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MINTER UNOCHAPECO/UFSC
DISCIPLINA: DIREITO E ECOLOGIA POLÍTICA
PROFESSOR ROGÉRIO PORTANOVA
A era planetária
Morin chama de era planetária o período da evolução humana no qual as
interações entre o velho e o novo mundo se realizam por todo o globo. Percebe que
esse período se desenvolve mediante muita violência e destruição, além da
“exploração feroz das Américas e da África” (p. 24). Esta seria a Idade de Ferro
planetária, na qual ainda estamos.
Ocidentaliza-se o mundo, posteriormente, pois o modelo de Estado-nação
criado pelos europeus vem a ser a forma que se encontra para fugir da dominação.
Da mesma forma, as idéias se mundializam, mas os povos não ocidentais
continuam sendo considerados atrasados. Mesmo com a teoria evolucionista de
Darwin, que definiu serem todos os homens descendentes do mesmo primata, o
preconceito ocidental encontrou uma saída: a compartimentalização da espécie
humana, em raças hierarquicamente superiores e inferiores.
A guerra também se mundializa. Os fatores determinantes seriam as
interações entre os grandes imperialismos europeus e os pequenos nacionalismos. A
morte de um duque gera uma guerra geral entre imperialismos mundiais (I Guerra
Mundial); a crise na bolsa de Nova Iorque gera danos econômicos à Alemanha já
massacrada pelo tratado de Versalhes.A violência é sintoma de outras violências.
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A agonia planetária
O desregramento do sistema econômico tem sua causa na falta de estudo da
economia em conjunto com outras ciências não-econômicas. Por isso ela é alheia
aos acontecimentos da sociedade (aumentos de preço e inflação). Não sabem os
economistas os porquês dos problemas que a sociedade sofre. “É a relação com o
não-econômico que falta à ciência econômica” (p. 70).
A sociedade também acaba influenciada pela economia à medida que passa a
monetarizar tudo. Ocorre uma erosão de valores e tudo passa a ser quantificado em
dinheiro. Para Morin, uma consequência desta erosão é “o quase desaparecimento
do não-monetário, que ocasiona a erosão de qualquer outro valor que não o atrativo
do lucro, o interesse financeiro”. É interessante pensar aqui na geração pós-google,
em que o não-monetário volta à importância (lembrar das ferramentas da Google,
todas gratuitas e melhores que as da concorrência, e todas atualizadas pelos próprios
usuários).
Há também outros problemas interligados, como a explosão demográfica, o
desregramento ecológico e a crise do desenvolvimento.
Problemas de segunda evidência também são importantes para entender o
desregramento mundial. A falta de coincidência entre a nação, a etnia e o Estado
causa sérios riscos, pois o Estado é o berço protetor dos adultos, que têm seus
relacionamentos baseados na etnia, na família, no clã, na tribo (p. 76). “A nação
restaura no adulto a relação infantil no seio do lar protetor”. A nação é a mãe do
adulto. Os Estados que não guardam correspondência com suas etnias
invariavelmente expulsam as minorias e acabam permitindo a instauração de
conflitos.
Morin parece sugerir então a criação de Uniões entre Estados para superar a
crise ecológica e outros problemas planetários, como o tráfico de drogas, ecologia,
êxodo rural (p. 77). Isso também evita a histeria nacionalista que favorece a
chegada de ditaduras. Quando a economia vai mal, os nacionalismos ganham força.
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No entanto, não se deve querer o melhor dos mundos, mas apenas um mundo
melhor – deve-se caminhar aos poucos.
Um passo para isso é a luta por uma democracia civilizadora, na qual não
haja uma imposição da maioria à minoria, mas pela qual se tenha a possibilidade de
expressar idéias desviantes e heréticas; a minoria não prevalece, mas tem vez.
Para esse objetivo é prejudicial o desenvolvimento das tecnoburocracias, que
tendem a excluir dos meios democráticos decisões que caberiam, num sistema
democrático, ao povo ou aos parlamentares (p. 120).
É preciso também “federalizar a Terra”, reconhecendo a ela a característica
de mátria e pátria do homem – daí o título do livro: Terra-Pátria. Deve-se buscar
uma associação mais ampla que o Estado-nação. A luta é pela unidade da
diversidade, ou seja, pela preservação das multiplicidades culturais, a “mestiçagem
generalizada” e diversificada (p. 126).
Em suma, é preciso ser cosmopolita. “É somente quando nos tornarmos de
fato cidadãos do mundo, isto é, cosmopolitas, que seremos vigilantes e respeitosos
das heranças culturais, bem como compreensivos das necessidades de retorno às
fontes” (p. 127).
O impossível realismo
A realidade é incerta porque é formada de múltiplas incertezas e o que
comumente se diz ser realidade comporta dois elementos variáveis: o elemento
factual e o elemento temporal.
Pelo elemento temporal percebe-se que aquilo que era verdade ontem já não é
mais hoje, e também não será a realidade amanhã.
O elemento factual remete à necessidade de se conhecerem os fatos para
definir a realidade; mas os fatos, além de não estarem sempre bem visíveis, ainda
têm que passar por uma interpretação. Essa interpretação, contudo, requer o
conhecimento de complexas e variadas realidades, porque o tradicional pensamento
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A antropolítica
Se a política se incumbe do devir do homem no mundo, o desenvolvimento,
que também significa a incumbência política do devir humano, deve ser tratado com
multidisciplinariedade, multidimensionalidade. “A política deve tratar da
multidimensionalidade dos problemas humanos” (p. 143).
Há duas espécies de política: a totalizante, que deveria encontrar boas
soluções para tudo; e a totalitária, que quer controlar tudo, mas por não conseguir
tenta se impor pela força.
O certo é que uma política, sozinha, não pode assumir nem resolver todos os
problemas.
Mas o problema é levar a uma política fragmentada, que recorra a experts que
trabalham de forma compartimentada. Por exemplo, deixa-se a política econômica
de um país inteiro nas mãos de um economista que nunca foi político. O resultado é
um pacote econômico sem respaldo público e sem eficácia. Isso tudo faz com que a
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“universalidade concreta”, segundo a qual “o interesse geral não é nem a soma nem
a negação dos interesses particulares” (p. 151).
Em suma, a estratégia da política complexa deve ter consciência das
interações entre os setores e os problemas tratando tudo de forma completa e
interagindo entre os espaços. “Necessita a consciência das interações entre os setores
e os problemas e não pode tratar isoladamente esses problemas e setores” (p. 151).
Deve-se agir não sobre causas isoladas, mas sobre interações entre os problemas que
levam à causa. Exemplo do pesticida: ataca as pragas mas também a qualidade do
alimento. É preciso um tratamento ecológico. Assim ocorre com a política, que
precisa de uma ecologia entre suas causas e efeitos.
Metáfora do motorista no trânsito: às vezes é preciso até pegar uma
contramão para chegar ao objetivo.
Mas essa estratégia política deve operar em três tempos. Os três tempos
devem ser tratados conjuntamente, de modo a permitir não ocorrer descontinuidades
entre cada período (curto, médio e longo prazo). O mais importante é o imediato e o
presente, que requer uma política pragmática do menor mal, às situações de
urgência. Se o doente está muito mal, devem ser tratados os sintomas primeiro, e
depois as causas. A multiplicação do tratamento dos sintomas acaba com o foco nas
causas.
A política de médio prazo tem por objetivo as finalidades terrestres, ou seja, o
associativismo e o “interesse geral”. É uma política de transição.
A política de longo prazo busca as ideias guias, a utopia, as ideias farois.
Há também três espaços, que normalmente não são considerados pela política
tradicional: o espaço das relações pessoais, das relações étnicas, e das relações
planetárias. A antropolítica deve considerar essas três escalas homogeneamente.
A reforma de pensamento
O maior problema do pensamento é o dogma de que quanto mais
especializado e abstrato, melhor. Mas o conhecimento sempre deve ser
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O evangelho da perdição
A aventura desconhecida é a consciência da finitude do ser humano, a
consciência da inconsciência humana.
O conceito de itinerância representa um constante retorno ao presente, ao
passado e ao futuro, revalorizando momentos poéticos, extáticos e autênticos.
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Conclusão – Terra-Pátria
São várias as tomadas de consciência que se complementam, entre elas a
tomada de consciência da unidade e da diversidade da biosfera, que é a consciência
ecológica; a da unidade e diversidade do homem, que é a consciência antropológica;
e a tomada de consciência do dasein, do estar no mundo sem saber porquê.
É preciso fundar a solidariedade humana centrada na consciência da perdição,
na consciência dos problemas comuns.
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Aristóteles na universidade...
Por Eduardo Sens dos Santos, novembro de 2001
Essa infelizmente seria a conclusão mais acertada que alguém poderia tirar da
assertiva do primeiro compadre.
Coitado do Aristóteles, tinha tudo para ser alguém na vida: um filósofo quem sabe;
ou então ser médico; se não o tivessem obrigado a isso poderia virar botânico, ou
biólogo; talvez continuasse a se dedicar à poesia; ou então mudasse o rumo e
passasse a se concentrar em matemática, astronomia; imaginem ele veterinário,
tinha tanto jeito para isso... poderia escrever sobre política ou ética, sobre
veterinária e anatomia animal, imaginem...
Mas Aristóteles não vai ser nada disso. Prestou vestibular para aquilo que mais o
agradava com seus dezessete anos e vai seguir a vida inteira fazendo a mesma coisa,
mesmo que sua paciência se esgote, ou que ele mesmo esgote o assunto, ou que o
assunto o esgote...
Porque ele foi obrigado a contrariar sua natureza inteligente e ilimitada. Forçaram-
no a voltar seus olhos, os radiantes olhos que todo garoto de dezessete anos tem
nessa idade quando descobre algo novo, para um só dos quadros do museu, para
um só dos livros da biblioteca. O crime é tão violento quando o do malandro que
mostra cinquenta pirulitos para uma criança e diz a ela que escolha apenas um
sabor pelo resto da vida, mesmo sem conhecer esse sabor...
Mas, e se Aristóteles não tivesse vivido em nosso tempo? Digamos que tivesse
nascido há muitos anos, talvez até mesmo antes de Cristo? O que teria acontecido a
ele? Teria sido alguém na vida?
Digamos que aos dezesseis anos gostasse de, por exemplo, medicina: escreveria aos
vinte um tratado; e se fosse biologia: pesquisaria e catalogaria milhares de espécies;
política ou ética: talvez escrevesse os textos mais importantes sobre o assunto;
digamos, quem sabe, literatura: não chegaria a ser o melhor, mas sua contribuição
para o mundo seria importante; e na astronomia: andaria a passos largos; e se se
metesse a falar de lógica, matemática ou, podemos pensar em algo completamente
distinto como... veterinária: deixaria, mesmo assim, suas marcas para o resto do
mundo.
Aí, quando quis estudar anatomia e escrever um tratado, teve que ficar seis anos
num curso maçante cheio de memorizações para dizerem que sabia do que falava;
depois, precisou de mais três anos de mestrado e cinco de doutorado para escrever
um tratado, que não foi aceito porque não estava nos padrões científicos...
Que nada, ainda não tinha conseguido o tal reconhecimento público e precisou
escrever diversas outras pequenas obras, sobre assuntos que não lhe interessavam
tanto para, somente então, tentar lançar o grande livro.
não vai descobrir nada de novo nem desafiar regra alguma. Vai ser somente joão, o
aluno de número 4.563 a ter passado pela faculdade...