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Escola Politécnica da Universidade de São Paulo

Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental – PHA

PHA2537 – Água em Ambientes Urbanos

Seminários
Cidades Resilientes a inundações

Luis Augusto Bertoni Strengari - 7211589


Luis Gustavo Kacuta - 7211717
Natalia Torres Dalessandro - 7212295
Rodrigo Hagen Bianchi - 7211929
Vitor Margato - 7211763

Prof. Dr. José Rodolfo Scarati Martins

2015
Sumário
1. Introdução..................................................................................................................... 1
2. Cidades Resilientes ...................................................................................................... 2
2.1 Definição e abrangência ......................................................................................... 2
2.2 Contexto internacional e importância...................................................................... 2
2.3 Panorama brasileiro e ações estruturais ................................................................ 3
2.4 Fundamentos para construção de cidades resilientes ............................................ 4
3. Águas em cidades resilientes ....................................................................................... 5
3.1 Panorama atual ...................................................................................................... 5
3.2 Casos de sucesso: água e a infraestrutura urbana ................................................ 6
4. Medidas estruturais ...................................................................................................... 9
4.1 Definição ................................................................................................................. 9
4.2 Medidas Estruturais Tradicionais ............................................................................ 9
4.3 Sistema de Drenagem Urbana Sustentável .......................................................... 10
5. Medidas não-estruturais ............................................................................................. 11
5.1 Definição ............................................................................................................... 11
5.2 Mapeamento das áreas sujeitas às inundações ................................................... 12
5.3 Elaboração de um plano diretor de uso do solo ................................................... 12
5.4 Fiscalização da ocupação do solo ........................................................................ 13
5.5 Seguros e taxas .................................................................................................... 14
5.6 Sistemas de alerta e defesa civil .......................................................................... 15
5.7 Programas de reassentamento............................................................................. 15
6. Conclusão................................................................................................................... 15
7. Bibliografia .................................................................................................................. 16
Cidades resilientes à inundações

1. Introdução
Formadas por redes interconectadas de infraestruturas, instituições e informações, além de apresentarem
uma alta concentração de valor, as cidades são constantemente expostas a fatores externos de estresse que
podem resultar em colapsos físicos e sociais, com perdas econômicas significativas. Tais elementos, aliados
com um rápido crescimento populacional, grandes transformações ambientais e um ascendente
agrupamento da população em centros urbanos, provoca um aumento da complexidade e da incerteza nas
cidades, o que influencia na escala de risco no qual estão sujeitas.

O risco é uma função do tipo e magnitude da ameaça (um ciclone, um terremoto ou a cheia de um rio, por
exemplo), da exposição de pessoas e bens a essa ameaça e das condições de vulnerabilidades dos mesmos.
Dependendo dos processos de desenvolvimento social e ambiental de uma região, esses fatores podem ser
afetados e agravados. Assim, o crescimento da população urbana implica no aumento da exposição às
ameaças e a ausência de serviços básicos em certas regiões de ocupação desordenada, na ampliação da
vulnerabilidade por exemplo. Por isso, a maior parte da população em situação de pobreza urbana está mais
exposta a ameaças e desastres.

Nesse contexto, surge a definição de cidades resilientes. Resiliência é a capacidade de um sistema,


comunidade ou sociedade de manter ou recuperar suas funcionalidades em eventos de ruptura e
perturbação. Portanto, uma cidade é resiliente quando possui a propriedade de garantir o seu
funcionamento para que as pessoas que vivem e trabalham em seu território, principalmente os mais
vulneráveis, sobrevivam e prosperem independentemente da ocorrência de eventos extremos.

Problemas e limitações no manejo de águas urbanas estão entre as principais causas de mortes e perdas
econômicas nas cidades. Fatores como a ausência de sistemas adequados de drenagem e mudanças no uso
e ocupação do solo, que permitiram invasões às margens de corpos hídricos e excessiva impermeabilização,
expuseram muitas áreas urbanas às inundações. Falhas nas infraestruturas de abastecimento, coleta e
tratamento de esgotos também contribuem para o aumento da vulnerabilidade a eventos extremos. Os
gráficos a seguir apresentam os principais desastres que causam perdas humanas e econômicas no Brasil,
sendo as enchentes a principal causa de mortes e a seca, de perdas econômicas.

Figura 1 Mortalidade e perdas econômicas devido aos fenômenos naturais no Brasil. Fonte: CRED EM-DAT (Feb. 2015). The
OFDA/CRED – InternationalDisasterDatabase

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Cidades resilientes a inundações

Para combater tal cenário, novas tecnologias e sistemas estão sendo desenvolvidos e implementados.
Medidas estruturais, como a construção de sistemas de drenagens eficientes e de infraestruturas de retenção
e detenção, são soluções que impactam significativamente na vulnerabilidade, reduzindo o risco. Mas apenas
tecnologias não são suficientes para tornar cidades resilientes. É necessário mudar convenções sociais,
políticas e econômicas, envolvendo medidas não estruturais, como alterações no planejamento do uso do
solo e o estabelecimento de uma rede de comunicações efetiva e colaborativa. Portanto, somente a
formação de uma estrutura holística e integrada, que considere não só os aspectos físicos das cidades, mas
também questões intangíveis ligadas ao comportamento humano, seria capaz de tornar uma cidade
preparada e segura, independente da complexidade, incerteza e mutabilidade dos riscos futuros.

2. Cidades Resilientes

2.1 Definição e abrangência

A Estratégia Internacional das Nações Unidas para a Redução de Desastres (UN/ISDR, 2004) define resiliência
como “a capacidade de um sistema, comunidade ou sociedade, exposto a riscos potenciais, de se adaptar,
resistindo ou transformando-se, a fim de atingir e manter um nível aceitável de funcionamento e segurança
estrutural. Isso é determinado pelo grau em que o sistema social é capaz de se organizar e por sua capacidade
de aprender com os desastres passados para uma melhor proteção futuro e para melhorar as medidas de
redução de riscos.” Nesse contexto, define-se desastre como “eventos causados por riscos de origem natural,
ambiental e tecnológica”. Impõe-se uma abordagem holística e multidisciplinar para a gestão do risco de
desastres e suas implicações sobre os sistemas sociais, econômicos, culturais e ambientais.

2.2 Contexto internacional e importância

No panorama internacional, é crescente a preocupação com o planejamento, previsão de eventos físicos,


organização preventiva e corretiva, alocação de recursos financeiros e humanos e aprendizado com
experiências passadas. Cidades e zona urbanizadas representam um sistema denso e complexo de serviços
interconectados, que devem seguir diretrizes específicas para aumentar sua eficiência frente a potenciais
riscos.

No âmbito dos organismos de representação internacionais, o mandato do Escritório das Nações Unidas para
a Redução do Risco de Desastres (UNISDR) foi definido por resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas,
com o intuito de “servir como o ponto focal do Sistema das Nações Unidas para coordenar atividades de
redução do risco de desastres e para assegurar sinergias entre as atividades de redução do risco de desastres
de organizações do Sistema das Nações Unidas e organizações regionais nos campos socioeconômico e
humanitário” (United Nations General Assembly, 2002).

Como motivações e justificativas para o foco em cidades resilientes, o Marco de Ação de Hyogo (UNSDR,

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Cidades resilientes a inundações

2007), produto da conferência internacional sobre o tema no Japão, provê algumas características
condicionantes da estima ao tema:

 O crescimento das populações urbanas e o aumento de sua densidade, ampliando as ocupações de


planícies costeiras, ao longo de encostas instáveis e de áreas de risco;
 A concentração de recursos e capacidade em âmbito nacional, com ausência de fiscalização, recursos
humanos e capacidades no governo local;
 A governança local fragilizada e a participação insuficiente dos públicos de interesse locais no
planejamento e gestão urbana;
 A gestão dos recursos hídricos, dos sistemas de drenagem e de resíduos sólidos inadequada, a causar
deficiências sanitárias, inundações e deslizamentos;
 O declínio dos ecossistemas devido às atividades humanas, que comprometem a capacidade de
oferecer serviços essenciais, como, por exemplo, a proteção e regulação contra inundações;
 A deterioração da infraestrutura e padrões de construção inseguros, que podem levar ao colapso das
estruturas;
 Os serviços de emergência descoordenados, que afetam a capacidade de rápida resposta e
preparação;
 Os efeitos adversos das mudanças climáticas, com um impacto sobre a frequência, a intensidade e a
localização das inundações e outros desastres relacionados ao clima.

De forma compreensiva e não definindo de forma estrita os indicadores ou forma de avaliação, a UNSDR
(2012) define risco de desastre:

Ameaça ∙ Vulnerabilidade ∙ Exposição


Risco de desastre =
Resiliência ou Capacidade de enfrentamento

2.3 Panorama brasileiro e ações estruturais

No contexto brasileiro, a Secretaria Nacional de Defesa Civil (SEDEC), subordinada ao Ministério da


Integração Nacional (MI), e órgão central do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil (SINPDEC), adiciona
à definição internacional de cidade resiliente a importância da eficiência organizacional e a importância de
prevenir que vidas e bens sejam perdidos em desastres. Tal órgão também se ocupa da conscientização da
causa, trabalhando para disseminar informações sobre proteção individual, de comunidades, do patrimônio
e do ambiente. Os objetivos da política nacional também abrangem pontos no contexto da redução de riscos
de desastres, que ajuda na diminuição da pobreza, favorece a geração de empregos e oportunidades
comerciais, a igualdade social, ecossistemas mais equilibrados e ainda atua nas melhorias das políticas de
saúde e de educação (SECED, 2014).

Numa iniciativa pontual, o Centro de Excelência para a Redução do Risco de Desastres (UNISDR-CERRD)
resultou de uma parceria entre o Governo Federal e o UNISDR, numa ação pioneira em âmbito global e

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Cidades resilientes a inundações

alinhada com as ações previstas no Marco de Ação de Hyogo (MAH) e com a Política Nacional de Proteção e
Defesa Civil (PNPDEC). O lançamento no Brasil da Campanha Construindo Cidades Resilientes: Minha Cidade
está se Preparando, da Estratégia Internacional para a Redução de Desastres (ISDR), pretende sensibilizar
governos e cidadãos para os benefícios de se reduzir os riscos por meio da atuação de forma a construir
cidades resilientes.

2.4 Fundamentos para construção de cidades resilientes

Em conjunto, governos, instituições internacionais e representantes da sociedade civil implantaram no país


medidas para a redução de riscos de desastres. Entre tais medidas, estão a criação de programas educativos
e de capacitação em escolas e comunidades locais, o cumprimento de normas sobre construção e princípios
para planejamento e uso do solo, os investimentos em implantação e manutenção de infraestrutura que
evitem inundações e o estabelecimento de mecanismos de organização e coordenação de ações com base
na participação de comunidades e sociedade civil organizada (SEDEC, 2014).

Tais ações baseiam-se num protocolo mais amplo, definido pelo Marco de Ação de Hyogo (UNSDR, 2007),
que contem dez pontos em formato de check-list:

 Implantar organização e coordenação para entender e reduzir o risco de desastres, com base na
participação de grupos de cidadãos e da sociedade civil. Construir alianças locais. Certificar a
compreensão por parte de todos os departamentos de seu papel na redução do risco de desastres;
 Atribuir um orçamento para a redução do risco de desastres e fornecer incentivos para os
proprietários, famílias de baixa renda, comunidades, empresas e setor público a investir na redução
dos riscos que enfrentam;
 Manter atualizados dados sobre riscos e vulnerabilidades; preparar avaliações de risco e utilizá-los
como base para planos de desenvolvimento urbano e decisões. Certificar-se de que as informações
e os planos para a resiliência da sua cidade estão prontamente disponíveis ao público e amplamente
debatido com eles;
 Investir e manter infraestruturas críticas que reduzam o risco, tais como drenagem inundação,
ajustados sempre que necessário para lidar com a mudança climática;
 Avaliar a segurança de todas as escolas e instalações de saúde e atualizá-las conforme necessário;
 Aplicar e fazer cumprir os regulamentos de construção econformidade a risco e princípios de uso e
ocupação do território. Identificar terreno seguro para os cidadãos de baixa renda e desenvolver
melhorias nos assentamentos informais, sempre que possível;
 Assegurar que os programas de educação e formação sobre a redução do risco de desastres estão
em vigor nas escolas e nas comunidades locais;

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Cidades resilientes a inundações

 Proteger os ecossistemas e amortecedores naturais para mitigar inundações, tempestades e outros


riscos a que sua cidade pode ser vulnerável. Adaptar-se às alterações climáticas através da
construção sobre as boas práticas de redução de risco;
 Instalar sistemas de alerta e gestão de emergência em cidades e realizar exercícios de preparação
pública regulares;
 Depois de qualquer desastre, garantir que as necessidades dos sobreviventes são colocados no
centro da reconstrução com o apoio para eles e suas organizações comunitárias. Projetar e ajudar a
implementar respostas, incluindo a reconstrução de casas e meios de subsistência.

3. Águas em cidades resilientes

3.1 Panorama atual

Nas últimas duas décadas, grande parte da atenção direcionada às cidades resilientes está ligada à ocorrência
de falhas relacionadas à infraestrutura deficiente de abastecimento, tratamento, coleta e manejo de água
no meio urbano. Tais deficiências são particularmente evidenciadas ao se constatar o impacto de episódios
de eventos extremos nos últimos anos em diversas regiões do mundo.

Em 2010, após o impacto de um terremoto no Haiti, milhares de metros de tubulações de distribuição de


água foram deteriorados e rompidos, causando uma crise geral de acesso à água potável no país.
Concomitantemente, as tubulações de esgoto também sofreram danos, causando vazamentos que
comprometeram a pouca água disponível no sistema de distribuição. Com isto, surgiu um surto de cólera no
país, deixando mais 600 mil pessoas doentes e 8 mil mortes (ARUP, RPA, and SIEMENS, 2013).

Atualmente, o estado da Califórnia nos Estados Unidos está passando pela mais drástica crise hídrica da
história do país. Ao longo de 2013, choveu no estado o equivalente a um terço do que choveu no primeiro
semestre em 2014 em São Paulo. Por não estar preparada para eventos deste porte, o governo do estado
passou a tomar medidas impactantes de racionalização e a aplicar multas severas àqueles que não
colaborarem com desperdício. No último ano, mais de 1 milhão de dólares em multa foram arrecadados,
evidenciando a falta de conscientização e preparo da população (SUPER INTERESSANTE, 2014).

No Brasil, a cidade de São Paulo vive desde 2014 o antagonismo da crise hídrica e o risco de inundações. A
falta de resiliência da infraestrutura da cidade evidencia, ao mesmo tempo, perdas de cerca de 25% no
sistema de distribuição (60% de perdas reais e 40% aparentes – SABESP, 2015), utilização do volume morto
dos principais reservatórios e mais de 420 mil pessoas morando em zonas de risco de inundação (SWISS
REINSURANCE COMPANY, 2011).

Assim, diversos são os exemplos que evidenciam a necessidade de uma infraestrutura urbana mais resiliente.
Seja em países subdesenvolvidos ou não, poucos são aqueles que estão realmente preparados, cabendo aos
que não estão, aprender com as experiências de sucesso e adaptá-las à sua respectiva realidade.

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Cidades resilientes a inundações

3.2 Casos de sucesso: água e a infraestrutura urbana

 Plano de Resiliência – Nova Iorque, NY

O projeto de tornar a cidade de Nova Iorque mais resiliente surgiu após a ocorrência do furacão Sandy em
outubro de 2012. O efeito das ondas e a chuva extrema gerada pelo furacão na região fizeram com que a
cidade litorânea sofresse danos severos em sua infraestrutura e na vida de sua população. 43 pessoas
morreram e milhares foram feridas. O nível da água chegou a mais de 2 metros acima do nível da rua, de
forma que estações de metrô ficaram submergidas, ruas e comércio foram destruídos, instalações elétricas
e de telecomunicações foram devastadas e milhares ficaram sem luz e energia por mais de 15 dias. Estima-
se que o dano total chega a, pelo menos, 19 bilhões de dólares (THE CITY OF NEW YORK, 2013). As figuras
seguintes ilustram alguns dos danos ocorridos.

Figura 2 - Danos ocorridos na infraestrutura de Nova Iorque com o furacão Sandy

Assim, com a participação de diversas organizações públicas e privadas, do poder público municipal, estadual
e da comunidade nova iorquina, elaborou-se o plano de resiliência, que inclui medidas estruturais e não
estruturais para reduzir a vulnerabilidade da cidade a eventos extremos.

Quando o foco é a influência da água na resiliência, como exemplo, duas medidas vêm se destacando. A
primeira delas é atuação da agência metropolitana de metrô e trens de Nova Iorque junto a empresas
privadas para elaboração de medidas mitigadoras para evitar a entrada de água em estações, evitando,
principalmente, danos nos sistemas elétricos, mecânicos e de telecomunicação. As medidas, de caráter
puramente estrutural, são equipamentos instalados nos pontos de vulnerabilidade para entrada de água nas
estações, como bocas de lobo, bueiros, grelhas de ventilação, penetração de conduítes e até as próprias
entradas de pedestres. As figuras seguintes mostram alguns destes equipamentos que vem sido instalados
nas estações de metrô e arredores para evitar entrada de água, que são, respectivamente: capas destacáveis
nas entradas e grelha de ventilação (acima), e espécies de portas mecanizadas que vedam a entrada de água
em grelhas de ventilação (abaixo).

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Cidades resilientes a inundações

Figura 3–Equipamentos para evitar a entrada da água nas estações subterrâneas de metrô

Outro projeto que vem se destacando na cidade é o parque linear Hunter’s Point South, localizado na região
da costa de Long Island. A utilização da chamada infraestrutura verde para retenção e absorção da água de
chuva vem garantido alta eficiência e servindo de modelo para este tipo de prática. Conforme mostram as
figuras seguintes, à esquerda, o parque conta com uma área circular equivalente a um campo de futebol com
vegetação que permite a penetração da água de chuva; logo abaixo desta área se encontra uma bacia de
retenção, que retardar os efeitos da chuva sobre a infraestrutura de captação e, então, não a sobrecarrega.
A imagem à direita ilustra outros elementos utilizados no parque, chamados de “bioswale” e calçadas
permeáveis, que são, basicamente, áreas permeáveis que garantem que parte da água da chuva seja
absorvida pelo próprio terreno.

Figura 4–Bacia de retenção (esquerda) e elementos permeáveis (direita) no parque Hunter’s Point South

 Nova SCOA e Centro de Gerenciamento de Emergências – São Paulo, SP

O crescimento da população da região metropolitana de São Paulo demanda um acompanhamento do

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Cidades resilientes a inundações

sistema de distribuição de água para atender a todos, ou seja, para que o sistema seja resiliente às
transformações urbanas. Com isto, a SABESP, agência reguladora e responsável por este sistema na cidade,
introduziu o Nova SCOA, projeto em parceria com a Siemens para garantir a qualidade do serviço e o tempo
de resposta na distribuição de água (SIEMENS, 2013). Através da instalação de 180 estações de
monitoramento remoto distribuídas em toda a região metropolitana, o sistema visa administrar pontos
críticos de pressão e facilitar a comunicação com a população durante períodos de falhas no
abastecimento(ARUP, RPA, and SIEMENS, 2013). As estações medem constantemente a pressão nas
tubulações, o consumo nos principais bairros, temperaturas do ambiente externo (para prever condições
climáticas) e, com isso, são capazes de administrar o sistema conforme a demanda em cada região, evitando
pontos críticos, identificando falhas e otimizando o sistema de distribuição.

Em termos de resiliência água de chuva, a cidade de São Paulo conta com uma central de gerenciamento de
emergências que, através de sensores de temperatura e pluviômetros, monitora as principais áreas de risco
da região metropolitana. A localização dos pontos mais críticos na cidade, vulneráveis a riscos de inundação
ou desabamento, pode ser prevista com 2 dias de antecedência pela Central. À medida que eventos de chuva
vão ocorrendo na cidade, o Centro entra em contato com a Defesa Civil, que é a responsável por alertar e
retirar comunidades de regiões de risco.

Uma das críticas referentes a este Centro é a falta de comunicação com a população da cidade. Poucos são
aqueles que conhecem o serviço disponibilizado pelo Centro (no site é possível ver em mapa os pontos de
alagamento), de forma que não se evita que as pessoas se direcionem aos locais onde há risco. Além disto,
aquelas que já se encontram em regiões de risco são pouco instruídas sobre a veracidade dos dados e a
confiabilidade com o trabalho da defesa civil é baixa.

 Centro de Operações – Rio de Janeiro, RJ


Nos mesmos moldes do Centro de Gerenciamento de Emergências de São Paulo, o Centro de Operações do
Rio de Janeiro entrou em funcionamento em dezembro de 2010. O papel do Centro é concentrar informações
em tempo real do que acontece na cidade e se comunicar com as autoridades responsáveis nos mais diversos
setores. Em termos de água de chuva, através de sensores também espalhados pela cidade e estações de
coleta de dados em seu entorno (até 250 km), pode-se prever as condições climáticas na cidade com até dois
dias de antecedência (ARUP, RPA, and SIEMENS, 2013), assim como em São Paulo.

Com isto, a defesa civil e agentes locais podem intervir em regiões de risco e evitar grande impacto sobre a
população. O centro também possui acesso a sirenes espalhadas em algumas comunidades de risco,
alertando-as através de aviso sonoro sobre riscos de desabamento e inundação (CENTRO DE OPERAÇÕES,
2015). A crítica relacionada ao centro de emergências de São Paulo quanto à comunicação com a população
também é válida para o Centro de Operações do Rio de Janeiro.

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Cidades resilientes a inundações

4. Medidas estruturais
4.1 Definição
As medidas estruturais são aquelas que envolvem obras de engenharia e ações de infraestrutura de
drenagem. A seguir, são discutidas algumas medidas estruturais segundo uma divisão em dois grandes
grupos: medidas estruturais tradicionais e sistema de drenagem urbana sustentável.

4.2 Medidas Estruturais Tradicionais


O método tradicional apoia-se em um sistema de drenagem para o rápido escoamento e afastamento das
águas pluviais. Tipicamente essa abordagem utiliza uma combinação de dois sistemas para atingir esse
objetivo:

 Sistema unificado: sistema combinado de esgotos no qual a água pluvial é misturada a efluentes
domésticos e industriais antes de ser tratada em uma estação central de tratamento de efluentes e
despejada em um curso de água receptor;

 Sistema separador: o sistema separador de águas superficiais coleta apenas águas pluviais e as
despeja nos cursos de água receptores com pouco ou nenhum tratamento.

A infraestrutura comumente utilizada para coletar e conduzir águas pluviais pela abordagem convencional
inclui:

 Microdrenagem superficial: Chuva escoada de telhados, ruas e outras áreas impermeáveis fluem por
sarjetas em direção a canais subterrâneos para assegurar a rápida remoção da superfície;

 Tubulação: tubos da rede de microdrenagem subterrânea possibilitam o transporte dos fluxos de


águas pluviais para o ponto de descarga;

 Canais de drenagem de concreto: canais para a condução das águas de escoamento às ETEs ou curso
de águas receptoras;

 Lançamentos: Em sistemas unitários os lançamentos ocorrem após o tratamento. Já em sistemas


separadores, as águas pluviais são despejadas diretamente nos cursos de água receptores.

Os sistemas convencionais de drenagem são os métodos mais comumente utilizados na gestão de águas
pluviais. Entretanto, esse sistema possui algumas limitações para a construção de cidades resilientes, pois
estão baseadas em prioridades que auxiliam na redução do risco de inundações localizados, mas raramente
atendem uma abordagem integrada e frequentemente são implantados com pouca consideração do impacto
a jusante, por exemplo.

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Cidades resilientes a inundações

4.3 Sistema de Drenagem Urbana Sustentável


As cidades estão enfrentando mudanças que devem aumentar a pressão sobre a gestão de águas pluviais
urbanas. A expansão de áreas pavimentadas gera maiores picos e volumes de escoamento superficiais e as
maiores variações na precipitação alteraram o estudo do volume e a intensidade de água escoada no meio
urbano. Nesse contexto, a operação dos sistemas de drenagem urbana sustentável é de significativa
importância para as cidades resilientes, adaptando a infraestrutura existente de modo que ela tenha a
robustez necessária para lidar com cenários de eventos extremos potenciais

Segundo Pompêo(2000), sistema de drenagem urbana sustentável é o conjunto de ações integradas que
possam articular a sustentabilidade com o tratamento de enchentes urbanas e as políticas de saneamento e
recursos hídricos. Esse sistema apoia-se na ideia de o ciclo hidrológico da região ser parecido ao ciclo
hidrológico natural. O sistema, queé desenvolvido para melhorar a gestão de riscos ambientais,também
maximiza as oportunidades de revitalização do espaço urbano e incremento da biodiversidade.

As principais diferenças entre a abordagem convencional da gestão de águas pluviais e o sistema de


drenagem sustentável são:

 Rápida eliminação vs. Amortecimento e reutilização: ao contrário do método tradicional, o controle


utilizado no sistema de drenagem urbana sustentável aproxima-se da fonte, ou seja, ele ocorre mais
próximo ao local de precipitação;

 Infraestrutura convencional vs. Infraestrutura verde: a vegetação e recursos hídricos utilizados no


paisagismo urbano podem ser adaptados para possibilitar amortecimento e tratamento dos
escoamentos superficiais. Além disso, há uma apropriação dos espaços existentes paraoutras
funções, como o armazenamento de águas pluviais durante fortes precipitações;

 Soluções de controle centralizada vs.Descentralizadas: sob o ponto de vista de cidades resilientes é


importante reconhecer a sazonalidade e exposição extrema. Nesse sentido, as melhorias
incrementais descentralizadas surgem como oportunidade de ação em áreas mais vulneráveis.
Identificar locais dentro da cidade onde melhorias ou mudanças na infraestrutura de drenagem
sejam prioritárias para o planejamento aumenta as chances de opções mais sustentáveis sejam
selecionadas ao invés de convencionais.

A seguir, destacamos dois exemplos de medidas estruturais sustentáveis, procurando descrevê-las e discutir
suas vantagens e suas limitações.

 Pavimento poroso

Um dos maiores impactos da urbanização na gestão de águas pluviais é a transformação de vegetação e solos
permeáveis em superfícies pavimentadas permeáveis, que aumentam o volume e a velocidade de

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Cidades resilientes a inundações

escoamento superficial.

A estrutura do pavimento poroso surge, portanto, como forma de minimização dos efeitos da
impermeabilização, pois permite a drenagem das águas pluviais através do pavimento, o armazenamento e
lenta liberação do volume por tubulações coletoras subterrâneas, amortecendo o escoamento das águas
pluviais.

O pavimento poroso é uma opção de controle local, concebida para controlar apenas a água que cai sobre
sua superfície. Esse tipo de solução possui algumas limitações, pois está intimamente ligado ao
enquadramento da utilização da via e, portanto, deve possuir resistência para suportar o peso e o volume de
tráfego local. Além disso, a construção de pavimentação porosa exige uma manutenção para que os
sedimentos e a própria compactação do pavimento devido a carga dos veículos não obstruam a drenagem
das águas. Atualmente, uma das utilizações mais comuns dessa solução são os pavimentos permeáveis em
estacionamentos.

 Sistemas de infiltração (medida estrutural local e regional)

Os sistemas de infiltração são trincheiras ou bacias que coletam as águas pluviais e as infiltram no solo por
um meio de cascalho e pedra. O escoamento é tratado por meio da filtração pelas pedras e cascalhos que
preenchem a trincheira ou reservatório e são capazes de remover diversos poluentes. A principal diferença
em relação as valas é que os sistemas de infiltração não possuem uma saída e, portanto, não são
descarregados em nenhum outro sistema de drenagem ou descarregado nos cursos de água receptores.
Dessa forma, atuam com maior amortecimento das águas. Esses sistemas de infiltração são mais eficazes
quando construídos em conjunto com outras opções de controle na origem como valas, coletores de
sedimentos, ou certos tipos de telhados verdes, pois o tratamento prévio desses outros sistemas reduz o
risco de águas subterrâneas.

5. Medidas não-estruturais
5.1 Definição
São medidas não estruturais aquelas que envolvem o convívio da sociedade com o fenômeno das cheias sem
a construção adicional de infraestrutura de drenagem – por oposição às medidas estruturais. Tais ações têm
se tornado cada vez mais importantes, por múltiplas razões. Em primeiro lugar, são medidas geralmente
muito menos custosas que as estruturais, embora suas exigências em termos de capital político sejam
elevadas (Zahed Filho, Martins, Porto, 2012; Andrade Filho, Széliga eEnomoto, 2000; Tucci, 1997). Em
segundo lugar, em inúmeras cidades, o estabelecimento de medidas estruturais intensivas contra as
inundações – tais como as canalizações – agrava os problemas a jusante, caso em que o uso conjunto de
medidas estruturais extensivas – visando a atenuar ou retardar o escoamento superficial – e de medidas não
estruturais se torna essencial. Com efeito, ainda que as medidas não estruturais fossem relegadas a um status

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Cidades resilientes a inundações

secundário no paradigma tácito que regia os projetos de drenagem no século XX, elas vêm assumindo um
papel de muito maior destaque neste século. As medidas não estruturais referentes a áreas não ocupadas
sob alto risco de inundação são chamadas preventivas, enquanto as ações em áreas de alto risco previamente
ocupadas são denominadas corretivas – e naturalmente envolvem maior resistência por parte da população.
A seguir, destacamos um conjunto não exaustivo de medidas não estruturais, procurando não somente
descrevê-las, mas também discutir suas vantagens e suas limitações.

5.2 Mapeamento das áreas sujeitas às inundações


Para que se lide adequadamente com a questão das inundações em meio urbano, é imprescindível uma
compreensão detalhada de tal fenômeno – incluindo necessariamente representações cartográficas. O
mapeamento pode assumir configurações bastante diversas, segundo se destine ao uso por equipes técnicas
governamentais ou à consulta pela própria população. Por exemplo, Andrade Filho, Széliga e Enomoto(2000)
sugerem que um mapa destinado à concepção de medidas não estruturais – portanto, um mapa cujo público-
alvo seriam técnicos – deveria integrar, no mínimo: a cobertura vegetal existente; o nível de permeabilidade
do solo e a sua vulnerabilidade à erosão; a declividade do terreno; as redes de drenagem; e contornos
especiais para áreas críticas. Já no caso de um mapa cujo propósito fosse a orientação da população, este
deveria ser bastante mais simples; com efeito, é essencial que se representem as áreas de acordo com o seu
risco de inundação (isto é, usando linhas “iso-risco”, de certa forma similares às linhas isócronas presentes
em mapas de transporte), assim como os equipamentos públicos relevantes para o atendimento em caso de
emergências hídricas. Um mapeamento adequado é o primeiro passo para a construção informada e
participativa de um conjunto de regras de ocupação do solo, na forma de planos diretores, como discutimos
adiante.

5.3 Elaboração de um plano diretor de uso do solo


A existência de planos diretores é preconizada pela Lei Federal n. 10.257/2001 (Brasil, 2001). Na verdade,
todo o capítulo III da lei supracitada é dedicado a esses instrumentos de política urbana, cuja elaboração é
obrigatória em cidades com população superior a vinte mil habitantes – assim como em outras que
preencham certas condições. Tucci (1997) sugere que três tipos de áreas inundáveis sejam tratadas de forma
distinta por medidas de zoneamento: (i) zonas de passagem da enchente, que não somente se inundam,
como também são essenciais para o escoamento da enchente, de forma que qualquer obstrução pode elevar
a altura da lâmina em grandes áreas a montante; (ii) zonas com restrições, sujeitas a inundações regulares,
mas com lâminas d’água de baixa altura e velocidades baixas, de maneira que sua importância hidráulica é
ínfima; (iii) zonas de baixo risco, sujeitas a inundações raras, mas que necessitam ainda de alguma forma de
regulação. Tal classificação nos parece bastante pertinente e compatível com as limitações dos mecanismos
de mercado em reger a alocação de recursos escassos em certas situações. Antes de prosseguir, cabe uma
breve discussão sobre esse assunto.

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Cidades resilientes a inundações

Em princípio, uma situação em que haja agentes racionais (no sentido econômico do termo), informação
perfeita e competição livre pelas parcelas de terra levará a um equilíbrio espacial que representa a alocação
ótima dos recursos fundiários. Nesse contexto, qualquer interferência direta do setor público – por exemplo,
pela confecção de um plano diretor que restrinja a ocupação de certas áreas – seria necessariamente
deletéria. O que, então, poderia sustentar a recomendação de elaborar um zoneamento urbano? Um dos
exemplos clássicos das chamadas falhas de mercado é a presença de externalidades, isto é, benefícios ou
prejuízos que recaem sobre agentes que não participam diretamente de uma transação. Na classificação
sugerida por Tucci (1997) e mencionada no parágrafo anterior, a ocupação das zonas de passagem da
enchente impõe uma clara externalidade negativa aos habitantes a montante, sem que esse efeito possa ser
incorporado no sistema de preços. A solução típica que um economista sugeriria para responder a tal
situação seria um tributo pigouviano – ou seja, os ocupantes das zonas de passagem da enchente deveriam
ser sobretaxados e a receita arrecadada deveria ser distribuída aos habitantes a montante como forma de
compensação. Embora essa solução seja teoricamente apropriada, não é difícil perceber que o cálculo do
nível apropriado dessa taxa envolveria técnicas extremamente sofisticadas, além do que se pode esperar do
ponto de vista prático – sem contar o fato de que sua aceitação social seria bastante problemática.

As zonas de passagem da enchente não são as únicas que impõem limitações ao funcionamento dos
mecanismos de mercado. As demais zonas inundáveis também exigem que se considerem certas
constatações da economia comportamental, citadas por exemplo em Kahneman (2011), especialmente o
fato de que considerar que o sistema de preços possa lidar adequadamente com fenômenos relativamente
pouco frequentes, porém com alto dano potencial (como é o caso de desastres naturais), pode ser
incompatível com as limitações cognitivas humanas. Assim, as chamadas zonas com restrições parecem ainda
justificar um nível moderado de ação estatal no sentido de regular diretamente o uso do solo; no caso de
zonas de baixo risco, provavelmente as medidas mais adequadas são aquelas que se assemelham a seguros,
que serão discutidas adiante.

Por fim, talvez a principal peculiaridade das áreas urbanas sujeitas a inundações seja que, não raro, tais áreas
são ocupadas de forma irregular. Como a existência de direitos de propriedade assegurados são uma
condição essencial ao funcionamento normal dos mercados, as ocupações irregulares representam um
contexto de necessidade de ação estatal, tanto no sentido de fiscalizar e impor aquilo que for decidido na
elaboração do plano diretor, quanto para encontrar alternativas de reassentamento das famílias afetadas.
Ambos os pontos serão tratados adiante. Planos diretores podem ainda ser importantes para a escolha de
localização de equipamentos públicos, que certamente devem considerar a possibilidade de inundações.

5.4 Fiscalização da ocupação do solo


A fiscalização da ocupação do solo é a contrapartida fundamental da elaboração de planos diretores. Não há
qualquer sentido em realizar uma empreitada tão complexa e tão custosa quanto a elaboração participativa
de regras de zoneamento se tais regras não tiverem sua aplicação estritamente observada. Por outro lado, a

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Cidades resilientes a inundações

imposição efetiva das restrições preconizadas pelo plano diretor pode ser impedida por algo que a literatura
de ciência política e econômica denomina dilema de agência: um prefeito que promova a remoção de lares
em áreas restritas arca sozinho com o ônus político substancial desse tipo de ação, embora os benefícios se
estendam muito além da duração de seu mandato; dessa forma, nenhum representante tem o incentivo de
tomar esse tipo de atitude, independentemente de quão socialmente benéfica possa ser. A ocupação
irregular de áreas de mananciais apresenta exatamente o mesmo tipo de conflito de interesses – e os
habitantes de áreas metropolitanas brasileiras estão cientes de que, até o presente momento, nenhuma
solução adequada foi encontrada. Apenas uma conscientização ampla das populações, que envolvesse a
cobrança de medidas apropriadas da parte dos governos municipais e estaduais, parece ser capaz de evitar
esse tipo de situação. Em outras palavras, a única forma de viabilizar esse conjunto de ações socialmente
benéficas parece ser reduzir o ônus político associado a elas.

5.5 Seguros e taxas


Em áreas cuja ocupação seja regular, e que estejam sujeitas a um risco baixo (porém não desprezível) de
inundações, uma solução que pode se mostrar adequada é a compra de seguros. O princípio de
funcionamento dos seguros é bastante simples, e envolve a transferência de um certo risco a uma entidade
com maior capacidade para suportá-lo, mediante um pagamento. Isso obviamente eleva o custo esperado
(médio) para o cidadão, já que há uma despesa adicional. Entretanto, em uma situação de aversão ao risco,
a elevação do custo esperado pode ser perfeitamente aceitável se a possibilidade de ter que suportar um
custo exorbitante (como o de ter todos os seus pertences comprometidos) for muito reduzida ou eliminada.

Pelo menos duas formas de implementar essa medida são concebíveis. A primeira é o condicionamento da
ocupação dessas áreas à aquisição de um seguro fornecido por empresas privadas. A segunda é a cobrança
de uma taxa regular pela ocupação de áreas sujeitas a inundações, cuja receita seria reservada num fundo
público destinado à compensação de vítimas desse tipo de evento e a outras medidas mitigadoras. Não
parece haver clara superioridade de uma opção em relação à outra. A via pelo emprego de transações
privadas poderia beneficiar o cidadão por meio de uma competição de preços entre tais empresas. Por outro
lado, o mercado de seguros opera primordialmente com apólices cujos sinistros são pouco correlacionados
entre si – a ocorrência de um acidente com o veículo de um cliente, em princípio, não altera o risco associado
a outro cliente. Tal condição é obviamente falsa no caso de áreas sujeitas a inundações: se graves danos
decorrentes de inundações são impostos a um lar, é extremamente provável que lares vizinhos também
sejam afetados, o que torna muito mais complexa a precificação de seguros residenciais contra esse tipo de
desastre. Isso poderia ser encarado como um argumento a favor da solução inteiramente estatal – embora,
na prática, o cálculo da taxa apropriada seja igualmente complexo, e problemas de aceitação social possam
ser vislumbrados para ambas as opções.

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Cidades resilientes a inundações

5.6 Sistemas de alerta e defesa civil


A relevância dos sistemas de defesa civil é bastante evidente para qualquer cidadão que se lembre de
tragédias como as inundações que acometeram o vale do rio Itajaí (SC) em 2008 (Folha de S.Paulo, 2008).
Obras de engenharia são empregadas com o intuito de reduzir o risco de desastres – mas normalmente não
o eliminam, tornando fundamental a existência de uma estrutura institucional que permita minimizar os
danos materiais e impedir a perda de vidas humanas. Para esse último propósito, podem ser empregados
sistemas de alerta, com configurações variadas. Áreas sujeitas a inundações poderiam ser dotadas de um
alerta sonoro comparável àquele que existe em regiões de terremotos frequentes. Além disso, a posse de
telefones celulares é tão difundida hoje no Brasil – quase 1,4 aparelho por habitante em março de 2015
(Valor Econômico, 2015) – mesmo entre as classes sociais menos privilegiadas, que possivelmente um
sistema de alerta baseado na emissão automática de mensagens de texto seria ainda mais eficiente.
Qualquer opção exigiria a presença ativa dos serviços de defesa civil para coordenar a evacuação eventual
das áreas em risco iminente.

5.7 Programas de reassentamento


O zoneamento das cidades pode exigir a remoção de população em certas áreas, por exemplo em
decorrência de um risco muito elevado de inundações. Essa remoção pode enfrentar significativa resistência
por parte das famílias em questão – compreensivelmente, diga-se. Para atingir o nível de sustentabilidade
ambiental almejado pelo plano diretor, a existência de programas de reassentamento que ofereçam
alternativas viáveis aos cidadãos afetados por remoções é fundamental. Tais programas podem ser capazes
de concretizar justamente a redução do ônus político associado a medidas contra as inundações que
mencionamos na seção referente à fiscalização do uso do solo. Mesmo que não venham imediatamente à
mente de quem pense em componentes de cidades resilientes, os programas de reassentamento pertencem
à classe de medidas não estruturais contra as inundações, em especial no mundo em desenvolvimento, e sua
importância não deve ser subestimada.

6. Conclusão
Inundações e emergências hídricas de forma geral são fenômenos cujas consequências para os habitantes
de áreas urbanas podem ser devastadoras – tanto em termos de perda de vidas humanas quanto de prejuízos
econômicos.

Cidades resilientes são aquelas capazes de atenuar os danos causados pelos desastres naturais, adaptar-se a
essas situações de estresse dos sistemas urbanos e garantir um nível mínimo de funcionamento e segurança
estrutural. É de vital importância que as cidades sujeitas a inundações – boa parte delas situada em países
em desenvolvimento – tornem-se resilientes para que possam garantir a integridade dos seus cidadãos e se
tornem mais prósperas.

Isso exige um conjunto bastante diverso de iniciativas. Certamente as medidas estruturais intensivas, como

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Cidades resilientes a inundações

as tradicionais canalizações de cursos d’água, fazem parte do repertório de que devem dispor as autoridades
públicas para lidar com tais fenômenos. Entretanto, o escopo de ações também deve incluir medidas
estruturais extensivas – destinadas a reduzir ou retardar o escoamento superficial, como os pavimentos
permeáveis e sistemas de infiltração – e medidas não estruturais – como a regulação do uso do solo e o
estabelecimento de um sistema de alerta e defesa civil.

As decisões sobre as medidas mais adequadas são altamente dependentes do contexto local. Embora a maior
parte das cidades sujeitas a inundações observe problemas semelhantes, as melhores soluções devem ser
elaboradas considerando as peculiaridades do ambiente natural e da situação socioeconômica, o que exige
a colaboração eficaz de pessoas com uma grande variedade de perfis.

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