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“Aprender a aceitar a morte é uma das lições mais importantes que uma criança tem de

aprender na vida”, começo por citar Brenda Mallon e aconselho o seu livro revelador:
“Ajudar as crianças a ultrapassar as perdas, estratégias de Renovação e Crescimento”.

Preocupo-me com o facto de muitos pais e Educadores tenderem a ignorar este tema. Tenho
acompanhado centenas de crianças e constato uma enorme resistência a encarar a morte e os
sentimentos de perda. O assunto geralmente é tabu, o recalcamento impera o que gera
insegurança e angústia. Esta resistência baseia-se na dificuldade crescente das crianças em
lidarem com qualquer frustração, sendo a morte a pior de todas.
Os pais têm tendência a superproteger, a facilitar em demasia a vida dos filhos pois sentem-se
culpabilizados pela pouca disponibilidade que têm e porque vêem o mundo cheio de
dificuldades. Acreditam na necessidade de os proteger do desgosto, pensam ser a melhor
forma de educar. Segundo Brazelton (pediatra de referência) “não podemos nem devemos
proteger os nossos filhos de uma identificação profunda e afectuosa com aqueles que sofrem
uma grande perda, nem podemos evitar o seu próprio desgosto. Este constitui uma parte vital e
inevitável da vida. Sentir saudades de alguém que desapareceu, temporária ou
permanentemente, permite à criança aumentar a sua capacidade de se preocupar com os
outros.”
Antigamente as crianças assistiam e participavam nos rituais e tradições ligados à morte. Por
vezes presenciavam situações chocantes e ninguém questionava até que ponto as poderiam
traumatizar. Desde que se começou a estudar o desenvolvimento psicológico da criança,
aumentou a consciência de a preservar de situações que não é capaz de compreender e que
lhe podem causar sequelas. Esta consciencialização tem tido como consequência uma atitude
radicalmente oposta: a morte faz parte das palavras não ditas, dos tabus.
As crianças estão cada vez mais à margem, sendo excluídas desta experiência para que não
sofram. Este evitamento é tanto maior quanto mais os adultos têm dificuldade em encarar a
morte.
Deste modo cria-se uma situação irreal: não se fala nem se vive a morte como fazendo parte
da vida!
Evita-se a todo o custo este assunto, chegando-se ao ponto de nada dizer à criança mesmo
quando morre uma pessoa próxima. Tenta-se ignorar ou, então, perante as suas questões
insistentes, diz-se que essa pessoa foi para longe, viajou, desapareceu, ou outras respostas
igualmente evasivas. Assim se vai adiando o problema.
Brazelton assegura: “para a criança é melhor compreender a morte através do próprio desgosto
dos pais do que sentir o afastamento deles sem entender a razão para isso. Para uma criança
a noção de morte é muito diferente da de um adulto. Tem tendência a equipará-la com a
sensação de ficar sozinha ou abandonada. Se os pais se alhearem sem compartilharem a
experiência por que estão a passar, isto confirmará os piores receios da criança.”

É essencial a criança encarar a morte como fazendo parte da vida!


Deverá ser preservada de cenas ou ritos chocantes, que excedam a sua capacidade de
compreensão, mas é sempre mais saudável e natural quando a criança vive, em família, o
desgosto e o luto participando nos tradicionais rituais de despedida. Assim, aprende a lidar com
a tristeza, descobre o sentido de chorar em família, a força da união e o consolo subjacente (as
lágrimas ajudam a ultrapassar, a sarar, são catárticas). A criança vive a perda amparada
afectivamente e na altura própria em vez de ser posta à margem ficando numa situação
indefinida que só causa maior confusão, medo, instabilidade e angústia. Desta forma poderá
fazer o luto - depois da fase aguda, do choque e da desorganização será possível a renovação.

A superação da perda depende, também, da experiência de que é aceitável expressar


sentimentos - quanto melhor os pais exteriorizarem e verbalizarem as suas emoções maior
capacidade os filhos terão. Os educadores são modelos muito poderosos de expressão
emocional
Entre os três e os seis anos a criança tem, com frequência, tendência para se sentir culpada da
morte de algum ente querido. Para Brazelton “a criança precisa de ouvir repetidamente que o
facto de ser “mau” não traz retaliações, e que os maus pensamentos não fazem com que as
pessoas morram.” A morte é a negação da vida e, como tal, será sempre difícil de aceitar. A
reacção mais primária é evitar encará-la. No entanto, esta fuga não é construtiva - só
aprendemos a lidar com a morte se a conseguirmos enfrentar, se formos aprendendo que ela é
tão natural como a vida.
Sentir os desgostos alheios e, nessa altura, ser solidário é, de algum modo, uma forma de
preparação para as suas próprias perdas. Mas a preparação começa muito antes, com a
aprendizagem das “pequenas mortes” que acontecem ao longo da vida: as flores; as
borboletas; os animais de estimação; as pessoas distantes, que partem para longe e deixam
saudades; o adiamento da gratificação ou sempre que somos capazes de prescindir de algo e
nos superamos. Todas estas experiências e muitas outras podem fortalecer pois o sofrimento
também faz parte da verdade da nossa vida. Outra forma de preparação é a temática de
numerosos filmes e livros para a infância onde a morte, a perda e o abandono surgem como
assuntos centrais. Não é por acaso que a oferta é imensa - este tema vai ao encontro das
questões mais profundas da criança. Aqui ficam alguns exemplos de filmes e de livros: O Rei
Leão; Peter Pan; Bambi; A Bela Adormecida; Branca de Neve; Babar; Nemo; A Idade do Gelo;
etc. É importante estar com a criança e ajudá-la a gerir as emoções ao identificar-se com os
personagens.
Concluindo… Se as crianças viverem em família, bem amparadas, o drama de perderem algum
ente querido e sentirem que, apesar do sofrimento vivido (tristeza, saudade, zanga, maior ou
menor aceitação) a vida continua, então aprendem uma lição essencial: a morte faz parte da
vida!
“A maturidade e o crescimento passam pela aceitação de que as lições de vida nem sempre
são fáceis de aprender.” Brenda Mallon

Estratégias a seguir
Aqui ficam algumas estratégias para a renovação e crescimento propostas por Brenda Mallon:
Informações claras - dependentes da maturidade, sensibilidade e proximidade; Rituais de
passagem – funeral, missa; Caixa de recordações; Escuta activa – ouvir incondicionalmente;
Protecção – amor, apoio, segurança; Respeito; Desenvolver a auto-confiança – a criança que é
valorizada aprende a valorizar-se.

Evolução
A forma como a criança encara a morte vai evoluindo com o desenvolvimento:
Dos 3 aos 5 anos. Pensamento Mágico (Egocêntrico) – morte = sono = longa viagem – implica
um acordar ou regressar.
Por volta dos 5 anos. Intensifica-se o medo da morte - ansiedade de separação.
Dos 6 aos 10 anos. Crianças intrigadas com a morte – a morte é real mas evitam imaginar que
as pode tocar

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