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A ARTE DE VIVER DA ARTE


Manual para a autogestão de artistas plástic@s
Felipe Ehrenberg

@s artistas que prosperam são os que têm o coração na arte e os pés na terra.

Sea regular y ordenad@ en su vida para poder ser violent@ y original en su trabajo.
Gustave Flaubert
ÍNDICE

INTRODUÇÃO: @s artistas que prosperam são os que têm o coração na arte e os pés na
terra. página

1. O UNIVERSO QUE NOS RODEIA: Das circunstancias em que vivemos e das


maneiras em que se difunde a arte.
- Aceitando a crua realidade página

- Sobre os territórios das artes página

- O panorama das artes visuais página

- A infra-estrutura que nos apóia página

- Em busca de mais espectadores/as página


- O mundo íntimo que nos rodeia: Pessoal de Apoio – direto e indireto
página

- Pessoal de Apoio Direto (PAD) página

- Pessoal de apoio indireto (PAI) página


- Nosso público (agora sim): Públicos ativos (PA) e Públicos Passivos
(PP) página

2. OS ESPAÇOS PARA A PRODUÇÃO ARTÍSTICA: De o simples encontrar soluções


imediatas e mediatas para resolver nossos problemas de espaço.
página

- Quanto maior a produção, maior a projeção página


3

- As partes essenciais do ateliê ideal página

- Entre dizer e fazer hà que caminhar página


- Projeto integral/ergonômico em pequenas dimensões
página

- Dividindo espaços (civilizadamente) página

- Acordos práticos para a convivência página

3. OS TEMPOS DA PRODUÇÃO ARTÍSTICA: De quão simples é encontrar soluções


imediatas e mediatas para redesenhar os tempos disponíveis, necessários para produzir.
página

- Quando você sonha, quando você sonha? página

- A agenda de bolso página

- Ah, sim... pontualidade! página

- ...e o caderno de contatos página

- O calendário na parede página

- Cronologias regressivas página

- Tempos e temporadas página

-Os bloqueios página


4. ESTRATÉGIAS E TÁTICAS: De certas chaves contidas na historia da arte e no senso
comum (outra vez), onde, além disso, se fala de tomar “a Alternativa”.
página

- Medicina, tauromaquia e gastronomia? página

- O momento da decisão página

- Questão de graus página

- Quem falou de exércitos? página

- A chave para sobreviver e prosperar página

- Como conseguir bolsas, estímulos e residências página

- Cinco pontos para conseguir uma bolsa página

- Nunca desperdiçar esforços página


5. A TRANSIÇÃO DA PAIXÃO A PROFISSIONALIZAÇÃO: De como é
aconselhável educar-se em academias, mas também por caminhos não tradicionais
página

6. O HABITO SIM FAZ O MONGE: De usos e costumes e demais hábitos (maus e bons)
que nos fazem o que somos página

7. O INVENTARIO DE NOSSA OBRA: Sobre as muitas opiniões que nos dão, sempre e
quando saibamos quanta obra ter página

8. INFORMAÇÃO BIOGRÁFICA: Sobre as muitas vidas paralelas que levamos e como


não ficar confus@s nem confundir ninguém
página

9. NOSSO ARQUIVO E SUAS PARTES: De como criar os elos na cadeia da vida...


página

10. MANEIRAS DE PROTEGER-NOS E PROMOVER-NOS: De como a cortesia não


tira a audácia, e como tudo vale na guerra e no amor
página

11. FECHANDO ACORDO COM TERCEIROS: De como podemos incidir no mundo que
nos rodeia, funcionando como se deve
página

12. PROMOVENDO-NOS PELO MUNDO AFORA: De como inverter a mesa na


relação entre n@s mesm@s e outros parentes
página

13. NOSSAS DEFESAS: Dos direitos e responsabilidade e das possibilidades de ganhar


dinheiro que nem imaginávamos
página

14. COLOCANDO PREÇOS: De onde podemos finalmente agarrar a ponta da madeixa e


deixar as duvidas para trás... e se alguém quer um desconto, pois logo o pensaremos
página

15. EXPOR NO ATELIÊ (OU QUANDO QUER QUE SEJA): De como não
necessitamos de galerias se queremos expor quando quer que seja, á nossa vontade
página
5

ANEXOS
BREVE E CONCISA TIPI F ICAÇÃO DA GALERIA página

O VALOR DA ARTE CONTEMPORÂNEA, por cortesia de Paula M astroberti

página
INTRODUÇÃO
A ARTE DE VIVER DA ARTE
@s artistas que prosperam são os que têm o coração na arte e os pés na terra!

A profissão de artista não é – e nunca foi – um “louco acontecimento vergonhoso”. É uma

atividade tão necessária para a sobrevivência física e espiritual dos indivíduos como o os

mil e um ofícios e profissões que permitem à humanidade florescer. Todo mundo precisa

da arte, e como sempre há um roto para um esfarrapado, qualquer um que se proponha a

isso pode, sem um só espaço para dúvidas, viver exclusivamente de sua produção

artística.

A missão deste livro é recuperar os esplendores de uma das mais antigas atividades

inventadas pela humanidade. Seu propósito é servir tanto a artistas emergentes que

procuram fazer seus primeiros esforços como a profissionais que já estão há anos na

lida.

Este ofício é profundo e maravilhoso, e requer muitos anos, às vezes a vida toda, para que

se possa exercê-lo em plenitude. Antes de entrar no assunto, pedirei ao meu leitor/a que

recorra à imaginação e se coloque a si mesm@ sob una lupa com o propósito de descartar

aqueles preconceitos que tantos danos trazem à nossa profissão.

Existem alguns mitos que enaltecem, como os d@s médic@s abnegad@s ou o dos capitães

que afundam com seu barco. M a s quase sem exceção, os mitos que rodeiam @s artistas

há uns cem anos, quando muito, nos envilecem. Para ser artista – se diz – é preciso

“nascer com talento” e “esperar que as musas nos inspirem”, e enquanto isso não

acontece, deve-se vestir de maneira esdrúxula, beber e fornicar pantagruélicamente. Somos

– diz a lenda – seres espirituflautic@s ou báquic@s, entes quase incorpóreos que

subsistimos de ar e sonhos quiméricos. Habitamos clarabóias ou palácios (nunca uma


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casa normal), jamais sabemos que horas são e somos sempre informais; nossos bolsos

não têm fundo, somos como... crianças pequenas!: impulsiv@s, arrogantes,

desobrigad@s, interessantes (muito interessantes, faltava essa!), e sempre imprevisíveis.

@s artistas – arremata o mito – somos valorizados depois de morrer!

Seria difícil listar as falácias que continuam tecendo ao redor do nosso maravilhoso

labor. O ruim é que, apesar de suspeitarem do contrario, muit@s artistas preferem a

mentira, é tão romântica! O pior é que há entre nós aqueles que vestem essa carapuça e

decidem, para sua desgraça, viver a farsa. Quanta gente com talento não almeja ser

artista? E destes quantos jamais conseguiram alcançá-lo?

Entre as falácias que se deve destacar de imediato está a crença que se não nos dão

atenção é porque “ninguém nos entende”, ou pior ainda, a que alimenta a esperança de que

algum dia “seremos descobert@s”. Pensar assim só nos conduz a definhar no

esquecimento. Certamente para ser artista profissional se requer muito mais do que saber

desenhar, modelar massinha ou pintar a óleo; é igualmente importante divulgar nosso

trabalho e, sobretudo, cobrar o justo. Para viver da arte, nós artistas devemos organizar

nossas vidas de modo que tenhamos os tempos requeridos para criar, por um lado; e por

outro, para administrar a nossa produção.

Não estamos sós


Muit@s aspirantes a artistas ignoram os meandros da profissão e desconhecem o

âmbito em que exercemos nossa atividade: um mundo farto, complexo e labiríntico. Não

sabem que para funcionarmos como se deve, dependemos de uma ampla rede de apoios

proporcionados por um universo de pessoas especializadas: estão, em primeira instância,

@s colegas de grêmio e uma surpreendente variedade de associações que criamos

(algumas importantes e influentes); também nos apóiam nossos provedores e produtores,

homens e mulheres especializados em mil e uma tarefas que nos proporcionam todo o
necessário para realizarmos nosso trabalho; existem representantes e galeristas (duas

ocupações muito diferentes) que são os principais encarregados de distribuir nossa obra;

@s curadores/as, crític@s e historiadores/as que localizam nossa produção e lhe dão

contexto; @s empregad@s e funcionári@s de museus e instituições públicas e privadas;

as pessoas que trabalham na imprensa e nos meios de comunicação de massa, e claro, @s

colecionadores e toda a variedade de clientes, que são @s principais – mas não são os

únicos – destinatários de nossa produção.

Paralelamente à criação de nossa obra, temos a obrigação de tratar com empregad@s,

assistentes e sub-contratados, realizar trâmites burocráticos de todo tipo, elaborar

orçamentos e cumprir compromissos com seriedade, dirigir nossas finanças e contas

bancárias, manter correspondência com terceiros, zelar por nossos direitos autorais e

lidar com o fisco (pagar ou não pagar impostos, eis a questão...).

Para conseguir tudo isso, devemos fotografar a obra que estamos produzindo e

inventariá- la (é necessário saber com precisão tudo o que temos armazenado), redigir

currículos especializados, montar portfólios para nos promover e estabelecer contatos

privados e institucionais (tanto em nosso país como no exterior).

Ao longo da vida profissional é necessário empacotar, assegurar e exportar as obras,

tratar com intermediários e funcionários e conhecer a diferença entre empréstimos,

subsídios e mecenatos. Deve-se saber decidir quando vender diretamente e quando fazê-lo

através de terceiros, se vamos dar aulas ou vender cachorro-quente, se queremos ser

empregados ou atuar de modo independente. Devemos inclusive saber como formar uma

coleção própria. Todo um labirinto de atividades e opções!

@s que sabem disso são @s artistas que operam de maneira profissional. Alguns se

apercebem da realidade no início da carreira. Outr@s vão aprendendo pelo caminho,


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lentamente; mas tod@s sabem que para desenvolver-se em plenitude é necessário

administrar- se de maneira cuidadosa: @s artistas que prosperam são @s que têm o coração
na arte e os pés na terra!

Quem não se dá conta da realidade a tempo acaba ganhando um salário como

funcionári@ de algum trabalho, geralmente como professor/a ou empregad@ menor.

Tornam-se melancólic@s porque lhes parece que sua obra “não atinge o público”, há

aqueles que se conformam em trabalhar de dia e criar à noite. Os sonhos se desvanecem e

muit@s caem abatid@s pelo caminho. Quem insiste em produzir sem se profissionalizar,

vão se amargurando porque não lhes chega o reconhecimento; produzem cada vez menos e

vendem pouco ou nada. Em sua frustração, se reduzem a falar mal de seus colegas e do

próximo e, como conseqüência, degradam a profissão.

Aqueles de nós que conseguem ver como nossas obras comovem quando as

compartilhamos, são @s que praticam o ofício milenar com o respeito que exige a

disciplina : somos os que criam para logo fazer a entrega pontual de nossas criações. Só

assim se pode operar o verdadeiro mistério da arte, o da interlocução, através do qual nós

artistas contribuimos no imaginário de nossa geração. Se nossa obra é significativa aos

olhos do próximo, pode chegar a transcender. Se corrermos com sorte, nos destacaremos

em vida, mas, ainda que a fama ajude, não é o que importa: se é artista para cumprir

uma função vital.

O senso comum
A única coisa que intermedia a desilusão e os prazeres do sucesso é o senso comum. Disso

se trata o livro: do senso comum que fui adquirindo ao longo da vida e que aplico desde

que soube que seria artista.

Quando voltei ao México, em 1974, depois de viver seis anos na Inglaterra, tinha 30 e
poucos anos de idade. Foi lá onde aprendi como ser profissional de fato e direito. Quero

dizer que por fim vivia daquilo que fazia. Capacitado nas artes tradicionais, mas metido

em experimentações, ao retornar deparei-me com um mundo de arte ermo e hostil.

Concentrado numa capital que ultrapassava os 10 milhões de habitantes, afundado em

práticas e costumes anacrônicos até em seu próprio entorno, a profissão das artes visuais

(que naquele então ainda eram “plásticas”) se desenvolvia carente de suportes essenciais:

as galerias que havia podiam ser contadas em uma mão; escreviam por coincidência o

mesmo numero de crític@s nos jornais e revistas e apenas se lhes era outorgada alguma

esquina e não havia uma só tribuna especializada. Certo, umas quantas pessoas

compravam arte, mas daí a dizer que constituíam um mercado de arte seria mentira.

Nestas circunstancias, a única coisa que me permitiu avançar em minhas propostas foi

meu profissionalismo. Muita água passou por debaixo da ponte desde então. Á primeira

vista pareceria que conseguimos avançar, mas na realidade a situação mudou pouco na

capital e quase nada no resto do país.

Se eu fosse pessimista nunca teria roubado um quarto de século da minha vida e

produção para conduzir um seminário chamado “A arte de viver da arte” e compartilhar

os conhecimentos que aplico para administrar minha obra. No entanto, sou e continuarei

sendo um otimista; acredito na capacidade redentora da arte e, sobretudo, na força que

tem o milenar grêmio ao qual pertenço, para efetuar mudanças profundas.

Minha intenção explicita ao escrever este manual é, como já expressei acima,

compartilhar experiências com colegas no México e outros países da América nossa, num

afã por diminuir os desgastes e dissabores que nosso trabalho encerra; também procuro

recuperar os ritmos e compassos que a profissão perdeu na turbulenta modernização do

continente latino-americano. Razão menos óbvia é a de colaborar na criação de um

contexto, um ambiente compartilhado que permita a@s artistas do continente ampliar a

capacidade de nossa infra- estrutura de apoio. Isso nos permitirá perceber melhor a
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presença em âmbito internacional e evitar, na medida do possível, caminhar dois passos

adiante, um passinho pra trás (e outro tanto pros lados), como acontece na atualidade.

Sedimento de nosso imaginário coletivo, a plástica, da mesma forma que todas as outras

artes (incluindo a culinária), é tão importante como uma cesta básica. Sua fragmentação

nos cega e desgasta a todos por igual.

Agradecimentos
No Brasil, em 2007:

À Tatiane Reverdito, ex-assistente, cúmplice e amiga especial desde os tempos difíceis

quando trabalhamos juntos na Embaixada do México no Brasil. Ninguém mais poderia

ter traduzido este livro.

À Beatriz Arantes, alegre amiga e também ex-assistente, pela primeira revisão do texto.

À historiadora Flavia Cesarino, pela última e determinante revisão feita em

circunstancias difíceis; sem seus comentários e observações este livro não seria o que é.

À maravilhosa e hospitaleira e aconchegante Cooperativa de Artistas Visuais do Brasil,

pela sua insistência em existir.

À artista plástica Monique Allain, por me abrir as portas de São Paulo.

À artista plástica e ensaísta Paula M ast roberti, quem com muita generosidade e sem me

conhecer mesmo, cedeu graciosamente seu corajoso e esclarecedor texto, O valor da arte

contemporânea.

A escultora Sol Abadie pela tradução na última hora dos dois ensaios finais.

À M alu e Roberto Viana, pela sua paciente generosidade e o seu amor á arte.

Ah sim! Obrigado ao Chamusquita e o Cuitlacoche, meus gatinhos pretos, que desistiram

de trepar- se no meu colo enquanto trabalhei.

No México, em 2000:

A@s técnic@s e operadoras/es que trabalharam na impressão, meus primeiros

agradecimentos. Ainda não os conheço enquanto redijo estas linhas, mas quero que
saibam que ninguém melhor que eu sei que sem seu trabalho, este livro não existiria.

À Rosina Conde, poeta e escritora, editora cúmplice, por corrigir, melhorar e cuidar deste

texto (e tantos outros).

Devo mencionar, assim mesmo, o Sistema Nacional de Criadores. Foi, sem dúvida

alguma, a grande segurança que me proporcionou o apoio deste organismo do Conselho

Nacional para a Cultura e as Artes, o que permitiu sentar cabeça e traduzir o oral para o

escrito; e depois, muito obrigado á confiança que o SNC concedeu à Biombo Negro

Editores, que tornou possível a publicação deste manual.

Não sou um iludido: não só aprendi que para chegar à redenção é preciso dirigir nossos

próprios esforços com precisão, também aprendi que não há possibilidade de exercer a

profissão de maneira isolada, sem contar com as cumplicidades carinhosas d@s colegas.

Neste manual resumo os conhecimentos que muita gente me ensinou ao longo da vida, teci-

os na trama dos conselhos que nunca me recusaram as amizades profundas e

admirad@s, como a historiadora e crítica Raquel Tibol, a atriz Lilia Aragón, o fotógrafo

Pedro Meyer, o situacionista Juan José Gurrola, o artista brasileiro Rubens Gerchman,

o compositor Michael Nyman, o ex-argentino Néstor García Canclini, o Ulises Carrión

(RIP), pela confiança inicial, a Tere del Conde, o velho gringo Howie Becker, @s

fotógraf@s Nathan e Joan Lyons, @s FLUXian@s Dick Higgins (RIP), Takako Saito

e Carolee Schneemann, o arquivista Clive Philpot, os perfomadores Guillermo Gómez Peña

e Carlos Zerpa, e a grande historiadora Shifra Goldman. Todos são amigos muito,

muitíssimos queridos que sempre exerceram suas atividades com ética e profissionalismo.

Incluo neste livro certos segredos e doces artimanhas do ofício que aprendi com

conhecid@s e amig@s sabi@s e dinámic@s: M athias Goeritz (RIP), José Chavéz

Morado, M anuel Felguérez, José Luis Cuevas, Rosa Luisa M á rquez e Antonio

M a r torell, Francisco Toledo, Silvia Pandolfi e a irmã Karen Boccalero (RIP). Seus

exemplos – e os de alguns mais – me serviram para salvar- me de mil e um recifes. Devo

admitir que se ainda me depare com problemas, isto se deve a minha própria intolerância
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e teimosia.

Em congruência, este livro está dedicado à memória de um de meus melhores amigos e

maior mestre, Arnold Belkin. Ao mesmo tempo, também o dedico à minha filha Annatlalli

Ehrenberg Diaz, cuja tese versa sobre a comunicação em casas de cultura, e a meu

sobrinho Ary Ehrenberg Lesur, quem como artista incipiente, poderá consultá-lo para

resolver sua vida com sensatez.

De modo muito especial, agradeço aos deuses e deusas pela existência de meus filh@s e

meus net@s, cujas vidas são – e foram sempre – minha razão de ser artista. Suas

milagrosas vidas me impulsionam a organizar a minha num afã de legar-lhes algo mais

que minha coleção de chapéus usados. Agradeço à minha esposa Lourdes Hernandez

Fuentes (a Cozinheira Atrevida) pela tranqüila paciência que teve comigo durante o tempo

que desapareci atrás do monitor de La Calandria (meu PC), bem como pelos acertados

comentários que me fez depois de cada leitura que lhe pedi; obrigado também a Francisco

Rocha Merino, desenvolto assistente que tão bem me cobriu as costas em outros misteres,

e obrigado a todos os Comensais do Crime, cúmplices na Editora Biombo Negro, pelo

apoio moral que significa a sua constante companhia.

As etapas finais do livro foram dias de trabalho braçal ingrato: um milhão (e muitos

outros) de agradecimentos ao advogado e Grande Juiz Ricardo (cuja identidade reservo

só a mim) e a Angelina Cué e M a ria Dueñas (advogadas autorais por antonomásia),

que me deram suas imprescindíveis opiniões; e de maneira muito especial, obrigado a

Rosina Conde, que leu e anotou e corrigiu e limpou o deduscrito (eu teclo com dois dedos).

Last but not least, obrigado a Vampi, minha gatinha, que decidiu ter sua camada de seis

bolinhas em vez de trepar- se a meu colo. Obrigado a todos: em seu coração sabem bem o

quanto continuarei precisando.


Felipe Ehrenberg; agosto de 2000, após as históricas eleições (as quais me conduziram –
indiretamente- a virar diplomata e viajar para o Brasil
I. O UNIVERSO QUE NOS RODEIA
Das circunstancias em que vivemos
e das maneiras em que se difunde a arte.

Aceitando a crua realidade


As estatísticas, ainda que se exagere, são contundentes: de cada cem aspirantes que

começam a faculdade de artes visuais, só oito chegam a se formar, cinco permanecem

dentro da profissão e apenas um gozará da lamparina do êxito. A maioria daqueles que

continua numa pós-graduação ou no mestrado deixa de produzir; alguns passam a

ocupar vagas como professores/as, outr@s a ser pesquisadores/as e promotoras/es e

alguns, mais recentemente, a inventar sua muito particular versão do exercício curatorial.

Longe da academia (quer dizer, fora das grandes cidades que contam com centros de

ensino superior de artes) o grau de mortalidade é talvez menor. Com outros ritmos,

outras exigências; se não há escola para compactar oito semestres em uma tese, não há

vara que regule a qualificação. Quem se torna artista na caminhada tem toda a vida

para se formar... uma coisa para se meditar.

Seja como for, os números refletem a realidade: muit@s começam, pouc@s conseguem ser

artistas. Tod@s constituem, no entanto, o complexo universo de relações sociais que

conhecemos como “o mundo da arte”: nós profissionais visuais vivemos inextricavelmente

entrelaçados num universo paralelo de gente sem cuja presença ativa seria impossível

sobreviver, e o contexto que nos rodeia é um labirinto cujo motor é o dinheiro, mais na

atualidade que nos tempos passados.

Hoje, nossos mundos de arte distam muito do que foram não há muito tempo: nós

artistas produzíamos e o objeto de arte passava a terceiros em simples operações de

patrocínio ou compra-e-venda: sem dealers intermediários, suas senhorias, os

burgomestres, ordenavam, Rembrandt entregava.


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Antanho, o uso do objeto artístico, fosse este um desenho, uma estampa, uma tela ou uma

escultura, reduzia-se a umas quantas pessoas e cumpria funções simples, ainda que

profundas.

Hoje, a arte mudou, mudaram seus materiais e seus suportes, mudaram seus alcances.

Continuamos usando tinta a óleo, mas também pintamos com uma infinidade adicional de

materiais; a fotografia se combina com o laser e os computadores, e recorremos a

gigantes tratores ou microscópicos chips como também a muitas outras ferramentas

inusuais. M as por que não? Acaso não acontece o mesmo com as demais tarefas

humanas?

Assim mesmo, a difusão e distribuição da arte mudaram de maneira radical. Atualmente,

nós artistas temos à nossa disposição tecnologia de reprodução e meios visuais

sofisticados ao extremo. Sua versatilidade permite e propicia que uma obra de arte

cumpra muitíssimas outras funções – que tenha mais usos – e que sirva a uma maior

quantidade de pessoas.

Ainda que hoje, como antes, as obras continuem sendo usadas para ornamentar luxuosas

residências e dar lustro a escritórios públicos e privados, também são usadas para

iluminar com seu brilho esplanadas comerciais e halls de hotéis e hospitais. São

utilizadas para incitar o turismo, vender produtos fotográficos, como base de programas

de computadores, para anunciar licores, como capas de livros e discos, para decorar

cenários de telenovelas, para constituir e herdar capitais, até para lavar dinheiro sujo! O

dinheiro que produz a arte se multiplica e se esparrama.

É lógico que ao complicar-se nosso universo profissional, complicam-se as relações entre

@s artistas e o público espectador. A função d@s intermediári@s, outrora temerosa,


hoje é imprescindível. Temos que viver com eles/as, por isso devemos regular nossa

convivência.

Sobre os territórios das artes


As artes se dividem por tradição em cinco grandes áreas: as cênicas, que são

essencialmente três: a música, a dança e o drama (e sem dúvida a gastronomia), e as não

cênicas: que são a literatura e as artes visuais.

A vida cênica é gregária e seus praticantes percebem ingressos que provém, de forma

geral, da bilheteria, em ocasiões do patrocínio; é muito diferente do modo como nós

artistas e literatos, que trabalhamos em maior solidão.

Os ingressos recebidos pelos poetas, novelistas e escritores/as provêm da multi

reprodução de seus textos na imprensa e por meio da venda de seus livros, de conferências

e seminários. Para a maioria d@s artistas, no entanto, a natureza de nossas obras nos

obriga a manter a antiga relação um-a-um com nosso público.

Tanto o ingresso na bilheteria e no restaurante como as edições de livros parcelam os

lucros que as pessoas do drama, literatura e a gastronomia recebem: @s espectadores/as

de uma função de teatro, dança, música ou os comensais no restaurante pagam uma

quantidade relativamente pequena por entrada, e do que entra na bilheteria sai para os

gastos, salários, honorários e direitos; de modo parecido, o total arrecadado na venda da

edição de um livro se divide e seu autor/a geralmente recebe 10% de direitos. Vender

bilheteria e em livrarias requer medidas muito distintas das que se requer para convencer

o povo endinheirado a gastar uma alta soma em uma única peça.

Enquanto isso, nós artistas temos dificuldade para compreender quanto mudaram as

maneiras que há para usar nossa obra.


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O panorama das artes visuais


A circunstância das artes visuais é singular, sem dúvida alguma. Isto responde a uma

realidade atual da sociedade e, portanto, da arte; e quem protagoniza seu desenvolvimento

são sempre @s propri@s artistas. Tanto se amplia e se bifurca nosso território que,

para prosseguir nesta leitura, temos rever suas especializações. A plástica se parece

muito com a medicina, já que ambas as disciplinas se subdividem em especialidades, cada

uma das quais tem suas particularidades técnicas, sua história, sua teoria, e claro, seu

próprio destino dentro do todo.

Atualmente, as artes visuais se dividem em dois blocos principais: o mais familiar é o da

obra retinal (ou retiniana), que inclui tudo o que se sustenta em objetos. Menos conhecido

é o da obra conceitual (ou não objetual), que privilegia as idéias relativas ao visual, o que

se traduz usualmente na produção de textos e gestos, ações (performances), instalações,

fotografia, vídeo e documentação diversa.

As especialidades são, em ordem de aparição histórica:

Desenho

- carvão e à sanguina

- prata ou ouro, sobre caulim;

- grafite (lápis)

- cera (lápis de cera e lápis de cor)

- tinta, negra e colorida (pena e/ou pincel);

- giz e pastel

Pintura

- guache
- encáustica

- óleo

- aquarela

- acrílico

- afresco (pintura mural)

- secco (pintura mural)

Escultura (hoje chamada obra tridimensional ou 3-D)

- modelada (barro, cera, gesso, massa de modelar, etc.),

- talhada (madeira),

- lavrada ou cinzelada (pedra),

- colada (metal, cimento, plásticos, etc.),

- soldada (metal, plástico),

- assamblage (madeira, metal, plástico, etc.) que pode incluir mecanismos

automotores,

- instalação (de cunho recente, freqüentemente efêmera) que pode incluir áudio e/ou

vídeo,

- ambientação (recente, frequentemente efêmera) que também pode incluir áudio e/ou

vídeo;

Estampa (frequentemente chamada erradamente de gravura)

- carimbos e a rolo

- madeira (xilogravura), da qual deriva a linoleografia,

- Planilhas/estêncil (de onde deriva a atual mimeografia e a serigrafia),

- monotipia (uma única impressão),

- metal: cobre, zinco, ferro,

- colografia,

etc., até chegar à digitalização.


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Fotografia (próxima á estampa)

- a cor, preta e branca,

- revelada,

- digitalizada,

Têxtil

- macramê,

- tecido,

- tingimento (e batik),

- costura e/ou colagem,

- misto, Etc.

Cerâmica

- modelada,

- moldada,

Artes temporárias

- performance (performance art),

- vídeo,

- digitais.

Para os propósitos dessa classificação tão reduzida e esquemática é aconselhável

descartar a tradicional distinção que fazemos entre as chamadas “artes” e os chamados

“artesanatos”. As teorias mais recentes sobre os processos e as funções da arte, assim

como a emergência de grupos sociais outrora reprimidos já não permitem manter essa

diferenciação. É mister formular marcos de referência diferentes, mais atentos à

circunstância mundial. Com isso quero dizer que é necessário colocar a grande
criatividade de artistas que se identificam com as chamadas etnias, dentro de qualquer

uma das especialidades acima elencadas. Sô um exemplo: no vale do Rio Balsas, no estado

de Guerrero ( MX), há muitos artistas ceramistas por tradição, que nos últimos anos

começaram a transferir seu extraordinário desenho ao papel amate 1; há entre esses,

criadores do mais alto calibre, que já começam a ser reconhecidos no exterior. Se a política

cultural do México –e na maior parte dos paises da América latina- não fosse racista,

eles também seriam considerad@s autores de artes visuais.

Pelo andar da carruagem, tudo indica que nossa lista terá que continuar sendo ampliada

para incluir mais e mais especializações que já estão sendo gestadas.

A infra-estrutura que nos apóia


Quase sem exceção, os países industrializados contam com uma enorme infra- estrutura,

mercados diversificados e uma cidadania assaz receptiva que permite a@s artistas

especializarem-se, se assim o quiserem, para viver de “um só cultivo”. Em países menos

desenvolvidos como o México e o Brasil existem, é claro, infra- estruturas parecidas; mas

como ainda é frágil a engrenagem entre suas partes e no resto da sociedade, e como os

níveis de percepção de nossa gente são tão dispares, a possibilidade de especializar-se é

reduzida quase a zero. Talvez seja melhor assim: maior especialização, menor visão

panorâmica; maior versatilidade, maiores possibilidades expressivas para dialogar com

o próximo.

Para dar um exemplo: no México – cujo imaginário é eminentemente visual – cultivou-se

durante séculos, e muito bem, a escultura. Legado de nosso passado pre-colombiano, ela

reflete uma particular sensibilidade rumo ao tridimensional. Os setores poderosos da

atualidade, no entanto, pouco se interessam por nossa história, muito menos por nosso

imaginário coletivo, ou seja, nossa cultura. Submersos em uma assustadora apatia,

1 Amate é o papel usado desde os tempos dos astecas.


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guiados pela frivolidade de revistas importadas de moda e decoração, imaginam que uma

escultura só pode ser de pedra, metal ou cimento, e que dizer “arte” é dizer “óleo”. Para

satisfazer seu afã de consumo conspícuo, as galerias pressionam para que @s artistas,

sobretudo os recém-formados das academias, cultivem a especialidade do óleo a despeito

da escultura e da enorme variedade de especialidades que existem. Salvo exceções que

confirmam a regra, o resultado é que a escultura quase não é cultivada no México, e @s

pouc@s artistas que insistem em continuar trabalhando vêem um horizonte negro

adiante.

Em busca de mais espectadores/as


É possível, e de fato desejável, escaparmos a essa dinâmica constrangedora e

procurarmos OUTROS públicos, casualmente pauperizados, mas sem dúvida menos

ostentosos e muito mais curiosos, aos que podemos chegar sem necessidade dos serviços

de galeristas, de maneira direta, desde nossos estúdios. Refiro-me a gente como nossos

familiares e vizinhos que também têm seu coraçãozinho... Perceberemos que as

necessidades estéticas deste outro público podem converter-se em poderoso estímulo para

ampliar nossa capacidade expressiva, para utilizar uma maior variedade de técnicas,

suportes, ferramentas e materiais, sempre e quando os aproximemos a nossa obra.

Eu, por exemplo, não pratico apenas uma ou duas técnicas, na verdade sou (da mesma

forma que um clínico geral) um profissional geral. Tenho duas poderosas razões para

trabalhar assim: por um lado, minha desmedida curiosidade e minha impaciência (me

aborreceria só pintar ou fazer gravuras); por outro lado, a quase provinciana timidez do

mercado mexicano (que não admite nada além do que lhe seja familiar). De modo que, há

muitos anos, produzo com alguma perícia e muitíssimo prazer desenhos, estampas e

pinturas que vendo principalmente no México, a preços mais que justos; enquanto me dou

asas elaborando instalações e performances para exibi-las no exterior, onde ninguém

barganha o cachê, e recebo porcentagens da bilheteria.


O mundo íntimo que nos rodeia: Pessoal de apoio – direto e indireto
Ao longo de suas mil historias, a humanidade vem desenvolvendo toda sorte de

especializações que são realizadas por técnicos e profissionais, com o objetivo de enlaçar

a@s artistas e sua sociedade com maior eficácia. Tais especialistas nos podem ser de

extrema utilidade, por isso deve reconhecê-l@s com cuidado para saber o que fazem, como

fazem e em que condições fazem.

O destacado jazzista, fotógrafo e sociólogo de arte, Howard S.Becker, classificou-@s

como pessoal de apoio, e @s divide em PESSOAL DE APOIO DIRETO (PAD) e

PESSOAL DE APOIO IND IRETO (PAI).

Muitas dessas pessoas são cúmplices d@s artistas, outras cumprem tarefas de

intermediação essencial. Outras ainda, como galeristas e curadores/as, poderiam ser

consideradas figuras parasitas, úteis em algumas ocasiões, sempre e quando saibamos

como e quando recorrer a eles. No conjunto, suas habilidades e serviços nos permitem

dedicar mais tempo de qualidade à nossa criação.

Pessoal de Apoio Direto (PAD)

Técnic@:

Sem dúvida, os primeiros que nos vêm à mente são:

- fabricantes de ferramentas para artistas;

- fabricantes de materiais de pintura (lápis, aquarela, tinta a óleo e acrílicos) para

artistas;

- fabricantes de suportes (papéis especiais, telas, bastidores, etc.);

- fundidores/as, serralheir@s e ceramistas artístic@s;

- emolduradores de arte;

- comerciantes especializad@s, ambulantes e estabelecidos;


23

- técnic@s impressores/as, de gravuras, litografia e serigrafia;

- programadores/as de computador especializados;

- noss@s propri@s colegas! refiro-me às amizades verdadeiras, sem cuja

companhia e apoio ninguém de nós poderia se desenvolver;

Prestadores de serviço:

- mestres e professores de arte, não necessariamente ligados a centros de ensino;

- assistentes especializad@s em estúdio e/ou ateliê, quase sempre estudantes de arte;

- fotograf@s especializad@s (não é a mesma coisa tirar foto artística e fotografar

arte);

- empacotadores especializad@s (toda a obra de arte requer embalagens especiais);

- seguradoras familiarizadas com as artes, para cobrir qualquer contingência com

máxima eficácia e mínimo custo;

- transportadores especializad@s, que sabem mexer com obras de arte sem danificá-

las;

- agentes alfandegários que conhecem a regulamentação mercantil relativa à arte;

- curadores/as, que estabelecem os parâmetros conceituais de coleções, exposições e

atividades adjacentes;

- museógraf@s, que seguem um roteiro curatorial para compor as exposições;

- vigilantes e monitores, cujas funções que @s artistas desdenhamos injustamente,

mas cujo trabalho é indispensável para aproximar-nos do público;

- contadores/as e advogad@s familiarizados com as artes, @s primeir@s, que

sabem dividir nossas atividades entre emissão de notas fiscais e recibos de

honorários para propósitos fiscais; @s segund@s, que sabem proteger-nos em

querelas, lesões autorais e demais situações;

- pesquisadores/as especializad@s, que sabem onde procurar a informação ou

materiais que podemos precisar a qualquer momento;

- noss@s colegas, @s artistas, me refiro às amizades verdadeiras, sem a qual


companhia e apoio ninguém de nós poderia se desenvolver, e cujos conselhos baseados

em uma realidade compartilhada são sempre inestimáveis;

ATENÇÃO! Também são PAD em serviços:

- associações de grêmio e autorais nacionais e internacionais (como a Cooperativa de

Artistas Visuais do Brasil ou a Sociedade Mexicana de Autores de Artes Plásticas,

no México);

- organizações filantrópicas nacionais e internacionais;

- fundações culturais nacionais e internacionais;

- clubes e círculos culturais nacionais e internacionais;

- organismos dedicados à proteção legal e contável de artistas;

- comissões culturais em corpos legislativos estatais e federais;

- noss@s colegas, @s artistas organizad@s em associações - me refiro às

amizades verdadeiras, sem cuja companhia e apoio ninguém de nós poderia se

desenvolver, e cujos conselhos baseados numa realidade compartilhada são sempre

inestimáveis: cerrar fileiras, na alegria e na tristeza, visitar- se nos ateliês para

compartilhar a crítica construtiva, acompanhar- se em exposições, intercambiar

informação sobre compradores morosos em seus pagamentos, falar de galerias...

Tudo se traduz em criar um grêmio.

Pessoal de exceção:

- @ companheir@! O marido, a esposa, @ namorad@, @s amantes.

Trata- se de cúmplices que nos amam (pelo menos, assim supomos), que nos conhecem

intimamente, que sabem pelo que passamos para criar, e que costumam presentear-nos

com amor, às vezes com paixão, seu mais desinteressado apoio.

Ainda se conta em muitas sobremesas, para explicar o êxito do mestre Rufino Tamayo,

que ele era um santo dadivoso e amoroso enquanto Olga, sua esposa, era uma mercenária
25

avara e desalmada. A fofoca oculta um dos elementos mais importantes relacionados com

o casal: a divisão de trabalho! Ninguém se surpreende que se um casal decide abrir um

pequeno comércio, e que enquanto uns d@s dois atende o balcão, seu companheiro se

encarregue de atender os fornecedores e fazer entregas. Também não é incomum que dois

médic@s, digamos uma pediatra e um dentista, abatam custos e dividam o consultório.

De fato, quantas empresas não surgiram do esforço conjunto de um casal que decidiu

tentar a sorte para prosperar? M as é tal o gosto pela fofoca que se perde o ensinamento

que a anedota do matrimonio Tamayo encerra. Que ignorância! Não apreciam o aspecto

pragmático do assunto: enquanto uma metade do binômio cria obras de arte, a outra

metade pode atuar como gerente para administrar a produção. Os Tamayo prosperaram

porque ambos assumiram funções complementares, O mestre Rufino pode ter sido o gênio

que quiserem, mas gênios abundam. O que falta são que gênios se administrem.

@s intermediári@s :

Diferentemente d@s técnic@s, com quem estabelecemos relações de trabalho claras e sem

subterfúgios (eu solicito, você sabe como, me cobra e eu te pago), os intermediários

geralmente têm agenda própria, quer dizer, quando recorrem a nós é para cumprir

projetos próprios. Os intermediários funcionam tanto no âmbito privado como no público:

No âmbito da IP :

- vendedores/as, que vão desde mascastes de condomínio até comerciantes

estabelecidos como empresa;

- representantes, ainda que na América latina existam poucos, em outros países

funcionam bastante bem, onde comprovaram serem mais úteis que @s donos de

galeria. Depende de nos estimular a sua aparição hoje em dia;

- historiadores/as da arte;

- sociolog@s das artes;

- curadores independentes;

- promotores/as especializad@s, sejam já empregados de instituições privadas ou


independentes;

- proprietári@s de jornais, revistas e concessionárias de rádio e TV;

- cibernautas don@s de sites na rede;

- editores/as de seções culturais na imprensa, radio e TV;

- repórteres culturais, na imprensa, radio e TV;

- colunistas e cronistas especializad@s;

- crític@s de arte;

- noss@s colegas, @s artistas organizados em associações - me refiro às amizades

verdadeiras, sem a qual companhia e apoio ninguém de n@s poderia se desenvolver,

e cujos conselhos baseados em uma realidade compartilhada são sempre

inestimáveis: cerrar fileiras, na alegria e na tristeza, visitar- se nos ateliês para

compartilhar a crítica construtiva, acompanhar- se em exposições, intercambiar

informação sobre compradores morosos em seus pagamentos, falar de galerias...

Tudo se traduz em criar um grêmio. (Não, isto não é um erro de edição. A repetição é

proposital).

O âmbito do setor público:

- Funcionári@s, mais velhos e mais novos, especializad@s, diretores/as e chefes de

institutos, museus, departamentos de artes plásticas, casas de cultura, instâncias

públicas de promoção cultural, etc.;

- historiadores/as de arte;

- sociólog@s da artes;

- curadores/as;

- promotores/as especializad@s, sejam já empregados de instituições privadas ou

independentes;

- noss@s colegas, @s artistas organizad@s em associações, me refiro a amizades

verdadeiras...
27

Pessoal de apoio indireto (PAI):

Acima listamos quem devemos considerar pessoal de apoio direto. Trata- se de pessoas

que, bem ou mal, desempenham atividades claramente delineadas por hábitos e

determinações legais previamente estabelecidas. Fazem parte do que Becker chama de

infra- estrutura. São, em paises desenvolvidos, figuras respeitadas, mas não temidas.

Dizer que nossa sociedade está em “vias de desenvolvimento” é querer dizer que nossa

infra- estrutura está tão cheia de buracos como uma esponja, e que é apenas um esboço

daquilo que esperamos que chegue ser algum dia. Boa parte de nossas falhas obedecem à

situação de nossas economias. A maioria dos problemas infra- estruturais de que

padecemos, no entanto, é conseqüência de uma ignorância generalizada, e em ocasiões, da

corrupção que campeia o interior dos setores universitários e acomodados a cargo da

cultura. Também @s artistas, gostemos ou não de admiti-lo, fazemos parte desta triste

realidade: se os intermediários se perpetuam com impunidade nos lugares que

desempenham mal ou dirigem com imperícia as coisas é porque nós permitimos, seja por

desconhecimento ou por preguiça.

Enquanto não encontrarmos a maneira de obrigar aos intermediários em postos públicos

a trabalhar com rigor, disciplina e honestidade teremos que fortalecer nossas relações

com os setores técnicos e de serviços. Vejamos então qual é a diferença entre PAD e PAI.

Um exemplo simples para ilustrar é o lápis!

Um lápis – digamos um Berol HB – é absolutamente indispensável para tod@

desenhista, portanto os anônimos operários da Berol que os fabricam devem ser

considerados pessoal de apoio. No entanto, aqueles lápis não são para uso exclusivo dos

artistas, Usam- no também estudantes, carpinteiros, engenheiros, ladrões de banco, até

deputados. Esses trabalhadores são então pessoal de apoio indireto.

Na mesma fábrica, outro grupo de operários produz lápis de cor com grafite de cera
(melhores do que se produzem nos EUA, diga-se de passagem), portanto são pessoal de

apoio direto, já que o destino dos ditos produtos é direitinho á mão do/a artista, ainda

que possa ser usado por estudantes.

Da mesma forma, um bom marceneiro não necessariamente sabe construir bastidores ou

cavaletes. Pode nos ser útil – como pessoal de apoio indireto - para construirmos uma

mesa de trabalho comum. O dia em que siga os planos para construir uma mesa de

desenho ou um bastidor passará a ser pessoal de apoio direto. Daqui para frente

poderemos recorrer a ele com a confiança de que nos será útil no âmbito particular.

Nosso grêmio inclui fotógraf@s, muit@s dos quais subsidiam suas propostas criativas

com o que ganham em trabalho de corte comercial, fotos para revistas de moda ou

arquitetura, tomadas de fábricas e de carros. Não necessariamente sabem fotografar um

mural de cerâmica, uma instalação ou uma performance. Podemos ser úteis a eles se os

ensinarmos como fazer. Então passam a ser pessoal de apoio direto para artistas.

Os mesmos princípios são aplicáveis a outras disciplinas. Contadores, advogados,

profissionais de todo tipo e gente que nada sabe de arte podem, se assim o desejarem e se

nos tomamos o tempo de familiarizá-los com nossa lida, transformarem-se em pessoal de

apoio direto e colaborar com o grêmio.

Nosso público (agora sim): Públicos ativos (PA) e Públicos Passivos (PP):

De acordo com a muito sensata classificação de públicos que faz o professor Becker,

nossos espectadores podem ser divididos em dois setores: público ativo (PA) e público

passivo (PP).

O PA, que é uma minúscula minoria aqui e nas ilhas Fidji, compra arte. Quem não

compra -a grande maioria- são PP. O curioso deste assunto é que enquanto o primeiro
29

(PA) representa o setor pouco entendido em assuntos de cultura e arte, é no setor PP onde

encontraremos as pessoas mais receptivas às artes. Não terá capacidade aquisitiva, mas

é sem dúvida, sensível a elas.

Entende-se, como conseqüência, que o PA é aquele que freqüenta galerias privadas e

leilões e costuma adquirir os chamados coffee table books de luxo; enquanto o PP é aquele

que visita museus e galerias de casas de cultura, e compra revistas de arte em sebos ou

artigos de segunda mão. Embora o público ativo nos pareça, à primeira vista, mais

desejável, nosso melhor público sempre será o público passivo.

Da mesma maneira em que @s artistas podemos incidir para transformar o pessoal de

apoio direto (PAI) em direto (PAD), podemos também incidir para transformar o PP em

PA. Não é que podamos fazer que fiquem ricos (deram saltos de felicidade!), mas sim

podemos pôr nosso trabalho a seu alcance, quer dizer, vender nossas obras a preços

acessíveis. Parece fácil e realmente é. Basta definir como e em que circunstancias a obra

sai de nossos ateliês.

Haverá ainda quem insista em alegar que “nós artistas estamos sozinhos”?
II. OS ESPACOS PARA A PRODUÇÃO ARTÍSTICA
De o simples encontrar soluções imediatas e mediatas
para resolver nossos problemas de espaço.

Quanto maior a produção, maior a projeção.


A falta de um espaço adequado para produzir é um problema endêmico de que padecem

quase tod@s @s artistas do mundo. Depois de formar- se, @s jovens emergentes passam

da paradisíaca existência de que gozaram na academia durante seus anos de formação à

inesperada e desagradável realidade que os obriga a desenhar na mesa da cozinha,

pintar no quarto entulhado de coisas na casa dos pais ou, na melhor das hipóteses,

trabalhar no quartinho de serviço.

Existem aqueles que se tornam independentes de imediato, é claro. Então, põem-se de

acordo com dois ou três colegas e amontoam-se num apartamento alugado. Depois de

alguns meses entram em disputas por causa do espaço divido e, confusões daqui

confusões dali, acabam brigados de morte. Uma vez mais, sem lugar onde trabalhar.

O triste é que tem quem nunca aprenda a remediar seu problema de espaço. Deixam que os

anos passem, casam-se, têm filhos, mas persistem em trabalhar sob condições

inimaginavelmente precárias: no quintal que algum dia cobriram com placas de eternit,

no microscópico jardim onde a duras penas construíram um tipo de cabana... Não é de se

surpreender que se esqueçam de seus entusiasmos juvenis, como a gravura e ou a

escultura em pedra, pois onde colocar o tórculo e a caixa de resina e as bandejas para os

ácidos, se há crianças engatinhando por toda parte? Onde armazenar o granito e o

mármore e realizar trabalhos tão poeirentos e ruidosos sem incomodar a vizinhança?

Desesperados, muit@s procuram um emprego como professor@s 2 em algum lugar onde

2 Antes de que se me echen encima los comentarios del mundo académico, quiero dejar bien claro: no tengo
NADA contra profesores. El grave problema son los usurpadores. Me refiero a aquellos artistas que por
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haja espaço (cruzam os dedos) para trabalhar. Poucas vezes são satisfatórios esses

arranjos. Para um/a artista, qualquer emprego se traduz, não em espaço, mas em

salário; e um salário é igual à morte criativa (bem o dizia Dick Higgins: tenure is death,

conseguir uma base é morrer...). Muit@s pouc@s artistas que ocupam espaços alheios

contam com áreas para diversificar sua produção, muito menos contam com o espaço

físico necessário para deixar as obras de ontem à vista e compará- las com a peça em

processo hoje.

Além do mais, produzir não é tudo. Se não contamos com espaço adicional para

armazenar nossa produção, como será possível ordenar o inventário necessário para

exibir e vender diariamente? Como poderemos produzir o suficiente para projetarmo-nos?

As partes essenciais do ateliê ideal


A primeira coisa a qual se deve dedicar qualquer artista, emergente ou com experiência,

será a de conseguir espaço apropriado para criar à vontade. Só assim alguém pode

desenvolver-se e crescer. O lugar ideal deve satisfazer não só nossa produção atual: deve

servir para o que vier no futuro. No momento de montar ou desenhar um ateliê à nossa

medida, é preciso considerar os seguintes elementos:

Zona de trabalhos “limpos”:

Onde se trabalha, sobretudo com papel: desenhos, aquarelas, desenho de planos e

maquetes etc. São necessárias mesas de trabalho, mesas de desenho (inclusive as

cualquier razon, porque su trabajo no cabe en los espacios de prestigio y no estén dispuestos a exponerse en
espacios mas... digamos, inmediatos, o porque no supieron cómo ganarse el pan con su obra, sin
entermediarios; deciden entonces ganar un salario como profesores, sin haber estudiado pedagogia. Ser un
profesor especialista en el sistema circulatorio es muy distinto a ser médico hematologo y nada nos
garantiza que un buen hematologo pueda ser un buen profesor. Lo mismo en el arte. La regla en centros
avanzados de enseñanza del arte es que los profesores estudien para ser eso mismo, profesores de arte. Es el
conjunto de profesores de arte lo que forma un artista profesional. El artista se forma para ser artista, no
para ser profesor, a menos que decida NO ser artista. Debe entonces cursar una capacitación adicional.
Ciertamente, hay excepciones, ha artistas que saben transmitir correctamente su experiencia. Pero son
garbanzos de a libra.
desmontáveis), cadeiras e bancos, prateleiras para materiais e ferramentas, luminárias

de mesa. Tudo deve se encaixar, de modo a facilitar ao máximo o trabalho.

Zona de trabalhos “semi-sujos” e “sujos”:

Para elaborar pintura e estampa, e, dependendo, para esculpir, modelar etc. são

necessárias mesas desmontáveis de trabalho (tábua e cavaletes), prateleiras para

materiais e ferramentas, às vezes cavaletes, bancos e tamboretes; tudo se deve ajustar ao

tipo de trabalho que estamos fazendo.

Zona de trabalhos “tanto faz”:

É necessária para preparar instalações, práticas de performance, etc. Trata- se de contar

com uma área aberta e de múltiplos usos que nos permita experimentar e projetar antes de

exibir ao público a(s) obra(s) em turnos, de modo que possamos evitar a improvisação

que tanto empobrece as boas idéias.

Zona de escritório:

Hà quem se surpreenda quando se fale em “escritório”; é necessário, no entanto, contar

com um espaço dedicado à administração de maneira exclusiva. Com isto, além de não

entulhar as zonas de trabalho com papéis, pizzas velhas e ressecadas, cartas de amor ou

negócios, baralho, contratos, camisinhas e demais coisas, para nos facilitar aquelas

tarefas que tanto odiamos, as escritorialísticas.

Hoje em dia, nós artistas devemos contar com um computador (com seu modem e tudo o

mais), com pelo menos com dois telefones e suficientes arquivos, tanto para documentos

como para fotos e transparências. Adicionalmente, é no escritório, em estantes onde se

guardam revistas, convites, livros técnicos e de referência, e toda a parafernália

informativa requerida para nosso trabalho.


33

Zona de armazenamento:

Assunto de máxima prioridade, o armazenamento seguro e limpo de nossa obra deve ser

planejado com cuidado, para resguardar a obra em processo, sem marcar e/ou a obra que

esteja pronta para sua exposição. Deve-se desenhá-lo de maneira que se possa incluir

objetos de tamanho e natureza diversa.

Zona de exposição:

Todo ano, uma plêiade de artistas emergentes se soma aos contingentes em atividade que

competem entre si para fazer ato de presença em fóruns nacionais. Seu número

ultrapassa e muito as por si só limitadíssimas capacidades das poucas galerias que

existem por aí. É ilusório e contraproducente pensar que estas empresas são nossa única

possibilidade de vender. Dai que tant@s artistas, em todo o mundo, regressam a essa

antiga tradição (que existia muito antes de ser aberta a primeira galeria): expor e vender

no próprio ateliê!

Qualquer pessoa agradecerá a emoção que lhe causa visitar um ateliê: estudantes,

critic@s e curador@s, pesquisador@s e, claro, o público (ativo e passivo). Zona

hospitaleira onde se pode conversar, mostrar obra e vender, é precisamente aqui, em

encontros cara a cara, onde se estabelecem as interlocuções mais significativas, aquelas

que acrescentam substância à nossa lida. Esta zona deve cumprir os seguintes requisitos:

Proximidade ao espaço de armazenamento (muito importante), para não andar

correndo de um lugar para outro arranhando obrinhas, obras e obronas.

Espaço suficiente para permitir a contemplação mais cômoda possível da obra.

Boa iluminação, necessária para banhar de luz a obra que queremos mostrar.

Muito cuidado com focos incandescentes porque dão uma luz muito amarela, que

pode deformar as cores da obra. O ideal é balancear luz incandescente com

fluorescente.

Mobiliário e/ou suportes para exibir a obra uma por uma (cavaletes, “tesouras”
para expor obra não emoldurada, tamboretes de leitura etc., sem esquecer mesa de

luz e/ou projetor de slides e tela, para estudar transparências). Com moveis

cômodos (sofás e poltronas) e mesa de centro para mostrar nossos livros e

catálogos, e claro, pôr os refrescos de cortesia. É recomendável contar, além disso,

com equipamento de vídeo e de som; o primeiro para mostrar mais a obra, o

segundo para passar um momento agradável.

Não se deve esquecer que o nosso ateliê precisa ter:

Acessos generosos (portas, janelas, garagem... na mesma rua) para não termos

problemas na hora de colocar e tirar materiais, maquinaria e obras de formatos maiores.

Sistema de cabos elétricos capaz de suportar cargas variáveis.

Iluminação apropriada (tubos de néon branco balanceados com luzes amarelas e azuis,

spots, etc.), contatos suficientes para não ter que improvisar.

Tomadas especiais (talvez até para corrente trifásica) prevendo a possibilidade de usar

alguma vez máquinas, ferramentas (serras, tornos, etc.).

Alimentação de água e drenagem apropriados.

Ventilação até o exagero: em geral nós artistas descuidamos dos gases, eflúvios e pós que

o nosso trabalho causa, e com freqüência padecemos de males que poderiam ter sido

evitados.

Entre dizer e fazer hà que caminhar


Um ateliê tal qual se descreve acima pode parecer um sonho, uma loucura inalcançável;

mas só para quem desconhece as veredas da profissão. Profissionais que somos (ou

queremos ser), nossa obrigação é fixar como meta clara, imediata, a obtenção de um

espaço que, embora reduzido, nos permita trabalhar, expor e vender da maneira mais

cômoda possível. Não se pode esquecer nunca que... Quanto maior a produção, maior a

projeção!
35

Existem somente dois caminhos para resolver o problema: improvisar com engenho para

redesenhar o lugar que no momento utilizamos (o quatro ou a sala? O quarto de serviço?

A garagem?), ou ainda alugar um lugar que seja o maior possível. Ambas as opções têm

seus prós e seus contras.

Projeto integral/ergonômico em pequenas dimensões


Um dia, hà muitos anos, viajei para Nova York (alguém lembra aquela cidade, que um

dia foi a capital da arte?). Entre as amizades que fui visitar havia um casal de artistas,

ambos sul-americanos, que vivia em um pequeníssimo apartamento em Greenwich Village

(ah! Que tempos aqueles!). O lugar era longo e estreito, mínimo!, como dizer que era quase

tão estreito como a única janela que dava para a rua. O singular é que ali viviam, ali

trabalhavam, ali recebiam visitas. Evidentemente, era um espaço de usos múltiplos, pois

haviam resolvido sua aglomeração da maneira mais imaginativa.

Em um extremo, graças a um engenhoso sistema de rodas e polias, a cama podia ser

elevada até o teto para abrir espaço a uma mesinha, que por sua vez saía de um armário

colado à parede. No outro extremo do apartamento estava à mesa de trabalho que ambos

usavam, cujo tampo se levantava para descobrir o espaço no qual guardavam papéis,

tintas, brochas, canetas e tudo muito arrumado.

Eu mesmo, quando alguma vez soltei as amarras e me atirei às léguas, viajava com um

velho baú de marinheiro, de 73 centímetros cúbicos. Ao abrir sua tampa, se despregava

uma mesa cujas “pernas” eram dobráveis (como a porta de um elevador antigo). M ais

abaixo, em prateleiras dobradas como uma caixa de ferramentas, havia os trecos e

cacarecos, cadernos de desenhos, pincéis e tintas e caixas de aquarela, todo o necessário

para produzir onde quer que me encontrasse. Quanto ao escritório, pois, um laptop era

mais do que suficiente.

Isto, creio, pode dar- nos uma idéia de como redesenhar o espaço que ocupamos neste
momento, e incluir pelo menos alguns dos elementos mais importantes acima enumerados.

Não se pode esquecer ter sempre à mão o que usamos com maior freqüência, para evitar

que nos escapem idéias... Das quais vivemos.

Dividindo espaços (civilizadamente)


Muito melhor que trabalhar em espaços reduzidos e enclausurados é criar no amplo. A

tão cobiçada zona baixa de M anhattan, ao sul da Avenida Houston (hoje conhecida como

Soho) se transformou a meados dos anos 70 de um setor dominado por fábricas de

roupas, em um empório de prósperas galerias, lojas muito chiques, bares e cafés. Tudo

começou quando um punhado de artistas pragmáticos se instalou em velhas fábricas que,

obrigadas pelos novos regulamentos, iam abandonando a ilha, deixando para trás

edifícios inteiros, de oito, dez, e até quatorze andares, totalmente vazios.

Estou falando, claro, dos famosos lofts, cuja ocupação e transformação em ateliês de

trabalho foi se dando em crescente, a ponto que @s marchands e representantes,

curadores/as, clientes e demais parentes que visitavam os artistas em seus novos

estúdios, viram que o mais prático era abrir suas lojas e galerias perto de seus clientes e

provedores. O resto é história, um fenômeno que se estende cada vez em mais cidades do

mundo.

A concentração de artistas, galerias e lugares de reunião em um só lugar não é novidade.

O bairro Montparnasse, em Paris, outrora caldo de cultivo de idéias e do comércio

cultural, continua sendo um modelo a seguir. Um dos bemóis do fenômeno é que esta

dinâmica conduz ao encarecimento dos imóveis. Da mesma forma que em Chicago, na

parte oriental de Berlim, La Condesa na Cidade do México, Vila M adalena em São

Paulo, onde no início dos anos 90 os aluguéis baratos congregaram a gente de todas as

disciplinas, agora jà não convém mudar- se... Sic transit gloria mundis. M as sempre haverá

outras paragens baratas e práticas em uma urbe. Não obstante a isto, @s artistas
37

sagazes reconhecem as regras de ouro no que se refere a seus espaços:

1) Procure não trabalhar dentro de casa (demasiadas distrações, demasiadas

restrições);

2) Procure sempre contar com espaços o mais amplos possíveis;

3) Se não é possível ficar sozinh@, cerre filas com outr@s!

Dividir é abater gastos fixos (aluguel, luz, água e manutenção). M a s dividir é também

conviver. Daí que, para colocar-se de acordo com três, quatro, quiçá até mais colegas,

seja necessaríssimo estabelecer certos alinhamentos para a convivência. Há, de antemão,

normas que devem ser consideradas tanto no que diz respeito à prática tanto quanto no

que diz respeito à ética:

Acordos práticos para a convivência


Á procura do espaço ideal:

A tarefa de encontrar um lugar ideal deve ser decidida entre todos os citados cúmplices.

Falar é fácil, mas não se pode esquecer que todo grupo se divide em dois tipos de pessoas,

as ativas, que fazem tudo sem se abalar, e as passivas, que fazem pouco ou nada.

Para começar, o grupo em seu conjunto terá que determinar em que parte da cidade

quererá procurar (quanto menos central, mais barata). Consultam-se as seções de

classificados da imprensa, indaga- se entre as amizades, mas, sobretudo se procura rua a

rua pessoalmente. A tarefa é tediosa e pode ser delegada a um dos colegas, sempre e

quando se anuncie como este será recompensado por fazê-lo.

É obvio que quanto mais pessoas se unam para dividir, maior deverá ser o espaço, e a

regra de ouro diz: quanto maior espaço, menor é o aluguel por metro quadrado.
U MA DICA: Acontece que em quase todas as cidades existem imóveis que são de

propriedade da prefeitura. Vale a pena começar por ai, já que por se tratar de artistas e

com a intenção de dar uso a grandes espaços, as autoridades locais costumam assinar

com gosto contratos de comodato (empréstimo ao invés de aluguel).

Responsabilidades legais:

Logo após a aprovação por consenso do espaço ideal, vêm as primeiras complicações. A

menos que o grupo se registre como associação (possibilidade que não se pode descartar),

alguém do grupo terá que se encarregar de negociar contratos: de luz, telefones e aluguel,

seja esta de comodato ou não (por um ano? por cinco?), para o qual se requererá algum

aval e com toda probabilidade, um depósito.

@s compartilhantes precisam estabelecer por escrito que se responsabilizam por igual

ante seu aval pela duração do contrato; que o depósito será pago em partes iguais e que

todos se encarregarão dos pagamentos mensais do aluguel, água, luz, telefones, e

dependendo do caso, certos impostos como o IPTU ou contribuições.

Prevendo a eventual dissolução da associação, os membros do grupo terão que assentar

por escrito como adquirirão os bens que lhes serão comuns (muros divisórios, instalações

elétricas, encanamentos, móveis e ferramentas divididas, etc.) e como procederão para

distribuí-los e terminar em paz.

Tudo, eu repito, por escrito e assinado. Contas claras e amizade longa.

Acordos éticos:

Tão ou mais importante que os acordos práticos são os acordos éticos que precisam ser

estabelecidos desde o princípio da associação. Trata- se de normatizar a convivência diária

entre pessoas com hábitos muito diferentes de vida e trabalho. Se para sua própria
39

comodidade alguém decide trazer, por exemplo, uma cafeteira ou uma geladeira, será ela

de uso exclusivo ou compartilhado? No último caso (o mais sensato), deve-se então

determinar como a usarão os demais. De fato, comprar um pacote sempre baixa custos

(seja café, comida, telas ou tintas).

As formas de compartilhar devem ser definidas com clareza, generosidade e sensatez. O

mesmo se aplica a coisas intangíveis como o tempo e os comportamentos de cada um, que

exige pequenas e carinhosas regras para não incomodar ao próximo.

Finalmente, os espaços compartilhados podem ser utilizados não só para criar, mas

também para expor e realizar eventos públicos coletivos. Mil e uma experiências em todo o

mundo demonstram que o impacto de artistas unidos é sempre maior que a soma de suas

partes.
III – OS TEMPOS DA PRODUÇÃO ARTISTICA
De quão simples é encontrar soluções imediatas
e mediatas para redesenhar os tempos disponíveis,
necessários para produzir.

Quando você sonha, quando você sonha?


Apresento o seminário “A arte de viver da arte” no México e no exterior há mais de vinte

anos. Uma das primeiras perguntas que faço aos participantes é: “A que horas vocês

trabalham para criar suas obras?” Quase sem exceção me respondem “à noite!”

Compreensível, pois quem se inscreve em um seminário é, precisamente, gente que quer

aprender a viver de sua obra, quer dizer, pessoas que desempenham dois ou mais

trabalhos para manter-se na superfície.

Como conseqüência, produz suas criações no tempo livre que lhe resta! Tempo geralmente

noturno.

Artistas ativos, ou seja, criadores/as de período integral conhecem bem quando produzem

melhor, a que horas as idéias lhes ocorrem, em que momento do dia ou da noite podem

entrar em transe e trabalhar sem se cansar e até resolver a obra. São marés internas que

nos animam para ditar quando estamos “em baixa” ou “em alta”, o que alguns

estudios@s de comportamento humano chamam “ritmo biológico”, ou “biorritmo”. Aqueles

que produzem aos poucos, em impulsos esporádicos, poucas vezes chegam a dar- se conta

que se devem criar quando estão “em alta”.

Uma maneira de resolver o problema, uma medida tática em nossa estratégia para viver

da arte, é não procurar ocupações alheias à própria que nos distraiam em tempos de

maior criatividade. O ideal, é claro, é não trabalhar mais que em sua própria obra. Assim

chegamos a reconhecer os momentos do dia de maior intensidade criativa e parcelar as

horas: umas (as altas) para desenhar, pintar, o que é muito importante, conceber idéias;
41

outras (as baixas) para nos administrar e cuidar de assuntos vindos do mundo externo,

como preparar uma palestra, arrumar a casa ou o carro ou desempenhar a função de

professor.

Há muitos artistas, é claro, que enriquecem a vida com atividades complementares, e para

os de mente aberta, estas adições também são medidas táticas. Conheço desenhistas que

estudam as cactáceas com a mesma seriedade (e talvez maior acerto) que muitos

biólog@s. O Dr. Atl se converteu em eminente vulcanólogista, José Fors faz bicos com

grande sucesso como músico, eu mesmo divido tempos iguais entre o visual e o literário.

O assunto aqui é reconhecer a necessidade de arrumar tempo para não se perder em

distrações que impedem nosso desenvolvimento.

A agenda de bolso
Hoje é impossível funcionar de modo profissional se não distribuímos as horas da vida.

Para isto serve a agenda, ferramenta de enorme utilidade. Muit@s a usam como parte

de medidas táticas que traçam para, em sua estratégia, alcançar a meta. O que

surpreende é o mau uso que fazem da mesma: saem de casa ou do ateliê ao vasto mundo,

agenda na mão (bom, na bolsa), e passam anotando com muita diligência quantos

encontros apareçam ou lhes atraia. Muito organizad@s e formais cumprem

pontualmente com seus compromissos. No entanto, terminam descobrindo com grande

perplexidade que “nunca têm tempo para nada”! Por muito simples que pareça, o

problema da falta de tempo não se resolve e continua supurando.

Parecerá uma trapalhada, mas quantos de nós, pelo simples fatos de saber-nos artistas,

esquecemos de anotar nossos próprios dias para criar?

Quem precisa controlar a agenda não é o mundo exterior, mas nós mesm@s! Dito em
outras palavras, a agenda deve ser utilizada como ferramenta de controle e proteção, deve

servir-nos em primeira instância para poder cumprir com os compromissos que nós

mesm@s nos determinamos. Só então a presença de terceir@s pode ocupar nosso tempo.

É recomendável determinar a semana em que enfrentamos, mais tardar à tarde do

domingo anterior, e marcar com precisão que dias, que horas dedicaremos no curso da

próxima semana a: 1) nossa produção; 2) nossa administração; 3) nosso lazer (á nossa

vida familiar!). Com base nessas anotações poderemos então ir acomodando nas lacunas

que ficam, aqueles compromissos que surgem do mundo externo ao longo da semana.

Não se pode esquecer que a agenda bem utilizada (boa tática) se converte também em

diário de bordo. Daqui a muitos anos, quando alguém quiser organizar uma

retrospectiva de nossos trabalhos, quando nos visite uma historiadora francesa ou um

sociólogo uruguaio trazendo-nos fatos que já quase tínhamos esquecido... Bom, todos

sabemos como são importantes os diários na hora da verdade. Essa verdade tem que ser a

nossa verdade.

Ah, sim... pontualidade!


@s artistas temos a reputação de sermos bagunceiros e impontuais. Ainda que nunca nos

traga malefícios o glamour que nos rodeia, baseado em nossos horários e nossa forma de

vestir (como não vamos andar com a roupa manchada de pigmentos, se isso é o que

fazemos!), existem aspectos da lenda maldita que nos colocam em plena desvantagem.

Atrasar- se no primeiro encontro com a diretora do museu, com o coordenador de uma

bienal, com qualquer funcionári@ cultural, inevitavelmente, nos debilita e lhes dá margem

para recusar um projeto, ou pelo menos para desconfiar de nós. Da mesma forma,

chegar na hora (ou antes, se possível) serve muito para colocá-los na defensiva: sua

desculpa, por muito automática que saia, valerá como ponto a nosso favor.
43

Ser pontuais nos dá tempo para transferirmos ao território conceitual da pessoa com quem

vamos tratar e, no processo, armar melhor nossas alegações. Trata- se sempre de alcançar

nossas metas .

...e o caderno de contatos


A outra parte de toda boa agenda é o caderno telefônico, que devemos ir armando como

extremo cuidado, dia a dia, para não desperdiçar as mil e uma possibilidades que nos

permitirão operar com profissionalismo.

Que fazer para não nos desconectarmos quando nos roubem a bolsa ou o port-fólio,

quando esqueçamos a agenda numa cabine telefônica, no banheiro de um cabaré ou no

ônibus? Devemos criar um fichário.

É preciso começar e agora! a transferir os nomes, endereços e telefones a cartões a serem

guardados num fichário, que deve estar sempre no escritório, perto do telefone. (Uma

versão do fichário deve existir também no computador).

Eu sei, eu sei. O simples fato de pensar em fazê-lo dá preguiça, mas sem um fichário

ninguém, nem @s artistas, podem funcionar. M ais adiante falarei deste fichário e de

como dividi-lo; enquanto isso, darei uma simples recomendação: para evitar as terríveis

soçobras do isolamento que causa a perda da agenda, deve-se foto copiar (xérox ou

scanner) suas páginas cada três ou quatro meses e guardar as cópias enquanto não se

começa a fazer as fichas.

O calendário na parede
O prolongamento direto da agenda é o calendário de parede que se pendura sempre no

lugar mais visível do ateliê ou, melhor ainda, do escritório. Pode-se traçar um à mão, mas

há papelarias que vendem calendários de trabalho mensais, semestrais e anuais. Para


mim sempre foi mais prático o anual, pois permite visualizar planos de médio e longo

prazo.

Enquanto a agenda serve para controlar encontros e situações imediatas, o calendário de

parede é útil para organizar universos de trabalho mais complexos, como para projetos

criativos específicos, o planejamento de uma exposição de museu ou a programação de

uma mostra itinerante.

Nos países desenvolvidos, quem se encarrega de boa parte dessas funções operativas são

os representantes e/ou donos de galeria com quem o artista assina contrato de

exclusividade. Nem o México ou Brasil, nem o resto da América Latina costumam manter

essas relações tão úteis, o que nos obriga, a nós artistas, a fazê-lo nós mesm@s.

Cronologias regressivas
No calendário de parede se marca a data de inauguração de uma exposição. M a s a

abertura não é tudo. É preciso cuidar do sucesso de sua permanência, portanto, devem-se

consignar, em ordem cronológica regressiva, outras datas- chave que assegurem que tanto

a inauguração como os dias que durará a obra exposta cumprira bem sua função:

Em que dia se transportará a obra à galeria ou ao museu; e antes disso,

Em que dia se entregará o catálogo à imprensa, mas antes disso,

Quanto tempo demorará em ser editado o catálogo, mas ainda antes disso,

Em que dia devem-se entregar os textos e as fotos do catálogo, e antes disso,

Em que dia devemos emoldurar a obra (e quantos dias demoram em fazê-lo), e antes

disso,

Em que dia deverá ser fotografada a obra (levando-se em consideração que se a obra é

sobre papel ou fica atrás de um vidro, sua foto deve ser feita antes de emoldurá-la... e

levando-se em consideração o tempo que o/a fotógraf@ levará para revelá-la e entregá-la)
45

e... Bom, para que continuar se já deu para entender.

Tempos e temporadas
Se a economia do país se dinamiza no rumo do final do segundo semestre e aumenta o

fluxo de dinheiro, o lógico é apresentar as exposições mais importantes nessa época, senso

comum posto em prática. Daí que, há muito tempo, as cidades mais importantes do

mundo estabelecem uma temporada de exposições, temporada esta que começa na segunda

quinzena de setembro e termina na primeira quinzena de dezembro. É quando se

inauguram salões nacionais, apresentam-se mostras coletivas de alto calibre e maior

envergadura, e o público pode ver as grandes propostas individuais.

As galerias privadas mais sagazes, em especial as corporativas, procuram sempre

programar mostras paralelas: se o Museu Tal Qual anuncia que apresentará uma mega

exposição de pinturas à óleo de Fulan@, ou de instalações de Beltran@, a galeria

apresentará a mostra da obra mais vendável desses mesm@s artistas: desenhos e

guaches, projetos desenhados, maquetes e outras coisas.

Do mesmo modo que há um tempo para expor, também há o tempo para produzir: a

temporada de produção costuma ser, por conseguinte, de janeiro a meados de agosto,

meses que também são dedicados a@s artistas emergentes que, ao emular as ações da

grande temporada, aprendem a escaldar- se nessas lidas.

São também nesse período que se pactuam convênios, se organizam calendários e se

estabelecem planos de trabalho para o resto do ano e os que estão por vir.

Planejar é adiantar- se para que as coisas saiam melhores. Não se pode esquecer que @s

críticos, pesquisadores/as e poetas encarregados de escrever textos que acompanham a

mostra necessitam tempo para contemplar as obras e depois redigir seus textos...
Rapadura é doce, mas não é mole não! Quanto mais tempo lhes dermos a esse pessoal de

apoio direto (PAD), melhor sairá o texto que nos escreverão. Se tais escritos não saírem a

tempo será difícil para os repórteres e cronistas (também PAD, lembra?) redigir a

informação.

Em relação à maneira de nos movermos no tempo, creio que o mais importante é reconhecer

que temos uma única oportunidade para vivê-lo. Não existe assunto que mereça nosso

tempo se este não pode estimular nossa imaginação e enriquecer nossa tarefa criativa.

Os bloqueios
Há ocasiões em que “as musas se esquecem do artista”, quando simples e absolutamente

não nos ocorre absolutamente nada, por mais que folheemos livros de arte e conversemos

com os colegas. Estes períodos de vazio duram poucos dias, quando muito um par de

semanas. M as há ocasiões que, por qualquer motivo, esses períodos chegam a se

prolongar por meses. Então começamos a nos deprimir, certo de que perdemos o “dom”.

Alguns artistas ficam tão espantados que cheguem a extremos como o suicídio ou a

política.

Tod@ criador/a profissional sabe que os ditos bloqueios são coisas comuns; aparecem

quando existe algum problema de saúde ou financeiro, ou em momentos da vida que

sentimos que ninguém nos nota e temos a impressão que nossa obra não repercute em

nosso âmbito.

Saber que quase todo artista sofre deles periodicamente e que logo desaparecem é

importante para não se mortificar demais e colocar o sol no mau tempo. No entanto, é

simples combater um bloqueio se aprendemos a arquivar de modo organizado as idéias!:

as anotações, os esboços e os mil e um projetos que nos vão surgindo dia a dia e para os

quais nunca temos tempo suficiente. Chegado o tempo de secas, um bom banco de idéias
47

pode ser a nossa salvação.

Finalmente uma fábula que me chegou por e-mail:


Isto me chegou por e-mail. É de um curso de gestão empresarial para aproveitar melhor o

tempo.

Um assessor de empresas especialista em gestão de tempo quis surpreender os

assistentes de sua conferência.

Tirou de debaixo da escrivaninha um grande frasco com uma larga boca. Colocou-o sobre

a mesa, junto com uma bandeja com pedras do tamanho de uma mão e perguntou:

– Quantas pedras vocês acham que cabem neste frasco?

Depois que os assistentes fizeram suas conjunturas, o visitante começou a colocar as

pedras até que encheu o frasco. E em seguida perguntou:

- Está cheio?

Todo mundo olhou e assentiu. Então ele tirou de debaixo da mesa um cubo com cascalho.

Pôs parte do cascalho no frasco e o agitou. As pedrinhas penetraram pelos espaços que

deixavam as pedras grandes. O especialista sorriu com ironia e repetiu:

- Está cheio?

Desta vez os ouvintes duvidaram, talvez não.

– Bem! – disse o homem, e pos à mesa um cubo com areia, que começou entornar dentro do

frasco. A areia se infiltrava nos pequenos espaços entre as pedras e o cascalho.

- Está cheio? – perguntou de novo.

- Não! – exclamaram os assistentes.

- Bem! -, disse e pegou uma jarra com água e começou a vertê-la no frasco. O frasco ainda

não transbordara.

- Então, o que demonstramos? – perguntou.

Um aluno respondeu: - Que não importa o que enche sua agenda, se você tentar, pode
sempre fazer que caibam mais coisas.

- Não – concluiu o especialista. O que esta lição nos ensina é que se você não coloca as

pedras grandes primeiro, nunca poderá colocá-las depois.

Quais são as grandes pedras? Seus filhos, seus amigos, seus sonhos, sua saúde, sua

pessoa amada? Lembre-se, coloque-as antes. O resto encontrará seu lugar.


49

IV. ESTRATEGIAS E TATICAS


De certas chaves contidas na
historia da arte e no senso comum (outra vez),
onde, além disso, se fala de tomar “a Alternativa”.

Medicina, tauromaquia3 e gastronomia?


O maior desafio que a vida nos brinda, a quem gosta de desenhar ou pintar ou modelar, é

decidir ser ou não ser artista. Traduzindo, quer dizer: viver ou não de nossas criações.

Não é a mesma coisa pintar nas horas vagas, que exercer a disciplina da arte da mesma

maneira como fazem @s médic@s, @s biolog@s ou @s astronautas: todos os dias de

suas vidas.

Existem mães que sabem como cuidar de expectorações, diarréias, sarampo, catapora e

tudo o que atacar seus pimpolhos, com muita perícia. Daí a considerá-las médicas, no

entanto, é um grande passo.

As pessoas que se inscrevem em meus seminários vêm de todos os tipos de vida e

representam um leque muito amplo de pessoas. Todas professam um grande amor pela

arte. Existem pessoas que gostam só de “desenhar” e outr@s que levam anos fazendo

cerâmica ou pintando. Também existem pessoas que, muito de vez em quando, apresentem

uma exposição. A maioria tem a (muito equivocada) crença de que assim é a vida, pensam

que “as musas nos visitam de vez em quando”, ou que “a arte e o dinheiro são como água

e óleo”, e conseqüentemente se condenam a vagar pela vida pintando suas coisinhas,

estampando suas gravurinhas, esperando – em vão – “serem reconhecid@s”.

Gostar de artes plásticas como passatempo e exercê-las de modo profissional são coisas

muito diferentes. Para ilustrar a diferença, costumo comparar as artes visuais com três

atividades que tod@s conhecemos muito bem: além da medicina, há semelhanças com a

tauromaquia e a gastronomia.
3 do Gr. tauromachía < taûrós, touro + mácre, combate; s. f., arte de tourear.
Como já havia dito, se comparamos nossa profissão com a medicina, podemos vê-la como

um território com muitas especializações. Assim como há médicos que se especializam em

pediatria, geriatria ou neurologia, há artistas que se especializam em desenho, em

pintura ou em videoarte. M as também como há médicos gerais, que sabem, da mesma

forma, cuidar de um braço quebrado, assistir um parto e curar uma infecção de pele, há

artistas gerais que sabem gravar, que pintam murais em afresco e, além disso, esculpem.

Entendido isso, se poderá identificar como artista gravurista, ou artista instalador/a, ou

ainda como artista a secas (ou seja, geral), com o que talvez consigamos evitar que as

pessoas lhe digam “pintor” a um/a escultor/a que em sua vida usou um pincel para

pintar um quadro.

O momento da decisão
Só os deuses sabem o que nos pica quando nos apaixonamos pelos touros. Passa o tempo e

nos familiarizamos com a tauromaquia, sua história e suas diversas escolas, aprendendo

a conhecer as diferenças entre um e outro tipo de gado. Temos matadores preferidos e

reconhecemos as sutilezas dos distintos passes. Uma ou outra pessoa decide ainda muito

jovem, a entrar seriamente no mundo dos touros e, depois de intensos anos de treinamento,

converte-se em novilheiro, lidando com novilhos de praça em praça, recebendo chifradas e

aplausos. Chegada a hora que a tradição estabelece, todo novilheiro enfrenta a decisão

mais transcendente de sua vida na Festa: tomar ou não A Alternativa.

Não se trata de um curso medido em semestres nem há exames em grupo. Nada disso. A

alternativa é uma decisão que cada novilheiro enfrenta na solidão. Há quem opte por

deixar as coisas como estão. Nunca se distanciam da Festa, mas passam a converter-se

em monosábios (assistentes) ou em publico cativo.


51

@s que decidem continuar, por sua vez, buscam padrinhos, que em uma tarde gloriosa,

lhes outorgam A Alternativa! Dai para frente serão toureir@s. Farão exatamente o que

faziam antes, só que agora nas grandes temporadas, diante de platéias muito maiores,

em todas as arenas do mundo hispano-falante. Também ganharão muito mais.

Um/a bom/a artista pode ou não se formar na academia, mas a todos chega o dia de

decidir: ou tomam a alternativa e se profissionalizam.

A diferença está radicada na visão que temos da arte. Quem insiste em crer que não se

possa viver da arte, fica como simples taurófilo. Quem entende que há que emular os

passos d@s artistas que sobressaíram em todas as épocas será matador/a.

Questão de graus
Finalmente, as artes plásticas podem ser comparadas à gastronomia: não é a mesma

coisa ser cozinheir@ que ser chef. Como cozinheiro a pessoa pode ser maravilhosa, mas

aos olhos (e paladares) de um limitado círculo de gente, quando muito. Ser chef implica

não só saber cozinhar e planejar menus, mas também organizar um exército de

cozinheir@s, ajudantes e garçons, encarregar- se de aquisições e do controle de qualidade,

organizar festivais e mil coisas, todas para satisfazer diariamente a exércitos de

comensais.

Há artistas que decidem trabalhar a vida inteira para satisfazer aos gostos de um

círculo limitado de amizades, para quem produz obras de pequeno e médio formato. E há

artistas que optam por trabalhar em grande escala e uma grande quantidade de obras

para o qual devem projetar- se nacional e internacionalmente.

Cada um escolhe seu cada qual.

Quem falou de exércitos?


Como acima mencionei a palavra “exércitos”, talvez seja o momento certo para fazer uma

última comparação. Todo general (tod@ executiv@, tod@ pensador/a) sabe qual é a

diferença entre estratégia e tática. Estratégia é a arte de elaborar ou empregar planos e

estratagemas para alcançar um objetivo; tática é a arte ou habilidade para empregar os

meios necessários para alcançar esse objetivo. Em outras palavras, elaborar uma

estratégia é fixar uma meta, conceitualizá-la e defini-la. Só assim se pode proceder às

medidas táticas necessárias para cumprir a estratégia.

Com grande precisão define o General Vallarta Cecena: “Ao iniciar uma guerra as

estratégias fixam um objetivo e os interesses que esperam conseguir ou manter nos quatro

campos do poder: político, econômico, social e militar. Depois de fazê-lo e conhecendo seu

poder nacional, e em seu caso, e o de seus possíveis aliados, elaboram os planos

respectivos para combater a capacidade, ameaça e danos que o inimigo pode provocar-

lhes, para mais tarde impor-lhes sua vontade. Nos planos se estabelece quando e como se

devem desenvolver as operações correspondentes”.

M al faria um/a artista em desdenhar o conceito: hoje em dia, tudo parecia conspirar

contra o avanço das artes (e dos artistas), e em especial, de todo aquilo que signifique

avanços de cultura.

Tod@ profissional da arte trabalha com base em estratégias, de curto, médio e longo

prazo. Ora uma série de monotemática de óleos de grande formato para, dentro de três

anos, mostrá- los em um museu brasileiro, ora conceber uma performance com nove anões e

uma girafa, de uma hora de duração, para um encontro internacional por realizar-se na

Austrália no ano que vem.

Cada estratégia requer passos táticos: se nosso espaço de trabalho é pequeno demais,

teremos que localizar e alugar um lugar especial para pintar esses quinze quadros de
53

formato monumental, para o qual será necessário procurar com tempo um financiamento

em seis fundações; além disso, é preciso estabelecer prazos-limite e assinar contratos com

o museu brasileiro. Ou ainda, para reunir aos nove pessoas de estatura mínima, deverá

publicar anúncios nos jornais de Sydney; enquanto isso se deve solicitar com meses de

antecipação o empréstimo da girafa a um zoológico australiano. Se não se pensa nos

passos táticos necessários, nossa estratégia não terá servido de nada, posto que será

impossível cumprir.

Para acabar logo: de onde surgiu a palavra “vanguarda” se não do mundo militar? De

fato a palavra contém todas as conotações para cumprir com seu uso. A vanguarda é

formada por aqueles soldados que, de maneira irregular, são enviados pelo general muito

além da fronte a explorar o território desconhecido. Com o relato dos sobreviventes que

regressam, o general planeja as medidas táticas necessárias para sua estratégia, que é

ganhar!

As vanguardas artísticas de todos os tempos são constituídas por artistas que se

adiantam com o objetivo de ajudar aos que vem atrás a avançar até consolidar novas

conquistas estéticas. Os estropiados sobreviventes do pelotão vanguardista às vezes

recebem sua medalhinha. Os méis da glória, no entanto, são para o general e seus

coronéis. Assim na guerra como na arte.

Se se compreende que a estratégia é a decisão de converter-se em toureir@, e os passos de

novilhada que se tomam para consegui-lo são táticos, então também se compreenderá que

se a estratégia é a decisão de profissionalizar- nos como artistas, a tática serão os passos

que devemos levara cabo para prosperar. Estudar este livro/manual, fazer a tia rica

apaixonar-se por você, jogar na loteria ou exibir nossa obra para sua venda dentro do

próprio ateliê, todas podem ser medidas táticas.


A chave para sobreviver e prosperar
Como se poderá inferir desde as primeiras páginas deste livro, a chave para sobreviver e

prosperar como profissional visual ancora-se num poderoso impulso: decidido@s a

dedicar a vida às artes visuais. Devemos aprender a traçar- nos estratégias e, como

conseqüência imediata, a definir as medidas táticas necessárias para cumpri-las.

Não há uma única estratégia de vida. Podemos definir uma para seguirmos adiante com

nossa obra, outra para dar aulas sem ser empregado de uma escola, outra ainda para

conquistar a pessoa que amamos. Há, como já disse, estratégias de curto, médio e longo

prazo, mas também há estratégias que, ao cabo de um tempo de prova, terão de ser

descartadas.

Finalmente, todo bom estrategista sabe que perder uma batalha não significa perder a

guerra; e que não existe pior luta que aquela que não se faz. Há quem perca uma

escaramuça de propósito para confundir o inimigo e no final, aniquilá-lo, como pode

acontecer na hora de buscar fundos para realizar algum projeto.

Como conseguir bolsas, estímulos e residências


Todo ano, os jornais publicam editais que as instituições públicas lançam (e uma ou outra

privada) e que oferecem bolsas para desenvolver algum projeto. As bases estabelecem

claramente o prazo final para entregar as solicitações. É quando começa a contagem

regressiva do relógio e o galinheiro alvoroça-se. @s artistas, então, recortam o anúncio,

colocam-no em sua mesa de trabalho ou pregam na parede, enchem-se de esperanças e

sonham no que aconteceria se ganhassem o dinheiro. Às cinco para o meio-dia (quer dizer,

três, dois, um dia! antes de vencer o prazo de entrega), põem-se a armar sua solicitação.

Um minuto antes de fechar, chegam patinando na décima primeira hora, suarentas,

pasta na mão, olheiras profundas e cabelo em pé, e o tumulto se forma na recepção. Logo
55

voltam a suas casas (poucos tem o próprio ateliê, claro, por isso pedem bolsas) e se

sentam em um cantinho obscuro para comer as unhas e esperar que se publiquem os

resultados.

As estatísticas são inclementes: dos muitos solicitantes, só alguns resultam agraciados.

@s demais continuam a sentir-se rejeitados, deprimem-se, caem na melancolia. Vários

rasgam suas roupas, chupam o dedo, cobrem-se de cinzas e há quem se enforca na

própria gravata. A maioria rejeitada vê como se confirmam suas piores suspeitas e se

lança em acusações aos quatro ventos: “Marmelada!” gritam despeitad@s. “Cartas

marcadas! Discriminação!” “Corrupção!” O que aconteceu na realidade é o que a maioria

dos solicitantes rejeitados não definiu nem sua estratégia muito menos sua tática, e que

ao perder uma das tantas batalhas, sentem que perderam a guerra.

Este assunto não é como uma loteria, que depende da sorte! Os membros de um júri nunca

fecham os olhos, metem a mão num saco e tiram o numero da pasta para “premiá-lo”.

Trata- se de um concurso cultural de arte, como tantos outros no mundo; que procura

estimular, com uma espécie de estipêndio, o talento e o propósito, atributos que tod@s @s

rejeitad@s, sem exceção, estão cert@s de ter. Talvez os tenham. O que não tem é o senso

comum necessário para reduzir as probabilidades de rejeição ao mínimo.

Sim, porque não se incomodam em informar- se sobre os operativos aplicados para

distribuir o orçamento em bolsas; porque não sabem como se constituem ou mudam, ano

após ano, os jurados qualificadores; porque não se aplicam com disciplina para

desenvolver um projeto ganhador nem fazem bem as suas contas; porque não reúnem

corretamente os materiais solicitados (CV, fotos, textos etc.). Muitos solicitantes sequer

são artistas, mas sim desenhistas gráficos, mergulhadores, arquitetos, astronautas e

coisas do estilo, e o que é pior, chegam sempre na última hora! Exemplos perfeitos de más

táticas.
Cinco passos para conseguir uma bolsa
1. Estar preparado de antemão

Ler com muito cuidado todos os pontos enumerados pelo edital e segui-los ao pé da letra

parece óbvio, mas pouc@s o fazem. Só assim saberemos se nos convém ou não as

condições oferecidas pelas instâncias convocantes e se realmente queremos solicitar o

oferecido.

Se estivermos atentos (e se pedirmos informes em instituições e fundações nacionais e

estrangeiras, embaixadas, consulados, etc.) veremos que os editais em todo o mundo

são cíclicos: ano após ano lançam-se e outorgam-se nos mesmos meses. Portanto,

nosso calendário de parede deve ostentar os períodos anuais de convocatórias de modo

que, chegado o dia em que se anunciam, tenhamos tudo pronto para armar nossa

solicitação e sermos os primeiros a entregá-la.

A última observação é muito importante: cada inscrição recebida (não, não são

“aplicações”, só falam assim aqueles que falam mal o português e pensam “to apply

for”, em inglês) é numerada em ordem de recepção. Ao jurado entregam caixas cheias

de pastas numeradas em quantidades que podem passar de três dígitos. Então, cada

membro do júri se senta e os lê um por um, um após o outro. O processo fica

complicado e tedioso: se estudam os antecedentes de cada solicitante, se olham as

fotos, se lêem as propostas e então se pondera e qualifica ponto por ponto. @s

jurad@s começam fresc@s e terminam cansad@s; quero dizer que são mais atent@s

se a solicitação é bem feita!

2. Conceber um projeto concreto, em termos claros.

A lógica continua sendo inexorável: se solicitamos fundos para algo nebuloso, seremos

rejeitados. É aqui que se põe à prova a habilidade – que devemos desenvolver – para

verbalizar nossa obra e sintetizar sua explicação de modo que qualquer pessoa, seja ou

não membro do júri, nos entenda. Não se pode esquecer que o que dizemos é cotejado
57

com fotos de nossa obra. Se há coerência, sobem as probabilidades de sermos

beneficiad@s. O xis da questão é não somente participar, mas puxar para ganhar!

3. Proporcionar de maneira impecável os materiais solicitados

M ás fotos, fotocópias borradas, erros tipográficos e gramaticais nos textos, CDs ou

DVD mal feitos, etc., tudo vai descontando pontos.

4. Evitar solicitar cartas de aval na última hora

Não podemos impugnar a lógica que se refere às cartas de aval: a informação teórica

que esses escritos proporcionam serve muito ao jurado, não importa se quem a assina

é um desconhecid@. Certamente se a assinatura do pé de página é de El Greco ou Andy

Warhol, bastaria que pusessem: dêem a bolsa a ele! para que o jurado outorgasse seu

parecer favorável. M as, cuidado. Isto pode ser contraproducente, especialmente

quando o/a artista solicitante redige uma carta modelo para que assinem as

luminárias de sua predileção. Por muito que impressionem seus nomes, se a

solicitação é vaga ou é uma “carta modelo” pré-escrita, os membros do júri podem

justamente recusá-la.

O ideal é cultivar @s especialistas que se admira, mantê-l@s a par de nosso trabalho, em


especial sobre o projeto para o qual buscamos apoio, e então, pedir-lhes, com bom tempo de
antecedência, que redijam sua recomendação. Não se deve esquecer que podem demorar até
um mês para escrevê-la.

5. Apresentar as contas claras e fidedignas

Usualmente um júri é composto por pares, artistas de trajetória que sabem muito bem se

um orçamento é viável ou não; portanto não devemos nem aumentá-lo nem calculá-lo

mal. A idéia proposta pode ser muito boa, mas se os cálculos estão mal feitos, causará

desconfiança. Pelas mesmas razões, nunca se deve prometer o impossível, nem ser
mirabolantes e tratar de impressionar com linguagem rebuscada.

Nunca desperdiçar esforços


É estúpido desperdiçar : elaborar a pasta de solicitação significa dedicar-lhe tempo e

dinheiro. Tudo isso se perde se a nossa solicitação é recusada. Outra maneira de elevar as

possibilidades de conseguir apoios, então, é apresentar a mesma solicitação (com

variantes se for o caso) a mais de uma instituição do país e no exterior, ao mesmo tempo!

Medida tática, sem dúvida alguma.

Preparemos uma lista o mais completa possível de fundações, instituições, bancos,

embaixadas, etc., para contatá-los e pedir-lhes que nos incluam em suas listas de correios

no momento de enviar suas convocatórias.

Finalmente, uma opinião: o estado nunca pode funcionar como mecenas. O mecenato é

assunto de filantropia. A função de um ministério da cultura (e de qualquer instituição

publica) é distribuir dinheiro público para beneficiar a cidadania em sua totalidade, não

para privilegiar uns quant@s artistas por ano.

Em relação às bolsas governamentais (quer dizer, financiadas com o dinheiro dos

impostos) creio injusto que a solicitemos para criar uma obra que terminará em mãos

privadas, logo a beneficiar as galerias. M ais sensato me pareceria, que na hora de

solicitar dinheiro público para produzir a obra de consumo suntuoso, que nos

propuséssemos a devolver uma porcentagem à instituição por cada obra feita com seus

fundos e vendida em galeria, a fim de ressarcir o orçamento que nos beneficiou, mas que

a cada ano se reduz mais. Isso, por exemplo, é assunto de consciência. A pergunta é: @s

artistas temos ou não consciência cívica?

*=*=*=*=* =* =* =* =*
59

Como se verá: a diferentes estratégias, diferentes medidas táticas. Não é a mesma coisa

procurar o reconhecimento de nosso trabalho dentro dos setores pudentes da sociedade

(público ativo), que procurar a interlocução com a maior quantidade possível de pessoas,

digamos “normais” (público passivo). Quero dizer que para ver pendurada nossa obra em

residências de empresários, produtores e financeiros, é preciso táticas muito distintas às

que necessitamos para chegar, por meio de museus e instituições parecidas, ao coração de

outros setores sócio-econômicos. Em todo caso, @s artistas devemos preparar a

administração solicitada, lida que por sua mesma definição é para nós aborrecíveis.

Como é preciso sorrir também em tempos de dificuldade, será preciso nos organizarmos

de tal maneira que o trabalho administrativo seja o mais indolor possível. Continuemos

na leitura...
V. A TRANSIÇÃO DA PAIXÃO A PROFISSIONALIZAÇÃO
De como é aconselhável educar-se em academias,
mas também por caminhos não tradicionais

Monosabi@s, novilheir@s ou toureir@s?

O que distingue qualquer profissional de um apaixonado é a sua dedicação: somos

profissionais quando praticamos o tempo todo, de maneira constante, nossos

conhecimentos. @s apaixonad@s trabalham de vez em quando, usualmente no tempo livre.

Em português há uma palavra antiga para descrever os apaixonados: “diletante”, da

qual gosto muito, pois vem de “deleite”. @s diletantes são pessoas-chave nas artes, pois

constituem nosso melhor público. De fato, muitos profissionais começam como

apaixonados diletantes, logo “tomam a alternativa” e alguns até se tornam protagonistas

na arena cultural.

Os latino-americanos têm uma visão das profissões artísticas que vem se deformando

paulatinamente com o tempo. Todo mundo sabe que @s bailarin@s e @s pianistas

começam muito pequenos e que devem praticar diária e incessantemente; que os atores e

atrizes passam noites em claro para memorizar seus papéis e que, na hora de trabalhar

em cena, sofrem muito. Porém, ao falar de artistas e de escritores/as tem-se a crença –

claro, errada – que vivemos de ar e produzimos somente “quando nos visitam as musas”.

Para nossa desgraça, há muitos artistas que se entregam a essa mentira.

Com tais referências, não é de se estranhar que uma família seja tomada pelo pânico

quando um/a jovem anuncia sua decisão de estudar artes visuais e que @s genitores

façam até o impossível para convencê-los a estudar desenho gráfico (antes era certamente

arquitetura). Quando você se formar (nos dizem) e se ainda insistir nessa aberração,

você pode desenhar, pintar e o que quiser, nos teus tempos livres! Acreditam que se pode

ser artista de meio período!


61

Podemos provar o quão ridícula é essa atitude, se nos perguntamos: no caso de uma

doença de um bebê, a quem recorremos: a alguém que nos aconselha atrás da vitrine da

farmácia ou alguém que cura nos fins-de-semana, ou ainda a um/a pediatra com diploma

e consultório próprio? Na hora de construirmos nossa casa, recorremos a um/a

estagiária de arquitetura que trabalha como moto-boy da Pizza Hut ou a alguém que se

formou e tem o próprio escritório?

O importante na vida é definir o mais rápido possível e decidir se se vai ser um

monosabi@ (espectador ativo), novilheir@ (afeiçoado) ou toureir@ (profissional da

arte).

Um/a profissional da arte geralmente se forma em escolas universitárias ou em

academias de arte, mas é sabido também que muit@s outr@s se formam pelo caminho da

vida. Cada opção tem suas armadilhas: quantos egressos da licenciatura, até do

mestrado, não abandonam a carreira para terminar como funcionários menores ou

criando inconseqüências nos tempos livres? E o contrário, quantos artistas afamad@s

não se destacam apesar de nunca ter tido uma educação formal? No fundo, tudo depende

das pessoas, de sua vocação, de sua obstinação, mas, sobretudo, da visão que podem ter

de sua profissão.

A seleção do método de formação depende, é claro, das oportunidades que tenhamos ao

nosso redor: se a cidade onde vivemos conta com mais de um centro de ensino de artes, a

lógica indica fazer nossas pesquisas, visitar as academias, conversar com @s

professores/as, interrogar os estudantes e recém-formados de cada lugar.

As vantagens que proporciona a academia são inquestionáveis: economizamos tempo e

dissabores porque podemos receber o treinamento em oficinas equipadas com os

instrumentos necessários e absorver todo tipo de informação histórica e teórica de modo


compacto. Além disso, contar com o bacharelado nos serve para pós-graduações e

especializações, para solicitar bolsas e viajar, e inclusive para converter-nos em

professores/as (com o que mudamos de direção, é claro).

Da mesma forma que no México, muitos países da nossa América contam apenas com

dois ou três centros de ensino superior das artes, que se concentram na capital ou em

grandes centros. Para muitos a decisão está em “fugir ou ficar”. A menos que alguém

goze de uma posição econômica confortável, será sempre muito difícil migrar para

estudar, sobretudo porque, diferentemente do sistema universitário norte-americano e

europeu, nossos centros de ensino artístico e universidades não estão pensados para as

pessoas que trabalham enquanto estudam.

Quem se muda quase sempre acaba se fixando onde se forma, longe da cidade natal. A

fuga de cérebros e talentos é na realidade uma fuga de corações. Os vazios tão

lamentáveis que sofram as "pátrias pequenas" quando seus filhos as abandonam serão

sempre irreparáveis, e as comunidades vão perdendo toda a possibilidade de desenvolver

seu imaginário coletivo.

Por circunstâncias que não vêm ao caso relatar, eu me capacitei à moda antiga (do jeito

que ainda se faz em muitas partes da América), no caminhar de minha profissão, como

assistente em ateliês de artistas maiores, fazendo cursos, e acima de tudo, lendo livros de

história da arte, biografias de artistas, manuais técnicos e tratados teóricos.

De uns quinze anos para cá, tenho me servido mais e mais de La Calandria (meu querido

computador), para me conectar á Rede das Redes. Descobri um mundo enorme e

fascinante de informação gerada por nosso universo hispanoparlante que oferece todas

as possibilidades de internacionalizarmos em direção à América nossa, à latina, em

direção à Ibéria na Europa, no Oriente, às Filipinas... Eu recomendo não se limitar à


63

consulta de sites em inglês. Please, please, não façam isso! Tudo bem?

Indo ao encontro, ao invés de esperar.


Se ao invés de migrar para a capital ou para o exterior, optamos por ficarmos na terra

pátria para fazermos méritos no caminhar, é indispensável não perder tempo. O melhor

será definir o quanto antes nossas estratégias (e conseguir um computador) para

cumprir como o nosso prometido. Empregos com mestres artistas, cursos, oficinas,

seminários, tudo isso nos oferece possibilidades extraordinárias para nos

desenvolvermos. M as atenção! Isso pode traduzir-se em grandes perdas de tempo se: 1)

os instrutores/as ou mestres não são competentes, e 2) se faz ao acaso, sem critério de

escolha.

Dir-me-ão que se faz aquilo que se tem. Hmm... Possivelmente, mas só até certo ponto,

pois pelo que se refere “aquilo que nos chega” é preciso discernir: quem nos traz esses

cursos ou oficinas? Quais são as credenciais do instrutor/a ou mestre vindo de fora? E,

de maneira muito especial, onde se encaixa esse curso em minha formação?

Com a intenção de cumprir o mais elementar seus programas, muitas instituições

públicas contratam instrutores/as que oferecem seus serviços grátis. O mal é que, como os

honorários são baixos, atraem pessoas que aceitam contratinhos justamente porque não

conseguiram defender-se em outros trabalhos. Suas intenções podem até ser boas, mas

nada nos garante que sabem transmitir um ensino de qualidade. Não se pode esquecer

que a gratuidade nunca é garantia de qualidade, de fato, o barato inevitavelmente nos

sairá caro. Pelo demais, de que nos servirá fazer um curso de macramé se somos

escultores/as em pedra?

Quando se vive em desertos acadêmicos, o mais importante é aprender os truques

necessários para atrair conhecimento, ou seja, para atrair mestres de prestígio. No


México, por exemplo, o conselho Nacional para a Cultura e as Artes opera há muito tempo

em seu programa “Criadores nos estados”. M as há muitas instituições mais, públicas e

privadas, nacionais e estrangeiras (como fundações dos grandes bancos) que também

têm fundos para organizar programas breves de ensino básico ou especializado, sempre e

quando se saiba solicitar os serviços. Tratar- se-ia, então, de contatá-los em grupo para

garantir resultados.

M ãos a obra, pois!! A união faz a força.


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VI. O HABITO SIM FAZ O MONGE


De usos e costumes e demais hábitos
(maus e bons) que nos fazem o que somos...

Usos e costumes
Não é que se queira insistir no assunto dos hábitos (bem, na verdade quero sim!).

Acontece que ao longo deste instrutivo manual (outros autores diriam “modesto”, rá!)

tentei sugerir formas para substituir os maus hábitos que nos alastram, por outros bons,

ou pelo menos por outros muito melhores.

Infelizmente, pouc@s se lembram de onde vem o hábito que praticamos @s profissionais

visuais. Existem os de ação e os de tradição. Os hábitos de ação têm a ver com técnicas,

com tratos compartilhados entre o pessoal de apoio direto que nos acompanha, com os

colegas, com os tempos das grandes cidades (por exemplo, bancos e escritórios abrem a

certa hora), com elementos similares de natureza prática. Por sua vez, os hábitos de

tradição são de natureza ritual, se tratam de hábitos e atitudes que são transmitidos de

uma geração a outra.

Os problemas surgem quando assumimos sem questionar aqueles hábitos que nos inibem

ou que nos submetem a interesses alheios. Isto, por simples que seja, se complica com o “o

que vão dizer”. O exemplo clássico é a idéia que “o dinheiro corrompe”, e que se nos

mostrarmos demasiado agressiv@s para divulgar nossa obra, se dirá que somos

“comerciais”. M ais insidiosas são as práticas herdadas de romances de banca, como a

inconstância e o desalinho, o do carente sonhador ou “poeta maldito”. Coisa estranha, a

imagem que nos evoca o último nunca é uma mulher...

Boa parte dos maus hábitos apela a idéias vagas sobre a essência da arte. Chegam-nos

tarde e de outros lugares (por exemplo, da França de há mais de cem anos). São

anacrônicos. Para a nossa má sorte, confundimo-los com tradição, e os assumimos como

comportamento natural. Isso só nos prejudica.


Há muitos outros hábitos, no entanto, que nos são úteis. Por exemplo, o de abandonar o

lar para viajar, tanto para aprender como para dar aulas e expor, ou de manter-se

informad@ em assuntos do ofício e a par dos acontecimentos globais: quanto mais

leitura, mais cultura.

O costume da assinatura
Na hora de assinar uma obra, muit@s artistas costumam adicionar uma data. A data

de realização é efetivamente de importância para a critica e para @s estudios@s, já que

lhes serve para localizar as obras de um/a artista no contexto de sua vida. Acontece com

freqüência, no entanto, que ao ver a data em uma obra realizada quatro, oito ou mais

anos atrás, cert@s possíveis clientes, em sua ignorância, sentem que “a peça está velha”.

Para quê ostentar a data se tanto incomoda a clientela? Artistas como Francisco Toledo

nunca põem a data na frente, mas atrás da obra.

Não ostentar a data é uma medida tática.

O hábito epistolar
Uma magnífica porção da história da arte se nutriu do epistolário havido entre artistas,

historiadores/as, poetas, critic@s, marchands (bom, dealers, para não ofender ouvidos

castos), e até colecionadores. Durante séculos, a carta foi o único meio para comunicar-se

à longa distancia. Com o aparecimento do rádio e da telefonia, a epístola - que havia

alcançado categoria de gênero literário – foi caindo em desuso. Volta a renascer com o fax

(palavra derivada de fac-similar) e se vitaliza com o correio eletrônico (ou e-mail).

Novamente, a epístola assume lugar preponderante no intercâmbio de idéias, no debate do

dia, na proteção autoral, em tudo. Na rede, por exemplo, se realizam toda sorte de fóruns,

alguns dos quais já existem há vários anos, como não se via há muito tempo.

Em uma missiva dirigida a algum/a colega podemos sempre discorrer sobre assuntos de
67

gravidade ou importância sem sentir a necessidade de um esforço literário, fazemos com e

com confiança. Essa mesma carta, escrita na íntima segurança da amizade, no entanto,

pode logo transformar- se em um texto público que sirva para alimentar a teoria estética

do momento. Os arquivos pessoais dos grandes artistas estão cheios desses casos.

Creio que fica claro que dificilmente poderemos retomar o hábito epistolário nem operar

com eficácia como profissionais se não comprarmos nosso computador e nos conectarmos

ao internet.

Entre os costumes mais destrutivos de que padecemos nós artistas existe um que há

milênios foi elevado à categoria de pecado. Refiro-me ao orgulho, que não é senão uma

manifestação da insegurança e ignorância. Quantos de nós não nos sentimos dadivos@s

e sonhad@s simplesmente por sermos artistas? Desconheceremos a história de nossa

profissão, praticaremos habilidades mal aprendidas, exibiremos pouco e venderemos

menos, mas como “somos artistas”, nos sentimos as graças mais divinas do paraíso.

Com o tempo, aqueles que se liguem para funcionar melhor, aqueles que expõem fora de

sua querência (talvez no exterior, onde dão os ombros aos profissionais visuais de outras

latitudes), possivelmente se tornem menos déspotas. Porém, é difícil curar- se do mal do

orgulho.

Reflitamos: Repugna-me o mau costume, generalizado entre tantos pesquisadores/as – de

que, quando publicam um livro ou um catálogo, mencionam a tod@s @s dignatári@s

existentes e por existir, mas “se esquecem” de consignar os agradecimentos de rigor @s

trabalhadores que confeccionam a publicação. Quase nenhum dos que se produzem no

México e em outras partes da América Latina menciona o trabalho dos tipógraf@s,

fotomecânic@s, prensist@s e encadernadores/as que intervieram na fabricação do livro.

Chegado o momento de publicar um catálogo, um caderno, um texto, eu recomendo aos

meus colegas jamais esquecer que sem cada um destes técnic@s esquecid@s, não
poderiam andar presenteando suas publicações pelo mundo afora.
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VII. O INVENTARIO DE NOSSA OBRA


Sobre as muitas opiniões que nos dão, sempre e quando saibamos quanta obra ter.

Ainda que doa, é preciso fazê-lo.


Agora sim chegamos à parte mais chata deste livro (e no caso, da minha vida). M as só

aparentemente.

Veremos aqui tudo o que concerne a inventários, pactos, arranjos, negociações, congressos

e contratos, acordos fiscais, proteção autoral, promoção, vendas, faturação... Para que

continuar, se a lista é interminável? Quase sem exceção, nós artistas nos aborrecemos com

este assunto porque “disso eu não sei nada...”, afirmamos. “Eu me ocupo de questões

espirituais”. Será que por pensar que a arte e o dim-dim não se bicam, acabamos sempre

zuretas e confusos? Eu só posso dizer que no momento em que aprendi a negociar e a por

as coisas por escrito, minha vida começou melhorar. Mortifico-me menos que antes e meu

saldo financeiro tem melhorado substancialmente.

Nossas opções, o tempo para gozá-las e as coisas em seu lugar.


Para tirar o suco de nossos talentos é necessário administrar nossa produção e seu

destino com extremo cuidado, o que nos exige ver as coisas panoramicamente,

simplificando assim a nossa papelada ao máximo. Para fazê-lo devem-se levar em

consideração três elementos fundamentais:

1) a diversidade de opções que nos oferece a profissão;

2) a idéia precisa sobre como parcelar e controlar nosso tempo de produção;

3) a consciência do número de pessoas que gravitam ao nosso redor;

Vale a pena reler esses três pontos com cuidado e ponderá-los. Uma vez digeridas as suas

implicações, podemos começar a organizar os mil e um assuntos sobre os quais se

sustenta o nosso processo criativo, ou seja, o tedioso mas importante trabalhão que
significa administrar com eficácia nosso trabalho.

É preciso admitir que ninguém goste de responder cartas, organizar seus currículos

especializados, chegar a tempo nos encontros, subir e descer para entregar mercadoria,

enfim, realizar as tarefas feitas por qualquer pessoa normal, ou seja, as pessoas que

vivem do que fazem.

Em que pesem todas as lendas negras que insistem no contrário, deve-se sublinhar que

nós artistas profissionais somos tão normais como a filha do vizinho. E mais, somos

pessoas normais plus, quero dizer que somos tão cidadãos como qualquer pessoa, tanto

que devemos pagar impostos e aluguel, alimenta-nos, pôer gasolina no carro e, além

disso, tiramos férias de vez em quando; mas somos plus porque, ao termos escolhido

nossa profissão, ganhamos o privilégio de sonhar e imaginar, de usar a mente e as mãos

para desafiar a segunda lei da termodinâmica: criar algo do nada! Se a isso se

acrescenta a (duvidosa) recompensa da fama, pois o plus é luxo puro!

Inventariando a produção ou... Quantas mercadorias têm na mão?


A chave da profissão de tod@ artista é – além da qualidade, é claro, – a quantidade de

obra que produz. Volto a insistir: quanto maior a produção, maior a projeção.

Existem pessoas prolíficas e as pessoas que demoram ao criar. Isso pode obedecer aos

processos internos de criação de cada individuo, mas depende mais ainda do tempo que

temos disponível. Cert@s artistas são meticulos@s e exigentes ao exagero. Se ainda por

cima recorrem a técnicas muitas trabalhosas, o volume de sua produção pode ser baixo.

Também é obvio que se produzimos só á noite, nos fins de semana ou entre um emprego e

outro, nunca conseguiremos encher nosso atelier e as gavetas de planos com obras.

Não se pode esquecer que uma galeria, até a mais desorganizada, dirige uma média de
71

dez artistas “de base”, grupo que constituem os que elas chamam “seu estábulo”. (A

palavra ignominiosa (em espanhol e português) provém do francês étable e se refere a

artista que uma galeria representa de modo estável).

Alem disso, as empresas melhor organizadas administram obras de uns dez ou quinze

artistas adicionais cuja obra, mesmo sem contrato de exclusividade, fica a disposição da

galeria. Afinal, todo negocio que se aprecie como tal, compra e venda o que pede sua

clientela (seja o que for) e por tanto conta com uma ampla gama de objetos artísticos

para vender a@s indecisos e a quem escute as sugestões.

Como a escassez das galerias é uma realidade, nós artistas, que queremos distribuir a

nossa produção com o sem ajuda de uma galeria , também devemos oferecer uma seleção

de produtos tão variados quanto possível. Quanto maior a nossa versatilidade, maior a

probabilidade de exibir em coletivas, ilustrar revistas e vender, tudo ao mesmo tempo.

Quero fazer um parêntese para falar da diferença que existe entre objeto de arte e
uma obra de arte (objet d’art VS l’oeuvre d’art) já que atualmente a mais e mais
artistas que renegam – ou de caso pensado, abandonam – a produção de objetos
tradicionais para criar obras seja de vida efêmera ou virtual (conceituais,
instaladores/as, performances, ciber e vídeo artistas, etc.).
O objeto de arte, que é conhecido por quase todo mundo, passa de mão em mão do
mesmo modo que uma mesa, um carro ou um imóvel. Bom ou mau, é - ou deve ser -
acompanhado de um certificado de autenticidade e uma nota fiscal, da mesma forma
que um carro ou um terreno. De outra maneira, seria difícil a esses revendê-los a
outros compradores/as.
Por outro lado, a obra de arte não é necessariamente uma “coisa”,um objeto. Pode
ser uma instalação ou uma performance, uma fita de vídeo-arte ou um DVD.As
instalações e as performances, por sua vez, se cobram como um serviço. Do mesmo
modo que um concerto de flauta, um recital de piano ou inclusive uma conferência
magistral, @ artist@ combina uma percentual dos bilhetes ou cobra por honorários.
No caso de uma fita de vídeo, um CD-ROM ou um DVDnão tem retorno, a copia é
vendida da mesma forma que um CDou um livro. Seu conteúdo não requer um
certificado de autenticidade, mas a fita ou o disco (o suporte) pode precisar ser
faturado.
Na era midiática em que vivemos (e isso é extremamente importante) existem formas
adicionais de vender nossa obra e ganhar dinheiro. Trata-se do uso secundário que se
pode dar às reproduções, em revistas, catálogos, telas de computador, selos postais
ou bilhetes da loteria, ou como parte de um desenho gráfico ou de telas... O que se
cobra, então, é o uso, além do direito de autor.
Há mais: podemos alugar nossa obra! O alugue de obras é cada vez mais freqüente,
para casamentos ou reuniões no fim do ano de uma empresa, para servir de cenário a
telenovelas, e o que é em especial atrativo, simplesmente para o deleite de quem
gosta de arte, como se trata de um smoking ou de um carro de aluguel. Como se pode
ver, isso de ganhar dinheiro com o que fazemos não é simples, mas tampouco é tão
limitado... E continuamos:

De um extremo a outro, das operações básicas às mais complexas, as leis da demanda e

da oferta, quer dizer, do mercado, é que mandam. Consequentemente temos de aprender

como:

1) reunir,

2) armazenar,

3) fazer o registro de nossa produção em sua totalidade.

Sublinho esse ultimo, pois a totalidade da produção de um/a artista profissional não se

limita a obras terminadas e emolduradas, e muito menos ao que algum/a especialist@

considere “arte válida”. Tudo o que @s artistas produzimos, pinturas, desenhos,

anotações, esboços, notas apontadas em guardanapos, até nossa correspondência e

“memorabilia”, tudo é passível de contemplação, de pesquisa e claro, de compra e venda.

Devemos, pois reunir todas as nossas criações, armazená-las bem e chegar a um registro
73

razoavelmente classificado que nos sirva para explorar melhor nossa produção. Cadernos

de desenho assim como esboços soltos, guardanapos rabiscados, lenços de papel

garatujados, tentativas de gouache e aquarela, roteiros para performances e diagramas

de instalações, serigrafias feitas sobre pão sírio, até fotos polaroid ou digitais

malogradas, tudo-tudo-tudo deve ser resguardado.

A ficha técnica
A ficha técnica é uma descrição que se anexa a uma obra em toda e qualquer

circunstancia. Deve acompanhar sempre a obra, em exibições, leilões e qualquer mudança

de donos. A dita descrição tem usos muito variados:

1) como identificação, escrita e/ou colada atrás ou debaixo da obra;

2) como ficha técnica, para acompanhar a peça em seu périplo por salas de exibição;

3) Como pé de gravado, para apoiar sua reprodução fotográfica;

4) como guia para ajudar a restauradores/as em caso de dano;

5) como texto descritivo em catálogos e listas de preços, em listas de seguros e exportação

(temporária ou permanente) por conduto de agente alfandegário, etc.

A ficha técnica não deve ser vaga. Não podemos, por exemplo, descrever um óleo pintado

sobre acrílica, empastado com pó de mármore e intervindo com craion, como “técnica

mista”, assim sem mais.

A ficha técnica deve descrever com toda a precisão possível, o seguinte:

Obra plana

AUTOR(A): M a riana M a rtines

ANO: 2000

TITULO: Cocolinhos (Da série: “Brincos e saltos”)


TECNICA: Desenho com carbono e sanguina sobre papel Strathmore

MEDIDAS: 58.5 x 45 cm (23’’ x 17 3/8’’)

VALOR: US$ 280,00

Deve-se anotar vários elementos:

- Se a peça pertence a uma série temática, se acrescenta o titulo genérico da mesma: Da


série: “Brincos e saltos”.
- È recomendável consignar até a marca do papel, para fazer conhecer seu nível de acidez.

MEDIDAS: Ainda que o sistema métrico seja reconhecido em todo o mundo, convém

acrescentar – como cortesia aos anglos, mas também por conveniência – as medidas em

polegadas. Para isso não são necessárias complicadas operações matemáticas, basta

pegar uma fita métrica com as medidas em polegadas (ou conferir no google!)

ATENÇÃO: as medidas sempre se dão nesta ordem:

Altura x largura x profundidade

Com freqüência (por exemplo, para esculturas de médio ou grande formato), deve-se

descrever o peso em quilogramas.

VALOR E PREÇO: Nem sempre significam a mesma coisa. A palavra preço se usa

quando se trata de vender, valor serve para seguros. O termo preço se aplica à operação

de venda, enquanto que o termo valor é utilizado para fazer o seguro da obra. A diferença

é importante porque no momento de exportar a obra, quanto menor o seu preço, menor o

imposto a ser pago, mas por outro lado quanto maior o valor declarado ao seguro, mais

alto será o pagamento em caso de danos ou perda da obra de arte.

Cotar em dólares? Sim, ainda que as leis do país determinem que toda cotação deva ser

feita em moeda nacional, não podemos dar- nos ao luxo de permitir que a cada espirro ou

tosse do ministério da fazenda balancem nossas, já por si, precárias finanças pessoais.

De fato, todos os cúmplices dos grupelhos no poder cotizam seus assuntos em dólares
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norte-americanos (ou em euros) e é a eles a quem procuram seduzir as galerias mais

ativas do país. Cotar em dólares ou em euros, além do mais, os tranqüiliza: se assustam

se vêem a etiqueta em moeda nacional, pelos zeros a mais.

Obra tridimensional:

AUTOR(A): Jorge Negrete Cruzado

ANO: 1997

TITULO: Aeolia

TECNICA: Ensamblado: madeiras diversas, bambu, serragem de raiz de samambaia,

cânhamo, folhas de prata e ouro falsas, unhas de caranguejo, alfinete de gravata com

perola de fantasia.

MEDIDAS: 103 x 142 x 23 cm (401/2’’ x 56’’x 9’’)

PESO: 9.458 kg

VALOR: US$ 1.520,00

Como se pode ver, quando se trata de uma peça de construção complexa, lista-se todos os

materiais.

Obra estampada:

AUTOR(A): Ulisses M a rcado

TITULO: Terra povoada (vi/x/100)

TECNICA: estampa em água- forte, agua-tinta e ponta seca sobre lâminas de zinco e de

cobre, impressa sobre papel Liberon.

MEDIDAS: 35.7 x 28,1 cm (14’’ x 11’’)

LUGAR E DATA DE REALIZAÇÃO: Artegrafías Limitadas, S.A., 1998.

ASSISTENTES NA CONFECÇÃO: Mestre impressor René Serra

Edição de 100 exemplares com 5 provas do artista, 5 provas da gráfica e 1 prova do

impressor, mais edição especial de 10 copias numeradas em romanos; intitulado da


direita, assinado à esquerda.

VALOR: US$ 220,00

O estampado representa uma das possibilidades mais viáveis de venda para um público

leigo, mas sensível (PP) que, depois de sua primeira aquisição costuma transformar- se

em publico ativo (PA).

É comum que as pessoas comecem a colecionar obra estampada se inventar certas regras,

como em um jogo, para fazê-lo; assim muit@s particularizam sua coleção, e em caso de

revenda, incrementam sua cotação. Existem comprador @es que só adquirem a cópia

número 1 de uma edição, pelo simples fato de ser a primeira.

Outr@s, ao contrário, compram a última (por ex: 120/120) por ser o encerramento da

edição. Há pessoas que compram o número correspondente à data de seu aniversario, ou

que juntam só provas de artistas (P/A) ou do ateliê (P/A) . E existem ainda pessoas que

colecionam exemplares com falhas, como na filatelia. Portanto os dados da ficha técnica

devem detalhar as características particulares da estampa. Isso inclui especificar onde e

quem colaborou em sua realização, pois como há ateliês muito prestigiados, sua reputação

se transmite a quem consegue produzir neles. Se forem desconhecidos, quem melhor para

prestigar- lhes que não n@s mesm@s?

São especialmente apreciadas, certamente, as estampas impressas por artistas em seu

próprio ateliê, pois as tiragens são quase sempre muito menores aos que podem imprimir

numa gráfica.

Muita atenção: o que em principio se cotiza na arte estampada é a matriz, a madeira, a

lâmina ou a pedra sobre a qual trabalhamos, cujo preço se divide entre o número de cópias

que configuram uma edição. Assim, um jogo de lâminas (para imagem policromada)
77

poderia ser avaliado em U$12.000,00. Se 100 cópias são impressas, o preço de casa será

de U$ 120,00. M as se apenas 60 copias forem produzidas, estas serão cotada s em U$

200,00 cada uma.

Compreendida a enorme utilidade da ficha técnica, passemos ao mais importante, ao que

hoje em dia pode ser uma fonte de renda em ocasiões maior ao que produz a venda de uma

peça: sua documentação fotográfica.

Fotografando a obra
O registro fotográfico de nossa obra, em vídeo ou digitalizado, pode ser realizado por nós

mesm@s. É muito mais barato e, em ocasiões, mais preciso, pois dependendo do que trata

a obra, pode-se fazê-la destacar- se como não saberia fazer um/a terceir@. Hoje

praticamente tod@s @s artistas sabem usar uma máquina fotográfica.

@s verdadeiros especialist@s são @s fotógraf@s, colegas de grêmio que em vez de

cobrar sua tarifa, talvez sejam amigos, e aceitem intercambiar seu trabalho por uma obra

nossa.

Não devemos nunca omitir ou permitir que se omita o crédito autoral d@s fotógraf@s.

Não só é uma imperdoável falta de ética, como também a lei o exige. Se o/a fotógraf@ não

põe seu carimbo atrás das impressões que nos entrega, deve-se fazer o seguinte:

CRÉDITO OBRIGATORIO
Nome e sobrenome / ano
Domicilio e/ou telefone e/ou e-mail d@ fotógraf@

Fotos reveladas em cores e em preto e branco, diapositivos (slides) pequenos e grandes,

vídeos e imagens digitalizadas, tudo ajuda a aproximar a nossa obra de quem queira

conhecê-la, mas não tenha a possibilidade (ou disposição) de vê-la ao vivo:

pesquisadores/as, historiadores/as, curadores e colecionadores.


A foto é necessária para em convites, catálogos e cartazes, jornais e revistas. Ajuda

inclusive na transmissão pela televisão no caso de uma entrevista ou crônica.

Os avanços da informática praticamente têm feito caducar muitos sistemas de

documentação fotográfica indispensáveis há pouco tempo atrás. Porem convém conhecer

tanto as velhas como as novas convenções:

Do jeito antigo
- Fotografia em branco e preto: ideal para reprodução em diários e hebdomadários (se

não conhecem a palavrinha, peguem o dicionário, caramba!) Deve ser impressa em brilhante,

com borda em branco, não precisa ser maior que 7 x 5.

Atenção: no caso de fotos P/B, seu negativo é propriedade inalienável d@ fotógraf@, que

cobra cada vez mais quando se pede novas impressões.

Cada impressão P/B deve ter no dorso, além do crédito autoral, uma etiqueta com a ficha

técnica da obra.

- Diapositivo (slide) em cores, 35 mm: ideal para quase todos os usos.

Os slides de 35 mm são usados para participar de editais e bienais, para imprimir

convites, cartões-postais, catálogos e cartazes. São utilizados também para estabelecer

contanto com galerias e museus, onde existe sem exceção projetores de carrossel ou mesas

de luz. Os diapositivos de 35 mm podem ser escaneiados para serem armazenados no

computador.

Como não há negativos para transparências e é preciso dispor delas a qualquer

momento, deve contar com cópias promocionais. No momento de serem duplicadas, no

entanto, perderão um pouco de qualidade; por isso quando fotografamos nossas obras
79

em transparência, é muito recomendável tirar na hora, pelo menos, cinco fotos adicionais:

a melhor será guardada no nosso arquivo intocável de fotos, as outras quatro servirão

para promover a obra.

O trabalho mais chato do mundo é marcar cada transparência, uma por uma, com sua

ficha técnica e o crédito d@ fotógraf@. Não tem jeito, é preciso fazer. Em certas

ocasiões, eu contratei um sobrinho abusado ou a filha mais inteligente de meus caros para

fazê-lo. Conheço artistas que usam seu computador para imprimir diminutas etiquetas

auto-aderentes que são coladas na frente da transparência. (vide p.214).

- Diapositivos em cores de médio ou grande formato: utilizam-se para a mais fina

reprodução impressa, mas caíram em desuso. Como essas se guardam em um envoltório

de celofane, colamos a ficha técnica e o crédito d@ fotógraf@ fora, sobre o envoltório.

- Impressões em cores: de pequeno e médio formato, essas quase sempre são reveladas em

laboratórios Express, desses de “pronto em uma hora”, onde o que se trabalha é a

instantânea (@s neófit@s não exigem qualidade, mas rapidez). @s operários nestas

empresas são muito descuidad@s, não ajustam suas maquinas para cada novo rolo nem

mudam os líquidos reveladores como indica seu manual de instruções. O resultado são

fotos variadas, de cores falsas, e não em poucas ocasiões, até fora de foco. Dai que, a

menos que sejam impressões da mais alta qualidade, a maioria das galerias e

departamentos de artes visuais de instituições públicas e privadas, em especial dentro de

nosso território, preferem não olhar essas impressões.

Contudo, uma impressão em cores nos pode ser útil quando queremos mostrar nosso

trabalho de modo informal. Ainda assim, não se pode descuidar e mostrá- las soltas, mas

em um álbum fotográfico, devidamente etiquetadas.


Ao estilo atual
- CDs e DVDs: é cada vez mais freqüente ver um note book em escritórios de galerias e de

museus (e d@s organizadores/as de editais e encontros). CDs e DVDs servem

primordialmente para mostrar obras não objetuais e temporárias, como instalações e

performances. M a s muit@s artistas os utilizam para mostrar também obras de tipo

tradicional. Muitos até o fazem com voz e textos, o que parece agradar as pessoas. O

importante é que a promocional não seja mais longa de 10 minutos. (É melhor

proporcionar 3 promocionais de 10 minutos cada uma, que uma de 30 minutos).

- Imagens digitais (jpg): Sem duvida, hoje o médio mais eficaz (e talvez de melhor

qualidade) para mostrar nosso trabalho em primeira instancia é a foto digital, e as

pessoas já estão acostumadas a vê-las na tela de seus computadores, no escritório ou em

casa.

Entre as mil e uma vantagens da foto digital está a possibilidade de enviá-las

imediatamente a qualquer parte do mundo, via internet. A ficha técnica é anexada no

mesmo e-mail, em baixo do ícone da imagem.

Armazenamento da foto documentação


Toda foto documentação, seja foto fixa, vídeo ou digital, deve ser arquivada:

1) no mesmo lugar, sempre ao alcance da mão;

2) em um lugar seguro (as boas lojas de móveis tem arquivos especiais para as fotos);

3) devidamente etiquetada para evitar qualquer perda ou confusão.

O arquivo foto documental se divide em dois: o intocável e o promocional.

Nos títulos esta a função, por isso atenção: Não mexer no intocável!

Arremato este capitulo sublinhando o óbvio: tanto as fichas técnicas como o inventário da

foto documentação devem ser reunidas em listas intituladas, de acordo com a


81

circunstancia.

Depois de trabalhar seis, sete meses criando uma serie de obras sobre o tema que nos

obceca, ou simplesmente criando, devemos executar as seguintes tarefas:

1. batizar ou intitular cada peça, cada obra (até “Sem titulo” é um titulo);

2. medir uma por uma;

3. fotografar (ou vídeo gravar ou digitalizar) o conjunto;

4. envolver cada uma das obras com plástico elástico ou plástico-bolha, ou montá-la

provisoriamente sobre cartão branco envolvido em PVC (o mesmo que se usa para

apresentar cestas natalinas e presentes de casamento, que se passa com secador de

cabelo).

5. etiquetar as obras, ou seja, colar a ficha técnica debaixo ou na parte de trás.

Justamente nesse momento, quando elaboramos a ficha técnica é quando determinamos o

preço da obra. A importância de fazê-lo nesta etapa em que podemos avaliar nossa

produção sem pressa em companhia d@ companheir@ ou de alguma amizade, sobretudo,

de fazê-lo sem nenhuma pressão de um/a cliente presente. M ais adiante veremos como por

preço a nosso trabalho;

6. etiquetar as fotos, as transparências, o vídeo;

7. elaborar a lista das obras, e foto copiar três ou quatro copias;

8. ter a lista sempre ao alcance das mãos, muito@s artistas pegam uma etiqueta

atrás da obra com o preço. Serve para vê-lo rapidamente sem ter que consultar a lista.

Para mudar o preço, basta adicionar uma nova etiqueta.


VIII. INFORMAÇÃO BIOGRAFICA
Sobre as muitas vidas paralelas que levamos
e como não ficar confus@s nem confundir ninguém

Um currículo para cada ocasião


Chegada a hora de enfrentar- se no mundo lá fora, é surpreendente o nível de ingenuidade

de que padecem @s artistas emergentes, incluindo os recém-formados de academias. São

muito mais vulneráveis frente às incertezas com respeito ao futuro que os formados por

outros cursos, inclusive de outros ramos artísticos. Será por que alguns (não tod@s) de

seus professor@es, que ensinam porque não se abriram ao mercado, pouco ou nada

sabem a respeito? Cheguei a suspeitar de que cert@s mestres e diretor@s não os ensinam

como operar profissionalmente porque temem a concorrência.

Levo quase 20 anos tentando convencer sem sucesso, por todos os meios possíveis, às

direções das mais importantes escolas do México para instituir a matéria de

administração. Este livro, por exemplo, não teria razão de existir se ensinassem a@s

jovens a mover-se no labiríntico mundo das artes, ao invés de levá-los a cometer erros

inúteis que na maioria das vezes @s incentiva a abandonar a carreira. A ignorância

administrativa é contagiosa, debilita a estrutura geral do mundo da arte.

Na vida real sempre há um roto para um descosido. Sejam ou não capacitados em centros

de ensino artístico, @s artistas mais sagazes de cada geração seguirão adiante, ainda

que nem tod@s se destaquem.

Indispensável para sobreviver e progredir é o testemunho de nossa profissão, o

documento chamado currículum vitae (CV) ou currículo, que se elabora em três

modalidades:

1) O currículo extenso:
83

Lista de todos os passos que demos ao longo da vida profissional, ponto por ponto e, de

modo sucinto, sem exceção.

2) O currículo resumido e especializado:

Lista ponto por ponto certos dados específicos, e faz menção aos demais termos gerais. O

propósito é destacar alguma especialidade, por exemplo, nossa produção gráfica, ou

nossa experiência docente, que desejemos promover em uma situação particular, como

conseguir um patrocínio para produzir uma capa gráfica, ou para dar aulas;

3) O currículo relatado (um memorial completo e/ou de tempos recentes):

É uma narração, em prosa simples, das etapas mais significativas em nossa vida

profissional. Quando é redigido pel@ própri@ artista, se escreve na primeira pessoa, a

terceira pessoa só é utilizada quando o redigiu um terceiro. A narração pode abarcar toda

nossa vida ou ainda concentrar- se em vitórias especificas ou gerais, de anos recentes.

O currículo extenso
1. Dados pessoais

1. 1. Nome e/ou pseudônimo:

Na hora de definir nome e/ou pseudônimo, é preciso informar se o pseudônimo está

legalmente registrado ou não. Será difícil, ainda que não impossível, descontar um cheque

ou fazer valer um contrato legalmente se o pseudônimo não está registrado.

1.2. Data e lugar de nascimento:

Há mulheres que jamais admitem sua idade. Não admiti-la poderá ser a norma em seu

circulo social, mas é inadmissível no âmbito profissional já que é um dado indispensável

para editais que determinam limite de idade, especialmente para que os pesquisadores/as

especializad@s possam localizar no tempo e relacionar com a nossa geração.

1.3. Domicilio atual do ateliê:

Rua, número, bairro, CEP, cidade, pais.

Telefone(s) com códigos completos, correio eletrônico (e-mail), página web (se a possui).

E incrível quanta gente esquece de mencionar dados vitais como o CEP e os códigos de
longa distância, ainda que se deva escrever assim:

+ + (55 11) 4579. 89 00

1.4 Domicilio Residencial (optativo):

Idem

Atenção: Se a circunstância exige, podemos anotar o da galeria ou do/a representante que

dirige nosso trabalho, em vez de anotar nosso domicilio particular.

Em outros tempos, a lista de nossas conquistas se marcava estritamente em ordem

cronológica; as exigências atuais nos obrigam a inverter a ordem. Hoje, há mais artistas

e menos tempo para dar- lhes atenção; funcionári@s e don@s de galerias recebem não

três ou quatro CVs por semana, como antes; mas em seus escritórios chegam a

acumularem-se pilhas com cem currículos de uma única vez. Como suas ocupações não lhes

permitemlê-los detidamente, folheiam-nos rápido para saber quantas e quais são as

atividades mais recentes d@s artistas; se lhes interessa, então lêem o CV com calma. Por

esta razão, nosso CV deve ser feito em ordem cronológica inversa!

2. EXPOSIÇOES IND IVID UA I S

Algumas regras de ouro:

O titulo da mostra (se houve) deve ser o mesmo referido nos convites;

Detalhamento resumido do conteúdo da exposição;

Nome preciso da sede anfitriã;

Quando houve assistência curatorial, costuma-se mencionar o nome do/a

curador/a responsável;

Quando se exibe na capital, basta colocar seu nome (Ottawa, Washington,

Guatemala, Brasília, Assunção, etc.) No entanto, o nome de qualquer outra

cidade deve vir seguido das iniciais ou a abreviatura do nome do estado,

província ou o pais.
85

Exemplo:

1999

- Virgens e vitimas e algo mais; 15 anos de estampas gráficas (água- forte, aquatintas,

pontas secas, serigrafias e litografias); A Cúpula/Espaço Neológico; Cidade do México.

1998.

- ...pra’ logo é tarde: ao redor da Morte, desenhos com caneta e tinta sobre papel;

Universidade Tecnológica de Nezahualcóyotl, Cidade do México. Curadora: Sandra

Racotta.

3. EXPOSIÇOES COLETIVAS

Seguir as mesmas. Exemplo:

1999

- “99 Budoh No Kuni International Bienalle Exbition of Prints; Museu Provincial de

Bellas Artes de Yamanashi, Tokyo.

1998

- A morte menina, coletiva antológica temática (séculos XVII I, XIX, XX),

curadoria: Gutierre Aceves Pina; Museu da Secretaria da Fazenda e Crédito

Público, Antigo Palácio do Arcebispado; Cidade do México.

- Fullbright-Garcia Robles: fotografia e estampa; exposição e apresentação da pasta

que contém a obra de L. Argudin, F.E., E. Ladrón de Guevara, Eniac M a rtinez,

H. Ortega e R. Ortiz; Casa do Tempo/UAM; Cidade do México.

1997

- Latin American Artists: a travelling exhibition; exposição itinerante curada por Carol

Norman para o Departamento de Arte e Desenho, East Tennessee State University,

Johnson City, Tennessee, EUA.

4. EXPOSICOES DE OBRA DE INSTALAÇÃO, PERFORMANCES E OUTRAS

ESPECIALIDADES
É cada vez mais comum que @s artistas distingam entre sua produção de obra de arte de

corte tradicional (como desenho, pintura e estampa), e não tradicional (como instalação,

vídeo arte e performance). A razão está em que cada vez mais espaços públicos e privados

estão se especializando. Uma galeria estadual na Escócia, que dedica seus espaços a

apresentar obra tradicional, não se interessará em nossa lida como instaladores/as ou

performances mais que em linhas gerais, enquanto para um centro de arte

contemporânea na Venezuela na ficará olhando esculturas de bronze. Cada um para cada

qual.

5. OBRA COMISS IONADA

Nossa obra se apresenta não apenas em salas de exposição, mas também in situ, de acordo

com sua natureza. (escultura monumental, murais externos, instalação e outras obras

fora de serie). Trata- se com freqüência de obra comissionada por empresas, instituições

ou indivíduos, e deve-se também listá-las em ordem cronológica inversa, do seguinte modo:

- data de apresentação, término e develação da obra;

- titulo;

- técnicas utilizadas;

- medidas;

- instância da comissão;

- instância que a comissionou;

- assistentes (se houver);

- localização (localidade, cidade e pais).

Exemplo:

1997

- O andar das meninas;

Acrílicos sobre M45 (chapa prensada), em bastidor montado sobre a parede.

3 x 5,60 metros
87

Assistentes: M a ria Verde, Juan Delgado e Benito F. Juarez. Salão de uso múltiplo, sede

da Delegacia do Conselho Estadual para Proteção da Infância, Cidade Arredondo,

Morelia, México.

6. PRÉM IOS E DISTI NÇÕES

Assinala-se a data, o nome do premio, a razão que nos acreditou o mesmo, o nome e a

localização de que o outorgou. Exemplo:

1983

- Premio El Tabachín Negro; a instalações de micro formato, II Encontro Internacional

de Três Dimensões, San Gregorio de Polanco, departamento Tacuarembó, Uruguai.

7. COLEÇÕES

Pela lógica, esta lista deve ser feita estritamente em ordem alfabética. Ela deve especificar

o nome completo das pessoas e/ou instituições que possuem nossa obra (não importa se foi

recebida em donativo ou aquisição), bem como seu país de origem. A lista se divide em

duas partes, a saber:

7.1 Instituições públicas e privadas

7.2 Particulares

Aqui só podemos listar o nome completo dos particulares que nos autorizam mencioná-los,

preferivelmente por escrito. Há quem, por qualquer motivo, prefira não ser mencionad@.

O assunto do colecionismo é muito interessante. Como se define uma coleção? Será acaso

qualquer acumulação sem pé nem cabeça de objetos de arte, sejam ou não de qualidade? O

assunto é vital quando se trata de coleções publicas ou corporativas, que devem guardar

coerência conceitual, e que, por ser publicas ou ter a ver com acionistas, devem justificar

os gastos com transparência. Pelo menos nos países desenvolvidos, pois no México e em

muitas partes da América do Sul as coisas costumam ficar ocultas em uma neblina de

regulamentos vagos e anacrônicos, foros inexplicáveis e até corrupção. A apatia do publico


e do grêmio de artistas não os isenta da culpa. No melhor dos casos, teriam que ser @s

especialistas, historiadores/as, sociólog@s, crític@s e, mas recentemente, curadores/as,

quem exigiram informação a respeito de alguma coleção que se forme de modo duvidoso.

Toda coleção particular é assunto privado e ninguém pode exigir informação alguma,

salvo quando seus donos decidem exibir, doar ou vender suas coleções a uma instituição

publica. Há pessoas e casais que possuem uma quantidade eclética de peças (velhas,

novas, más, boas, muito a seu gosto). Muit@s não se consideram colecionadores/as,

talvez porque não começaram a comprar com essa intenção. Determinar se são ou não

depende da decisão que tome cada quem depois de amassar certo numero de peças. Decide-

se definir o acervo como coleção, então o é e tomará medidas que julgue necessárias ou

convenientes: legitimará a procedência de cada peça (se não o fizer, corre riscos – no caso

de guardar uma peça pre-hispânica ou colonial – de ser detida pelas autoridades);

cuidará das condições em que as armazena, as avaliará e assegurará, se preocupará em

restaurar obras e molduras quando seja necessário, e para cada objeto ou conjunto terá

uma pasta própria.

As questões que decorrem da decisão de criar uma coleção particular são conseqüência do

gosto de cada indivíduo, da dinâmica do mercado, e com freqüência, da agenda pessoal

dos mercadores. Adquirir uma obra de arte não é moleza, não. Deve-se conhecer algo de

arte, ou então saber ouvir o chamado da intuição. Desgraçadamente, pouca gente com

capacidade aquisitiva entende dessas coisas. É então quando @s vendedores/as de arte

(marchands em francês, dealers em inglês) se fazem presentes, não sempre

desinteressadamente. No nosso desconcerto, nós artistas costumamos julgar seus ofícios

como acertados só quando são a nosso favor, do contrario os satanizamos. Pareceria

obviedade insistir em que os corretores estão com todo o direito de dirigir o que mais lhes

convenha, e mais vale calar que falar mal desses, pois chegará o momento em que lhes

convenha dirigir o que é nosso.


89

O importante é reconhecer que as artes visuais, como as doenças, prosperam em climas

propícios: em colônias de semelhantes, em círculos de conhecidos que pertençam à mesma

classe social. Como todo mundo, os membros de cada círculo buscam parecer-se com seus

pares e, mais ainda, quando se trata de dinheiro. Assim, se o conhecido banqueiro E____

C_____ F____ compra um Gerchman, já aconteceu que seu vizinho em Moema, Edimilson

Ramires (ou quem seja) também adquirira o seu, ainda que se vomite cada vez que passe

na frente da peça.

Disso vivem as galerias, que no México e na América Latina são em sua maioria de

caráter parasitário: dirigem obras já reconhecidas, de prestigio geralmente ganho no

exterior, graças aos esforços de seus autores/as (ver anexos: Galerias). Contam-se nos

dedos as empresas que sabem como projetar devidamente seus artistas. Por sua

natureza, o trabalho desses negócios é eminentemente cortesão; depende de muito

pressionar, pelo que preferem logicamente trabalhar com aqueles/as artistas que

compartilham sua predileção pelo jogo cortesão (que existem, sim, perto de nós e em

qualquer parte).

Sobre gosto se rompem gêneros: cada um de nos saberá decidir em seu coração se prefere

cortejar políticos e empresários grandes para, na melhor das hipóteses, decorarem suas

mansões. Ou se preferem realizar vendas mais modestas, mas mais freqüentes. @s

primeir@s terão que expor em galerias elegantes e ajustar- se aos gostos da clientela

dessas empresas; @s segund@s podem expor em espaços institucionais e acrescentar

algo à historia do pensamento e da cultura.

Na realidade, a única coisa complicada do colecionismo é a maneira com que se misturam

e entrelaçam os interesses particulares com os das instituições públicas, cujos orçamentos

saem de nossos impostos. Os funcionários latino-americanos são mais atentos a


interesses do mercado e ao que podem lucrar, social e economicamente falando, que nos

mistérios da estética e da historia. Não nos reconforta saber o que acontece na região. O

que não se pode perder de vista é que nenhuma opção anula as possibilidades de incidir no

problema para resolvê-lo.

Para voltarmos ao currículo. Terminando a lista de nossas conquistas profissionais,

prossigamos:

8. OBRA PUBLICADA

Listarmos os livros, revistas, inclusive os canais e programas de televisão em que

publicamos o fato público de nossa obra, sejam essas capas, ilustrações, antologias,

resenhas visuais ou em televisão, em ordem alfabética. Exemplos:

Biombo Negro, revista de literatura negra, Cidade do México, n.1 ao 8, Rolando Trokas, o

camionheiro intergaláctico, quadrinho seriado, sobre roteiro de Jaime Lopez, 1993 e 1994.

Reforma, A, México D.F; Vinhetas semanais para Diário de uma cozinheira atrevida,

coluna culinária de Lourdes Hernandez Fuentes, durante o ano de 1994.

Universitários Os, Órgão de Difusão UNA M, Cidade do México; desenhos de Dia dos

Mortos: novembro de 1993, novembro de 1994, novembro de 1995, novembro de 1996.

9. BIBLIOGRAFIA

Sob esta categoria, listamos os livros e ensaios publicados sobre uma pessoa em

antologias. Consigna-se o nome d@ autor em ordem cronológica, depois o titulo do texto, o

nome da cidade onde foi publicado, a editora e finalmente o ano.

Exemplo: - BECKER, Carol et all. The subversive imagination – artists, society and social

responsibility. N.Y., EUA/Inglaterra. Routledge, 1994.

KASSNER, Lilly. Diccionario de Escultores Méxicanos del Siglo XX. Colección Arte e imagen.

México, Consejo Nacional para la cultura y las Artes, 1997.

LAUF, Cornelia e CLIVE Phillpot. Artist/Author –Contemporary Artist’s Books. N.Y,


91

distributed by Art Publishers Inc., 1998.

4
10. HEMEROGRAFIA

Sob esta categoria, listaremos as crônicas, entrevistas, resenhas críticas e textos símiles

sobre uma pessoa, publicados em jornais e revistas. Consigna-se o nome do/a autor/a e

ordem cronológica, depois o título do texto, o nome da cidade onde foi publicado, a editora

e finalmente o ano.

Exemplo: MAYER, Mônica. Gráfica periférica: o que fiz primeiro. Cidade do México, El

Universal, 2 de dezembro de 1994.

11. M I D IAGRAFIA (radio e TV)

É muito comum que @s artistas omitam o elenco de crônicas, revistas, resenhas,

reportagens ou entrevistas transmitidas pela radio ou pela televisão. Talvez não se dêem

conta de que os meios eletrônicos têm maior penetração no público que os impressos.

Diferentemente desses últimos, o elenco sob essa categoria deve seguir também ordem

cronológica inversa, do mais recente ao mais antigo.

Exemplo: 1997 A cozinheira atrevida, conversa com Lourdes Hernández Fuentes, Cidade do

México; Radio Educación/Setembro; 11h, terça-feira 27, 1997.

ANEXOS
- Associações em organizações culturais.

Essa categoria é especialmente importante para historiador@s, pesquisador@s,

sociólog@s e demais acadêmic@s, uma vez que no momento de recriar o passado, seja

esse distante ou imediato, possam recorrer a esses dados para localizar @s artistas em

seu contexto social. Aqui se proporciona informação sobre as associações e organizações

artísticas nas quais participou, tais como clubes, sindicados, frentes, etc. A lista é em

ordem alfabética, seguindo os modelos anteriores.

4 Hemerografia - substantivo feminino: catálogo ou depósito de jornais, revistas, e outras publicações periódicas
- Trabalho docente ou jornalista ou qualquer outra atividade que manteve de importância.

Elencamos os trabalhos que realizamos como instrutores/as, mestres, professor@s,

assessor@s, conselheir@s, etc. Também em ordem cronológica inversa.

- Palestras, mesas-redondas, debates, júris, etc. Também aqui em ordem cronológica

inversa.

- Outras atividades

Na dinâmica de nossa profissão, a curiosidade ocupa um lugar muito próximo à

imaginação e é lógico que isso nos impulsiona à aventura. Qualquer experimento, viagem

ou conquista que tenha sido determinante em nosso trabalho deve ser elencado nessa

ultima categoria, claro, em ordem cronológica inversa.

- Formação profissional

Elenca-se a educação formal e informal que recebemos para capacitarmos-nos como

artistas. Ninguém esta interessado em saber qual maternal, jardim de infância e escola

fundamental freqüentamos. A única coisa que importa é a formação profissional:

academias, oficinas, cursos, inclusive viagens de estudo, para informar dos quais se deve

sempre informar datas e demais dados pertinentes.

Um CV deve conter unicamente a verdade


Um Currículo Vitae é de enorme utilidade entre outras coisas para concordar exibições,

conseguir bolsas, receber apoios especiais, cumprir residências e dar palestras. Este

documento é considerado de cunho legal em todo o mundo, ou seja, a informação vertida

no CV deve ser fidedigna e comprovável. Por essa razão e para respaldar a lista, será

necessário guardar em arquivo e em ordem, todos os títulos, diplomas, certificados,

constâncias, anúncios de exibição, catálogos, recortes de jornais e revistas, gravações de

entrevistas e demais testemunhos.

Especializando o CV para cada ocasião


Não obstante a estratégia geral que tenhamos traçado para o nosso futuro, ao longo da

vida, irão aparecer oportunidade que nos ofereçam opiniões inesperadas. Não se trata de
93

“abandonar” as artes, mas sim encadeá-las a um plano maior. Quanto mais experiência

pudermos acumular, mais substância terá nossa obra. Para aproveitarmos ao máximo

algum panorama novo, temos que cumprir com os requisitos de rigor, em primeiro lugar,

apresentar o currículo apropriado para cada ocasião.

Assim, ao ir revisando as opções que nos vão apresentando – esta bienal de gravuras, o

convite de alguma universidade a dar um seminário, aquela cenografia- , ou quando por

qualquer motivo tenhamos que trabalhar para terceiros, então, tomamos no nosso CV

extenso e selecionamos o que mais poderá interessar à pessoa com quem tratamos: nossa

produção gráfica, nossa experiência pedagógica, ou nossos trabalhos cenográficos e de

ambientação. O listado detalhado é a nossa melhor carta de apresentação.

O CV relato
Por muito útil que possa ser um elenco ponto por ponto, não deixa de ser um documento

frio, chato inventario de datas, nomes e dados. Muitas pessoas estão interessadas em

uma narração biográfica anedótica, texto que serve para nos apresentarmos em uma

mesa redonda ou nos inclua em antologia, para atualizar a informação requerida por

colunistas e jornalistas..., enfim.

O que se entrega é uma simples e sucinta narração de momentos significativos de nossa

vida profissional. Há artistas que podem escrever com maior facilidade que outr@s,

portanto podem redigir em primeira pessoa. Quem tem maior dificuldade para fazê-lo,

pode recorrer aos serviços de algum/a amig@ literat@ para fazê-lo. Claro, em terceira

pessoa e com a sua assinatura ao final.

Verbalizando nosso trabalho


Além dos mitos que rodeiam a@s artist@s e que nos acarreta gravíssimas

conseqüências, o mais danoso é aquele que reza que @s artistas não pensam, só sentem.
Nos dois ou três qüinqüênios recentes, muit@s artistas, especialmente @s mais jovens,

deu-lhes para cultivar uma sorte de balbuciar gago, quase troglomegalítico, ao falar de

motivos que os impulsionam. A incapacidade para verbalizar nossa lida reflete o vazio

que envolve a plástica contemporânea em muitos paises do nosso continente. Trata- se de

uma gradual diminuição na qualidade dos debates das artes atuais. O pior é que, com a

falta de apoios conceituais, muit@s d@s autores/as que publicam catálogos e discorrem

em mesas-redondas se expressam em termos cada vez mais mirabolantes e menos precisos.

Nas escolas e academias dos paises desenvolvidos, o alunado começa desde o terceiro

semestre a expor-se à critica de seus pares e de seus professores/as. Tem que exibir

periodicamente sua produção mais recente em petit comitê, e racionalizá-la, de modo que

não só aprendem a ouvir opiniões que retro alimentam, mas também a explicar seus

motivos e madurecer frente á critica. Ao sair pelo vasto mundo, tem as armas para

defender-se com argumentos requeridos para abrir passagens nos âmbitos acadêmico e

mercantil.

É essencial verbalizar sobre a nossa obra. Cada novo projeto, cada ação visual que

realizarmos tem sua razão de ser. Ninguém melhor que nós para conhecê-la, ninguém

pode verbalizar nossos motivos melhor que nos mesmos. Os dados que possamos oferecer

servem para informar a quem não conheça nosso trabalho, repórteres, promotor@s e

curador@s, até os clientes. Eventualmente, esses dados passam a fazer parte do discurso

crítico do momento e dai, da historia da Arte.

Para escrever sobre a nossa obra é preciso praticar, redigir textos breves e uma vez

outrora, lê-los no círculo que freqüentamos. Ou escrever cartas e e-mails...


95

IX – NOSSO ARQUIVO E SUAS PARTES


De como criar os elos na cadeia da vida...

Cada coisa em seu lugar e uma pasta para tudo


Já nos familiarizamos, em linha geral, com o mundo que nos rodeia. Habitam-no desde

noss@s primeir@s mestres até diretores de museus, jornalistas, carpinteiros,

restauradores e muitas outras pessoas. E todo o nosso mundo interno está rodeado,

obviamente, pelo publico. Trata- se de nossos interlocutores, a quem já dividimos em

publico ativo e publico passivo.

Tanto as pessoas que apóiam nosso trabalho como as que o desfrutam devem ser

consideradas laços: é tal a sua importância que devemos aprender a tratá- los com todo o

cuidado que merecem. Para mantermos contato com tantas pessoas, utilizamos o fichário

de endereços, e para dar um bom prosseguimento as nossas relações de trabalho com cada

uma das pessoas ou instituição, é necessário criar um arquivo dividido em classificações.

É preciso combater o caos onde este surgir. A única forma de não nos afogarmos em um

mar de papéis soltos, convites, mostruários, cartas pendentes, uma meia velha sem par e

cheques extraviados entre revistas e desenhos, é organizando nosso arquivo corretamente.

Á medida que avancemos em nossa profissão, vamos acumulando projetos, compromissos

e atividades, cada um dos quais exige uma pasta própria, que se classifica de acordo com

o assunto no arquivo. Parece complicado, mas não é. Especialmente se começarmos a

construir este arquivo no inicio da carreira, quando temos apenas três cartas, seis

recibos e uma exibição coletiva em amadurecimento (total: 10 pastas ou folders, se

preferir).

Comecemos por definir as divisões de nosso arquivo (classificação), para então acomodar

cada pasta em um lugar apropriado. Meu arquivo, por exemplo, está dividido assim:
ÍNDICE
Assunto Caixa
1. Informação Biográfica (CV) A

2. Assuntos domésticos A

3. Aulas, assessorias, palestras B

4. Haltos2Ornos (Oficina H2O) N

5. Trabalho jornalista: - ativo B eC

- passivo C

6. Administração - ativa D eE

- passiva EeF

7. Correspondência

7.1 Geral

7.2 Grêmio F, G e H

7.3 Organizações e Publicações Internacionais H eI

7.4 Organizações e Publicações Nacionais I

7.5 Críticos e cronistas I eJ

8. Inventario da obra J eK

9. Questões de política (ou de estética, ou...) K

10. Assuntos diversos L

11. Museus

11.1 Nacionais

11.2 Exterior M
97

12. Arquivo Morto caixas de papelão 1,2 e 3

13. Seção intocável de foto móvel de metal à esquerda

14. M aterial promocional móvel de metal à direita

Note-se que as seções mais importantes, a 13 e a 14, têm seu próprio móvel.

Comecei a acumular e ordenar meus papeis há pelo menos quarenta anos. Não me deu

trabalho fazê-lo, já que comecei com muito poucos papeis. O tempo e o costume de guardá-

los se encarregaram do resto. Agora tenho um total de quinze gavetas repletas, todas

razoavelmente arrumadas (isso só eu que digo, pois, provavelmente, se alguma vez algum

administrador profissional as viesse desataria em gargalhadas). Entretanto, me serve

muito bem, pois como surgiu de maneira orgânica partir de meu trabalho, responde às

minhas necessidades particulares. Hoje, quem quer que busque algum dado, uma

historiadora, meu contador ou algum pesquisador poderá resgatá- lo em questão de

segundos.

Logicamente, desde o inicio dos anos 90 meu arquivo começou a ser virtual, pois se

estendeu ao interior de meu computador (os espanhóis e franceses, muito sagazes, dizem

“ordenador”, por algum motivo será). Juntos os dois sistemas, o físico e o virtual, são as

ferramentas mais úteis de meu trabalho. As pastas de cada uma das pessoas,

instituições, organizações ou fundações que povoam nosso universo de trabalho se

localizam no momento graças a uma lista, ou cardex, que se duplica no escritório virtual.

O fichário de domicílios especializados


É impossível dirigir o arquivo com eficácia e relacionarmos com o mundo que nos rodeia,

se não contarmos com um fichário de domicilio, dividido também em classificadores.

Trata- se de um sistema para guardar e consultar os nomes e domicílios de clientes e


provedores, PAD e PAI, galerias e instituições, meios de comunicação, colegas etc. Cada

um pode inventar seu método para fazê-lo, mas qualquer papelaria grande oferece uma

variedade de fichários da qual podemos selecionar o que mais convier. São muito bons os

fichários circulares chamados “rolex” (ou algo do gênero), pois admitem uma boa

quantidade de cartões que se pode consultar com um simples movimento da mão. Hoje há

uma série de softwares que podem nos ajudar neste trabalho de classificação.

Confesso que sou um pouco obsessivo nisto de manter-me em contato com as pessoas.

Acontece que não me custa muito trabalho, pois já tenho meus hábitos para fazê-lo da

forma menos indolor possível. Além dos domicílios e telefones que anoto na minha agenda

de bolso e que logo copio em fichas, também guardo na bolsa direita de minha camisa uns

quantos cartões de apresentação ou papelzinho rabiscado que vou pegando no caminho. Ao

chegar ao escritório, os coloco em uma caixinha e a cada oito ou dez dias, me sento para

copiar as fichinhas. Chatíssimo, mas utilíssimo.

Obviamente essa tarefa nunca termina, pois a mobilidade das pessoas, a fugacidade de

executivos e funcionários e demais mudanças que exige atualização no fichário

constantemente.

No caso de precisarmos de dados que não estejam em nosso fichário, sempre podemos

recorrer à agenda de telefones, em qualquer parte do mundo. Bato o pé no obvio, pois,

ainda sabendo de sua existência, muit@s artistas não sabem como localizar telefones ou

endereços e depois se queixam por se sentirem isolados. Internet, por sua vez, também tem

informações equivalentes aos telefônicos, basta clicar na cabeça do nosso ratinho para

consultar a rede.

Meu fichário de domicílios está divido da seguinte maneira:

- Seção Geral, com subclassificações tais como: Amizades, Colecionadores, Família,

Galerias, Hotéis, Instituições publicas e privadas, Médicos, Museus, Provedores (por


99

especialidade), Restaurantes, Serviços (como Fotógraf@s, Modelos, Fundidores, e

outros), Zoólog@s, etc.

- Seção Artistas

- Seção Meios de Comunicação

- Seção Estados do País,

- Seção Exterior

Esses últimos, repito, em ordem de subdivisão para conservar sob a lupa os contatos que

vou conhecendo.

Cada seção de nosso fichário de domicílios cobra importância em distintos momentos da

vida produtiva. Na hora de preparar uma exibição, por exemplo, se consulta a seção

dedicada a Meios de comunicação, a qual se divide da seguinte forma:

- imprensa,

- televisão,

- radio

É fácil usar telefones, fax ou correios eletrônicos de jornais e revistas, para depois

proporcionar-lhes informação: através da rede, se tivermos computador. Consultando as

páginas amarelas e na pior das hipóteses, comprando na banca de jornal mais próxima.

Conseguir os dados é o de menos. O importante é aprender a nos concentrarmos no

importante. Por exemplo, não é preciso guardar os dados de qualquer jornalista, a menos

que seja uma amizade. Armazenamos só os dados daquelas pessoas cujo trabalho nos

seja afim. Como saber quem são? Lendo o que escrevem!

Correspondência
As cartas- caracol, correio tradicional que bem ou mal continuam funcionando, se

acrescenta agora a eficaz velocidade dos correios eletrônicos. O resultado é que ganha

novos brios aquele importante adjunto da literatura de todos os tempos, a arte epistolar.
A escritura que resgata para nosso deleite (e para bem da memória coletiva) o mais

recôndito da atualidade. Como já disse anteriormente, cartas nos ajudam a verbalizar

com precisão assuntos que de outra maneira poderiam ficar no balbuciar ou perder-se no

silencio.

Com uma produção em marcha sobre rodas e arrumadela, e com o fichário atualizado à

mão, pronto para descobrir que se nos aproximará mais e mais das pessoas. E não é só

isso, descobriremos com prazer que contaremos com muito mais tempo para criar nossa

obra.

Todas as cartas que enviamos passam a ocupar seus lugares nos arquivos de nossos co-

responsáveis. Podemos ajudar- lhes a classificar identificando-as: colocar cabeçalho,

datar e assinar, além de ser útil, causa muito boa impressão.

Certamente antes mandar imprimir nossa papelaria era um luxo. Hoje, com o computador

podemos criar até nossos cartões de visita. Artistas com cartões de visita? Claro que sim!

Como podemos figurar nos fichários de outras pessoas melhor organizadas que nos, se

não distribuímos os ditos cartõezinhos? Pessoalmente considero o desenho desses

papeizinhos uma arte, um parêntesis na arte do estampado. A fazer voar a imaginação!


101

X. MANEIRAS DE PROTEGER-NOS E PROMOVER-NOS


De como a cortesia não tira a audácia, e como tudo vale
na guerra e no amor

Com certeza a vida de artista não é fácil. Porém não temos porque complicá-la mais

atuando como seres passivos. Contas claras e amizade longa, diz o ditado, que traduzido

nos indica que no momento de estabelecermos convênios e outros acordos, de dirimir

diferenças, de construir relações e, em geral, de funcionar como profissionais que

queremos ser, é preciso pôr as cartas sobre a mesa, deixar as coisas claras e por escrito.

Infelizmente ficaram para trás os dias em que o que valia era o fio da barba. Hoje só por

escrito é que as coisas têm valor, por isso é necessário saber quando e como escrever

cartas.

Deve-se ponderar com cuidado, isso sim, como responder à nossa correspondência. Uma

epistola manuscrita de 74 paginas dirigida a uma preciosa colega no Brasil, não é o

mesmo que um e-mail ao sempiterno Romario Silva, no Ministério de Relações Exteriores,

a quem devemos proporcionar de imediato as medidas das seis peças que viajarão ao

Canadá. Também é diferente entabular comunicação com um/a crític@ de arte e com um/a

sociólog@ da arte. @s crític@s precisam de informação muito diferente da que

procuram, por exemplo, @s sociólog@s ou @s historiadores/as.

M ais importante ainda, em tempos de competitividade muito alta e punhaladas nas

costas, é aprender a defender-se, seja legalmente, seja de maneira publica. A seguir

ofereço uma série de cartas que podem nos servir como modelo.

Modelos de cartas
A carta técnica:

Trata- se de uma comunicação na qual ou repetimos alguma conversação telefônica ou

afinamos detalhes da relação que estamos levando a cabo.


Felipe Ehrenberg
Av. Necaxa 125 bis
Col. Portales 03300
México DF, México
kbajin@yahoo.com
www.ehrenberg.art.br
Á atenção de:
F.. C... F...
Castellana 101 – 2 andar
28046 M ad rid, Espanha
Tel: + + (34 1) 556-2044
Fax: + + (34 1) 556-2053
Cidade do México, 18 de outubro de 1993

Estimado F...,

Depois de uma ligação internacional e dois envios de fax falidos, envio-lhe a confirmação
oficial de seu muito grato convite para participar da mesa redonda “Estética, niilismo e
violência” a se realizar no dia 25 de novembro do ano em curso, no Museu Nacional
Centro de Artes Rainha Sofia.
Considero, também, aceitável o pagamento de R$ 750,00 reais pela participação.
Assim mesmo, terei muito prazer de dar um curso de quatro sessões sob o nome “Novas
artes e comportamentos estéticos”, no Instituto Estético e Teoria das Artes, da UA M, do
dia 22 ao 25 do mesmo mês. Também considero justo o honorário de 1.000 reais.
Com esta mensagem , F., lhe envio também meus mais sinceros e agradecidos
cumprimentos,
Fico a sua disposição,

Felipe Ehrenberg

PS- Lembro-lhe que estarei fora da Cidade do México do dia 23 de outubro até dia 3 de
novembro, por motivo da exposição olímpica (!) em Atlanta, EUA.

A cortesia não tira á audácia... Nem acovarda o bom humor.

Carta de conteúdo:

Refiro-me àquelas que escrevemos para intercambiar opiniões e críticas construtivas,

simplesmente para dialogar ou proporcionar indícios ao modo em que pensamos e


103

funcionamos, com o que se enriquece toda relação:

EHRENBERG
GONZALEZ ORTEG 58-1 COL. MORELOS 06200- MEXICO DF
Tel e Fax: ++(52 55) 795-7975

A atenção de:
M.G. e/ou L.M.S
Coordenação de Difusão Cultural
Museu Universitário do Chopo/UNA M
Presentes
Cidade do México, dia 20 de abril de 1992
Queridas amigas,

Acuso o recebimento de sua carta (10/08/1992) com referencia aos donativos de esculturas que
solicitam para sua coleção permanente. Respondo-lhes:
1. Sempre acreditei prejudicial insistir na cronologia para distinguir gerações de artistas
plásticos. Não se faz isso em outras categorias de atividades sociais (ninguém, por
exemplo, se refere a advogados ou a médicos jovens e não se fala da arquitetura ou da
engenharia jovem).
O tempo se reflete certamente nas artes, mas a palavra jovem, na imprecisão que lhe outorga
a moda, é incapaz de descrever as diferenças geracionais e muito menos estilísticas. Meu
conselho é que tomem o touro pelos chifres, que a palavra “jovem”fique com o que é, um
mero recurso de marketing de nossos marchantinhos da arte, e que em seu afã pedagógico, o
museu assuma frontalmente tarefa de redefinir para precisar.
2. O governo atual delineia com claridade sua política fiscal, e cobra impostos a@s artistas
plásticos com rigor. Sendo a UNAM uma instituição publica, não entendo porque a
recadação não é distribuída de tal forma que os museus oficiais contem com orçamento
de aquisição para enriquecer seu acervo.
Enquanto não mudem a mencionada fiscalização dos artistas, não vou dar de presente
um só bem cultural que deveria ser comprado com os impostos que pagamos.
3. Além disso acredito – e isso como membro fundador da Sociedade de Amigos do Museu
do Chopo – que nós amigos deveríamos marcar como prioritária a tarefa de criar uma
coleção permanente da sociedade, mesma que se albergaria no museu, para protegê-la
das inconstâncias e desacertos de administrações futuras... Mas isso é, talvez, farinha de
outro saco.
Agradeço a oportunidade que sua carta me deu para expressar minhas inquietudes e reitero
minha admiração pelo trabalham que vocês realizam frente ao Chopo.

Atenciosamente,

Felipe Ehrenberg E.

Carta tipo “a cortesia não tira a audácia”:

Pouco comum em nosso meio, mas se explica sozinha.


Felipe Ehrenberg
Av. Necaxa 125 bis
Col. Portales 03300
México DF, México
TEL/fax ++(52 55) 532-6487
kbajin@yahoo.com
www.ehrenberg.art.br

Á atenção de C.P.
Av. Miguel Angel de Quevedo, 3967
Coyoacán, D.F
Tel: 5539-5270

Cidade do México, dia 6 de março de 1997


C______,
Acredito que você não pode mais guardar na memória a boa convivência que sempre tivemos,
desde que você era ainda muito jovem. A natureza agradável de nossa relação se mantinha e até
se reconfirmou durante a época que compartilhamos entusiasmos no jornal O Mercantilista ,
você na redação e eu como colaborador.
Quis o destino que eu me descuidasse de meus assuntos até agora que, chegado o momento,
solicitei á R____ a devolução de meus desenhos e você os tinha levado e guardado para devolvê-
los a mim. Já emolduradas, as obras estão cotadas a quase US$ 500,00 dólares, ou seja, uns
US$4.000,00 dólares cada uma. Nestes momentos, tenho a oportunidade de vender, pelo menos
15, e o dinheiro viria em muito boa hora.
105

Já faz algum tempo, tentei comunicar-me com você por todos os meios sem nenhum resultado.
Quero pensar que foi o azar que impediu você de responder a minha solicitação. Portanto agora,
em minha ultima tentativa amistosa por aclarar o assunto, volto a pedir-lhe que me traga as
obras (no endereço acima mencionado), que me envie pelo correio ou indique onde meu
assistente poderá pega-las.
Agradeceria se isso não passasse deste mês.

Despeço-me,

FAX zangadissimo!

Temos n@s artistas a reputação de sermos muito dóceis, e a julgar por mil e uma

historias de maus tratos e despojos, talvez a mereçamos. Porém assim não é a vida: se

não nos defendemos n@s mesm@s, ninguém mais o fará...

+++ + + + + + + + + + + + + + + + + + + + + +

Folha de transmissão de Faz


n. paginas: 1
De: neologista Felipe Ehrenberg E.
Fax: + + (52 55) 532-64 87
Data: 4 de março de 1996
IMPORTANTE
AS LINHAS TELEFONICAS NO MEXICO ESTÂO TÃO RUINS QUE OS FAXS
COSTUMAM CHEGAR MULTILADOS. FAVOR RETORNAR SE ESTE FAX
CHEGAR INCOMPLETO.
+++++++++++++++++++
Atenção: C.B.G
Fax. 5543-1273
C________,
Em questões de ética nada é inoportuno. Acabo de receber do serviço de recortes, a fotocópia de
um artigo seu, Incidentes II, (O financeiro, 2 jan. 96), no qual exterioriza informações falaciosas e
opiniões que constituem um inusitado ataque a minha pessoa.

Reitero neste fax o que lhe disse no telefonema que mantivemos há alguns minutos: em minha
qualidade de co-curador da coleção de imagens digitais produzidas por meia centena de plásticos
para a empresa Edumac, EM NENHUMMOMENTORECUSEIA IMAGEMPORVOCECRIADA– a
única que você ofereceu a escolha, certamente – nem soube que tivesse sido excluída da coleção
final.
G.L(em sua qualidade de organizadora, não de curadora, como você afirma), me informou sem
ambigüidades:

1. a imagem por você criada faz parte SIM da seleção final,

2. até a data em que se publicou a sua nota, não havia sido oferecido o pacote de imagens a
nenhum possível comprador. Eu não poderia ter-me “submetido”, portanto à censurar-lhe, nem
você afirmar o que só pode ser considerado um calunia.

O que você publicou no citado texto é absolutamente falso. Continuará sendo uma mentira até
que não a esclareça e evite que o libelo a fique assentado como verdade na crônica de artes
destes dias.

C___, eu havia considerado você até essa data como um amigo. Quero pensar que você se afastou
do rigor acadêmico e profissional que sempre o caracterizou por equivoco. Sob nenhum motivo
quero pensar que a gravíssima acusação de censor que você me dá, obedeça a outra obscura
razão. Sei que de seu cavalheirismo e sua disciplina, lhe permitirão de dar-me a satisfação que
exige nossa profissão e uma amizade que temos mantido ao longo de muitos anos.
Será, lhe asseguro, apagado e começaremos do zero quando você me entregar os exatos 19,5 cm
(medindo a partir de “O(neo)costume... etc.) seu próximo artigo em O financeiro.

M ais que evidenciar, o que quero mostrar aqui é como nenhuma arbitrariedade ou ato de

prepotência cometidos contra n@s por ocupantes de postos de poder ou tribunas da mídia,

deve ficar sem resposta.

E-mail íntimo:
De: felipe ehrenberg (S MTP: kbajin@yahoo.com)

Enviado: sexta-feira, 14 de maio de 2001 12:59 P M

Para: M.B

Assunto: Obrigado e mais sobre a mesa redonda

M___, vamos ver se vocé responde ao meu e-mail A.Z. - ...se não, terei que ligar para ela. É M. H. ,
quem anda trás de V.S. -... e onde vivia, dizem que “sumiu”(?) hmmmmmm.....
Me super mega hiper encantaria participar da mesa redonda Arte VS Desenho. Bem difundida,
poderia resultar não só esclarecedor, mas também, quem me dera, determinante para acabar com
as confusões e limpar AMBOS OS territórios... E por tabela, evitar duplicidades...
Quando você volta de Nova Orleans?????Por mim, voltarei de Monterrey no dia 25 de maio. Aí
107

você quem manda.


Você não virá à Cúpula hoje à noite?
Beijos às meninas,
F.

Esses exemplos ilustram varias verdades, que nunca é demais reiterar:

- vida e trabalho formam um continuo ininterrupto

- a informalidade não tira a precisão;

- é preciso (sempre) deixar por escrito o que se pactua verbalmente;

- não devemos deixar para amanhã a carta que devemos enviar hoje.

Relações de negócios e promoção


Um dos mais temíveis obstáculos que se interpõem entre @s artistas e o mundo lá fora é

a nossa incerteza em relação à realidade. É muito comum topar, num coquetel de

embaixada ou num boteco, com alguém interessante, com quem conversamos como se nos

conhecesse há muito tempo. Em algum momento surge a pergunta inevitável: “bem, e por

falar nisso.... Você estuda ou trabalha?”

- Pois eu, como lhe disse, - responde alguém, pondo-se tod@ vermelho no rosto e varrendo

o piso com os pés -. Eu, bom, eu pretendo ser pintor/a.

@s únicos artistas que respondem “sou artista” ou “sou pintora” são @s que já

chegaram, @s que já organizaram sua vida. Nunca cruzei com um médico, por mais

modest@ ou desconhecid@ que seja, que me diga com pena: “pois, olha, eu curo...” Ah,

não, sempre respondem com firmeza: Sou médico!

O assunto é preocupante, porque a maneira pela qual nos identificamos e nos (mal)

promovemos como artistas pode levar a que nos tratem com desdém.

Quantas vezes não acontece que um/a possível comprador/a de nossa obra pechinche o
preço ?: “E... para mim?”, costumam dizer, “você faz por quanto?” Uma pergunta que

jamais a pessoa se atreveria a fazer a um dentista ou inclusive a seu estilista. Se por

acaso esses cobram caro, ou querem pagarem parcelas, por que diabos não perguntam

que desconto podemos fazer-lhes para pagamento a vista? Por que nos tratam como um

camelô na rua (que também não merece esse tratamento)? Sem dúvida, isso se deve ao

fato de que nos custa a muit@s admitir que somos artistas... Como sentimos que não nos

irão levar a serio essa sensação se projeta como luz de farol.

Talvez um/a analista possa descrever melhor a confusão de sentimentos encontrados que

se engasga em nossas almas torturadas e confundidas pelos mitos que foram

construídos ao nosso redor (tcha tcacha tchãn!) e que também são a causa das

ambigüidades associadas com a palavra “artista” na fala comum.

Artista como vocábulo descritivo costuma ser usado de maneira admirativa para descrever

excelência em qualquer atividade (essa cozinheira é uma artista, aquele trombadinha que

rondava pelo metro era um completo artista). Utiliza-se também de modo genérico no

mundo da mídia e das celebridades (os artistas do Globo ou SBT, tanto faz). Para

nossos propósitos, é e será sempre o nome da profissão, tão acertado como dizer mineiro,

bailarino/a, chef ou administrador/a de empresas. Além disso, diga-se já não tão de

passagem assim, não é a mesma profissão artista visual a do designer gráfico, da

mesma forma que não é a mesma coisa a veterinária e a medicina...

Enquanto não nos profissionalizemos, enquanto não levemos os assuntos próprios da

profissão com a seriedade e a disciplina que merecem, inclusive até que não nos assumam

como pequenos empresários com intenções de crescer, nunca avançaremos mais do que os

níveis primários. As pessoas continuarão desdenhando-nos como quem “faz um favor”.

Posso ver o cabelo em pé e as sobrancelhas franzidas dos colegas leitores/as que se


109

preparam para jogar este livro no lixo.. Estarão exclamando em seu interior,

indignadíssim@s, “imagina, igualar @s artistas aos pequen@s empresári@s! Ora

essa! Se nos não somos feitos da mesma matéria do que a desses mercenários!”.

A isso só posso responder: leiam a sua Historia... Estudem como operavam @s artistas

que mais admiram, aprendam como cuidaram de seu próprio dinheiro. E se não quiserem

seguir seu exemplo, não joguem esse livro no lixo, dêem-no a outr@s...

Maneiras de promover-nos
Métodos artesanais:

A maneira mais antiga e eficaz de pôr nosso próximo a par do que fazemos é mostrando-

lhe a obra de modo direto, quer dizer, convidando as pessoas par ir à nossa casa ou ao

nosso ateliê, em cujas paredes e espaços de exibição penduramos nossa obra, velha e nova.

Descobrimos depois de cada visita o quanto é eficaz a noticia transmitida boca a boca.

Claro, se nosso espaço de trabalho é uma biboca, todo sujo e virado de pernas para o ar, o

tiro pode sair pela culatra.

O passo seguinte é expor trabalhos com a maior freqüência possível e avisar meio mundo,

até a vovozinha, quando e onde estamos expondo, e se necessário entregar todos os convites

em mãos. Adiante veremos como, quando e porque é mais pratico exibir no ateliê e em casa,

com todas as da lei, ao invés da andar procurando uma galeria que nos faça o favor.

Ainda que dependa do prolífico que sejamos, se temos bem organizados nossas gavetas de

mapas, nosso armazém e nossa documentação, podemos participar até em 10 ou 12

coletivas por ano. No que se refere às exposições individuais, o ideal é apresentar pelo

menos uma por ano.

Métodos surpreendentes:
Sei de um artista colombiano de grande renome que logo depois de fazer a via crucis no

México nos anos setenta, decidiu emigrar para Nova York, naquele tempo uma

importante capital da arte. A primeira coisa que fez ao chegar foi uma lista de

absolutamente todos os museus, grandes e pequenos, que existiam nos Estados Unidos.

Depois redigiu uma carta/forma que rezava mais ou menos assim:

“Prezado/a diretor/a... sou artista da Colômbia... acabo de chegar dos EUA... impactou-me em
especial o trabalho que realiza o museu que tão dignamente o Senhor(a) dirige... como sinal de
minha admiração gostaria de doar a seu acervo a seguinte obra...”.

... E a enviou, com uma de suas gravuras, a todos os museus. Sem exceção, todos

aceitaram sua “doação”. Ao fim de um par de meses pode este artista arrumar seu

currículo sob a categoria colecionadores, os nomes de um monte de museus americanos.

Consequentemente suas cotações foram às alturas.

Desde então, mudaram muito as circunstâncias. Atualmente, sempre é possível doar

obras aos museus, ainda que estes agora se apóiem em um conselho de especialistas e

curadores para assim construir suas coleções de modo coerente. O importante do exemplo é

que não há nada reprovável em ser agressiv@. M al é mentir ou falsificar dados.

Por sua parte, José Luis Cuevas também é muito bom exemplo de como tratar @s

amigo@s nos meios de comunicação. Sabendo que merecem uma atenção muito especial,

sempre deu jogo. Como compreende bem que um/a jornalista cultural tem tanto apreço por

seu trabalho como ele o tem pelo seu, nunca esquece de mandar uma nota, invariavelmente

manuscrita, para agradecer a todas e cada uma das menções que o citam, sem exceção. E

nada lhe custa acompanhar suas linhas com um delicado desenho, que sabe será

imediatamente emoldurado. Gesto generoso que rende a todos...


111

Métodos de marketing:

Passemos agora a territórios muito mais delicados e complexos, reservados a@s

marchands e seus propagandistas. Não por isso, podemos perdê-los de vista.

Conta-se de um artista de uma cidade do norte, filho de família quatrocentona. Os pais,

mostrando uma grande confiança em seu rebento, investiram ao longo de dois anos, com

muita sagacidade, mais de um milhão de dólares para promovê-lo no exterior, alugando

galerias na Suíça, em Nova York, em Berlim, financiando impressão de luxuosos

catálogos, e vendendo suas obras entre parentes e amizades. Em menos do que canta o

galo, o dito artista – nada desprezível, diga-se de passagem – conseguiu efetivamente

posicionar-se entre os mais cotados do país.

Sirva o botão de mostra para ilustrar o assunto. A promoção não faz a@s artistas, mas

pode funcionar.
XI. FECHANDO ACORDO COM TERCEIROS
De como podemos incidir no mundo que nos rodeia,
funcionando como se deve

Passos para expor sem dor


Atacaremos agora o tema das galerias e como devemos nos relacionar com elas. Grandes

ou pequenas, públicas ou privadas, elegantes ou bibocas, temos que considerá-las como um

negócio comercial. De qualquer forma, para que perder tempo se podemos expor no ateliê?

Daqui para frente vou me referir a elas como “empresas”, simplesmente porque é isso que

são. Para cada objeção que nós artistas expressemos contra as galerias, elas

expressaram cinco vezes mais contra nós. Para dizer a verdade, tem-se que admitir que

elas têm muitas razões para fazê-lo: nos somos são tão doidos, e se eu fosse dono de

galeria, a transformaria em sapataria ipso facto!

Sempre que se pactua uma exposição com uma empresa, seja publica ou privada, devemos

levar a cabo uma série de passos para suavizar o que costuma degenerar em uma relação

ríspida, para transformá- la em uma associação agradável que beneficie ($$$) ambas as

partes.

1. Intercâmbio de lembretes onde se põe por escrito tudo que foi falado.

Nunca faltarão mal-entendidos na relação entre artistas e empresas. Surgem em um

piscar de olhos e as conseqüências podem ser nefastas. Sobre o desenho dos convites,

sobre a maneira de redigir os informes de imprensa, sobre se a comissão será

descontada do preço da obra ou da obra toda, com moldura... Aliás, o assunto das

molduras é um bom exemplo: para um/a artista emoldurar pode chegar a ser um gasto

proibitivo; é mais conveniente, então, chegar a um acordo para que a empresa cubra esse

gasto e logo, ao encerrar a mostra e fazer as contas, que se desconte o gasto que nos

corresponde das vendas (também é comum dar obra em troca de molduras). É diferente se
113

pactuamos com uma instituição, que normalmente protege a obra com os vidros e as bases

que guarda em seus depósitos. Não há pior luta que aquela que não se faz: se não

podemos negociar o pagamento ou a troca de obra por moldura, podemos sugerir a quem

represente a instituição que cubra a moldura em troca de um recibo de honorários , e logo

fazemos as contas…

Da mesma forma delicada (e típica) pode ser o seguinte exemplo, que se refere ás listas

de endereços (a nossa e a da empresa): - Me dá os convites que me correspondem e eu os

envio, ou te empresto a minha lista para que a envie junto da sua? Porque se a galeria

vende para um de meus clientes o contrato diz claramente que a comissão será menor, não

é?

(CONTRATO? O que é que isso de contrato? De onde mesmo saiu essa historia de

contrato? Fiquem tranquil@s! Continuemos a ler, e isso virá mais tarde).

O assunto dos convites físicos, impressos, pouco a pouco está ficando no passado. Tenho

recebido por e-mail mais e mais convites lindos e bem desenhados; com o qual, alias,

evitamos o trabalho de lamber e colar os selos e levá-los ao correio e paga- las e…

Outro exemplo: o que é que será servido para o coquetel de inauguração e quem se

encarregará de pagá-lo? (na Europa e nos Estados Unidos é costume cobrar dos

convidad@s a partir da segunda bebida e vender os canapés. M as é LÁ, me dirão. Pois é

justamente lá onde se tem mais dinheiro e que se cuida melhor que nós, justamente porque

eles sabem sim economizar).

Também é conveniente chegar a algum acordo com a galeria sobre a possibilidade de

pagar aos nossos amigos pessoais uma porcentagem de comissão, para o caso de venda

dentro de nosso circulo de amizade. Se a galeria não concorda, não nos impeça de

estimular nossos conhecidos a pagar alguns centavinhos a mais.


2. Confirmem os arranjos combinados no calendário, e com toda a cordialidade do mundo,

se cotejam ambas as partes.

3. Chegada a hora de assinar o contrato (um minutinho de paciência, mais adiante

trataremos do assunto), se determina a data para compartilhar um jantar ou almoço

agradável e fechar o acordo.

4. Se procede a tudo o que se procede, com sorrisos e pontualidade… quer dizer,

cumprimos o combinado de maneira agradável mas formal.

Convênios verbais ou por escrito?

Começo por tocar em um assunto de senso comum: na hora de negociar, seja com @s

promotores/as de qualquer instituição encarregados de organizar nossa mostra, seja com

a dona da galeria da zona mais elegante da cidade, se não soubermos abertamente como é

que queremos trabalhar como eles antes de passar aos negócios maiores, corremos o risco

de acabar sendo puxados pelos cabelos. A culpa será nossa. Pensemos em só algumas

possibilidades:

Na Instituição
- Vai inaugurar em fins de janeiro do ano que vem…

- Como? Não tínhamos combinado dentro de três semanas?

(Talvez, mas não por escrito).

- O senhor tem a décima - quarta apresentação na mesa-redonda. Tem cerca de 3 minutos


para apresentar seu trabalho…e pode projetar somente quatro diapositivos.
- O que? Vocês não me pediram uma palestra magistral? Estou preparando há meio ano
meu texto, organizei minhas fotos em um PowerPoint fantástico, já avisei toda a família
que vem desde…
(Talvez, mas não por escrito).
115

No Festival
- Finalmente ficou pronta a programação. Você vai apresentar a sua performance na
ultima terça-feira às sete e meia da manha…
- COMOASSIM? Lembro-me perfeitamente que a minha performance iria abrir o festival.

(Talvez, mas não por escrito). Quem, quando e como é que vocês decidiram a
mudança…?
- Em nome do diretor e de todos seus colaboradores, é para nós uma honra entregar-lhe
este diploma como sinal de nosso agradec…
- O que?? O que? Como assim? E as 350 notas de um real que vocês prometeram me pagar?
(Ficou por escrito?)

Na galeria
- Bom, aí está o que ficou de tuas obras, menos o óleo que me cabe...

- O óleo que lhe cabe...? O que? Não tínhamos combinado que eu pagava a impressão e o
coquetel e você cobriria o…?
(Talvez, mas não por escrito).

- Aqui está o seu saldo, logo que descontar minha comissão…

- O que é que aconteceu!!!?? Eu me lembro de termos combinado que você ficaria com 55%
e não com 97%. Segundo meus cálculos…

E assim por diante. Se não se estabelece em detalhes nos tempos de negociação prévia, se

não pusermos por escrito e se não assinarmos as partes, vão nos prejudicar de todas as

maneiras. Sempre. (E será bem merecido).

O Convênio, agora sim.

O documento que agora passaremos a estudar em detalhe contém sugestões para

múltiplos usos, quer dizer, suas diferentes partes oferecem cada uma, um modelo a
seguir , de acordo com a circunstância. Chegada a oportunidade de elaborar um acordo,

bastará selecionar as partes necessárias do mesmo para aplicá-las no caso especifico.

O resultado não pode ser mais longo que uma, no máximo três, folhas .

Uma vez selecionados os pontos de interesse, redige-se um rascunho como primeira

proposta, e ambas as partes o estudam com cuidado. É um momento em que se corrige e se

modifica. O dito encontro deve ser uma reunião tranqüila, calorosa, com alguma coisa

para beber. Ganhamos pontos se convidamos a outra pessoa para comer ou jantar em

casa.

Uma vez que amb@s cheguemos a um acordo, qualquer das duas partes redige o

convênio definitivo e o assinamos diante de testemunhas. Assim é simples.

O maior problema que enfrentamos tem sua origem na falta de costume e pouca seriedade

com que costumamos levar os assuntos de arte. Nem os artistas nem @s don@s de

galeria têm o habito de assinar acordos. Não é de se surpreender que surjam, quase

inevitavelmente, os mal-entendidos.

A diferença entre um convênio e um contrato é um tanto vaga. Minha muito querida

amiga, Angelina Cué, me explicou que convênio é um termo mais suave, mais cortês que

“contrato”. Contudo, no momento de algum desentendimento, diz-me minha amiga, ambos

operam igualmente diante da lei. Além disso, lembra me essa eminente especialista em

direito autoral que há convênios privados e convênios registrados no cartório. Quase sem

exceção, os acordos assinados serão privados. Decidir entre um e outro dependerá, claro,

da magnitude dos acordos que queremos pactuar, mas mais das conseqüências que

poderiam ocorrer no caso de alguém (qualquer uma das partes) mudar suas clausulas.

Nossa conveniência deve estar acima de tudo, sem duvida. Insistir sempre na assinatura
117

de acordos é útil tanto para @s artistas como para @s contratantes, pois nos

proporciona a seriedade exigida por qualquer operação seja ou não comercial. Muita

atenção.

Duas advertências
Primeira : O modelo de convênio que exponho a seguir foi elaborado com base na média de

contratos que tenho assinado ao longo de minha vida profissional tanto no México

(poucos, muito poucos) como na América Latina, Europa e Estados Unidos, mas que

conheci graças á generosidade de amigos e colegas.

É possível que alguém, entendido em leis, ache-o um pouco norte-americanizado. Duas

razões me levam a precisamente este modelo: por um lado, o universo legal que até então

regia a nossa vida social começou a mudar, sobretudo no que se refere aos tratos

comerciais. Conseqüentemente, nós latino-americanos estamos suspensos nessa trama

formada pelo choque de duas cosmogonias, a ibero-americana (baseada no direito

romano, no código napoleônico e nossos muito próprios costumes), e a estadunidense

(baseada no direito comum anglo-saxão e nos uso e costumes especificamente do vizinho

dominante).Entretanto, creio que possamos celebrar o pragmatismo que rege o mundo da

arte dos europeus e dos estadunidenses. Por que não? A César o que é de César. Se vamos

emular modelos, que emulemos o melhor.

Segunda : Os comentários que irei acrescentar para ilustrar pontos e cláusulas estão

marcados em tipografia cursiva.

Passemos agora a conhecer a utilíssima ferramenta:

MODELO DE CONVÊNIO
Acordo assinado no dia _______________________, de_________________ de

__________, entre (nome legal completo, pseudônimo se o usa). Residente em (número da rua,

bairro, cidade, CEP,estado e país), daqui por diante denominado “O ARTISTA”; e ( nome do

dono ou responsável legal, nome da instituição ou empresa), com domicílio fiscal em (número

da rua, bairro, cidade, CEP,estado e país), daqui em diante denominado “A EMPRESA”.

Considerando que o ARTISTA, como profissional nas áreas (desenho e/ou gravuras e/ou

esculturas etc. Você que escolhe) deseja por vontade própria mostrar obras de sua autoria

nas galerias da empresa;

Considerando que a EMPRESA expressa a vontade de representar O ARTISTA nos

termos abaixo acordados, ambas as partes subscrevem o CONVÊNIO a seguir detalhado:

1. SOBRE OS ALCANCES DA REPRESENTAÇÃO


O ARTISTA tem a bem designar a EMPRESA como seu representante (exclusivo)

(não exclusivo) para a exibição, promoção e vendas de obras consignadas durante o

período de tempo que ampara este convênio (vide clausula 18).

(Exclusividade é proteção, mas para ambas as partes. Pode-se outorgar exclusividade á empresa ,
pode-se determinar em um único caso: só se a empresa pode vender tudo o que produzimos, e se
fosse assim já seriamos quase exclusivos de maneira automática. Uma opção quando uma
empresa nos pede exclusividade è assegurar-nos que se comprometa a representar-nos, e não só
a vender nossa obra em ocasião da exposição. Em todo caso, podemos estabelecer por mutuo
acordo uma duração justa para o período de exclusividade que costuma ser de dois a cinco anos –
ao cabo do quais ambas as partes avaliam os resultados e, de acordo com esses, assinam ou não
um novo acordo. Outra opção é outorgar exclusividade somente em uma das modalidades que
praticamos, por exemplo, só no que se refere a obra gráfica ou a desenho, mais não a pinturas ou
esculturas. Capito?).
119

2. SOBRE AS CONSIGNAÇÕES
Durante a vigência deste CONVÊNIO, o ARTISTA dará a EMPRESA as obras

abaixo detalhadas, em consignação:

(___) Todas e cada uma das obras detalhadas no RECIBO DE CONSIGNAÇÃO

que se anexa a este acordo sejam listadas com seus respectivos recibos, mesmo que

se acrescente a este acordo.

(___) Toda obra nova criada pelo ARTISTA a partir da assinatura deste

CONVÊNIO, excluindo a obra que o artista reserve para sua coleção pessoal, e que

seja produzida com os seguintes materiais, suportes e meios:

Obra gráfica (detalhar que tipo)

Escultura (detalhar que tipo)

Outro tipo de obra (detalhar)

(____) Toda obra, antiga ou recente, QUE SEJA SELECIONADA PELA

EMPRESA, mas excluindo aquilo que o ARTISTA reserve para sua coleção

pessoal, e que tampouco inclua a obra que o ARTISTA retenha para vender DE

MANEIRA DIRETA em seu ateliê, realizada com os seguintes matérias, técnicas

e suportes:

___________

___________ (etc.)

(______) Não menos de _______ obras ao ano sobre as que se chegue a um acordo

mutuo realizada com os seguintes materiais, técnicas e suportes:

___________

___________ (etc.)

O ARTISTA tem o direito de exibir, vender ou dispor de qualquer maneira de toda

obra que não esteja especificada neste CONVÊNIO:

O ARTISTA informará a EMPRESA, no caso de que esta o solicite, sobre todo e


qualquer acordo que subscreva o ARTISTA em outras empresas ou

representantes.

(Será necessário ler o ponto dois (2) varias vezes. Essencialmente, nos serve para reduzir qualquer
possibilidade de confusão. ATENÇÃOao ultimo parágrafo deste ponto. Não se trata de prejudicar
ninguém, mas de jogar o jogo mais limpo possível. Isso implica em entrar em cumplicidade
verdadeiramente amistosa com a empresa).
3. SOBRE A PROPRIEDADE E OS RECIBOS
O ARTISTA afirma como verdade ser autor e dono exclusivo e incondicional de toda a

obra consignada a EMPRESA nos termos do CONVÊNIO. M anterá a inteira

propriedade da obra consignada, até que esta não seja liquidada em sua totalidade.

A EMPRESA acusa recibo de todas as obras listadas no RECIBO DE

CONSIGNAÇAO anexado a este CONVÊNIO e suas adicionais em caso de haver, e

cujas copias assinadas serão entregues AO ARTISTA no momento em que a

EMPRESA receba a obra.

(O primeiro parágrafo deste ponto pode parecer néscio. Não o é. Deve-se oferecer sempre a quem
lida com nossa obra a absoluta segurança de que não está comprometida. Quantas vezes, quando
nos vimos pressionad@s por questões econômicas ou qualquer outro motivo não tomamos essa
tela e damos a alguém que diz ter um cliente? Essa mesma noite chega á casa a nossa cara-
metade e CARAMBA! O que é que aconteceu com o quadro que você me presenteou quando…E aí
que estamos tentando explicar que o aluguel, o veterinário, que… NAO ME IMPORTA!Esse quadro
è meu! E na hora de telefonar para recuperá-lo…“Pois, já o vendi”Não me importa! ESSE
QUADROÉ MEU!Agora vou buscá-lo…Ufff… a encrenca na qual nos metemos, por não respeitar
o que presenteamos).

4. SOBRE A REPRESENTAÇÃO E PROMOÇÃO PROLONGADA


A EMPRESA se empenhará em promover sempre e em todo caso a obra a ela
121

consignada pelo ARTISTA, como o fim de projetá-lo da maneira mais decorosa, e

atuará como seu representante mediante as seguintes ações:

- Visitas periódicas a seu ateliê para familiarizar- se com seus logros e avances;

(UAUAU!!Leram isso? Visitas? Periódicas? Ao ateliê? Estamos muito mal acostumad@s a ir vira-
latas em galerias levando obrinhas embaixo do braço, fazendo filas e ante-salas, enquanto nos
recusam com a mão na cintura ou nos fazem o favor de pó «por aí, vamos ver se vendem» Puxa,
nem se fossemos... Pois, me ocorre uma ignomínia para colocar aqui.

O problema é que assim não se fazem as coisas. Ponto. O que procede é fazer chegar nosso port-
fólio à galera para que possa ser estudado uns dias. Se os proprietários gostam do que
produzimos, eles irão marcar um primeiro encontro em nosso ateliê – e, por favor, que não
esqueçam de devolver o port-fólio, pois nos custou os olhos da cara fazê-lo – e dai, sem duvida,
poderá florescer uma boa relação. O miolo do assunto estriba que as visitas de ateliê devem
pactuar-se e ficar estabelecidas como prática usual.

- Planificando e especificando em linha geral os lugares onde procurará exibir sua

obra;

- Descrevendo a maneira pela qual exibirá a obra tanto em seus espaços como em

outros lugares (muros, divisórias, gavetas de mapas, tesouras, transparências,

impressos e publicações etc.).

ATENÇÃO

Em todo e qualquer caso, o uso da obra fica amparada pela Lei de Defesa do Direito

Autoral, (citar os incisos pertinentes). A empresa e o adquirente estão impedidos de

autorizar a reprodução ou utilização alguma das obras, sem considerar a autorização

fidedigna e por escrito do autor ou de seus herdeiros, já que o instrumento legal

autoriza somente a exibição privada desta obra. O uso ou a exploração diversa a

simples possesso viola a lei.


5. SOBRE AS VENDAS
A EMPRESA venderá a obra a ela consignada, ao preço especificado no RECIBO DE

CONSIGNAÇÃO, ao qual acrescentar- se-à / ficará o________ pela comissão.

(Acrescentar ou subtrair, somar ou restar, eis a questão. No México – e em geral, na América


Latina – é usual ficar uma parte do valor total a galeria. Mas não há porque se surpreender se em
outros países se acrescenta a comissão. Talvez alguém que seja mais crânio do que eu em
matemática possa explicar a diferença entre ficar com uma percentual (U$ 1.000,00 – 35% = U$
650,00) e somar uma percentual (se calculamos 35% de mil, trezentos e cinqüenta dólares, o
resultado é U$ 866,50… hmmm. O que não se pode aceitar, sob nenhuma circunstancia, como
acontece ultimamente, é que as galerias congelem-se em uma soma fixa. No ponto sete, mais
abaixo, veremos o assunto em maior detalhe.)

a) A EMPRESA poderá outorgar descontos sem prévia autorização do ARTISTA,

sempre e quando esses não excedam _____ % do preço pactuado, e unicamente quando

se trate de vendas a museu, a outra galeria, a decorador de interiores ou a arquiteto.

Neste caso a quantidade descontada será deduzida da comissão que corresponde à

EMPRESA.

b) O preço de venda de cada obra inclui os pagamentos de impostos previstos pela lei.

c) A EMPRESA entregará ao ARTISTA para seu arquivo, uma comprovação de

revenda, indicando devidamente cada uma das obras vendidas.

d) Os preços das obras NÃO incluem os custos de entrega ao cliente. Os ditos custos

(transporte, embalagem, seguro etc.) correrão por conta e risco da EMPRESA, e se

sujeitarão aos acertos feitos por ela para que a obra chegue a seu cliente.
123

e) O ARTISTA apoiará em todo momentos os esforços e o trabalho da EMPRESA, e

cuidará em respeitar o preço de varejo no mercado, nas vendas que se levam a cabo em

seu próprio ateliê, ou dado o caso, em acordos que se façam com outros representantes

e empresas. Isto inclui cotizações que façam sobre as obras consignadas ou doadas

para leilão. O ARTISTA dará informes pormenorizados de suas vendas e demais

tratos a EMPRESA, se essa o solicitar.

6. SOBRE TRANSFERENCIAS DE OBRAS PARA ALUGUEL, “E EXPOSIÇÃO


PUBLICAÇÃO” E OUTROS ASSUNTOS
a) A EMPRESA não poderá dispor de obra « como mostruário »e fora da galeria por

mais de __ dias.

(Conheço um artista que há nove meses anda atrás de uma galeria para que essa o devolva duas
pinturas em acrílicos que saíram de seu espaço « como mostruário ». Resulta que as obras foram
pedidas por um possível cliente, um restaurante que as tem penduradas em sua sala principal
desde então. Ele, por descuido, não especificou suas condições, e agora chora. Isto pode acontecer
com qualquer pessoa, de modo que mais vale que nestes casos também fique claro e por escrito).

b) A EMPRESA pode com prévio consentimento de O ARTISTA, estabelecer convênios

de representação com outra(s) empresa(s) ou corretores de arte. Em tal caso, a

comissão que resultara das vendas será dividida segundo conveniência, entre a

EMPRESA e o(s) terceiro(s).

c) O período por conceito de aluguel de obra não excederá o limite de _________

semanas, a menos que O ARTISTA autorize a prorrogação por escrito.

(Como assim? Não acabaram as surpresas? O que é isso de aluguel? Pois hei de avisar, se não
pularam paginas atrás quando falei de aluguéis, que esse costume, muito saudável em minha
opinião, já se pratica há muito tempo. Parece-me que começou no Museu de Arte Moderna de
Nova York há mais de 40 anos, de onde se difundiu a mil e um lugares. Na América Latina apenas
começa. Costumam alugar obras as companhias produtoras de telenovelas, serviços de
banquetes… Assim que «coloquem a massa cinzenta para trabalhar, minha gente! »

d) Se depois de alugar uma obra o cliente deseja adquirir- la, a quantidade já

abonada por conceito de aluguel será (___) // não será (___) dedutível do preço total

da obra citada.

7. SOBRE AS COMISSÕES
(Atenção redobrada: este é um ponto que exige cuidado especial e diplomacia, já o adverti
acima. Todas as distintas comissões devem pactuar-se de antemão, sempre de acordo com o
trabalho que invista a galeria. Da minha parte, não teria nenhum impedimento de pagar até 75%
de comissão, sempre e quando o único, absolutamente o único! que tivera eu que fazer è produzir.
Que lindo, não?
A mesma importância em um futuro não muito distante, @s artistas terão de pensar em lograr
acordos sobre o máximo de comissão que se poderá cobrar que adquira sua obra para revender
(“droit de suivre”, ou direito de seguimento). É lógico – e justo – que se o revendedor investe
adquirindo obra e a pagando em dinheiro, possa ganhar uma comissão maior do que a que se
paga em consignações).

A EMPRESA receberá as seguintes comissões sobre a venda da obra consignada:

a) (___) % sobre o preço convênio para venda ao varejo, tal e qual se estipula no

RECIBO DE CONSIGNAÇÃO.

b) (___) % do preço da obra consignada á EMPRESA, sempre e quando tenha sido O

ARTISTA quem tenha enviado ao cliente.

c) (___) % do preço de obra em venda realizada pelo ARTISTA do seu ateliê durante a

vigência deste CONVÊNIO.


125

d) (___) % do preço de venda realizada pelo ARTISTA em seu ateliê, sempre e quando

tenha sido a EMPRESA quem tenha enviado ao cliente.

e) (___) % do preço de obra comissionada ao ARTISTA, sempre e quando tenha sido

a EMPRESA quem tenha conseguido o contrato.

f) (___) % de honorários recebidos pelo ARTISTA por conferencias,palestras,

participação em debates, mesas redondas e outros serviços, sempre e quando tenha

sido a EMPRESA a encarregada de todos os trâmites para sua participação nos

ditos eventos.

g) (___) % da quantidade que receba o ARTISTA por conceito de prêmios, sempre e

quando tenha sido A EMPRESA a encarregada de todos os trâmites de sua

participação no concurso.

h) (___) % por conceito de alugueis pactuados EXCLUSIVAMENTE pela

EMPRESA.

i) (___) % de alegueis pactuados pela EMPRESA mediante gestões realizadas pelo

ARTISTA.

j) (___) % e outras possibilidades…

8. SOBRE A FORMA DE PAGAMENTOS DA EMPRESA AO ARTISTA


Com respeito ao Ponto 7, incisões ___, ___, ___:

a) Em pagamentos recebidos em dinheiro ou por cheques, a EMPRESA liquidará a

quantidade que corresponde ao ARTISTA em um tempo não maior do que 30 dias a


partir de que o cliente liquide sua divida. Se for pagamento em cartão de crédito, será

a partir de 30 dias de que a quantidade fique comprovadamente depositada na conta

do artista.

b) Em acertos de pagamentos deferidos (parcelas) a EMPRESA destinará em

primeira instancia o ingresso para liquidar a porção correspondente ao ARTISTA.

Em todo caso, esta liquidação prioritária será feita dentro dos 30 dias posteriores ao

pagamento (aparcelado).

A EMPRESA reterá as quantidades que ingressem por conceito de vendas de obras

consignadas em deposito e em beneficio de o ARTISTA. A EMPRESA acorda

garantir a confiabilidade de seus clientes e de assumir perdas em caso de morosidade

ou falta de pagamento dos mesmos.

9. SOBRE A FORMA DE PAGAMENTOS DO ARTISTA Á EMPRESA


Com respeito ao Ponto 7, incisões ___, ___, ___:

a) Em vendas liquidadas em dinheiro ou com cheque, o ARTISTA pagará a comissão

á EMPRESA em um tempo não maior de 30 dias a partir de que o cliente liquide sua

divida. Se for com cartão de crédito, será a partir de 30 dias de que a quantidade

fique depositada na conta.

b) Em acertos de pagamentos deferidos, O ARTISTA reterá os primeiros ingressos

para cobrir a parte que lhe corresponde. O pagamento á EMPRESA se fará dentro de

30 dias depois de cada pagamento adicional que receba o ARTISTA. O ARTISTA

acorda garantir a confiabilidade de seus clientes e de assumir perdas em caso de

morosidade ou falta de pagamentos dos mesmos.


127

(Todos estes pontos e incisões podem soar complicados. Não o são. Trata-se de evitar, no
momento de fazer contas e até onde seja possível, diferenças que podem chegar a ser maiores. Se
estas incisões ficam claramente escritas, tudo se dirime na pratica com a uma calculadora de
bolso: “Vamos ver, você vendeu tanto e eu devo tanto de comissão para você, mas eu vendi este
tanto pelo que você me deve… tiremos a diferença e pronto.

10. SOBRE OS ESTADOS DAS CONTAS


(Nota: Este ponto opera no caso da existência de um CONVÊNIOde exclusividade, ou com
motivo de uma exibição).

A EMPRESA se compromete a entregar AO ARTISTA um Estado das Conta

pormenorizado

( ) dentro de 15 dias depois de cada trimestre,

( ) dentro de 30 dias depois do encerramento da exposição,

( ) a partir do ____ de ______ de 20__.

Dito o Estado das Contas incluirá a seguinte informação:

a) A relação de obras vendidas (e/ou alugadas),

b) Nome e domicílio do(s) cliente(s),

c) Data da venda (e/ou aluguel), com preço e condições de pagamento (em dinheiro,

cheque, cartão, letras etc.),

d) Quantidade correspondente ao ARTISTA depois de descontar a comissão

pactuada;

e) Saldo a favor ou contra o ARTISTA no caso de pagamento adiantado;

f) Localização precisa da obra consignada no caso de encontrar- se « como mostrário

» e/ou fora da galeria.

11. SOBRE AS EXPOSIÇÕES


Durante o período coberto por este CONVÊNIO e ademais da representação continua

que da obra do ARTISTA se fará pela EMPRESA, esta ultima instalará e


promoverá (pelo menos) U MA exposição individual da obra do ARTISTA, cuja

duração será de ____ dias, cada ____ meses.

Além disso, se dedicará a que a obra do ARTISTA seja exibida individualmente, e

incluída em mostras coletivas, em museus, galerias e outras instituições, sob o

acordo de que não se fará nenhuma negociação sem o consentimento pleno (por

escrito, se necessário) do ARTISTA.

a) A EMPRESA avisará ao ARTISTA da programação de sua exibição com ____

meses de antecipação.

b) A EMPRESA proporcionará ao ARTISTA a programação detalhada dos

preparativos necessários para a realização da mostra, marcando claramente quais

correspondam a cada parte.

(Muita atenção aos assuntos como o das fotos da obra, quando podem-se dividir os custos da
documentação. Em troca, é claro, das concessões do uso das mesmas. Será conveniente reler
varias vezes o ponto 14, que trata dos direitos autorais).

Ademais, a EMPRESA determinará a data e condições de devolução de obra não

vendida (ver ponto 12).

c) Previamente a toda exposição, a EMPRESA notificara O ARTISTA de qualquer

condição que, por questões de espaço e movimentação, limite o tipo de obra a exibir.

O ARTISTA, por sua vez, informará á EMPRESA com suficiente antecipação,

qualquer requisito que exija a montagem de sua obra.

d) Antes da exibição se acordará por escrito sobre a responsabilidade que todo o


129

quem assumirá em relação ao custo da montagem (molduras, pintura de paredes

etc.), promoção (cabine de imprensa, convites, catálogo, cartazes, correio, coquetel de

recepção etc.).

e) Em caso de que o ARTISTA proporcione sua Lista de e-mail Privad a á

EMPRESA, esta a receberá respeitando integramente seu caráter confidencial.

f) Ao final da exposição, a EMPRESA e o ARTISTA intercambiarão fotocópias das

resenhas, críticas e matérias que tenham compilado ambas as partes sobre a

mostra.

12. SOBRE A ENTREGA DAS OBRAS


A entrega de obras a consignar á EMPRESA será responsabilidade de

_____________.

A devolução de obra consignada ao ARTISTA será responsabilidade de

_____________.

(Optativo: Os gastos ocasionados pela transferência da obra (embalagem, seguro,

transporte) serão divididos, correspondendo ____ % à EMPRESA e ____ % ao

ARTISTA.

13. SOBRE DANOS E PERDAS


O ARTISTA e A EMPRESA acordam o seguinte:

a) A EMPRESA tomará todas as precauções possíveis para evitar danos

maliciosos ou acidentais á obra consignada. Ademais, será responsável pela

manutenção, pela limpeza e, se necessário, pela restauração de toda e qualquer obra

consignada que for danificada. Isto também se refere às molduras.

b) Assim mesmo, a EMPRESA assumirá a responsabilidade por qualquer dano ou


perda em caso de ter sido feito em seu espaço físico (ver Ponto 6).

(Assunto de constantes fricções entre artistas e galerias, mas, sobretudo, entre artistas e
instituições, isto de danos e perdas e molduras pode chegar a maiores discussões. Se queremos
que se respeitem nossas obras, @s artistas devemos por força entregar toda e qualquer obra,
emoldurada ou não, devidamente envolvida para sua total proteção. E assim devem devolver-nos
depois da exposição. Para entregar nosso trabalho em condições ótimas para sua transferência e
seu manejo, é muito recomendável ter sempre a mão, no ateliê, um rolo de papel Kraft e outro de
plástico bolha.

b) Se a EMPRESA o requeira, o ARTISTA proporcionará uma lista

pormenorizada por escrito, no qual descreve a condição física da obra que entrega

em consignação.

c) No caso de que uma obra danifica requeira restauro, A EMPRESA se

encarregará de fazê-lo por conta própria, acordado que dará prioridade ao

ARTISTA de fazer a restauração, em troca de um pagamento de honorário justo.

(Este IMPORTANTISSIMOparágrafo não precisa de maiores explicações, mas bato o pé em suas


bondades: convém às duas partes, sobretudo á galeria, já que o artista sempre cobra menos que
@s restauradores/as.

d) No caso de perda ou destruição total da obra, o ARTISTA será compensado com

a quantidade estipulada para sua venda e descontando a comissão, de acordo com o

RECIBO DE CONSIGNAÇÃO.

14. SOBRE OS DIREITOS DO AUTOR


(Para a elaboração deste parágrafo devem-se consultar as leis locais e federais, assim como os
regulamentos vigentes tanto da entidade federativa como da Federação. Geralmente, se inclui em
131

um documento legal quando se trata de um CONVÊNIOou Contrato de Representação


prolongada. Ver, além disso, pontos 4 e 6, incisões b); e Ponto 7).

15. SOBRE DIREITOS ETICOS E MORAIS


A EMPRESA fará o possível para impedir todo uso do nome ou da obra do

ARTISTA que pudesse lesar sua honra profissional, ou desvirtuar o espírito e

sentido de sua obra.

16. SOBRE AS MEDIDAS DE SEGURANÇA


Nenhuma obra consignada á EMPRESA, na qualidade de empréstimo, poderá ser

alienada por ação legal ou embargo algum contra a EMPRESA.

No caso de quebra ou bancarrota, ou qualquer outro fechamento da EMPRESA, o

ARTISTA poderá exercer seus direitos conforme as leis vigentes na entidade onde se

assina este CONVÊNIO.

17. SOBRE A VIGÊNCIA DO PRESENTE CONVÊNIO


Este CONVÊNIO entra em plena vigência na data em que é assinado e vencerá no

dia ___ de ___ do ano de _______.

a) A petição de qualquer das partes, este CONVÊNIO pode ser rescindido mediante

um aviso por escrito, fechado e entregue ao menos 45 dias prévios a qualquer

operação ou movimento programado.

b) Este CONVÊNIO não poderá ser rescindido por nenhuma das duas partes em um

período de 60 dias antes da inauguração da exposição programada, ou até 30 dias

depois do encerramento, sempre e quando tenham sido liquidadas todas as dividas.

c) Este CONVÊNIO caduca de maneira automática no caso de morte do ARTISTA,


ou no caso que quebra ou de insolvência devida e legalmente comprovada pela

EMPRESA.

d) Ao término deste CONVÊNIO, a EMPRESA devolverá toda a obra consignada

ao ARTISTA dentro um prazo máximo de 30 dias (ver Ponto 13).

18. SOBRE QUESTÕES DE ARBITRAGEM


(Atenção: toda disputa entre ambos contratantes se sujeitará necessariamente ás leis vigentes na
entidade e na Federação, pelo que, repito, deve-se consultá-las e citá-las. Talvez valha a pena –
para atritar @ galerista imoral - escrever o seguinte: “se submetem às partes a direção legal para
revolver os conflitos possíveis”.Como os direitos de autor vêm de uma lei federal, talvez seja mais
conveniente fixar como competentes os Tribunais Federais aqueles de domicílio do artista.

a) Este CONVÊNIO è INTRANSFERÍVEL.

b) No caso de determinar- se a ilegitimidade de alguma das partes das partes deste

CONVÊNIO, o fato não afetará a legalidade das duas partes.

c) O presente CONVÊNIO contém todos os acordos, tratos e entendimentos e

condições tomadas oralmente e por escrito entre os contratantes; e não poderá ser

modificado em suas parte exceto por CONVÊNIO mutuo e previamente avisado por

escrito.

d) Toda notificação dirigida a O ARTISTA será o seguinte endereço:

- Rua e número:

- Cidade, bairro e CEP:

- Telefones, fax e e-mail:

Enquanto que toda notificação dirigida à EMPRESA será ao seguinte endereço:


133

- Rua e número:

- Cidade, bairro e CEP:

- Telefones, fax e e-mail:

e) A validade deste CONVÊNIO e de todo o contendo, assim como as

responsabilidades e direitos a que se submetem ambos contratantes se aplica

estritamente àquilo que respeita à lei, e em especial, ao regulamento vigente na

entidade onde se assina.

(LUGAR E DATA)

CONCORDANDO COM TUDO ACI MA EXPOSTO E ENU MERADO, ASSINA M A

CONFORM I DADE AMBAS AS PARTES:

___________________ ___________________

O ARTISTA A EMPRESA

___________________ ___________________

TESTEM U NHA #1 TESTEM U NHA #2

=- =- =- =- =- =- =- =- =- =- =- =- =- =- =- =- =

Para finalizar este longo e complicado capitulo volto a insistir em que o documento acima

exposto é só um modelo a seguir. No momento de elaborar nossos convênios, bastará

selecionar as partes necessárias para aplicá-las ao caso especifico. O resultado poder ser

não mais longo do que uma, ou ao máximo três, folhas.

PS-

Agradeço de maneira muito especial e carinhosa a revisão feita pelo bom amigo Ricardo

Guzman Wolffer, quem me escreveu:


“No geral, é muito bom contrato; certo é que uma serie de contratos em um só: mandato,
representação, venda, aluguel de obra (pelas reparações); de modo que se necessitaria de tempo
para estudar com calma, muito calma, cada um dos assuntos que por sua especialidade jurídica,
ainda que solo se mencione em uma ou em outra clausula, tem distintas implicações jurídicas.
Mas esse tipo de detalhes deverão ser redigidos com calma.”
135

XII. PROMOVENDO-NOS PELO MUNDO AFORA


De como inverter a mesa na relação entre n@s mesm@s
e outros parentes

O que é um port-fólio?
É totalmente inútil lançar-se pelo mundo afora em procura de... de... dealers! (Antes eram

chamados de marchands, em português são revendedores, as vezes representantes).

Ninguém sai de seu ateliê, com o carro (próprio ou emprestado) cheio de obras,

carregando e descarregando em uma ou outra galeria, como se costumava fazer antes.

Hoje as pessoas interessadas em nosso trabalho costumam fazer-nos visitas periódicas e

freqüentes em nosso ateliê. Quem ainda não o faz deve entender que a única maneira que

um vendedor/a de arte se compenetra no mundo e na produção de seus artistas. Para

isso, primeiro é preciso despertar o interesse deles pelo nosso trabalho, coisa que

conseguimos mostrando nosso port-fólio.

Coisa estranha, a única palavra parecida a port-fólio que está no Pequeno Larousse

Ilustrado, 1990, é “porta-documento”. @s artistas latino-americanos entendemos o

conceito tal e como nos chega do mundo dos negócios de arte que fala inglês. Vejamos pois

como o define a décima edição de Merriam Webster’s Collegiate Dictionary:

Port-fólio (it. Portafoglio, fr. Portare + folgio: carregar a folha, pagina 1. uma capa

com dobradiça ou estojo flexível para carregar folhas soltas, retratos, ou panfletos. 2. um

jogo de retratos (com desenhos ou fotografias) encadernados em forma de livro ou soltos

em uma pasta.

Repito, se trata de um mecanismo que utilizamos para despertar- lhes a curiosidade a

pessoas interessadas em gerenciar (ou estudar) nossa obra, para que logo passe a ve-las

em nosso ateliê.

Sempre servem os velhos ditados, como o que reza “segundo o sapo, a pedrada”, quer dizer,

teremos que apresentar port-fólios distintos para distintas ocasiões. Por exemplo, para

mostrar ou vender uma obra a uma empresa que distribui só estampas gráficas, não
será preciso mostra a seu representante fotos de nossos murais e esculturas.

Deve-se estar preparado, além do mais, para ter à mão três, quatro, sete port-fólios, dez

se for necessário! Sobretudo se se parte em viagem. Em outras latitudes é habito deixá-lo

uns quantos dias nas mãos da pessoa apropriada que trabalha em galerias e nos museus

que nos interessam, afim de que possa decidir se nos recebem ou não. Dai que se deve

“armar” nossos port-fólios da maneira mais convincente e persuasiva possível. Se não cai

impactada aos nossos pés, que nos devolva o port-fólio! M as se entramos em acordos,

então sem duvida nos pedirá outro, armado sob medida das correções que faremos chegar

até aquela pessoa. Normalmente, os custos dos subseqüentes port-fólios que a empresa

nos peça, vão por conta dessa.

Como a esta altura do campeonato já aprendemos muitas coisas, nos será facílimo armar

todos os port-fólios que serem precisos:

Os conteúdos do port-fólio
- Currículo vitae: geral e especializado (capítulos VII I)

- Currículo relato: idem

- Diapositivos (slides): devidamente etiquetados e arrumados em laminas porta-

transparencia e/ou impressões em cores de alta qualidade, da obra recente (capítulos

VII). Ainda que hoje em dia os diapositivos são menos usados, continuam sendo práticos.

- Exemplares: dos convites mais recentes (capítulos IX).

- Copias: de catálogos e/ou CD-ROMs ou DVDs (capítulos VII e XI).

- Fotocópias: de resenhas criticas, crônicas e textos diversos. Nunca incluir colunas

sociais (capítulos VII e XI)

- CD-ROM ou DVD: que devem conter todos os elementos já mencionados.

Não se pode esquecer que quanto melhor a apresentação, melhor o impacto: um port-fólio
137

que contenha o CV limpo e bem redigido, boas fotos, fotocópias arrumadas de crônicas e

resenhas, apresentado em um estojo elegante, faz a diferença entre uma rejeição e uma

aliança de trabalho. Da mesma forma ao contrario, tampouco se deve passar de espertos

e apresentar port-fólios exageradamente luxuosos... Se tivermos dinheiro para

impressionar assim, porque solicitamos essa “bolsa”?...

Por que e como publicar convites, cartões postais, cartazes, catálogos,


livros e demais parentes
Nosso trabalho é info-visual (isso será um neologismo?). Nunca como hoje tinha se

proliferado em tal quantidade de propostas artísticas que, entre tantas informações que

bombardeia o publico, custa trabalho digerir: as novidades parecem contraditórios e em

sentido a primeira vista, e a segunda também. Cada um de nos pratica algum dos mil e

um “dialetos”, que por sua vez se desprendem das centenas de “idiomas” visuais que

convivem contemporaneamente. Por isso mesmo, nossa obra precisa ser traduzida e

transmitida. Por que – nos perguntamos perplexos – temos que explicar o inexplicável?

Por acaso o que fazemos não é... Pois visual?

Não se trata de “explicar” a obra. O que devemos saber fazer é complementar para

contextualizar.

Outrora quando as condições que rodeavam o uso da arte eram relativamente simples, os

textos complementares não eram necessários posto que o que @s artistas produziam se

comentava de boca em boca na sua zona.

Tomemos como exemplo El Guercino (1591-1666), aquele grande pintor barroco do Sul da

Europa, a quem chamavam assim porque era vesgo. A obra mais conhecida deste bolonhês

é “Aurora”, que pintou no teto do Cassino Ludovisi, em Roma. Trata- se de uma obra de

ilusionismo decorativo das mais incríveis da era da Contra-reforma. Ao longo de sua


carreira, O Vesgo mudou varias vezes de estilo. Começou a pintar muito influenciado por

seu mestre, D. Ludovico Caracci, mas logo adotou um estilo de chiaro-oscuro muito

marcado (à Caravaggio, porém mais suaves). Depois, muito atento á seu tempo,

desenvolveu um sentido de iluminação uniforme e sem ênfase, de ar mecânico, muito

didático e concorde ás exigências do dia. Ao longo de 55 anos de vida profissional, com

todas as voltas REVIRADAS? que deu sua obra, nunca confundiu a seus espectadores! A

explicação é obvia: o seu era um publico relativamente reduzido (a população de Roma e

seus arredores naquela época não ultrapassava os 60 mil habitantes e de Bolonha era

ainda menor). M a s sobretudo, seus contemporâne@s estiveram sempre a par de suas

mudanças de rota, portanto iam se adaptando com prazer ás mutações de linguagem

visual do Vesgo, cujo verdadeiro nome era Giovanni Francesco Barbieri.

Para fechar a historia com chave de ouro: o Guercino deixou uma resma de cadernos de

anotações que cobrem um período de 37 anos (1629-1666), nos quais podemos ver que sua

principal preocupação foi a clientela, suas dividas e os pagamentos que fazia, detalhes e

resumos de renda anual, mil e um assuntos mais de sua diária administração.

A novos tempos, novas maneiras de informar! Não em vão a humanidade inventa mais e

melhores modos para comunicar-se: de tambores e sinais de fumaça até a rede das redes.

Assim simplesmente é a coisa. Não seria lógico continuar a grande tradição e emular

a@s artistas do passado, recorrendo às ferramentas do presente? Que melhor maneira

de manter o próximo a par de nossa obra, senão imprimindo e distribuindo informação?

Os convites que costumamos enviar para atrair ao publico uma EXIBIÇÃO (palavra

contraria a inibição):

Não há pior desperdício que um convite sem informação. Toda a minha vida eu guardei

só aquilo que me proporcionou informação: um texto inteligente (me chocam os panegíricos

pseudopoéticos), uma foto d@ artista ou de sua obra, uma breve nota biográfica. Está na
139

moda o habito de desenhar convites como cartões postais desprendíveis. E por que não?

Serve como promoção inclusive depois do evento (ver abaixo).

Os catálogos que são sempre bem-vindos já que além de alentar as vendas de cada uma

das peças exibidas, ficam como memória do que se apresentou naquele momento. Ainda

que você não crie, ha muit@s artistas que não conhecem a diferença entre um convite e um

catálogo. Na palavra está a diferença. O convite convida, pelo que dever ser o mais

atrativo possível e incluir o mínimo de informação. Ao contrario, um catalogo consigna

cada uma das obras apresentadas, pelo que, em ocasiões, deve incluir um ou vários textos

que lhes dêem sustância teórica á mostra. Enquanto os convites se presenteiam, os

catálogos podem ser vendidos para recuperar o investimento.

Os cartazes que podem acompanhar uma mostra, mas podem também ser produzidos sem

maior motivo que luzir nossa obra nas paredes dos escritórios, escolas, oficinas,

quartos... Os cartazes (ou pôsteres, como dizem alguns) são especialmente úteis para

promover exibições itinerantes. Desenham-se de maneira que seja possível colar uma

etiqueta diferente pra todas as sedes, nas que se consiga data e domicílios. De resto, não

ha quem resista a comprar um bom cartaz.

Os cartões postais (e os carimbos) que costumam converte-se em objetos de colecionadores.

Em todo o mundo se presenteiam postais, coisa que @s artistas podemos aproveitar.

Podemos publicar nossos próprios cartões postais, ou vender nossas imagens a don@s de

discotecas, bares e cafés, para sua distribuição gratuita. Ha inclusive criadores/as que

desenham e imprimem seus próprios carimbos postais, com tudo e picotagem, que logo

colam em cada envelope que enviam pelo correio. Se nos decidimos por fazer disso um

costume dos postais, podemos logo em seu tempo reuni-las para vendê-las como pacotes.

O que a imaginação propuser: selos de borracha para onde seja, formas para estarcir
nos muros da rua, panfletos para colocar nos vidros de carros parados ... Ou em bolsas

de supermercado. PUTZ! Tudo é arte. O negocio é exibir, não inibir!

Já posso ouvir os comentários: Ah! Caramba! Vamos nos queimar, que idéias tão

palurdas, não pois não, isso não vai comigo, eu que sou tão frufru,...

Não resta duvida que “o que dirão” é um poderoso elemento inibidor. Coisa estranha entre

que goza de reputação de boêmios desinibidos, não? Na realidade são pruritos que

atentam contra o que motiva a nossa lida profissional: comunicar-nos com o próximo.

Porém, bem, da minha parte só posso dizer: Sou totalmente... Livre!


141

XIII. NOSSAS DEFESAS


Dos direitos e responsabilidade e das possibilidades de
ganhar dinheiro que nem imaginávamos

Entre citações, homenagens, plágios e roubos.


Quem copia um texto ou imagem sem permissão ou pagamento de direitos comete um

roubo, sem dúvida alguma. Existem alguns empréstimos ou apropriações que são lícitos,

quando sua intenção é construir sobre o fato, como homenagem, ou como parte de um

diálogo em tempo. O plágio, seja cometido por dolo ou ignorância, é penalizado quando se

comprova a forma em que se utilizam os resultados do plágio.

A Universidade Estadual de Pensilvânia destacada por cuidar e dar a conhecer as

normas respeito à “honestidade acadêmica” e em seu lugar na rede tem um espaço especial

para este capitulo, pois enquanto nós artistas sofremos muito com plágios cometidos

contra n@s, é justo admitir que também incorremos em plagiar outr@s.

Para parafrasear o site da mencionada universidade, ao falar de plágio “é difícil evitar

referir-se às idéias como se fossem objetos como mesas e cadeiras. É evidente que não o são.”

Tratando-se da arte, que é um sistema de conhecimentos acumulados, nos explica o site, as

idéias visuais de outr@s podem ser – de fato, são – mecanismos disparadores que fazem

fluir as próprias idéias. Em grande medida, o chamado pós-modernismo constitui todo um

movimento em âmbito mundial de idéias e conceitos que, em vez de mover-se em impulsos

“para a frente” (como pretendia o modernismo), fuçam o passado para retomar e recriar

idéias que ficaram pendentes, ou que voltam a ser-nos de utilidade. As ditas idéias podem

ser produto da criatividade coletiva de todo um povo ou de mentes criativas individuais.

O que é que acontece quando Alberto Gironella retoma As meninas que Diego Rodríguez de

Silva Velásquez (1599-1660) pintou a seus 57 anos de idade? Da mesma maneira, o que é

que acontece quando Rupert García pinta um quadro no qual transcreve a foto Obreiro de

M anuel Álvarez Bravo? Será que comete um ato ilícito?


Não, eles não plagiam. Quando Gironella retoma As meninas de Velázquez, e quando

García pinta um quadro baseado na foto de Álvarez Bravo, estão citando. Seu propósito é

transformar uma idéia e contextualizá-la novamente. Os artistas não ocultam a fonte de

inspiração, mas a incluem no título de sua obra. Ao devolvermos as imagens que criaram

seus antecessores pedem-nos para meditar ao redor de ambas as propostas

O plágio se comete quando se oculta a origem da idéia, quando se nega o crédito devido a

seu autor/a ou quando não se pagam os direitos. Alguns copiam uma obra de arte linha

por linha; outr@s incorrem no que a literatura chama de “parafrasear” e tomam traços

e cores reconhecíveis de outr@s autores/as, porém há muit@s que, muito no estilo da era

eletrônica em que vivemos, reproduzem por meios virtuais e/ou fotomecánicos uma

pintura, uma escultura, uma proposta visual, para usá-la em um cartaz publicitário, um

cardápio ou uma camiseta, sem pedir permissão, sem dar créditos a@ autor/a e sem

pagar o uso da obra.

Um exemplo de especial mau gosto (à margem da legalidade) é a campanha publicitária

de um monopólio mexicano, produtor de pão, cujos publicitários e desenhistas gráficos

mutilam o comovedor auto-retrato de Van Gogh e reproduzem em seus anúncios

espetaculares e sobre o pára- choque de caminhões repartidores, sem a permissão dos

proprietários herdeiros de Van Gogh. Ao mutilar a obra e compará- la com seu pão

banalizam o grande holandês diante dos olhos públicos que mereceria ser conhecido em

melhor circunstância.

Outro exemplo, menos insultante mais igualmente imoral, é o da Loteria Nacional para a

Assistência Publica (no México) quando reproduz em seus boletos obras de artistas vivos

sem pagar- lhes direitos por seu uso, sem sequer avisá-los do que está fazendo. O dolo se

duplica quando, no momento de ser notificada para ressarcir o dano patrimonial, a


143

autarquia se nega a fazê-lo por escrito! Seu plágio vulnera nossos direitos autorais e deve

ser sancionada com todo o rigor da lei.

Direitos e obrigações autorais


O conceito de direito autoral representa um dos avanços qualitativos mais generosos

concebidos pelo intelecto humano. Em nossa transição de um passado simples, de

comunicações diretas, a um presente explosivo e a futuros desconhecidos e midiatizados, o

registro, armazenamento, transmissão e utilização das idéias se erige como o conjunto de

mecanismos capaz de criar os maiores lucros ($$$) jamais concebidos.

Basta saber quantas pessoas vivem de processar a informação (entre as que se incluem

as idéias); basta observar as indústrias de informática e conhecer a magnitude dos

capitais que geram; basta ver o impacto na sociedade para nos darmos conta que o tema

nos atinge diretamente.

Dada a importância que adquirem os conceitos sobre os objetos (assunto fielmente

refletido nas artes) e a necessidade que se requer para resguardar os direitos criados

por intelectos individuais, sejam ou não reconhecidos, o tema exige atenção prioritária.

O dinheiro é gerado em todos os níveis da estrutura informática: na origem, no registro e

no armazenamento, onde se protegem as idéias, as propostas, os planos e, naturalmente,

todas as obras de todas as artes; assim como no desenho, a transmissão e a utilização

onde se concentram no mundo todo astronômicas utilidades.

O terreno das artes plásticas, por sua vez, é talvez o espaço gerador de idéias mais

desprotegido, em especial em Ibero - América. Isso se deve em maior medida a voracidade

dos depredadores que nos rondam. Porém boa parte da culpa é responsabilidade d@s

artistas quando preferiam ignorar e até desdenhar o assunto, quando permitimos a


terceiros (empresas, publicitários, desenhistas gráfic@s, etc.) utilizarem nossas obras e

nossas idéias sem nos dar conta alguma nem a nos nem ás leis: “deixa aberta a gaveta e

terá um ladrão”.

O universo que rodeia às artes plásticas é hoje muito diferente do que foi no passado

imediato. Até pouco tempo atrás, a obra d@s artistas se transladava a mãos de terceiros

em simples operações de patrocínio ou de compra e venda. O uso do objeto artístico, que

fosse um desenho, uma gravura, uma pintura em tela, um mural, ou uma escultura se

reduzia a poucas pessoas e a poucas funções. A relação autor-espectador era

praticamente “um-a-um”, pessoa a pessoa.

A situação agora é muito mais complexa. Mudou a arte, mudaram os materiais; suas

possibilidades de expressão e efeitos cresceram de modo exponencial graças à tecnologia

de reprodução e dos meios de difusão que se tornam cada vez mais sofisticados e

versáteis. Uma obra de arte cumpre hoje muitíssimas funções a mais: tem mais usos e

serve a um número maior de pessoas. Nós artistas visuais gozamos agora de um

potencial para espalhar nossas idéias jamais antes imaginado.

Complica-se também a relação entre @s artistas e o público, de modo que é necessário

regular a função tanto de quem trafica as idéias, os intermediários, como de seus

destinatários, os usuários.

As funções intermediárias não se limitam a vendedores/as de arte, aos chamados dealers.

Em uma primeira instância, consideram-se intermediários também os representantes, os

promotores/as, o pessoal da redação da mídia, vendedores de anúncios, crític@s,

diretores/as e empregad@s de galeria e museus, seus museógraf@s e curadores/as. São

assim mesmo intermediários, os fotógraf@s, desenhistas gráfic@s e agências de

publicidade, a indústria editorial, a de embalagens, a têxtil e, em especial, a de


145

computação.

Todo esse universo de pessoas recorre com mais e mais freqüência ao engenho de

autores/as plásticos para seus muito particulares propósitos. Considere-se o seguinte:

eles editam, imprimem, publicam, difundem, promovem, distribuem, comercializam e até

registram todo tipo de mercadoria impressa, livros, jornais, revistas especializadas,

folhetos publicitários, etc., relacionada com seus objetivos. Ninguém a primeira vista

poderia objetar esse desenvolvimento, mas isso tem seu lado trágico: entre a multidão que

usufrua do produto artístico, quem menos se beneficia são nós própri@s, os artistas.

Deve-se, pois, ampliar nossa cultura autoral. De outra forma, não saberemos como

dirigir com familiaridade todas as possibilidades que existem de aproveitar ao máximo

as possibilidades de nossas obras, ainda mais depois que o objeto físico deixe nossas

mãos.

É preciso saber, portanto, como negociar com eles as licenças de uso de nossas obras,

particularizando ou por repertórios. Deve-se saber, sobretudo, como negociar os direitos.

Também os usos que tem uma obra fora dos mercados de arte tem se estendido. Somem-se

os intermediári@s enumerados, outros como contadores, advogados: o universo das artes

plásticas é toda uma indústria, aparentemente robusta, viçosa. Na realidade é uma

complicadíssima madeixa, cheia de buracos legais de que sabem aproveitar os

depredadores.

Para afrontar a situação, @s artistas profissionais em todo o mundo começaram a

formar sociedades de autores que nos brindam com representatividade e proteção, que

buscam sanear nossas relações com o mundo que nos rodeia, que estimulam a atitude

ética e justa a nossa lida. Deve-se apoiá-las e robustecê-las.


Uma sociedade de autores se forma com o objetivo de proteger @s membr@s, para que se

considerem autores/as de obras plástico-visuais e que se encarrega de arrecadar e pagar-

lhes as quantidades que por conceito de direitos do autor se geram a seu favor. Assim

mesmo, proporciona ajuda mútua entre seus associad@s e funciona com alinhamentos

definidos pela lei (precisamente a que a converte em uma entidade de interesse público).

Não só protege autores nacionais e internacionais, como também se ocupa de proteger @s

titulares de direitos patrimoniais de autor, não importa onde se localizem. Isso implica

em toda classe de procedimentos administrativos, em ocasiões, legais: uma sociedade

autoral “apresenta, ratifica ou se desiste da demanda ou querela em nome de seus sócios,

sempre que conte com poder geral para pleitos e cobranças...”

Nisto, como em tantas outras coisas, os países desenvolvidos estão à frente, mas o

México e o Brasil não ficam muito atrás. Existe há quase 20 anos, uma sociedade

Mexicana de Autores das Artes Plásticas (SOMAAP). Membro da Confederação

Internacional de Autores e Compositores (CISAC), a SOMAAP é uma sociedade de

autores chamada “de interesse público” sem fins lucrativos. Atualmente é uma

organização fraca, que peca pela ingenuidade e má administração. Entretanto está

legalmente constituída e poderia crescer em importância, se simplesmente @s artistas se

preocupassem em associar- se e participar de modo ativo para defender os direitos do

grêmio.

Todos os países têm a sua legislação. Para regular sua relação com os vizinhos, a

maioria ajusta suas leis autorias com os tratados internacionais assinados entre as

nações. Como entre dizer e fazer há um caminho a percorrer, toca-nos transitá- lo.

Passemos agora a outro grande tema, o de nossa relação com o Fisco (iiiiiiiiiich!)

Obrigações fiscais
147

Pareceria que nós artistas sentimos que as leis que afetam aos mortais comuns não são

aplicadas a nós: apenas uma bem pequena proporção do grêmio cumpre com suas

obrigações cidadãs, o resto sonega o pagamento de impostos (e ainda exigem dos

funcionários que atuem com responsabilidade!).

Entretanto, quando buscamos retificar o caminho, deparamo-nos com o fato de que o fisco

não só não nos contempla em suas leis e regulamentos, mas que nos impede de exercer

cabalmente nossa profissão. Perfeito exemplo no Brasil é o parágrafo ________, da lei

sobre o Imposto de Renda, a única que nos reconhece como artista. Embora as disposições

desta chave nos impeçam de estender faturas, o que nos obriga a vender obras em troca de

recibos honorários. A medida é claramente uma aberração, pois sem fatura, um/a

comprador/a nunca poderá crer ser don@ legitimo da peça, não poderá assegurá- la, e

muito menos poderá ser incorporada ao seu capital fixo ativo.

Sem outorgar reconhecimento à profissão de artista, o único lugar onde o fisco nos

permite estender faturas é o parágrafo _________ (entradas por atividades

empresariais). Isso nos obriga a registrar- nos sob duas chaves e embaralhar nossas

declarações como Deus – e @s contadores – queiram.

Pagamento em espécie ou em dinheiro


Certamente existe no México o chamado “pagamento em espécie”, sistema que um

presidente anterior inventou , sem duvida com boas intenções, mas que foi modificado pelo

tristemente célebre Salinas. Está tão mal organizado que só alguns artistas podem

recorrer a este sistema, já que opera em apenas algumas zonas do país. Rege-se por

critérios absolutamente arbitrários: favorece apenas artistas que produzam obra

tradicional e exclui a crescente grei de praticantes atualizados.

Resumindo, a atual legislação em toda a América Latina é tão confusa que até parece
maquiavélica: proporciona aos malandros de colarinho branco os mecanismos ideais para

lavar dinheiro sujo.


149

XIV. Pondo preços


De onde podemos finalmente agarrar a ponta da
madeixa e deixar as duvidas para trás... e se alguém quer um
desconto, pois logo o pensaremos

Quem você puxa, quando sonha...


Saber em quem pensamos quando creamos, a que publico queremos chegar, é condição

sine qua non da nossa profissão, por mais que existam pessoas insistindo que “a arte é

universal”. Os parâmetros estéticos de uma francesa são muitíssimo diferentes dos

japoneses, tanto como são diferentes as sensibilidades de uma cidade sulista e calorosa

aos lugarzinhos do campo nórdico e frios. Vai! As necessidades e interesses espirituais e

recreativos de uma operaria são completamente diferentes aos de seu patrão ou patroa,

nem melhores nem piores, são simplesmente outros.

De onde viemos, onde trabalhamos, em que direção vamos são fatores que também

influenciam quando criamos. Para localizar-nos no tempo e no espaço e tirar o máximo

proveito de nosso trabalho, é bom repensar nossa relação com as instituições culturais

publicas, por um lado, e com fundações e empresas privadas, por outro. Dito de modo

claro e direto: queremos viver de salários e subsídios ou de vendas, direitos autorais e

honorários?

Se quisermos produzir com base em salários e subsídios, teremos que procurar lugares

onde esses sejam oferecidos. Geralmente isso ocorre em instituições publicas e fundações

privadas. Se queremos viver de vendas, de direitos autorais e honorários, teremos que

procurar cultivar a freguesia. A opção do subsidio, não se esqueça, será sempre e por sua

natureza, de curto prazo. A das vendas vai aumentando à medida que se ponha em

marcha.

Conseqüentemente, a pergunta: que preços devemos por na nossa obra? Será determinada

pela resposta que formulemos a uma pergunta anterior: Com quem procuramos
estabelecer a interlocução: com gente comum ou com gente poderosa? Com a enorme classe

média ou com a minúscula elite?

Falando claramente: onde há mais publico passivo (PP) sujeito a transformar- se em

publico ativo (PA), entre a multidão de rendas médias ou em pequenos grupos de altos

salários?

Enquanto mais caro queiramos vender, mais teremos que cortejar setores de alto poder

aquisitivo. Em seu desconhecimento, o PA prefere tratar com galerias empresariais, com

tudo e com seu marketing, pois pelo menos recebem conselhos, úteis ou não, a respeito do

“investimento” que fazem. Se pelo contrario, estabelecemos preços mais acessíveis, mais

poderemos incidir – de modo direto – no PP e ajudar a convertê-lo em PA.

Assim simples? Não, não tanto, porque os riscos do primeiro caminho são enormes, não

menos o de ter que fazer pré-vendas aos pudentes, concessões que possam lesar o espírito

criador de maneira irremediável. Os riscos, eu lhe asseguro, são menores no segundo

caminho. E, já não há com o que se preocupar. Afinal de contas, o que se impõe é o acerto

da obra por si mesma. Se acaso chega a comover as fibras do público e os comentários

começam a passar, a obra pode chegar a ser muito cotizada. Francisco Toledo, artista

mexicano, é a melhor prova disso.

O tema dá pano para manga:

No quimérico final da administração de De la M adrid e depois durante todo á de

Salinas, no México dos 90s, muitos colegas ficaram gulosos com a riqueza que se dizia

circulante no país. Isso os impulsionou a subir os preços, que chegaram a cifras

astronômicas, e o mercado, uma minoria de consumidores conspícuos afim, se saturou.

Hoje a maioria daqueles artistas sofre as conseqüências, já que lhes foi impossível
151

sustentar os preços de então. Enquanto as obras se acumulam em seus ateliês, cortejam

com desespero a nomenclatura na moda com idéia de receber apoios para

internacionalizar-se, dividir seu tempo entre a pintura de retratos de senhores/as

acomodados/as e sua obra pessoal. No melhor dos casos, dão aulas em casa. As exceções

confirmam a regra e sublinha a tragédia.

De minha parte, vendo a um modesto ritmo, duas ou três peças por mês, a preços

igualmente modestos, pelo que meus compradores são pessoas de minha condição social,

amizades e vizinhos. (Até minha própria ex-assistente e agora a minha cúmplice, a

Tatiane, coleciona minha obra).

Pelo mais, nunca, nunca joguemos fora a nossos próprios colegas aliad@s, quem

costumam ser nossos melhores promotores, que em ocasiões atuam como curadores/as e

até funcionári@s: eles também podem chegar a ser nossos melhores colecionadores. Se

não fosse assim, como poderia ter-se dotado de obras o Museu Rufino Tamayo, o de José

Luis Cuevas, os dos irmãos Coronel em Zacatecas, o do José Garcia Ocejo em Córdoba,

Veracruz...?

Agora sim, a etiquetar nossas obras:


A matemática não é a matéria preferida dos artistas. Pelo menos isso é o que dizem por

ai. M as não é preciso trigonometria para anotar uns números e por preços ao nosso

trabalho. Vejamos:

O lógico é que nosso trabalho cubra os gastos do lar. A primeira coisa que precisamos

fazer, então, é dividir o orçamento/a economia doméstica da o orçamento/economia

profissional.

Para isso, somemos os gastos mensais das despesas:


- Aluguel ou condomínio R$

- Luz, água (média) R$

- Telefones (média) R$

- Alimentos (média) R$

- Dependentes (média) R$

- Transporte (média) R$

- Vestimenta (média) R$

- Gastos médicos (convênio) R$

- Geral R$

- Imprevistos: R$

Total R$

Digamos que a média mensal total é de... (o colocarei em dólares? Não melhor em reais...

a final é só um exemplo): R$ 1.100 por mês.

Para estarmos tranqüilos em casa, teremos que ganhar esse total em nossa lida visual,

MAI S o que se precise para produzir nossa obra, MAIS o gasto fixo de nosso ateliê e

imprevistos diversos.

Digamos outro tanto, a soma do doméstico e profissional sejam R$ 2.200 por mês.

Agora calculemos outra média, desta vez, de nossa produção.

Há artistas parcos em seu trabalho, produzem pouco e de maneira pausada. Outros

produzem muito. Seja como for, devemos calcular de modo realista que média de obras

podemos criar por mês, entre esboços, desenhos, gravuras, pinturas, esculturas,

instalações, objetos, etc. Se as condições de trabalho são boas, quer dizer, se podemos

trabalhar em um ateliê acondicionado e equipado sob medida às nossas (primeiras)

possibilidades, vamos criar muito mais obras que se trabalhássemos em meio à desordem.
153

A aritmética nos indica que se fazemos um só quadro por mês, teríamos que vende-lo a

2.000 reais, mas se produzimos quatro quadros, poderíamos vendê-los a 500 reais.... E

que tal se criamos 9 obras, e as avaliamos em 300 reais cada uma. Fácil não?

Continuemos com a aritmética: se por mês podemos produzir dois quadros médios, oito

desenhos de bom tamanho e duas esculturinhas, poderíamos vendê-los assim:

2 óleos R$ 600 cada um = R$ 1.200,00

8 desenhos R$ 120 cada um = R$ 960,00

Total: R$ 2.160,00

O que nos indica que ultrapassamos o orçamento por 160 reais. Se além disso vendermos

uma das esculturinhas (o que não pus em minha listinha porque não esperava vendê-la)

em 300 reais, pois chegamos a poder viajar no feriado prolongado para o Guarujá.

Quando se trata de arte, as coisas podem complicar-se (quem sou eu para negá-lo?), por

isso deve-se levar em consideração o TEMPO e o ESFORÇO que foram necessários

investir para vender os óleos, oito desenhos e a esculturinha, em 30 dias! A resposta é o

mês inteiro. Então, quando criamos?

Como a freguesia nunca é abundante devemos ser realistas e fazer nossos cálculos de

outra maneira. Digamos que demoraremos um mês para produzir e um mês para vender

nossa produção. Para cobrir os gastos dos dois meses (R$ 4.000) deve-se dobrar o preço

de cada coisa, teremos que vender cada óleo a R$1.200 e os desenhos a R$240 cada um.

Não existem mecanismos que tabulem os preços. No momento de calcular nossos gastos

fixos e custos de produção a máxima prioridade, acima de qualquer outra, são nossas

próprias necessidades. M as não podemos ignorar o mundo que nos rodeia. Ver por onde
andam os preços de colegas que trabalham temas ou técnicas ou formatos similares aos

nossos, ver como vendem no ateliê ou na galeria, pode nos ser útil. Se o mercado local

agüenta a barra, podemos subir nossos preços um pouquinho. Se não, cuidado! É muito

fácil cair na tentação (nunca faltam os delírios de grandeza) e por preços tão

estrambóticos ao trabalho, que ainda que chegue a interessar a alguém, não poderia

paga- lo.

Todas essas decisões são táticas, medidas que devem ser pensadas e repensadas para

cumprir de modo mais cabal nossa estratégia: que é – nesse caso especifico – vender nossa

produção constante e parceladamente.

A vida não é um sonho, até que possamos descansar sabendo que já funcionamos

profissionalmente. Duas das opções que temos em vista são vender um pouquinho por

mês, como vimos acima, ou vender de uma só tacada um bom número de obras, uma vez ou,

ao máximo, duas vezes por ano. Para isso temos que organizar uma ou duas exposições

individuais por ano.

Pode-se exibir em uma galeria privada que tenha boa carteira de clientes, ou em uma

institucional onde teremos que vender por conta própria. M as também podemos exibir

durante vários meses, logo que separarmos outro tempo exclusivo para organizarmos o

evento, depois inaugurar com pompa e circunstância, para finalmente dedicar os dias que

dure a exposição a promovê-la e vendê-la.

Essa ultima opção tem sido a mais comum, começa, no entanto, a cair em desuso, em parte

porque nos obrigar a cuidar do dinheiro que entra de repente e fazê-lo durar até a

exposição seguinte. Com outras palavras, exige de nós calcularmos o tempo e programar

com prazos mais largos.


155

Pode-se compreender que países mais civilizados que o nosso marcam suas temporadas, a

principio do ano para produzir, e no final para expor, promover e vender.

Todos esses cálculos se baseiam em que, efetivamente, tenha clientela que adquira nossa

obra, o que quer dizer, que haja quem queira o produto de nosso talento, ou ainda que @s

artistas sejamos capazes de detectar quem goste de nossa obra. U U F FAA! A coisa, vista

assim, fica preta. É quando pensamos: melhor que outra pessoa se encarregue de vender!

Que preguiça!

M as se já lemos até aqui, é porque já entendemos como ter nossos assuntos sob o nosso

controle: sabemos, por um lado, que temos que contar com o ateliê, seu armazém e o

escritório; arquivos e fichários arrumados (entre os quais se encontram alguns nomes de

clientes e de noss@s amig@s do meio); por outro lado, sabemos que se deve ter suficientes

obras e que devem ser apresentadas de modo decoroso.

Finalmente, sabemos que é recomendável recrutar a@ namorad@, amante, espos@ ou

sobrinha do senhor que não sabe nada de arte, para vender nosso trabalho em troca de

uma comissão (essa sim, previamente pactuada).

Ah, então tá bom!

M as não! Não! Ainda faltam coisas: dada a cabeça dura do PP, que não se deixa

converter em PA com facilidade, dada a situação econômica que atravessa o país (o país?

O continente inteiro!), visto que vivemos na querela que vivemos, a quem passaria pela

cabeça vender só em território nacional?

Não íamos viajar para outras cidades, outros países? Não é no escritório que temos

nosso computador e a conexão a rede, e sabemos daquele edital da Argentina e aquele

concurso no Japão? Então, o que estamos esperando? O mundo inteiro é nosso, NÃO
I M PORTA ONDE ESTEJA NOSSO ATELIÊ.

Voltemos ao ateliê, onde estamos a ponto de decidir que preços dar ao que acumulamos. O

sensato, na hora de decidir que preços dar aos 19 acrílicos e aos 60 desenhos de diversos

tamanhos e à série de xilogravuras que fizemos no mês anterior... E aos quinze

modelinhos em barro cozido que queimamos quando fomos a Minas Gerais, é com papéis

nas mãos listando as fichas técnicas – escrever o preço de cada peça em uma etiqueta

aderente e grudá- la atrás ou abaixo ou onde se possa.

Com esta previsão economizamos intocáveis mortificações quando alguém nos visite ou

quando os das lojas ou da galeria venham ao ateliê pegar as obras: já não haverá

possibilidade de que pechinchem o preço, que o esqueçamos ou erremos. Está por escrito, a

etiqueta o diz, esse é o preço definitivo. Ponto final.

Espera um pouquinho... Uma ultima lembrança: uma coisa é o preço na obra e outra coisa

é o custo da moldura... Ou a base da escultura, ou o que seja. Claro, o incluímos ao

calcular nossos preços, mas se por casualidade alguém se atreve a pedir-nos um

descontinho, então podemos oferecer-lhe o desenho SEM moldura (mas já tinha dito isso

em algum lugar, né?).

Boa sorte!

Custos dos honorários


Nós artistas não podemos andar expondo nesta ou aquela instituição gratuitamente, ou

só porque dizem por ai que “nos convém”. Claro que nos ajuda fazê-lo, mas a quem

convém mais é à instituição, se não, de que maneira justificaria seu trabalho aos

funcionári@s? A nós cabe cobrir os gastos mais pesados: criar as obras, emoldurá-las,

às vezes até pagarmos o coquetel e a promoção. Isso é especialmente ingrato quando se

trata de obra não vendável, como instalações e performances, que pelo geral apresentamos
157

em espaços institucionais. Qualquer instituição simplesmente se reduz a exercer um

orçamento fixo de antemão, nossa exposição simplesmente é acrescentada às demais

atividades que logo listam no relatório anual, esse sim muito importante para as

instituições.

O que é pior: ainda que um outro museu da capital comece a pagar honorários aos

artistas para expor suas instalações e performances em seus espaços (como se costuma

fazer em outros países), escassas instituições públicas contemplam sequer a possibilidade

de vender as obras expostas em seus espaços (o estatuto não permite, costumam

sussurrar seus funcionári@s).

Possuem orçamento para pagar honorários do pessoal do teatro, da musica, da dança e

a@s escritores/as por suas apresentações e conferencias. Além disso, cobram ingresso e

vendem livros. Por acaso não mereceríamos o mesmo tratamento? Poderiam estabelecer,

no pior dos casos, uma porcentual pela venda da obra, ou permitir a uma comissionista

vender durante os dias que duram a exposição. A final de contas, tudo volta a depender de

nos, @s artistas e de nossa capacidade de convencer a@s funcionari@s...e a n@s

mesmos.
XV. EXPOR NO ATELIÊ (OU QUANDO QUER QUE SEJA)
De como não necessitamos de galerias
se queremos expor quando quer que seja, á nossa vontade.

Expor no ateliê ou na galeria, eis a questão


A queixa mais comum d@s artistas que participam de meu seminário é em relação a

dificuldades que têm para exibir sua obra. Seu lamento sempiterno é: “Ah, aqui em Lagoa

do Bauzinho (ou onde for) não há boas galerias”. Só posso responder o lógico: não há

galerias boas ou más. Só se pode distinguir entre as que vendem e as que não. O que por

acaso existe sim, é obras boas ou más... E nem isso, porque, o que é bom e o que é mau?

Como se mede a qualidade? A resposta à falta de galerias e a sua qualidade está na

definição das funções das ditas empresas.

Uma galeria não é nem mais nem menos que uma loja, uma loja privada de mercadoria

artística, que vende o fruto de nosso trabalho. Se @s proprietári@s de uma galeria

vendem muitas obras, podemos considerá-l@s bons empresário@s. Se não vendem, jogam

casinha de bonecas, simples assim. Como qualquer loja, uma galeria empresarial oferece

só o que apreciam, ou seja, seus don@s ou gerentes vendem precisamente porque gostam

da mercadoria com a qual mexem. Em outras palavras: só venderão nossas obras se

gostarem delas. Ponto.

A capacidade de qualquer uma dessas empresas que se queira respeitar está logicamente

limitada ao numero de artistas que seus don@s podem gerenciar com soltura e

facilidade, sem parecer-se a um supermercado ou mercado das pulgas (também existem

essas...) Vender arte não é fácil, e “gerenciar uma obra” é ainda mais complicado que a

compra-e-venda de imóveis. Uma má galeria limita-se a aceitar obras que tragam ao seu

estabelecimento, pendurá- las e contar-lhe qualquer historieta à clientela incauta com o

propósito de ganhar uma comissão injusta. Ao contrario, uma boa galeria se compenetra

até onde lhes seja possível com a obra e a vida do artista, assume suas propostas
159

estéticas e acrescenta as próprias, para desenhar sua estratégia de venda. Compactando

o discurso de seus artistas, o aplica no momento de abordar um cliente em potencial.

Consegue-se convence-l@, vende. Se não, tenta de novo.

A clientela de uma galeria se encontra de modo predominante no seio sociocultural, entre

os pares de seus don@s. Se @s clientes são ignorantes ou se gostam só de paisagens,

marinha e naturezas mortas, a galeria lhes poderá vender isso e mais nada... A menos

que seu dono seja especialmente persuasivo em seus métodos e consiga convencer suas

amizades de ampliar seu panorama de gostos. Este ultima é o que pode distinguir uma

galeria de outras, porque além de vender, chega a sensibilizar seus consumidores,

educando-@s no processo.

Muit@s de nos, por desconhecer a realidade, nunca vamos conseguir ajustar- nos a essa

e caminhamos envolvidos em uma nevoa de sonhos caipiras. Desanimamos-nos com

demasiada facilidade quando somos rejeitados pel@s don@s de uma galeria, quando

segundo eles nosso trabalho “não é bom”. O que na realidade está dizendo é que, bom ou

mal, nossa obra não é do agrado a sua galeria nem a sua freguesia, nada mais. Em vez de

nos sentirmos rejeitad@s pelo mundo, devemos tomar suas opiniões com uma medida de

cepticismo, e levar nossos port-fólios a outros lugares, mesmo que selecionamos

exclusivamente porque gerenciam obras parecidas à natureza da nossa.

Nunca se pode esquecer que, no fundo, uma galeria é só um espaço de quatro paredes que

alguém habilitou com carpete e luzes para expor. Todo o resto, sua capacidade para

promover sua mercadoria, para cuidar de seus provedores (nos), para publicar

inaugurações, para telefonar a contatos em museus, para vender, dependera do nível de

operacional d@s don@s. A maior parte das pessoas que abre galerias, por aqui e por

acolá, as fecha em um par de anos simplesmente porque não soube fazer de sua galeria

uma empresa operativa.


A realidade é que há uma severa escassez de espaços de galeria e, mais ainda, de pessoas

com o cacife financeiro e os conhecimentos necessários para gerenciá-los.

Consequentemente, mais e mais artistas voltam a tomar os hábitos de sempre, e

regressam ao milenar costume de expor a produção em seu lugar de trabalho.

Substituir a galeria é simples


A vida é tão simples quando aplicamos o senso comum: se por acaso este livro nos serviu

para alguma coisa, se já conseguimos nos organizar ainda que fosse a uns 25%,

estamos já em possibilidade de satisfazer a necessidade de exibir e vender para substituir

a galeria com nosso ateliê, ou temporariamente com um espaço emprestado.

Os passos a serem dados são:

1. Habilitar o espaço (seja nosso ateliê ou um temporário);

2. Programar as operações necessárias (capítulo II I );

3. Reunir as obras e enquadrá- las;

4. Examinar as finanças (cap. I, IV, e X.II I );

5. Adaptar nosso ateliê, casa ou lugar onde será realizada a exposição (cap. II);

6. Resolver a apresentação das obras (sentido comum);

7. Anunciar e/o promover o evento (cap. IV, VII e IX)

7.1 convite, catálogo e/ou cartaz (cap. IX),

7.2 Fazer boletim (cap. IV e IX),

7.3 Preparar a noite inaugural (senso comum);

8. Inaugurar (senso festeiro)

9. Presença na mostra até, e depois do encerramento (cap. IV, IX e XII I )

9.1 Organizar eventos enquanto durar a mostra (cap. II I , IV e IX),

9.2 Liquidar comissões (senso comum);

10. Programar novos lugares para expor a mesma mostra ou o que ficar dessa (cap.
161

II I, IV e IX).

Cada um dos passos necessários para a organização com sucesso de uma mostra está

claro. Todos se sustentam no que temos estudado ao longo deste manual. Não há nada

que nos empeça de levar a cabo esta ou qualquer ação que eu tenha proposto, salvo pelas

inibições que cada um guarda em seu coração. Saberão os deuses por quais motivos

(porque razoes não tem não).

Certamente é muito difícil desfazermos de mil e um preconceitos que se tem formado

inculcados desde que somos pequen@s. Acreditar, por exemplo, que se não exibimos em

uma galeria “famosa” não o faremos pelo mundo afora, impedirá que organize as nossas

próprias exibições onde, na realidade, é melhor para n@s mesm@s. Acreditar que @s

critic@s não visitam exposições se não em museus e galerias é uma falácia. Acreditar que

o preço de nossas obras seja determinado pelas forças desconhecidas de algum lugar do

Olímpio artístico, impedirá que coloquemos preços justos, concordes com as nossas

necessidades. Acreditar que a freguesia prefira comprar em lugares elegantes, ao invés

de um ateliê... Trata- se só disso, de crenças, tão infundadas como qualquer superstição.

Retomo as palavras da introdução deste livro: sempre tá um sujo para um mal lavado.

Sempre é possível viver da arte de maneira exclusiva! Basta assumir que a profissão que

escolhemos, a de artista visual, não é incomum nem envergonhante, nem coisa de outro

mundo. Produzir e viver das artes é, simplesmente, indispensáveis para a sobrevivência

humana.
ANEXOS

O VALOR DA ARTE CONTEMPORÂNEA


Paula M astroberti

Li, em 1996, um livro cujo teor reacionário, apesar de generalizar e salientar apenas os

aspectos negativos da arte pós-moderna, idealizando as expressões artísticas que lhe

precedem, ainda assim oferece uma pertinente e corajosa reflexão sobre os bastidores do

meio artístico em suas diferentes instâncias. Cultura ou Lixo (1996, Civilização

Brasileira, 256 págs.), de James Gardner, com tradução de Fausto Wolff. Afinal, ele

desnuda muito da arbitrariedade desmedida, da hipocrisia e do jogo de vaidades que

regem este mundinho maluco do qual muitos artistas são, consciente ou inconscientemente,

cúmplices.

As denúncias de James Gardner sobre a mediocridade mal-disfarçada que há por trás de

certas expressões artísticas dos últimos vinte anos, apesar de amargas, foram úteis na

compreensão de como qualquer juízo de valor, desde que Foucault e sua tribo gritaram

aos quatro ventos o fim das ideologias totalitárias, havia se tornado precário, dependente

de critérios e interesses subjetivos. O que, no caso da arte, significa dizer: dependente da

maneira como ela é experienciada, do grau de seriedade e de responsabilidade com todos

os envolvidos se posicionam, para que uma obra de arte mereça ser denominada como tal.

Não que o objeto-arte não tenha valor em si mesmo. Eu acredito que sim, que ele pode

conter e agregar sobre si informações importantes, cuja leitura sempre rica apenas
163

variará conforme a época ou do contexto em que for analisado. Algumas obras (e, por

favor, quero incluir qualquer forma de expressão humana, literatura, música, etc.)

certamente preencherão requisitos para uma leitura mais perene e universal do que

outras. Paradoxalmente, parece que toda vez que insistimos em determinar regras para

estes valores, ou toda vez que um artista pensa ter inventado uma fórmula que conduza

uma obra a este patamar, a coisa não funciona e se banaliza.

Há sempre certa polêmica envolvida no que se refere ao valor da arte – principalmente da

arte contemporânea. Tanto quanto a polêmica (esta mais danada) sobre o que ela

significa e qual a sua função. Há sempre tentativas absurdas de reduzir a arte a um

mero objeto utilitário e, como tal, sujeito às regras capitalistas que abarcam qualquer

produto criado para ser consumido.

Ou ainda, tentativas no sentido contrário: a verdadeira arte não pode ser útil e não se

consome – ponto final. Fica a questão: A arte tem valor de consumo? Ou não?

Ante esta provocação difícil, cuja resposta requereria que citássemos uma penca de

filósofos dedicados ao assunto, eu gostaria de começar pelo princípio do fenômeno e sua

fonte, ou seja, pelo próprio homem, que é quem a produz e para a qual ela se volta.

Pois a diferença está aí. Na fonte. Na verdade, o modo como se consome, circula ou se

gerencia o objeto-arte pouco tem a ver com o sentido de valorizá-lo enquanto arte-autêntica

(notem que eu liguei por um hífen as duas palavras). A autenticidade já nasce agregada

ao próprio processo criativo do artista. Ou, como pretendo dizer: ela já nasce arte-

autêntica – ou embuste, trapaça, picaretagem, chamem como quiserem – lá no estúdio, em

seu protótipo, antes de concluída. Se o artista realmente comprometido com seu labor

falha, ou é bem-sucedido, ele o saberá imediatamente – esta que é a verdade. O resto,

marchands, curadores, críticos (e os há?), vão contribuir apenas com um glacê que pode

encobrir um bolo ruim ou muito gostoso.


O mercado de arte tem suas modas, é bom que se diga. Quando eu comecei, a pintura

estava em alta, principalmente a pintura- pastiche, ou neo-expressionista, como a dos

alemães. Hoje a moda é outra, a pintura aparentemente caiu, outros materiais e

linguagens subiram, mas nada disso determina o que é bom ou ruim de fato. Tanto em

termos de investimento quanto de valor estético ou poético. Quem segue modismos

geralmente é quem não entende nada, e obedece dieritinho às orientações do arquiteto (bem

comissionado por um galerista) ao decorar a sua fantástica cobertura com peças de

última linha pra exibir aos amigos (e quanto mais esfíngicas, maior o impacto). O que

não quer dizer que ele acabe comprando uma obra ruim. Quem sabe?

Artistas iniciantes sempre são uma promessa. Que podem não se cumprir. Aposta quem

tem olho profético. Ou quem tem menos dinheiro. Artistas já consagrados – bem, aí já

temos outra história. Que merece ser contada.

Entende-se por Artistas consagrados aqueles que já têm por aí uns dez anos pra mais de

carreira, os que foram aprovados após cumprirem o percurso necessário para sua

promoção profissional, a saber: um bom número de mostras individuais em galerias de

destaque, seleção em salões institucionais, prêmios de importância reconhecida, alguma

bienal (qualquer uma, desde que tenha esta palavra escrita no currículo), quem sabe uma

pós-graduação em alguma área de poética visual (com bolsa-residência no exterior),

acervo em galerias e museus, catálogo com textos em jargão acadêmico intraduzível etc.

Então o investidor vê todo aquele dossiê e pensa: estou seguro. O marchand garante. O

curador abaliza. Até o jornal, que geralmente não dá mais que uma notinha sobre artes

plásticas, já fez o cara merecer pelo menos meia-página no caderno de cultura. Ele

compra. Fez uma boa compra? Quem sabe?

Artistas consagrados são certamente seguros, pra quem vê a arte como um objeto de

investimento capital. Artistas consagrados têm a garantia da consolidação de suas


165

carreiras. É provável que continuem a aumentar seus currículos, a produzir até o fim de

suas vidas coisas boas e às vezes nem tanto (Artistas consagrados também falham,

também sucumbem às modas, patinando num mesmo estilo, o que pode desvalorizá-lo no

futuro). Entretanto, o sistema assegura, através da palavra de curadores, críticos e

marchands, e o investidor arrisca. Simples assim. Como a bolsa de valores, como uma

aplicação financeira. E agora chegamos a outra ponta. A questão é: quando desejamos

um objeto de arte, o desejamos com que intenção? Notaram que eu usei dois vocábulos

para definir o interessado em arte? Consumidor e investidor. A princípio, quem compra

arte é um ou outro, ou os dois juntos. Há, entretanto, uma diferença sutil entre eles: o

consumidor aparentemente compra para decorar a sala de estar; o investidor

aparentemente inicia uma coleção para ganhar dinheiro. Nenhum dos dois está errado.

Porque a arte não pode ser destinada a enfeitar o espaço residencial ou a ante-sala de um

consultório, afinal de contas? E porque não haveria de ser um bom investimento? O

mercado de arte é um dos mais valorizados no mundo, cujas cifras podem atingir bilhões.

Ambos, consumidor e investidor, compram arte com intenções diversas, porém ambos

podem ter ainda uma segunda, mas não menos importante intenção, a do colecionador – o

que compra arte pela fruição estética. E é aí que a cobra fuma. Voltando ao nosso

princípio:

qualquer obra de arte será tanto mais autêntica e pontual se tiver aplicados sobre si

conceitos tanto mais profundos e universais acerca da visão de mundo de quem a cria, e

se exprimir estes conceitos através de uma linguagem tanto mais bem elaborada, clara e

precisa. Independente de modismos, do que quer que digam os críticos e os curadores, o

sistema e o mercado, esta obra já nasceu carregada de auto-estima pela própria mão do

artista profundamente comprometido com as questões do fazer artístico e, se não cair no

ostracismo destruidor de um depósito qualquer, é bem possível que brilhe independente de

quaisquer previsões ou circunstâncias.


Tudo muito bonito. M as estamos falando de sistemas, e os sistemas, em nome da

consagração de certos padrões, são obrigados a rejeitar outros. Em geral, tudo o que se

produz visando cumprir padrões, tende ao superficial e imediato. O colecionador de arte,

se está em busca da arte-autêntica ou de uma arte que preencha quesitos mais exigentes,

terá, portanto, que estar atento não só ao que o marchand ou curador lhe diz, ou o

tamanho do currículo parece provar, mas sobretudo à pessoa do artista – ele deve

investigá-lo bem. Todo aquele que se pretende um connaisseur deve educar-se e ao seu

olhar (e quanto mais cedo começar, melhor). Intuição vale mais do que a razão, na

maioria dos casos. M as esta intuição só vale se instruída pela educação e a convivência

com o meio.

Afinal, a arte-autêntica está também presente no mercado de arte (e porque não estaria?

Há mercadoria para todas as necessidades e gostos.). Seu canto-de-sereia, contudo, é

mais sutil, complexo, e requer uma atitude contemplativa demorada, perscrutadora. Às

vezes pode ser levada para casa, às vezes terá efeito temporário ou volátil, só podendo ser

apreciada no local onde se instalou.

O que se quer dizer aqui é que não se pode esperar que o sistema de arte determine o valor

absoluto de uma obra, seja ela pintura, instalação, ou um site-specific. O sistema está

estruturado sobre padrões estéticos transitórios (circunstanciado pela axiologia do

momento), interesses mercadológicos e é em nome destes valores que julga o que é arte ou o

que não é. Exigir que o mercado de arte atue de forma puritana e idealista é um absurdo

tão grande quanto querer o mesmo do supermercado onde você faz as compras ou mesmo

do editorial ou do fonográfico, que, em sua maioria, também vende e consagra enorme

quantidade de lixo.

Como um bom livro, ou uma boa música, que recebe maior ou menor aclamação mediante

nossa sensibilidade e preparo intelectual, assim também é com a obra de arte. Feliz ou
167

infelizmente, meu caro leitor, cabe exclusivamente a você, consumidor, investidor ou

colecionador, visitante ocasional de museus e galerias, exercitar- se o máximo possível a

fim de não se sujeitar ingenuamente ao que querem lhe impor.

Neste momento, a escala de valores mais importantes é a sua, e é com base nela que você

deve ir atrás do que deseja. Boa sorte.

©® 2006 Paula M astroberti, artista plástica e escritora www.mastroberti.art.br

Anexos
Breve e concisa tipificação de galerias.
Onde se entende como publico ativo @os que podem adquirir, e o passivo @os que se limitam a
contemplar
Tradução: Sol Abadi

É possível que alguém, em algum lugar, tenha escrito um texto que recolha a historia da

Galeria como instituição no Ocidente. Se existir, eu desconheço. Desconheço também de

texto algum que classifique os diferentes tipos de galerias que tem surgido desde que se

institucionalizou este conceito empresarial. Do que eu tenho certeza é que não tem um único

estudo sistemático que trate, em concreto, das galerias mexicanas, nem da sua historia e

desenvolvimento, nem das repercussões que tiveram e tem na plástica deste país.

No referente ao mercado mundial da arte, podemos ler diariamente de leiloes

internacionais, lavado de dinheiro, oscilações de preço sem muita explicação, mega-

investimentos para construir novos museus, roubos, seguros e polícias especializadas.

Pela sua magnitude, é difícil calcular a quantidade de dinheiro envolvida neste setor.

Nem México, nem Brasil não éstao à margem deste fenômeno. O desenvolvimento de nossa

economia assim como os desafios aos quais nos enfrentamos exigem uma investigação
sobre o funcionamento das galerias que funcionam na América Latina, para analisar o

fenômeno e regular as relações com a nossa sociedade.

No momento, tentarei uma aproximação ao assunto. Advirto-lhes que não sendo um

investigador na matéria, minhas observações são absolutamente empíricas. Baseiam-se

exclusivamente nos meus conhecimentos e experiências como artista (como se isto não

bastasse…), me impulsiona o afã de estimular o debate em torno ao assunto, que

considero de máxima importância, justo agora, quando coincidem por um lado, os

esforços “modernizadores” com os que os estados em Latino-América descartam o

histórico modelo de apoio â cultura, e com a responsabilidade que começam a assumir,

para bem ou para mal, os setorer mais privilegiados de nossas sociedades, a chamada

“iniciativa privada”, tanto na forma de possíveis clientes como a través da filantropia.

Encerro este ensaio com uma listagem dos diferentes tipos de galerias que operam na

atualidade em nossos âmbitos.

1
Do Palácio a periferia

Praticamente desde que o homem deixou de ser nômade, o acesso e o desfrute da alta

cultura se estabeleceu como um direito outorgado por deus e privilegio exclusivo de todas

as pequenas e grandes teocracias e monarquias. Esta muito especial relação entre o

artesão (ou o artista) e o poderoso e sua corte nunca precisou de intermediários

especializados.

O intermediário surge só depois da Revolução Francesa.

Chefes, caciques, duques, reis, czares, paxás , imperadores, faraós, bispos, papas,

tlatoanis, regentes e presidentes, todos competiram entre si para deleitar sua existência

com o talento dos mais destacados criadores de seus tempos, próprios ou estrangeiros.

Num processo de seleção natural, os mais importantes músicos e compositores, os mais


169

requintados ourives, poetas e bardos mais hábeis, os melhores bufões e trovadores, os

dramaturgos, pintores e escultores, passavam a formar parte da corte – às vezes durante

toda a vida- para entreter a seus soberanos, interpretar as crenças de seus súditos e

imortalizar a passagem de seus amos por este mundo.

Certamente, tiveram que elaborar loas aos deuses e césares , mas graças à tranqüilidade

em que viveram, albergados nos claustros ou palácios, protegidos pelos poderosos

senhores – ou com freqüência, pelas consortes destes – aqueles criadores também

traduziram as visões cósmicas de seu tempo. Neste processo, refinaram suas habilidades

e conhecimentos para retransmiti-los às gerações posteriores, legitimando desta forma o

poder.

A relação entre o mecenas e o artista foi invariavelmente direta e pessoal. O soberano

ordenava e o artesão executava. Dificilmente poderemos fazer justiça ao papel que de

forma tão calada desempenhou e continua desempenhando a esposa (ou a amante) do

grande patrão.

F oi somente na metade do século XIX, na França, que surge e adquire carta de

naturalização a Galeria, instancia distribuidora de obras de arte, empresa privada que

oferece sua mercadoria a um público seleto. (Não deixa de ser um dado curioso porém

significativo o fato de que isto acontecera pouco mais de duzentos anos depois do

surgimento de aquela outra grande instituição distribuidora do saber humano, a

Livraria.)

O nascimento da galeria deve ser visto como conseqüência lógica dos processos sociais na

Europa, onde as mudanças de ordem econômica se traduzem numa gradual redução dos

poderes monárquicos e no crescimento das classes medias. As mudanças se refletem

fielmente na produção cultural. Começam também a se desmoronar os mecanismos de

mecenato tradicionais que apoiavam e estimulavam as belas artes.

A ascensão da classe media não ocorre de forma homogênea, mas de forma estratificada.

Seus setores mais vorazes procuram adquirir um refinamento social para se legitimar
perante seus pares e por cima de seus congêneres menos afortunados. Alguns (os menos)

o fazem com o autentico intuito de enriquecer sua existência, mas a maioria dos que

começam a comprar, nada seguros do lugar que ocupam nas novas hierarquias sociais,

se limita a emular os ritos cortesãos das aristocracias que se desmoronam. (Se tudo isto

nos resulta familiar nos dias de hoje, não será por mera coincidência…)

Com o objetivo de elevar o status social, os novos compradores de objetos de arte se

apropriam, antes de qualquer coisa, dos aspectos cerimoniais da alta cultura, que tão

bem serviram a velha ordem para manter seus privilégios.

O poder se impõe mais quando mais se cerca de pompa e circunstancia e o luxo de todo

cortesão consiste em aproveitar o ócio para inventar coreografias sociais, eventos que

também podem ser considerados rituais de afirmação. As artes não ficam excluídas deste

processo.

A incipiente democracia na Europa exige novas ordens hierárquicas na sociedade. Quando

os homens ambiciosos percebem que já não é necessária uma unção divina para aceder ao

poder absoluto, mas que é possível fazê-lo pelas vias econômicas, palmo a palmo, tostão

por tostão, muda a natureza das subordinações: o europeu aprende a inserta-las nos

novos discursos do momento.

Os novos capitais gerados em base a mais-valia não podem porém funcionar como os

antigos, que se alimentavam dos saqueios vis e do tributo direto. Pela sua própria

mentalidade, o mercador e o monarca gastam de formas diferentes. Por este motivo se

estabelecem novas relações sociais, onde o dinheiro muda de mão de maneiras novas.

Como conseqüência disto, na produção e em especial, em seus conteúdos, as artes

delataram de forma direta os efeitos de todas estas transformações. Aos grandes temas

do passado se somam um sem-número de novidades. Na pintura dos Países Baixos, por

exemplo, surge um costumbrismo que retrata as feições simples de simples mercadores e

anônimos camponeses, ou a caipira hospitalidade da taverna , com a qual se celebra a

origem humilde dos novos barões, com a secularização da vida da cúpula social, aparecem
171

a natureza-morta e o fogão. (século XVI); enquanto nos lugares mais cálidos da Europa

o paisagismo, especialmente o urbano, cobra vigência como gênero.

Não devemos esquecer – e isto é muito importante- que naquela época não tinha sido

inventada a câmara fotográfica, razão pela qual os artistas eram os únicos capazes de

criar imagens.

A democratização dos temas, observa John Berger em “Modos de ver” é o fiel reflexo da

origem modesta dos novos patrocinadores das artes, que daqui para frente se verão

permeadas por este pragmatismo.

Ao mesmo tempo em que a arquitetura se transforma para servir ao novo homo urbis, se

“democratizam” também as artes e se modificam de forma substancial os rituais que a

cercam. Se antes o artista residente produzia em troca de um teto, sustento e proteção,

agora será obrigado a negociar pela sua existência de forma diferente, e de vender seu

trabalho, obra por obra. Se antes sua produção se albergou em templos, castelos e

palácios (lugares que tinham sido de caráter público, ou ao menos semipúblico), agora,

necessariamente, terá que inventar novos espaços onde colocar sua produção, já que os

das residências e palacetes burgueses le resultam por demais íntimos. Surge então o

conceito de museu, que levará um bom tempo em adquirir as características que possui

hoje em dia.

Relações simbiôticas
Mesmo que existiram clérigos, monarcas e mercadores que são lembrados pela sua

sensibilidade e cultura, o poder e a prosperidade econômica nunca foram, infelizmente,

sinônimo de intelectos refinados. Os novos barões do comercio e da indústria sabiam

muito pouco das questões do pensamento e da alma. A aquisição de bens artísticos

dependeu mais de sua astúcia que de seus conhecimentos em matéria de cultura. A pesar

disso, toda classe de objetos de arte finamente elaborados por mestres artesões e

consumados pintores e escultores, começaram a preencher as novas mansões de campo e

os palacetes da cidade da classe media alta emergente; e frente à necessidade de contar


com conselho e assessoria, surge o lógico: aparece em cena, à direita do poderoso

comprador, os obrigatórios cognoscenti , gente que se erige como experta em questões de

arte.

Rapidamente será difícil prescindir destes intermediários e muito pronto também, suas

funções se especializarão; mas mesmo que se bifurquem, nunca deixarão de se

complementar: de um lado, se desenvolverá a crítica da arte, e do outro surgirá o

marchand de arte .

Convém destacar aqui algo pouco estudado: a profissão de crítico surge e é capaz de

crescer como conseqüência direta do desenvolvimento em matéria de impressão e

reprodução dentro da industria editorial, em meados do século XVII. Estes avanços,

somados ao gradual incremento da produção do papel, permitiram que a incipiente

imprensa informativa também se ramificara e se especializara. Nasceram revistas e

folhetins de caráter cultural que procuravam sua freguesia dentro de certos setores da

pequena burguesia, e que publicavam a produção literária de escritores que faziam a

crônica que depois desembocaria na crítica. È este fenômeno, de fato, o que conduz ao

nascimento do que hoje chamamos Historia da Arte. São os textos de crônica e depois os

de opinião, os que constituem os fundamentos desta, até então inédita disciplina.

O que nos interessa aqui é também que em muito pouco tempo, os escritos destes novos

especialistas se convertem no apoio imprescindível que fortalece aos corretores de um

mercado que, em menos de cem anos, adquirirá proporções descomunais. São estes

últimos, os corretores, os que preencherão os vazios deixados pelo desaparecimento dos

mecenatos monárquicos. O que daqui pra frente levara o pão nosso de cada dia à boca dos

artistas e estimulara o desenvolvimento da arte, é a incansável, mas nunca

desinteressada tarefa do marchand (dealer). Em sua função de intermediário, este aprende

a cobrar os serviços prestados: ao cliente ele cobra o conselho, e ao artista, a comissão

sobre o que foi vendido.

Não demora o marchand em descobrir que para que a arte lhe proporcione maiores

rendimentos, ela tem que ser vista, não como parte de um processo lógico dentro da
173

estrutura social, ou seja, como um diálogo vivo, porém como algo fora do comum e

principalmente alheio aos simples mortais. Teve que se criar uma demanda especial, pelo

que se envolveu ao artista numa áurea de mistério, cheio de anedotas e mitos para

encarecer a obra de arte e de alguma forma, compensar a ignorância do mercado. A

maioria das lendas negras que até os dias de hoje cercam aos “poetas malditos” e aos

“pintores boêmios”, principalmente aquelas que tipificam o artista como um ser

introvertido e anti-social, como um psicopata genial, se gestaram a princípios do século

XIX. Hoje em dia chamamos este processo de mercadologia (ou marketing).

No seu inicio, a natureza desta nova instituição mercantil chamada galeria foi de ordem

eminentemente parasitária : os mercadores começaram lidando com antiguidades, quer

dizer, objetos produzidos por artesões e artistas já falecidos, açambarcando em algumas

ocasiões, para depois vende-los, não necessariamente como obras de arte (o objet d’art

antes da obra, a oeuvre d’art). Fieis ás leis da oferta e da demanda, os marchands

legitimavam o preço dos objetos com base ao pedigree dos mesmos, quer dizer, em função

da estirpe e importância social de seus anteriores donos.

No que diz respeito á obra de artistas vivos, esta começou a entrar no mercado com o aval

dos expertos, ao receber certificação de qualidade nos vernissages anuais das também

novas academias. Logo mais, este trânsito da academia a tertúlia social beneficia aos

corretores de tal forma que eles decidem abrir seus próprios centros de reunião, lugares

que eles chamaram “galerias”, espaços onde se desenvolverá um novo universo social e

econômico.

No final do século XIX, diz Aaron Sharf , o costume de visitar galerias rendia tanto que

só em Paris, a compra e venda de obras superavam os 2.500 objetos por ano.

O mercado de arte continua crescendo, sempre atento as mesmas normas operacionais e

principalmente, as mesmas regras básicas da oferta e da procura que animam os

mercados de qualquer produto. Porém, o fato de que no mercado de arte a procura se

apóia – ou é criada- em base às necessidades espirituais , transforma à questão da

procura num assunto muito delicado de determinar. A incógnita é: Quem procura e por
quê?

Será essencial, então que a gente entenda as relações simbióticas que se estabelecem entre

o marchand e o outro grande intermediário, o crítico, já que é nesta relação que se

encontra a clave de como se cria e se cultiva esta procura.

A medida em que a produção de arte responde ao crescimento do mercado e os novos

conteúdos da obra de arte se ajustam aos gostos e expectativas dos compradores, cresce o

papel do crítico que assume, cada vez mais, a tarefa exclusiva de interpretar, e

principalmente de avalizar o objeto artístico. Por sua parte o marchand ficará imbuído de

valora-lo e distribui-lo.

As mudanças também ocorrerão em maior velocidade ao se afirmar o hábito de consumo:

aumenta o número de compradores e cresce o número de artistas fornecedores. Da mesma

forma, o mercado refina suas regras do jogo. Duas destas serão mantidas como

condição sine qua non até os dias de hoje, a da assinatura de certificação do


artista sobre o objeto criado, e a da durabilidade dos materiais usados
para fabricar uma obra: quanto maior o investimento, mais tempo devera perdurar a

singular aquisição única. Como dote, fiança ou herança, sempre será um capital ativo.

-II-

Como meu objetivo é oferecer aos galeristas que estudem este livro uma análise

aproximado do sistema galerístico que determina o consumo atual da arte, será

necessário também classificar o publico e dividi-lo entre os que têm possibilidades de

compra e os que não a possuem. Howard Becker os define, grosso modo, como público ativo

e publico passivo, entendendo aos primeiros os que compram objetos de arte visitando

galerias, e os segundos como os que contemplam a arte visitando museus. Este último

representa a grande maioria da população, enquanto o primeiro grupo representa o

sector com capacidade aquisitiva, que é uma ínfima minoria.

Nestor Garcia Canclini começou uma tarefa- visivelmente interminável- de analisar as


175

relações que existem entre o público mexicano e nossos museus: o que é um museu, como

surge, como é que se sustenta, quem determina suas políticas y ao serviço de quem ele

está. Eu insisto: falta agora quem se dedique a estudar profundamente o galerismo.

A pesar da galeria como instituição que condiciona a estética de ocidente ter nascido na

Europa e ter criado suas raízes em Paris, não foi ali onde adquire seu atual poderio,

porém nos Estados Unidos, a partir do fim da segunda guerra mundial, após uma serie

de brilhantes golpes de mercado dado pelos galeristas e críticos de Nova York, em

estreita cumplicidade com o Departamento de Estado Americano.

É o modelo norte-americano o que desde aquela época, tem determinado o perfil do

mercado mundial, o qual consiste numa complexa rede de sistemas e subsistemas ligados

entre si de maneira informal. O que da consistência a esta rede de interdependências é

uma imprensa especializada ubíqua e inalterável: basta consultar os catálogos e revistas

de arte produzidos nos EUA, Alemanha, Japão, Inglaterra, Itália e França para

compreender a natureza desta relação. A flexibilidade do sistema é tal que permite e até

incentiva a existência de subsistemas que servem de plataformas de lançamento, ou como

filtros de obra ou de tendências que de encontrar aceitação, logo serão consumidas nas

metrópoles.

Em sua essência, os mecanismos de compra e venta de arte mudaram muito pouco nestes

dois séculos e meio. Mesmo assim, para que a galeria possa sobreviver em diferentes

latitudes, dentro de sistemas legais e em diferentes momentos, o comercio teve que se

adaptar. Hoje ele oferece toda uma serie de variações dignas de atenção especial.

Nos últimos cinqüenta ou sessenta anos se configuraram diferentes tipos de galeria,

projetos embrionários destinados alguns a desaparecer, outros a continuar a sua

transformação, num processo que tem tudo a ver com o contexto socioeconômico: não é

difícil – si observamos as galerias com atenção- reconhecer as diferenças que existem

entre as que funcionam dentro de uma economia privada, uma mista e uma de estado.

A galeria se estabelece da mesma forma em sociedades muito desenvolvidas como nas

sociedades em total subdesenvolvimento. A galeria privada e/ou corporativa prospera nos


dois casos, já que o perfil de sua freguesia é o mesmo. A única diferença é que o nível

cultural do publico comprador em sociedades desenvolvidas é qualitativamente superior à

dos compradores das sociedades subdesenvolvidas. É em países atrasados e sem

infraestrutura onde surge um perigo real: é comum que o critério da galeria privada se

erija como reitor único da estética do momento, influindo nas estratégias do setor público.

-II I-

Na atualidade, as sociedades na América Latina, em fast-track em direção a sua

modernização, parecem condenadas a seguir o modelo norte-americano de forma

exclusiva. Tudo indica que este processo está afetando, de forma direta e muito profunda,

o desenvolvimento de nossas culturas. As mudanças de fundo que se percebem nos

obrigam a levar a serio, entre outros assuntos, o da galeria: apesar do aumento

gradativo que tem tido nas suas vendas e que representa o ingresso de maiores divisas

para o país, será imperativo vigiar de perto o seu desenvolvimento conceitual,

principalmente agora que assumem -no México- um grupo de funcionários aos quais a

cidadania lhes exigirá uma prestação de contas.

Será necessário, por exemplo, pressionar pra que os governos criem os mecanismos

necessários, de defesa e de ataque, para nos assegurar a saúde de nosso mercado de arte;

o que em resumo significa zelar pela saúde no trato entre artistas, compradores e

intermediários. As ações que deverão realizar os funcionários no poder terão que conter

desde a legislação impositiva (impostos) até o apoio a um desenvolvimento descentralizado

da produção artística. Isto deverá ser assunto de prioridade se queremos evitar ser

arrastados, sem eira nem beira, ao maëlstrom da maquina das artes.

A única esperança que existe de contra arrestar esta tendência fica em mãos do próprio

grêmio e, talvez, de estudiosos independentes. Para isso, comparemos o desenvolvimento

que tiveram as artes plásticas no México e nos estados Unidos. Vejamos primeiro nos

Estados Unidos:
177

Após as primeiras décadas de nosso século, a produção plástica dos EEUU (assim como

a do resto do continente americano0 tinha sido considerada como um provinciano remedo

do que se produzia na Europa). Apenas se s mostravam as obras de artistas norte-

americanos em seus museus, que eram poucos. Desde sua relativa modéstia, os artistas

norte-americanos não tinham presença no mercado internacional; vendiam somente a seus

conterrâneos.

Foi talvez depois da famosa exibição da nova plástica européia no Armory (que incluiu o

polêmico Desnudo descendo as escadas de Duchamp) que os norte-americanos, fortemente

estimulados pela inovadora desobediência, começaram a assumir uma atitude que hoje

poderíamos considerar como nacionalismo estético. A mostra precipitou o surgimento de

uma arte que com o tempo, seria identificada como nitidamente norte-americana.

O vigor da resposta foi ta grande que a crítica teve que tomá-la como referência, e com

isso se marco a pauta: dealers e galeristas se dedicaram a fortalecer o mercado nacional e

a procurar novos clientes na Europa. O mercado europeu, continuamente interrompido

pelos conflitos internos, foi decaindo e em meados deste século, já quase não prevalecia

como fator determinante no discurso estético de Ocidente.

A galeria norte-americana, com todo o apóio de seus críticos e dos meios de comunicação,

começou a pontificar. A galeria européia tinha cimentado o colecionismo nos EUU. A

galeria norte-americana se encarregaria de erigir o resto da construção.

Os museus norte-americanos funcionam de maneira muito diferente aos mexicanos. Nos

EEUU, o museu é, quase sem exceção, um organismo sem fins de lucro que nasce por

iniciativa do setor privado. A pesar de receber verbas públicas, se sustenta graças às

doações de seus patrocinadores, que são ao mesmo tempo seus conselheiros. Poderosos

empresários a maioria, esses conselheiros são donos, quase todos, de importantes coleções

de obras de arte que adquiriram, precisamente em galerias. Oferecendo respeitáveis

descontos, um fisco sagaz estimula (ou estimulou) a doação de coleções aos museus.

Quanto melhor consiga o colecionador avaliar sua coleção, maior será o seu valor de

mercado e maior será a sua isenção fiscal. Por isso que é tão determinante a ingerência
nas políticas dos museus que tem, ou procuram ter, as galerias e seus clientes, os

patrocinadores dos museus.

Outro aspecto determinante tem a ver com os processos de seleção que aplicam os setores

pudentes a seus fornecedores, no caso, os artistas. As galerias norte-americanas, sempre

a procura de nova mercadoria, dependem muito das academias de arte. Na sua maioria

particular, estas escolas capacitam na atualidade uma media de 40.000 formandos

anualmente, que concorrem ferozmente uns com os outros.Todos estes esperançosos e

ambiciosos jovens são ensinados que a única forma de atingir o mercado é através da

galeria . Sabem que esta os conduzirá, com o apoio da crítica e da imprensa especializada,

aos compradores e daí ao museu. O acesso à sociedade, ao grande público passivo é, por

sinal uma conseqüência e não uma meta.

O estadunidense é um sistema fechado que contem o artista, a critica, a imprensa e os

clientes, e no qual o cadeado é a galeria.

Vejamos agora no México:

Até inícios do século XX, nossas artes tiveram mais o menos o mesmo destino que as dos

EEUU, ou as de outros países do continente. A partir da Revolução de 1910, o artista no

México assume – de forma singular- o papel de cidadão ativo, cidadão primeiro e artista

depois. Suas idéias se tecem na trama de nossa historia de maneira significativa.

Graças a Vasconcellos, nosso projeto nacional educativo integra a cultura a educação. Em

resposta aos pedidos de nossos artistas e pensadores, se dispõe que o estado zele pelos

seus criadores e difunda sua obra em beneficio da sociedade. Para atender as entidades

da federação, se procede com o tempo a estabelecer casas da cultura, com base num modelo

francês e na atualidade, se estimula – seguindo o modelo imposto pelo Banco

Interamericano de Desenvolvimento (BID) e com acertos cada vez menores- a

descentralização por meio de institutos estaduais que se mantém submetidos ao controle

central.

Mesmo que a cúpula no poder tenha sempre defendido de forma descarada o setor mais

privilegiado por cima das classes populares, e mesmo que na prática deixe muito, demais,
179

a desejar no que respeita as obrigações do estado, também é verdade que como

conseqüência do impulso vasconcelista, o país foi capaz de elaborar programas culturais

de enorme alcance, em ocasiões exemplares.

De fato, o projeto original para a participação do estado na cultura conserva sua

vigência e pelo menos até meados do sexênio de De La M adrid, este projeto podia se

resumir assim: é motivo do estado: a) sensibilizar a cidadania de maneira global, b)

formar mais e melhores quadros profissionais através de uma educação sistematizada,

c) reconhecer a pluralidade das artes e a heterogeneidade dos produtores e finalmente, d)

circular à produção artística.

Com a fundação do Instituto Nacional de Belas Artes nos anos 50s, sob a regência de

Carlos Chavez, se abriu o caminho para estabelecer os primeiros museus contemporâneos

de arte e posteriormente, as primeiras galerias oficiais. Os acervos dos museus foram

construindo-se de maneira um tanto casual: por meio de doações e legados, uma ou outra

aquisição e até impostações fiscais como o programa “Pago em espécie”, do qual sua

muito duvidosa legalidade anula a sua generosidade. O inventario nacional ficou

enriquecido recentemente, de um jeito bastante habilidoso, graças aos prêmios de

aquisição com que as instituições se fazem possuidoras de obras contemporâneas.

Depositários do melhor de nossa essência, os museus do México hoje em dia resguardam

a produção de nossos maiores artistas do passado e do presente. Eles têm obras

acreditadas não tanto pelas suas cotações no mercado como pela sua pertinência

histórica.

E bom ressaltar que praticamente até a formação do Conselho Nacional para a Cultura e

as Artes, durante o governo de Salinas, nem o setor privado, nem as galerias tinham sido

fatores de importância nas políticas institucionais. Pelo contrario, os critérios que até

então tinham regido os nossos museus tinham sido os de uma elite intelectual e

privilegiada pela sua educação universitária. Especialmente (e isto eu quero sublinhar),

foram muito influentes as opiniões dos próprios artistas.

Tanto por desígnio como por acidente, quer dizer, tanto pela vontade da administração
salinista que deu a luz a CNCA como pelas condições que nos arrastar am à assinatura

do tratado de Livre Comercio e depois com a perda de bússola do Zedillismo, este grande

projeto mexicano, único no mundo, parece ter chegado ao fim. Prova disto é o que acontece

na Universidade Nacional Autônoma de México, que destina um miserável 5% do seu

orçamento à cultura. Isto é sem dúvida preocupante.

-IV-
Até pouco tempo atrás, os compradores e colecionadores mexicanos de importância se

podiam contar com os dedos. Alguns surgem do setor de classe media alta, classe

descastada e pouco disposta a se cultivar. Quase todos provem de um setor crioulo

desvinculado por decisão própria da maioria mestiça e os naturais; consideram a Europa

e EEUU como modelo de comportamento e se envergonham da morenidade mexicana.

Dificilmente poderíamos considerar suas preferências estéticas como representativas da

grande comunidade. As galerias surgem de e servem precisamente a este setor social.

Das numerosas galerias particulares que tem nascido e perecido desde a década dos

trinta, lograram se destacar escassamente três ou quatro como autenticamente

propositivas. Desde então, quase todas – salvo as honrosas exceções de rigor- podem ser

classificadas como parasitarias, quer dizer, nunca desenvolveram uma prática o uma

ética que lhe permita ao artista viver nem sequer com alguma dignidade, nunca criaram

uma autentica consciência de colecionismo, nem sequer tem sabido estimular a imprensa

especializada para proveito próprio.

A expansão da instituição galeristica privada mexicana, do jeito que a gente conhece hoje

em dia, começa com o efêmero auge petroleiro na época lopezportillista, e se fortalece

quando se afirmam no poder os tecnocratas que assumiram depois. Alentadas pelo boom

de arte latino-americana nos EEUU, o volumem das vendas das galerias cresceu de

maneira acelerada, obedecendo à norma de que “o que faz a mão gringa faz também a

mexicana”.

Poucas coisas mudaram desde o tempo - não faz tanto tempo- em que os dealers se
181

aproveitavam do êxito que os artistas se forjavam sozinhos, freqüentemente amparados

por uma instituição pública. As galerias continuam atentas à programação dos

principais museus para apresentar mostras coincidentes e aproveitam a publicidade que

este pagam com o orçamento público.

O funcionamento destas empresas se da por acaso: operam num clima no qual a traição e

as partes envolvidas concorrem ferozmente entre si: artistas contra artistas e contra

galeristas, galeristas contra corretores sem carteira; artistas e galeristas contra um

fisco cuja ignorância é maior, se isto é possível, que a dos comerciantes de arte.

E comum que a galeria abra e feche acordos com artistas e terceiros sem prestar contas

para ninguém, organize exposições sem que exista um contrato, maltrate a obra sem se

responsabilizar pela mesma, manipule seus ingressos, cometa evasão fiscal, explore a

ignorância administrativa dos artistas e que como se isto não bastasse, seja totalmente

insensível ás expectativas de seus clientes. Os proprietários destes comércios possuem em

geral uma impunidade que geraria inveja em qualquer empresa de outros rubros

comerciais.

Apesar do aumento dos acordos com o estrangeiro nos últimos anos, nada indica que

nossos mexicaníssimos dealers tenham amadurecido e se tornado mais responsáveis ou

procurem sequer profissionalizar a sua prática. A maioria continua prosperando como

lojas mais do que como agentes representantes. Privilegiam o objeto e desdenham a obra.

As conseqüências destas práticas conduzem a uma anarquia que prejudica a sociedade

em sua totalidade. Mesmo que os artífices da modernidade tentem nega-lo, os ventos de

mudança que trouxe o TLC afetaram a distribuição do produto artístico e também sua

produção, e o que é pior, seus conteúdos: basta ler a Ley Federal de Direito de Autor que

entrou em vigor em 1997 para comprova-lo. Trata- se de uma disposição que protege aos

usuários e prejudica os autores, especialmente aos artistas plásticos. Os jovens deuses de

nossas economias e os presidentes neoliberais fazem questão de ressaltar a insensatez que

diz: “nossa cultura não se verá afetada, mesmo que cada vez se homogeneíza mais com a

do mundo inteiro”.
Por tanto, os donos e donas de galerias, impunes em sua prosperidade e atentos ao

modelo norte-americano, marcam pautas sui generis que incluem o lavado de dinheiro.

M as existem aqueles que como eu lutamos por que as galerias se rejam por códigos éticos

claramente delineados e que levem sua administração em ordem; existem inclusive alguns

que sugerem que “alguém” controle a tabulação de preços. O que se procura estabelecer é

um modelo próprio, que responda por igual à nova economia e às características de nossa

personalidade social. Este será o desafio, não daqueles que só procuram o lucro, mas

daqueles que se preocupam pelo desenvolvimento cultural do futuro.

-V-

Galerias Públicas e Galerias Privadas

Setor Público
A Galeria estudantil, de escola ou academia de arte
Como espaço de existência garantida, a finalidade principal da galeria estudantil é

apoiar a docência. Exemplos destas são: as galerias da Escuela Nacional de Artes

Plásticas (ENAP/UNA M ), a de La Esmeralda (INBA), as da Escuela de Artes

Plásticas de la Universidad Veracruzana, assim como as de alguns institutos estaduais

de cultura e algumas casa de cultura dispersas pelo território nacional, onde se dedicam

ao ensino das artes plásticas. Seu público é passivo e reduzido, mas informado.

Desenhada para “foguear” ao profissional emergente, em ocasiões estimula a

experimentação de alunos inquietos e às vezes favorece a museografia . A difusão de suas

atividades é praticamente nula. Mesmo alheia ao mercado, ocasionalmente é visitada por

galeristas à procura de novos talentos, de forma que, às vezes, pode ser uma instancia

fornecedora, com tudo o que este termo implica. Incide raramente na historia da arte.

A Galeria Oficial
Geralmente, este espaço é uma extensão de um organismo público, de um centro de
183

investigação especializado o de alguma universidade pública. Exemplos são: As galerias

dos centros culturais dependentes do Instituto Mexicano de Seguro Social o do ISSSTE

(tanto no D.F. como nos estados), as galerias da Secretaria da Fazenda, a Galeria

Universitária Aristos, Casa Del Lago y Casa Del Libro (estas últimas três dependências

da UNA M ), todas no D.F.

Seu público é passivo. Este espaço é potencialmente próspero, afirma seu prestigio quase

que exclusivamente no do organismo matriz, dependendo inclusive de suas políticas para

programar suas atividades. Salvo raras exceções, é geralmente dirigido por pessoas não

especializadas em questões de arte, razão pela qual suas exposições são pouco

imaginativas e estão sempre atrás dos acontecimentos. Diferente da galeria temporária

de um museu, este espaço é mais ágil operativamente falando, já que não tem um acervo

que cuidar nem promove a investigação. Em algumas ocasiões afortunadas estimula e às

vezes até financia a experimentação artística. Em épocas recentes, muitos destes espaços

tem servido como trampolim para uma atividade recente, a do curador independente.

Mesmo impedida de vender pela rigidez de suas burocracias, pode servir de ligação entre

o comprador e o artista. Este espaço incide na historia da arte de maneira esporádica e

casual.

Os Salões Anuais
Criados pelo INBA na década de setenta, os Salões Anuais operam como galerias

periódicas, itinerantes e efêmeras. Teoricamente foram concebidos para estimular a

gerações de artistas emergentes, e sua função é a de: a) convocar e reunir b) selecionar c)

premiar, através dos júris. Na pratica, porém, ela tem se convertido em aval por

excelência, em beneficio dos marchands: depois que o INBA/CNCA ou os institutos

regionais destinam o orçamento público requerido para reunir os artistas jovens que

serão premiados, entra a galeria para colher os dividendos. Sua preeminência nos

projetos oficiais conduziu a um abuso no uso do termo “jovens talentos”, conceito que

deriva diretamente de um marketing agressivo que começaram a exercer as galerias


privadas durante o sexênio delamadridista As pessoas que visitam estes espaços são um

tipo de público passivo. Pela infraestrutura que os apóia incidem significativamente na

historia da arte.

A galeria gremial não lucrativa


Estas galerias são escassas e sua sobrevivência é sempre ditada pelo acaso. Exemplos

são: O Salón de la Plástica Mexicana e a já desaparecida Galeria Venta Direta (as duas

subsidiadas pelo INBA). Sua finalidade principal pretende “sensibilizar o mercado”.

Sujeita aos gostos da direção de turno ou de uma direção fantasma, este tipo de galeria

recebe em ocasiões obras emergentes ou inovadoras, mas nunca proporciona fundos para

apoiar estas obras. Sua promoção depende dos departamentos de comunicação social das

instituições as quais ela pertence, pelo qual são pouco conhecidas as suas atividades.

Privilegia um público passivo e incide de maneira pouco significativa na historia da arte.

A galeria do museu
Como galeria temporária, o museu se situa a principio no topo das galerias

institucionais.

Com capacidade de planejamento de longo prazo, geralmente expõe artistas com uma

trajetória reconhecida, legitimando eles de forma definitiva. Atende a um publico passivo,

mas como ratifica reputações, influi de forma decisiva no público ativo.

Uma coisa alarmante nos últimos anos, é que a galeria temporária do museu responde

cada vez mais as condições próprias das galerias privadas, e funciona em relação cada

vez mais estreita com o mercado. Conseqüentemente, converteu em costume um sistema de

clientela: favorece as exigências da iniciativa privada ao invés de definir projetos próprios

e de obras menos comercializáveis, mas de maior relevância para a cultura do país.

Praticamente nenhum museu do México possui um orçamento para a aquisição de obras.

No entanto, nos últimos quinze anos, sugiram as associações “amigas” de museus,

constituídas por industriais, funcionários, banqueiros – alguns deles colecionadores – e


185

algum ou outro artista. Isto conduz a um perigo real: que os amigos “cobrem” seu apoio

impondo os gostos particulares.

De caráter protagônico, a galeria de museu tem assegurado a sua sobrevivência e suas

atividades se situam no centro do discurso da historia da arte.

Setor privado
A Galeria “independente” de artistas
Animados por artistas de espíritos independentes ou marginados pelo gosto que impera,

estes espaços surgem como cogumelos após a chuva, aparentemente do nada. No seu afã

de atrair o público ativo procuram chegar perto dos setores, quando não abastados, pelo

menos prósperos. É usual que desapareçam após uma curta existência, devido as suas

próprias contradições e a incapacidade administrativa de seus animadores. Exemplos são

-ou foram- o Centro Proceso Pentágono, el Salón Aztecs, La Quiñonera, La Panaderia,

Zona, etcétera.

Estes espaços aparecem em qualquer cidade grande apesar de ter uma vida breve já que

nunca condicionam à produção de seus afiliados. Se por acaso alguma se mantém

funcionando durante um tempo maior do que dois anos, geralmente é porque aprendeu a

conhecer a dinâmica do mercado. Geralmente são dirigidas por artistas que sacrificam

um valioso tempo de sua própria produção. Este tipo de espaço galerístico geralmente

estimula a inovação , pelo que apesar de sua curta vida, logra incidir na historia da arte.

O jardim dominical ou de arte


Animado por artistas associados ou cooperados, este espaço copia os mecanismos da

galeria já que se dirige a um publico ativo porém desinformado, daí que seu caráter seja

eminentemente turístico. No entanto, não pode ser desqualificado já que consegue

sensibilizar, mesmo tangencialmente, ao público leigo. O jardim de arte propicia uma

produção decorativa, derivativa e repetitiva. É especialmente útil a centenas de artistas

que de outra forma não poderiam nem mostrar nem vender a sua obra em lugares mais
exigentes. Não incide na história da arte.

A Galeria comercial
Existem inúmeras empresas que abusam do nome “Galeria”. São geralmente comércios

que ao mesmo tempo vendem móveis, livros ou antiguidades, emolduram quadros ou

vendem ferramentas e material artístico. Costumam investir para acumular, pelo que as

suas margens de lucro são bastante altas.

Seu púbico é invariavelmente ativo, mesmo que desinformado. Algumas destas empresas

alugam seus espaços a marchands independentes ou a artistas para exibir. Sua natureza é

sempre parasitária. Lidam com obras “atemporais” ou de gênero: Naturezas mortas e

fogões, marinas, paisagens e obra costumbrista ou manierista. Também vendem obras

decorativas de aceitável execução que imita a moda na arte. A história da arte as ignora

de forma enfática.

A Galeria Diletante
Com o olhar atento num público ativo próspero e geralmente desinformado, a galeria

diletante costuma se lançar ao rodeio com pompa e circunstancia a procura da iniciativa

de gente com possibilidades; jovens arquitetos, gente “bem de vida”, “amantes da arte” ou

prósperos designers gráficos. Lamentavelmente, sua falta de profissionalismo se traduz,

voluntária ou involuntariamente, em danos e perdas de obras e em enganos a clientes e

artistas. O dono deste tipo de espaços parece com o tipo “coiote de condomínio”, (vendedor

sem carteira nem registro), já que investe pouco ou quase nada em promover os artistas

de sua galeria, evade o máximo possível o fisco (aqui é onde com maior freqüência se faz o

lavado de dinheiro sujo) e com freqüência, desfalca o artista incauto. São poucas dentre

estas negociações as que sobrevivem por mais de dois anos e suas idas e vindas

desprestigiam um setor já por si só frágil. No entanto existiram empresários capazes de

amadurecer e até atingir um nível de profissionalismo respeitável. Operação de natureza

parasitária já que lida com obra (mercadoria) já previamente prestigiosa, este tipo de
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galeria funciona principalmente como centro de reunião social, pelo que em ocasiões

consegue incidir na história da arte.

A Galeria corporativa
Mesmo que contados nos dedos, estes espaços são os que mais se identificam com o

modelo desenvolvido pelos EEUU: operam sob os mesmos princípios e com a mesma

dinâmica e eficiência que qualquer outra empresa dedicada à venda de bens.

Seu funcionamento exige fortes investimentos imobiliários e um constante aporte, tanto

para as despesas fixas como para o “oculto”: administração, publicidade, e despesas de

representação (aluguel de espaços em feiras, etc). conseqüentemente, são capazes de

satisfazer compromissos de grande envergadura que vão desde a criação de novas

coleções (atividade que adquire cada vez más importância) e a depuração de coleções

antigas, até o estabelecimento de nexos com galerias, museus, geralmente no exterior.

A galeria corporativa começa a protagonizar, de forma significativa, o mercado

conhecido como “secundário”, aquele da revenda. Apesar de revender obra de todos os

tipos (seja como comissionista ou como intermediária), a tendência e se especializar em

obra contemporânea, organizando esta por rubros: maestros da abstração, obra objeto,

novas tendências, arte naïf, etcetera. Na prática aprendeu a assumir a representação

exclusiva de artistas que possam interessar a um círculo de clientes, em algumas ocasiões

retendo eles através de salários fixos.

Para criar uma reputação e valorizar o produto artístico, a galeria corporativa estabelece

parcerias rentáveis com a crítica e a imprensa, e se enlaça diretamente com as agendas

das exposições dos museus, dos concursos internacionais e recentemente com as das

feiras anuais e internacionais de arte. Incide de maneira muito significativa na historia

da arte.

O atelier do artista
Nos últimos anos, um crescente número de conhecedores com capacidade aquisitiva
(público ativo) estão começando a desfrutar das visitas ao estúdio do artista, o espaço

dedicado à produção que cada vez mais artistas estão habilitando para expor sua obra de

forma decorosa: móveis confortáveis, luzes direcionais, horários de visita e até

maquininhas para pagamento com cartão de crédito. Lugar que emociona ao comprador

pela oportunidade que oferece de conviver com o artista, este espaço só incide de forma

indireta na historia da arte.

Além das galerias


Mesmo que a visão panorâmica oferecida acima se centraliza em espaços habilitados

para a exibição e venda, cabe mencionar outras instancias que tem surgido recentemente, e

as quais começam a afetar as formas tradicionais de venda dos objetos artísticos.

Em primeiro lugar estão os leilões e as casas de leilão, fenômenos relativamente recentes

em nosso meio. Inicialmente, estes eventos –sempre muito emocionantes- vieram refrescar

um mercado cauto e aletargado. Organizadas com caráter de urgência, geralmente a

beneficio de alguma causa de alta investidura (ajuda aos danificados, apoio a projetos de

beneficência, partidos ou movimentos sociais), os leilões juntavam obras de tipo e origem

diverso e convocavam um grande público, com perfil tão heterogêneo como desigual a sua

capacidade aquisitiva. Tão eficazes foram os primeiros leilões, que se acreditou que

poderiam se converter num mecanismo tabulador de preços. Prontamente, porém, caiu o

entusiasmo que geravam.

São muitas e muito complexas as razões que começaram a desprestigiar os leilões.

Algumas razões que podemos citar são: a desorganização administrativa dos promotores,

quase sempre neófitos em matéria de arte; o reduzido tamanho do mercado de arte no

México, que lhe impede de absorver o caudal de obra em oferta e a própria ignorância dos

compradores que permite que os preços se elevem fora de proporção. A isso se somam

fatores de tipo social: o leilão se converteu num ritual prazeroso para um setor

privilegiado da sociedade que procura adquirir status ostentando sua capacidade para

adquirir (consumo conspícuo). O caso é que hoje, o público de leilões prefere a certeza, à
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margem da qualidade do produto artístico, procura assinaturas conhecidas.

Atualmente os leilões diminuíram e se dividiram. O público conhecedor aprendeu a assistir

a dois tipos de venda: o leilão organizado pelas contadas empresas de leilão estabelecidas

(algumas de duvidosa reputação); ou as que são avalizadas pela presença de certos

leiloeiros de prestigio, que também são poucos.

Em segundo lugar estão os “coiotes de condomínio”, ou vendedores ambulantes, que pela

sua falta de escrúpulos podem ser extremamente nocivos, nem só para o mercado de arte

como para a cultura em geral, já que conseguem distorcer uma realidade já por si só mal

interpretada, à do profissionalismo do artista plástico.

Por contraste e em terceiro lugar, começam a surgir “corretores de arte independentes”,

também conhecidos como promotors, entre os que podem ser incluídos certos curadores

dignos de todo respeito, apesar de que em principio se trate de uma prática não ética. São

pessoas que prestaram serviços em instituições diversas, publicas ou privadas, das quais

saíram por algum motivo (diferenças com os titulares ou suas políticas, salários

raquíticos, etc.). Como operadores independentes que oferecem serviços promocionais ou

curatoriais , costumam organizar exposições muito mais imaginativas e de maior

significação que normalmente. Como conseqüência lógica dos honorários baixos que

recebem pelos seus serviços, muitos independentes começam a funcionar como

intermediários entre artistas e compradores. Sua comissão se fixa à discrição, mas

depende, em grande medida, da confiança da qual são merecedores no meio, assim como

pela sua eficácia nas vendas.

Faltaria por mencionar de passagem a um número muito reduzido de “representantes

pessoais” de artistas, gente esta que assume a tarefa de representar por sua conta e de

forma exclusiva a um pintor, uma escultora ou algum artista gravurista.

Num passado recente, estes representantes não eram senão a esposa ou marido do/da

artista, que demonstravam uma sensata divisão do trabalho: um produz para que o outro

distribua. Logicamente os lucros são compartidos em partes iguais.

Na medida em que um representante atende a um individuo, quanto muito a três, se situa


como a pessoa mais confiável, tanto para seu representado como para os seus clientes. É

provável que logo vejamos crescer o número de gente que se dedique a esta tarefa.

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