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Resumo: A análise de regra variável (LABOV, 1972, 1994, 2001) de dados de fala de português brasileiro de 18
informantes da comunidade de Esquina Barra Funda - Novo Machado/RS, revela índices baixos de elevação das
vogais médias átonas finais. A análise de contextos com as vogais /e/ e /o/, juntos, revelou apenas 11% de
elevação. Quando analisados separadamente, /e/ apresentou 4% de elevação e /o/, 9%. Os condicionadores desse
baixo índice de elevação são tanto linguísticos como sociais. Entre eles estão o contexto precedente (dorsal,
coronal [-an] e labial), contexto seguinte (consoantes posteriores e labial), a presença da vogal alta na sílaba
tônica, a idade (36 a 57 anos e 15 a 35 anos) e a escolaridade (de 04 a 08 anos e até 04 anos de escolaridade).
Além disso, as relações entre os indivíduos na comunidade, que apresenta pouca abertura e contato com redes de
fora, a manutenção de costumes tradicionais (por parte dos jovens) e o orgulho do pertencimento ao local
também contribuem para a conservação das vogais médias átonas finais.
1 INTRODUÇÃO
O português falado no Brasil foi, e continua sendo, formado por diversos contatos
linguísticos ao longo da história. Quando focamos o Rio Grande do Sul, notamos a presença
significativa de comunidades que se originaram de processos imigratórios, com destaque para
a imigração italiana e alemã. Além disso, é marcante em diversos locais a presença lusa.
No noroeste do estado do Rio Grande do Sul, em uma região conhecida como
fronteira noroeste, encontramos a cidade de Novo Machado, formada em sua pluralidade por
descendentes de imigrantes italianos, alemães e portugueses. No interior de Novo Machado,
encontramos a comunidade de Esquina Barra Funda, fundada em 1920 por imigrantes alemães
que para ali foram enviados como forma de povoar as regiões brasileiras de fronteira.
O português falado em Esquina Barra Funda apresenta uma nível baixo de elevação
das vogais médias átonas finais, como em nom[e]~nom[ɪ], gad[o]~gad[ʊ]. Vale dizer,
enquanto em alguns lugares, principalmente acima do sul do Brasil, as comunidades
apresentam um comportamento praticamente categórico na elevação vocálica nessa posição
da palavra, em Esquina Barra Funda esses índices são baixos, prevalecendo ali a conservação
das vogais médias (LINK, 2015).
Sabendo que existe essa diferença, este estudo se propõe a analisar a realização das
vogais médias átonas finais no português falado nessa pequena comunidade rural,
1 Doutorando da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Letras, Programa de Pós-Graduação
em Letras, linha de pesquisa Sociolinguística, sob a orientação da Profa. Dra. Elisa Battisti.
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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
feita, pois é nessa posição que se distinguem todas as vogais do sistema. Na posição tônica,
portanto, contrastam /i e Ɛ a ᴐ o u/. Descrevendo essas vogais em relação a sua altura,
teremos: a vogal baixa /a/, as vogais médias de primeiro grau // e /ᴐ/, as vogais médias de
segundo grau /e/ e /o/ e as vogais altas /i/ e /u/. Nessa posição, as vogais produziriam
distinções de significado, como em s[a]co, s[]co (adjetivo), s[]co (1ª p.s. do verbo secar),
s[o]co (substantivo), s[ᴐ]co (1ª p.s. do verbo socar), s[i]go e s[u]co.
Ainda em posição tônica, porém antes de segmentos nasais (sonho, cama), o autor
indica que as vogais de primeiro grau são eliminadas e a vogal central é levemente
posteriorizada. Neste ponto, o sistema vocálico contaria com 5 vogais contrastivas.
Nas posições átonas, ocorre o que Câmara Jr. (2007 [1970]) interpreta como
neutralização, pois há a perda de algumas oposições entre fonemas, com a eliminação da
distinção entre eles, acarretando a redução do número de fonemas: a oposição entre as vogais
médias de primeiro grau // e /ᴐ/ e segundo grau /e/ e /o/ é eliminada, como em b[Ɛ]lo,
b[e]leza, f[ᴐ]rma e f[o]rmoso. Além disso, também nesta pauta a vogal baixa central sofre
uma leve posteriorização.
Chegamos agora à posição postônica, onde, de acordo com Câmara Jr. (2007 [1970]),
as vogais podem ser não finais e finais. Na posição postônica não final, há a neutralização
somente entre /o/ e /u/, em formas como pér[u]la para per/o/la. Por fim, na posição postônica
final, restam três vogais contrastivas, /u/, /i/ e /a/, pois ocorre a neutralização entre as vogais
médias e as altas, em formas como bol[u]para bol/o/ e tim[e] para tim/i/.
Cabe ressaltar aqui que Câmara Jr. (2007 [1970]) tem como base o dialeto carioca e
que as análises tradicionais como a dele não consideravam a variação. Vieira (1994) observa
que a pauta vocálica proposta por Câmara Jr. (2007 [1970]), com afirmações categóricas, não
necessariamente dará conta da variação existente em diferentes dialetos.
2.2 A variação das vogais médias em posições átonas no português do sul do Brasil
de vogal, gênero, escolaridade e etnia. Das variáveis sociais, ou seja, gênero, escolaridade e
etnia, todas apresentaram favorecimento da regra de elevação, sendo os jovens os que mais
elevam. No gênero, são as mulheres que favorecem o processo de elevação.
Vieira (2002) desenvolve um estudo nos três estados do sul do Brasil, nas cidades de
Porto Alegre, São Borja, Flores da Cunha e Panambi no Rio Grande do Sul; Florianópolis,
Chapecó, Lages e Blumenau, em Santa Catarina; Curitiba, Pato Branco, Irati e Londrina no
Paraná. A amostra de Vieira (2002) foi selecionada do banco de dados VARSUL, e foi
composta por 8 informantes para cada cidade. Considerou na análise a postônica final e não
final. Nos ateremos apenas aos resultados para a posição final.
As variáveis controladas por Vieira (2002) para a posição final foram: contexto
precedente, tipo de sílaba, contexto vocálico, localização da postônica na palavra, faixa etária,
escolaridade e localização geográfica. Os resultados para /o/ em posição final indicam
favorecimento das variáveis tipo de sílaba e contexto vocálico, sendo a coda /S/, como citado
em estudos anteriores, importante para a aplicação da regra variável. Também, como
expuseram trabalhos anteriores, a presença de vogal alta na sílaba próxima se mostrou
influenciadora da elevação.
Quanto a /o/, as fricativas /s, z/ e as labiais precedentes, presença de vogal alta no
contexto vocálico e coda /S/ foram favorecedores. A autora cita a variável extralinguística
localização geográfica como determinante na realização das vogais médias átonas, e também
pontua a variável linguística contexto precedente como tendo importante papel na
manifestação variável das átonas finais. Sobre isso, Vieira (2009) nos diz que os falantes do
Rio Grande do Sul tendem a elevar tanto /e/ quanto /o/; os de Santa Catarina apresentam uma
atitude neutra, ao passo que preservam e elevam as vogais médias na mesma medida; e os do
Paraná tendem à preservação das vogais médias.
Em relação às cidades analisadas, Porto Alegre apresenta maior índice de elevação das
vogais médias em posição final e não-final, Curitiba apresenta maior preservação em posição
não-final e Flores da Cunha, Chapecó e Irati apresentam uma maior preservação de /e/. Por
fim, Vieira (2002) conclui que a regra de neutralização está aos poucos sendo introduzida no
sistema vocálico do sul do Brasil, sendo, desta forma, condicionada tanto por fatores
linguísticos como por extralinguísticos.
Outros estudos também contribuíram para a descrição da realização do sistema
vocálico do português brasileiro no sul do país, em especial no Rio Grande do Sul, no que diz
respeito à elevação das vogais médias átonas finais. Silva (2009) analisou a elevação das
vogais médias átonas finais na localidade de Rincão Vermelho, cidade que faz fronteira com a
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Argentina e se localiza no noroeste do Rio Grande do Sul, concluindo que a regra apresenta
aplicação variável nesta comunidade, tendendo mais para a preservação das vogais médias.
A elevação de /o/ ocorre mais geralmente do que a de /e/, o que vai ao encontro de outros
trabalhos já citados: “a análise estatística revelou que em posição final tem-se variavelmente
a oposição entre /o/ e /u/ e /e/ e /i/. Os resultados apontaram, também, que a regra de
elevação de /o/ final encontra-se em um estágio mais avançado em relação à vogal /e/.”
(SILVA 2009, 155)
As análises de Silva (2009) e de Vieira (2002) nos apontam para dois fatores que têm
efeito na aplicação variável da regra de elevação das vogais médias no português do sul do
Brasil. Tais fatores são: a localização geográfica, visto que, para Vieira (2002), em Porto
Alegre a regra de elevação já se aplica categoricamente, enquanto em outras capitais da região
sul o sistema ainda está em processo de mudança; o contato entre línguas, seja com a língua
espanhola, como no caso de Rincão Vermelho apontado por Silva (2009), ou com dialetos
presentes em regiões de colonização italiana e alemã.
Por fim, também Mileski (2013) faz a análise da elevação variável das vogais médias
em posição átona final. Sua pesquisa, realizada na cidade de Vista Alegre do Prata com
descendentes de imigrantes poloneses, apresenta como resultado uma maior preservação das
vogais médias, e, como já esperado pela autora, uma frequência maior de elevação de // em
relação a //. Tal resultado vai ao encontro do verificado pelas pesquisas já citadas: as regiões
de contato entre línguas tendem à preservação das vogais médias, principalmente no sul do
Brasil.
Os estudos revisados revelam fatores que condicionam ou não a elevação das vogais
médias em posição átona. Especialmente no que se refere às variáveis sociais, constatam que
a localização geográfica tem efeito sobre o processo, o que pode relacionar-se a práticas
sociais locais.
2 De acordo com Bonnewitz (2003[1998], p.53-54), na teoria social de Bourdieu os agentes sociais podem
possuir diferentes tipos de capital, em volumes diversos: (a) Capital econômico: Ligado aos fatores de produção
e bens econômicos; (b) Capital cultural: Produzido nos sistemas escolares e familiares, pode ser
institucionalizado (diplomas e títulos), incorporado (expressão oral, postura) e objetivo (posse de bens culturais;
(c) Capital social: conjunto das relações sociais dos indivíduos ou grupos. Relações e atividades (objetivos) em
comum; (d) Capital simbólico: ligado à honra e ao reconhecimento e representado pelos rituais sociais como
etiqueta e protocolo.
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Bourdieu chama de habitus3.Todas essas incorporações que o indivíduo faz ao longo da vida,
seu habitus, definirão seu posicionamento perante o mundo e formarão sua persona.
Labov (1986) já nos dizia que as mudanças no sistema linguístico não ocorrem isolada
e internamente na língua, mas que são resultado, também, de mudanças e pressões sociais,
ocorridas nas comunidades e difundidas nas ligações em rede entre os indivíduos. Buscando
um entendimento sobre as redes sociais e seu papel na manutenção ou difusão de formas e
valores linguísticos, primeiro devemos entender como se dão os modos de participação dos
agentes nas comunidades. De acordo com Meyerhoff (2011), entenderemos as metas
compartilhadas pelos sujeitos de determinada comunidade de prática somente através de um
detalhamento das relações internas do grupo. A análise dessas comunidades e a relação em
rede entre indivíduos poderão nos fornecer informações de como os falantes se influenciam
durante as trocas linguísticas e como acontece seu trânsito entre diferentes comunidades de
prática.
Os indivíduos podem estar ligados a várias dessas comunidades, e são essas ligações
que definirão sua rede social individual. Milroy (1987) nos indica que as redes sociais podem
apresentar diferentes níveis de densidade e multiplexidade. Nas redes sociais de alta
densidade, teremos um grande número de indivíduos conectados, e se essas conexões
ocorrerem através de diferentes formas de ligações (parentesco, trabalho), essa rede também
será multiplexa. Ainda para Milroy (1987), as redes de baixa densidade são as que possuem
poucos indivíduos conectados entre si, podendo também essa rede ser uniplexa, com apenas
uma forma de ligação entre os indivíduos. Abaixo, trazemos figuras de redes presentes em
Bortoni-Ricardo (2011):
a
e
b
d c
Figura 02: Estrutura de rede de alta densidade
Fonte: Bortoni-Ricardo (2011 p. 91)
e b
d c
Figura 03: Estrutura de rede de baixa densidade
Fonte: Bortoni-Ricardo (2011 p. 92)
é a lexical, com formas oriundas de outro sistema linguístico, classificadas por Weinreich
(1953) como empréstimos.
Para o autor, é importante analisar, além dos comportamentos individuais, as atitudes
que os falantes têm em relação aos sistemas linguísticos em contato e, também, as atitudes
que o grupo em que ocorre este contato tem sobre o bilinguismo, pois as relações sociais têm
efeitos sobre os usos linguísticos.
Por fim, cabe ressaltar que o contato de línguas poderá ser experienciado de modo
diferente pelos usuários das línguas envolvidas. Poderá haver interferência na fala individual,
relativa ao que o indivíduo conhece sobre a outra língua, e interferência na língua, resultante
de contatos de longo prazo, já incorporada coletivamente a uma variedade local. Esse último
deve ser o caso da elevação das vogais médias postônicas finais no português falado em
Esquina Barra Funda, Novo Machado/RS, em suas baixas proporções de aplicação.
3 METODOLOGIA
Conforme dados do IBGE (2010), o município de Novo Machado foi criado pela lei
9555 de 20 de março de 1992 e está localizado no noroeste do estado do Rio Grande do Sul.
Tem como municípios limítrofes Doutor Maurício Cardoso, Tucunduva, Tuparendi, Porto
Mauá e, ainda, possui fronteira fluvial (através do Rio Uruguai) com a comunidade de
Colônia Aurora, situada no município de 25 de Mayo, na Argentina.
Figura 04: Noroeste Rio Grande do Sul. Figura 10: Noroeste Rio Grande do SulFonte:
(http://antigo.ses.rs.gov.br/conteudo/387/?14%C2%AA_CRS_%28Santa_Rosa%29) Acesso em 02 ago 2017
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A comunidade de Esquina Barra Funda fica no interior do que era Linha Machado,
atual município de Novo Machado. Esquina Barra Funda é essencialmente rural, composta
principalmente por pequenos produtores que cultivam tabaco e criam suínos e bovinos.
Existem uma padaria e dois mercados na comunidade. Até 2005, existia em Esquina
Barra Funda uma central de recebimento de grãos, chamada popularmente de “moega”, porém
essa acabou fechando devido à concorrência de empresas maiores da região.
Nessa localidade, a maioria dos residentes possui descendência alemã e ainda conserva
a variedade dialetal alemã4 para a comunicação em momentos do dia a dia. Cabe ressaltar que
os donos de ambos os mercados existentes na comunidade sabem falar a variedade alemã e
utilizam-se da língua em diversas situações de comunicação durante o dia, visto que alguns
clientes preferem a comunicação na sua “língua original”.
As localidades que circundam Esquina Barra Funda são: Esquina Carvalho, Barra
Funda Baixa e Lajeado Corredeira, sendo esta última a comunidade com a maior presença
lusa da cidade, além de ser a localidade onde encontramos ribeirinhos, que além da
agricultura também ganham a vida através da pesca. As outras duas localidades possuem uma
semelhança com a comunidade alvo do estudo, pois são predominantemente de colonização
alemã e de pequenos agricultores, sendo que, para ambas localidades, o ponto de referência
nas proximidades é Esquina Barra Funda.
4 Em Esquina Barra Funda os moradores referem-se à variedade dialetal alemã como “alemão”. Ainda há, entre
eles, alguns que nomeiam como alemão-russo, porém o pesquisador não teve acesso a estudos, documentos ou
materiais que esclareçam qual a variedade dialetal ali praticada.
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A variável dependente é a elevação das vogais médias em sílaba átona final absoluta,
isto é, a realização de /e/ como [] e de /o/ como [], alternando com [e] e [o],
respectivamente, em sílabas finais átonas e sem coda. Exemplo, cidad[e]~cidad[],
nov[o]~nov[]. Definimos, então, o fator de aplicação como sendo a elevação das vogais
médias nessa posição.
Na rodada com dados apenas de /e/, a variável dependente é a elevação da vogal média
/e/ em posição átona final absoluta, alternando-se [] com [e]. Na rodada com dados apenas de
/o/, a variável dependente é a elevação da vogal média /o/ em posição átona final absoluta,
alternando-se [] com [o].
As variáveis independentes linguísticas controladas na pesquisa foram:
4 RESULTADOS
Antes da apresentação dos resultados das rodadas, devemos referir o resultado para a
variável bilinguismo, que não foi selecionada pelo programa. Isso se deve, possivelmente, à
grande disparidade na quantidade de dados entre falantes bilíngues e não bilíngues,
disparidade essa devida à quase maioria dos entrevistados falarem uma segunda língua. Assim
mesmo, apontamos aqui que os resultados são: para os falantes bilíngues, o peso relativo foi
de 0,514, e para os não bilíngues, de 0,486, ambos muito próximos do ponto neutro.
Como podemos verificar na Tabela 01, a comunidade de Esquina Barra Funda mostra
um alto índice de preservação da vogal média, ocorrendo a elevação em apenas 9,0% dos
casos, ou seja, em 1022 dados de um total de 11363. Nota-se, também, que contextos
terminados em /o/ são condicionadores da aplicação da regra de elevação, pois o fator /o/
aparece com um peso relativo de 0,578 (acima do ponto neutro) e 11,1 % de realização,
enquanto o peso relativo para o fator /e/ é de 0,324, não favorece a elevação e apresenta uma
proporção 0,324 % de aplicação da regra.
No contexto seguinte, os fatores que ficaram acima do ponto neutro foram consoantes
posteriores (resultado do amálgama entre dorsal e coronal[-ant]) e labial, com pesos de 0,565
e 0,531. Já os fatores vogal, com peso de 0,493, e coronal [+ant], com peso de 0,411, não
favorecem a elevação.
Nosso resultado mostra um peso relativo de 0,616 para contextos com vogal alta na
sílaba tônica (contra 0,384 em contextos sem vogal alta), considerado favorecedor para os
resultados de /e/ e /o/ juntos.
4.1.1.5 Idade
Variável Fator % Peso relativo Aplicação/Total
36 – 57 anos 10,5 0,539 406/3456
4.1.1.6 Escolaridade
A seguir, apresentamos os resultados da análise com dados de /o/ apenas. Assim como
na análise das duas vogais juntas, o programa selecionou variáveis linguísticas e
extralinguísticas. São elas:
- Contexto precedente
- Contexto seguinte
- Vogal alta na sílaba tônica
- Idade
- Escolaridade
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Para a vogal /o/, os fatores favorecedores no contexto precedente foram labial (0,622),
dorsal (0,618) e coronal [-ant] (0,567), semelhantes aos resultados obtidos por Silva (2009):
“[...] o fator dorsal amalgamado com coronal [-anterior] apresenta o maior peso relativo,
0,67, figurando como altamente favorável ao alçamento das vogais médias /e/ e /o/ não
finais. Mostraram-se também favoráveis à elevação, com peso relativo de 0,60, as
labiais.” (SILVA, 2009, p. 139).
Como no resultado da análise conjunta de /e/ e /o/, nos dados de /o/ a presença de
vogal alta na sílaba tônica se mostrou favorecedora, o que nos remete novamente aos estudos
de Vieira (1994, 2002), que observa essa relação entre elevação e vogal alta nas comunidades
de fronteira e de colonização italiana e alemã. Podemos referir aqui também o resultado de
Mileski (2013) na sua análise de uma comunidade de descendentes de poloneses.
4.1.2.4 Idade
Em relação à elevação e à idade para /o/, esperávamos obter resultado semelhante aos
de Roveda (1998), Carniato (2000), e Mallmann (2001), que mostram a tendência dos jovens
a assumir formas inovadoras, o que se confirmou.
3.1.2.5 Escolaridade
Para /o/, assim como na análise conjunta, esperávamos que os resultados fossem
semelhantes aos de diversos estudos anteriores, como o de Silva (2009), em que
“[...]informantes com ensino superior e ensino médio, com peso relativo de 0,71 e 0,66,
respectivamente, mostram-se mais favoráveis ao processo de alçamento da postônica /o/.”
(SILVA, 2009, p. 133). Porém, novamente nos aproximamos do resultado de Mileski (2013),
que aponta que os informantes com Ensino Fundamental são os que mais favorecem a
aplicação da regra, os informantes que desfavorecem a elevação são os com Ensino Superior.
Cabe ressaltar que a divisão feita por Mileski (2013) e Silva (2009) foi de acordo com
a divisão oficial de Ensino (Ensino Fundamental, Médio e Superior) no Brasil, enquanto
nossa divisão foi por anos de escolaridade. Desta forma, como Mileski (2013), temos os
informantes com mais anos de estudo como os que desfavorecem a elevação, e os das faixas
de até 04 anos e de 04 a 08 anos perto do ponto neutro.
Curiosamente, para /e/, o programa selecionou apenas três variáveis linguísticas como
relevantes para a aplicação da regra de elevação das vogais médias átonas em posição final
absoluta. São elas:
- Contexto precedente
- Contexto seguinte
- Presença de vogal alta na sílaba tônica
Para contextos com /e/, exceto o fator vogal, que apresentou apenas dois dados e
nenhuma realização de elevação, todos os outros fatores se mostraram relevantes para a
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realização da regra de elevação. Pela ordem dos pesos relativos, tivemos os fatores dorsal,
com 0,976, coronal [-ant], com 0,955, S/Z, com 0,732, coronal [+ant], com 0,639 e labial com
0,639. Destacamos aqui o fator labial, que mesmo com peso relativo indicando
favorecimento, apresentou apenas dois casos de elevação em um universo de 122 contextos.
No contexto seguinte, o fator vogal apresentou peso relativo de 0,684, sendo o mais
forte condicionador, seguido pelo fator consoantes posteriores, com peso de 0,568, e pelo
fator labial, com 0,567 de peso relativo. Já o fator coronal [+ant] aparece com peso relativo de
0,211, sendo, então, desfavorável à aplicação da regra de elevação.
4.1.4 Cruzamentos
Idade
Escolaridade 15-35 % 36-57 anos % Mais de 58% Total %
anos anos
Até 04Aplic. 160 13 157 13 44 3 361 10
N. Aplic. 1089 87 1030 87 1240 97 3359 90
anos
Soma 1249 1187 1284 3720
De 04 aAplic. 110 10 190 9 126 10 426 10
N. Aplic. 939 90 2067 91 1159 90 3975 90
08 anos
Soma 1049 1877 1285 4401
Mais deAplic. 88 7 59 10 88 7 235 7
N. Aplic. 1229 93 549 90 1229 93 3007 93
08 anos
Soma 1317 608 1317 3242
Total Aplic. 358 10 406 11 258 7 1022 9
N. Aplic. 3257 90 3456 89 3626 93 10341 91
Soma 3615 3862 3886 11363
Tabela 15: Cruzamento entre idade e escolaridade para /e/ e /o/
Idade
Escolaridade 15-35 % 36-57 anos % Mais de 58% Total %
anos anos
Até 04Aplic. 23 6 23 6 4 1 50 5
N. Aplic. 353 94 336 94 366 99 1055 95
anos
Soma 376 359 370 1105
De 04 aAplic. 16 5 20 3 22 6 58 4
N. Aplic. 314 95 645 97 342 94 1301 96
08 anos
Soma 330 665 364 1359
Mais deAplic. 12 3 10 6 12 3 34 4
N. Aplic. 370 97 170 94 370 97 910 96
08 anos
Soma 382 180 382 944
Total Aplic. 51 5 53 5 38 4 142 4
N. Aplic. 1037 95 1151 95 1078 96 3266 96
Soma 1088 1204 1116 3408
Tabela 16: Cruzamento entre idade e escolaridade para /e/
Idade
Escolaridade 15-35 % 36-57 anos % Mais de 58% Total %
anos anos
Até 04Aplic. 137 16 134 16 40 4 311 12
anos N. Aplic. 736 84 694 84 874 96 2304 88
Soma 873 828 914 2615
De 04 aAplic. 94 13 170 12 104 11 368 12
08 anos N. Aplic. 625 87 1232 88 817 89 2674 88
Soma 719 1402 921 3042
Mais deAplic. 76 8 49 11 76 8 201 9
08 anos N. Aplic. 859 92 379 89 859 92 2097 91
Soma 935 428 935 2298
Total Aplic. 307 12 353 13 220 8 880 11
N. Aplic. 2220 88 2305 87 2550 92 7075 89
Soma 2527 2658 2770 7955
Tabela 17: Cruzamento entre idade e escolaridade para /o/
de semana em torno de eventos musicais e, também, os senhores, que aos sábados participam
dos jogos de cartas na comunidade católica.
Nessas comunidades de prática, cada interação implicará uma escolha linguística para
cada indivíduo. Pensando que, nessas comunidades de prática, realizam-se atos de fala
específicos por indivíduos ocupando distintos papeis sociais, podemos dizer que encontramos
aí diferentes mercados simbólicos, onde a utilização da língua por cada membro se orientará
pelo habitus e visará a um determinado lucro simbólico em cada diferente grupo de que o
indivíduo participe.
Baseados nas observações realizadas em Esquina Barra Funda, identificamos
indivíduos que “concentram” os contatos quando se trata das relações com a sede do
município ou, até mesmo, com as cidades vizinhas. É comum na comunidade que todos
saibam quando um determinado morador, principalmente os dono dos mercados ou da
padaria, sairão da comunidade para realizar negócios fora. Com essa informação, os
moradores solicitam a essas pessoas atividades como pagamento de contas, compras de
produtos que não são vendidos por ali, serviços de correios, etc.
Com base nisso, podemos afirmar que existem aí redes de alta densidade, o que pode
nos indicar uma possível resposta aos altos níveis de conservação das vogais médias átonas.
Bortoni-Ricardo (2011) nos diz que as redes de alta densidade tendem a ser mais fechadas às
influências externas e que isso poderia implicar uma maior resistência às mudanças vindas de
fora.
Retomando Eckert (2000), que nos diz que cada indivíduo terá um papel em cada
comunidade de prática de que participe, podendo estar no centro ou na periferia de uma
determinada rede, encontramos em Esquina Barra Funda papéis centrais em indivíduos com
determinada posição. Por exemplo, o dono do mercado, a presidente da OASE, o atendente do
bar, os presidentes das comunidades religiosas, etc. Cada um destes indivíduos, em uma
determinada comunidade de prática, representa um núcleo e, ainda segundo a autora, são estes
representantes dos papéis centrais que poderão influenciar social e linguisticamente o grupo
todo.
Obrigatório mencionarmos aqui que, em Esquina Barra Funda, grande quantidade dos
habitantes é bilíngue, na medida em que fala português e a variedade dialetal alemã. Podemos
exemplificar esse fato quando analisamos diferentes comunidades de prática da localidade,
como o Círculo de Pais e Mestres da escola e a Ordem Auxiliadora das Senhoras Evangélicas.
Esses dois grupos são bastante presentes e atuantes na comunidade, e nos mostram que
um mesmo indivíduo, que participa dos dois grupos, usará alternadamente seus códigos. Dos
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dezoito informantes que fizeram parte desta pesquisa, ressaltamos que catorze declararam-se
bilíngues, sendo doze bilíngues português-alemão, um bilíngue português-italiano e um
bilíngue português-espanhol.
Abaixo apresentamos um quadro (quadro 03) com a frequência de contato entre os
informantes (os nomes foram substituídos por letras na ordem alfabética), sendo que os
números representam: 1 – contato diário, 2 – contato semanal e, 3 – contato mensal.
A B C D E F G H I J K L M N O P Q R
A ### 2 1 3 2 3 1 2 1 1 3 3 2 3 3 2 2 2
B 2 ### 1 3 2 3 2 3 2 1 3 3 1 3 3 2 2 3
C 1 1 ### 3 2 3 3 3 2 1 3 3 2 3 3 3 2 2
D 3 3 3 ### 3 3 2 2 3 2 3 3 3 3 3 3 2 3
E 2 2 2 3 ### 3 2 2 2 2 3 3 2 3 3 2 1 3
F 3 3 3 3 3 ### 3 3 3 2 3 1 2 1 1 3 3 3
G 1 2 3 2 2 3 ### 2 1 2 3 3 2 3 3 1 2 3
H 2 3 3 2 2 3 2 ### 3 3 3 3 3 3 3 3 2 3
I 1 2 2 3 2 3 1 3 ### 2 3 3 2 3 3 1 2 3
J 1 1 1 2 2 2 2 3 2 ### 3 2 1 2 2 2 1 2
K 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 ### 3 3 3 3 3 3 3
L 3 3 3 3 3 1 3 3 3 2 3 ### 2 2 2 2 2 2
M 2 1 2 3 2 2 2 3 2 1 3 2 ### 2 2 2 2 2
N 3 3 3 3 3 1 3 3 3 2 3 2 2 ### 1 3 3 3
O 3 3 3 3 3 1 3 3 3 2 3 2 2 1 ### 3 3 3
P 2 2 3 3 2 3 1 3 1 2 3 2 2 3 3 ### 2 3
Q 2 2 2 2 1 3 2 2 2 1 3 2 2 3 3 2 ### 2
R 2 3 2 3 3 3 3 3 3 2 3 2 2 3 3 3 2 ###
Quadro 03: Frequência de contato dos informantes de Esquina Barra Funda
clubes de damas e cavalheiros e encontros para jantares e almoços, além de atividades como
fazer as compras nos mercados da localidade. Já os contatos mensais ocorrem principalmente
em eventos religiosos, como cultos, reuniões com os membros da igreja, encontros em
palestras sobre saúde, vizinhos mais distantes e entre indivíduos que trabalham por dia e são
contratados quando existe a necessidade de algum ajudante em determinado dia.
A rede social dos moradores de Esquina Barra Funda apresenta, então, características
de multiplexidade, uma vez que as relações podem ser familiares e também comerciais ou de
trabalho. Como exemplo podemos citar alguns informantes na matriz de relações que são
familiares mais distantes em que um dos sujeitos também presta serviços aos seus parentes.
Além disso, outra relação entre esses indivíduos pode ocorrer nas atividades de lazer da
comunidade. Em cada um desses momentos, um papel diferente é assumido.
Interessante apontar, também, a porcentagem total (dados de /e/ e /o/ juntos) de
elevação de cada informante, resultado obtido através das rodas estatísticas, como se vê na
tabela 18:
Informante Porcentagem de
elevação vocálica
A 5.1
B 3.9
C 5.6
D 5.6
E 5.4
F 5.9
G 5.3
H 5.6
I 5.9
J 5.1
K 5.9
L 6.6
M 5.4
N 5.6
O 6.0
P 5.4
Q 5.6
R 5.9
Tabela 18 : Relação de informantes e porcentagem individual de elevação vocálica
31
arrumações, falaram em alemão e escutaram músicas tradicionais, coisa que desde muito não
via.
Outro fator que sempre aparece em conversas entre o pesquisador e os sujeitos de
Esquina Barra Funda é a importância da família. Mencionam o período de final de ano,
quando muitos dos ex-moradores voltam para passar o natal ou a virada de ano com a família
e são reforçados os costumes que ali aprenderam, como ir ao culto de natal para ver a
distribuição de presentes às crianças, a mesa farta e as conversas em alemão.
Outro momento curioso observado pelo pesquisador ocorre durante um encontro com
um senhor de 65 anos, identificado aqui como ZS, que começa a falar dos tempos em que ele
e mais três amigos tinham uma banda que animava festas de Kerb pela região. Z, que é de
origem lusa, diz que nunca soube falar alemão, mas que sempre cantava em alemão, pois as
pessoas não aceitavam que se cantasse em português. Indagado de como fazia, ele diz que
escutava as músicas e decorava as palavras como eram ditas, mas que não entendia e não
sabia escrever nenhuma delas. Acrescenta ainda que sente falta desse tempo e lembra que,
agora, na organização da festa, estão falando bastante em alemão e que ele, mesmo sem falar
ou entender, não se sente excluído, pois muita coisa ele deduz e outras os amigos vão
explicando.
Nas entrevistas gravadas e que deram base para a coleta dos dados quantitativos,
devemos ressaltar que, quando indagados sobre perspectivas de futuro e como percebiam a
vida nessa comunidade, os jovens, em sua maioria, demonstraram satisfação com a vida que
têm ali e que não percebem motivação para mudar para outra cidade.
DB, jovem com 20 anos, fala:
“[…] tem tudo que a gente precisa aqui, se quiser estudar não precisa
ir longe, a prefeitura dá transporte, dá pra ir e voltar no mesmo dia. Os
amigos estão todos aqui, finais de semana nos reunimos pra jogar
futebol ou escutar um som. Não vejo necessidade de sair.”
Os jovens também parecem estar felizes com a vida no campo, pois conseguem suprir
suas necessidades financeiras e, além disso, comprar objetos de seu desejo. EY, de 24 anos,
por exemplo, fala em sua entrevista:
“[…] hoje a gente consegue viver bem da agricultura. Antes acho que
era mais difícil, mas eu sempre trabalhei com fumo e dá pra viver
tranquilo. Comprei minha moto, tenho dinheiro pra ir em festa, os
parentes estão todos aqui, os amigos também. Não tem motivo para
sair”
33
Da mesma forma, os informantes com mais idade não demonstram vontade de sair,
principalmente por acharem que não terão a mesma tranquilidade e os mesmos contatos.
Como informou JP, de 65 anos:
“Não tem motivo pra ir embora, se teria, seriam os filhos, mas eles
moram perto e, se eu for pra cidade, não vou poder sair como saio
aqui, ir na vizinha tomar mate, caminhar um pouco na rua e conversar
com os amigos”
Concluímos então que esse sentimento de pertencer ao local, de estar ali, ter todas suas
relações em um pequeno local, vai ao encontro do fato de que a rede social de Esquina Barra
Funda é densa, multiplexa, fechada, com pouca interação com o que vem de fora. Isso, por
sua vez, reforça o vernáculo local, fator importante nesse baixo índice de elevação vocálica
encontrado na análise quantitativa.
5 CONCLUSÃO
A análise quantitativa apontou baixa elevação das vogais átonas finais em Esquina
Barra Funda. Revelou que alguns fatores linguísticos e extralinguísticos estão em ação na
comunidade, como selecionado pelo programa Goldvarb X e já citado acima: o contexto
precedente (dorsal, coronal [-ant] e labial), o contexto seguinte (consoantes posteriores e
labial), a presença de vogal alta na sílaba tônica (com vogal alta), a idade (36 a 57 anos e 15 a
35 anos) e a escolaridade (de 04 a 08 anos e até 04 anos de escolaridade).
Para além disso, devemos ressaltar que a comunidade apresenta aspectos particulares
no que diz respeito às relações entre seus membros e, desses, com indivíduos de fora. Existe
um entendimento na comunidade de que várias atividades que necessitam ser realizadas fora
dali concentram-se nas mãos de poucas pessoas, ou seja, os indivíduos evitam sair do local
quando não é uma necessidade urgente, preferem fazer suas demandas a outros que vão à
cidade e tomam conta do que lhes foi pedido. Estes responsáveis acabam sempre sendo as
mesmas pessoas, geralmente os comerciantes do local, que, por seu trabalho, necessitam um
maior deslocamento e uma abertura maior para outras redes.
Porém, esses indivíduos que estão em contato maior com outras redes e tenderiam a
uma abertura para formas linguísticas inovadoras também são conservadores, seguem
realizando práticas sociais tradicionais de Esquina Barra Funda. Estão pautados,
principalmente, pelas relações familiares e de conjuntura social daquele pequeno lugar, que
34
exerce forte influência no ser e fazer de cada um e freia a mudança representada pela elevação
vocálica.
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