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Mais adiante, ela reforça aquilo que ela demonstrou desde do inicio, o seu não
pertencimento ao bairro – ainda que tenha nascido ali e morado só neste lugar a vida
inteira. Pergunto qual a visão dela a respeito da presença da penitenciaria, ela diz não
acha ruim a estrutura física, mas que a existência dela gera outras consequências para o
bairro:
Não é uma estrutura ruim, é muito bacana esse modelo, é uma das melhores do
Estado de São Paulo, o padre da minha igreja é da pastoral carcerária e disse que a
reincidência dessa nossa é muito pequena, o problema mesmo é o CDHU[lado direito
da Vaz Filho, como citei anteriormente] e a vizinhança, que acaba se instalando por
conta da penitenciária e o tráfico é muito intenso, velado, mas intenso...já aprendemos
alguns sinais, as vezes, por exemplo, uma terça de manhã a gente escuta rojão e sabe o
que significa, as drogas chegaram...a minha vizinha de 14 anos fica trancada dentro de
casa porque os pais não deixam ela sair, eles até levam a chave com eles, morrem de
medo dela andar na nossa rua, parece que fica mais presa que os presos
O que se pode analisar da fala da Giovana, é que para eles – que evidentemente
tem uma formação a partir da fala dos seus pais, já que ela os cita - não é que a
penitenciária seja um problema, o problema é a vizinhança que se forma no entorno -,
que em grande parte, principalmente na Vila Biagioni(que é um bairro mais novo que o
Jd.Pinheiros) é formada por familiares de presos ou de ex-presos, quando cumprem sua
pena acabam fixando-se no bairro, principalmente nos prédios do conjunto habitacional
que faz parte dessa vizinhança, mas que por questão de tempo e até mesmo de não
encontrar um mediador para entrar nesse espaço, ficou de fora da pesquisa. A
interlocutora reforça que sua família agora está terminando uma casa em outro bairro
periférico da cidade, mas que (informação verbal/Giovana) graças a Deus nós vamos
mudar no final do ano(2017).
A ambiguidade da interlocutora aparece novamente ao final da entrevista,
quando ela faz um questionamento – retórico, aparentemente – de como será que a
vizinhança tal como ela descreveu, mesmo se deparando diariamente sempre com a
estrutura da penitenciária, tem “coragem” de continuar nesse mundo do tráfico.
Evidente, não tive como responder, não sei se ela esperava uma resposta pronta que
afirmasse a conexão entre a estrutura física do cárcere presente no bairro e as dinâmicas
do tráfico que ali ocorrem De qualquer modo, não há como ignorar o que Goffman
define como estigma logo no início de sua obra, para retratar tanto o que ela questiona, e
– talvez - o porquê de eu acha-la tão ambígua na sua fala e no seu papel de
moradora/observadora: