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Depósito extrajudicial na consignação em

pagamento
Trata da possibilidade do devedor valer-se da
via extrajudicial na consignação em pagamento,
inserida em nosso ordenamento jurídico com o
advento da Lei 8.951/94.

Por Ricardo Farias Oliveira Neto


PROCESSO CIVIL | 31/OUT/2008
DN
1. INTRODUÇÃO
Em linhas gerais, a Consignação em Pagamento
é uma das possibilidades que tem o devedor
para a extinção de uma obrigação [1]. Tal
instituto visa assegurar o direito do devedor ao
adimplemento de uma obrigação, assim como
também é direito do credor exigir o
cumprimento desta.
O rol de possibilidades de cabimento da
consignação em pagamento é numerus
clausus e está elencado nos cinco incisos do Art.
335 do Código Civil [2]. Neste artigo tratarei da
hipótese do depósito extrajudicial, inserido em
nosso ordenamento jurídico com o advento da
Lei 8.951 de 13 de Dezembro de 1994.
2. APLICAÇÃO
Não raros nas relações sociais são os casos de
devedores que procuram seus respectivos
credores para o adimplemento de uma
obrigação (entrega de coisa, in casu, dinheiro –
prestação pecuniária) que assumiram, e espera-
se que esse cumprimento se dê na forma e
tempo pactuados. Acontece que em
determinadas ocasiões há divergência entre os
dois pólos dessa relação, ocasionando por
muitas vezes, é bem verdade, o inadimplemento
por parte do devedor, mas levando também em
tantas outras, o credor à negativa do aceite do
pagamento.
Teria então o devedor duas possibilidades: a)
lançar mão de uma Ação de consignação em
pagamento; ou b) efetuar depósito da quantia
tida por ele como devida em um
estabelecimento bancário. Como estamos
tratando do depósito extrajudicial, ficaremos
com a segunda opção, salientando que esta que
só pode ser adotada quando se tratar de
obrigação em dinheiro.
3. VANTAGENS
As vantagens do procedimento extrajudicial são
o maior atrativo para a utilização dessa via em
detrimento do ajuizamento de uma ação
consignatória. Dentre elas estão a celeridade do
procedimento, bem como o que os
doutrinadores contemporâneos chamam de
fenômeno da desjudicialização.
A qualquer tempo, sentindo-se o devedor
prejudicado por ver-se constituído em mora, em
razão do não recebimento do pagamento pelo
credor, poderá ele proceder com o depósito em
estabelecimento bancário da quantia devida, em
conta com atualização monetária, conforme
preconiza o § 1º do Art. 890 do CPC.

Faz mister trazer à baila a problemática da


redação do parágrafo primeiro do mencionado
artigo, que Ipsis litteris traz que o depósito será
efetuado “em estabelecimento bancário oficial,
onde houver, situado...”. Essa redação
influenciou o entendimento de alguns
doutrinadores e profissionais do Direito no
sentido de que somente seria possível o
depósito em bancos oficiais.
Contudo, na prática o que vem ocorrendo é a
interpretação desburocratizada desse
dispositivo, e assim também é o meu
entendimento, no sentido de que a melhor
interpretação é que o depósito seja
feito, preferencialmente, em banco oficial.
Pois assim, aqueles que residem nas localidades
onde não há bancos oficiais, não teriam
preterido seu direito de utilizar esse
procedimento extrajudicial.
Luiz Rodrigues Wambier [3] ensina que “O
depósito pode ser feito em qualquer
estabelecimento da rede bancária do País, pois
o texto legal deve assim ser entendido: “em
estabelecimento bancário, oficial onde houver,
situado...”. Nas localidades onde não houver,
pode ser efetuado em qualquer banco privado”.
4. PROCEDIMENTO
Uma vez efetuado o depósito, o credor será inteirado
deste, por meio de carta com aviso de recebimento
(AR), iniciando-se assim o prazo para sua
manifestação, prazo este de dez dias.
No decurso desse prazo, o credor tem três
possibilidades a seguir:
a) aceitar o depósito, podendo então levantar a
quantia;
b) permanecer inerte, ocasião na qual reputar-
se-á o devedor liberado da obrigação (Art. 890,
§ 2º); e
c) declarar expressamente sua recusa,
necessariamente por escrito, ao
estabelecimento bancário.
Veja que nas duas primeiras hipóteses, há a
extinção da obrigação. Enquanto que na última,
a obrigação permanece, podendo o devedor, ou
o terceiro, propor dentro de 30 dias a ação de
consignação, devendo instruir a inicial com a
prova do depósito e da recusa (Art. 890, § 3º).
Não propondo a ação em 30 dias, o depósito
efetuado perde sua eficácia, oportunidade em
que poderá ser levantado pelo próprio devedor.
Nada obsta que devedor proponha a ação em
prazo posteiror aos 30 dias, contudo, terá que
efetuar novo depósito, ou solicitar ao juiz o
depósito da quantia, que deverá ocorrer no
prazo de cinco dias, contados do deferimento do
pedido.
A Lei 8.951/94 na parte que tange ao depósito
bancário extrajudicial, muito embora esteja
prevista em norma processual, tem natureza de
direito material. Em razão disso, encontramos
na doutrina uma certa divergência quanto à
amplitude de abrangência da norma. Nelson
Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery [4] sob
o argumento de que “somente foram
modificados os dispositivos materiais sobre a
consignação”, e que “Os processuais, previstos
em lei especial não foram alcançados pela Lei
8.951/94”, defendem que o procedimento
extrajudicial não poderá ser adotado para a
consignação de débitos fiscais, nem de débitos
provenientes de relação locatícia.
Antonio Carlos Marcato [5] por sua vez, ensina
que é faculdade do devedor ou terceiro
interessado, “efetuar o depósito extrajudicial de
qualquer prestação pecuniária, inclusive
aquelas relativas a aluguel e encargos da
locação”. Sua tese se funda na alegação de que
a mens legis foi abranger toda obrigação que
envolva prestação pecuniária e que a posição
contrária é uma clara negação aos escopos
almejados pela lei, visto também que os
conflitos entre locador e locatário são de grande
incidência e não mais se justificaria a
obrigatoriedade do segundo ter que valer-se da
via judicial.
Me filio à segunda corrente, tendo em vista o
grande aparato jurisprudencial de nossos
tribunais aceitando o depósito extrajudicial de
aluguéis e encargos de locação. Não obstante à
isso, utilizando-se de boa hermenêutica,
concluímos que a própria essência do instituto é
de contemplar qualquer atividade cuja natureza
seja de prestação pecuniária, sem a necessidade
da mobilização dos órgãos jurisdicionais para
resolução do conflito, ou seja, ofertando a
desburocratização/desjudicialização do
procedimento.
Tanto é assim, que o § 1º do Art. 890 traz Ipsis
litteris “Tratando-se de obrigação em
dinheiro...”, não fazendo qualquer restrição à
aplicação do dispositivo, senão à hipótese de
tratar-se de obrigação pecuniária. Nesse
baluarte, não seria razoável diminuir a
amplitude da abrangência do instituto,
tolhendo outrossim o direito dos cidadãos de
utilizar-se dessa via alternativa de composição
dos conflitos.
5. CONCLUSÃO
A desjudicialização deste procedimento especial
é de suma importância para a plena, rápida e
eficaz realização do Direito, sendo notórias suas
vantagens, tanto para o credor como para o
devedor, que vislumbram no procedimento
extrajudicial uma forma alternativa e célere de
composição de litigios. Evidentemente que é
uma faculdade do devedor utilizar-se do
depósito extrajudicial ou, desde logo, lançar
mão de uma ação de consignação em
pagamento. Mas as vantagens daquele primeiro
assinalam que deva ser a via eleita.
Notas
[1] Art. 334 CC - Considera-se pagamento, e
extingue a obrigação, o depósito judicial ou em
estabelecimento bancário da coisa devida, nos
casos e forma legais.
[2] I - se o credor não puder, ou, sem justa
causa, recusar receber o pagamento, ou dar
quitação na devida forma; II - se o credor não
for, nem mandar receber a coisa no lugar,
tempo e condição devidos; III - se o credor for
incapaz de receber, for desconhecido, declarado
ausente, ou residir em lugar incerto ou de
acesso perigoso ou difícil; IV - se ocorrer dúvida
sobre quem deva legitimamente receber o
objeto do pagamento; V - se pender litígio sobre
o objeto do pagamento.
[3] Luiz Rodrigues Wambier, Curso avançado
de processo civil, vol.

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