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Mário Simões
Licenciado em Antropologia e Medicina
Psiquiatra – Professor de Psiquiatria da FML
Sumário
O autor define a Parapsicologia como uma disciplina científica e explicita alguns dos
seus fenómenos. Tece reflexões críticas sobre a fenomenologia dita anómala ou "psi" e
conclui pela existência insofismável daquela, continuando por explicar, na sua totalidade,
como se processam e para que servem. Alguns dados sobre estes aspectos são
descritos e discutidos.
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*Manuscrito revisto e ampliado da Conferência proferida na Sociedade de Ciências
Médicas de Lisboa, em 23.03.1001, comentada pelos Profs. Doutores Luis Sobrinho e
Alexandre Castro Caldas.
Mário Simões
Licenciado em Antropologia e Medicina
Psiquiatra – Professor de Psiquiatria da FML
Introdução
Numa obra recente, editada em Espanha, com vinte e três edições - Guia Prático de
Psicologia (Vigésima terceira edição!) - de Vallejo-Naguera (2000), com milhões de
leitores, escrevia-se, entre outras considerações, que o tema "Parapsicologia" era
polémico e escabroso. Estes dois termos pressupõem, que o tema em análise não é
pacífico e merece uma reflexão crítica.
Para um mínimo de conhecimento de algo deve existir um envolvimento, seja pela sua
prática seja pela dedicação ao seu estudo crítico. Não existindo a profissão de
parapsicólogo, pois são profissionais de outras áreas (físicos, psicólogos, sociólogos,
etc.), que se dedicam ao tema, também não é pela leitura de literatura especializada,
que alguém se transforma num profissional dessa área. Por exemplo, não é lendo um
jornal, que se "fica" jornalista ou por estar na bancada de um campo de futebol, que se
"fica" futebolista. Serve esta introdução para corrigir o que jocosamente alguns designam
por parapsicólogos, parapsiquiatras ou parasociólogos - os profissionais de outras áreas
que se dedicam ao estudo deste tipo de fenómenos.
Na verdade, este assunto tem sido estudado, desde há muito, de um ponto de vista
científico. Talvez não de início, com uma metodologia científica standardizada tal como
actualmente, mas há mais de cem anos, que a Society of Psychical Research
(www.spr.ac.uk) se dedica ao estudo destes assuntos e, pode dizer-se que, a sua revista
oficial tem um elevado nível científico, com peer review crítico em relação à metodologia.
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Uma outra sociedade mais recente, americana – Society for Scientific Exploration
(www.scientificexploration.org) - tem-se dedicado a publicações nesta área – nos últimos
vinte anos, com um nível altamente elevado e outras publicações e instituições,
respectivamente, começam a aceitar artigos ou a apoiar investigação sobre estes temas.
Alguns livros de texto de Psicologia recomendam sites na net tais como
http://www.ed.ac.uk/~ejua35/parapsy.htm e http://www.psiresearch.org/para1.html para uma
primeira abordagem ao tema (Hayes, 2000). Começa, pois, a ser algo que merece o
interesse da Ciência.
Um exemplo deste interesse é traduzido num outro livro de texto de Psicologia, utilizado
amplamente nos Estados Unidos da América – Hilgard's Introduction to Psychology - de
Atkinson et al (1996), um clássico da psicologia com mais de vinte anos, com várias
edições, que dedica a este assunto, vinte páginas. É um contraste, por exemplo, com os
livros recentes de Psiquiatria, onde, na última edição, nem uma única entrada tem para a
palavra Parapsicologia, enquanto que há vinte anos, lhe era dedicado um capítulo de
cerca de oito páginas. Talvez não signifique desinteresse, mas tão só que o
parapsicológico não seja um assunto paranormal, no sentido de doença. Seria sobretudo
do domínio da psicologia, isto é de sujeitos normais, que têm outro tipo de capacidades e
por isso cabem melhor num livro de Psicologia do que num livro de Psiquiatria. Um livro
de texto, universitário, mais recente, de 2000, “Foundations of Psychology" (Hayes, 2000)
dedica vinte e cinco páginas ao tema, num capítulo intitulado “Consciência e seus
Estados Modificados ou Alterados”; no qual se abordam assuntos como a meditação,
hipnose e os fenómenos Psi.
Em Portugal, a Fundação Bial, tem sido a única instituição, que tem dado apoio ao
desenvolvimento e investigação nesta área. Trata-se de um apoio substancial, pois
recentemente, num curso sobre Métodos de Investigação e Ciência, na Faculdade de
Medicina de Lisboa, um quadro apresentando o dinheiro que era dado para diferentes
áreas de Investigação, mostrava que a Fundação Bial ultrapassava em subsídios para a
parapsicologia e psicofisiologia qualquer outra área e era com uma certa estranheza, que
o comentador dessa sessão dizia: “Como é possível dar tanto dinheiro para a área da
Parapsicologia?”. Talvez não seja de estranhar se se souber, que a Fundação Sony deu
já muito mais, quatro ou cinco vezes mais para investigação nesta área e que a própria
CIA dispendeu milhões de dólares com o mesmo objectivo. Um estudo recente sobre o
conteúdo de artigos em relação com os temas da parapsicologia, na base de dados de
caracter médico MEDLINE, mostrava como o número de artigos nesta área tinha crescido
significativamente entre 1987 e 1993 (Fassbender, 1993).
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informação e ou energia cinética, entre aqueles entre si ou com objectos - não
correntemente explicáveis dentro dos paradigmas habituais de tempo, espaço e energias
conhecidas.
Trata-se de uma disciplina científica, mas ainda não de uma ciência, pois, apesar de
utilizar as regras do método científico, ainda não possui um método próprio, que cada
Ciência usa. Naturalmente, possui um objecto próprio. Por outro lado o seu objecto não
se refere apenas a fenómenos de experiência humana denominados fenómenos “psi
anómalos”, mas também animal. A expressão surge entre aspas pois não corresponde à
lógica e paradigmas Kantiano e Newtoniano, colocando-se para além do que é o
princípio da causalidade, da sequência temporal e da contradição e não se inscreve em
paradigmas estrita e fisicamente orientados. São, por isso, duplamente excepcionais, por
um lado, porque só raramente se verificam, por outro porque não têm uma explicação de
acordo com os paradigmas acima referidos. Parece tratar-se de interacções, melhor,
processos de troca de informação ou energia de tipo cinético entre humanos entre si e ou
animais ou com objectos. Dentro do estudo da Parapsicologia cabem, também,
interacções entre seres humanos e objectos, não convenientemente explicadas pelos
paradigmas habituais, que incluem o tempo, espaço e energias conhecidas. Quais são,
então, os fenómenos que a Parapsicologia estuda? Estuda três categorias de fenómenos
- Psi-Gama, Psi-Kappa e Psi-Teta. Entre os Psi-Gama incluem-se os fenómenos de
Telepatia, Clarividência e Précognição; entre os Psi-Kappa os fenómenos de
Telequinésia - Micro e Macro - ex. RSPK (recurrent spontaneous psychokynesis),
"poltergeist" (espírito barulhento), DMILS (distant mental influence in living systems) -
estas siglas, traduzem a denominação anglo-saxónica e respectiva fenomenologia e
serão explicitadas adiante e os Psi-Teta, tais como experiências fora do corpo (OBE - out
of body, em inglês), experiências próximas da morte (NDE - near-death-experience, em
inglês) e, recentemente, fenomenologia ligada à hipótese, melhor, teoria dos
renascimentos sucessivos.
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Poltergeist, cuja palavra alemã designa um “espírito ruídoso”, que bate, que dá
pancadas, que é capaz de produzir fenómenos tão estranhos, como parapirogenia –
eclosão espontânea de fogo. Outro tipo, macroscópico, de fenómenos é designado pela
sigla DMILS (Distant Mental Influence on Living Systems) - quer dizer, a possibilidade do
ser humano actuar, à distancia, sobre sistemas vivos, através da mente, sem outros
meios físicos. É a palavra-sigla moderna para utilizar nesse tipo de acção.
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Ciências da Saúde. Será possível fazer cura à distância, naturalmente, fazendo apelo à
fé? Há alguma evidência surpreendente recente e publicada em livro (Plante & Sherman,
2001). Mais estranhos são os casos de cura obtidos por curadores no Brasil, sem
assepsia nem anestesia, e analisados em livro pelo professor de antropologia Greenfield
(1999) e que se inscrevem na fenomenologia DMILS.
Como ilustração das experiências fora do corpo e das experiências de quase morte refira-
se um quadro de Bosch, do tempo do Renascimento, e que teria sido pintado por ele,
porque ele próprio teria tido uma experiência semelhante ou alguém lha descreveu.
Durante uma anestesia ou em situação de morte clínica, por vezes, a pessoa "sai" fora
do corpo, vendo-se de cima, estendido na cama. Estas situações começaram a ser
relatadas, sobretudo, em jornais de enfermagem ou trabalhos nesta área (Dias, 1995)
mas também de cirurgia. Uma revisão extensa do assunto encontra-se em Simões (1998)
sendo referenciados por este autor, artigos publicados, por exemplo, no British Journal of
Psychiatry, British Journal of Medicine ou Journal of Royal Society of Medicine.
Uma NDE pode descrever-se resumidamente: A pessoa vê o seu corpo de cima; pode
relatar, no final da operação conversas que ouviu; deslocar-se a longa distância "fora do
corpo"; em situação de morte eminente imaginada ou real surgem experiências no limiar
da morte em que apareceriam personagens angelicais ou outras já falecidas, que as
conduziriam para uma luz que se vê ao longe e, após um "julgamento" e "apêlo
emocional" dos familiares, regressariam. Trata-se, naturalmente, de uma descrição muito
sucinta e por isso se remete para Simões (1998), neste livro.
Têm sido objecto de várias publicações, recentemente, casuísticas que referem como
plausível a hipótese de reencarnação ou renascimentos sucessivos, na sequência da
clássica investigação sobre o tema, de Stevenson (1974). Prefere-se, actualmente, a
designação de renascimentos sucessivos, pois se considera, que o novo ser não é uma
"cópia" ou continuação de uma personalidade falecida. Tem individualidade própria,
embora se admita que exista uma expressão parcial da personalidade prévia e é por isso,
que mesmo em culturas onde a crença é comum, que as crianças são tratadas como tal,
embora possam ser "reencarnações" de seres muito evoluídos ou de grande prestígio. A
evidência científica desta hipótese tem sido baseada não só em sinais, marcas ou
defeitos congénitos de nascença, comuns à personalidade falecida (Stevenson, 1997)
mas também de mémórias cognitivas e comportamentais (Pasricha, 2001).
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psicodinâmicas, inclusivamente recorrendo à psicopatologia para os explicar, como
ilusão, alucinação, etc.
Estudos de Ganzfeld
Por outro lado verificou-se, que nestas situações de ganzfeld, estes fenómenos, ditos
Psi, se manifestam mais regularmente em estados de relaxação, sono, hipnose e de
deprivação sensorial, isto é, estados onde a consciência fica modificada em relação ao
estado de vigília (Simões, 1997a) e nos quais a "atmosfera motivacional" (Psi-conducive)
contribui para a sua manifestação. Essa atmosfera motivacional consiste num ambiente
agradável (setting), um acolhimento caloroso das pessoas e uma vontade de sucesso na
experiência.
Após algumas experiências que testaram estas varíáveis, chegou-se à conclusão, que
existem certas pessoas (sujeitos e investigadores), que terão sempre um desvio negativo
porque não estão predispostas para aceitar o fenómeno Psi. É como se houvesse uma
influência do sobre o fenómeno a ser observado. Estudos de Harris e Rosenthal (1988) e
de Morris et al (1993) têm demonstrado esse aspecto e têm replicado, que o investigador
é susceptível de influenciar o fenómeno. Algo semelhante ao que se conhece da Física
Quântica, isto é, que o observador interfere com o próprio fenómeno.
Reflexões Críticas
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Algumas reflexões críticas perante o exposto foram já abordadas, em parte, por Simões
(1997a) e são, sobretudo, relacionadas com a replicação e ou com a previsibilidade dos
resultados. Note-se, no entanto, que a previsibilidade, em algumas ciências, é baixa ou
irregular, como por exemplo a meteorologia. Considera-se que ambos os aspectos
referidos fazem parte das condições científicas, pelo menos em termos de “ciências
exactas”. Ora, as pessoas (e fenómenos a elas associados) não conseguem replicar a
cem por cento em laboratório o que tinham feito ou tinham dito antes e também não se
pode prever, com segurança, o que se vai verificar. Trata-se de uma situação semelhante
ao dos estudos com placebo. Prevê-se que o placebo não tenha efeitos secundários e,
na verdade, surgem, por vezes, mais efeitos secundários no placebo, que no produto
activo (Moerman, 1981). Ou ainda, também semelhantes às situações ligadas a reacções
imprevisíveis em situações do dia-a-dia, sendo exemplo disso os programas de TV, do
tipo da "câmara escondida". No fundo, a imprevisibilidade é uma característica do ser
humano "normal", pois se se tratar de um paciente, com uma síndroma caracterizada, as
suas reações tornam-se previsíveis em certos contextos. Ora, se a imprevisibilidade é
uma observação vulgar quotidiana, mais difícil se torna ser previsível numa situação onde
as experiências são ditas duplamente excepcionais - pela sua raridade contextual e pela
produção ligada a pessoas, elas também de "excepção" (Lucadou, 1990). Por outro lado
exige-se duplamente - por um lado que se utilize o método científico das ciências
exactas, por outro que os resultados sejam incontroversos (replicáveis e previsíveis a cem
por cento), o que nem as ciências ditas humanas e sociais exigem, ficando-se por uma
margem de exclusão do acaso para uma probabilidade de erro menor que 0.05 por
cento.
Sabe-se, por outro lado, que as capacidades excepcionais não têm elevado nível de
consistência. É do conhecimento geral que um futebolista, um atleta ou mesmo um
jogador de xadrez excepcionais não podem ter sempre performances excepcionais.
Campeões de xadrez, perdem, às vezes, em campeonatos simultâneos com
principiantes. Portanto, não só estas faculdades já são consideradas excepcionais como
também se encontram associadas a pessoas de excepção - são contextos duplamente
excepcionais. Assim, dado que não apresentam elevado nível de consistência no tempo,
tem de se entrar em linha de conta com a força do efeito a estudar.
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Este tipo de dificuldades leva a que autores, como por exemplo James Randi (1986), um
autor dedicado às “artes mágicas” e de palco – muito conhecido na América – escreva
livros, artigos e edite mesmo uma revista - Skeptical Enquirer - em que tenta demonstrar,
com truques práticos, que o fenómeno parapsicológico não existe, e que tudo não
passaria de fraude. Ele chega mesmo a oferecer um milhão de dólares a quem, nas
condições que ele propõe, seja capaz de produzir psicoquinese à frente dele. Pode
argumentar-se, pela contrária, que nas condições propostas pelos investigadores do
fenómeno PSI, quando ele se verifica, também Randi não conseguiria executar a
simulação daqueles, por meio de truques. Algumas condições de reprodutibilidade já
foram tratadas e outras serão analisadas adiante.
Também deve ser tida em conta a possibilidade de fraude e, portanto, que qualquer
equipe que faça investigação nesta área deva possuir na sua constituição um “mágico de
palco”. Estes têm contribuído para a clarificação nesta área, excluindo, naturalmente a
fraude ou simulação (Randi, 1986; Wiseman, 2001). Deve excluir-se, ainda, a
possibilidade de explicação pelo acaso ou pelo cálculo de probabilidades, isto é, que não
se trate de uma coincidência. Esta deve distinguir-se da sincronicidade, conceito
cunhado por Jung (1952) e, no contexto deste artigo, definida como uma coincidência de
estados de consciência entre um emissor e receptor ou entre o estado de consciência
daquele e a matéria (Moisset, 1993), caso, p.ex., da psicoquinese. Neste sentido poderá
dizer-se que a palavra sincronicidade traduz uma coincidência de algo acausal entre si,
mas que no entanto apresenta um sentido ou intenção comum, que une os aspectos em
presença. Restam, por fim, explicações mais psicológicas para os fenómenos anómalos
tais como ilusão, imaginação e alucinação ou, ainda, que o facto de se ter acesso a uma
determinada informação não passará de uma criptomnésia - memória antiga real,
escondida, profundamente na mente e que num momento especial se evoca. Uma
hipótese que deve ser mencionada - super-psi - supõe uma habilidade extraordinária da
parte de certos sujeitos para obter informação de qualquer modo e em qualquer
circunstância, remetendo o fenómeno para uma explicação hipoteticamente naturalista,
mas nada acrescentando sobre a sua natureza.
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perguntas, neste contexto, que remetem mesmo para aspectos da sociologia religiosa,
interrogando-se se este tipo de manifestações tem algo de divino. Diga-se, desde já, que
esta fenomenologia, embora descrita em personagens de cariz religioso ou espiritual,
nada tem de divino e muito menos serve para atestar do desenvolvimento espiritual de
alguém. Refere-se, frequentemente, que Einstein teria dito, que "Deus não joga aos
dados", para, com isso, significar ou evocar a suspeita, que este tipo de fenómenos terá
leis, ainda, desconhecidas pela ciência. Cientistas da física quântica tentam,
teoricamente, descortinar uma racionalidade no paranormal, considerando que este não é
excluído da Física (Shoup, 2002). Falta, talvez, ainda, descobri-la, conhecê-la sob a
forma de leis naturais, ainda desconhecidas. Retomando e reformulando Einstein poder-
se-ia dizer, que Deus joga aos dados mas influencia-os num determinado sentido. A
epistemologia da Ciência não passa apenas pelas ideias ou mudança de paradigmas
mas também pela falta de instrumentação necessária para detectar e medir os
fenómenos ou para detectar um outro tipo de “organização” ou fisiologia mais subtil do
nosso corpo. Sirva de exemplo Pasteur, a este propósito, quando descreveu micróbios só
visíveis ao microscópio e foi ridicularizado, na altura, por aqueles que ainda não tinham
acesso aquele objecto de observação, dizendo, em tom jocoso, tergiversando o Corão,
que “O micróbio é pequeno e Pasteur o seu profeta”.
Outro tipo de crítica refere que apenas os resultados positivos são publicados, sendo
conhecida por file-drawer (ficheiros, de resultados negativos, na gaveta), isto é, só se
publicariam os bons resultados enquanto os outros ficariam na gaveta. Na realidade
passa-se o contrário pois são os próprios jornais de parapsicologia que pedem relatos de
estudos com resultados negativos. Também a comunidade científica de parapsicologia
promove uma p esquisa ativa para verificar a não replicação e tenta saber de resultados
negativos em congressos. Ainda, neste caso, a meta-análise estatística permite calcular o
número de estudos não publicados, que anulariam o significado estatístico obtido pelos
estudos positivos. Para os 28 estudos de ganzfeld positivos teriam de existir 400 estudos
na gaveta, o que corresponderia a 12 000 sessões para invalidar o valor estatístico
daqueles, não podendo ser explicado o sucesso pelo file-drawer (Honorton, 1985),
havendo, neste aspeto, acordo entre autores oponentes (Hyman e Honorton, 1986).
Relatos pessoais de autores prestigiados têm demonstrado o contrário, isto é, resultados
positivos não são publicados com receio do ridículo na comunidade científica. Remetem-
se para o silêncio ou para uma explicação pelo acaso, que será outro nome para se
referir ao desconhecimento de "leis", que regem aqueles fenómenos. Uma outra
formulação poderia remeter para a verificação que o fenómeno Psi depende de outras
variáveis, físicas ou não (p.ex. as já mencionadas "psi-conducive"), que confluem, naquele
momento excepcional, para a sua manifestação.
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A principal crítica científica ao fenómeno psi, admitida a sua possibilidade, é a sua fraca
reprodutibilidade em condições de controlo laboratorial (Schweizer, 1990) e já
parcialmente discutida. O fenómeno psi, p. ex. a telepatia ou a précognição, não pode
ser dependente nem do observador, nem da pessoa que o produz, seja porque ambos
acreditem (sheeps, na literatura anglo-saxónica) ou sejam descrentes (goats). O
fenómeno (o objecto da ciência) tem de existir por si e ser reproduzido nas condições,
que outros observadores descreveram. Entre as variáveis não físicas capazes de
influenciar a reprodutibilidade dos resultados, foram já detectadas algumas,
nomeadamente relacionadas com o sujeito e ou o experimentador. Existem correlatos
entre resultados e variáveis do sujeito e ou experimentador (sheep e goat) e ainda com o
setting. Citando vários autores, Hayes (2000) refere-se a variáveis susceptíveis de
aumentar a reprodutibilidade: 1. Atmosfera acolhedora do setting 2. Expectativa ou
motivação positiva do experimentador 3. Sujeitos que crêm no fenómeno (sheeps),
creativos ou praticantes de disciplinas espirituais. Perante estes dados verifica-se que
algumas pessoas (sujeitos e cientistas) são mais psi-conducive.
Em resumo, pode dizer-se que os resultados positivos não se devem ao acaso e fraude,
pois são desmentidos pelo cálculo estatístico e pela verificação de condições
experimentais em laboratório. No entanto o ceticismo continua, pois tem havido fraudes,
algumas não voluntárias, e que seria melhor designar por erros metodológicos e que têm
vindo a ser corrigidos. Por outro lado o ceticismo encontra-se ligado a um paradigma,
que considera estes fenómenos como "não podendo ocorrer" ou, na sua melhor
designação, como anómalos. Teria, pois, de haver uma mudança do paradigma da
realidade ou a admissão, que a lógica Kanteana (princípio da causalidade, sequência
temporal e contradição) e a física de Newton não se aplica a este tipo de fenómenos.
Continua-se perante um enigma sobre o acontecer e qual o sentido dos fenómenos Psi
apesar da consistência dos muitos resultados observados. Cada vez mais se interpretam
no contexto dos diferentes estados de consciência (Simões, 1997a) e devem ser
entendidos, também, como possíveis portas abertas para a consciência (Caldas, 2000) e
para um modelo integrativo dos fenómenos conscientes, inconscientes, de placebo e Psi
(Simões, 1996).
Dada a natureza dos fenómenos Psi parece não existir uma localização da mente/ Self/
consciência, isto é, a sua manifestação não depende do cérebro ou de outra parte do
corpo (Radin, 1999). Seria, pois, de entender a informação recebida ou transmitida como
imersa num Universo, que se assemelharia a uma grande "sopa cósmica". Qualquer
ação num dos seus constituintes afetaria o todo e, embora em graus diferentes, a parte
conteria o todo da informação a veicular. Aquela "sopa" seria o suporte de um tipo de
comunicação/ informação diferente da captada pelos sentidos. Seria como se a
informação, por vezes com carga cinética, tivesse propriedades de uma "quinta essência"
- um plasma (quarto estado da matéria, simultaneamente com propriedades dos gases e
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líquidos) especial, também com algumas características, embora em quantidade ínfima,
do estado sólido. Seja permitida uma expressão lúdica, para melhor explicitar a natureza
dessa informação - tratar-se-ia de um "ar líquido, que momentâneamente, em certas
condições, solidificaria"…
Perante o que se sabe, será de admitir, que os fenómenos "anómalos" testemunham leis
naturais, eventualmente universais, harmoniosas, ainda desconhecidas, pela inexistência
ou de um paradigma científico compreensivo e integrativo desta ordem de fenómenos ou
pela inexistência de instrumentação adequada para a sua explicação.
Conclusões
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Posição crítica individual
A minha posição individual reflecte uma das conclusões do I Simpósio da Fundação Bial
(Simões,1997b) - o futuro do conhecimento humano encontra-se na sabedoria da
incerteza - quer dizer que, se se fica satisfeito com as explicações actuais do acontecer
na realidade, não se farão novas descobertas. Sirva de exemplo o que há cerca de vinte
anos se aprendia sobre o tratamento da úlcera péptica, baseado em anti-ácidos e dietas
e o conhecimento actual sobre a inibição da bomba de protões e seus tratamentos
correlatos, bem como o papel da antibioterapia na erradicação do Helicobacter Pylori. Até
mesmo com as explicações actuais, o cientista não se deve dar por satisfeito e deve
tentar descobrir mais. É isto que quer dizer na sabedoria da incerteza.
Referências
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Hilgard's Introduction to Psychology (12th Edition). Harcourt Brace College Publishers:
New York
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Illinois Press. Chicago
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