D. João V era um amante dos prazeres humanos, a figura real é construída através do olhar crítico do narrador, de forma multifacetada:
é o devoto fanático que submete um país inteiro ao cumprimento de uma
promessa pessoal (a construção do convento, de modo a garantir a sucessão) e que assiste aos autos-de-fé;
é o marido que não evidencia qualquer sentimento amoroso pela rainha,
apresentando nesta relação uma faceta quase animalesca, enfatizada pela utilização de vocábulos que remetem para esta ideia (como a forma verbal" emprenhou" e o adjectivo "cobridor");
é o megalómano que desvia as riquezas nacionais para manter uma corte
dominada pelo luxo, pela corrupção e pelo excesso;
é o rei vaidoso que se equipara o Deus nas suas relações com as religiosas;
é o curioso que se interessa pelas invenções do padre Bartolomeu de Gusmão;
é o esteta que convida Domenico Scarlatti a permanecer em Portugal;
é o homem que teme a morte e que antecipa a sua imortalidade, através da
sagração do convento no dia do seu quadragésimo primeiro aniversário.