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Pavlov Skinner | “Apenas uma coisa na vida tem um interesse verdadeiro. para ns — nossa experiéncia psiquica. Mas seu mecanisme foi € permanece ainda co- berta de mistério. Todos 0s recursos humanos — arte, religiao, literatura, f fosofia € cé@ncia histérica — se combi naram para lancar juz nessa escuri- dao. © homem tem & sua disposicgo ainda outro recurso poderaso; a cién- cia natural cam seus métades estrita- mente objetivas.“ PAVLOV: Os primeiras passas certs no caminho de uma nova investigagso “AS principals reagoes_nerwasas do animal e do hamem sio inatas c tom a forma de reflexos. PAVLOV: © trabatho dos grandes he- mistérios cerebrais “Do meu ponto de vista, a psico- logia da Gestalt é uma das tentativas menos bem-sucedidas dos psicélogos. Seu papel, eu penso, ¢ inteiramente negative.” PAVLOV: Critica da Psicologia da Ges- talt "A linguagem € um conjunto bem conhecido de contingéncias reforgado- ras. Burame centenas de anos, as ho- mens falaran sem a beneiicio das re gras codificadoras, Algumas sequén- clas de palavras eam mais eficazes, outras menos, ou simplesmente nao 0 cram. A descoberta da gramatica foi a descoberta das propriedades bastante estaveis. das contingéncias mantidas por uma comunidade,”" SKINNER: Contingéncias do Reforgo Os Pensadoré$ 83-1334 CIP- Brasil, Cotalogacdu-na-Poblicagao- Cimara Brasileira do Livro, SP Paviae, Ivan Powovich, 1849-1936, ‘Textos escolhides / Ivan Petrovich Pavlov; tradugdes de Ra chel Moreno, Hugolino de Andrade Uflaker ¢ Elena Olga Maria Andeea Continpéncias do reforgo | Bucrhus Frederic Skinner; tradugie dle Rachel Moreno. — 2. ed,— Sto Paulo: Abril Caltural, 1984, (Os ponsadores) Inclui vida e obra de Pavlov © Skinner. Bibliografia, 1. Comporiamenta turmano 2. Psicologia fisialdgica 3. Relexos con- dicionadoy 4. Reforgo (Psicologia) L, Skinner, Burrus Frederic, 1904 - il. Titulo, UL. Titulo: Contingéncias do reforen, IY, Série, eDD-152,322: -150) indices para catillago sistenviticn: 1, Comportamento humany : Psicologia 150 2 Psteologia fisioligica 152 3 Reflexes condicionados ; Psicologia experimental 192.3224 4. Reforg Psicologia 152.3224 AVAAIN FEINRWVICTIFAYLUY TEXTOS ESCOLHIDOS Tradugdcs de Rachel Moreno (1. il, IV. Vi, VII. XI), ‘Hugotino de Andrade Uflaker ¢ Elena Olga Maria Andreoli (MY, VOT, EX, BURRHUS FREDERIC SKINNER CONTINGENCIAS DO REFORCO Uma Anidlise Tedrica ‘Tradugies de Rachel Moreno EDITOR: VICTOR CIVITA ‘Tiealos or Texins de 1. P. Pavios *STive First Sure Steps Alen the Pah of New Investigation’ “Experimental Psychology and Peyckopathotigy in Auituals”” “Seientific Study of the So-Called Poychical Processes ithe Higher Animal” “the Concept of the Reflex and as Extension The Conditioned Reflex" The Batablishment of Sleep” Hypnotic Stages in Dogs: Parsdaxical and! Ultraparadoxical Phases of Diffuse Uahibition"™ “Lactates on tee Work af Corebral Hemispheres: Lecture Ce" Reply of a Physiologist to Psychologists" ‘“Feagaients of Statements at the 'Wedacsday’ Gathiriags. Stugyle af. P. Paviov against Ideatisia" “An Attempt of « Physiologist to Digress into the Demin of Psychiatry” ‘Texto te B. F, Skinners Contingencies af Retrfarccment: A Theurediedl Analsis © Copyright Abs $A. Cultural, Sia Paula, 1980 — 1 ealigto 198d ‘Texto publicada sob licenga de Prentive-Hull, te, N, J., USA, (Coniegencias de Reforcos- Original \aag wage edition. published by! Copyigh © 196) by Mente: he Allies cose Trhcuoes peblicaas sob licenga de Hemus - Levrana Editora Lida., $0 Paulo: “A Prigologia ¢ a Psicopatologia Experimentaic dos Anlusis "0 Reflexe Condictonadn’” ‘0 Trahatho dos Grades Heomicterios Cershraie* ““Resposta de ua Pisidlogo eos Psicdioga ‘"Frapmentas dos Debates Palestray das “Qhusetas- Peas! ireitiisexelusivos sobre as demass aradugies deste volume, ‘Abril S.A. Cultural, ip Paulo, Diteitis exttusivis sobre "*Paviow — Vida ¢ Obes” # 'Sidoiner — Vida-e Obra”, Absil 8.A, Cultural, S80 Palo, PAVLOV VIDA E OBRA Consultoria: Antonio Branco Lefevre {x Petrovich Pavlov nasceu a 14 de sotembro de 1849 em Rya- zan, ha Rassia central. Seus estudos foram iniciados no semina tio da cidade natal e continuados na Universidade de Sao Petersbur. 30, onde trabalhou scb a diregdo dos fisiologistas Ousiannikov © Cyon, Em 1883, doutorau-se em medicina e dirigiu-se 3 Alemanha, a fim de trabalhar com Karl F. W. Ludwig (1816-1895) @ Rudolph Hei- denheim (1834-1897), Retornanda & Russia, em 1890, assumiu a ca- deira de farmacologia da Academia Militar de Medicina de Sia Petors- burgo @ dirigiu a construo do primeiro centro cirtirgico do munde, Em 1891, passou a lecionar fisiologia e dedicau-se aos problemas do funcionamento do pancreas, obtendo uma medalha de ouro pela va- lor desses trabalhos. Depais disso, Pavlov resolyeu estudar o panel do sistema nervar so sobre 9 coracaa; em seguida, espantado pela imprecisio do que se conhecia na época sobre os fendmenos da digestéo, passou a se apro fundar nessa drea, realizando experimentos que se tormaram clas tos. A publicagdo dos resultados dessas pesquisas, em 1897, valeu- Ihe a obtencio, sete anos depois, do Premio Nabel. Contudo, seria um outro Campo de estudos que the conferiria lu gar de maior relevancia dentro da histéria da citncia, Desde 1901, Pavlav dedicou-se a pesquisas sobre secregdo sulivar ¢, a partir dat, comecou a estudar os reflexos condicionados, demonstrando sua de. pendeéncia des hemisférios cerebrais ¢ criando um novo métode de in- vestigagiio do cérebro, de suas fungées ¢ de suas relagdes cam 0 meio externa. Uma teoria revolucionaria Em 1927, foi criada a cidade-laboratério de Koltuchi (mais tarde chamada Faviovol, onde Pavlov, até sua morte, em 1936, concen- trou-se na aplicacao dos principios do condicionamento aos proble- mas de clinica priquitrica. vill PAVLOV Dos trabalhos de Pavlov a parte mais conhecida, e também a Sue acarretou as mais amplas censeqtencias nos terrenos da psicolo- gia © da pedagogia, refere-se as estuxlas sobre os reflexos, sobretu- do, & teoria dos reflexes condicionados, Para Pavlav, um reflexo comporta seis elementos que formam uma cadeia: primeiro, uma estimulac3e que pode ser uma cor, um som etc.; segundo, um orgdo receptor (olho, ouvido, receptores olfati- vos © gustalivos, comiisculos receptores da sensibilidade superficial ‘ou profunda); terceito, uma terminagdo nervosa quic transmite a exci- fagdo a Um centro nervoso; quarto, um centro nerves, constituldo de indmeras células, cujas sinapses permitem circuits miltiplos para a difus3o do influx nervoso recebido; quinto, um nerve efetor, que transmite © impulso desencadeador da resposta: finalmente, um Or- a0 (figado, estémago, glandula salivar etc.) que efetua a resposta. Es- sa cadeia constitu os refiexos que Pavlov chama de inatas ou absolu- tos; eles formam 0 proceso basico de tode © comportamento nao aprendido @ sio necessdrias, mas nao suficientes, para a unidade do organisme com @ munda externa, © segundo tipo de reflexos investigados por Pavlov sdo os refie- xos condictonados. A diferenca dos primeiros, os reflexos condiciona- dos nao sio inatos ou absolutas, dependendo sua existéncia das expe- rigncias pelas quais passam os organismos vivos em seu relaciona- mento com o mundo extarior. Pavlov desenvolveu a teoria dos réflexos condicionados a partir de suas famosas experiéncias com cies. Inicialmente, a fisidlogo rus- $0 investigou o compartamento inato ou absaluta dos cées, calculan- do com exatidac a saliva gue os mesmos produziam ao ser-lhes apre- sentado um pedaco de carne, Depois ce bem conhecida esse m nismo, Pavlov passou a tocar uma campainha, ao mesmo tempo que apresentava a came aos cies; depois de repeltidas experiéncias nesse sentido, conseguia obter a respasta (salivagao}) ao simples toque da campainha sem apreseniagio da carne, Em outras palavras, 0 cio pas- sou a dar a mesma fesposta a um estimulo associado ao primeiro, A esse novo tipo de comportamento, Pavlov deu o name de "reflexo condicionado” @ chegou & elaboragdo de uma teorla fundamental pa- fa @ conhecimento do animal e do homem, inclusive em seus niveis superiores de organizacsa, como a linguagem eo pensamento. Segundo Pavlov, as leis principais que regulam os reflexos candi- clonados s40 quatro. A primeira diz qué toda resposta condicianada 6 resultado da repeti¢aa de um comportamento, associado a certo es- timulo e seguido sempre de uma recompensa. Assim, fazendo-se soar yma campainha sempre que se oferece carne a um cao, depais de ra- petidas vezes o cio salivard 20 simples soar da campainha, nda sen do necesséria a visdo da came, Por outro lado, a resposta “‘saliva- C40", referida samento.& came, é uma resposta Incondicionada. Uma segunda lei deserave a extingaa do roflexo condicionada. Is- so acorre quando, depois de estabelecida um condicionamento, 0 es- limulo — “som de campainha’’, por exemplo — nao & repetidamente acompanhado de recompensa. A terceira lei mostra como uma resposta pade ser retardada. E 0 que acantecerd se for estabelecica um invervalo de tempo entre 0 esti- mulo ‘som de campainha"’ © ¢ oferecimento da carne, Nas primeiras VIDAEOBRA IX vezes, 0 cdo salivard imediatamente apés ouvir 0 som, mas pouco a pouce atrasaré sua resposta. Finalmente, uma quarta lei é a de condicionamento seletivo. Ao se fazer sear alicrnadamente duas campainhas de sons ligeiramente diferentes — e s@ 0 C30 for recompensado em apenas um dos casas —, inicialmente ele salivara tanto para uma como para a outra, mas Jogo faré uma selegao, respondendo apenas a que é acompanhada de premio. Novos rumos para a ciéncia Aa lado da teoria dos reilexos condicionados, Paviov fez outras contribuigées importantes para a ciéncia. Desenvolveu uma teoria da unidade funcional do cérlex contrapando-se ds teorias classicas das localizagoes cerebrais. Fara Pavlov, 0 cortex cerebral apera sinteses, constituinde cadeias, associagées, ‘reflexos corwlicionados, que for- mam esteredtipos. Estes sio dindmicos, tencem a persistir, nda sio de- finitivos e so modificavels em fungdo do desenvolvimento de novas. excilagoes € inibigdes, Todos os processes entram em interagiio € con- flito, desenvolvendo-se para produzir um comportamento qualquer, ‘om um “sistema dindmico grandiosa”. Em Intima vinculagso com suas idéias sobre a unidade funcional do cértex cerebral, Pavlov desenvolveu uma teoria dos tipos nervo- 508, COMUNS aos animais € aos homens. Esses tipos sdo o colérico, o sanguineo, 0 fleugmética e o melancdlico; todas eles seriam resultan- tes de ume heranca nervosa da espécie, mas estariam sujeitos a modi- ficagées, em fungao do meio, nao implicands, portanto, nenhum fata lismo ou predestinagao obrigatoria ou hereditaria, Outro campo de investigagao em que Pavlov fez contribuigocs importantes foi 9 da fisiopatolagia cértico-visceral. Em sua época, os médicas tinham perdido de vista o conjunto do organismo sadio ou doente, bem como as relagdes com o mundo circundante. No maxi- mo, justapunham fatos sem aprofundar caracteristicas particulares, tendo chegado a algumas tentativas de sintese: as “teorias” humoral ¢ do simpitico, Pavlov mostrou que no se pode reduzir 0 conjunto dz fisiologia e da patalogia as atividades normais ou anormais dos fa- tores humorais, sobretudo dos endécrinos, sem levar em conta o siste- ma nervaso, Unindo; assim, 0 cortical e 0 visceral, lancou as funda- mentos da medicina psicossomatica e desenvolveu inimeras investi- gagdes sobre as neuroses experimentais. Provocando sobrecargas ner- vosas em suas Cobaias, Pavlov conseguia reproduzir manifestacdes pa- toldgicas, como eczemas ¢ atites, Indmeras foram as conseqiéacias e aplicagdes praticas das des- cobertas de Pavlov. Entre outras, 2 sonoterapia, que permite a restau- ragio de processos nervosos alterados; os tratamentos quimioterdpi- 03, que modificam a dinamica cerebral; as lécnicas de parto sem dor etc. Para a histdria das idéias em geral, a extraordinaria contribui- gio de Paviov constitui uma das mais completas concepgdes cientifi- o-naturalistas do homem, que levaram a psicologia ¢ a pedagogia a se libertarem de pressupastes metalisien-ospiritualistas, tradicionais No pensamento cristao ocidental, x PAVLOV Cronologia Bibliogratia 1849 — Petrovich Pavlov naxce em Ryazan. Russia, a 74 de sotembre 1867 — Pavlov entra na Universidade de Petersburg, 1879 — Formarse em modicina, 1881 — Casa-se com Seraphina Karchevskaya. 1983 — Doutorrse em medicing com uma tese sobre inemacao de cara Glo. 1884-1886, — Trabalha na Alemanha.com K. Ludwig eR. Heidenhein. 1888 — Rescobre os nervos OU Borie 1889 — Escreve sobre “alimentiac sinnilada” ¢ “secrogdes psiquicas” gds- (rica. 1890 — Assume a cadcira de Farmacologia da Academia Miliiar de Medici a, 1891 — Ditige 4 constragio do departamento cintirgica do Instituto uke Metli- cine Experimental, no qual € chete de departamento. 1895 — £ nomeade protessor de fisiofogia na Academia de Medicina Mili- lar. 1897 — Publica seus trabiliwos sabee a atividade das glindulas digestivas 1901 — Pavlov comera suas pesquisas sobre secregiae saliva. 1904 — Recebe o Prémia Nobel 1906 — E eleifo memlbro da Academia Russa de Citncias, 1907 — Eeleito memlue estrangeiza do Rayal Society, de Lonaes, 1924 — Dermte-se da Academia, esr protesto contra 2 dscrinitnagdo. ant clerical. 1928 — Estuda ¢ aplicagde de seus princioies de candicionamento em ctini- a psiquiiirica, 193 — £ eleito membra hanorétia do Royal Colloge iof Physicians div Lon- re 1936 — Morte em Leningrad, no dio 27 de fevereina, Astatvan:E. A. Ivan Petrovich Pavlov, Mis Life and Work, Moscou, 1953: Baskin, 8, P.: Pavkay: A Biography, Chicago, 1960, Plarono. K. Lt The Word as 9 Physiological ane Therapeutic Factor — The Theary and Practice af Psychoierapy According to Ivan Petrovich Paviev, Moscou, 1954, Was. H. X.: Pavlov and Freud, 2 volumes, Nova Yorke Londres, 1962, Frowov, ¥. P.; Paylav and His Schoo! — The Theory of Conditioned Rerlexes, Nova York © Lortdras, 1947, IVAN PETROVICH PAVLOV TEXTOS ESCOLHIDOS ‘Tradugies de Rachel Moreno (1, 112, 1V. V1, VI, XI). Hugolino de Andrade Uftaker c Elena Olga Maria Andreoli (UM, ¥. VIN, IX. X) tf OS PRIMEIROS PASSOS CERTOS NO CAMINHO DE UMA NOVA INVESTIGACAO"* Nifo é por mero acaso que todes os fendmenos da vida humana sio domina. dos pelo pao nosso de cada dia — o mais antigo clo de ligagdo de todas as coisas vivas. incluindo o homem, com a natureza circundante. O alimento, que acha seu caminho no organismo, no qual sofre certas modificagdes — dissocia-se, entra em novas combinagdes, ¢ novamente se dissocia — corporifica 0 processo vital, em toda a plenitude, desde as propricdades fisicas elementares do organisa, tais como a lei da gravidade, a inércia, ctc., ds mais altas manifestagdes da natureza humana. O conhecimento preciso do que ecorre com o alimento, adentrando o organismo, deve ser o objeto da fisiologia ideal, a fisiologia do futuro. A fisiologia contemporfinea pode apenas engajar-se na acumulagao continua do material necessirio 4 consecugio desse objetivo remoto. O primeiro estagio, através do qual as substéncias alimenticias, intraduzidas de fora, devem passar, ¢ o canal digestivo; a primeira agdo vital exercida sobre essas substiincias, ou, para ser mais exato ¢ objetivo. sua primeira participacio na vida, no progesso vital, é efetuada pelo que conhecentos come digestio. © canal digestivo é uma espécie de tubo que passa ao longo de todo o orga: hismo ¢ esti cm comunicagin com o mundo externo. isto 6, atinge também a superficie externa do corpo, mas esté virado para denwo ¢, consegientemente, ooulto no organismo. © fisidloge que-consegue penetrar cada vex mais profundamente ao canal digestivo se convence de que este consiste em uma séric de Laboratérios quimicos. equipados com virios csquemas mecanicos. Esses esquemas mecanicos si for- mados pelo tecido muscular, que € parte constitutiva das paredes do canal digesti- vo. Eles tanta facilitam a passagem dos components alimentares de um labora- rio para cutro, como Os retém, por algum tempo, num determinado laboratério, ou, finalmeate, expelem-nos quando cles provam ser prejadiciais ao arganismo. Além disso, participam do processamente mecdnico do alimento, acclerando a agao quimica sobre o mesmo, pela mistura compacta, ete. O tecido glandular especial, que & parte constituinte da parede do canal Gigestivo, ou fica 4 parte na forma de massas separadas, comuni¢ando-se com ele através de tubos de ramificagio, produz reagentes quimicos*, os chamados sucos ' Diserrso do Pranic Nobel, conferido em Baoccime, a 12 de dezembro de 1904, > Substineia que produs uma reagan epshecida ecgractessiica cin owva subptinaia, 4 PAVLOV digestivos, que fluem em segmentos separados do tubo digestivo. Os reagentes, por um Lado, so solugdes aquosas de conhecidas substancias quimicas, tais como Acido hidrecloridrico, soda, etc. por outro lado, sio substincias encontraveis somente no organismo vive © que dissolvem os principais componentes do ali- mento (proteinas, carboidratos, ¢ gorduras) com muito maior facilidade, isto & muito mais rapidamente ¢ numa temperatura mais baixa, e em quantidades meno- Tes qué quaisquer outras substincias estudadas quimicamente. Essas substancias, que tanto funcionam Ja visro,* coma no canal digestivo, ¢ que, portanto, sao obje- to natural da investigagio quimica, tém sido até agora de dificil analise. Como é sabido, clas silo chamadas fermentos. * Dessa deserigio geral do processo digestt- ‘vo, cu me voltarei para os aspectos relativos a esse processo estabelecido por mim ¢ pelo laboratdrio, de qual sou enearregado. Em assim fazendo, julgo ser meu dever lembrar, com profunda gratidao, meus inimeros colaboradores de laboratério, Para investigar o desenvolvimenta da sccregio nas glindulas digestivas grandes, * que se comunicam com o canal digestivo através de ramificagies de tubos, cortamas pequenos fragmentos da parede do canal digestivo, em cujo cen- (ro se enconiravam as aberturas normais dos dutos secretérios. Nés, entio, castu ramos as aberturas na parede do canal, os fragmentos cortados cam as abcrturas dos dutos secretores foram suturados ds partes correspondentes na superficie da pele, do ludo de fora, Gragas a esse procedimento 0 suco fol desviado do canal digestivo ¢ coletado em recipicntes especiais, Para coletar 0 suco produzido pelas glandulas microscépicas, localizadas diretamente na parede do canal digestivo, grandes fragmentos foram cortados dessas paredes ¢ foram feitos quistos artifi- siais com aberturas para o lado de fora, No caso do estémago, a preparacdo dos quistos urtificialmente isolados envolveu sempre o seecionamento des nervos das célulax glandulares, ¢ isso, naturaimente, desordenou o trabalha normal do estamago. Levando em conta as relagées anatémicas mais delicadas, modificamos a ‘operagao de tal forma que deixasse as vias nervosas normais intactas, quando se fazia um quista isolado das partes da parede do estémago. Finalmente, ja que 0 canal digestivo é um sistema complexe, assim dizendo, uma porgio de laboratérios quimicos separados, eu costumava cortar a comuni- cagio entre eles, de forma a investigar a ocorréncia de fendmenos em cada labora: t6rio particular; ew dividi, portanto. o canal digestivo em varias partes distintas. Isto, € claro, exigia passagens répidas ¢ convenientes do exterior para cadu labo- ratorio separado, Para isso, estiveram em constante uso tubos metalicos, Eleg slo Introduzidos nas abernuras artificiais, * e, durante os intervalos entre as experién 4 Osorrende fora de arganivmo vivo, geraimente awin (cipitate de vidro, como um tubo de easaio ow * Hoje. setiam mais provavelmente channades enaimas. * Pavioy serefere squi a drgios como w pancreas, * citar pode encontrar um termo malt tignivw para es abertura, como por excmplo ital: sias, podem ser fechados. Dessa forma, freqtientemente realizamos Operagdes bem completas ¢, algumas vezes, muilas aperagGes em um dmico animal. Carece dizer que 0 desejo de cumprir @ nossa larefa com maior confianga, para evitar perda d¢ tempo ¢ trabalho, ¢ para poupar o animal tanto quanto possivel, fez-nos observer estritamente todas as precaugdes tomadas pelos cirurgides com seus pacientes. Aqui, também, tivemos que aplicar a anestesia prépria, observar limpeza impeca- vel durante a operagda, providenciar compartimentos limpos depois da operagio, ¢ observar meticuloso cuidado com os ferimentos. Nossos saudaveis € felizes ani. mais ficeram seu trabalho de laboratério com verdadeiro. Prazer. Eles sempre saiam de suas jaulas para o laboratério ¢ Prontamente pulavam sobre as mesas onde nossas experiéncias ¢ observagSes eram conduzidas, Em noysas observagies em cies, logo notamos 0 seguinte fato fundamental: 9 tipo de subsiéncias que entravam do mundo externo pare o canal digestivo, isto €, quer camestiveis, quer ndo, secos ow liquides, tanto quanto as diferentes subs- tancias alimentivias, determinava 0 principio do trabalho das glandulas digesti vas, as pecutfaridaces de seu finclonamento em cada ceso, a quantidade de rea- Gentes produzidos por elas e sua composicado.? Isso pode ser provado por intimeros fatos, Veja-se, por exemplo, a formacao de saliva petas ghindulas salivares muco sas. Com cada refeigio, quando substancias comestiveis se introduzem na cavie dade oral. uma saliva grossa ¢ viscosa contende muito muco brota dessas glandu- las. Com a int odugio de substincias ofensivas, como o sal. Acido, mostarda, etc,, na boca do animal, a saliva pode brotar na mesma quantidade que no primeiro CuSO, Mas sua qualidade é bem diferente — é fluida e aguada. Se forem dados ora carne, ora pio comum uo cio, sendo iguais ay outras condigdes, a secrecdo de saliva, no segundo caso seré mais abundante que no primeiro. Igualmente, algu- mas das substincias que sao rejeitadas pelo animal, por exemplo, tio irritantes como © Acido, o dleool ¢ outras, prevocam uma seoregdo mais profusa de saliva Que outras, quimicamente indiferentes, como as amargas; conseqiientemente aqui, também, observa-se uma atividade diferente das glandulas salivares, As glandulas gastricas reagem da mesma maneira; elas scerezam seu sumo ora em maiores, ora em menores quantidades, ora com mais alta e ora com mais baixa acider; seu conteido de pepsina — um fermento dissolvente de proteina — € algumas vezes maior. algumas vezes menor. Pao provoca a secregio de suco gastrico com a mais alta concentracao de fermento, mas com uma avidez muito baixa; leite provoca a menor concentragiio de fermento, enquanto a ¢arne proyooa a maior concentragao de dcido. Sob a ago de certas quantidades de proteina, introduzidas na forma de pao, as glandulas produzem de duas a quatro vezes mais fermento de proteina, do que no caso da carne ou do lei Entretanto, a diversidade do trabalho das ylandutas gastricas nao é restrita aos fendmenos acima mencionados, Ela se manifesta também em flutuagdes pecu- liares na quantidade ¢ qualidade dos reagentes durante o periodo de funciona- * Itétiods do editor, 6 PAVLOV mento das glindulas, depois da inweduglo de uma ou outra substncia alimenticia. Mas isso sera suficiente. Eu abusaria da atengiio dos senhores, dando um relatirio de todos os dados coletados por nés neste campo. Quero apenas ressaltar que correlagdes similares foram obser vadas por nds na atividade de todas as ou- tras glindulas do canal digestivo. Agora pode-se perguntar: que significa essa diversidade no trabalho das glandulas? Em resposta, vamos recair no fendmeno da secregao Salivar. As subs tancias alimenticias provocam a sccregio de saliva mais grossa ¢ mais concen- trada. Por qué? A resposta, obviamente, & que isso possibilita a massa de alimento passar facilmente pelo tubo, partindo da boca ao estémago. Sob a ago de certas substinciss desagradaveis ao cio, as mesmas glindulas segregam saliva fluid. Para que serve 4 saliva em tais casos? Obviamente, ou para diluir essas substan- cias ¢ dessa forma atenuar sua ago quimicamente irritante, ou, como sabemos por experiéncia propria. para limpar a boca dessas substancias. Neste caso é necessario agua, ¢ nao muco, c € realmente segregada Agua. Come vimas, 9 pia, ¢ especialmente © pao seco, provoca secregio de quanti- dades de saliva consideravelmente maiores que a carne. Isso também € perfeita- mente compreensivel: o consumo de pio seco requer saliva, primeiramente, para dissolver os componentes do pao, ¢ tornar assim possivel sentir-Ihe 0 gosto (pois qualquer coisa totalmente nfio comivel pode entrar na boca!), ¢ em segundo lugar, para amaciar o pio duro ¢ seco, caso contrario ele passarin com dificuldade ¢ poderia mesmo ferir as paredes do esdfago, ao mover-se da boca ao estomago. As relagdes dentro do estémago siio exatamente as mesmas, A proteina do pao produz a secregio de mais fermento de proteina, que a do leite ou da carne. poden- do-se observar um fendmeno semelhante no tubo de ensaio: a proteina da carne ¢ do leite ¢ dissolvida mais faciimente pelo fermento de proteina que a proteina vegetal. Aqui, novamente, cu poderia citar numerosos exemplos adicionais de tais lagos, exclusivamente funcionais, entre o trabalho das glandulas digestivas ¢ as. propriedades das substdncias que entram no canal digestivo (mas eu © farei mais tarde, quando e se surgir oportunidade). NZo ha nada de surpreendente nesse fend meno; ¢ nia se poderia esperar outras relagdes. Est& claro para tedos que o orga- nismo animal é um sistema altamente complexo, consistindo em uma quantidade quase infinita de partes, relacionadas tanto entre si quanto,como complexe tinico, com o meio circundante, com © qual esti em estado de equilibrio, O equilibrio desse sistema, como 0 de qualquer outro, é uma condigo indispensivel para sua cxisténcia. E se em certos casos somos incapazes de descobrir as relagdes funcio- nais nesse sistema, @ razdio disso € nossa caréncia de conhecimento. Isso nao quer dizer que essas relagdes estejam ausentes de um sistema que tem a qualidade de permanéncia. Passaremos agora a outra questiio que surge do que foi dito acima; Como se da esse equilibrio? Por que é que as glandulas produzem no canal os reagentes necessarios para o ratamento bem sucedide do respective objeto? E claro que se TEXTOS ESCOLHIDOS: 7 deve admitir que, de alguma forma, as propriedades definidas do objeto atuam sobre a glindula, provocam nela uma reagao especifica ¢ causam sua atividade especifica. A analise dessa influéncia sobre 2 glandula ¢ um assunto muito intrin- sade, que requer muito tempo. © principal ¢ revelar no objeto as propriedades que, no caso particular, atwam como estinmios sobre as glandulas em questio. Uma investigacao dessa espécie nfo é tio facil como parece 4 primeira vista, Eis aqui alguns fatos para provar isso. Nés introduzimos carne, através dos tubos metilicos ja mencionados, no estémago yazio ¢ inalivo do ea, sem qué 6 animal © perecba. Em poucos minutos, o reagente gAstrico, uma solugao do fermento-pro teina gastrico, comega a exsudar das paredes do estimago, Mas gtral foi a proprie dade da massa de carne que ogiu como estinulo® nas glindulas gastricas? Seria mais simples admitir que esta ago foi provocads por suas propriedades mecani cas — pressio, ou fricgdo nas paredes do estomago. Mus essa suposigio seria absclutamente incorreta, As influéncias mecanicas su inteiramente ineficazes. com relaco is glindulas gastricas. Podemos influenciar mecanicamente a parede do estémago, de qualquer maneira — fortemente, ov fracamente, continuamente ou com interrupedes, em freas limitadas ou esparsas —, mas sem obter-uma sim ples gota de suco gastrico, Na verdade, so os componentes da carne dissolvidos na agua as substincias estimulantes. Entretanto, ainda carecemos de conheci- ‘mento sobre essas substincias, pois as substéncias extrativas da carne formam um vasto grupo que aguarda uma investigagdo mais aprofundada. Eis aqui outro cxemplo: poucos minutos depois que o quimo® se encontra na parte mais préxima do canal digestivo — no duedeno — uma das glandulas do mesmo enira em ago; 6 o parereas — um grande 6rgio localizado ao lado do canal digestive e ligado a este por um cuito exeretor, Mas qual das propriedades do quimo, avangando nos intestinos, atua como um agente estimulador sabre a plandula? Ao contririo das nossas expectativas, verificou-se que essa ago era exereida, nao pelas propriedades do alimento consumido, mas pelas propriedades do suco que se juntou a cle no estamage, isto é, por seu contaido aeida, Se despe- Jarmos suco giistrico puro no estémago. ou diretamente no intestino, ou simples- mente o dcido que ele contém, ou mesmo qualquer outro acido, a citada glandula ‘comegard a funcionar tio vigorosamente ou mais que no caso do quimo normal, passando do estémago aos intestinos. A grande significancia desse fato inespe- radoé bem clara. O laboratério gastrico utiliza seu fermento de proteina sob uma reagio acide. Diferentes fermentos intestinais, e, entre eles, naturalmente, os fermentos Pancreaticos, nao podem desenvolver sua atividade num meio acide. Consegien- temente, é claro que a primeira tarefa do laboratdrio é providenciar a reagdo neu- ta ou ulcalina neeessaria para sua atividade trutifera. Essas relagdes sao afetadas pelas acima mencionadas inter-relagdes. j4 que o conteido dcido do estémago, como ja foi dito, induz & secregao do suco pancreatico alealino (¢ quanto maior o * Tileos do ecto. > Termo téonioa, que designa 6 bolo alimectar apie alguma iemsformaigSe por pedo péstrica. ® PAVLOV conteido Acido, maior a seeregZo). Assim, « sueo pancreatico atua, antes de mais nada, come uma solugio de soda. Mais um exemplo: sabia-se de longa data que o sueo pancredtico contém todos os trés ferments que agem nas principals substancias alimenticias — 0 fer- mento de proteina, que é diferente do gastrico, o fermento de amido. ¢ 0 fermento adiposo. Como foi provado pelas nossas experiéncias, o fermento de proteina no seco pancredtico & constantemente ou as vezes, inteira ou parcialmente (isso & ainda temirio de controvérsia) uma forma inerte, latente. Isso pode set explicado pelo fato de que um fermento de proteina ativo pode comprometer os outros dois fermentos pancredticos ¢ destrui-los, Simultancamente, estabelecemos que as paredes da parte superior dos intestinos distribuem em sua cavidade uma subs- tancia fermentativa cuja finalidade & transfarmar o fermento de proteina paner: ico inerte, em ative. O fermento ative, entrando em contato com as substancias da proteina do alimento nos intestines, perde sua agio nociva com relagdo aos ow tros fermentos. O fermento intestinal especial, acima mencionado, & segregado pele parede do intestina, devido unicamente d agdo estinuladora do fermente de protetia pancredtica. Assim, a relagdo oportuna de fenémenos é baseada nas propriedades espee!- ficus dos estimulos e nas reagdes igualmente especificas correspondentes a eles. Mas isso, de forma alguma, esgota o assunto, Agora deve-se colocar a seguinte questio: come & que as dadas propriedades do objeto, os dados estimuladores, aleangam o proprio tecido glandular, seus elementos celulares? © sistema do organismo, de suas imimeras partes, ¢ rcunido numa tinica entidade de duas for- mus: por meio do tecido especifico que existe apenas para manter relagdes mu- tuas, isto & 0 tevidy nervosa, ¢ por meio dos tecidos fuidos, que lavam todos os elementos do tecido. Sao esses muitos intermediérios que transmitem nossos mulos go tecido glandular. Investigamos por completo a primeira dessas inter-relagdes. Muito antes de nds, foi estabelecido que o trabatho das glindulas salivares é regulado por um aparato nervoso complexo. As terminagaes dos nervos sensoriais na cavidade oral sao irritadas por diferentes estimulos; a irritagdo ¢ wansmitida através desses nervos ao sistema nervoso central e dai, com a ajuda de fibras ner- vosas seeretérins, eferentes especiais, diretamente ligadas com as células glandul res, alcanga os elementos secretores ¢ 0s induz a certas atividades. Coma ¢ sabido, esse processo, coma um todo, ¢ designade como reflexo. Afirmamos, ¢ provamoy experimentalmente, que normalmente esse reflexo é sempre de uma natureza especifiea, isto é, que as terminagdes dos nervos que rece- bem a estimulagio siio diferentes, cada qual eliciando uma reagao somente quan do ha estimulos externos definidos. De acordo com isso, 0 estimulo que atinge a célula glandular é também de um carater especifico ei . Esse é um mecanismo muito profundo, Como cra de s¢ esperar, a descaberta do aparato nervoso das glandulas sali- vares impeliu imediatamente os fisidloges a procurar um aparato similar em ou- tras glandulas que se encontram nas profundezas do canal digestive. Nossas experiéncias nao apenas provarum a existéncia de um aparato nervo so nessas glandulas, mas também cxtrafram dados que mostraram claramente a barticipagao desses nervos na atividade normal. Eis aqui um exemplo admiravel. Executamos duas operagocs simples muito facilmente suportadas pelos caes, edenois das quais, se adequadamente cuidarmos de sua sobrevivencia, eles vivem por anos, absolutamente saudaveis ¢ normais. As operagdes foram feitas como segue: (1) 0 esdfago foi cortado na altura do pescoco v ambas as extremidades foram suturadas na pele do pescogo de tal forma que s¢ evitasse a passagem da comida da boca para o estémago do animal — ela escoava através da abertura. superior do canal: (2) uma sonda metalica foi introduzida no estémage através da paredé abdominal — uma operagio mencionada anteriormente e ha muito tempo praticada, Entender-sc-A que os animais cram alimentados de forma que permi- lisse 4 comica entrar diretamente no estmago através da sonda. Quando, depois de um cespago de muitas horas. ¢ depois que o estmaso vazio do ede fora inteira mente lavado, o animal cra alimentado da mancira normal (0 alimento, como ja foi mencionado, caindo fora do eséfago. sem atingir o estimago), em poucos minutos 0 esimago vaio comegava a segregar sco gastrica puro. A sccregio continuava, enquanto se dava comida ao c&o, algumas vezes persistindo muito de- pois da interrupgo da chamada alimentagao simulada. Nessas condigics, a secre- Gio de suco é muito abundante, ¢ é possivel obter centenas de centimetros cibicos de suco gastrico, Em nosso lahoratério, nds realizamos essa ‘operagao em muitos ses ¢ 0 suco gdstrico assim obtido néo apenas serve as finalidades da pesquisa, como é também um étimo remédio para os pacientes que sofrem de insuficicncia de atividade das glindulas gistricas. Assim, uma parte dos suprimentos vitais de fossos animais, que vivem por anos (mais de sete ou vita) sem revelar mesmo o mienor desvio da salide normal, € benética ao homem. Das experiéncias acima mencionadas, fica claro que o simples process de comer, mesmo qué o alimento ndo atinja o estémago. estimula as glandulas gastri- cas, Se cortarmos of nervos vagos do pescoge desse animal, a alimentagio simu- lada no provecurd qualquer secrecio de suco gastrico, néo importando a idade do clo e seu estado fisico. Assim, a estimulagia praduzida pelo proceso de comer atinge os glandulas gastricas através das fibras nervosas contidas nos ner- vos Vagon, Entre os estimulos das glandulas digestivas ha uma caiegoria — ainda n&o mrencionada — que, muito inesperadamente, atingiu o primeiro plano de nossas investigagies. E de hi muito conhecido que a visio de comidas saborosas produz agua na boca de um homem faminto; a falta de Apetite, também, foi sempre consi- derada como indesejavel, do que se pode deduzir que o apetite esta intimamente gado ao processo da digestio. Na fisiologia, tem sido feita mengiio da (assim- shamada)'® estimulagao psiquica das glindulas salivares @ gistricas, Deve-se ressaltar, entrctanto, que a estimulagao psiquica das glindulas gdstricas nao foi ** A expresso "asvim-chamada” foi ullizaca aqui para soeniwar que Pavlov usou @ lermo psiguien come ‘étulo, mais proprismente que para wma explieacdo des fendmenos que tequeriam investipagies sistem ftican, 10 PAVLOV recomhecida universalmente, e, de um modo geral, a papel especial da estimulagfo psiquica no processamento do alimento no canal digestive nao tem encontrado o devide reconkecimento. Nossos estudos nos forgaram a levar adiante essas influéncias. © apetite, a ansia pela alimentagao, é um estimulo constante ¢ poderoso para as glandulss gistrieas, Nao hd cdo no qual uma habilidosa provocagao com ali- mentos nao produva uma consideravel secregiio de suco no até ent3o vazio e inati- vo estémago. A simples visio da comida, animais nervosos ¢ excitaveis segregam centenas de centimetros aibicos de suco gastrico, enquanto que o animal calmo ¢ quieto segrega apenas alguns poucos centimetros, Mudando a experiencia de maneira definida, uma secregdo extremamente profusa de suco ¢ observada em todos os animais sem exces%o. Tenho cm mente as experiéncias anteriormente descritas com alimentaggo simulada, quando a comida nao pode ir da boca para © esiGmage. Uma andlise muito completa e freqiientemente repetida dessa expe- riéneia convenceu-nos de que, nese caso, a seeregao de suco no pode ser consi- derada como sendo a resultado de uma estimulagao reflexa simples, da boca garganta pelo alimento ingerido, Qualquer substancia quimica irritante pode ser introduzida na boca de um cao operado dessa forma, e ainda assim aestimulagao nao produsira a secregéo mesmo de uma tinica gota de suco gastrico, Disso se pode conchiir que a cavidade oral é estimulada no por todas as substncias qui- micas, mas apenas por substancias especificas contidas no alimento ingerido. Entretanto, observagdes continuas nite confirmaram essa suposigao, A agiio de um Unico alimento, como um estimulo glandular, difere, dependendo de se 0 al mento foi comido pelo animal com avidez ou com contrariedade. em obediéncia. Geralmente, € observado o seguinte fendmeno invariavel; cada tipo de alimenta ingerido pelo cao durante a experiéncia atua como um forte estimulo'’ apenas quando esti de acordo com o gosto do e&o,'* Devemos admitir que, no ato de comer, 0 apetite serve como um poderoso e constante estimulo. Provou-se ser excepcionalmente grande 0 significado fisiclégico desse suco, que denominamos suco do aperite, Se nds introduzirmos pio no estémago do do através de uma sonda metalica, de forma a ¢' que cdo o perceba, isto ¢, jem estimular seu apetite, o pio permanece no estémago, sem mudangas, por uma hora inteira, sem provocar mesmo a menor secrecdo de suco, j4 que faltam as substancias que estimulariam as glindulas pastricas. Mas quando 0 mesma pio & devorade pelo animal, 0 suco gastrico segregado neste caso, isto é, 9 seo do ape- tite, exerce uma influéncia quimica sobre as substdncias protéicas do pia, ou, na terminologia popular, digere-o, Algamas das substancias obtidas da proteina sub- metida @ essa mudanga atuam por sua vez sobre as glindulas gastricas como esti- mulos independentes, Desse modo, elas continuam 9 trabalho iniciado pelo pri- "Isto é, um forte estinnto para n seceapiia da-suca pice, "Ou melhor, (...) “quand assim parece ao observader estar de acordo cam o'gostb do eo", TEXTOS ESCOLHIDOS ul meiro cstimulo, o apetite que agora, no curso normal das coisas, esti regredindo. '# No deeoirer do nosso estudo das glindulas gastricas. ficamos convencidos de que o apetite atua mao apenas como um estimulo geral para as glandulas, mas que ele também estimula as mesmas em um grau variado, dependendo do objeto para o qual ¢ dirigido. Para as gldndulas saitvares a regra estabelece que todas as variagoes de sua atividade, observadas nas experiéncias fisioldgicas, sdo exata- mente duplicadas nas experiéncias com estimulagdo psiquica, isto é, naquelas experiénctas nas guais o objeto dado nao é levado ao contato direto da membrana mucosa da boca, mas atrai a aten¢do do animal a disténeia.'* Por exemplo, a visio do pio seco provoca uma sccregio de saliva mais intensa que a visio da carne, embora a carne, julgando pelos movimentos do animal, possa excitar um interesse mais vivo. Ao mostrar-s¢ a carne ao cio. ou qualquer outra substincia comestivel, uma saliva altamente concentrada brota das glandulas submaxilares. A visio de substincias desagradiveis, ao contrario, produz uma sectegiio de sali- va muito fluida das mesmas glandulas. Em uma palavra, as experiéncias com esti- mulagiio psfquica provam ser modelos exatos, porém miniaturas, das experiéncias com estimulagdes fisioldgicas pelas mesmas substincias. Assim, com respeito ao trabalho das glindulas salivares, 2 psicologia ocupa um lugar proximo dagucle ocupado pela fisiologia. Mais quc isso! A primeira vista, o aspecto psiquico dessa atividade das glan- dulas salivares parece mesmo mais incontrovertivel que o fisiolégico. Quando qualquer objeto que atrai a atengao do animal a distancia produz secrecao salivar, tém-se todos 05 motivos para se admitir que esse é um fendmeno psiquico ¢ allo fisiokbgico, Quando, entretanto, a saliva comega a bratar depois que 0 cio ingeriu algo, ou substiincias foram introduzidas a forga em sua boca, é ainda necessario provar nesse fendmeno a presenga de uma causa fisiolégica, para demonstrar que nao é de carter puramente psiquico, reforgado devide as condigdes cspeciais que © acompanham, Essa concepgio parece bem verdadeira, ja que, depois do rompi- mento de todos os nervos sensoriais da lingua, a maioria das substancias que en- ‘Fam na boca, pelo processo de alimentagao forgada, provocam, por estranho que parega, a idéntica agio pré-operatéria das glandulas salivares. E necessério ir mais adiante erecorrer a medidas mais radicais, como envenenar o animal ou des- truir as partes superiares do sistema nervoso central, a fim de ficar-se convencido de que entre substincias que estimulam a cavidade oral e as glindulas salivares ha nao apenas uma relacdo psiquica, mas também fisioldgica. Assim, temos duas sé- ries de fendmenos aparcntemente diferentes. Mas como deve o fisidlogo conside- rar os fenémenos psiquicas? £ impossivel desconsiderd-los porque eles estiio em estreita ligagio com os fendmenos puramente fisiolégicos no trabalho das glindu- las digestivas com o qual estamos ocupados. E se o fisilogo pretende prosseauir seu estudo delas, ele se defronta com esta questdo: Como? “4 0 emprego por Paviow da termo apetite (de feorda com ofta wi akagiwil nie parece ear em afinidade com sau habitual rigor clenficn, Implica gue é uma espicie de eatidade que tanto estimmule quanto € estimulada, mas 0 referente do tarmo ndo ¢ operacionalmente especificaco. ** Tuilicos do citar, 12 PAVLOV Desde que bascamos nossa abordagem na experiéneia adquirida por nos com Os Tepreseatantes organizados inferiares do reino animal, ¢, naturalmente, deseja- mos permanceer fisidlogos ao invés de nos tornarmos psicilogos, preferimos man- ter uma atitude puramente objetiva com relagiio aos fendmenos psiquicos em nos- Sas experiéncias com animais. Acima de tudo. tentamos disciplinar nosso pensamento ¢ nossa linguagem com a finalidade de ignerar o estado mental do animal. Limitamos nosso trabalho a completa observagiio ¢ exata descrigio da influencia exercida por objetos distantes na secreeiio das glindulas salivares. Os resultados corresponderam As nossas expeciativas — as relagGes entre os fendme- nos externas ¢ as variagdes no trabalho das glandulas podium entao ser sistemati- adas; clas provaram ser de cardter regular, jd que podiam ser reproduzidas & vontade. Para nossa grande alegria. vimos por nés mesmos que haviamos tomado © caminhe certo em nossas observagies, sendo levaidos ao éxito. Citarei alguns exemplos ilustrando os resultados obtides por nés com a ajuda desses novos métodos. Se 0 cio for repetidamente estimulade com a visio de objetos que induzem a secregao salivar a distancia, a reagio das glindulas salivares se torna mais fraca ¢ finalmente cai a zero. Os intervalos mais curtos entre estimulagGes separadas fazem com que a reagao atinja mais rapidamente o grau zero, e vice-versa, Essas regras sio manifestadas intciramente somente quando as condigges das experién- cias siio inalteradas. A identidade de condigdes, entretanto, pode ser apenas de um carater relative; pode ser restringida apenas aqueles fendmenos do mundo externo que foram previamente associados com o alo de ingerir ou com a introdugao for ¢ada de substincias correspondentes na boca do animal; a mudanga de outros fendmenos nao teria signifiedncia, Essa identidade ¢ facilmente atingida pelo experimentador, de forma que um experimento, no qual um estimule aplicado repetidamente a distancia perde gradualmente seu efeito, possa Scr prontamente demonstrago no curso de uma conferénein. Se numa estimulagao, repetida @ distineia, uma certa substiincia se torna ineficiente, isso néo significa que a influéncia de outras substincias esta por isso eliminada, Por exemplo, quando o leite para de cstimular as glandulas salivares, a ago do pio permanece fortemente ficiente, e quando 0 po perde seu cfeito, devido a repetigao da estimulagao expe rimental, © deido ou outras substincias produzem ainda agio completa nas glan- dulas. Essas relagGes também explicam o real significado da identidade acima mencionada das condigdes experimentais. Todo detathe dos objetos circundantes surge como um novo estimulo, Se um certo estimulo perdeu suo influéncia, cla pode ser restaurada somente depois de um descanso de muitas horas. Entretanto, 4 agiio perdida pode ser restaurada sem falha, a qualquer momento, por meios especiais. Se 0 pao, mostrado repetidamente a0 c&o, nao estimula mais suas glindulas salivares, ¢ necessario apenas deixar 0 animal comé-lo ¢ 0 efeito do pao colocada a distancia sera inteiramente restaurado. O mesmo resultado é obtido quando ¢ dado 90 ¢0 algum outro alimento. Mais que isso. Se uma substincia que produz uma secregdo salivar, acide por exemplo, for introduzida na boca do cao, ainda entdo © efeite distante original do pao sera restaurado. De um modo geral, tudo 0 que estimula as glindulas salivares restaura a reagdo perdica: quanto maior sua atividade, mais completamente sera restaurada. Entretanto, a reagao pode ser inibida com a mesma regularidade por certos meios artificiais, se. por exemplo, alguns estimulos extraordinarios aruarem sobre 9s olhos ou ouvidos do cio, provocando nos tiltimos uma forte reagao motora, digamos, um tremor de todo o corpo. Como 0 tempo é curto, eu passarci para uma consideracdo tebrica dessas experiéncias. Os resultados obtidos por nds con- dizem inteiramente com nosso pensamente fisiolégic. Os efeilos produzidos pelos estimulos que atuam a distincia podem certamente ser denominados ¢ consideradas reflexos. Uma observacio cuidadosa mostra que. neste tipo de refle- xO, a atividade das glandulas salivares é sempre excitada por certes fendmenos externos, que, coma 6 reflexo salivar fisioldgico comum, & causada por estimulos externos. Mas, enquanto o ultimo emana da cavidade oral, o primeiro vem dos olhos, olfato, etc. A diferenga entre 08 dais refiexos € que nosso velho reflexe fisio- légico € constante ¢ incondicionado, enquanto o novo reflexo esta permanente- mente sujeito 4 flutuagao, ¢ é, portanto, condicionado.' * Examinando os fendme- nos mais de perto. podemos ver a seguinte distingdo essencial entre os dois reflexos: no reflexo incondicionado, as propricdades da substincia awam como estimulo com 0 qual a saliva tem que lidar fisiologicamente, por exemplo, dureza, secura, propriedades quimicas: definidas, etc.: nos reflexos condicionados, pelo contrario, as propriedades da substaacia que atuam como estimulo nao tém rela- ao direta com 0 papel fisiolégico da saliva, por exemplo, a cor, ete, Essas dltimas propricdades surgem aqui como sinais das primeiras. Nao podemos senao notar, em sua agdo estiladora, uma adaptagao mais ampla e mais delicada das glandulas salivares aos fendmenos do mundo externo. S aqui um exemplo: estamos prontos para introduzir dcido na boca do clo: pela imtegridade da membrana mucosa bucal, ¢ obviamente desejavel que, antes que o acido pencire na boca, haja nela mais saliva: por um lado, a saliva impede 9 contato direto do Acido com a membrana mucosa e, por outro, dilui imediata- mente o Acide, enfraquecido assim seu efeito quimico prejudicial, Entretanto, em esséncia, os sinais tém apenas um significado condicional: por um lado, eles estio Promtamente sujeitos & mudanga, ¢, por outro, os objetos sinalizadores no podem entrar em contato com a membrana mucosa da boca. Conseqiientemente, a me- Thor adaptagao deve consistir no fate de que as propriedades dos abjctos sinaliza- dores estimulem agora as glindulas salivares, ¢ outras vezes, nao, E isso é real- mente 0 que ocorre, Qualquer fendmeno do mundo externo pode temporariamente ser feito sinal do objeto que estimula as glandulas salivares, desde que a estimulagdo da mem: 1 sCondicional” de asorde com o Ls, Gantt, 6 lgtmo enprepedo eriginalrnente por Pavlov ¢ fod presen Yyedo-em runeSs € alemilo pela tradugis. “Condictomads” xe tornos: cor vencional sit portugaés cmbura © term original de Paviow parega mais apropriade: isu & tende a enfatizar quic o cstebelecimence da nowa rebar «gle catimulerresponta krefleca) é contingente ou condicional sabre w oeoerénein de vertas eventos necessérios, 14 PAVLOV brana mucosa da boca pelo objeto tenha sido associada, uma ou mais vezes, com @ agao do fen6meno externo determinado em outras areas Teceptoras da superficie do corpo. Em nossso laboratdrio estamas tentando muitas com binagdes altamente paradoxais: ¢ @ experiéacia est sendo bem sucedida. Por outro lado, sinais pron- lamente ativos podem perder seu efeito estimulador, se repetidos por um longa periods sem levar o objeto correspondente a0 contato com a membrana mucosa da boca. Se é mostrado alimento comum ao cdo por dias ¢ semanas, sem the ser dado a comer, entao a visio da comida cessara. finalmente, de produzir secregiu salivar, O mecanismo de estimulagao das glandulas salivares através das proprie- dades sinalizadoras dos objetos, isto € o mecanismo de “estimulagao condiciona- da”, pode ser facilmente concebido, do ponto de vista fisiolégieo, como uma fun- 80 do sistema nervoso, Como acabamos de ver, na base de cada reflexo condicionado, isto ¢, de estimulagao através das propriedades sinalizadoras de um objeto, ha um reflexo incondicionado, isto é, uma estimulagdo através dos atribu- fos essenciais do odjeto. Assim, pode-se supor' ® que o ponto do sistema nerveso central que é fortemente estimulado durante o reflexo incondicionado atrai para si estimulos mais fracos procedentes do mundo externo para outros pontos do siste- ma nervoso central, isto é, gragas ao reflex incondicionado ha um caminho aber- to para todes os outros estimulos externos, levando ao ponto central desse reflex. AS condigées que influenciam a abertura ¢ fechamento do caminho constituem 0 Mecanismo interno da eficiéneia ou ineficigneia das propriedades sinalizadoras dos objetos externas: elas so a base fisiolégica da mais delicada reatividade da substincia viva, da mais delicada adaptagdo do organismo animal, £ minha firme convicgao que a pesquisa fisiolégica avangard cam sucesso ao longo das linkas que esbocei aqui. De fato, apenas uma coisa na vida tem um interesse verdadeiro para nos — Nossa experiéneia psiquica. Mas o seu mecanismo foi ¢ permanece ainda coberto de mistério. Todos os recursos humanos — arte, religiao, literatura, filosofia, & ciéncia histérica — se combinaram para langar a luz nessa escuridio, O hamem tem a sua disposicao ainda um outro recurso poderoso — a ciéneia natural com seus métodos estritamente objetives, Essa ciéncia, como todos sabemos, esti fazendo grandes avangos todos os dias, Os fatos e consideragdes que thes coloquei sio tipicos das numerosas tentativas de empregar um meétoda de pensamento consistente, puramente cientifico, no estudo do mecanismo das manifestagies vi- tais superiores no cao, o representante do reino animal que é0 melhor amigo do homem. “8 Esta suposigio — como muitas das especilagdex de Professor Peviov tobre o que aonteve denna de sls tema nervosio — ao é um fro compravado, Tl A PSICOLOGIA E A PSICOPATOLOGIA EXPERIMENTAIS DOS ANIMAIS* Sendo a linguagem dos fatos a mais elogiente, eu me permito passar, direts- mente, aos dudos experimentais que me autorizam a falar a respeita do objeto escolhido para a minha dissertagao. Ides ouvir como um fisidlogo foi levado a passar de questées puramente fisiolégicas para 0 dominio dos fendmenos habituaimente denominadas psiquicos, Embora inopinada, essa transigfo ocorreu naturalmente ¢, 0 que me parece ser 0 mais importante, sem mudanga dos prineipios metadolégicos. Durante muitos anos, cu me ocupei da atividade normal das glandulas diges- tivas e, analisando as condigdes permunentes das suas fungées, deparei com ele- mentos de ordem psiquica que ja tinham sido mencionados por outros. Nao havia agnhuma razdo para deixar de lado essas condigées psiquicas, porque concor- riam, de modo permanente, para a boa marcha dos fendmenos considerados, Meu dever era ocupar-me delas, j4 que minha intengao era « de aprofundar 0 mais pos- sivel © objeto de meu estudo, Mas, instantaneamente, se apresentou uma questiio: de que modo? A exposigdo que segue é a resposta a essa questio, Vou deter-me, somente, numa parte de nassos dados, ou seja, as experiéncias efetuadas sobre as glandulas salivares. O papel fisiolégico deste érgao é, provavel- mente, muito restrito, mas se converter — estou seguro disso — no objeto chis- * Diswerse promuneiado per veasiio de uma dua reunider plonitias dla Congresso Mitticu Internacional, rea fizado em Mari, em abril de 1903, Publicado pela primeira ver mas Nouvelles de (Academe de atone ‘Militaire, 1903, pak 103, Depois de ter elahorada ox métodos de esuido das ceagiee reflexes do urpanisme eda seetego das elindulas digestivas. em um animal praticémente win, Paview, cm sims obras a rexpcito da digestio, vin mencionado J8 9 possibiidade de uma “secregio. psuica”. ao lady da seeregiy prowess por faery puramene fisiol6gices. Por vota dos ditimos anos da daceda de 90, Pavlov empreendet 0 estedo experimental da mecanismo da “se regia priguica”, 0 célebre discurvo dy Madi comprecads 0 programa miximo que © genial eriador da doutrina da atividade 6 YO superior 9¢ havia proposio realizar © que se puis a camprir, com perseverange, no curso dos wrist leés unos soguintes de atividade clemtifica. A atitude materialisia de Pavlov em celagdo aos fenndmmenos psigui- cox manifesta-se claramente aesse discurso: ele considera © pskquisme sob um ponto de vista biokigico « evolucionista, rejeitande o§ potas de vista "mecano-tisica” e wicalista Nests diseorso, foram oprssenindas, pola primeirn vez, as definigies de reflex comdivionade e reflexo incom Ecionado, (Nots dos Edltores Usrangeiros,) 16 PAVLOV sico dum dominio de investigages novas, cujos primeiros ensaios tenho a honra de lhes expor, parcialmente realizados ¢ parcialmente projetados. Quando se observa a atividade normal das glandulas salivarcs, é inipossivel que © ¢xperimentador nao se surpreenda com o alto grau de sua adaptagdo funcio nal. Dando-se a0 animal alimentos sdlidos e secos, a saliva corre em grande quan dade: dando-lhe uma alimentagdo rica em dgva, haverd uma secregio salivar muito menor. Evidentemente, « degustagao quimica dos alimentos, sua mastigagao ¢ a for- magao de um bolo alimentar deglutivel exigem a presenga de gua, que é propor- cionada pelas glandulas salivares. Uma saliva rica em mucina & derramada pelas glindulas salivares de muco sobre todos os alimentos ¢ se constitui em um ele- mento lubrificante que facilita 9 caminho dos alimentos até o estimago. A saliva &, igualmente. derramada sobre todas as substincias cuja agdo quimica é irritan te: cides, sais, ete, A quantidade e a composi¢o da saliva dependem do grau de irritago produzida por esas substancias. Trata-se, com efeito, de neutraliza-las, de dilui-las ¢ de lavar a boca com ela, como é demonstrado pela observagiio diu- turna sobre nds mesmos. As glandulas salivares segregam, neste caso, uma saliva aquosa, pobre em mucina, Com efeito, para que serviria a mucina nessas condi- ses? Se metermos na boca de um cdo alguns calhaus limpos, de quartzo inschi- vel, 0 co os revolve em sua boca, procura mastiga-los e, finalmente, os pde fora, Nenhuma salivacda, ou, no maximo, uma ou duas gots. Para que serviria, neste caso, a saliva? As pedrinhas sio langadas fora da boca do animal sem deixar nada atras delas, Ponhamos, agora, arcia na boca do cio, ou seja, o mesma pedre- gulho reduzido a uma forma mitida ¢ fragmentaria; 0 cho segregara muita saliva. E facil de ver que, sem saliva, sem derramamento de Nquide na cavidade bucal, a arein no poderia ser expelida, nem conduzida ao estémago. Estamos em presenga de fatos precisos ¢ constantes, fatos que parecem demonstrar uma espécie de discernimento, Entretanto, o mecanismo desse discer- nimento ¢ claro como a luz do dia, A Fisiologia dispde, com efeita, desde hit muito, de dadas sobre os nervos centrifugos das glindulas salivares, que nio 9} fazem-nas segregar uma saliva rica em igua, como também com que ela seja enti quecida com substincias orginicas especiais. Ademais, a parede interna da cavi- dade bucal apresenta zonas que possuem uma irritabilidade especial diferente, meciinica, quimica, ou térmica. Estas espécies de irritabilidade se subdividem por sua vez, como, por exemplo, a irritabilidade quimica se divide em sensibili- dade aos ficidos, aos sais, etc. Outro tanto se pode supor em relagdo a irritabi- lidade meeinica: nervos centripetos especinis partem dessas regides dotadas de irvitabilidade expecifica, Deste modo, um simples ato reflexo estd na base das adaptagdes, ato que tom, em sua origem, certas condigdes exteriores que exercem a sua gio sobre um grupo determinado de terminagdes aferentes, donde uma excitaglo se propaga, Por intermédio de uma via nervosa apropriada, até a glindula, na qual se origina um trabalho definido, Noutros termos, temos uma influéncia exterior especifica

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