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A terceirização trabalhista no
Brasil: aspectos gerais de uma
flexibilização sem limite
___________
1. Histórico
$SDUWLUGD6HJXQGD*XHUUD0XQGLDOVXUJLXDQH-
cessidade de aumento da produtividade na indústria bélica,
com o objetivo de manter a oferta de armamento para os pa-
tVHV HP FRQÁLWR &RPR DV JUDQGHV IiEULFDV QmR FRQVHJXLDP
suprir toda a demanda, “a saída encontrada (...) foi remodelar
a forma de produção, transferindo atividades não essenciais a
outras empresas”1. Dessa forma, a indústria percebeu que era
necessário voltar seu foco para a produção de material bélico,
delegando suas atividades secundárias a terceiros2.
$SyVRFRQÁLWRPXQGLDORVSDtVHVYHQFHGRUHVDSUHVHQWDUDP
grandes conquistas no plano econômico. Surgiu, naquele mo-
PHQWRRPRGHORGHSURGXomRWD\ORULVWD3, que aliado ao mo-
delo fordista, conduziu “ao elogio da grande planta industrial
FDSLWDOLVWDFRPJUDQGHVPDVVDVGHWUDEDOKDGRUHVYLQFXODGRVD
funções pouco especializadas, que se conectavam pela esteira
URODQWHGDOLQKDGHSURGXomRµ5.
eQHVWHPRGHORTXHVHLPSOHPHQWDDLGpLDGHKRUL]RQWDOL]DomR10
GD HPSUHVD HP RSRVLomR DR PpWRGR XWLOL]DGR SHOR WD\ORULV-
6 “No cenário da forte crise econômica então desencadeada no Ocidente, com a exa-
cerbação da concorrência interempresarial e mundial, inclusive com a célere invasão,
naqueles anos, do mercado econômico europeu e norte-americano pelo novo con-
FRUUHQWHMDSRQrVWXGRDVVRFLDGRDRGHVHQYROYLPHQWRGDFKDPDGDWHUFHLUDUHYROXomR
tecnológica e das condições macropolíticas desfavoráveis ao Estado do Bem-Estar
Social, passa-se a assistir à incorporação de novos sistemas de gestão empresarial e
laborativa.” In'(/*$'20DXUtFLR*RGLQKRCapitalismo, trabalho e emprego: entre o
paradigma da destruição e os caminhos de reconstrução6mR3DXOR/7US
7 DELGADO, Gabriela Neves. Direito fundamental ao trabalho digno. São Paulo: LTr,
2006.p. 163.
8 DELGADO, Gabriela Neves. Direito fundamental ao trabalho digno. op.cit. p. 163.
9 '(/*$'20DXUtFLR*RGLQKRCapitalismo, trabalho e emprego: entre o paradigma da des-
truição e os caminhos de reconstrução. op. citS
10 “Alguns autores, especialmente no âmbito da Administração de Empresas, usam o
WHUPRKRUL]RQWDOL]DomRGDDWLYLGDGHHFRQ{PLFDHPTXHDVHPSUHVDVWUDQVIHUHPSDUD
outras parte das funções que exerciam diretamente”. In MARTINS, Sérgio Pinto. A
Terceirização e o Direito Trabalho. São Paulo: Atlas, 1997. p. 20.
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11 “Foi para se segurar dos riscos do mercado que Ford verticalizou sua empresa, do-
minando, passo a passo, todo o ciclo produtivo (...). Foi também por isso que acen-
WXRXRVPpWRGRVWD\ORULVWDVGHGLYLVmRGRWUDEDOKRJDUDQWLQGRQmRVyDOWDVWD[DVGH
produtividade, mas sobretudo o controle da resistência operária”. In VIANA, Márcio
Túlio. $SURWHomRVRFLDOGRWUDEDOKDGRUQRPXQGRJOREDOL]DGR2GLUHLWRGRWUDEDOKR
no limiar do século XXI. Revista LTr, São Paulo, n. 7, v. 63, jul./1999, p. 885.
12 '(/*$'20DXUtFLR*RGLQKRCapitalismo, trabalho e emprego: entre o paradigma da des-
truição e os caminhos de reconstrução. op. citS
13 DELGADO, Gabriela Neves. Terceirização: Paradoxo do Direito do Trabalho Contemporâ-
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/XL]*XLOKHUPH5LEHLURGD&UX]
2. Conceito
$SULQFtSLRFXPSUHREVHUYDUTXHDWHUFHLUL]DomRWUDEDOKLVWD´UH-
FHEHRXWUDVGHQRPLQDo}HVWDLVFRPRIRFDOL]DomRKRUL]RQWDOL]D-
ção, outsourcing, externalização de atividades, parceria, contrato
de fornecimento, subcontratação, entre outras”. É necessário,
entretanto, fazer uma ressalva em relação ao termo subcontrata-
omRSRLVHVWHVRPHQWHGHYHVHUXWLOL]DGR´SDUDGHÀQLUVLWXDo}HV
em que a terceirização revestiu-se de ilicitudes (...)”15.
-i/XL]&DUORV$PRULP5RERUWHOODREVHUYDTXH
WUDWDGRVpFKDPDGDSUHVWDGRUD(ÀQDOPHQ-
te, do empregado contratado pela prestadora,
TXHGHVHPSHQKDVXDVIXQo}HVEHQHÀFLDQGRVH-
cundariamente a tomadora21.
3HUFHEHVHDVVLPTXHHVVDIRUPDGHÁH[LELOL]DomRGDUHODomR
de emprego se relaciona à “possibilidade de contratar tercei-
ro para a realização de atividades que não constituem o obje-
to principal da empresa”22&RPLVVRDHPSUHVDEHQHÀFLiULD
poderá delegar à empresa prestadora de serviços a realização
de atividades que não correspondam às suas atividades pri-
márias.
)LQDOPHQWHKiTXHPGHIHQGDDWHUFHLUL]DomRFRPRXPDSRV-
sível solução para as crises de desemprego que se alastraram
pelo mundo, pois, mesmo que precariamente, cria postos de
empregos, possibilitando o desenvolvimento sócio-econômico
dos países que a implementaram.
5XEHQV)HUUHLUDGH&DVWURSDWURFLQDHVVHUDFLRFtQLRDÀUPDQGR
que
27 )216(&$-RmR%RVFR/HRSROGLQRGD*OREDOL]DomRH'LUHLWRGR7UDEDOKR.
Rev. TST, Brasília, vol. 65, n. 1, out/dez 1999. p. 217.
30 CASTRO, Rubens Ferreira de. A Terceirização no Direito do Trabalho. op. cit. p. 75-76.
31 DELGADO, Gabriela Neves. Terceirização: Paradoxo do Direito do Trabalho Contemporâ-
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2WUDEDOKRWHPSRUiULRFRQVLVWHQDTXHOH´SUHVWDGRSRUSHVVRD
física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de
substituição de seu pessoal regular e permanente ou à acréscimo
H[WUDRUGLQiULRGHVHUYLoRVµDUWLJR/HLQ(VVH
tipo de contratação é visto pelos autores como uma forma lícita
de intermediação de mão-de-obraSRLVKiDSUHYLVmRH[SUHVVD
QRDUWLJRGD/HLQ356HQGRDVVLP´RWUDEDOKDGRUSUHV-
ta serviços não para quem o admite, mas para quem contrata a
empresa que o contratou. E não de forma permanente, mas re-
WLFHQWHVHPHOKDQWHHPERUDQmRLGrQWLFDDRWUDEDOKRDYXOVRµ36.
-i D /HL Q GH UHJXOD D VHJXUDQoD SDUD HVWDEHOH-
FLPHQWRV ÀQDQFHLURV LQVWLWXLQGR QRUPDV SDUD FRQVWLWXLomR H
funcionamento das empresas particulares que exploram servi-
ços de vigilância e de transporte de valores. Essa lei possibilita,
ainda, a terceirização permanente dos serviços de vigilância,
“estabelecendo normas para a constituição e funcionamento
de empresas particulares terceirizadas de vigilância no segmen-
to bancário da economia”37.
$QWHULRUPHQWHjDOWHUDomRSURYRFDGDSHOD/HLQDWHU-
ceirização era permitida exclusivamente para os serviços de vi-
´(PIRLVDQFLRQDGDD/HLQTXHWUDWRXVREUHRWUDEDOKRWHPSRUiULR
Nesta lei sim, pela primeira e única vez, dispôs o Direito brasileiro sobre a intermedia-
ção lícita de mão-de-obra. Atendendo a interesses e preocupações das empresas, para
procedimento de necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e perma-
QHQWHRXDDFUpVFLPRH[WUDRUGLQiULRGHVHUYLoRVIRLSHUPLWLGDDLQVHUomRGHWUDEDOKDGR-
res contratados de empresas fornecedoras de mão-de-obra temporária.” In CARELLI,
Rodrigo de Lacerda. Terceirização e intermediação de mão-de-obra: ruptura do sistema trabalhista,
precarização do trabalho e exclusão social5LRGH-DQHLUR5HQRYDUS
35 Compreende-se como empresa de trabalho temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja ativida-
de consiste em colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente
TXDOLÀFDGRVSRUHODVUHPXQHUDGRVHDVVLVWLGRV$UW/HLQ
36 9,$1$0iUFLR7~OLR9HOKRVHQRYRVHQIRTXHVVREUHRWUDEDOKRWHPSRUiULRRevista
Tribunal Regional do Trabalho%HOR+RUL]RQWHQMXOGH]
37 DELGADO, Gabriela Neves. Terceirização: Paradoxo do Direito do Trabalho Contemporâ-
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Revista do CAAP - 1º Semestre - 2009
JLOkQFLDGHHVWDEHOHFLPHQWRVÀQDQFHLURVHWUDQVSRUWHGHYDORUHV
3RUpPFRPDVPRGLÀFDo}HVLQWURGX]LGDVSHODQRYDOHLFULRXVH
a possibilidade de prestação de serviços de segurança privada a
pessoas, estabelecimentos comerciais, industriais, entidades sem
ÀQVOXFUDWLYRVDOpPGHUHVLGrQFLDVHHPSUHVDVS~EOLFDV38.
+iSRUÀPR'HFUHWRQGHTXHGLVFLSOLQDDFRQ-
tratação de serviços pela Administração Pública Federal direta,
autárquica e fundacional. O Decreto citado surgiu com o ob-
jetivo de impossibilitar o desvirtuamento das contratações de
serviços realizadas pela Administração Pública, disciplinando
RVHXREMHWRQRGRDUWLJR
neo6mR3DXOR/7US
CARELLI, Rodrigo de Lacerda. Terceirização e intermediação de mão-de-obra: ruptura do
sistema trabalhista, precarização do trabalho e exclusão social5LRGH-DQHLUR5HQRYDU
p. 108.
MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários às Súmulas do TST. São Paulo: Atlas, 2005. p. 189.
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Revista do CAAP - 1º Semestre - 2009
+iQDGRXWULQDRTXHVWLRQDPHQWRVREUHDSRVVLELOLGDGHGHIXQ-
GLURVLWHQV,H,,,HPVRPHQWHXPVHQGRHVVDKLSyWHVHDIDVWD-
da por Rodrigo de Lacerda Carelli:
3HUFHEHVHGHVVDIRUPDTXHIRUDPGHÀQLGDVVLWXDo}HVHPTXH
DWHUFHLUL]DomRpWUDQVLWyULDFRPRQRFDVRGHWUDEDOKRWHPSR-
UiULR6~PXOD,767H/HLQHVLWXDo}HVQDV
quais a terceirização é permanente, como observado em rela-
ção aos serviços de vigilância, limpeza e conservação, além dos
especializados relacionados às atividades-meio do tomador.
&DEHGHVWDFDUTXHKDYHQGRDSUHVHQoDGRVHOHPHQWRVIiWLFR
jurídicos da relação de emprego, quais sejam, pessoalidade e
subordinação direta, na relação entre a empresa interposta e o
SUHVWDGRUGHVHUYLoRVHQFRQWUDUVHiXPDKLSyWHVHGHWHUFHL-
UL]DomRLOtFLWD$GHPDLVFDVRRWUDEDOKDGRUHVWHMDH[HFXWDQGR
XPDWDUHIDUHODWLYDDDOJXPDDWLYLGDGHÀPGDHPSUHVDWRPDGR-
ra de serviços, caracterizado estará mais uma situação em que
a terceirização é ilícita.
QRUPDVUHODWLYDVDFDWHJRULDGHWUDEDOKDGRUHVGHIRUPDUHWURD-
tiva, com o objetivo de corrigir as parcelas que forem devidas.
6. Conclusão
$WXDOPHQWHDWHUFHLUL]DomRWUDEDOKLVWDpDIRUPDGHÁH[LELOL-
]DomR GRV GLUHLWRV WUDEDOKLVWDV PDLV XWLOL]DGD SHODV HPSUHVDV
Objetivando a redução dos custos e o aumento da produção,
as empresas descentralizam algumas atividades que são consi-
deradas de importância periférica. Assim, o que não representa
DDWLYLGDGHÀPpUHSDVVDGRSDUDHPSUHVDVSUHVWDGRUDVGHVHU-
viços executarem as atividades.
1XPFRQWH[WRKLVWyULFRDWHUFHLUL]DomRVXUJHFRPDOJXPDIRU-
ça durante a Segunda Guerra Mundial, em que as indústrias
EpOLFDVQRVHQWLGRGHDEDVWHFHURVSDtVHVHPFRQÁLWRIRFDYDP
na produção de armamento, transferindo a outras empresas
as atividades secundárias. Porém, é com o advento do modelo
HFRQ{PLFRQHROLEHUDODSDUWLUGRPRGHORGHSURGXomRWR\R-
WLVWD TXH D WHUFHLUL]DomR WUDEDOKLVWD YLUD SUiWLFD FRUUHQWH QDV
empresas privadas.
A legislação existente no País acerca da terceirização ainda é
LQVXÀFLHQWH SDUD UHJXODU XPD PDWpULD WmR FRPSOH[D 'HVVD
forma, os Tribunais superiores interpretam as normas exis-
tentes e editam súmulas, com o intuito de possibilitar a aplicar
da terceirização no Brasil, como no caso das Súmulas 331 e
363 do TST.
Num primeiro momento, a ideia da terceirização torna-se mui-
to sedutora. Como o foco na redução dos custos, essa forma
GHKRUL]RQWDOL]DomRGDSURGXomRQDWHRULDVHULDUHVSRQViYHO
pela criação de um grande número de postos de emprego, já
que as empresas prestadoras de serviços deveriam ter um gran-
de quadro de empregados para atender a demanda.
/XL]*XLOKHUPH5LEHLURGD&UX]
Referências
BRAMANTE, Ivani Contini; MOMEZZO, Marta Casadei. A
terceirização e seus limites. Revista de Direito do Trabalho. Ano
QMXOKRVHWHPEUR
&$0326-RVp5LEHLURGH$6~PXODQGR7ULEXQDO6XSH-
ULRUGR7UDEDOKRHDUHVSRQVDELOLGDGHGDHPSUHVDWRPDGRUDGH
VHUYLoRVSHODVYHUEDVWUDEDOKLVWDVQDWHUFHLUL]DomRRevista IOB.
$QR;9,,Q$EULOGH
CARELLI, Rodrigo de Lacerda. Terceirização e intermediação de
mão-de-obra: ruptura do sistema trabalhista, precarização do trabalho e
exclusão social. 5LRGH-DQHLUR5HQRYDU
Revista do CAAP - 1º Semestre - 2009
'(/*$'2*DEULHOD1HYHV+(15,48(&DUORV$XJXVWR
-XQTXHLUD&RRUGTerceirização no Direito do Trabalho.%HOR+R-
UL]RQWH0DQGDPHQWRV
)216(&$-RmR%RVFR/HRSROGLQRGDGlobalização e Direito
do Trabalho. Rev. TST, Brasília, vol. 65, n. 1, out/dez 1999.
/XL]*XLOKHUPH5LEHLURGD&UX]
Revista do CAAP - 1º Semestre - 2009