tipos de mega rituais
globais orgânicos ao crescimento da globalização e do transnacionalismo. Considerarei
brevemente os dois primeiros, para explorar o terceiro com mais detalhes.
Em primeiro lugar estão os mega shows de rock, rituais onde os fãs se encontram
em espaços públicos e mostram sua adesão a um estilo de música pop internacional, à
cultura pop global. As tournées mundiais de superstars são comuns. Aqui Michael
Jackson, Rolling Stones e Madonna são tão importantes quanto Coca-Cola e Kodak para a
estandardização da cultura global. Estes mega shows são, em geral, eventos da mídia
global que pretendem passar um sentido de unidade planetária, um sentido de “we are the
world”. O poder ritual da música na unificação de diferentes segmentos sócio-políticos, na

22
criação de communitas, opera claramente nestas circunstâncias18. Dos três tipos de mega
rituais globais, os shows de rock são os menos direcionados à celebração de uma identidade
global. É a eficácia da cultura pop internacional e a demonstração da força
homogeneizadora da língua inglesa que estão mais evidentemente em jogo.
Em segundo lugar, estão as competições mundiais, dentre as quais duas se
destacam, pelo peso e alcance: os Jogos Olímpicos e o Campeonato Mundial de Futebol.
Os Jogos Olímpicos são de interesse especial pois mostram, em diferentes formas, as
tensões entre um discurso que se pretende universal, “os esportes são o instrumento para a
integração pacífica da humanidade”, e as diferentes apropriações nacionais desta pretensão.
Atletas e espectadores, incluindo aqueles que seguem os eventos pela mídia, participam de
uma celebração da performance humana que homenageia a excelência de indivíduos ao
mesmo tempo que mantém um sistema estrito de contabilidade de medalhas por países. A
luta por medalhas e o sistema classificatório resultante refletem, com frequência, a crua
geopolítica mundial como durante os períodos Nazista e da Guerra Fria. Os países que
obtêm mais medalhas são tidos como mais poderosos e “desenvolvidos”. Os campeões de
países menos competitivos são imediatamente transformados em símbolos e heróis
nacionais.
Além das projeções e identificações que acontecem entre espectadores e atletas, as
Olimpíadas e Campeonatos Mundiais de Futebol possuem outras características
importantes dos rituais. Seus ciclos criam um calendário, marcadores temporais para a
definição de quem são os melhores indivíduos e grupos no mundo. Estas competições são,
igualmente, enormes eventos da mídia global, ajudando a criar não apenas um sentido de
sincronicidade mundial mas também uma sequência compartilhada de eventos e dramas,
uma cronologia, dois passos fundamentais na construção de comunidades imaginadas.
Além disto, estes eventos são iniciados e finalizados através de ritos de abertura e
encerramento que definem o caráter único do período. É interessante notar que tanto os
ritos de abertura quanto os de encerramento conformam períodos liminares que dramatizam
as tensões irreconciliáveis entre cooperação humana-global e competição inter-nacional.
Estas cerimônias consistem normalmente de exercícios ao redor do tema da criação de uma
comunidade de iguais, de uma communitas, através da destruição da estrutura, hierarquia e
diferença.
Porém, nenhum outro cenário representa melhor os mega rituais de
transnacionalidade do que as conferências da ONU, uma agência imediatamente vinculada
à promoção do inter- e do trans-nacionalismo. Entre conferências como as sobre direitos
humanos (1993), população (1994), e mulheres (1995), em Viena, Cairo e Pequim,
respectivamente, destaca-se a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (CNUMAD, a Cúpula da Terra, Eco-92, ou Rio-92). Foi a primeira
oportunidade de enaltecer a nova ordem mundial, após a queda do muro de Berlim, sob a
égide de novos pactos e alianças emergentes do capitalismo pós-fordista transnacional tanto
quanto de uma ideologia transnacional ascendente, o ambientalismo. A maior exibição de
poder global até hoje, a Rio-92 reuniu os mais poderosos atores da economia política
transnacional. Representantes de Estados nacionais, de agências multilaterais e de

18. Meu entendimento de rituais é fortemente inspirado em Turner; a noção de communitas, enquanto uma
instância igualitária, em oposição à estrutura, como ordem e hierarquia, é especialmente útil (veja Turner 1969,
1974).

23
corporações transnacionais reuniram-se com empresários e administradores, a comunidade
científica e a sociedade civil global19. A Agenda 21, um documento de 800 páginas, teve
sua versão final aprovada no Rio. Estabeleceu um conjunto de objetivos comuns para a
humanidade no próximo século. A Rio-92 foi um mega rito de passagem do sistema
mundial, onde instituições e indivíduos, em um momento de transição política, econômica
e ideológica, comemoraram antecipadamente o que esperavam ser o futuro do mundo.
Um mundo sem fronteiras significa o fechamento do sistema mundial, a
capilaridade da modernidade transformada em realidade. Esta capilaridade e este
fechamento não seriam possíveis sem a existência dos atuais aparatos de compressão do
espaço-tempo. Controlar e usufruir da compressão do espaço-tempo é um privilégio e uma
fonte de poder. Esta uma das razões porque no Rio havia uma impressionante concentração
daqueles aparatos. Do aeroporto internacional do Rio de Janeiro, um importante nó do
sistema mundial que recebeu o maior número de aeronaves da sua história, até o centro de
convenções onde acontecia a conferência, um corredor de compressão do espaço-tempo foi
aberto, um verdadeiro tubo de velocidade que separava os participantes oficias dos nativos
e onde caravanas de carros, com motocicletas e helicópteros, podiam desenvolver altas
velocidades para transportar a poderosa elite mundial em segurança. Numa época onde
ainda eram incomuns, a ubiquidade e exibição arrogante dos telefones celulares mostraram
a conexão entre a compressão do espaço-tempo, alta tecnologia e poder. A mídia global foi
um show à parte. Microfones, câmeras, cabos e spots entraram em muitas escaramuças com
a segurança da ONU visando comunicar ao mundo cada aspecto da conferência. De Jane
Fonda a Jacques Cousteau, do Dalai Lama a Fidel Castro, todos queriam ser vistos naquele
redemoinho midiático. A necessidade ritual de co-presença impediu que o primeiro-
ministro japonês participasse eletronicamente na Assembléia, uma clara demonstração de
que o que estava em jogo era uma passagem da virtualidade para o real. Redes de
computadores também mantiveram informados aos membros da comunidade imaginada
transnacional que não puderam estar no Rio. Até agora, a CNUMAD foi o principal cenário
para a demonstração da relevância das ONGs e redes eletrônicas na cultura política
contemporânea20.
A projeção do futuro implícita em rituais também implica na produção de utopias e
distopias que são disputadas em terrenos ritualizados. Neste sentido, a Rio-92 só pode ser
adequadamente entendida se interpretada como um acontecimento composto por dois
eventos contrapostos e representativos de forças políticas complementares que se
regulavam: a conferência oficial da ONU e o Fórum Global. A conferência oficial foi o
cenário onde o establishment transnacional negociou suas visões do futuro do mundo. O
Fórum Global foi a primeira assembléia mundial de cidadãos transnacionais. Localizados

19. Bruce Rich (1994: 242) descreve a “Cúpula da Terra” como “a maior reunião diplomática da história. Trinta
mil pessoas compareceram à cúpula...; 9.000 jornalistas e 118 chefes de estado voaram para o Rio para o eco-
evento global. (...) nenhum gasto foi poupado”. Veja também Little (1995).

20. “Na preparação da CNUMAD, durante e após, as redes eletrônicas contribuíram para a formação de redes de
ONGs. As organizações não-governamentais tiveram acesso e intercambiaram informação e documentos,
discutiram posições, articularam ações dentro e através de redes durante todo o processo da Rio-92” (Inoue 1995:
93). A CNUMAD também revelou um importante ator, a Association for Progressive Communications (APC),
uma rede eletrônica que da Rio-92 à Pequim-95, por exemplo, foi responsável por vincular as Conferências da
ONU com a comunidade transnacional virtual-imaginada (Ribeiro no prelo a).

24
muitos quilômetros um do outro, mantiveram relações análogas às de
estrutura/communitas.
Na CNUMAD o poder institucional era o foco de um encontro dominado por
estruturas formais, hieraquia e status. Apenas pessoas qualificadas podiam ter acesso a
espaços qualificados. Acesso a certas áreas, especialmente aos centros rituais mais
poderosos (neste caso, aqueles com maior exposição à mídia global) foi restringido a uma
minoria de pessoas identificadas através de diferentes crachás. Contrastivamente, o Fórum
Global foi marcado por uma atmosfera festiva, onde altos funcionários, diplomatas,
celebridades, ativistas e pessoas comuns formaram uma comunidade que não apenas
discutiu os problemas do planeta mas também comemorou o caráter único de suas visões21.
Infelizmente, poucos anos após a Rio-92, é cada vez mais prevalescente a
interpretação de que a conferência foi uma oportunidade para poderosos atores
transnacionais, como agências multilaterais e corporações transnacionais, consolidarem seu
controle do poder econômico e político global. O ambientalismo empresarial e a
administração ambiental global centralizada são expressões de forças de globalização
autoritárias e exclusionárias vinculadas à expansão do capital transnacional. Sua existência
é apenas mais uma confirmação de que a condição da transnacionalidade é um campo de
poder onde outros agentes necessitam ocupar suas posições.

21. Rich (1994: 259) chamou o Fórum Global de “eco-Woodstock”. Segundo ele “o Fórum Global podia
vangloriar-se de suas próprias estatísticas impressionantes: 5.000 ONGs de todo o mundo estiveram representadas,
havia mais de 600 barracas ou pavilhões na área do Fórum e , em um período de duas semanas, mais de 400
reuniões e eventos ocorreram”.

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SÉRIE ANTROPOLOGIA
Últimos títulos publicados

214. SILVEIRA, Alex Ricardo Medeiros da. Vila São Jorge & Parque Nacional da
Chapada dos Veadeiros: o Impacto Cultural de um Projeto Ecológico. 1997.
215. SEGATO, Rita Laura. Formações de Diversidade: Nação e Opções Religiosas no
Contexto da Globalização. 1997.
216. RAMOS, Alcida Rita. A Concise Dicitionary of Received Prejudice. 1997.
217. RIBEIRO, Gustavo Lins. Bodies and Culture in the Cyberage. A Review Essay. 1997.

218. RIBEIRO, Cultura, Ideologia, Poder e o Futuro da Antropologia. Conversando com


Eric R. Wolf. 1997.
219. LITTLE, Paul E. Superimposed Cosmographies on Regional Amazonian Frontiers.
1997.
220. DIAS, Eurípedes da Cunha. MST: Rito e Praxis da Democracia Agrária. 1997.
221. RAMOS, Alcida Rita. Convivência Interétnica no Brasil. Os Índios e a Nação
Brasileira. 1997.
222. BARRETTO FILHO, Henyo T. Da Nação ao Planeta Através da Natureza: uma
tentativa de abordagem antropológica das unidades de conservação na Amazônia.
1997.
223. RIBEIRO, Gustavo Lins. A Condição da Transnacionalidade. 1997.

A lista completa dos títulos publicados pela Série


Antropologia pode ser solicitada pelos interessados à
Secretaria do:

Departamento de Antropologia
Instituto de Ciências Sociais
Universidade de Brasília
70910-900 — Brasília, DF

Fone: (061) 348-2368


Fone/Fax: (061) 273-3264

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