TUAN, Yi-Fu. Espaço e lugar: a perspectiva da experiência. São Paulo: Difel, 1983.
Elza Yasuko Passini1
Estevão Pastori Garbin2 1 Universidade Estadual de Maringá Departamento de Geografia Av. Colombo, 5790 – CEP 87020-900 – Maringá – Paraná – Brasil elzayp@wnet.com.br 2 Universidade Estadual de Maringá Departamento de Geografia Av. Colombo, 5790 – CEP 87020-900 – Maringá – Paraná – Brasil estevoepg@gmail.com
O livro de Yi-Fu Tuan é quase mágico pequena e limitadora. Quando conhecermos
em sua explanação fazendo com que entremos espaços mais amplos, sentiremos o horizonte em um mundo de conceitos complexos e caros aberto, o ilimitado, diferente daquela cidade à Geografia por meio de reflexões sobre pequena e murada. experiências dos espaços vividos, tornando-os Os títulos dos capítulos já nos motivam próximos e reconhecíveis para um amplo a ler com cuidado e vontade o desvendamento número de leitores. do mundo. O autor nos apresenta, na Yi-Fu Tuan, um dos principais perspectiva da experiência , suas reflexões expoentes da Geografia Humanística, é desafiando a rever os conceitos que temos professor de Geografia da Universidade de armazenado: Minnesota. Suas contribuições à Geografia são • Introdução diversas, e, em geral, humanizam as relações • Perspectiva experimental do homem com seu meio, superando • Espaço, lugar e a criança obstáculos impostos pela Geografia durante • Corpo, relações pessoais e grande parte do século XX, que pouco valores espaciais considerava o homem como um ser composto • Espaciosidade e apinhamento por instintos, fantasia e sonhos. Desta forma, o • Habilidade espacial, conteúdo deste livro é orientado pela conhecimento e lugar “complexa natureza da experiência humana, • Espaço mítico e lugar que varia do sentimento primário até a • Espaço arquitetônico e concepção explicita”. conhecimento Nós estudamos o espaço e o lugar • Tempo no espaço experiencial como categorias geográficas e o autor nos • Experiências intimas com lugar convida a refletir filosoficamente sobre elas • Afeição pela pátria com a afirmação: “O lugar é segurança e o • Visibilidade: a criação de lugar espaço é liberdade: estamos ligados ao • Tempo e lugar primeiro e desejamos o outro”. Espaço e lugar • Epílogo estão intimamente relacionados e devem ser tratados como elementos do ambiente. O livro todo nos desafia com reflexões Ao indagar “o que é espaço?” o autor e análises memoráveis, no entanto, alguns são nos convida a confrontar espaço e mais provocativos, como a frase “As crianças espaciosidade, imaginando-nos em uma cidade são miniaturas no mundo dos adultos, mas
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gigantes em seu mundo de brinquedos” (p. 31) colocando-nos claramente que não precisamos que coloca os investigadores dos caminhos da trabalhar os espaços geográficos em círculos aprendizagem de ciência geográfica pelo concêntricos, permitindo que a criança público infantil a repensar suas propostas extrapole os limites das categorias dos livros metodológicas. O capítulo terceiro - Espaço, didáticos. "Ao ler um livro ou ao ver suas Lugar e a criança - é um convite para os figuras, ela entra rapidamente na fantasia de professores pesquisadores do mundo infantil a um mundo de aventuras”. A imaginação se reestudar as ações das crianças numa apresenta como um forte elemento para criar e perspectiva analítica de observar as ações e dotar os espaços de sentido e emoções: é a reflexos, pois o autor coloca algumas construção do lugar. advertências para que o mundo da criança seja Ainda bastante interessante a estudado e analisado como tal. "Os objetos no perspectiva com que o autor responde à espaço são impressões; portanto tendem a questão "O que caracteriza o laço emocional existir para ele somente enquanto permanecem da criança pequena com o lugar? É preciso em seu campo visual". É a construção da que todos os educadores reflitam sobre essa permanência a que se refere Piaget e que pergunta: pais, professores de diferentes idades conforme descreve Tuan, neste livro, alertando desde a educação infantil aos ciclos iniciais do também que a capacidade de ver está ensino fundamental, pois nem sempre os relacionada a experiências não visuais lugares organizados para acolher crianças são também."… a lua no alto é diferente da lua no adequados. É preciso pensar em um espaço horizonte" e que "a lua se move ao redor da acolhedor, onde a criança se sinta segura com Terra é uma abstração alheia à experiência da referências conhecidas como brinquedos criança: a lua é vista apenas em dados trazidos de casa, fotografias de pais e amigos, momentos, separados por intervalos de tempo colocação de mobília que convide a criança a que a criança sente quase como eternos…" (p. se sentar e se dedicar a algum trabalho como 25). Ele afirma que a criança aprende a ver os quebra cabeça, leituras, desenho, organização indicadores espaciais e ambientais. de material etc. É importante que haja O autor afirma que "As realizações possibilidade de fomentar a imaginação. sensório motoras, não implicam um Passar uma noite no quintal, em uma barraca conhecimento conceitual das relações ou em uma casa na árvore é para elas uma espaciais" concordando com afirmações de verdadeira festa, como se estivessem Piaget sobre a construção da inteligência realmente fazendo uma longa viagem para sensório-motora que precede em vários anos a uma cabana de caçador" apreensão conceitual. Durante as atividades Conforme afirma Tuan, o lugar pode do dia-a-dia, a criança revela habilidades ter um profundo significado para o adulto por espaciais que estão muito além de sua meio de acréscimo de sentimento ao longo dos compreensão intelectual. Ainda afirma que "O anos… é um quadro de referência dinâmica, horizonte geográfico de uma criança expande à mobílias, odores, cores, movimentos. "A medida que ela cresce, mas não criança tem um passado curto, mas seus olhos, necessariamente passo a passo em direção à mais que os dos adultos, estão no presente e no escala maior. Seu interesse e conhecimento se futuro imediato." fixam primeiro na pequena comunidade local, O autor afirma que a criança não tem depois na cidade, saltando o bairro; e da mundo, pois ele é construído pela sua ação, cidade seu interesse pode pular para a nação e seus movimentos. Falta ao espaço do bebê, para lugares estrangeiros, saltando a região. estrutura e permanência que ele constrói ao Na idade de cinco ou seis anos, a criança pode longo da sua vida. As outras crianças, os demonstrar curiosidade sobre a Geografia dos adultos, as informações do entorno e toda lugares remotos." A criança muitas vezes espécie de estímulo auxiliam a formar o interessa-se por notícias de lugares distantes e arquivo. não conseguimos divisar fantasia e realidade,
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São piagetianas as suas referência à experimental de Warner Brown, colocando as capacidade de coordenação de pontos de vista, principais etapas de seu experimento sobre as egocentrismo: "O egocentrismo se manifesta habilidades para os seres humanos aprenderem na tendência em pensar que todos os carros a se orientar em um espaço labiríntico, que vão na mesma direção devem estar indo utilizando padrões táteis-cinestésicos. para o lugar dela.". "Para a criança lugar é um Conforme Brown (apud Tuan) "… a princípio, tipo de objeto grande e um tanto imóvel.(…) A somente o ponto de entrada é claramente ideia de lugar da criança torna-se mais reconhecido; além fica o espaço. após um específica e geográfica à medida que ela tempo, mais referencias são identificadas e o cresce. sujeito adquire confiança no movimento. "Tão logo a criança é capaz de falar Finalmente o espaço consiste em caminhos e com certa fluência, quer saber o nome das referencias familiares - em outras palavras, coisas. As coisas não são bem reais até que lugar." (p. 81). No entanto, Brown afirma que tenham nomes e possam ser classificadas de após essa experiência, se pedirmos aos sujeitos alguma maneira" (p.33). que desenhem o espaço labiríntico percorrido, Através da leitura integral do livro, é há muitas dificuldades para essa reprodução. possível realizar reflexões importantes sobre a E Tuan confirma: "Quando o espaço forma que nós – homens e mulheres, adultos e nos é inteiramente familiar, torna-se lugar". crianças – criamos vínculos e exploramos os As explanações do autor sobre a espaços que nos entornam. concepção de lugar de alguns povos como Nesse sentido, todos os capítulos são Tasadai, de Mindanau que ocupam um ricos e significativos, porém destacamos o pequeno nicho ecológico e sentem-se capítulo 3, por ser um exemplo da perspectiva inseguros em sair do limite conhecido e ainda da experiência e reflexões, como também o relata o autor que eles não têm palavras para capítulo 6 que relataremos a seguir por mar ou lago. Também Tuan relata sobre proporcionar uma articulação entre concepções grupos primitivos de caçadores da Siberia que de espaço e lugar. têm conhecimentos de astronomia. Os Yakute "… a mente, uma vez iniciado o e os Buriate que conseguem reconhecer caminho exploratório, cria grandes e estrelas no céu para se orientarem. complexos esquemas espaciais, que vão muito "O desenho de mapas é evidência além do que o indivíduo pode abranger através incontestável do poder de conceituar as da experiência direta."(p. 76) e em seguida relações espaciais. (…) Se se procura coloca: "A habilidade espacial se transforma conceituar, o resultado pode permanecer na em conhecimento espacial quando podem ser mente em vez de ser transcrito para um meio intuídos os movimentos e as mudanças de de comunicação material" (p. 86, 87). localização" e também esclarece "Andar é uma E como faz em todo o livro, Tuan lança habilidade mas, se eu puder conservar esta uma pergunta provocativa: "Que ocasiões imagem em minha mente que me permita exigem um mapa?(…) Talvez a ocasião mais analisar como me movo e que caminho estou comum seja quando se necessita transmitir seguindo, então eu também tenho eficientemente conhecimento geográfico a conhecimento" (p. 77) outra pessoa. Quando alguém quer saber como ir ao acampamento ou à cacimba, o "Como os seres humanos adquirem a auxílio que mais tempo consome é ir com ele habilidade de ziguezaguear em um ambiente até lá. Em vez disso, pode-se procurar desconhecido, como no caso das ruas de uma explicar verbalmente o caminho e a natureza cidade estranha? os indicadores visuais têm do terreno, mas isto é sempre difícil, porque a importância fundamental, mas as pessoas linguagem serve melhor para narrar eventos do dependem da imagem e de mapas mentais que para descrever relações espaciais conscientes bem menos do que elas possam simultâneas. Um mapa esquemático, pensar. E Tuan faz alusão ao trabalho rabiscado rapidamente na areia, barro ou neve,
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é a maneira mais simples e mais clara de revelar a natureza da região." Os registros em argila, couro ou rochas de cavernas "sugerem um desejo de guardar como relíquia o conhecimento geográfico comum em forma cartográfica." O autor dá o exemplo dos chukchi do nordeste da Sibéria que foram desenhados com sangue de rena sobre tábua de madeira e é possível perceber a excepcional habilidade. Ainda o autor acrescenta que os mapas dos chukchi não ficam nada a dever aos elaborados pelo ministério da Marinha da Rússia por volta de 1900 da mesma região. Pelo conteúdo e a forma com que o autor aborda estes temas, “Espaço e Lugar” torna-se uma leitura obrigatória a todos os leitores que desejam se aventurar pelos caminhos indicados por Tuan.
Data de recebimento: 08.02.2012
Data de aceite: 11.02.2012
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