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Data de criação Os Anos JK: 1979 | Data de término da criação1980

Atualizado em: 14-06-2016

Reprodução fotográfica autoria desconhecida


Histórico
Os Anos JK - Uma Trajetória Política, com produção da Terra Filmes e distribuição da extinta Empresa Brasileira de
Filmes S.A.(Embrafilme), é o primeiro longa-metragem dirigido por Silvio Tendler (1950) e trata da trajetória da vida
pública e pessoal do ex-presidente Juscelino Kubitschek, falecido em 1976, em decorrência de um acidente de carro
na Rodovia Dutra. O documentário é narrado por Othon Bastos (1933), com texto de Cláudio Bojunga, que
reorganiza e apresenta novas leituras a imagens de antigos cinejornais. O cineasta entrevista personalidades que
conviveram com o estadista, caso do marechal Henrique Lott, dos políticos Juracy Magalhães e Tancredo Neves e do
advogado Sindival Palmeira.
Da montagem desses depoimentos com as imagens de arquivo surge um quadro presente em filmes como Getúlio
Vargas(1974), de Ana Carolina, e Revolução de 30 (1980), de Sylvio Back, todos claramente preocupados com o
contexto em que são realizados. Entre 1976 e 1980, período de pesquisa e produção de Os Anos JK, o Brasil está sob
a ditadura militar, marcada por um processo de gradual retorno ao sistema político democrático, com a organização
da sociedade civil e movimentos a favor da anistia política aos exilados e as greves operárias no ABC paulista.
Ao fazer um documentário sobre Juscelino Kubitschek, afastado da política nacional pelos militares nos anos 1960, o
interesse do cineasta não é simplesmente recuperar o percurso e os feitos do ex-presidente, analisando-os apenas
em contextos originais, mas refletir sobre o passado recente do país para pensar os rumos do Brasil contemporâneo,
o que se evidencia desde os planos iniciais do filme. Registros de arquivo de 1946 mostram homens públicos
celebrando a Constituição promulgada após o fim do Estado Novo (1937-1945). Há a promessa de consolidar a
democracia recém-instaurada, e a montagem destaca o líder do Partido Comunista Brasileiro, Luís Carlos Prestes. A
multidão eufórica saúda o novo sistema governamental, numa imagem que Tendler incorpora para, por meio dessa
referência histórica, transmitir uma mensagem de contestação e sugerir a tão desejada abertura democrática.
Esse mesmo procedimento, de mobilizar a experiência passada como reflexão para o presente, está na origem da
construção de uma imagem positiva para Kubitschek. Ele é celebrado como homem sorridente e cordial, responsável
por um projeto de modernização do país e político hábil capaz de conciliar, em sua gestão à frente do Poder
Executivo, os interesses dos grupos políticos de direita e de esquerda, dos latifundiários e dos industriais associados
ao capital estrangeiro. Entusiasta do desenvolvimento nacional, carismático e bem aceito pelas camadas populares,
no filme, Kubitschek personifica o defensor dos ideais democráticos e liberais. Em contraponto ao regime militar em
vigor, Tendler constrói um protagonista heroico que não pode desaparecer da curta memória brasileira, pois é
exemplo de virtude a ser relembrado em meio à obscuridade ditatorial.
No artigo Os anos JK: como fala a história?, publicado em dezembro de 1981 na revista Novos Estudos Cebrap, Jean-
Claude Bernardet (1936) comenta esse procedimento. Para o crítico, Tendler opta por um modelo de interpretação
do país com base em paralelismos comparativos, o que gera uma leitura da história brasileira a partir de jogos de
oposição. Esse "princípio de organização" existente no filme "dispõe elementos em ecos positivos (JK) e ecos
negativos (ditadura militar) (...) Por exemplo: JK pede ao Congresso autorização para processar um deputado,
autorização negada, governo derrotado, JK respeita a decisão. O governo militar quer processar um deputado, é
derrotado, o Congresso é fechado".
Paulo Sérgio Pinheiro, no texto Cinema, historiografia e análise política, publicado na revista Filme Cultura1, observa
que a leitura da trajetória de Kubitschek é favorável ao ex-presidente porque Tendler privilegia a oposição entre
democracia e ditadura: "A interpretação aparentemente se deixa contaminar pelo espírito daquela época, o
ufanismo relido através do plano de metas, cinquenta anos em um (...) [seria] equivocado, como por vezes o filme
tende a fazer, confundir essas artes [políticas] com o desempenho, com a intervenção de um governante
democrático. (...) Foi justamente no governo [JK] que mais se aprofundou, num quadro populista, o uso da estrutura
corporativista da legislação trabalhista e que se promoveu um estrito controle oficial sobre as organizações
sindicais".
Embora aponte que o governo Kubistchek tenha aumentado a dependência do Brasil em relação ao capitalismo
estrangeiro, Pinheiro, tal como a crítica da imprensa da época, elogia Tendler pela realização de um documentário, o
qual, além de animar o debate sobre os rumos da política nacional, se compromete com um posicionamento a favor
da redemocratização do país. Na época do lançamento do filme, em agosto de 1980, a maior parte da crítica
jornalística, mesmo aquela incomodada com o enaltecimento público e privado a Kubitschek, legitima a estratégia de
retorno ao passado para propor uma intervenção crítica contra a ditadura militar. É essa união de esforços em torno
de um processo de abertura política que repercute em inúmeros textos.
Orlando Fassoni, em Anos JK, contribuição para o cinema e a história, crítica publicada na Folha de S. Paulo, em 23 de
agosto de 1980, escreve como a escolha de Tendler em trazer à tona os acontecimentos históricos anteriores a 1964
é fundamental para recuperar a história nacional: em sua opinião, filmes como esse permitem lutar contra os
aparatos ditatoriais de repressão que manipulam a memória dos brasileiros impondo o esquecimento de um breve
período (entre 1946 e 1964) no qual se vive o sistema democrático. Esse assunto é debatido dentro do próprio
documentário, quando são apresentadas as ações dos militares, cuja finalidade é afastar Kubitschek da vida pública
e, consequentemente, forçar seu isolamento político.
Em outro texto publicado na revista Filme Cultura, também de agosto de 1980, intitulado De Getúlio a Juscelino, o
Brasil no cinema, Sérvulo Siqueira aproveita o debate sobre o resgate da história do Brasil para propor, como modelo
governamental para a redemocratização, o estilo populista de JK, seu espírito de negociação e conciliação com as
diferentes lideranças civis da sociedade. Vencedor do prêmio especial do júri e do prêmio de melhor montagem no
Festival de Gramado de 1980, Os Anos JK inquieta não somente a crítica especializada em cinema, mas a
intelectualidade que, no início dos anos 1980, se encontra engajada no processo de redefinição política do país.

Outros documentos:
http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra67261/os-anos-jk
http://www.planetaamericalatina.com.br/artigo/os-anos-jk-uma-trajetoria-politica-de-silvio-tendler
http://cinemadahistoria.blogspot.com.br/2010/06/silvio-tendler-em-jango-e-os-anos-jk.html
https://guiadoestudante.abril.com.br/estudo/como-foi-o-governo-de-juscelino-kubitschek/

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