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Professor: Cláudio R. Duarte Ano: 2º Data: 18/08/17

Geografia Trimestre: 2º

Debates sobre mobilidade urbana e reforma tributária no Brasil


1- Tarifa zero no transporte público: Como pagar a conta?
Ruth Costas, Da BBC Brasil em São Paulo – 19/06/2017

Se o Estado garante acesso gratuito a um sistema de saúde pública e à educação, por que não pode
assegurar que todos os cidadãos possam exercer seu direito de "ir e vir" em uma grande cidade,
custeando integralmente também o transporte público?
Esse questionamento é a base da proposta de "tarifa zero", defendida pelo Movimento Passe Livre
(MPL), responsável pelas manifestações de junho de 2013 e que realiza nesta terça-feira seu quarto
protesto do ano contra a alta da tarifa de ônibus em São Paulo (recentemente, o bilhete foi
reajustado de R$ 3,50 para R$ 3,80).
A pergunta também é considerada pertinente por especialistas em políticas públicas e economistas
consultados pela BBC Brasil. Parece haver certo consenso entre eles que o transporte gratuito de fato
poderia trazer benefícios sociais e ajudar a reduzir o trânsito.
O ponto que divide opiniões, porém, é que, como sempre, alguém tem de pagar a conta – e, no caso,
uma conta robusta.
De acordo com o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), a "tarifa zero", ou "passe livre" para
todos os cidadãos custaria R$ 8 bilhões, o equivalente a toda a receita do IPTU (Imposto Predial e
Territorial Urbano) local.
Para muitos especialistas, a proposta é economicamente inviável para uma cidade do tamanho de
São Paulo. Outros, porém, acreditam que, com vontade política e apoio da população, seria possível
levar adiante um projeto nesse sentido.
Haddad parece estar hoje no primeiro grupo. Em entrevista ao jornal Valor Econômico na semana
passada, o prefeito lembrou que o transporte gratuito para estudantes de baixa renda e idosos já
custa ao município R$ 2 bilhões.
"É óbvio que alguém pode propor isso (tarifa zero). Quem sabe não aparece um candidato (nas
eleições municipais) que defenda essa tese, que fale: 'Olha, vou pegar todo o IPTU da cidade – que é
mais ou menos o que custa o sistema de transporte – e vou usar para passagem grátis para todo
mundo?'", disse o prefeito.
"O dinheiro da prefeitura é dinheiro do povo. Se o povo entender que vale a pena colocar 100% do
IPTU no transporte tirando de saúde, educação, é um direito da democracia, mas tem regras
democráticas para decidir isso."

Simplificação
Na opinião do economista e consultor Paulo Sandroni, que foi presidente da extinta Companhia
Municipal de Transportes Coletivos, e do engenheiro Lúcio Gregori, que esteve à frente da Secretaria
Municipal dos Transportes durante a gestão de Luíza Erundina (1989 - 1993), é contraproducente
"simplificar" o debate dessa maneira.
Durante os anos 1990, Gregori foi um dos arquitetos de uma proposta de tarifa zero rejeitada pela
Câmara de Vereadores. Sandroni, professor aposentado da FGV, também apoiou o projeto. Hoje,
ambos continuam a defender a viabilidade econômica da tarifa zero em São Paulo.
"O custo das estruturas necessárias para cobrar as tarifas de ônibus – cobrador, sistema de
recarregamento de bilhetes e etc. – corresponde a algo entre 20% e 22% do total, por exemplo,
então se você acaba com a cobrança já tem uma redução de custo que não está sendo considerada
(pelo prefeito)", diz Sandroni.
Para ele, o passe livre poderia ser custeado por um aumento do imposto sobre carros de luxo e do
IPTU das camadas mais ricas da população. "O IPTU poderia dobrar para os verdadeiramente ricos",
opina.
"As famílias de classe média também poderiam pagar um pouco mais, mas, no caso, isso seria
compensado pelo fato de elas não precisarem mais pagar pelo transporte público de seus integrantes
e dos empregados domésticos."
Já para Gregori, hoje haveria formas preferíveis a um eventual aumento do IPTU para financiar o
passe livre.
"Até porque o IPTU perdeu peso em relação a outras fontes de arrecadação", explica ele. "Entre as
alternativas interessantes estão um repasse de recursos do Estado e da União. Também poderia
haver um rearranjo dos gastos municipais, com a identificação de áreas em que poderiam ser feitos
cortes para que os recursos sejam direcionados ao transporte gratuito", opina.

Argumento contrário
Há quem discorde da viabilidade dessas alternativas. O economista Ricardo Gaspar, da PUC-SP, por
exemplo, está entre os que acreditam que a tarifa zero é inviável em uma cidade como São Paulo,
por questões financeiras e políticas.
"É claro que todos gostariam que os ônibus fossem gratuitos – os benefícios sociais do projeto, como
seus efeitos na redistribuição da renda, são inegáveis. Mas a complexidade da mudança que a tarifa
zero exigiria na estrutura de gastos do município faz com que ela seja inviável", diz Gaspar.
Para o economista um aumento de impostos encontraria muita resistência. "Veja só como é difícil
aprovar uma reforma tributária, por exemplo, apesar de todos considerarem isso necessário."
Além disso, Gaspar acredita que para fazer um rearranjo de gastos do município para encontrar
recursos para o projeto seria necessário cortar de forma definitiva os gastos de alguma área
importante. "Ou seja, teria de haver uma troca de um serviço público por outro", afirma.
O professor da PUC também considera pouco provável que os Estados ou a União aceitem ampliar
seus repasses para os municípios para custear o transporte público.
"No atual contexto já há dificuldade até para se cumprir o que está acordado em termos de repasse,
imagine para ampliar essas transferências", diz o economista. "Não é à toa que não temos nenhum
exemplo no mundo de cidade do tamanho de São Paulo que tenha o transporte gratuito."

Exemplos
Cidades como Sydney, na Austrália, e Baltimore, nos EUA, têm algumas linhas de ônibus grátis, mas
nessas localidades também há linhas pagas.
Tallinn, a capital da Estônia, com mais de 400 mil habitantes, se autoproclamou a "capital do
transporte público gratuito" ao oferecer ônibus grátis para todos seus habitantes em 2013.
Lá, o fato de as pessoas terem de se cadastrar como moradoras para ter acesso ao benefício (os
turistas ainda têm de pagar) teria ajudado no aumento da arrecadação de impostos ao incentivar
mais pessoas a se registrarem como residentes locais (passando a pagar impostos em Tallinn),
segundo explicou Sulev Vedler, editor do principal jornal da Estônia, o Postimees, em um artigo
recente no site de jornalismo independente sobre urbanismo Citiscope.
A decisão de implementar o sistema foi aprovada por referendo, o que deu às autoridades locais
legitimidade para fazer as mudanças necessárias.
Além disso, segundo Vedler, o fato de que os subsídios já cobriam 70% do custo do transporte da
cidade fez com que o diferencial a ser pago com a gratuidade fosse menor do que em uma cidade em
que o subsídio é pequeno.
Também há exemplos de cidades que tiveram de voltar atrás na decisão de implementar o passe
livre, justamente por dificuldades em custeá-la, como Hasselt, na Bélgica.
No Brasil, há algumas cidades que oferecem ônibus gratuitos a seus moradores, como Agudos, em
São Paulo, e Porto Real, no Rio de Janeiro, mas todas são relativamente pequenas.
A maior delas é Maricá, também no Rio, que tem mais de 140 mil habitantes. Lá, a prefeitura criou
em 2014 uma autarquia para gerir o transporte público gratuito.
A Empresa Pública de Transportes de Maricá (EPT), financiada em grande parte com recursos
provenientes dos royalties do petróleo, conta hoje com uma frota de 13 ônibus e 10 micro-ônibus,
mas não tem capacidade de atender toda a população. Por isso, os ônibus pagos continuam a circular
na cidade.
"É difícil fazer comparações porque cada cidade tem uma estrutura diferente de receita e gastos.
Trata-se de uma discussão que precisa ser particularizada", opina Gregori.

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2- Folha de São Paulo – Tendências e Debates – 12/08/17
GOVERNO DEVERIA AUMENTAR IMPOSTO DE RENDA DOS MAIS RICOS?
SIM - PRECISAMOS REVER NOSSA TRIBUTAÇÃO
A proposta de tributar os mais ricos está amparada na experiência recente da maioria das
economias avançadas do mundo. O Brasil tem várias razões para seguir essa trilha.
Nossa carga tributária é semelhante à média da OCDE (grupo de nações desenvolvidas) e
caiu na última década de 33,7% para 32,2% do PIB. O problema é que tributamos
pesadamente o consumo das famílias e a folha salarial das empresas, mas muito pouco o
patrimônio e a renda das pessoas.
Além disso, as rendas são oneradas de modo pouco progressivo e com inúmeras isenções
que favorecem especialmente os muito ricos.
Não me refiro à classe média que ganha cerca de R$ 7.000 mensais e integra a fatia dos
10% mais ricos, mas aos realmente ricos, que vivem de expressivos lucros obtidos das
empresas em que são acionistas e do dinheiro aplicado no mercado financeiro -cuja
tributação é menor do que sobre salários.
Ao observarmos o topo da pirâmide social, descobrimos que cerca de 70 mil pessoas
(0,05% da população ativa) ganham, em média, R$ 5 milhões anuais e concentram 8,2%
da renda nacional.
Não há nada parecido em outro país com grau de desenvolvimento semelhante ao nosso. E
essa elite paga apenas 7% de sua renda em imposto devido à nossa peculiar isenção de
lucros e dividendos distribuídos, outro caso raro no mundo.
Tal distorção, por si só, já justifica a revisão do nosso modelo de tributação de renda e
lucros. Mas além disso o país vive uma crise fiscal grave, gestada nas últimas décadas e
agravada pela recessão.
Em apenas três anos e meio, desde 2013, nossa dívida pública saltou de 30% para quase
50% do PIB, a conta de juros passou de 4,7% para 6,9% do PIB e o resultado primário
(receitas menos despesas) regrediu de um superavit de 1,2% para um deficit de 2,6% do
PIB.
Diferentemente do que muitos pensam, essa rápida deterioração fiscal não ocorreu porque
as despesas cresceram acima da média histórica, mas sobretudo porque a arrecadação
desabou com a crise econômica. Entre 2014 e 2017, as receitas da União caíram 9,7% em
termos reais, enquanto os gastos aumentaram 1,5%.
Isso não significa que o governo não deva controlar as despesas, como aliás está fazendo.
O investimento público federal já foi reduzido do patamar de R$ 70 bilhões para R$ 40
bilhões anuais, mas existem limites para se avançar nesse front.
É importante destacar que 50% do R$ 1,2 trilhão que o governo gasta anualmente é
destinado a benefícios sociais -aposentadorias do INSS, seguro-desemprego etc. A reforma
previdenciária, se for bem-sucedida, vai estabilizar, mas não reduzir essa despesa em
proporção do PIB. A redução do gasto e do deficit terá de vir de outras áreas.
Uma alternativa é baixar a taxa de juros e rever subsídios e desonerações tributárias que
beneficiam grandes empresários. Também é necessário limitar o gasto de pessoal,
sobretudo das corporações com maior poder de barganha que tentam se esquivar do
sacrifício para equilibrar as contas públicas.
No entanto, nem essas medidas nem a retomada do crescimento econômico serão
suficientes para reverter o deficit e evitar que nossa dívida continue crescendo. Por isso, é
preciso aumentar transitoriamente a carga tributária.
A questão é como fazer isso de forma menos dolorosa para o país. A tributação das rendas
mais altas é o melhor caminho, o que passa por rever a isenção de dividendos e alíquotas
sobre aplicações financeiras e altos salários. Esse ajuste solidário pode ser compensado com
uma redução gradual de outros impostos, contribuindo para o equilíbrio fiscal.
De um modo ou outro, a conta será paga -o ideal é que seja de acordo com a capacidade
contributiva de cada um de nós.

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SÉRGIO WULFF GOBETTI, doutor em economia pela Universidade de Brasília, é pesquisador do Ipea. Foi secretário-adjunto de
Política Fiscal do Ministério da Fazenda (governo Dilma).

NÃO - SOLUÇÃO É REDUZIR GASTO PÚBLICO

É da natureza humana concordar em tese com reformas, mas ser contra quando nos atinge.
Todos somos a favor do ajuste fiscal, de preferência em cima dos outros.
No entanto, pensando em um ajuste fiscal permanente, sou contra qualquer aumento de
impostos, independentemente da faixa de renda ou de ser pessoa física ou jurídica. Isso
seria apenas um paliativo -e rapidamente se tornaria insuficiente, sendo necessário
trabalhar nas despesas públicas.
O cerne do desequilíbrio fiscal está no descalabro dos gastos públicos. Enquanto houve
modo de aumentar as receitas para acompanhar essa dinâmica, a bicicleta continuou
rodando. Desde 2013, porém, por razões estruturais, e a partir de 2015, por razões
conjunturais, a receita começou a patinar. O Brasil perdeu a capacidade de gerar superavits
estruturais, deteriorando agudamente a dívida pública.
O Brasil se tornou um país caro antes de se tornar um país rico. No ano passado, a carga
tributária chegou a quase 33% do PIB, muito acima de qualquer outro país emergente e até
de muitos desenvolvidos. A carga nos Estados Unidos, por exemplo, é de cerca de 20% do
PIB.
Defendo, então, em um contexto de uma reforma tributária neutra, rediscutir a carga que
incide sobre renda e produção.
Pode-se argumentar que a alíquota de Imposto de Renda sobre os trabalhadores nos
percentis mais altos é relativamente baixa, portanto, caberia uma discussão acerca dos
efeitos redistributivos de aumentar a tributação dos que ganham mais.
No entanto, a incidência de outros impostos no Brasil sobre o consumo de vários produtos é
exorbitante (50% na compra de automóveis). Para o crescimento de longo prazo, seria até
recomendável mudar esse modelo, incidindo mais na renda e menos no consumo/produção,
mas sem aumentar a carga total.
Em termos mais pragmáticos, o que se percebe é a dificuldade do governo Michel Temer em
conseguir avançar nas reformas que corrijam os gastos públicos.
A própria reforma da Previdência está espremida na agenda legislativa -parece que o poder
de articulação do presidente no Congresso está se exaurindo.
A discussão da revisão da meta do déficit primário, para este ano e para o próximo,
demonstra a preocupação de não cumprir o Orçamento aprovado.
A equipe econômica parece emparedada, sem condições de continuar o ajuste com o corte
significativo dos gastos e de avançar em mais reformas estruturantes.
Nesse caso, um arranjo provisório pelo lado das receitas será proposto. Do contrário, a
equipe econômica e o presidente ficam sujeitos a penalidades ao infringir a Lei de
Responsabilidade Fiscal.
De qualquer maneira, dada a reação ao balão de ensaio de aumentar os impostos dos
assalariados que ganham mais de R$ 20 mil, não vai ser uma discussão fácil num
Congresso permeável a pressões corporativas e de olho na eleição de 2018.
A opção da equipe econômica deve ser por aumentar contribuições e impostos que não
precisem de aprovação legislativa, como PIS/Cofins e IOF.
Enfim, na eleição do próximo ano, será inescapável debater o tamanho do Estado. Caso a
escolha da sociedade não seja por seu enxugamento, todos teremos que pagar mais
impostos, sendo feito, assim, um ajuste de pior qualidade, com consequências indesejadas
sobre o crescimento e a distribuição da renda.
MARCELO KFOURY MUINHOS, doutor em economia pela Universidade Cornell (EUA), é professor e coordenador do Centro
Macro-Brasil da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas

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