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CENTRO UNIVERSITÁRIO DO VALE DO IPOJUCA – UNIFAVIP/DEVRY

COORDENAÇÃO DE ROSÂNGELA ARAÚJO


CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO PARA JORNALISMO

LEONARDO CHAGAS VIEIRA

LINGUAGEM TATUAGEM: UMA ANÁLISE SOBRE O GÊNERO DA TATUAGEM


EM PERFIS DE TATUADORES NO INSTAGRAM

CARUARU-PE
2017
Leonardo Chagas Vieira

LINGUAGEM TATUAGEM: UMA ANÁLISE SOBRE O GÊNERO DA TATUAGEM


EM PERFIS DE TATUADORES NO INSTAGRAM

Monografia apresentada ao curso de


Comunicação Social com habilitação em
Jornalismo do Centro Universitário do Vale
do Ipojuca – Unifavip/DeVry, como
requisito obrigatório para obtenção do
título de bacharel em Jornalismo.

Orientadora: Profª. Carolina Cavalcanti


Falcão.

CARUARU – PE
2017
Leonardo Chagas Vieira

LINGUAGEM TATUAGEM: UMA ANÁLISE SOBRE O GÊNERO DA TATUAGEM


EM PERFIS DE TATUADORES NO INSTAGRAM

Monografia apresentada ao curso de


Comunicação Social com habilitação em
Jornalismo do Centro Universitário do Vale
do Ipojuca – Unifavip/DeVry, como
requisito obrigatório para obtenção do
título de bacharel em Jornalismo. Tendo
sido aprovada pela banca examinadora
composta pelos professores abaixo.

Aprovada no dia _____/_____/_____

__________________________________________________
Profª Carolina Cavalcanti Falcão
Orientadora

_________________________________________________
Prof.
Examinador

_________________________________________________
Examinador
Externo
Para eles, que são a base da minha vida e
carreira, meus pais. Que tiveram toda a
paciência e dedicação do mundo para criar
um filho com imaginação demais. Vos amo
com todo o meu coração.
Agradecimentos

Em primeiro lugar, agradeço, como forma de empatia para com a força de


vontade que eu sempre tive a sorte de ter, ao destino. Por sempre me permitir tentar
ser o melhor possível, continuar ultrapassando tantos obstáculos e correr atrás dos
meus objetivos, diante de tantas adversidades vividas nos quatro anos de graduação.
Por mais orgulhoso que pareça ser o fato de agradecer a algo que remete a si mesmo,
acho que se todos nós ficássemos realmente felizes por nossas conquistas que
beneficiam o mundo – ainda que de uma pequena forma -, cada vez mais nos
inspiraríamos a continuar seguindo por bons caminhos. Orgulho demais é abuso, mas
não faz mal se sentir bem por ter cumprido um objetivo importante. Ninguém poderia
colaborar para esse trabalho se eu mesmo não estivesse certo de que é isso que eu
queria fazer.
Agradeço aos meus pais, que sempre fizeram o possível para que eu fosse um
bom menino e agora, um bom homem. Meu pai, Lourival Braz Vieira, por sempre ter
lutado pela minha educação e sempre ter respeitado as minhas decisões. Porque eu
sei quantas pessoas queriam ter um pai como o meu, e eu sou grato ao destino por
ter me trazido para um lar onde a figura paterna é repleta de amor. À minha mãe,
Lucineide Maria das Chagas Vieira, por ser a minha melhor amiga e companheira,
sempre ficando do meu lado e me dando todo apoio e amor que uma mãe pode dar.
Por ser a mulher mais guerreira que eu conheço, mas mesmo assim a mais gentil e
preocupada com os seus filhos. Sempre nos entendemos bem, de forma que ela se
tornou a minha maior força para prosseguir. Tudo que eu conquistar na minha vida,
sei que devo ao incentivo dela. Sem os meus pais, eu seria um homem sem base,
uma construção prestes a implodir. Obrigado por incentivarem meu desenvolvimento.
Agradeço aos amigos que me acompanham no curso de comunicação social e
aqueles que me apoiam de um pouco mais longe. Em especial meus amigos de
Caruaru, que sempre comemoram as minhas conquistas. À Elton Braytnner, Sonaly
Oliveira e Michelle Nogueira, por nesses últimos dois anos de graduação terem sido
a melhor equipe que eu poderia ter. Espero que nossos caminhos se cruzem mais
vezes.
À minha orientadora, Carol Falcão, a quem posso chamar de amiga. Obrigado
por sempre ser justa, sincera e participar da minha vida além do que se refere ao curso
de graduação. Por ter me ensinado tantas coisas e me incentivado em diversas
ocasiões. É uma inspiração para mim. Um dia quero ser inteligente e legal ao mesmo
tempo como você consegue ser.
Minha gratidão se estende também aos outros professores quais tive a sorte
de ter durante a graduação. Em especial, para os professores: Kywza Fideles, Ian
Costa, Heleniza Saldanha, Jurani Clementino, José Carlos de Melo e Iraê Mota; meus
mais sinceros agradecimentos. Professores estes que auxiliaram na minha
compreensão sobre o que é comunicação e me inspiraram na vida acadêmica e
profissional.
Também agradeço ao Centro Universitário do Vale do Ipojuca pelo
acolhimento, recompensa e cuidado que teve comigo, principalmente durante os dois
últimos anos da minha graduação. Agradeço a DeVry Brasil, por ter me premiado com
título de Academic Winner 2017 e ter me levado para conhecer a Califórnia. E a toda
a Turma Lucas Rangel, onde vivi situações que lembrarei para o resto da vida.
A todos, obrigado!
“Quero ficar no teu corpo feito tatuagem,
que é pra te dar coragem
pra seguir viagem
quando a noite vem.”

Tatuagem - Chico Buarque


RESUMO
No intuito de discutir e problematizar sobre uma das produções culturais e sociais que
constroem a identidade dos indivíduos em uma sociedade em que a pressão externa
já não consegue direcionar as produções humanas como fazia no passado, é
importante considerar o fenômeno da tatuagem como uma manifestação válida
mediante o seu uso na comunicação e composição identitária do sujeito na geografia
social. A presente pesquisa tem o objetivo de responder a seguinte questão-chave:
Como o ser humano se utiliza das tatuagens para manifestar/performar o seu gênero?
O objetivo geral proposto é a análise da relação entre a tatuagem e a performance de
gênero, assim como a relação de gênero com a identidade humana. Essa pesquisa
se justifica por levantar o debate sobre uma das produções estéticas e culturais que
constituem a identidade das pessoas, possibilitando assim reflexões sobre a produção
da tatuagem como ela acontece atualmente. A metodologia utilizada corresponde a
revisão bibliográfica de autores que trabalham a tatuagem na construção da
identidade humana e perfis, e a análise da produção da tatuagem em perfis de
tatuadores no Instagram, em busca de verificar pontos da discussão sobre gênero na
produção prática. Quanto ao seu tipo, possui caráter bibliográfico com pesquisa
qualitativa, proporcionando a análise estética e dos discursos. A base de dados
utilizada é composta por estudos sobre as marcas na pele, desde a que foram
encontradas nas estruturas sociais da história do planeta ao fenômeno e os
desdobramentos que resultam na compreensão da tatuagem como ela acontece
atualmente. Apesar das diferenças de propostas, motivações e funções dessas
marcas terem passado por grandes mudanças, a partir dos desdobramentos no
processo técnico e do papel da tatuagem no cenário social, a prática de se tatuar
sempre apontou para a ideia de que a sua produção, além de proposital, sempre
possuiu significados. Pela importância de observar o desenvolvimento histórico e
técnico da tatuagem, e como os processos de se tatuar passaram de fenômenos
culturais com fins supostamente medicinais, até o seu atual caráter social, coletivo e
categórico, e, por fim, a construção da identidade individual como ela se apresenta
atualmente.
Palavras-chave: Tatuagem, Gênero, Identidade.
ABSTRACT
In order to discuss and problematize one of the cultural and social productions that
construct the identity of individuals in a society in wich external pressure is no longer
able to direct human productions as it did in the past, it is important to consider the
phenomenon of tattooing as a valid manifestation through its use in the communication
and identity composition of the subject in social geography. The present research aims
to answer the following key question: How does a human being use tattoos to manifest
/ perform his / her gender? The general objective is to analyze the relationship between
tattooing and gender performance, as well as the relationship between gender and
human identity. This research is justified by raising the discussion about one of the
aesthetic and cultural productions that constitute the identity of the people, thus
allowing reflections on the production of the tattoo as it happens today. The
methodology used corresponds to a bibliographical review of authors who work on the
process of tattooing in the construction of human identity and profiles, and the analysis
of tattoo production in tattoo artist profiles at Instagram, in order to verify points of the
discussion about gender in practical production. As for its type, it has a bibliographic
character with qualitative research, providing aesthetic analysis and discourses. The
database used is composed of studies on the marks on the skin, from which they were
found in the social structures of the history of the planet to the phenomenon and the
unfoldings that result in the understanding of the tattoo as it happens today. Although
the differences in proposals, motivations and functions of these brands have
undergone great changes, from the unfolding of the technical process and the role of
tattooing in the social scene, the practice of tattooing has always pointed to the idea
that its production, in addition of purpose, always possessed meanings. For the
importance of observing the historical and technical development of tattooing, and how
the processes of tattooing went from cultural phenomena to supposedly medicinal
ends, to their present social, collective and categorical character, and, finally, the
construction of individual identity as she presents herself today.
Keywords: Tattoo, Gender, Identity.
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 10
1.1 – OBJETIVOS ..................................................................................................... 14
1.1.1 – OBJETIVO GERAL ...................................................................................14
1.1.2 – OBJETIVOS ESPECÍFICOS .................................................................... 14

2. TATUAGEM: DO ARCAICO AO MODERNO ....................................................... 15


2.1 – A HISTÓRIA DO “TATUAR” ....................................................................... 15
2.2 – O “PORQUÊ” DA TATUAGEM ................................................................... 22
2.3 – O COMPORTAMENTO COMUNICACIONAL DA TATUAGEM ................. 26
2.4 – A TATUAGEM COMO LINGUAGEM ......................................................... 31

3. SEXO, GÊNERO E IDENTIDADE: UNIVERSO DA TATTOO ............................. 35


3.1 – O “GÊNERO PERFORMÁTICO” DE BUTLER........................................... 35
3.2 – TATUAGEM E PRODUÇÃO DE SENTIDO ............................................... 38
3.3 – TATUAGEM, REPRESENTAÇÃO SOCIAL E IDENTIDADE ..................... 41

4. A IMAGEM DA TATUAGEM ................................................................................ 46


4.1 – A TATUAGEM NO INSTAGRAM ............................................................... 46

5. METODOLOGIA ................................................................................................... 49

6. DESENVOLVIMENTO E ANÁLISE ..................................................................... 50


6.1 – CONSIDERAÇÃO INICIAS ........................................................................ 50
6.2 – IMAGENS SELECIONADAS ...................................................................... 51
6.3 – ANÁLISE E RESULTADOS ........................................................................ 52

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 59

8. REFERÊNCIAS .................................................................................................... 61
8.1 REFERÊNCIAS DIGITAIS ............................................................................ 63

9. ANEXO ................................................................................................................. 64
9.1 PERFIS DE TATUADORES MAIS SEGUIDOS EM PERNAMBUCO .......... 64
1. INTRODUÇÃO

Tatuar é o processo de marcar na epiderme humana, de forma permanente,


signos que possuam ou construam sentido para o seu portador e/ou para o(s) seu(s)
observador(es). Esses signos podem ser resultantes de indeterminados contextos de
produção, mas é indispensável compreender que uma marca pigmentada na pele gera
no cenário social espaços para que análises – ainda que primárias – sejam feitas
sobre o “objeto” e o corpo tatuado. Constitui-se de um processo técnico que evoluiu
no decorrer da história e resultou no fenômeno cultural e social que é compreendido
como tatuagem, como ela acontece atualmente.
Essa pesquisa visa identificar a tatuagem como instrumento de comunicação, de
construção de sentido e identidade, e problematizar a produção da tatuagem na
atualidade diante dos aspectos que transmitem características que performam gênero.
De maneira a entender como decorre a história da tatuagem, como esse fenômeno é
realizado e observado na atualidade e como a semiologia, psicologia e sociologia são
capazes de visualizar na tatuagem pontos relativos ao conceito de performance de
gênero, este último discutido pela filósofa pós-estruturalista e pesquisadora
estadunidense Judith Butler.
Ao percorrer sobre os estudos da tatuagem, semiologia e sociologia, de forma
relacionada, é possível compreender que a tatuagem pode ser considerada um
instrumento de produção de sentido e de comunicação. Para alguns autores, a
tatuagem já constitui uma linguagem ou mesmo um gênero discursivo, diante da
estrutura delineada do seu contexto. Uma prática datada de milênios, a marcação
permanente na pele fazendo uso de pigmentos pode ser observada em múmias que
viveram há mais de 5 mil anos (NOVAK, 2012). No espaço entre as primeiras
marcações até a tatuagem de hoje em dia, os processos técnicos, causas,
intervenções, corpos e conceitos mudaram drasticamente, e a tatuagem pode ser
observada em um contexto social muito mais complexo.
Atualmente, a tatuagem assumiu um outro status, atribuindo valores de distinção
para os seus portadores de forma diferente de como fazia no passado - são
apresentadores, cantores e pessoas comuns, que divulgam suas tatuagens nas
mídias e redes sociais e utilizam espaços do seu corpo para exibirem esses signos
como adorno estético -. Sob essa perspectiva de que a tatuagem passa por um
momento de ressignificação no cenário social moderno, é importante ter a

10
compreensão de que uma marca na pele sempre assumiu significados, seja em suas
primeiras representações percebidas historicamente ou em seu contexto atual.
É possível também estabelecer uma conexão sobre como a tatuagem tem sido
realizada atualmente e como sua produção pode estar diretamente ligada ao exercício
das performances de gênero no corpo dos indivíduos. Sob essa perspectiva, apesar
de não ser uma regra geral, nota-se que tatuagens podem assumir “gêneros”. De
modo mais simples, pode-se dizer que algumas tatuagens ainda podem ser
consideradas como “de homem” ou “de mulher”. A problematização dessa concepção
é necessária para o desenvolvimento dos estudos sobre a tatuagem.
A relação entre tatuagem e comunicação, dentro desse projeto, permeia um eixo
temático considerado pouco abordado em seus campos de pesquisa. Esse eixo
consiste na ideia de que a tatuagem moderna/atual é resultado de uma produção
intencional e de autoria do indivíduo tatuado (corpo), que é considerado o autor da
tatuagem mesmo que outra pessoa (no caso, o tatuador) seja quem realize o processo
do “tatuar”. Desta forma, a escolha de como e do porquê os signos serão
representados dão à pessoa tatuada a autoria da mensagem, e essas decisões muitas
vezes acabam sofrendo influências diretas dos conceitos de gênero disseminados na
sociedade. Quando usado o termo “moderna” refere-se ao fato de que atualmente a
tatuagem difere dos significados e dos processos técnicos antes utilizados em sua
produção, em uma sociedade que não a vê mais com tanto impacto e já a reconhece
mais comumente na geografia epidérmica das pessoas.
De acordo com a pesquisadora Vanessa Novak (2012), em seus estudos feitos
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a popularização da tatuagem se
deve a diversos fatores, como os avanços tecnológicos, o crescimento e disseminação
do trabalho de tatuadores profissionais, o aumento do poder aquisitivo da população,
a influência da moda no cotidiano dos cidadãos e a disposição das pessoas de
investirem no próprio bem-estar (NOVAK, 2012). Dessa forma, a tatuagem é
classificada também como uma produção estética, tida como adorno ou acessório de
uma composição visual humana, geralmente baseada em conceitos de moda.
Desta abordagem inicial, têm-se três questões norteadoras da pesquisa: a)
Como a produção da tatuagem pode ser relacionada aos processos de comunicação?
b) De que forma a tatuagem possui relação com os conceitos de gênero? c) Como é
possível enxergar características de gênero em tatuagens presentes em perfis de
tatuadores pernambucanos?
11
Além dos estudos sobre gênero de Judith Butler (2003), essa pesquisa utilizará
estudos de Bourdieu (2003) para aprofundamento sobre questões do gênero no
âmbito da sociologia. Nomes como Bakhtin (2003) e Umberto Eco (1997) serão
referenciados pela contribuição das suas pesquisas quanto aos processos de
comunicação e linguagem. Priscila Novak (2012) e outros teóricos que dissertam
sobre a tatuagem também são incluídos na fundamentação teórica dessa pesquisa.
No primeiro capítulo será realizado um recorte da história das marcas
permanentes na pele. Esse ponto de partida é fundamental para a compreensão do
nascimento e da produção da tatuagem atual. Será também este um espaço de
discussão sobre o papel da tatuagem como instrumento de comunicação e sobre
como essa prática se estrutura de maneira possibilitar seu entendimento como
linguagem. Ainda podemos analisar a visão do corpo como mídia, capaz de suportar
elementos de produção de sentido.
A relação da tatuagem com os conceitos de gênero e sua função em grupos
humanos serão abordados no segundo capítulo. Além da sua relação direta com
composição identitária do sujeito tatuado, a tatuagem é muito mais do que um adorno
na pele. Ela cria situações claramente relacionadas a representação social. Já o
terceiro capítulo é dedicado a explicar o que é o Instagram e como se percebe a
tatuagem quando em uma fotografia.
Diante dessas abordagens, será observado onde as teorias e hipóteses se
cruzam com a prática real da tatuagem. Isso será feito através da análise das
fotografias disponíveis em perfis de tatuadores pernambucanos. Essa etapa ficará
responsável de exemplificar argumentos e ressaltar pontos importantes sobre a
produção da tatuagem nos homens e nas mulheres. Temos assim, como objetivo geral
da pesquisa, relacionar a bibliografia sobre o tema com a produção real da tatuagem
nesses perfis, a ponto de compreender onde é possível observar e problematizar
questões de gênero nessas marcas.
Esse trabalho de conclusão de curso foi realizado em caráter bibliográfico
juntamente com análise qualitativa; consistido em revisão bibliográfica, leitura de
livros, artigos científicos, teses, dissertações e análise de imagens de tatuagens
obtidas em perfis de tatuadores pernambucanos.
Nos últimos anos, crescem os estudos e publicações relacionados às
produções estéticas modernas e ao gênero, portanto esta pesquisa visa relacionar os
dois estudos em um cenário que identifica a tatuagem como um instrumento de
12
comunicação dotado de sentidos de gêneros, mesmo em um espaço onde cada dia
mais surgem variações desses conceitos. Dessa forma, o estudo sobre os sentidos
de gênero na tatuagem necessita de atualizações e recorte temático específico para
conferir a consistência entre a relação tatuagem-comunicação-gênero nos dias atuais.
Também colaborando com a ampliação da literatura em torno da relação tatuagem-
comunicação-gênero, abrindo caminhos para uma qualificada compreensão sobre
esse processo semiológico por meio de um estudo analítico entre a bibliografia
atualizada e a produção da tatuagem em perfis de tatuadores pernambucanos.
Particularmente, o interesse pelo estudo da tatuagem nasce a partir da
percepção da abundância de temas que podem ser abordados diante desse sistema
de signos que cada vez mais se estrutura conceitualmente como uma linguagem. Ao
considerar a produção e efeitos das marcas na pele, como uma manifestação cultural
e social, ao campo da comunicação, essa relação permite uma enriquecedora e
satisfatória composição de um saber acadêmico voltado a servir para futuros
estudiosos das áreas de comunicação e produções estéticas socioculturais modernas.

13
1.1 OBJETIVOS

1.1.1 Objetivo Geral


Compreender e problematizar, através de revisão bibliográfica atualizada, de
discussão conceitual, de estudo analítico, como a tatuagem atua na representação do
gênero performativo no Instagram, ampliando a literatura e o debate sobre conceitos
como: tatuagem e gênero, tatuagem como instrumento de comunicação, e tatuagem
e identidade.

1.1.2 Objetivos Específicos


• Identificar, a partir da semiologia, os aspectos que correspondem aos conceitos
comunicacionais da tatuagem;
• Observar como a tatuagem pode promover as performances de gênero;
• Problematizar os conceitos de gênero a partir da ideia de performatividade.
• Relacionar as performances de gênero a materialidade da tatuagem.
• Identificar e discutir, através de análise, sobre as características que traduzem
conceitos de gênero da tatuagem.

14
2. TATUAGEM: DO ARCAICO AO MODERNO

Nessa etapa será possível conhecer a história da tatuagem à nível mundial e as


teorias fundamentais e básicas que sustentam essa pesquisa. A partir dessa parte se
faz compreensível como as primeiras marcas permanentes na pele surgem e como
sua evolução resulta na tatuagem atual. Encontram-se nessa etapa também as teorias
básicas sobre semiologia, comunicação e gênero. Além disso, também serão
relacionados a produção da tatuagem como acontece atualmente com os processos
de comunicação, construção de identidade e performance de gênero.

2.1 A HISTÓRIA DO “TATUAR”

A tatuagem é um fenômeno cultural e estético percebido há milhares de anos na


história das estruturas socais do planeta. Alguns autores que pesquisam sobre a área
arriscam o argumento de que a prática de ornamentar a pele é tão antiga quanto a
ideia de civilização (Lise, et al, 2009). Sua origem, mesmo que incerta, sempre deu
indícios de que sua existência sempre foi proposital, mas com motivações que se
desdobraram com o passar do tempo. Mesmo nos períodos históricos mais recentes,
como entre o século XX, até a contemporaneidade, é possível perceber que várias
mudanças aconteceram envolvendo a tatuagem, desde o seu papel como
manifestação identitária de tribos a sua aceitação e disseminação no espaço social.
O percurso entre a história e a atualidade demonstrou a capacidade converter e
ressignificar códigos, símbolos e signos. Isso acontece e com clareza se analisarmos
as mudanças, por exemplo, nos papéis representativos do homem e da mulher no
âmbito familiar e profissional. Esses exemplos de ressignificação de conceitos nos
guiam a compreender que esses processos também acontecem com a tatuagem, que
se origina na prática de marcar a pele num cenário arcaico, com supostos fins
terapêuticos e medicinais. É observada em diversas regiões do globo terrestre em
diversas culturas e sociedades, e atravessa milhares de anos até sua grande
disseminação no século XX, ao se tornar símbolo identitário entre tribos como os
marinheiros e rebeldes. Esse fenômeno, também possibilitado graças ao
desenvolvimento técnico do tatuar e a profissionalização dos tatuadores, resulta na
inegável concepção da tatuagem como adorno estético e visual como acontece no
cenário moderno.
15
A produção de marcas na pele é uma atividade cultural e social que pode ser
vista em vários povos há milhares de anos (NOVAK, 2012). Apesar de passar por
várias transformações, pode-se entender que a tatuagem e as marcas epidérmicas
mais antigas - como as dos povos nativos de várias partes do globo – não são
produções tão semelhantes, apesar de se basearem em processos técnicos
parecidos. A tatuagem possui seus próprios significados e história, por isso não pode
ser comparada ao mesmo peso, por exemplo, com as marcas na pele de um nativo
lapita das ilhas da Melanésia. São significantes e significados diferentes, assim como
os contextos nos quais estas marcas aparecem.
Muitos autores, em suas obras, tentam decifrar a origem da tatuagem através do
estudo e pesquisa sobre as primeiras marcas, desenhos, símbolos e signos
associados à pele de forma permanente das quais a história tem conhecimento. Esse
tipo de busca atua como norte para a compreensão do que é o fenômeno da tatuagem
hoje. Por exemplo:

A pratica da ornamentação da pele é um habito tão antigo quanto a


civilização, tendo sido encontrada em múmias do período entre 2000 e 4000
a.C. Não se sabe ao certo sua origem. Alguns autores acreditam que ela
possa ter surgido em várias partes do globo, de forma independente; outros
creem que ela tenha sido difundida pelo mundo com as grandes navegações
dos países europeus. (Lise MZL, et al. 2009, Pág. 632)

Lise et al. (2009) assumem que essas marcações ornamentarias da pele são
observadas em múmias de pessoas que viveram entre 2000 e 4000 anos atrás,
entretanto essa prática pode ser encontrada antes mesmo desse período. De acordo
com Novak (2012):

O primeiro corpo tatuado de que temos conhecimento atualmente é a múmia


Ötzi, descoberta em 1991 em uma geleira alpina localizada na fronteira entre
Itália e Áustria. De acordo com o EURAC-Institute for Mummies and the
Iceman, Ötzi viveu há aproximadamente 5.300 anos. Em seu corpo, há
diversas marcas (pontos, traços retos em paralelo e uma cruz) cuja
pigmentação, segundo estudo publicado em 2009 no Journal of
Archaeological Science (PABST, M. A. et al.), foi elaborada com fuligem. No
total, o corpo de Ötzi apresenta 57 pequenas inscrições, divididas em 10
grupos localizados na metade distal das pernas, na lombar e no punho
esquerdo. (NOVAK, 2012, p. 28)

A pesquisadora, além de constatar que essa atividade é mais antiga do que o


intervalo de tempo que Lise et al. (2009) propõe, vai mais além ao discutir, diante do
resgate histórico dessa prática, que o surgimento do “tatuar” e da configuração do
16
corpo humano como dispositivo de modelização da tatuagem, não ocorreu de forma
casual. Segundo Novak (2012), as marcas encontradas em Ötzi foram supostamente
realizadas com fins terapêuticos, como vestígios de busca por determinada cura para
algum tipo de enfermidade ou situação (NOVAK, 2012). Ela ainda complementa que
as inscrições irreversíveis encontradas na múmia em questão indicam o estado
primitivo da prática do tatuar, decorrente de uma provável tendência do sistema
médico vigente na cultura em que Ötzi viveu.
Entretanto semelhantes exemplos desse tipo de prática são vistos em outras
múmias que supostamente viveram no período antes citado por Lise et al. (2009). É o
caso da múmia da sacerdotisa egípcia Amunet, cuja fama já resultou na construção
de personagens de filmes hollywoodianos como a deusa “Ahmanet”, interpretada por
Sofia Boutella em “A múmia” de Alex Kurtzman, em 2017. Novak (2012) detalha as
inscrições encontradas no corpo mumificado de Amunet:

Entre os anos 2.160 e 1.994 a. C. (equivalentes à XI Dinastia), viveu a


sacerdotisa Amunet, cujos restos mortais foram encontrados em 1891 em
Tebas (Egito). Amunet dedicou-se à adoração da deusa Hathor,
representativa do amor e da fertilidade feminina. A sacerdotisa possuía em
seu corpo alguns conjuntos de linhas e pontos semelhantes aos identificados
em estatuetas enterradas em tumbas masculinas. Embora todas as múmias
tatuadas encontradas no Egito sejam do sexo feminino, há indícios de que a
prática da tatuagem também ocorria entre homens, conforme mostram
algumas peças da arte egípcia. (NOVAK, 2012, p. 28-29)

No caso de Amunet, Novak (2012) ainda diz que não foram encontradas
evidências entre as inscrições no corpo dela e a mitologia egípcia ou suas possíveis
práticas como sacerdotisa na cultura que ela vivenciou. Mesmo assim, é preciso levar
em consideração que outros corpos mumificados supostamente dessa mesma época
e período também apresentam inscrições semelhantes, o que aponta para o fato de
que essas linhas e pontos marcados não estão nesses corpos por acaso.
Até então, a marcas na pele dessas múmias não apresentavam forma
complexas, se constituíam de pequenos pontos, traços curtos e finos, e a mínima
relação entre esses signos não era capaz de transmitir a ideia de que essas formas
geométricas podiam constituir alguma representação imagética ou mesmo algum tipo
de desenho. Essa característica só começa a ser observada em múmias que viveram
aparentemente por volta de 400 anos a. C., no Egito. É nesse período que se percebe
as primeiras representações imagéticas aplicadas à pele de modo permanente. As
imagens encontradas nessas múmias referem-se ao desenho de Bes, o deus das
17
festividades, que “tanto em tatuagens como em vasos e estelas (corpos não humanos)
é representado como um anão – cuja aparência lembra a de um macaco -, vestindo
pele animal” (NOVAK, 2012, p. 33). É relevante citar também que esses desenhos
representando Bes aparecem nas coxas das múmias de dançarinas e músicos.
Ainda segundo a autora, além desse caso, também é possível encontrar imagens
de animais selvagens e seres da mitologia tatuados em múmias do povo Cita,
nômades siberianos que supostamente viveram em uma época próxima às múmias
egípcias que possuem a representação de Bes na pele (cerca de 100 anos de
diferença entre um caso e o outro). Nota-se, portanto, que a produção da prática de
marcar a pele em meados de 2.500 já difere muito do que é observado nas múmias
mais antigas, como Ötzi. Novak denomina esse fenômeno como a tendência pela
“complexificação” da tatuagem (NOVAK, 2012)
A pesquisadora ainda cita em seus estudos outros dois tipos de ornamentações
permanentes na pele, dessa vez observadas em indivíduos vivos. O primeiro caso se
refere ao povo lapita.

Habitantes das ilhas da Melanésia há quase 11.000 anos, os lapita foram


observados por viajantes europeus, pela primeira vez, a partir do século XVII.
Os desenhos das tatuagens lapita são similares aos encontrados em peças
de cerâmica produzidas por esse povo por volta de 1.500 a. C., nas quais
predomina a estampa de motivos geométricos. Além de serem esteticamente
semelhantes à tatuagem, os desenhos na cerâmica eram formados por
pequenas perfurações com pouco espaçamento entre si. O objeto cerâmico
era, portanto, um corpo tatuado - considerando a técnica utilizada (NOVAK,
2012, p. 29-30)

O segundo caso se refere aos povos nativos do Arquipélago das Ilhas


Marquesas, no Oceano Pacífico, onde a prática e significado da “tatuagem1” podem
ser confrontados diretamente com a produção à moda lapita, de maneira a deixar
evidente as diferenças na decisão sobre as marcas que vão ser aplicadas à pele. Para
essa situação, a autora traz as pesquisas de Willowdean Handy, que descreveu a
prática da ornamentação permanente na pele dos nativos das Ilhas Marquesas ao
realizar estudos de pesquisa e observação no local em 1920.

1
. O termo “tatuagem” está entre aspas pois não existe uma definição para o termo quando na cultura
lapita. É preciso esclarecer que o termo “tatuagem” só surge em 1769, através de James Cook. Outros
casos como esse serão encontrados na fundamentação teórica desta pesquisa, quando se referir a
necessidade de usar o termo “tatuagem” como referencial para a prática citada.

18
Handy esteve sempre muito próxima dos nativos para realizar suas
pesquisas. Em uma ocasião, um tatuador (tuhuna patu tiki, como eram
chamados os profissionais da tatuagem) esclareceu que as figuras criadas
para tatuagens são diferentes das que ornamentam objetos, pois seria
inconveniente, por exemplo, comer em uma tigela estampada com imagens
criadas para o corpo. (NOVAK, 2012, p. 29)

Essa descrição corrobora duas questões importantes para a história e


entendimento da tatuagem e a respeito da produção das marcas nessa cultura: (1) a
“tatuagem” – nesse caso - é um processo estético e cultural referenciado, ou seja, os
signos que são aplicados à pele já podem ser categorizados. Não é qualquer imagem,
forma ou inscrição que, nesse caso, pode ser marcada na pele, pois existem “imagens
criadas para o corpo”; e (2) é possível enxergar nessa situação um olhar mais
preocupado para a questão estética, uma vez que se supõe que, com as marcas
categorizadas, é necessário um maior cuidado na representação dessas inscrições
tanto para a sua função estética quanto cultural e social. Esses dois pontos são
relevantes para a história da tatuagem pois revelam que a prática da ornamentação
da pele, nesse período, já difere muito da prática percebida nas múmias de milhares
de anos, seja por questão temporal, cultural, geográfica ou mesmo na composição e
função do indivíduo diante da sociedade em que ele se apresenta.
Quando observada na história mais recente, é possível compreender que a
“tatuagem” enfrentou adversidades ao ser percebida no período histórico em que o
cristianismo assumiu o protagonismo político e social em várias regiões do mundo,
mas principalmente na Europa (NOVAK, 2012). O cristianismo, em abrangente avanço
durante o Império Romano, causou umas das principais intervenções na
disseminação da prática do tatuar, movimento esse que até hoje possui reflexos na
atualidade através do discurso conservador cristão. Em um versículo da Bíblia, no que
se refere ao Velho Testamento, é possível encontrar os seguintes dizeres: “Pelos
mortos não ferireis a vossa carne; nem fareis marca nenhuma sobre vós. Eu sou o
SENHOR.” (A BÍBLIA SAGRADA, Levítico 19:28, p. 87). Já no Novo Testamento:
“Acaso, não sabeis que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo, que está em vós,
o qual tens da parte de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes
comprados por preço. Agora, pois, glorificai a Deus com o vosso corpo.” (A BÍBLIA
SAGRADA, Coríntios 6:19-20, p. 139).

19
Em outros cenários da história é possível começar a perceber que a produção
da tatuagem começa a ser limitada devido as intervenções políticas, culturais e/ou
religiosas. Esse argumento leva a compreensão de que as estruturas sociais, ao se
desenvolverem, estipulam também valores e costumes aos seus indivíduos, criando
uma espécie de “norma” às práticas em uso. O corpo começa a sofrer restrições para
receber as marcas permanentes, de maneira a se notar que algumas regiões da
epiderme passam a ser compreendidas como espaços onde as tatuagens não são
observadas.

Até o século IV, era permitido que gladiadores e mineiros tatuassem as mãos
e os pés. Por outro lado, em imagens pintadas pelo ilustrador John White por
volta de 1590, nativos norteamericanos exibem tatuagens no corpo inteiro,
exceto nas mãos e no rosto. No diário escrito a bordo da embarcação
Endeavour, em 1769, Joseph Banks aponta que todo o corpo dos taitianos é
tatuado, exceto o rosto. (NOVAK, 2012, p. 30)

O termo tatuagem “deriva do taitiano ‘tau’ ou ‘tatau’, que significa ‘ferida, desenho
batido’. Trata-se de uma onomatopeia relacionada ao som produzido pelo instrumento
utilizado para bater no tronco oco” (LISE et, al., 2010, p. 623). Já o termo inglês
“tattoo”, segundo os autores, foi introduzido pelo explorador inglês James Cook, em
1769; e posteriormente traduzido para várias línguas: tattowierung (alemão);
tattuaggio (italiano); tatouage (francês); tattooing (inglês moderno); e tatuagem
(português). É importante ressaltar que a tatuagem não foi conhecida a partir desse
termo na maior parte da sua história. “Antes de ser chamada de tattoo (ou similar), a
prática foi mencionada em registros escritos no Egito e nas civilizações greco-
romanas sob outras denominações” (NOVAK, 2012, p. 40).
Novak (2012) também cita o curioso fato de que Cook foi responsável pela
disseminação da tatuagem entre membros da nobreza europeia. Segundo a autora, a
tatuagem se popularizou nos portos britânicos através do seu alto índice de aceitação
por parte dos marinheiros. Esse fenômeno despertou o interesse dos nobres.

O primeiro registro de tatuagem entre nobres da Grã-Bretanha é uma cruz


desenhada em 1862 no braço do rei Eduardo VII, motivada por sua visita à
Terra Santa enquanto ele ainda era príncipe de Gales. A tradição foi seguida
por seus filhos, que durante uma visita ao Japão foram tatuados pelo
renomado artista Hori Chiyo. (NOVAK, 2012, p. 38)

Outra manifestação importante da tatuagem que não pode deixar de ser citada
ocorreu no Japão. No século XVII, a tatuagem se populariza no Japão de modo
20
decorativo, depois de um período de proibição e negação que durou séculos. Esse
modo de fazer japonês do tatuar é um ponto muito relevante para a história da
tatuagem, uma vez que ela se consolida no país como uma prática que transmite
status, beleza e classe em ordens coletivas.

Quando os japoneses passaram a tatuar desenhos extensos e extremamente


detalhados na pele, a língua natural - palavra escrita - teve considerável
importância na disseminação da prática da tatuagem. (...) nessa fase da
tatuagem japonesa, ocorreu modelização da tatuagem pelo sistema da arte
tanto em termos estéticos quanto em termos técnicos. (NOVAK, 2012, p. 37)

O desenvolvimento do processo técnico foi de fundamental importância para a


disseminação dessa prática a partir, principalmente, da invenção da máquina de
tatuar. Quando essa intervenção tecnológica acontece, a prática de ornamentar a pele
se torna muito mais fácil, menos dolorosa e o aspecto estético da tatuagem melhora
consideravelmente, o que possibilita produções mais trabalhadas, que
consequentemente, acabam por chamar mais atenção dos observadores pela riqueza
de detalhes. Novak (2012) afirma que a modelização através do sistema tecnológico
trouxe para o âmbito da tatuagem uma evolução do seu fazer. Potencializando suas
propriedades, o uso da tecnologia nos processos de tatuar possibilitaram a menor
duração de execução da tatuagem, menos riscos de saúde (mais assepsia), menos
dor, menos dificuldade de manuseio dos instrumentos, mais cores e mais
aplicabilidade de técnicas artísticas.
Lise et al. (2009) explica o fazer da tatuagem como acontece na atualidade,
através de definições técnicas:

Atualmente, as tatuagens são feitas com pigmentos de origem mineral,


principalmente, e com agulhas especificas para tatuar, as quais devem ser
sempre descartadas, nunca reutilizadas (mesmo que sejam na própria
pessoa), assim como as tintas. As maquinas devem, preferencialmente, ter a
ponteira de aço inox cirúrgico e/ou descartável e precisam ser limpas por
ultrassom e esterilizadas em estufa, a uma temperatura de 170ºC ou superior
e por um período de, pelo menos, três horas. (LISE, 2010, p. 623)

Com essa definição é possível compreender o quanto evoluiu a maneira de


produção da tatuagem no decorrer da sua história. Esse ponto de vista torna-se ainda
mais relevante quando nos perguntamos por que o processo técnico passou por
tantas mudanças. Como antes citado, o Japão – com a arte extensa e detalhada na
pele -, seguido pela popularização das tatuagens nos portos europeus através dos

21
corpos dos marinheiros (no período que marca a expansão do comércio marítimo e
da estruturação dos grandes mercados e lógicas mercantis), a tatuagem começa a
dar indícios do seu papel comercial em sua história, fenômeno esse que tem sua
explosão com o desenvolvimento da indústria em várias regiões do mundo.

Essa influência partiu das mudanças no sistema econômico mundial, que


começava a se adaptar às necessidades da sociedade de consumo. A
indústria produzia os bens que o comércio tratava de trocar por dinheiro, em
escala mundial. Em paralelo, as culturas também começavam a comercializar
o resultado das práticas culturais, transformando-as em produtos. No século
XX, grupos de pessoas com ideais e interesses semelhantes ganharam
visibilidade. (NOVAK, 2012, p. 54)

Nesse momento da tatuagem na história das sociedades, é possível observar


que a produção das marcas na pele já não remete em quase nada aos pontos e traços
encontrados nos corpos da múmia Ötzi e Amunet. Isso se deve porque a tatuagem,
durante seu aparecimento em épocas, culturas e sociedades diferentes, construiu
complexidade na sua maneira de ser apresentada e observada. Por exemplo, a
tatuagem que se observa na disseminação da prática “tatuar” durante o
desenvolvimento industrial não pode ser comparada em graus de semelhança de
causa, corpo e função como era usada no povo lapita ou Cita; ou mesmo com a prática
da adornada tatuagem japonesa. Não se deve comparar, por exemplo, a tatuagem de
um astro do pop da atualidade com as marcas encontradas nos povos nativos das
Ilhas Marquesas, onde essa prática se modelizava por questões de gênero 2. São
situações diferentes, apesar de se basearem na mesma premissa de usar pigmentos
sob a epiderme afim de construir formas que produzam sentido.
Das primeiras marcas até a produção da tatuagem como ela acontece
atualmente, as mudanças de contexto possibilitam um estudo amplo sobre as
características dessas marcas em cada etapa da sua história.

2.2. O “PORQUÊ” DA TATUAGEM

Após o resgate histórico da trajetória das marcas permanentes na pele até a


compressão de como o desenvolvimento tecnológico e a lógica do consumo foram

2
Essa modelização da tatuagem como aspecto de diferenciação de gênero nos povos nativos das Ilhas Marquesas
é explicada com mais detalhes no capítulo “Performance de gênero”.

22
fundamentais para a popularização da tatuagem no mundo todo, é preciso também
levantar uma questão: por que alguém se tatua?
Observa-se que no caso das múmias Ötzi e Amunet, as marcas na pele
condizem a uma situação possivelmente terapêutica ou relacionadas à pratica cultural
e religiosa, tendo alguma relação com uma possível busca por uma cura, equilíbrio ou
conexão com alguma ideologia divina ou mesmo mitológica. Essa afirmação já
evidencia a causa da “tatuagem” nesses corpos. No caso dos povos das Ilhas
Marquesas e das Ilhas da Melanésia é evidente o fato de que a prática da
ornamentação da pele é algo resultante das práticas culturais e sociais.
Em alguns povos, a marcação da pele de forma permanente se constitui um
processo extremamente doloroso. Há indícios de culturas em que a “tatuagem” era
feita em conjunto com cortes ou até mesmo queimaduras causadas (e esse tipo de
prática ainda existe, mas obviamente é realizada por pequenas parcelas da
população, uma vez que as culturas tradicionais e nativas diminuem cada vez mais
no cenário moderno). A relação com a dor é, em alguns casos, um dos fatores
fundamentais da motivação da tatuagem em alguns povos. É possível exemplificar
como um desses povos, os nativos de Samoa, na Oceania, onde a tatuagem é
sinônimo de bravura:

Para os habitantes de Samoa, a tatuagem evidenciava características que


todos os nativos deveriam possuir, sem considerar as particularidades de
cada pessoa. Nessa cultura, o corpo que suporta a arte deve, antes, suportar
a dor. Suportar a dor é como suportar a morte - e um corpo sem as marcas
da dor superada é um corpo morto. (NOVAK, 2012, p. 31)

Outro caso onde fica evidente que a prática da “tatuagem” condiz, na verdade, a
uma condição para o convívio social é o povo maori:

A dor também é a chave para a compreensão da tatuagem maori


(denominada moko), praticada na região da atual Nova Zelândia. A tatuagem
é uma provação social que desafia a coragem dos homens e os torna aptos
à atração pelas mulheres. Prova de bravura e motivo de orgulho, a tatuagem
maori era obtida por um processo extremamente doloroso e, quando
finalizada, apresentava características de escultura mais do que de pintura:
tratava-se da escarificação, técnica utilizada na formação de relevos e
distorções no corpo humano (e, especialmente, no rosto, para a cultura
maori). As perfurações para a escarificação devem ser profundas,
consequentemente mais dolorosas do que as realizadas em tatuagens
comuns. (NOVAK, 2012, p. 31)

23
A importante questão que se pode abordar nesse capítulo não diz respeito a
esses povos, quando há um contexto onde a prática de marcar a pele se baseia
estritamente (e obrigatório em alguns casos) em preceitos terapêuticos, religiosos,
culturais ou sociais, mas quando a tatuagem – através dos processos técnicos, e o
seu uso começar a constituir a representação da identidade do sujeito – começa a ser
reconhecida como um processo estético, de composição visual e de identidade em
um âmbito de liberdade para se marcar.
Antes desse processo, é preciso compreender que a prática de possuir marcas
permanentes na pele e outros adornos, em alguns povos, mesmo que sobre a
obrigação ou influência social, já podia ser entendida como também uma
manifestação de identidade. A pesquisadora Rafaela Melo, em seus estudos
realizados pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília, em 2007, aponta argumentos
para esse fenômeno. Segundo a autora, “a insatisfação com a aparência dentro de
culturas exóticas leva o homem ao auto-embelezamento, usando a tatuagem como
um fator de diferenciação.” (MELO, 2007, p.13). Araújo (2006) aponta de forma mais
detalhada esse processo, ao exemplificar que não só as tatuagens como outros
adornos, como piercings, são como uma “carteira de identidade” nas sociedades
tradicionais, de forma a transmitir características de um povo, nível hierárquico e
reconhecimento de tribo ou clã, apenas ao olhar tais pontos da composição visual do
indivíduo.
A autora do livro “O corpo como suporte da arte: piercing, implante, escarificação,
tatuagem”, Beatriz Ferreira Pires (2005), traz argumentos sobre a motivação da
tatuagem onde não há obrigação social, cultural ou influência externa. Ou seja,
quando a produção, signo escolhido, forma e local da tatuagem são resultados da
decisão não compulsória do sujeito. Ela afirma que na sociedade atual, as pessoas se
tatuam não por uma iniciativa social, mas pessoal; e, apesar da sociedade não ser
capaz de impor esse tipo de produção na pele, o indivíduo a adquire quando se sente
preparado para possuí-la (PIRES, 2005).
Diante dessa afirmação, nota-se que um indivíduo, atualmente, quando faz uso
de sua própria liberdade física, ideológica e cultural, assume total autoria das práticas
que correspondem a estética do seu corpo. Essa “liberdade” de produção, além de
fundamental para a percepção da tatuagem como um fenômeno social como pode ser
visto hoje, também traz para o seu contexto elementos de áreas em que pode se

24
referenciar, por exemplo a mídia, o entretenimento e até mesmo a publicidade. Além
de abrir espaços para a criação de gêneros estéticos da tatuagem3.

Atualmente, podemos perceber, nos diferentes gêneros de tatuagem, uma


infinidade de recodificações de outras linguagens. Sistemas semióticos tão
dinâmicos, como os da mídia e das artes, frequentemente encontram espaço
nas fronteiras da semiosfera do sistema da tatuagem, onde contribuem para
a conservação de gêneros como o realismo, o tribal, o arabesco, o HQ, o
surreal, o grotesco, etc. Esses sistemas em contato nas regiões fronteiriças
das semiosferas interferem, também, no repertório de imagens preferenciais
entre as pessoas tatuadas. (NOVAK, 2012, p. 64)

É possível encontrar, ainda nos estudos de Novak (2012), uma análise


exemplificada sobre os desdobramentos e mudanças da motivação da “tatuagem”
entre os povos nativos das Ilhas do Pacífico, por exemplo, e a tatuagem da atualidade.
Ela afirma que pontos históricos que envolvem a tatuagem e a tecnologia marcaram
deslocamentos importantes na semiosfera de algumas culturas, de forma a
transformar a “receita” da tatuagem, agilizando e facilitando do seu processo.
Entretanto, ela afirma que existem alguns pontos de semelhança entre as duas
práticas (a marcação da pele como se vê nos povos nativos e como ela acontece na
atualidade).

Ainda assim, não se perdeu o sentido do nome tattoo, e nem o aspecto


ritualístico de se tatuar. Este último é garantido pela propriedade mnemônica
do sistema semiótico da tatuagem. A imagem tatuada permanece no corpo
por tempo indefinido, podendo ultrapassar até mesmo o ponto de tangência
entre vida e morte (como se percebe nas múmias que apresentam
tatuagens). (NOVAK, 2012, p. 67, 68)

Contudo, é importante ter cuidado com esse tipo de afirmação. Atualmente


existem processos de remoção de tatuagem, sinais e cicatrizes, e o “tempo indefinido”
que Novak (2012) cita já não pode ser compreendido como uma realidade imutável.
Considerações como essa só podem ser estimadas em situações em que não há a
intenção de “apagar” os signos aplicados permanentemente na pele. Portanto, a
tatuagem na modernidade não pode ser considerada uma produção de duração
indeterminada. Apesar da sua característica de permanência na epiderme, sua

3
É sob essa perspectiva que se observa, por exemplo, a tatuagem japonesa hoje em dia. A prática extensa e
detalhada da tatuagem japonesa, como observada no período da sua popularização no Japão no século XIX,
acabou se tornando um gênero da tatuagem até hoje muito usado por praticantes da tatuagem.

25
apresentação pode ser alterada – de forma a modificar seu sentido ou transformá-lo
completamente – ou mesmo extinguida.
Por fim, é observado que atualmente a tatuagem assumiu um outro status,
atribuindo valores de distinção para os seus portadores diferente de como acontecia
e acontece com povos nativos e tradicionais. Por exemplo, a tatuagem hoje não é um
fator de diferenciação hierárquica ou de sexualidades. Ela sempre possibilitou a
distinção do sujeito tatuado, mas de maneiras diferentes em contextos, regiões e
períodos históricos. Sob essa perspectiva de que a tatuagem passou por um momento
de ressignificação no cenário social moderno graças ao desenvolvimento tecnológico
da sua prática, sua relação com produções da indústria do entretenimento, a sua
observância nas mídias de massa e digitais, além de outros meios, é importante ter a
compreensão de que uma marca na pele sempre assumiu significados, seja em suas
primeiras representações percebidas historicamente ou em seu contexto atual.

2.3 O COMPORTAMENTO COMUNICACIONAL DA TATUAGEM

Illana Polistchuk e Aluísio Ramos Trinta afirmam, no livro “O pensamento e a


prática da Comunicação Social”, de 2003, que o processo da comunicação está
diretamente ligado a composição da identidade e do relacionamento humano. De
acordo com os autores, a comunicação “compõe o processo básico para a prática das
relações humanas, assim como para o desenvolvimento da personalidade individual
e do perfil coletivo. Pela comunicação, o indivíduo se faz pessoa, indo do ser singular
à relação plural” (POLISTCHUK; TRINTA, 2003, p. 62-63).
Em acréscimo a esse argumento, no livro “A Estrutura Ausente”, Umberto Eco
(1997) afirma que a semiologia é capaz de estudar todo e qualquer fenômeno cultural
como se fossem sistemas de signos – “partindo da hipótese de que na verdade todos
os fenômenos de cultura são sistemas de signos, isto é, fenômenos de comunicação”
(ECO, 1997, p. 3). Sob a luz dessa afirmação, portanto, é possível entender que, tanto
as marcas na pele dos povos milenares e nativos, quanto a tatuagem como é feita
hoje, são comportamentos dotados de sentidos e intenções, portanto comportamentos
comunicacionais.
Ainda que supostamente não tenha sido a intenção de Ötzi, Amunet e outros
exemplos antigos de constatação da “tatuagem”, usar as marcas em sua pele como
instrumento de comunicação, é preciso deixar claro que toda produção humana,
26
quando diante da observação de um sujeito, gera nele interpretações semióticas,
mesmo que ele não tenha consciência disso.
Voltando um pouco a um dos argumentos que discutem sobre o porquê das
pessoas se tatuarem, em relação a premissa de que a tatuagem corresponde a um
comportamento comunicacional, podemos recorrer a teleologia do ponto de vista
aristotélico. Esse enfoque é direcionado acentuadamente ao conceito filosófico do
indivíduo, diferente da sociologia com o seu “sujeito social”. Aristóteles, no livro “Ética
Nicômaco” (1984), afirma que a ação humana é baseada no finalismo. Isso quer dizer
que tudo que o ser humano faz, ele faz com uma finalidade. Para o filósofo, toda ação
de um indivíduo tem objetivos claros em direção ao bem, seja esse “bem” a si próprio
ou ao coletivo. Esse passeio pela visão de Aristóteles (1984) possibilita de imediato a
conclusão de que a tatuagem, resultado de uma ação humana, tem um propósito de
existência, um resultado para algo. A pesquisadora Ana Rosa Luz (2015), em trabalho
de análise sobre a obra aristotélica no que corresponde ao teleologismo, diz:

Segundo Aristóteles, é da natureza humana direcionar todas as suas ações


para uma finalidade, última ou não, tendo em vista que toda ação tem uma
intencionalidade inerente a ela. Ou seja, toda ação é praticada a partir de um
objetivo, a partir de algo que se deseja obter com aquela ação. A ética
aristotélica, então, tem como o ponto fundamental descrever qual seria o
objetivo último ao qual se dirigem as ações humanas e a razão de o ser. (LUZ,
2015, p. 79)

A visão aristotélica se baseia em premissas filosóficas que argumentam sobre


a busca humana pela felicidade, através das ações que sempre estão direcionadas a
essa recompensa. Essa ação, trazida pelo filósofo, se refere a qualquer ação, mas
nessa pesquisa a proposta é analisar a ação enquanto a prática da marcação
permanente na pele, ou seja, prática e ação estética. E para realizar essa análise é
preciso ter como ponto de partida que o exercício da comunicação e da interpretação
humana não se baseia apenas em configurações verbais, mas também imagéticas.

É tal a distração que a aparente dominância da língua provoca em nós que,


na maior parte das vezes, não chegamos a tomar consciência de que o nosso
estar-no-mundo, como indivíduos sociais que somos, é mediado por uma
rede intrincada e plural de linguagem, isto é, que nos comunicamos também
através da leitura e/ou produção de formas, volumes, massas, interações de
forças, movimentos; que somos também leitores e/ou produtores de
dimensões e direções de linhas, traços, cores... Enfim, também nos
comunicamos e nos orientamos através de imagens, gráficos, sinais, setas,
números, luzes...Através de objetos, sons musicais, gestos, expressões,
cheiro e tato, através do olhar, do sentir e do apalpar. Somos uma espécie

27
animal tão complexa quanto são complexas e plurais as linguagens que nos
constituem como seres simbólicos, isto é, seres de linguagem. (SANTAELLA,
1983, p. 10)

Com isso, é aceitável evidenciar que a ação humana é comunicativa e


proposital, podendo assumir papéis da interpretação entre o indivíduo que a produz e
outro que a observa ou mesmo interage com essa ação/indivíduo. Por outro lado, é
necessário compreender o corpo humano como um espaço de grande potencial
comunicativo. É através dele que as tatuagens se projetam no cenário social e são
expostas às interpretações semióticas por parte de quem as observa. É importante
ressaltar ainda que quem se tatua, mesmo na atualidade, pode não possuir
consciência de que está possibilitando um caso de comunicação. Mas como antes
evidenciado, essa prática não necessita de consciência para se constituir como tal.
Baitello Junior (2005), no livro “A era da iconofagia: ensaios de comunicação e
cultura”, se utiliza das características físicas do corpo humano para o definir como
uma “mídia”:

O nosso corpo é de uma riqueza comunicativa incalculável. Um levantamento


das linguagens faciais pode resultar em um dicionário muito maior que o
Aurélio. A quantidade de músculos e de possibilidades de movimentos de
cada músculo pode gerar uma "palavra" de linguagem corporal - os vincos, a
presença do tempo, a pele, os cabelos, os movimentos de cada músculo da
face ou dos membros visíveis, há uma infinidade de frases possíveis nessa
linguagem. Imaginem quando se juntam as "falas" do rosto, dos ombros, do
pescoço, da testa, dos cabelos ou sua ausência, dos braços, das mãos, dos
dedos, da postura. Sem sombra de dúvida, é esta a mídia mais rica e mais
complexa. (BAITELLO JUNIOR, 2005, p.32)

O autor considera o corpo uma “mídia primária”, aquela que se faz presencial,
tendo limitações de espaço e tempo muito restritas, fechadas ao “aqui e agora”. O
autor sugere que mesmo que existam mídias secundárias (com o espaço como limite
– livros, esculturas, cinema; que exigem a presença física do interlocutor para realizar
comunicação) e mídias terciárias (que transmitem os sinais sem necessidade de
suporte e necessitam de meios e equipamentos de transmissão de mensagens, como
a internet e televisão que podem transmitir mensagens fragmentadas), “a mídia
primária é o começo e o fim, sempre, de todo processo de comunicação" (BAITELLO
JUNIOR, 2005, p. 34).
Diante disso, é preciso então compreender que o corpo, para além do seu
potencial comunicativo, pode ter essa capacidade ampliada através do uso de

28
produções humanas e alterações comportamentais e estéticas, características essas
encontradas em todos os povos. Melo (2007) afirma que:

O corpo é uma forma de expressão individual e representa os valores comuns


à vida em sociedade em diferentes formas, no tempo e no espaço. Por meio
do corpo, é possível fazer uma análise de elementos sociais e históricos, já
que este foi um dos primeiros instrumentos utilizados pelo homem para
expressar um significado. (MELO, 2007, p. 6)

Em seu trabalho monográfico, Melo (2007) traz também uma citação da psicóloga
clínica, Maria Luíza Aparecida Curti, em um artigo publicado no site Domínio Feminino,
em 12 de abril de 2002:

“Penso que a tatuagem, seja ela qual for, encerra mensagens e quem a
“comete”, a faz para o outro. Se fosse para si mesmo, ninguém a faria nas
costas, no pescoço ou em qualquer outro lugar onde ela própria não pudesse
ver, porém, se está apenas transmitindo mensagens, não há necessidade de
enxergá-la.” (CURTI, 2002, apud Melo, 2007, p. 11)

A conclusão de Melo (2007) é a de que tatuagem, por ser um signo, uma forma
de comunicação muitas vezes inconsciente, permite que o desenho tatuado seja um
símbolo codificado. Uma espécie de “segredo visível”. (MELO, 2007, p. 11)
Exemplificando esse processo, podemos citar Pierce. O filósofo e linguista assume
em seu livro “Semiótica” (2000) que “a única maneira de comunicar diretamente uma
idéia é através de um ícone; e todo método de comunicação indireta de uma idéia
deve depender, para ser estabelecido, do uso de um ícone” (PIERCE, 2000, p. 64).
Melo (2007) argumenta que, mesmo que o indivíduo não saiba o motivo do símbolo
que ele escolheu para tatuar, de certeza existe uma identificação desse indivíduo com
esse ícone. “É uma forma inconsciente de mostrar aos outros um gosto pessoal”
(MELO, 2007, p. 19).
Esse ícone, quando analisado sobre a tatuagem, se constitui de um objeto
material: a tinta, disposta em formas na pele. A prática de se tatuar nada mais é do
que a técnica de inscrever de forma permanente na epiderme humana utilizando
pigmentação. Essa afirmação dá a tatuagem a característica de materialidade. Sobre
esse assunto, Novak (2012) afirma que:

A presença da materialidade no sistema semiótico da tatuagem evidencia a


relação entre forma e informação, a qual confirma a função comunicativa da
tatuagem enquanto texto cultural. A forma da imagem tatuada, que
compreende cor, dimensão, disposição, referencial imagético e outras

29
características aparentes, é a materialidade da informação traduzida em
códigos próprios da tatuagem. (NOVAK, 2012, p. 32,33)

Em presença desses conceitos, pode-se concluir que é necessária a atividade


mental para compreender as mensagens disponíveis nas tatuagens. É preciso
começar analisando a possível causa do exercício de perceber a tatuagem enquanto
ícone, e não enquanto produção técnica; essa explicação pode ser encontrada nas
pesquisas de Santaella (2004) sobre a análise das linguagens e a comunicação.
Segundo a autora, a comunicação é realizada se utilizando da singularidade e do
caráter cumulativo, através de interação com outros indivíduos em contexto cultural e
linguístico. Diante desse argumento, podemos dizer que a tatuagem, como prática já
difundida e fácil de encontrar principalmente em ambientes urbanos, não causa
surpresa pela sua existência, mas ativa o exercício mental para que quem observa
o(s) seu(s) signo(s) busque em seu arquivo mental referências que correspondam ao
que a tatuagem forma, sugere ou se assemelha.
Uma explicação disso é sugerida por Novak (2012) de maneira mais clara e
trazendo um termo fundamental para o entendimento do comportamento
comunicacional da tatuagem: a tradução.

As semioses, no sistema da tatuagem, ocorrem principalmente pelo


mecanismo de tradução - seja a tradução da tradição (de textos do próprio
sistema cultural) ou de textos alossemióticos. Utilizando códigos como o
visual, o tátil, o cinético e o verbal, além de códigos específicos de outros
sistemas semióticos (carcerário, militar, etc.), a tatuagem desenvolve uma
linguagem própria, baseada, principalmente, em signos contínuos. A relação
entre os sistemas da tatuagem e da tecnologia produz textos característicos
do caos da explosão cultural. Exemplos são as tatuagens do gênero tribal,
que têm como referência as tatuagens de formas abstratas ou geométricas
comuns nas ilhas do Oceano Pacífico, quando realizadas em um contexto
contemporâneo, ocidental, com máquinas elétricas ao invés de instrumentos
artesanais. (NOVAK, 2012, p. 67)

Assim como todo processo de comunicação, as mensagens transmitidas pelas


tatuagens podem estar sujeitas ao ruído. Essa interrupção na conclusão do
entendimento da mensagem pode ocorrer por diversos motivos. Podemos listar por
exemplo, uma tatuagem que foi realizada de modo malfeito. Além de, em alguns
casos, não apresentar o conteúdo que o seu autor deseja, uma tatuagem malfeita
pode transferir a atenção do signo tatuado para a forma como ele foi tatuado, mudando
dessa forma, a maneira como ela é percebida. Novak (2012) também possui um
argumento sobre esse processo, e denomina os ruídos como “desvios”:

30
Embora a tatuagem não seja um texto limitado à função comunicativa na
cultura, os processos semióticos que a codificam podem passar por desvios
que podem ser construtivos ou prejudiciais. Na recodificação de uma pintura,
por exemplo, para torná-la um desenho tatuado, o tatuador age como um
tradutor de linguagens contínuas. A ação de tatuar recodifica os códigos
presentes na obra de arte para transmitir a informação contida nela, porém o
tatuador precisa reproduzir a imagem que foi concebida para a pintura, com
seus materiais e técnicas específicos. O tatuador necessariamente realiza
"desvios", pois não utiliza tinta acrílica, nem pincel, nem tela. Assim, quanto
à técnica da tatuagem, os ruídos produzidos na semiose provam que a
tradução entre linguagens contínuas nem sempre gera perda de sentido.
Porém, quando o desvio ultrapassa o nível técnico e atinge o nível da
informação que perpassa as linguagens em tradução, o ruído pode
comprometer as funções do texto da tatuagem. Toma-se como exemplo a
tatuagem que recorre ao código verbal, na qual a omissão ou a modificação
formal de um caractere pode distorcer todo o texto em semiose, tornando
ininteligível ou confusa, para o observador, a informação que se pretendia
comunicar através da tatuagem. (NOVAK, 2012, p. 59)

Portanto fica claro que, seja em qualquer contexto de qualquer cultura (território,
religião, período histórico, política, interesses sociais, causas, etc.), a tatuagem pode
ser compreendida como um texto dotado de propriedades definidas por matéria,
suporte e técnica. É mídia primária, é meio de comunicação, é arte, é memória, é
símbolo, ícone e texto.

2.4 A TATUAGEM COMO LINGUAGEM

Em várias regiões do mundo, a tatuagem assumiu e assume significados


diversos. Sua prática já foi moldada por questões culturais, sociais, religiosas e, como
pode ser observada no cenário urbano da atualidade, por vaidade. De acordo com
Araújo (2006, p. 07), “em todas as épocas e lugares do mundo o homem usa o corpo
como linguagem”. Para Novak (2012):

Decalques ou imagens utilizadas como referência, embora sejam textos da


cultura da tatuagem, não são a própria tatuagem. A tatuagem é uma
linguagem do corpo humano - embora não seja uma linguagem natural (como
o sorriso) -, que pode ser recodificada por corpos não humanos. (NOVAK,
2012, p. 55).

Sabino e Luz (2006) também trabalham a tatuagem sobre o conceito definido de


linguagem. Para os pesquisadores, durante a história da tatuagem é possível observá-
la em diversas culturas, períodos e contextos, mas sua existência sempre apresentou
pontos de semelhança, seja em que contexto ela fosse encontrada. Eles dizem que

31
“a tatuagem mobiliza olhares, reflete sentimentos, classifica e ordena subjetivamente
o fluxo intermitente de indivíduos que lhe servem de tela e que nela buscam distinções
simbólicas” (SABINO E LUZ, 2006, p. 252).
Para Pires (2005), a tatuagem é uma linguagem codificada que se baseia
fundamentalmente nos signos que apresenta em sua estrutura (significado, maneira
como foi feita, cores, etc), a partir do exercício da busca por referências.

A escolha dos adornos, que são os componentes concretos dessa linguagem,


tem origem nos elementos resgatados do inconsciente e transformados,
através de uma cadeia associativa, nas imagens ou formas escolhidas pelo
indivíduo para serem aplicadas a seu corpo. O fato de que o real significado
dessas intervenções só seja totalmente conhecido pelo indivíduo que as
possui, cria, assim como nos sonhos, uma linguagem codificada”. (PIRES,
2005, p. 60 e 61).

Apropriando-se dessa ideia, e voltando a citar sobre a história da tatuagem, mais


especificamente no período que corresponde ao século XX, a tecnologia e conversão
das tatuagens em bens de consumo possibilitaram a grande explosão de
popularização dessa prática, mas também lhe atribuíram um novo sentido: coletivos
humanos se estruturam usando a tatuagem como “objeto em comum”. Uma forma de
comunicação entre os membros de grupos ou classes e também com indivíduos de
fora desses espaços (diferente do que acontecia com a yakuza, no Japão, ou os povos
nativos das Ilhas do Pacífico, em que a tatuagem era instrumento de comunicação
entre os seus membros apenas e não tinha intenção de ser um instrumento de
diferenciação desses membros com o “mundo externo”). Sobre isso, Novak (2012)
afirma:

A tatuagem passou a diferenciar as "tribos urbanas" umas das outras,


adaptando elementos da composição estrutural do seu sistema semiótico
(forma, memória - ou ideais e interesses, o vir a ser da memória -, tecnologia,
etc.) a cada tribo. Nasceram, então, novos gêneros na linguagem da
tatuagem. Atualmente, uma das formas de definição mais usadas na
descrição verbal de tatuagens é o gênero, pois ele engloba várias
modelizações, traduções e textos simultaneamente. Como exemplos de
gênero de tatuagem, podem ser mencionados o tribal, o grotesco, o realista,
o paisagístico, o abstrato, etc. (NOVAK, 2012, p. 54)

Quando Braga (2009) diz que gênero é tudo o que é falado, escrito ou
desenhado, a maneira como isso é feito e a forma que é dada ao texto, podemos
entender a tatuagem também como um gênero textual/discursivo. O pesquisador é
conhecido por explorar a tatuagem (seja grafismo, desenho ou aforismo) como gênero

32
virtual, não verbal. Justificando a expressão “não-verbal” para imprimir a ideia de que
“mesmo quando a palavra se constitui tatuagem seu campo de significação pode
mudar ou ser ampliado, ou seja, deixa de significar apenas como palavra” (BRAGA,
2009, p. 136). Segundo Ribeiro e Pinto (2013):

Os gêneros textuais/discursivos fazem parte do nosso dia a dia e foram


historicamente criados pelo ser humano a fim de atender determinadas
necessidades de interação verbal. E, em uma situação de interação verbal, a
escolha do gênero é feita de acordo com os diferentes elementos que
participam do contexto, tais como: quem é o produtor do texto, para quem se
produz, com que finalidade, em que momento histórico, entre outros.
(RIBEIRO E PINTO, 2013, p. 04)

Bakhtin (2003) afirma que qualquer tipo de discurso se manifesta dentro de um


determinado gênero caracterizado por sua estrutura composicional, conteúdo
temático, função comunicativa, e estilo. A tatuagem, quando entendida como um
enunciado elaborado dentro de uma das esferas da atividade humana, pode ser
entendida também como correspondente a essa ideia de Bakhtin. A tatuagem além
do ser tatuagem, também se classifica por tipos de tatuagem (abstrata, paisagismo,
punk, etc.), possui enunciado, estilo, motivação e função na transmissão da sua
mensagem. Portanto, enquanto é linguagem, a tatuagem também é gênero.
A relação corpo-cultura é fundamental para o entendimento da tatuagem como
sistema linguístico que possui gêneros também linguísticos. Para que haja a
decodificação dessa linguagem, é preciso entender o contexto social no qual o
indivíduo tatuado está inserido.

Nos povos encontrados pelos exploradores europeus nas ilhas do oceano


Pacífico, no século XVIII, a tatuagem era uma linguagem tão praticada quanto
a linguagem verbal - quase um sistema modelizante primário, segundo as
ideias originais dos semioticistas da cultura. A tatuagem era um sistema
modelizante que definia o importante sistema da organização social, que
engloba hierarquias, divisão de tarefas, deveres e direitos. Havia tatuagens
específicas para cada sexo, para as diferentes faixas etárias, para as
profissões (o guerreiro, o chefe, o tufuga - mestre da tatuagem em Samoa) e
para os corpos não humanos. Finalmente, havia, entre os maori, tatuagens
personalizadas para cada indivíduo, que serviam à identificação deles até
mesmo após sua morte. (NOVAK, 2012, p. 52).

Esse trecho dos estudos de Novak (2012) evidencia com clareza a relação da
tatuagem com o processo de decodificação da linguagem que ela estrutura no cenário
cultural. Fica claro compreender que somente quem faz parte dessas estruturas

33
sociais consegue entender os significados da tatuagem. Se um estrangeiro, em um
primeiro contato com os nativos de Samoa, se deparar com as “tatuagens” desse
povo, certamente ele não saberá o que elas representam quanto a sua função de
definir hierarquia e sexo, por exemplo. Ela ainda comenta:

Inscrição na pele humana, a tatuagem não recorre necessariamente a signos


discretos para realizar-se como linguagem, embora ocasionalmente o faça
(por exemplo, em tatuagens de números, nomes pessoais e símbolos, como
as praticadas no Japão, no século XVII, e no governo nazista alemão, na
metade do século XX, que tatuava à força os presos em campos de
concentração, a fim de identificá-los). O desenho, signo contínuo
característico da tatuagem, recodifica outros sistemas da cultura, como a
hierarquia social, a mitologia, as artes visuais e a própria língua natural,
traduzindo linguagens. A imagem tatuada comunica e eterniza uma condição
do seu portador. (NOVAK, 2012, p. 56, 57)

Dessa forma, conclui-se que a tatuagem pode ser compreendida, dentro das
sociedades, como linguagem (pelo seu processo de estruturação quanto aos sistemas
de decodificação possíveis e por gerar condições de construção de identidade pessoal
e coletiva, que por sua vez, serão traduzidas por um indivíduo observador) e portanto
gênero (por compor características que criam uma espécie de “tipologia” das
tatuagens dentro do seu próprio universo).

34
3. SEXO, GÊNERO E IDENTIDADE: UNIVERSO DA TATTOO

Nessa etapa da pesquisa será discutida a relação entre a tatuagem e os


conceitos de gênero. Um curto resgate histórico mostra que, em algumas culturas, a
tatuagem é usada como fator de diferenciação entre homens e mulheres. Diante da
produção atual da tatuagem, será discutida a forma como as questões sociais e
históricas constroem relação entre a prática de marcar o corpo com as performances
de gênero.

3.1 O “GÊNERO PERFORMÁTICO” DE BUTLER

Episódios de observação das marcas permanentes na pele revelam que essa


prática, em alguns povos, possuía evidente ligação às “definições” de gênero. A
“tatuagem” se manifestava de uma maneira na pele dos homens e de outra na pele
das mulheres4.

Nas ilhas Marquesas, Langsdorff (1813, apud Gilbert, 2000) observou que as
tatuagens costumavam ser mais extensas do que em outras tribos, cobrindo
o rosto, as mãos, os pés e os dedos. Os desenhos tatuados consistiam em
formas geométricas que cobriam o corpo inteiro dos homens, enquanto nas
mulheres se localizavam nas mãos e nos pés. Assim, nessa cultura, as
porções de corpo tatuadas realçam a ideia dicotômica de gênero (feminino e
masculino), elencando a sexualidade como um sistema modelizante da
tatuagem. (GILBERT, 2000, apud NOVAK, 2012, p. 30)

Já foi citada nessa pesquisa a prática da “tatuagem” maori e dos nativos de


Samoa. Nesses dois casos é possível observar que o exercício de se marcar, junto a
simbologia dessas marcas, condizia características sociais importantes para a
organização desses grupos de pessoas. A sexualidade, dor e o convívio em sociedade
orientavam diretamente a prática samoana de ornamentação da pele.

Em 1903, o antropólogo alemão Augustin Krämer publicou a obra Die Samoa-


Inseln, na qual aponta que a dor envolvida no procedimento da tatuagem

4
Como já citado, Novak (2012) ainda afirma, em seus estudos outras modelizações da tatuagem encontrada
em alguns povos das Ilhas do Pacífico, como a tatuagem mediada por idade, posição hierárquica ou função
social, por exemplo.

35
constituía prova de hombridade, de forma que os homens desprovidos de
tatuagens seriam repelidos pela comunidade. (NOVAK, 2012, p. 31)

A partir desse exemplo, junto a função da tatuagem em representar coragem


e hombridade (através da dor que sua produção remete) nos povos maori, é possível
compreender como questões estabelecidas pela sociedade podem influenciar na
produção da tatuagem. Obviamente, nas sociedades modernas não existe a
obrigação de se tatuar para estabelecer um bom convívio com outras pessoas, pelo
contrário, a tatuagem surge de uma disposição própria e livre do indivíduo. Entretanto
é preciso ir mais fundo na análise dessa vontade e decisão “própria e livre” de se
tatuar. Dessa forma, é perceptível que as tatuagens podem passar por delimitações
construídas através da ideologia de gênero, ainda que de forma inconsciente. Para
essa percepção, é necessário buscar possíveis respostas na filosofia e sociologia.
A respeito da discussão referente a gênero do ponto de vista social, podemos
começar refletindo sobre a conhecida frase de Simone de Beauvoir (1967), em O
segundo sexo: “A gente não nasce mulher, torna-se mulher” (p. 09). Se pensarmos
nessa perspectiva em relação ao gênero – não apenas ao feminino – e
correlacionarmos com os conceitos de “performances de gênero” definidos por Judith
Butler (2003), já é possível vislumbrar um aporte teórico capaz de analisar a tatuagem
como parte de uma estrutura simbólica de gênero. Segundo Butler (2003), “embora
os cientistas sociais se refiram ao gênero como um ‘fator’ ou ‘dimensão’ da análise,
ele também é aplicado a pessoas reais como uma ‘marca’ de diferença biológica,
lingüística e/ou cultural (BUTLER, 2003, p. 28). Ao mesmo tempo, a autora também
discute sobre um gênero “inteligível”, que seria aquele que mantem relações de
coerência e continuidade entre sexo, gênero, prática sexual e desejo.
De acordo com Bourdieu (2003), as diferenças culturais entre os gêneros
podem ser vistas em seus corpos, seguindo a noção do habitus, que é uma disposição
corporal construída pela sociedade e pela cultura, ou seja, uma lei social incorporada.
De modo mais detalhado, o autor explica que habitus pode ser compreendido como:

Um sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando todas


as experiências passadas, funciona a cada momento como uma matriz de
percepções, de apreciações e de ações – e torna possível a realização de
tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de
esquema. (BOURDIEU, 1983, p. 65)

36
Assim, podemos considerar o corpo humano como vitrines de diferença
sexual, não por suas disposições biológicas apenas, mas socialmente construídas.
Ainda segundo ele, a força simbólica que a sociedade exerce sobre o indivíduo, exerce
também sobre os corpos. Dessa maneira, os corpos femininos e masculinos se
diferenciam quanto a uma série de movimentos, posições e posturas que traduzem as
diferenças pensadas e construídas sobre os gêneros.
Para Butler (2003), sexo é uma constatação natural e gênero é uma
construção social. A forma como uma pessoa se apresenta na sociedade não condiz
com as características do seu sexo, mas com o conjunto de elementos que a
sociedade atribui ao mesmo. A autora afirma que o gênero, durante a história das
sociedades, nem sempre se fez coerente com o sexo diante do seu contexto histórico
“porque o gênero estabelece interseções com modalidades raciais, classistas, étnicas,
sexuais e regionais de identidades discursivamente constituídas” (BUTLER, 2003, p.
20). Diante dessa constatação, Butler (2003) afirma que a “cultura se torna destino”.
De modo simplificado, argumenta que ninguém nasce homem ou mulher quando se
trata de gênero, mas traz para si, no decorrer do seu desenvolvimento pessoal,
interativo e de identidade, essas concepções que estão estabelecidas na sociedade e
na cultura que ela vivencia.
Um dos conceitos mais conhecidos e marcantes da filósofa estadunidense diz
respeito a performatividade do gênero. Como o termo já supõe, Butler (2003) afirma
que o gênero de um indivíduo se constitui de performance, ainda que o mesmo não
possua consciência de que está transmitindo informações do gênero com o qual se
identifica através de vários aspectos do seu comportamento e composição visual. Por
exemplo, o jeito como anda, como se veste, como fala e, consequentemente, como
se tatua.
Sob essa visão, é possível compreender o gênero como um conjunto de atos
que se repetem em um círculo regulatório de práticas sociais e estéticas altamente
rígidas, onde a identidade é resultado das expressões capazes de serem enxergadas.
Dessa maneira é criada uma espécie de padrão de gênero, que é o que a sociedade
enxerga atualmente como o universo masculino e o feminino.
Essa perspectiva da autora pode causar em muitos a sensação de que o seu
próprio gênero seria algo falso, constituído por questões sociais e não divinas (como
no caso dos cristãos que assumem que “Deus fez o homem e a mulher/ Adão e Eva”)
37
ou até mesmo biológicas (por afirmar que o sexo natural não possui relação com as
práticas do gênero das quais o indivíduo se utiliza). Entretanto, Butler (2003) diz que
um sujeito pode se identificar com essas práticas e elas construírem sua
personalidade e identidade, através da relação sexo-gênero-desejo. Quando o sujeito
se identifica conscientemente e voluntariamente nessa tríade, ele compõe sua
identidade.
A ideia de performatividade do gênero fica mais evidente ainda se analisarmos
a produção da composição estética quando voltada a destacar características de um
gênero específico. É o que acontece quando analisamos o fenômeno drag, homens
(de qualquer orientação sexual) que se “produzem” como mulheres por diversos
propósitos, como profissional ou mesmo por lazer, por exemplo. Nesses casos, o
indivíduo procura no conhecimento do “inventário feminino” peças, itens e trejeitos que
lhe auxiliem a se apresentar como pertencente ao gênero feminino. Essa “mecânica”
de representação evidencia que o ser humano cria repertórios de gênero, onde buscar
referências para atuar ou observar a masculinidade e a feminilidade.

3.2 TATUAGEM COMO PRODUÇÃO E CONSUMO DE SENTIDO

A fim de complementar a ideia de que a tatuagem transmite mensagens


através da produção do sentido que, por sua vez, pode ser um sentido de gênero, é
preciso recorrer a análise filosófica da mentalidade e das práticas humanas. De
acordo com Berger e Luckmann (2012):

O sentido se constitui na consciência humana: na consciência do indivíduo,


que se individualizou num corpo e se tornou pessoa por meio de processos
sociais. Consciência, individualidade, corporalidade específica, sociabilidade
e formação histórico-social da identidade pessoal são características
essenciais de nossa espécie, cuja filo e ontogênese complicadas não
precisamos considerar aqui. (BERGER E LUCKMANN, 2012, p. 14)

O sentido, tanto do agir quanto do compreender, existe na consciência humana


em um espaço diretamente ligado às experiências. Essas experiências, pelas quais o
indivíduo se molda, não vivenciadas nos arquétipos que as instituições que operam
na sociedade definem, como a família ou igreja, por exemplo. O conceito de
experiência é fundamental para entender como o ser humano compõe seu
conhecimento de mundo, sua capacidade de aprendizado e interação e, por fim, sua

38
identidade dentro do cenário em que as experiências são alcançadas. Segundo
Berger e Luckmann (2012):

A instituições devem conservar e disponibilizar o sentido tanto para o agir do


indivíduo em diversas áreas de ação quanto para toda a sua conduta. Esta
função das instituições está numa relação essencial com o papel do indivíduo
como consumidor de sentido, mas também, de caso para caso, produtor de
sentido. (BEGER E LUCKMANN, 2012 p. 23)

Segundo os autores, as instituições também são responsáveis por


estipularem as “configurações de valores” dos indivíduos. O ser humano sempre se
utilizou dessas configurações para tentar compreender o mundo e o seu papel dentro
dele. Indivíduos com perícia na religião, filosofia e na ciência, se utilizaram dessas
configurações para criar sistemas de valores. Esses sistemas servem como um guia
da compreensão humana ao construir uma base, um ponto de partida de onde o
indivíduo possa seguir uma trajetória pessoal e mental em níveis crescentes. “Estes
sistemas pretendem explicar e regular significativamente (teodiceias) a conduta do
indivíduo, tanto em relação a sociedade e nas rotinas do dia a dia, quanto na
superação de suas crises em vista das realidades que transcendem o cotidiano
(BERGER E LUCKMANN, 2012, p. 21).
Os sistemas de valores, mediados pelas instituições sociais, são de
fundamental importância para compreender como se faz a produção e o consumo de
sentido através das produções estéticas, como a tatuagem.

Em todos os tempos, grupos humanos constituídos sempre recorreram a


modos de expressão, de manifestação de sentido e de comunicação sociais
outros e diversos da linguagem verbal, desde os desenhos nas grutas de
Lascaux, os rituais de tribos “primitivas”, danças, músicas, cerimoniais e
jogos, até as produções de arquitetura e de objetos, além das formas de
criação de linguagem que viemos a chamar de arte: desenhos, pinturas,
esculturas, poética, cenografia etc. E, quando consideramos a linguagem
verbal escrita, esta também não conheceu apenas o modo de codificação
alfabética criado e estabelecido no Ocidente a partir dos gregos. Há outras
formas de codificação escrita, diferentes da linguagem alfabeticamente
articulada, tais como hieróglifos, pictogramas, ideogramas, formas estas que
se limitam com o desenho. (SANTAELLA, 1983, Pag 11)

Ao compreender a tatuagem como uma atividade que possui autoria e


precedentes referenciais que ajudam a estruturar a decisão do que será tatuado e

39
como será sua representação imagética (objetiva ou mesmo subjetiva), é possível
imaginar que tais precedentes podem se basear na exemplificação ou nas abordagens
já experimentadas pelos indivíduos que a cogitam realizá-la. Em termos simples,
pode-se entender que existe uma relação entre o signo que será tatuado com os
fatores coletivos do sujeito, como gêneros, raças, posições em um grupo, etc. Ao
determinar limites para os seus significantes, tendo como resultado a composição de
um sentido, a tatuagem opera tanto para quem se tatua quanto para quem observa.
Se analisarmos novamente a “tatuagem” como uma prática com fins
terapêuticos ou medicinais, como se supõe que tenha acontecido há milhares de ano
no Egito, a produção do sentido pode ser exemplificada de forma clara. As marcas na
pele evidenciam que a “tatuagem”, nesses casos, funcionavam como intermédio entre
o plano real e a possibilidade de cura, seja pela capacidade humana ou divina. As
marcas na pele, nessa situação, funcionam como estratégia do indivíduo de
estabelecer uma possibilidade de cura ou satisfação, como uma trajetória até uma
recompensa, pois provavelmente, em sua cultura, esse tipo de prática gerava um
sentido completo suficiente para resultar nesse tipo de alteração física. Atualmente, a
produção da tatuagem é muito mais complexa, assim como os sentidos que gera.
Quando Novak (2012) diz que a tatuagem é um fenômeno que comunica uma
condição muito mais ampla do que a estruturalidade do texto cultural pode
corresponder, ela afirma que a tatuagem suporta uma função importante no consumo
de sentido em sociedade, pois transmite algo “digno de ser memorizado e
exteriorizado através da pele, na vida das pessoas que carregam tatuagens em seus
corpos. A tatuagem, nesse nível coletivo, gera sentido porque há uma porção de
pessoas que não se tatua” (NOVAK, 2012, p. 58).
Se voltarmos a pensar a tatuagem como gênero e considerarmos que
Bazerman (2009) entende como gênero os fatos sociais sobre os tipos de atos de fala
que as pessoas podem realizar e sobre os modos como elas os realizam, os gêneros
“emergem nos processos sociais em que pessoas tentam compreender umas às
outras suficientemente bem para coordenar atividades e compartilhar significados com
vistas a seus propósitos” (BAZERMAN, 2009, p. 31), a tatuagem pode ser considerada
um ponto de sentido entre as interações humanas. Sobre a produção atual da
tatuagem, Novak (2012) afirma:

40
Nas culturas contemporâneas ocidentais, a tatuagem ganhou visibilidade ao
sofrer modelização do sistema da moda. Em diversas culturas, a tatuagem é
percebida como uma cultura externa, peculiar, cuja linguagem se manifesta
nos textos da moda (mesmo os textos da contracultura, que de certa forma
também participam da moda). Textos que se pretendem inovadores em
algum sentido, isto é, textos modernos em relação à conjuntura do seu tempo,
traduzem textos da tatuagem, embora ela seja uma prática milenar 5. Assim,
movimentos sociais que buscam modernizar uma cultura, inserindo nela
elementos externos (de não-cultura e de anti-cultura, entre as quais a cultura
da tatuagem), se apropriam da prática de tatuar-se, diferenciam- se
coletivamente conforme os gêneros de tatuagem que caracterizam cada
grupo, e com isso modelizam o sistema semiótico da tatuagem de tal forma
que o próprio sistema se torna um signo - portador de significado integral -
naquela cultura. (NOVAK, 2012, p. 54)

Essa função da tatuagem na cultura moderna levou à criação de espaços de


aberta análise sobre esse fenômeno, no que corresponde tanto a sua história quanto
as suas diversas vertentes na atualidade. Melo (2007) traz em seus estudos uma
referência a essa aberta discussão sobre a tatuagem. A pesquisadora cita que em
Milão, foi criada a disciplina Psicologia da Tatuagem, que visa investigar o
inconsciente na produção da tatuagem pelo ponto de vista de quem se tatua, ou seja,
quem escolhe os desenhos e significados. Ela comenta que na disciplina “o local do
corpo a ser tatuado também tem registros. Tatuagem no braço significa um lento
processo de maturação. Nas pernas, sinônimo de pessoas infantis e pouco reflexivas.
No tronco, capacidade de decidir”. (MELO, 2007, p. 18). Esse exemplo demonstra a
variedade de sentidos que podem ser acionados pelas faculdades mentais humanas.

3.3 TATUAGEM, REPRESENTAÇÃO SOCIAL E IDENTIDADE

Na cultura maori, as “tatuagens” não representavam somente as posições dos


indivíduos nas diversas esferas sociais, mas atuavam também como peça-chave na
construção da identidade individual e na relação entre os outros membros do grupo.
Cada nativo maori possuía, no rosto, uma figura que representava o seu nome. Como
a prática da guerra também era muito comum nessa cultura, as “tatuagens de
identidade” serviam também para o reconhecimento dos corpos em locais de batalha.

5
Nesse trecho, Novak compara a prática da tatuagem da atualidade com a prática de marcação permanente na
pele observada em múmias do Antigo Egito. Essa relação é equivocada, pois por mais que elas se baseiem na
mesma prática de inserir pigmentos na pele, o contexto inteiro muda de uma situação para outra. A tatuagem
moderna não remete contextualmente, tecnicamente nem em relação ao sentido proposto nas marcas
observadas em Ötzi e Amunet, ou mesmo em outras situações, como no caso dos nativos das Ilhas do Pacífico.
Uma pessoa hoje, ao observar uma tatuagem no seu dia a dia, não estabelece, por exemplo relação dessas
marcas com um ritual divino ou mesmo hierárquico.

41
Os desenhos funcionavam como nomes próprios, possuíam um alto efeito de
memorização e eram reproduzidos como assinatura pessoal. Únicas em cada
indivíduo maori, mas semelhantes em sua técnica.
Ramos (2001), em sua tese de doutorado denominada Teorias da tatuagem:
corpo tatuado - uma análise da loja Stoppa Tattoo da Pedra, traz a análise das “novas
tribos” para mapear o fenômeno da tatuagem dentro das sociedades urbanas
modernas. A autora encontra em seus estudos o aparecimento evidente das
tatuagens em grupos de contracultura surgidos nos anos 60, “[...] Hippies, Punks, ou
Choppers – prenunciavam uma nova individualização, priorizado a liberdade política,
social e, principalmente, corporal” (RAMOS, 2001, p. 122). As tatuagens, dessa
maneira, agiam como vozes desses grupos para externar seus posicionamentos e
ideias à sociedade. Para Melo (2007), esse tipo de ação é completamente plausível.
A autora afirma que “ao mesmo tempo em que este quer ser reconhecido pela
singularidade, quer também sentir-se inserido em um grupo social por meio de
semelhanças. (MELO, 2007, p.13).
Um exemplo das afirmações acima, observando a tatuagem enquanto uma
prática de composição de identidade e transmissão de ideais, é supor que um cidadão
pacifista provavelmente nunca tatuará o símbolo da suástica nazista em sua pele. O
significado e sentido dessa marca não condiz com os ideais do indivíduo, o que
possivelmente afasta esse símbolo da composição visual que ele busca para si. No
senso comum, por exemplo, talvez seja mais compreensível que este indivíduo tatue
uma pomba branca, pois trata-se de uma convenção social e histórica (e até mesmo
da mitologia cristã) que esse símbolo referencie a paz e a harmonia. Diante desse
exemplo, portanto, já se observa que a prática da tatuagem se manifesta de uma
maneira para um conjunto de valores, e de outra forma para outro conjunto.
No século XX, a tatuagem passou a ser obrigatória entre os militares da
Inglaterra, que precisavam tatuar o brasão da sua divisão como demonstração de
engajamento para com a sua equipe. Esse fato curioso especifica que, em alguns
casos (mesmo que obrigatórios, como no caso desses militares), um mesmo signo ou
estilo pode ser recorrente em um coletivo humano. Compreender a tatuagem como
um processo cultural, requer relacionar essa prática com as outras práticas que o
indivíduo escolhe em seu contexto de cultura, o que nos leva a ideia de que os signos
tatuados têm relação direta com o “quem sou?” do indivíduo e “como me apresento?”.

42
Pierce (2000) afirma que o processo de dedução humana é um argumento
compulsório que se baseia, positivamente, na conclusão e admissão da sua
representação como um fato (para o indivíduo), mesmo que se constitua ícone. Essa
ideia é abordada por Melo (2007), que chega a exemplificar esse conceito ao assumir
que “ao olhar uma tatuagem com um desenho de uma Santa, deduzimos que a pessoa
tatuada seja religiosa, mas, se o desenho for de um monstro ou algo sombrio, logo
podemos deduzir que a pessoa seja agressiva.” (MELO, 2007, p. 12). Esse tipo de
observação é muito importante para estudiosos que pretendem analisar os discursos
das produções estéticas humanas, principalmente a tatuagem. Villaça, Góes e
Kosovski (2006) também possuem trabalho que reafirma esse argumento.

As divisões estabelecidas pelos desenhos configuram a manutenção,


reprodução mesmo, da gramática das diferenças inerentes às relações de
gênero. Quando pensa escolher seu desenho (seja ele qual for), o indivíduo
é “escolhido” por todo um conjunto de representações e práticas, estruturas
subjetivas e objetivas reproduzidas pelo estilo de vida que articula e imita
(EDMONDS, 2002). Tal sistema (inconsciente) aparta, organiza, distingue e
constitui as (dis)posições sociais, alocando o indivíduo em uma, e exprimindo
a sua condição de gênero e classe. (SABINO E LUZ, 2006, p. 255)

O corpo sustenta como matéria a produção dos processos de identificação a


partir de suas evidentes marcas visuais que expõem a identidade do sujeito
consigo próprio, com a sociedade e com o grupo do qual participa e pelo qual
quer ser acolhido e reconhecido. Mas o corpo é também o limite que separa
o sujeito ou o indivíduo do mundo e do outro, lugar de onde se pode
determinar a alteridade. (VILLAÇA, GÓES E KOSOVSKI, 1999 p. 152).

Com uma visão filosófica, os autores ainda argumentam que o homem tem uma
relação problemática com a própria imagem. Isso é responsável por fazê-lo retocar
seu corpo de múltiplas maneiras, seja por tatuagens, maquiagem, vestimentas,
cirurgias plásticas, ou mesmo mutilações e deformações.
Ribeiro e Pinto (2013), acrescentam a esse contexto alguns dos possíveis
motivos para se realizar uma tatuagem no século XXI. Segundo os autores, as
tatuagens podem ser motivadas por “puro modismo, inserção em determinado grupo,
homenagem, para expressar suas preferências, reforçar atitudes, religiosidade,
crenças, devoção, embelezamento, e estabelecer relações entre pessoas e ideais.”
(RIBEIRO E PINTO, 2013, p. 01). Essa última motivação, citada pelos autores,
exemplifica o uso da tatuagem como uma produção de identificação de coletivos
humanos.

43
Voltando a citar a conhecida organização criminosa japonesa yakuza, é
observado que a tatuagem serve como um instrumento de identificação e união entre
os seus membros, assim como uma prova de coragem e lealdade. Essa posição da
tatuagem como um aspecto em comum entre membros de coletivos humanos incita
também outra questão: existe uma coleção de temas ou características que
influenciam no resultado simbólico da tatuagem nesse tipo de relação entre os seus
portadores?
Antes de chegar a essa resposta, é preciso refletir um pouco sobre o conceito
de representação social. Esse termo, retirado da psicologia social, auxilia na
compreensão do que propõe esse capítulo quanto a construção da identidade do
indivíduo e como ele se utiliza dela para se manifestar e interagir com outras pessoas.
Para Moscovici (2003), o ato de representar, resumidamente, significa trazer o que
está ausente e apresentar coisas da maneira a satisfazer as condições de uma
coerência argumentativa, da racionalidade e da integridade normativa do grupo
(MOSCOVICI, 2003). No livro Representações sociais, de Moscovici (2003), é
possível encontrar discussões fundamentais para a compreensão do que é
representação social e como a tatuagem pode ser entendida nesse contexto.

É, portanto, muito importante que isso [a representação social] se dê de forma


comunicativa e difusiva, pois não há outros meios, com exceção do discurso
e dos sentidos que ele contém, pelos quais as pessoas e os grupos sejam
capazes de se orientar e se adaptar a tais coisas. Conseqüentemente, o
status dos fenômenos da representação social é o de um status simbólico:
estabelecendo um vínculo, construindo uma imagem, evocando, dizendo,
fazendo com que se fale, partilhando um significado através de algumas
proposições transmissíveis e, no melhor dos casos, sintetizando em um clichê
que se torna um emblema. (MOSCOVICI, 2003, p. 216)

Isso significa que representações sociais são sempre complexas e


necessariamente inscritas dentro de um “referencial de um pensamento
preexistente”; sempre dependente, por conseguinte, de sistemas de crença
ancorados em valores, tradições e imagens do mundo e da existência.
(MOSCOVICI, 2003, p. 216)

O corpo humano é o recinto de significação no sistema semiótico da tatuagem e


apoia signos que ligam o indivíduo e a sociedade. Essa situação acontece devido a
representação social e a capacidade de tradução da sociedade para com os signos
que a tatuagem traz. Para Novak (2012), as tatuagens atuam tanto na distinção de
um indivíduo em coletividade, quanto distinguem coletividades entre si. “Corpos de

44
mulheres e de homens apresentam tatuagens que acentuam as diferenças de gênero,
marcando sexualidades.” (NOVAK, 2012, p. 32)
Melo (2007) também traz esse argumento. A pesquisadora assume que quando
uma pessoa decide se tatuar (em um cenário moderno, onde seu corpo é livre e a
prática da tatuagem não remete a nenhum tipo de obrigação), essa ação implica em
uma estética que relaciona vários valores dentro dos conceitos sociais. Além disso, a
escolha dos signos que vão compor a tatuagem e o local onde tatuado podem não
mostrar somente a autonomia desse indivíduo, mas parte da representação para qual
o mesmo queira transmitir através do signo. Goffman (2014) afirma que:

Quando um indivíduo desempenha um papel, implicitamente solicita de seus


observadores que levem a sério a impressão sustentada perante eles. Pede-
lhes para acreditarem que o personagem que veem no momento possui os
atributos que aparenta possuir, que o papel que representa terá as
consequências implicitamente pretendidas por ele e que, de um modo geral,
as coisas são o que parecem ser.” (GOFFMAN, 2014, p. 29)

Sobre esse argumento, de que o ser humano sempre está buscando construir
ou concretizar a sua identidade, as tatuagens podem ser observadas como um
instrumento nessa estratégia, pois além de serem usadas como representação de si
(vontades, desejos, ideais e até mesmo sua profissão ou hobbie), a tatuagem ajuda a
compor a singularidade de grupos ou mesmo do grande grupo “tatuados”, que se
refere as pessoas que se tatuam, de qualquer que seja a maneira que elas realizem
essa prática.

45
4. A IMAGEM DA TATUAGEM

Esse capítulo tem como objetivo responder duas questões fundamentais para a
análise que essa pesquisa propõe: O que é o Instagram e como as fotografias da
tatuagem podem analisadas enquanto fenômeno semiótico e social.

4.1 A TATUAGEM NO INSTAGRAM

Para a compreensão dessa pesquisa é preciso refletir sobre a conexão entre


a produção da tatuagem e a veiculação do seu resultado. É quando fica possível
atualizar os processos que disseminam a tatuagem nos dias de hoje. Assim como
grande parte das produções estéticas e culturais, atualmente a tatuagem tem como
maior meio transmissor – além da pele do seu portador – a internet; mais
especificamente as redes sociais e o entretenimento. É essa relação entre a tatuagem
em si e a sua imagem divulgada na internet que possibilitará avanços na análise aqui
proposta. Afinal, a internet é o principal meio de veiculação da imagem “tatuagem” e
também de suas mensagens, que geram interpretações semióticas. De acordo com o
site “Guia da PC”, uma descrição sucinta do Instagram é:

O Instagram, na verdade, é uma rede social que serve para nós postarmos
fotos. E como tal, podemos seguir outros membros e ser seguido por eles. As
fotos que postamos, possuem a opção “Curtir” e “Comentar”, para que outros
usuários digam o que acharam da imagem. A rede social foi criada em
outubro de 2010 pela dupla Kevin Systrom e Yosyp Shvab. Inicialmente, ela
era restrita apenas para usuários de iPhone, já que o aplicativo só era
compatível com o sistema iOS, da Apple. Em abril de 2012, porém, foi lançado
o aplicativo do Instagram para Android e, mais recentemente, o Facebook
adquiriu o Instagram por 1 bilhão de dólares! Com isso, a quantidade de
usuários da rede social cresceu exponencialmente. (GUIA DO PC, 2012)

Recuero (2005) vai mais além nessa definição. Para ela, uma rede social não é
apenas um espaço para postarmos algo, seguir e sermos seguidos. Essa visão traz
uma perspectiva muito limitada das interações possíveis numa rede virtual. A autora
considera como capital social o conteúdo transmitido em nessas redes.

O conteúdo de uma relação social refere-se àquilo que é trocado pelos pares
envolvidos nos processos de interação. A direção é entendida como uma
relação que pode ser dirigida a alguém específico ou ao grupo como um todo.
Por fim, o conteúdo de uma relação é aquilo que é trocado entre os pares

46
através das interações sociais, como a quantidade de informação,
sentimento, suporte, conhecimento e etc. (RECUERO, 2005, p. 02)

Atualmente, o Instagram (no Brasil, conhecido também pela abreviação “insta”),


suporta vídeos e a modalidade de “stories”, que são vídeos de duração limitada a 24
horas, uma espécie de conteúdo feito justamente para não se eternizarem no perfil do
seu autor (com exceção de serem gravados por terceiros e repostados em outros
espaços). Além disso, o Instagram também possui hoje o recurso ao vivo, onde um
usuário pode usar o seu smartphone para transmitir conteúdo em tempo real.
Uma pesquisa divulgada em julho de 2017 pelo portal de estatísticas Statista
resultou em um ranking das redes sociais mais usadas no mundo. De acordo com o
ranking, o Instagram ocupa a quinta posição, com cerca de 700 milhões de usuários
ativos por mês, perdendo apenas para o Facebook (com 2 bilhões de usuários ativos
por mês), Whatsapp (1,3 bilhão), Messenger (1,2 bilhão) e WeChat (938 milhões).
Em agosto do mesmo ano, o portal brasileiro especializado em tecnologia Olhar
Digital, divulgou um ranking semelhante, mas em relação às redes sociais preferidas
pelos brasileiros. O Instagram ficou em terceiro lugar, com 60% da preferência entre
as duas mil pessoas entrevistadas.
O Instagram é um espaço de grande veiculação de imagens, uma rede social
virtual especializada nisso. E por isso, muitos perfis nessa rede se utilizam desse
espaço para divulgar resultados de processos estéticos. Cada dia é mais comum ver
perfis de usuários mostrando dicas e referências de moda, estilo e comportamento. A
tatuagem entra nessa lista de produções divulgadas através de imagens no Instagram,
seja no perfil do tatuado ou do tatuador. De um modo ou de outro, é fácil perceber e
encontrar a tatuagem nessa plataforma virtual.
Essa ideia de trama entre a produção da tatuagem e o que ela transmite
através da veiculação da sua imagem pode ser exemplificada através das
considerações de Martino, que dizem que “os meios de comunicação têm propriedade
específicas que devem ser pensadas em suas articulações com outras práticas
sociais, interferindo direta ou indiretamente na maneira não só como as pessoas se
relacionam e interagem com o mundo ao seu redor.” (MARTINO, 2014, p. 199).
Em complemento a essa perspectiva, Cruz e Araújo (2012), dissertam sobre
a veiculação da imagem humana em espaços virtuais, ao citar o que Chalfen conceitua
como “mídia doméstica”. Segundo seus estudos, “a acessibilidade dessas imagens
na rede virtual, acentuada pela rápida disseminação dos repasses pessoais, coloca a
47
fotografia como idioma preferido nas práticas de comunicação mediada” (CRUZ;
ARAÚJO, 2012, p. 112).
A veiculação da imagem da tatuagem foi de grande importância na mudança
no modo como a sociedade a vê, consome e a traduz. Essa relação já foi especificada
anteriormente nessa pesquisa. Entretanto, é importante compreender que os novos
significados que os signos desenvolvem não são uma característica propriamente
deles. A transformação nos significados do que existe trata-se na verdade das
mudanças na percepção e interpretação humana desses signos, capazes de serem
abordadas pela semiótica.
Martins (2011), em seu livro Sociologia da fotografia e da imagem, afirma que
a sociologia e antropologia possuem esperança de que a fotografia, filme e vídeo
possam ser utilizados como fontes e registros de informações em âmbito sociológico
e antropológico sobre a realidade social. O autor também contesta um clichê comum
do universo da fotografia, o de que a fotografia é o congelamento de um momento da
história ou da vida de alguém. Segundo o autor, essa afirmação pode ser contrariada
através do conceito de polissemia. Martins afirma que a foto só cumpre essa função
quando o indivíduo a interpreta acompanhado ou munido do conhecimento sobre a
fotografia. Se o observador não possui esse conhecimento, ele a interpreta de outras
formas. Portanto, a fotografia depende da forma como o seu observador a interpreta.
Como a imagem da tatuagem, de um modo geral, reflete sua forma como ela
é no mundo real, na pele humana (viva ou morta), as interpretações de quem a
observa costumam ser mais simples. A pouca diferença entre a imagem da tatuagem
(quando nítida sua observação) e a própria tatuagem fazem com que a sua tradução
em ambos os contextos se assemelhe.
Diante desse argumento, a análise aqui proposta se baseará na discussão
sobre a imagem da tatuagem no Instagram e sua relação com os processos sociais,
históricos e psicológicos trazidos na fundamentação teórica dessa pesquisa. O foco é
perceber como as tatuagens com possíveis características de gênero podem ser
encontradas em perfis de tatuadores, sob o ponto de vista de que os tatuados optaram
por marcar a pele de tal maneira.

48
5. METODOLOGIA

Para executar a análise dessa pesquisa são utilizados três instrumentos


metodológicos: 1) pesquisa bibliográfica; 2) observação e seleção de cinco imagens
divulgadas no Instagram por tatuadores pernambucanos; e 3) Análise qualitativa,
relacionando a produção da tatuagem com a bibliografia sobre os temas.
Instrumento 1: O primeiro passo nesse processo de pesquisa consiste de um
levantamento teórico de algumas referências clássicas e contemporâneas sobre
tatuagem, semiologia, comunicação, gênero, filosofia e psicologia social; estas como
base de todo o apanhado teórico. A produção da tatuagem no que se refere a:
processo semiológico, procedimento comunicacional, produção estética, composição
de identidade e coletividades, e a relação entre a tatuagem e os gêneros. A análise
qualitativa das imagens servirá para observar, na prática, as ideias e conceitos
estudados. As leituras contribuíram para o projeto da seguinte forma: a) para
fundamentar a compreensão sobre tatuagem como instrumento cultural, social e
comunicacional; b) relacionar a tatuagem com as performances de gênero; c)
compreender como se estrutura uma relação entre o processo de se tatuar com as
representações de gênero atualmente; e) identificar e analisar a tatuagem produzida
em Pernambuco diante dos estudos citados.
Instrumento 2: Observação e seleção de imagens divulgadas no Instagram por
tatuadores pernambucanos: Identificação dos três tatuadores do Estado que possuem
mais seguidores na rede social. A partir do contato e da seleção das 5 imagens amis
recentes postadas, será possível: a) delimitar de forma consistente quais
características da tatuagem permitirão contribuições à pesquisa; b) fundamentar os
parâmetros basilares para a formulação da metodologia analítica sobre essas
imagens.
Instrumento 3: A última técnica de investigação a ser utilizada consiste em uma
análise das imagens divulgadas por tatuadores pernambucanos em seus perfis na
rede social Instagram. Será realizado um julgamento: a) às tendências, características
da produção da tatuagem e a relação com as performances de gênero; e b) sobre as
maneiras pelas quais as noções sobre comunicação e gênero fazem parte do universo
da tatuagem em Pernambuco. O Estado foi escolhido como delimitação da área de
pesquisa aqui proposta por ser a região onde o autor reside e possui mais proximidade
e facilidade para encontrar os perfis de tatuadores.
49
6. DESENVOLVIMENTO E ANÁLISE DOS DADOS

Nessa etapa, serão feitas considerações sobre a seleção das imagens que serão
analisadas, o contexto no qual elas se fazem, a seleção propriamente dita e análise
dessas imagens e tatuagens, se utilizando de aspectos observados e aplicação de
aporte teórico comparativo.

6.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Visto que em uma rede social, há a liberdade de expressão e de


posicionamento pessoal e individual das ideias de seus autores, as imagens a seguir
foram selecionadas para melhor representarem a análise que este artigo propõe.
Serão utilizadas somente imagens de tatuagens, sendo excluídos dessa seleção
vídeos e imagens que não correspondam a imagens de tatuagem (como fotografias
pessoas ou publicidade e promoções, por exemplo). Esta seleção está sujeita a
algumas percepções mais complexas em algumas situações, como em casos de
androginia e transgeneridade, mas no geral, a discussão sobre essas questões não
estão propostas nessa pesquisa.
Foram de fundamental importância as legendas das fotos e marcação de
pessoas (recurso do Instagram que permite que um perfil seja marcado e linkado em
uma imagem postada). Em todos os casos, os tatuadores fizeram menção à pessoa
tatuada na foto, usando nomes próprios ou mesmo flexão verbal de gênero. Dessa
maneira foi possível compreender se a pessoa tatuada na fotografia se apresenta
como homem ou como mulher.
Sobre a seleção dos perfis mais seguidos de Pernambuco, esse resultado foi
alcançado através de uma pesquisa própria do máximo de perfis de tatuadores
pernambucanos encontrados através da ferramenta de pesquisa do próprio Instagram
e sua funcionalidade de sugestões a partir de perfis seguidos. Não foi encontrada
nenhuma pesquisa ou mesmo ranking que pudesse ser usada para essa seleção, por
isso, essa triagem foi realizada de modo autoral. Um ranking foi composto com os dez
tatuadores mais seguidos de Pernambuco. Dentre os dez, os três primeiros (aqueles
com mais seguidores) foram selecionados para essa análise. A tabela, com o
resultado do ranking citado, está disponível como anexo nessa pesquisa.

50
6.2 IMAGENS SELECIONADAS

PERFIL 1: @rafamedeirostattostudio

Figura 1: Homem / Figura 2: Mulher / Figura 3: Mulher / Figura 4: Mulher /Figura 5: Mulher

PERFIL 2: @skazxim

Figura 1: Mulher / Figura 2: Homem / Figura 3: Homem / Figura 4: Mulher /Figura 5: Homem

51
PERFIL 3: @evertonirado

Figura 1: Homem / Figura 2: Homem / Figura 3: Mulher / Figura 4: Homem /Figura 5: Mulher

6.3 ANÁLISE E RESULTADOS

Em primeiro lugar, o que se observa é que a tatuagem masculina e feminina


encontrada nesses perfis possuem similaridades técnicas em cada caso,
possivelmente demarcando o estilo do tatuador. Por exemplo, as tatuagens
encontradas no segundo perfil claramente transmitem uma estética parecida, como
uma espécie de trabalho contínuo mantido pelo estilo utilizado pelo tatuador. Apesar
da escolha do signo ser do tatuado, o estilo se perpetua em outros corpos.
Sobre o tamanho das tatuagens, nas fotos retiradas dos 3 perfis, não se observa
grande descordos. No geral, não é possível observar uma diferença significativa entre
o tamanho da tatuagem masculina e feminina em nenhum dos casos. Sobre esse
ponto, vale a pena ressaltar que, entre as 15 imagens analisadas, a menor e maior
tatuagem foram observadas em mulheres (figura 2 do perfil 1 e figura 1 do perfil 2).
Apenas 3 das 15 tatuagens nas imagens analisadas ultrapassam os limites de
uma região do corpo humano. São elas: a figura 4 do perfil 1 (nuca e costas); a figura
1 do perfil 2 (parte posterior da coxa e panturrilha); e na figura 2 do perfil 3 (antebraço
e pequena parte do bíceps). Nos dois primeiros casos, são tatuagens a pele de
mulheres, e no terceiro, na pele de um homem. Essa característica não parece possuir
nenhuma relação de gênero, pelo menos não na atualidade. Mas, como forma de
complemento a esses resultados, serão expostos aqui alguns dos resultados obtidos

52
por Andrea Osório (2005), através de observação e análises em estúdios de tatuagem
do Rio de Janeiro, sobre os locais das tatuagens no corpo do homem e da mulher:

As regiões mais tatuadas pelas mulheres são as costas (26.4%), o


pescoço/nuca (23.6%), e o calcanhar/pé (9.5%). Observe-se que as costas e
o pescoço/nuca correspondem à metade das tatuagens femininas (50%). As
costas são a segunda região corporal mais procurada pelos homens para a
tatuagem (14.1%). Apesar das costas serem mais procuradas por mulheres
(26.4%) do que homens (14.1%), não creio que se trate de uma região
feminina, na medida em que os homens a tatuam em larga escala. Tampouco
de trata de uma região neutra, na medida em que as mulheres tatuam a
lombar e os homens não. O braço é o local masculino por excelência (61.7%),
apresentando uma porcentagem de incidências superior à das costas e
pescoço/nuca juntas nas mulheres (50%). (OSÓRIO, 2005, p. 76)

Algumas dessas afirmações da pesquisadora foram encontradas nas imagens


analisadas nessa pesquisa. O braço, em ambas as situações, aparece como região
com predominância da tatuagem masculina, sendo vista em 5 de 7 fotos que
aparecem homens (os dois casos que não se referem ao braço ou antebraço, são as
figuras 3 e 5 do perfil 2 (costas e coxa, respectivamente). Há também 2 imagens com
mulheres tatuadas no braço (no perfil 3) e 1 no antebraço (no perfil 1), porém, se
observa uma diversidade maior de locais tatuados nas mulheres. Osório (2005) faz
questão de relacionar a escolha do braço, para os homens, com a questão da
exposição da tatuagem e ainda com a ideia de força que ela pode transmitir nessa
região do corpo masculino. Ela ainda afirma que essa relação entre a tatuagem e o
local onde ela vai estar no corpo também pode acontecer para as mulheres,
exemplificando ao citar a nuca, local de pouca visibilidade – facilmente é possível
“esconder” a tatuagem na nuca com o véu do cabelo -, e que aceita marcações
delicadas e pequenas.
Sabino e Luz (2006) reafirmam algumas observações feitas por Osório, mas em
uma contexto e cenário diferentes: as academias de musculação. Para os
pesquisadores, a mulher, nesses locais, tende a tatuar a nuca, a região lombar, os
seios, as nádegas e as virilhas, assim também como os omoplatas, pés e calcanhares.
Já os homens costumam tatuar os bíceps (parte exterior e interior), costas, deltoide,
antebraço e, de forma menos evidente, o abdômen, panturrilhas e peito. Os
pesquisadores vão além nos argumentos que influenciam a produção da tatuagem
nas mulheres, tanto em questão simbológica, referencial quanto a relação com as
partes do corpo feminino.

53
Deste modo, ao se servir do seu próprio corpo, a mulher tatuada, ao menos
neste caso específico, naturaliza uma ética estruturada culturalmente que a
constrói como ser-para-o-outro. A tatuagem parece então surgir como uma
espécie de adorno que realça e sensualiza determinados dotes físicos,
conferindo e reiterando à portadora o poder (ou o contrapoder) e o quantum
da sua feminilidade, construída como complemento e contraposição à
masculinidade que a define em oposição a determinada sensualidade
masculina que reside na musculosidade diretamente ligada à figura do
homem senhor de sua força e de forças alheias. (LUZ E SABINO, 2006, p.
259)

Analisando as imagens e os perfis de forma individual e respectiva, começamos


pelo perfil 1. Nessa situação, é possível realizar uma análise dos signos transmitidos
nas imagens. Não há limites para o conteúdo temático de uma tatuagem. A marca
epidérmica pode ser construída sobre ilimitadas particularidades, gostos ou
posicionamentos do indivíduo que decide se tatuar. Entretanto, é possível perceber
uma coleção temática mais “específica” principalmente no caso das mulheres das
fotos analisadas do perfil 1. Enquanto a primeira foto, que mostra a tatuagem do rosto
de um leão entre as bordas do formato de uma cruz – em um homem -, as tatuagens
femininas apresentam, respectivamente:

• Figura 2: O signo verbal “mãe”, seguindo do trajeto traçado de um pequeno


avião de papel, trajeto esse que, em um momento, toma a forma de um
coração. Através de uma tradução simples, essa tatuagem pode ser
relacionada com o conceito de família, ou apenas ao papel familiar materno.
Pode ser considerada uma homenagem ou mesmo uma espécie de
confirmação da maternidade da pessoa tatuada.
• Figura 3: Trata-se de um Hamsá, um símbolo da cultura islâmica. Um signo que
representa um amuleto contra forças negativas. No interior da tatuagem é
possível encontrar um desenho floral e alguns traços suaves e pontilhados,
esses últimos muito finos.
• Figura 4: Um desenho floral contornado por traços finos e com adornos que
seguem a coluna.
• Figura 5: Trata-se da cauda de um peixe ou de uma sereia. Um traço suave
acompanha o desenho. Por fim, há o pequeno desenho de uma concha de
ostra.

54
É possível perceber algumas convenções sociais e de signos atribuídas ao sexo
feminino nas tatuagens dessas mulheres. Osório (2005) discute sobre essa coleção
temática dos símbolos que comumente são vistos nos corpos femininos.

São desenhos criados especialmente para mulheres e que se diferenciam dos


demais (masculinos ou unissex) pela temática, envolvendo fadas, anjos, estrelas,
luas, flores. (...) Os ‘desenhos femininos’, muitas vezes, apresentam um aspecto
infantil, de desenhos feitos por crianças ou para crianças, como bonecas e
querubins. Os animais escolhidos por elas são domésticos ou vistos como
inofensivos, como gatos, beija-flores e golfinhos”. (OSÓRIO, 2005, p. 74)

Para os homens, Osório (2005) observou:

A maior parte dos desenhos “masculinos” envolve algum tipo de elemento de


agressividade (...), seja na escolha por animais selvagens ou por desenhos
associados a um imaginário guerreiro, como caveiras (...), samurais, índios e o
próprio dragão. Observar um significativo número de ideogramas poderia sugerir a
expressão de uma masculinidade menos agressiva, menos pautada em símbolos
de violência. Contudo, se somados, os desenhos relacionados a alguma forma de
agressividade são a maioria, pois estão disseminados em categorias e elementos
distintos. (OSÓRIO, 2005, p. 74).

Seguindo essas conclusões, Osório (2005) propõe que, subjetivamente, em


meio a sociedade e até mesmo no grupo de pessoas que possuem ou se interessam
por tatuagem, uma relação dos significantes adequados para cada tipo de tatuado já
está estabelecida. Essa separação entre a gramática epidérmica que se faz para o
homem e para a mulher considera, portanto, aspectos não criados sob o olhar da
tatuagem, mas são reflexos do decorrer histórico marcado pelo patriarcalismo e a
representação masculina, antes comentada por Bourdieu (2003) e a suposição da
fragilidade do gênero feminino.
Sobre esse uso de signos capazes de externar a ideia de masculinidade nos
homens, Silva (2000) propõe um claro argumento histórico capaz de tentar
compreender como esse fenômeno se origina na composição visual e representação
do homem na história. Ele explica:

A Revolução Francesa primeiramente, que apregoava os ideais de liberdade,


igualdade e fraternidade, e posteriormente a Revolução Industrial e as
conseqüentes guerras mundiais que se sucederam, trouxeram uma
desordem no papel do homem burguês, que tentava se reconstruir, fazendo
com que se consolidasse uma masculinidade e uma virilidade hegemônica
comum a todos os homens (Gay, 1995; Mosse, 1998; Badinter, 1993;
Almeida, 1995; apud SILVA). Sob a ameaça de uma feminilidade inerente a
alguns homens, decorrente do medo de tornarem-se homossexuais, e diante
da obrigatoriedade de pôr a prova o seu sexo forte, os homens tiveram que

55
cultivar mais do que nunca a sua masculinidade e a sua virilidade,
caracterizando também a primeira crise da identidade masculina” (SILVA,
2000)

Em todas as manifestações das marcas femininas encontradas no perfil 1 é


possível observar a predominância de traços mais finos. Enquanto na única foto de
tatuagem em um homem, o desenho (rosto de um leão) assume traços mais realistas
e nenhuma necessidade de outros adornos, traços e extensão da tatuagem à outras
áreas do corpo. Esse detalhe faz com que as tatuagens “femininas” do perfil 1, em
relação as tatuagens dos homens em todas as imagens analisadas, pareçam mais
claras e suaves, mesmo que seus tamanhos se assemelhem.
Voltando a falar sobre o conteúdo temático, começaremos a análise de forma
mais individualizada para o perfil 2. No perfil 2, nota-se uma similaridade muito
evidente das tatuagens dos homens e das mulheres. Somente na figura 2 o aspecto
estilístico não se manifesta dessa forma, mas é perceptível mesmo assim. O tatuador,
nesse caso, possui um estilo voltado ao abstrato. Seus desenhos apresentam formas
e traços irregulares e o uso de três cores predominantes: o preto, azul e vermelho.
Somente na figura 2 a tatuagem remete, em sua generalidade, a um signo de forma
concreta. Trata-se de um pássaro (aparentemente um corvo) vestido com uma caixa
craniana bovina. É possível ver, nas outras tatuagens, imagens concretas em meio às
formas abstrata como olhos, bocas e narizes, postas de forma a compor imagens
incompletas de rostos. No perfil 2 não é possível encontrar pontos específicos que
difiram o modo como a tatuagem está para os corpos masculinos e femininos, apesar
disso, ressalto que a figura 2 nesse perfil é a única tatuagem em que é possível
observar e traduzir os signos de uma forma geral, sem características abstratas.
No perfil 3, o aspecto mais facilmente observado é que todas as tatuagens foram
feitas na região do braço das pessoas. Nos três homens, a tatuagem aparece
predominantemente no antebraço, e nas duas mulheres, as tatuagens aparecem na
parte exterior do bíceps. Essa contestação reafirma os resultados obtidos por Osório
(2005), Sabino e Luz (2006) sobre a relação do braço com a tatuagem feminina, mas
também proporciona a problematização desse argumento em relação às mulheres.
Estariam as mulheres, por exemplo, tentando representar a ideia de força trazida por
Osório? A resposta para isso pode ser obtida através da reflexão sobre a citação de
Silva (2000) que afirma a “necessidade” do homem em reafirmar sua masculinidade
diante de uma sociedade que espera que ele se apresente dessa forma. Se

56
pensarmos pelo lado feminino, a mulher também sofre imposições e influências na
composição da sua aparência e comportamento, mas a abordagem das questões
feministas, em busca de equilíbrio e igualdade entre os sexos e gêneros, vislumbra
uma “abertura” para as produções estéticas ao disseminar o fato de que o corpo da
mulher pertence a ela e a ela cabe usá-lo como bem entender. Além disso,
compreender a crise de identidade citada por Silva (2000) como um processo ainda
atual do pensamento masculino e sob o argumento de que há uma necessidade da
reafirmação constante da masculinidade do homem para com o seu gênero e o seu
papel nas instituições da qual ele faz parte, devido a questões sócio históricas, há
também o entendimento de que as mulheres trilham um caminho oposto, do momento
em que alcançaram o espaço público até os debates atuais sobre posição e igualdade
de gênero e sexo. Culturalmente falando, a mulher moderna e feminista vai em direção
contrária às imposições que delimitam a composição da sua aparência, o que a
permite adentrar no universo da tatuagem e as características dessa produção sem
descaracterizar seu gênero.
Um ponto interessante na análise das fotos em geral é que em 4 das 7 tatuagens
dos homens é possível observar imagens que representam ossada humana ou
animal. Na figura 2 do perfil 2, há a caixa craniana bovina. Nas fotos 1, 2 e 4 do perfil
3, observasse nas duas primeiras a imagem clara de um crânio humano (na primeira,
somente uma lateral desse crânio), e na última, a forma de um crânio se mescla com
a forma de uma maçã. Essa observação abre margem para a percepção também, de
que há mais referências concretas e completas a seres reais na tatuagem dos
homens, se consideramos a representação dos crânios como uma referência ao ser
em si. Por exemplo, em 6 das 7 imagens é possível enxergar essa referência. Isso só
não é possível de ser visto na tatuagem 3 do perfil 2, por se tratar apenas de um olho
e não uma referência humana completa, como parte de um rosto, por exemplo, como
na figura 5, também do perfil 2. Para as mulheres, essa referência (concreta e
completa) só pode ser vista na foto 1 do perfil 3, onde há uma composição parcial de
um rosto humano, e na foto 3 do mesmo perfil, onde é possível ver o desenho de um
elefante, a cabeça de uma girafa e um golfinho. Em todo os outros casos de imagens
da tatuagem nas mulheres não há referência há seres reais. Na figura 5 do perfil 1,
mostra-se a uma cauda de um ser ou animal aquático, mas não é possível distinguir
se a representação é de um peixe, sereia ou outra referência.

57
Sobre a coloração das imagens, no perfil 1, todas as tatuagens se utilizaram
somente de tons de preto. Fora desse perfil, somente a na figura 5 do perfil 3 é
possível reencontrar esse padrão. Em relação as tatuagens coloridas, não é claro
observar as influências das cores nos resultados que remetem à pele masculina e a
feminina. Desse modo, as cores usadas nas tatuagens, para os dois casos, parece
ser resultado de uma decisão meramente estética, sem relação – nessa análise – a
discussão sobre gênero.

58
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A atuação da tatuagem na atualidade cresce de forma rápida e abrangente,


de maneira a ser utilizada como parte da composição identitária dos indivíduos. Há
milhares de anos tida como uma produção terapêutica ou medicinal, a prática de
marcar a pele permanentemente decorreu na história da humanidade, passando a ser
uma produção cultural e social, e posteriormente, uma prática estética. Atualmente,
são inúmeras as formas como a epiderme humana pode ser marcada e usada na
composição da identidade das pessoas.
Diante do resgate teórico, que traz a história da tatuagem desde a discussão
sobre os primeiros corpos tatuados observados pelo ser humano, até a forma como a
prática de ornamentação da pele em culturas das Ilhas do Pacífico e de outras regiões
do Globo, é possível compreender que a tatuagem pode e já foi usada como uma
prática social e de distinção de indivíduos de maneira estritamente delimitada, seja
em tribos nativas ou mesmo por militares ingleses e membros de associações
criminosas como a yakuza, no Japão. Atualmente essa prática não é uma obrigação
ou condição para que um sujeito seja incluído na sociedade em que está inserido, mas
continua tendo seu papel de diferenciar quem é tatuado e o que a tatuagem desse
sujeito representa ou simboliza.
Os conceitos que afirmam que a manifestação cultural é também uma
produção comunicacional podem ser relacionados com outros conceitos da semiótica
afim de contextualizar o comportamento comunicacional que a tatuagem pode exercer
em coletivos humanos e na sociedade em geral. Os conceitos de dedução e tradução
são indispensáveis para a compreensão desse argumento. Em complemento a
afirmação de que a tatuagem comunica e gera processos mentais para a sua
decodificação, sua estrutura pode lhe qualificar como linguagem e também como
gênero, discursivo e temático.
As conclusões filosóficas de Butler (2003) e Bourdieu (2003) são básicas para
o entendimento teórico sobre gênero discutido nessa pesquisa. Um dos conceitos-
chave usados aqui é o de performatividade de gênero, e a constatação de que
ninguém nasce masculino ou feminino, mas é construído sobre padrões estabelecidos
na sociedade vigente. Por outro lado, também se discute sobre como esses padrões
de vida, comportamento e aparência são capazes de direcionar os aspectos estéticos,
como a tatuagem, por exemplo.
59
O conceito de representação social é o fundamento da compressão da de
como o indivíduo se apresenta na sociedade e como a tatuagem pode ser usada na
para compor essa manifestação. Goffman (2014) afirma que o indivíduo é capaz de
criar uma imagem de si e usar todos os artifícios a sua disposição para externar essa
imagem como o objetivo de fazer as outras pessoas acreditarem que aquele é o seu
verdadeiro “eu”. Uma espécie de personagem, que pode ser criada de forma
consciente e inconsciente.
A análise qualitativa ressaltou conceitos e observações realizadas durante o
desenvolver teórico da pesquisa, discutindo e problematizando a produção da
tatuagem em perfis de tatuadores pernambucanos. Foi possível observar que poucos
elementos ilustram as diferenças entre as tatuagens “masculinas” e “femininas” nos
perfis analisados, mas foi possível encontrar características que puderam ser
comparadas com outros estudos analíticos, possibilitando a discussão sobre a
coleção temática das tatuagens e a região no corpo onde elas são encontradas.
Conclui-se, portanto, que existem aspectos sociais, históricos, culturais e
psicológicos que definem a produção da marca epidérmica enquanto tatuagem sob
questões de gênero, ainda que essa própria produção esteja em constante processo
de mudanças devidos aos aspectos dessas categorias citadas e do próximo contexto
social e cultural que ainda caminha para mais desenvolvimento técnico e social. Com
isso, a tatuagem que atualmente podemos encontrar pode ser observada e
problematizada se analisada e refletida diante de questões de gênero. Dessa forma,
é possível alcançar o compromisso de mostrar que o “tatuar” não é um processo
instantâneo, mas resultante do exercício mental, comunicacional, psicológico e de
representação social.

60
8. REFERÊNCIAS

A BÍBLIA SAGRADA. Antigo e o Novo Testamento. Barueri-SP: Sociedade Bíblica


do Brasil, 1993.

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8.1 REFERÊNCIAS DIGITAIS

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• https://www.statista.com/chart/5194/active-users-of-social-networks-and-
messaging-services/

• https://olhardigital.com.br/noticia/saiba-quais-sao-os-10-apps-de-redes-sociais-
mais-usados-pelos-brasileiros/70474

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9. ANEXO

9.1 PERFIS DE TATUADORES MAIS SEGUIDOS EM PERNAMBUCO*

PERFIL DO TATUADOR NÚMERO DE SEGUIDORES

@rafamedeirostattoostudio 77,4 mil

@skazxim 56,6 mil

@evertonirado 26,3 mil

@dinoferreiratattoo 19, 7 mil

@marquinhotattoo 15,9 mil

@philipesans 15,8 mil

@eduu_tattoo 14,6 mil

@nandozeve 13,2 mil

@brandaohenriquetattoo 11,7 mil

@lucassouzatattoo 11,3 mil

*Pesquisa realizada no mês de novembro de 2017 e atualizada nos dias 11 e 12 do


mesmo mês e ano.

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