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A primavera de Dilma: setembro pode marcar uma reviravolta de gênero

José Eustáquio Diniz Alves1

A candidata Dilma Rousseff vem apresentando uma trajetória ascendente na curva dos
percentuais de intenções de voto, em todas as pesquisas, durante o ano de 2010. No eleitorado
total (ambos os sexos) ela tinha algo como 30% das intenções de voto em janeiro de 2010 e
chegou a cerca de 50% no final de agosto. Como candidata do governo, ela tem surfado na maré
favorável do desejo, por parte do povo brasileiro, de continuidade administrativa e política.
Também tem se beneficiado dos elevados índices de satisfação da população com o desempenho
da economia e com o prestígio do Brasil no mundo (inclusive com a realização da Copa do
Mundo, em 2014, e as Olimpíadas, em 2016).

Porém, Dilma – mesmo sendo mulher - sempre apresentou um pior desempenho entre o
eleitorado feminino. O gráfico 1 mostra que Dilma manteve, nos primeiros 8 meses do ano de
2010, uma diferença absoluta de cerca de 9 pontos de intenção de votos entre os eleitorados
masculino e feminino. Existem várias explicações para este fenômeno que não é novo na
trajetória de disputas do PT, um partido que apesar de algumas inovações na área de gênero,
nasceu marcado por uma forte presença masculina.

Gráfico 1: Diferenças de intenção de voto na candidata Dilma Rousseff entre os eleitorados


masculino e feminino, Brasil, janeiro a agosto de 2010
18 45
Diferença homens - mulheres (absoluta)

Diferença homens - mulheres (relativa)


16 40
14 35
12 30
10 25
8 20
6 15
4 10
2 5
0 0
Ibope 09/02

Ibope 10/03

Ibope 16/04

Ibope 03/06
Ibope 21/06

Ibope 30/06

Ibope 29/07

Ibope 05/08

Ibope 15/08

Ibope 25/08
Vox 17/01
Sensus 29/01

Data 25/02

Data 26/03
Vox 31/03
Sensus 09/04
Data 16/04

Vox 13/05
Sensus 14/05
Data 21/05

Vox 26/06

Data 01/07
Vox 20/07
Data 24/07

Sensus 02/08

Vox 10/08
Data 12/08

Data 20/08
Data 26/08

Diferença absoluta Diferença em % Linear (Diferença em %) Linear (Diferença absoluta)

Fonte: 29 pesquisas eleitorais realizadas em 2010

1
Professor titular da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE. Expressa seus pontos de vista em
caráter pessoal. Tel: (21) 2142 4696 ou 2142 4689 E-mail: jed_alves@yahoo.com.br. Artigo publicado em
29/08/2010.

1
Contudo, no mesmo período, já era possível perceber que a diferença relativa estava diminuindo.
No primeiro trimestre de 2010, Dilma tinha, em média, 30% de intenção de voto (para ambos os
sexos), sendo algo em torno de 26% entre as mulheres e 35% entre os homens. A diferença entre
os sexos representava mais de 30%. No mês de agosto, a média das intenções de voto de Dilma,
no eleitorado total, chegou a cerca de 45% e a diferença entre os sexos ficou na casa de 8%, o que
representa uma percentagem de menos de 20%. Portanto, mesmo mantendo uma diferença
absoluta em torno de 9 a 8 pontos percentuais durante o ano, a diferença relativa tem diminuido,
mostrando que a candidata líder das pesquisas está ganhando terreno no eleitorado feminino.

Como já discuti em artigos anteriores, Lula e o PT sempre tiveram menos votos entre o eleitorado
feminino. As eleições de 2002 e 2006 só não foram decididas no primeiro turno porque o
percentual de votos femininos foi menor do que o percentual masculino, sendo que este último
ultrapassou 50% para Lula em ambos os pleitos. Ou seja, as mulheres levaram as eleições para o
segundo turno nas duas últimas eleições presidenciais do país. Parece que este fenômeno não vai
se repetir em 2010, pois a vantagem de Dilma Rousseff é tão grande que as últimas pesquisas
indicam uma vitória no primeiro turno, mesmo com a candidata petista tendo menos votos entre
as mulheres do que entre os homens.

Todavia, o desafio de conquistar o eleitorado feminino permanece. Dilma tem a possibilidade não
somente de ser a primeira presidenta do Brasil, mas também a primeira candidata do PT a ter
mais votos entre o eleitorado feminino do que entre o masculino. Os estrategistas do PT e da
coligação “Para o Brasil seguir mudando” têm conciência da importância de conquistar o voto
das mulheres.

Tanto é verdade que a convenção do PT, ocorrida em junho de 2010, foi precedida por uma
Plenária Nacional das Mulheres do PT, que imprimiu um tom lilás ao evento e apresentou o
documentário “Muito prazer, mulheres do PT”. A convenção do PT estabeleceu “Aqui se
celebra, em primeiro lugar, a mulher brasileira!”. Dilma, logo no início de seu discurso, disse:
“Aqui se consagra e se afirma a capacidade de ser – e de fazer – da mulher”. E já orientada
pelos profissionais do marketing, disse em tom familiar: “É em nome de todas as mulheres do
Brasil – em especial de minha mãe e de minha filha – que recebo esta homenagem”.

O comando da campanha de Dilma, com base em sondagens internas, percebeu que o discurso
de "mãe" provocou aumento significativo das intenções de voto em Dilma no eleitorado
feminino. Desta forma, no comício na cidade de Mauá/SP, Dilma reafirmou o discurso: "Vou
governar este país com a atenção de uma mãe, o carinho de uma mãe e a força de uma mãe". O
presidente Lula reforçou: "Se eu não tivesse a Marisa, tivesse um filho e precisasse deixar este
filho para alguém cuidar eu deixaria com ela (Dilma)".

Também o jingle da campanha reforçou o lado mulher da candidatura do PT: "Eu tô com
Dilma/Uma grande brasileira/É a mulher e sua força verdadeira". No encontro com seis centrais
do país (CTB, CGTB, CUT, Força Sindical, NCST e UGT), em agosto, Dilma disse: "Eu não
tenho o direito de errar. Assim como o presidente Lula foi o primeiro operário a governar o
Brasil, eu serei a primeira mulher. E, se eu errar, vai custar para uma mulher voltar à
presidência. Eu não vim até aqui para falar apenas de campanha eleitoral. Vim aqui para falar
do projeto de governo da primeira presidenta do nosso país. Eu preciso de vocês para que
possamos juntas mudar essa situação de discriminação que vivemos ainda hoje".

2
Todo este esforço de se dirigir às mulheres, às mães, às donas de casa e às trabalhadoras parece
que começou a surtir efeito já no final de agosto. A pesquisa Ibope, divulgada no dia 28/08,
apontou a menor diferença nas intenções de voto de Dilma Rousseff entre os eleitorados
masculino e feminino (como mostrado no gráfico 1). Considerando que os índices de indefinição
de voto são maiores entre as mulheres, o discurso feminino de Dilma pode conquistar esta parcela
do eleitorado e garantir uma maioria inédita entre o “segundo sexo”, que pela primeira vez
poderia se tornar o primeiro sexo em termos de percentual de voto em candidatura do PT.

Setembro é o mês do início da primavera. E pode também ser o mês que, pela primeira vez na
história do PT, uma candidatura à presidência da República consiga ter mais votos entre o
eleitorado feminino do que entre o eleitorado masculino, ou que, pelo menos, as diferenças de
voto não sejam significativas entre os dois sexos. Uma reviravolta de gênero nas intenções de
voto seria a confirmação do acerto da estratégia inovadora de lançar uma mulher para o cargo
máximo do Executivo brasileiro.

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