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Tema I
Notas de Aula1
1. Responsabilidade civil
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,
nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida
pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
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Aula ministrada pela professora Lucia Mothé Glioche, em 26/8/2010.
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A doutrina traz outras nomenclaturas do direito comparado para os deveres primário e secundário:
respectivamente, chama-os de debitum e obligatio, do latim, ou shuld e haftung, do alemão.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
O CC, porém, não conceitua ato ilícito lato sensu como o simples ato de causar
dano. O artigo 186, supra, não tem por redação a simples frase “ato ilícito é causar dano”.
O conceito legal é mais específico, bem pormenorizado, contemplando diversos
pressupostos. Esse conceito do artigo 186 do CC é o conceito de ato ilícito em sentido
estrito, stricto sensu.
Vale mencionar que o conceito de ato ilícito mais amplo possível é o de ato que
descumpre a lei. Em qualquer seara – cível, penal, administrativa –, é ilícito o ato que é
contrário à lei. Contudo, no plano da responsabilidade civil, é ato ilícito em sentido amplo o
descumprimento de uma “lei” específica: a de não causar dano (norma que, como dito, não
tem positivação expressa).
Há que se atentar para alguns doutrinadores que entendem que o artigo 927 do CC,
supra, trouxe ao ordenamento expresso a adoção dos conceitos de ato ilícito em sentido
estrito e em sentido amplo. A leitura mais comum desse dispositivo não é essa: ali, segundo
a maior doutrina, está sediada a responsabilidade civil subjetiva, no caput, e a objetiva, no
parágrafo único. E só. Para essa vertente, porém, quando se fala em ato ilícito em sentido
amplo, se fala em descumprimento do dever primário, causar dano, ou seja, praticar
conduta que causa dano – o que é suficiente para configurar a responsabilidade objetiva, e,
por isso, o parágrafo único exibe a definição do ato ilícito em sentido amplo, abrangente: é
ato ilícito lato sensu a conduta que causa dano, para essa corrente. Já no caput, em
combinação com o artigo 186 do CC, a lei teria adotado o ato ilícito em sentido estrito,
porque menos abrangente, eis que apresenta um outro elemento, além da conduta que causa
dano: o elemento culpa. É ato ilícito em sentido estrito, portanto, a conduta culposa que
causa dano.
Em síntese: descumprir o dever primário de ser cauteloso com os bens alheios,
causando dano a outrem, é o conceito mais abrangente de ato ilícito, lato sensu; preencher
os elementos do artigo 186 do CC, por seu turno, é o ato ilícito em sentido estrito.
Há autores que afirmam que a responsabilidade civil não nasce só do ato ilícito,
como se tem dito até agora: nasce também de ato lícito. Para outros, há ainda uma outra
fonte da responsabilidade civil, que não o ato ilícito ou o lícito: nasce da própria lei. O
artigo 188 do CC traz causas excludentes da ilicitude, apresentando casos em que as
condutas, que seriam ilícitas, são reconhecidas lícitas, por lógica sistêmica:
Veja: no caso da legítima defesa, por exemplo, o ato passa a ser lícito, mas ainda é
causador de dano. O dano ainda existe. Mas note: o conceito de ato ilícito em sentido amplo
é resumido a ato que causa dano, pelo que surge o seguinte problema para o direito civil:
esse ato gerará responsabilidade?
Na seara penal, a exclusão da ilicitude elide completamente a responsabilidade. Na
cível, não: vai depender do exato motivo pelo qual foi excluída a ilicitude do ato, na forma
dos artigos 929 e 930 do CC:
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188,
não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que
sofreram.”
“Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de
terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância
que tiver ressarcido ao lesado.
Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se
causou o dano (art. 188, inciso I).”
Pode acontecer, então, de a conduta lícita, porque inserta nas previsões do artigo
188, ainda ser geradora de responsabilidade civil, na forma dos artigos supra. São os casos
de responsabilidade civil por ato lícito.
Há quem diga, no entanto, que não se trata, conceitualmente, de responsabilidade
civil derivada de um ato lícito, mas sim da própria lei: é o caso em que a lei impõe a
indenização. E uma terceira forma de se dizer a mesma coisa é o que faz outra corrente: na
verdade, o que há é a responsabilidade civil por ato ilícito sem qualquer diferença, pois
como se disse o ato ilícito em sentido amplo é apenas o ato que causa dano – e se há dano,
aqui, o ato é ilícito lato sensu. De qualquer forma, a indenizabilidade é a regra, variando
apenas a forma de a justificar – ou por ato lícito, ou por lei, ou por ato ilícito em sentido
amplo.
Um exemplo dessa situação é o do policial que, em legitima defesa de sua vida no
confronto com bandidos, dispara sua arma acertando um transeunte. O ato, em legítima
defesa, causou dano a quem nada tinha com o conflito. Nesse caso, seja o ato chamado de
lícito, ilícito lato sensu, ou responsabilidade ex lege, há que se indenizar, por conta de mera
questão de justiça – o foco jurídico, aqui, é na vítima. Sendo assim, o Estado responderá.
É claro que, no exemplo, se o próprio bandido é aquele atingido, não se impõe a
responsabilidade de indenizar, porque a legítima defesa era contra ato seu, criador do
perigo, e o artigo 929 é claro em emprestar indenizabilidade apenas à pessoa que não
causou o perigo, que nada tem com o fato.
“Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais
juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos,
e honorários de advogado.”
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
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Essa classificação da responsabilidade na quebra das tratativas não é assim, pacificamente, entendida como
contratual. Ao contrário, é bastante controvertida. Para Sílvio Venosa:
“A relação jurídica não nasce do ilícito, mas é a ele preexistente. O dever genérico
de não prejudicar não nasce do ordenamento jurídico, mas sim, do conteúdo das
tratativas e das condutas das partes.”
E há ainda uma terceira corrente, minoritária, que entende que a responsabilidade civil pré-contratual
é sui generis, um tertium genus da responsabilidade civil.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
O CDC não contempla tal classificação. A doutrina reputa que o CDC adota uma
teoria monista, unicista, do fato gerador, sendo irrelevante tal classificação, pela simples
presença do artigo 17 nesse diploma:
“Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as
vítimas do evento.”
“Art. 392. Nos contratos benéficos, responde por simples culpa o contratante, a
quem o contrato aproveite, e por dolo aquele a quem não favoreça. Nos contratos
onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em
lei.”
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
seja, não se exige que haja dolo ou negligência por parte do agente, bastando que haja a
conduta arriscada causadora do dano.
A responsabilidade civil é objetiva, portanto, quando a atividade normalmente
desenvolvida oferece risco de dano. É o que a doutrina chama de teoria do risco criado:
aquele que aceita desenvolver atividade arriscada responde pelos danos desta decorrente.
Mas há outra fonte da responsabilidade objetiva: a própria lei. Há casos em que,
mesmo que não haja atividade de risco, a própria lei comanda responsabilização objetiva,
dispensando análise de culpa.
Parte da doutrina chama a responsabilidade objetiva de responsabilidade civil com
presunção absoluta de culpa.
Há uma corrente absolutamente minoritária que entende que a regra, no
ordenamento, é a responsabilidade objetiva, mas diz isso por uma análise empírica da
realidade, porque entende que praticamente todas as atividades desenvolvidas em sociedade
são geradoras de algum nível de risco. Por exemplo, a mera atividade de conduzir veículo
automotor é arriscada, para tal corrente, e por isso seria caso de responsabilidade objetiva.
Como dito, é corrente minoritária, porque não se pode entender que haja risco criado em
toda e qualquer atividade que oferece qualquer perigo fático: dirigir é conduta capaz de
gerar dano, de fato, mas não é geratriz de responsabilidade objetiva, pois é um risco aquém
do considerado relevante para fim de responsabilização civil sem culpa – é
responsabilidade civil subjetiva.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Note-se, porém, que a responsabilidade por fato da coisa nem sempre vem
consignada em lei; a do exemplo dado, do animal, conta com previsão legal expressa, mas a
rigor seria desnecessária: a responsabilidade pelo fato da coisa vem da própria lógica
naturalística das relações jurídicas, que se passam entre pessoas, e não entre pessoas e
coisas. Como a coisa não pode ser chamada a responder, é a pessoa por trás desta coisa que
o será. É a teoria da guarda: o guardião da coisa responde por fatos desta, como se fosse
esta uma extensão da pessoa.
Veja o artigo 936 do CC:
“Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se
não provar culpa da vítima ou força maior.”
A responsabilidade por fato da coisa nem sempre vem da propriedade, sendo mais
técnico falar que vem da posse, pois quem tem a posse é o guardião da coisa, em regra.
“Art. 928. O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele
responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios
suficientes.
Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não
terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem.”
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
A terceira corrente, que diz que há apenas três elementos, assim o faz por reunir em
um só dois deles: para essa corrente, são elementos da responsabilidade civil o dano, o
nexo, e a conduta culposa – ou seja, reúne em um só os elementos conduta e culpa.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
arrimo no art. 1521, III, do CC/16. Inocorrência. O empregado do Clube não era
obrigado a intervir em luta corporal entre sócios, ainda que tenha ocorrido em suas
dependências, porque: exercia a função de guardador de armários na sauna;
comunicou o fato a um dos diretores; a contenda entre os sócios não guardava
relação com as atividades do Clube, certo que as lesões decorreram diretamente da
rixa e foram causados por outro sócio. Inexistência nexo causal entre a conduta do
empregado e o resultado danoso, nenhum é o dever reparatório. Provimento do
recurso para julgar improcedentes os pedidos, invertidos os ônus sucumbenciais.”
Questão 2
Resposta à Questão 2
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 3
MARLY MACEDO ingressa com ação de indenização por danos morais em face do
CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO MONTE AZUL, ao argumento de que no dia 10 de janeiro
de 2008, sua mãe MARGARIDA DE MACEDO, de 75 anos, faleceu vítima de incêndio
ocorrido em seu apartamento. Sustenta, em síntese que o que deu causa ao evento foi a
falta de recursos do condomínio réu que impedissem o resultado danoso. Justifica a autora
a ação o fato de que o prédio não possuía os requisitos de segurança indispensáveis para
as edificações conforme estabelece o Decreto Estadual nº 897/76, Código de Segurança
Contra Incêndio e Pânico. Aduz que o dano causado pelo réu deu causa ao ocorrido e
restou demonstrada mediante o falecimento de sua genitora e que é o suficiente para a sua
condenação. Acrescenta que a canalização preventiva de incêndio do prédio, naquele
momento, não funcionou em razão da falta de água e pressão, além de o réu não possuir a
rede de chuveiro tipo "sprinklers”, os conhecidos chuveiros automáticos. O condomínio em
contestação alegou que o laudo pericial acostado às fls., comprovou que o incêndio
ocorreu por curto circuito no apartamento da vítima e restou comprovada, neste aspecto, a
culpa exclusiva da vítima. Afirma, também, que a responsabilidade da vítima é concorrente
com a da autora com fundamento na culpa in vigilando, ao permitir que uma
septuagenária, more desacompanhada. Decida, fundamentadamente, a questão com
abrangência no aspecto do ato ilícito da Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 3
“Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua
indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto
com a do autor do dano.”
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema II
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Notas de Aula4
1. Conduta
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
poder destituídos. Mas o CC exige mais do que haver o poder familiar: exige que o menor
esteja em companhia dos pais. Estar em companhia não é estar na presença física, mas sim
na guarda dos pais, para que eles respondam. Havendo guarda alternada, aquele que estiver
com a guarda no momento é o responsável, bem como aquele que está em poder do menor
para fins de visitação.
O artigo 933 do CC estabelece que a responsabilidade civil pelos atos de terceiros,
nesses casos do artigo 932, é objetiva:
“Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que
não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali
referidos.”
Aquele que for responsabilizado pelo fato de terceiro terá regresso em face dele, a
não ser em uma hipótese: quando se tratar de filho ou descendente dependente, absoluta ou
relativamente incapaz. Veja o artigo 934 do CC:
“Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que
houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente
seu, absoluta ou relativamente incapaz.”
“Art. 928. O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele
responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios
suficientes.
Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não
terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem.”
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Incapaz é quem não pode celebrar negócios jurídicos por mão própria, e não quem
não possa causar danos, e por estes ser imputado. Praticado ato ilícito, lato sensu, o incapaz
deve por ele responder, para essa corrente. Sylvio Capanema assim entende: para ele, o
incapaz responde solidariamente, porque assim diz o CC, na forma do artigo 942, parágrafo
único.
Essa corrente interpreta o artigo 928 do CC da seguinte forma: se não houver como
os responsáveis responderem, os incapazes respondem sozinhos. É essa a leitura que se faz
do dispositivo, sem se subordinar a responsabilidade do incapaz às impossibilidade de
responsabilizar os seus responsáveis.
Reitere-se, porém: essa corrente é bastante minoritária, prevalecendo a corrente que
entende que é subsidiária a responsabilidade dos incapazes, reputando o parágrafo único do
artigo 942 como atinente apenas à possibilidade de concurso de agentes internamente ao
artigo 932.
No inciso II do artigo 932 do CC, a dinâmica é bastante similar à do inciso I do
mesmo artigo: responde o tutor pelos atos do pupilo, e o curador pelos atos do curatelado,
da mesma forma que o pai pelo filho menor – inclusive no que diz respeito à companhia,
que não é a presença física, como dito, mas sim a possibilidade de vigiar o dependente.
No inciso III do artigo em estudo, a incidência da responsabilidade objetiva é
consignada nas súmulas 341 do STF e 130 do STJ:
“Súmula 341, STF: É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo
do empregado ou preposto.”
“Súmula 130, STJ: A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano
ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento.”
“Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se
não provar culpa da vítima ou força maior.”
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem
de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.”
“Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano
proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.”
2. Culpa
A culpa, no sentido mais amplo, vem da ideia de falta, do francês faute, significando
violação, falha. É a violação de um dever, ainda que genérico, de cuidado, de atenção. Na
culpa lato sensu, insere-se também o dolo, que é a falta intencional, ao lado da culpa stricto
sensu.
A culpa em sentido estrito, que é o foco do estudo, é identificada por elementos
essenciais, necessários a formalizar tal circunstância. O primeiro elemento é a
previsibilidade: para haver culpa, ou seja, para que se imponha o dever de cuidado e se o
repute descumprido, é preciso que o agente possa ao menos prever, potencialmente, a
ocorrência do dano.
Um segundo elemento da culpa é a involuntariedade do resultado: a conduta é
voluntária, mas o resultado não. No dolo, tanto a conduta como o resultado são voluntários.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato
praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento
de dever legal ou no exercício regular de direito.”
A absolvição na seara criminal por falta de provas, apesar de ausente do artigo 935,
é um caso de coisa julgada que não contamina o juízo cível, que poderá perseguir o
causador do dano, procurando provas do fato e de sua autoria.
Casos Concretos
Questão 1
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 1
Em um dia chuvoso, todo motorista sabe que a atenção deve estar redobrada, sendo
claramente previsível que o veículo derrape. Por isso, a ré responde, em função da óbvia
previsibilidade do dano.
Quanto à perda da capacidade laborativa, essa certamente é relevante para fins de
indenização, in casu, eis que o fato de ser aposentado não faz dispensável essa capacidade.
Veja, a respeito, o julgado abaixo:
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 2
Resposta à Questão 2
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 3
Resposta à Questão 3
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 4
ELIAS PEREIRA propôs ação de indenização por danos materiais, morais e lucros
cessantes em face de JOAQUIM REIS, JOANA REIS E JORGE REIS, e ainda na busca da
declaração da existência de solidariedade entre os réus. Alegou em síntese ter sido
agredido a facadas pelo 3º réu, deficiente mental, o que resultou em incapacidade
temporária por mais de 30 dias. Alegou que o agressor é pessoa perigosa e salientou que o
mesmo faz tratamento no Centro Psiquiátrico de Campo Lindo há vários anos com
freqüentes internações no referido hospital. Atribui aos 1º e 2º réus a responsabilidade
pelo evento danoso, uma vez que é dever da família assistir a seus familiares e, por isso
credita aos pais do agressor culpa in vigilando pela negligência provocada. Os réus
contestam ao argumento que a lesão corporal sofrida pelo autor foi amplamente discutida
pelo Juízo Criminal, por meio de prova emprestada, o que demonstrou a insanidade mental
do agressor e, consequentemente, a sua inimputabilidade. Como juiz, decida a questão.
Resposta, fundamentada, em 15 (quinze) linhas.
Resposta à Questão 4
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema III
Nexo causal. Teorias. A teoria acolhida pelo nosso Direito Civil. Causalidade da omissão. Concausa.
Exclusão do nexo causal. Fato exclusivo da vítima. Fato de terceiro. Caso fortuito e força maior.
Notas de Aula5
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Aula ministrada pelo professor Álvaro Henrique Teixeira de Almeida, em 27/8/2010.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
1. Nexo causal
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
que a empresta a outrem, que a deixa sobre a mesa. Terceira pessoa, então, supondo a arma
descarregada, a manuseia, momento em que um quarto indivíduo entra, de surpresa,
assustando o que manuseia o revólver; acidentalmente, a arma dispara, e, com isso, pessoa
que estava em outra sala é atingida, e morre.
Nesse exemplo, todas as pessoas citadas – o dono da arma, que a emprestou; aquele
que a deixou sobre a mesa; aquele que a manuseou e atirou; e aquele que o assustou, todos
eles, responderão pelo dano causado, porque todos concorreram, de qualquer forma, para o
dano, e se os antecedentes são todos equivalentes, a cadeia causal formada será, toda ela,
imputada.
Essa teoria é bastante criticada, e certamente não foi adotada em nosso ordenamento
jurídico para fins de responsabilidade civil. Parece claro que há uma retroação ad infinitum,
se assim se operar, vez que, a rigor, também é causa antecedente equivalente o fato de
alguém ter vendido a arma para o proprietário, e, no mais absurdo dos vínculos remotos –
absurdo, porém tecnicamente possível, em se seguindo o raciocínio dessa corrente –, a mãe
do fabricante da arma terá responsabilidade, porque se não desse seu filho à luz a morte não
ocorreria.
A teoria da causalidade adequada, por seu turno, é a que nosso ordenamento adota, e
que, em síntese, pode ser assim resumida: a causa adequada é extraída de uma averiguação
científica de probabilidades. Dentre os antecedentes do dano, há que se destacar aquele que
está em condições de necessariamente tê-lo produzido, ou seja, é o mais relevante dos
antecedentes. No exemplo dado, o único responsabilizado será aquele que efetuou o disparo
culposo, seguindo-se a teoria que nosso ordenamento elegeu, a da causalidade adequada,
conditio sine qua non. O critério eliminatório dos antecedentes menos relevantes consiste
em identificar que, mesmo na ausência de um antecedente, o dano ocorreria – é a
identificação do centro, do ponto nodal, imediato, do nexo causal.
A ideia fundamental da doutrina, em relação a essa teoria, é a de que só existe
verdadeiramente uma relação de causalidade entre o fato e o dano quando o ato ilícito
praticado for efetivamente apto a causar aquele dano, segundo o curso normal da coisa e as
regras de experiência. Para a doutrina, essa teoria da causalidade adequada é encontrada
positivada no artigo 403 do CC:
“Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só
incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e
imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.”
Quando o legislador fez a opção por restringir a reparação dos danos aos efeitos
direta e imediatamente decorrentes da conduta, optou pela teoria da causalidade adequada.
Somente a causa mais direta, a mais determinante, guarda nexo imputável ao
agente. Por exemplo, se o condutor de um veículo causa um acidente, e, levando a vítima
para o hospital, ela vem a morrer por falta de atendimento hospitalar, não se lhe imputa a
morte: a causa mais adequada à morte é a falta do atendimento pelo hospital, e não o
atropelamento – o qual é causa remota, havendo sim o liame, mas menos intenso do que o
liame entre a falha hospitalar e a morte.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Quando a vítima, de alguma forma, concorre com sua conduta para que o resultado
ocorra, se dá essa concorrência de causas, ou concorrência de culpas, como ainda se chama
tal fenômeno.
A culpa, ou fato, pode ser exclusivo da vítima. Quando o for, estará excluída a
responsabilidade de outrem, porque não se formará nexo entre nenhuma conduta, senão
aquela da própria vítima. Rompido o nexo, não há responsabilidade de ninguém mais, a não
ser da própria vítima.
A concorrência de culpas, ou de fatos, não exclui o nexo. Nesse caso, portanto, o
que se impõe é a redução do quantum indenizatório. Veja o artigo 945 do CC:
“Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua
indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto
com a do autor do dano.”
Quando não for possível determinar o grau de culpa de cada um, o grau de
relevância de cada conduta, a redução será pela metade; quando for possível encontrar a
proporção da relevância, a indenização será assim estabelecida.
Sérgio Cavalieri dá um bom exemplo: pessoa trafegava na garupa de uma
motocicleta, sem capacete. O motorista de um carro, errando na condução, abalroa tal
motocicleta, e o garupa vem a sofrer sérios danos na cabeça, por estar sem capacete: nesse
caso, há concorrência de culpas, concorrência de causas? Na verdade, não há: a causa
adequada ao evento danoso foi o abalroamento culposo, e não a ausência de capacete. Sem
o abalroamento, a falta do capacete não causaria dano algum. Há culpa da vítima em não
cumprir a norma de trânsito, mas essa culpa não é relevante na ocorrência do evento
danoso, qual seja, a colisão dos veículos. O choque não se deu por ela estar sem capacete. A
relevância da conduta da vítima, aqui, é para a extensão de seus danos, mas não para a
ocorrência do evento danoso.
Um exemplo em que se dá concorrência de fatos é o de uma colisão frontal entre
dois veículos, acidente que só aconteceu porque os dois estavam invadindo a contramão
parcialmente, ou seja, trafegavam ultrapassando a faixa de rolamento divisória das mãos.
Cada um será responsável por pagar metade dos danos do outro veículo.
1.2. Concausas
Concausas são circunstâncias que concorrem para o agravamento do dano, mas que
não têm a virtude de excluir o nexo causal da conduta principal. É o caso do exemplo dado
há pouco, da colisão com a motocicleta: a falta do capacete é concausa para o dano
craniano, mesmo não sendo causa concorrente para o evento da colisão.
A concausa é uma outra causa, que não inicia nem interrompe o processo causal –
apenas o reforça, tal como um rio menor deságua num maior (expressão de Cavalieri).
Assim, não rompem o nexo causal principal, não afastando a responsabilidade daquele que
causou o evento principal, com sua conduta.
A concausa pode ser preexistente ao evento danoso, e é aquela preexistente ao
próprio desencadear do nexo causal. Assim, por exemplo, são concausas preexistentes as
condições pessoais da vítima, tais como suas patologias, que em nada diminuem a
responsabilidade do agente causador de um dano que se agrava ou altera por conta das
concausas.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
É assim que o agente que ataca uma pessoa, lesionando-a com dolo de lesão, sem
saber que ela era hemofílica, ainda terá guardado o nexo entre sua agressão e a morte que a
patologia induziu, porque a concausa preexistente não altera o nexo causal. Contudo, nesses
casos, a responsabilidade poderá ser afastada não porque o nexo foi quebrado pela
patologia – o nexo entre o dano e a agressão permanece hígido –, mas sim por falta de outro
elemento: pode faltar a culpa, eis que falta previsibilidade acerca da patologia, e ser
previsível é elemento da culpa lato sensu6.
Há também concausas supervenientes, ou mesmo concomitantes, cujo tratamento
jurídico é idêntico ao das preexistentes: tais concausas não quebram o nexo causal da
conduta original, apenas agravando o dano. A causa superveniente somente tem o condão
de afastar o nexo quando não for concausa, ou seja, quando for ela própria a causa mais
adequada do dano, erigindo-se em causa direta e imediata do dano, em atenção ao sistema
da causalidade adequada, afastará a responsabilidade do agente anterior, rompendo o nexo
anterior e fazendo surgir um novo nexo de causalidade. Exemplo que já foi mencionado é o
da morte do neonato que se deu por um aneurisma, e não pelo erro médico – o nexo existe
entre a morte e o aneurisma, causa superveniente que exclui o nexo entre a morte e o erro
médico. Se a morte não se imputasse ao aneurisma, mas sim à conduta do médico, o
aneurisma seria concausa superveniente irrelevante para afastar o nexo entre o erro e a
morte da criança.
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Veja que se, nesse caso, a agressão fosse causada por um agente público, nessa qualidade, a responsabilidade
do Estado não seria afastada, pois é objetiva: como o nexo causal restou intacto, e não se vai perquirir da
culpa, a responsabilidade estatal está mantida (e nem mesmo o regresso será frutífero, porque a
responsabilidade do agente, subjetiva, não foi culposa). E note-se que, mesmo que haja uma incongruência
aparente – a vítima hemofílica será indenizada pelo Estado, se o agente for público, mas se o agressor for
particular não o será –, tal incongruência inexiste, por conta dos fundamentos diversos das responsabilidades
subjetiva e objetiva: na primeira, o fundamento é justamente a culpa, sendo injusto imputar alguém sem culpa
lato sensu; na segunda, a responsabilidade se deve à teoria do risco, em que se faz quase impossível provar
culpa do responsável – sendo injusto deixar a vítima sem indenização.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
(...)
Relevância da omissão(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para
evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:(Incluído pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; (Incluído pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984)
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; (Incluído
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.
(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).”
27
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Casos Concretos
Questão 1
28
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
pela passagem aberta pela ré no canteiro central, vez que não existem passarelas. Aduz
que é de responsabilidade da ré conservar a rodovia por ela administrada com perfeita
iluminação e segurança, uma vez que os transeuntes dela sempre se utilizam para a sua
locomoção. Em contestação a concessionária ré sustenta que a vítima agiu
imprudentemente, ao trafegar com sua bicicleta em pista de rolamento de alta velocidade,
à noite, em trecho perigoso, perto de curva e sem iluminação adequada; o que poderia ter
optado pela travessia em viaduto existente em aproximadamente 300 metros do local do
acidente. Acrescentou, também, que pelo princípio da eventualidade deve ser considerada
a culpa concorrente e, ainda ressaltou a inexistência de comprovação da dependência
econômica da autora em relação à vítima. Na qualidade de juiz, como decidiria a questão?
Resposta, fundamentada, em 15 (quinze) linhas.
Resposta à Questão 1
A concessionária não pode ser responsabilizada, eis que o nexo causal aponta
exclusivamente para a conduta da vítima: há a excludente do nexo consubstanciada no fato
exclusivo da vítima, que não pode ser isenta de qualquer responsabilidade por seus próprios
atos, sob pena de se adotar postura paternalista incompatível com o direito.
Veja:
Questão 2
29
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
30
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Além disso, a comunicação do furto ao banco deve ser feita pelo cliente, sob pena de se
configurar fato exclusivo da vítima a quebra do dever de informação.
Sendo assim, não havendo obrigação de verificar a assinatura, por serem cheques
pequenos, e não havendo a cautela do consumidor, o fato exclusivo da vítima exclui o nexo
de causalidade entre a conduta bancária e o prejuízo. Houvesse comunicação do cliente, ou
houvesse obrigação de aferição da correção dos dados, a responsabilidade seria do banco.
Veja os seguintes julgados:
31
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema IV
Dano. Conceito. Dano patrimonial: dano emergente e lucro cessante. Dano moral: evolução doutrinária,
posicionamento atual, configuração, prova, arbitramento. Legitimação para pleitear o dano moral.
Transmissibilidade. Liberdade de informação e inviolabilidade da vida privada. Controvérsias sobre
Responsabilidade Civil no âmbito do Direito de Família.
32
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Notas de Aula7
1. Dano
A noção de dano, assim como toda a noção sobre os bens jurídicos em geral, vem
sendo alargada, ampliada, no decorrer da evolução jurídica, sempre no afã de melhor
proteger a vítima.
O melhor dos exemplos dessa dinâmica é mesmo o dano moral. Em regra, como
qualquer dano, é preciso que seja provado para haver responsabilidade por sua reparação.
Contudo, há eventos que causam danos morais, sem que haja qualquer dúvida, pela sua
própria natureza: são os danos in re ipsa. A negativação indevida de dados daquele que tem
conduta de bom pagador, a morte de entes queridos, o extravio de bagagens, são exemplos
de danos que dispensam a prova de perturbação moral, eis que essa perturbação é
presumida de forma jure et de jure, absoluta.
O abandono moral por parte de um dos pais também é exemplo em que há claro
prejuizo psicológico. Todavia, há que se conceituar, aqui, o que é o dano moral indenizável
(compensável, mais tecnicamente, em se tratando de dano moral), porque a doutrina faz
diferença entre dano justo e dano injusto: apenas o dano injusto é indenizável.
Vejamos um exemplo de dano justo, e por isso não indenizável: o prejuízo causado
pela perda da clientela para a concorrência, em disputa normal de mercado, é um dano – há
a perda de lucro. Porém, não é um dano injusto: a disputa de mercado é perfeitamente lícita,
e inclusive fomentada. Assim, não há que se falar em indenização8.
A indenizabilidade é uma cláusula geral de proteção a interesses juridicamente
protegidos; se o interesse prejudicado não é tutelado (como no exemplo acima, o lucro
perdido em concorrência justa), o dano a ele infligido não gera indenizabilidade.
No dano patrimonial, esse raciocínio é mais visível, como se viu no exemplo. No
dano moral, é mais intrincado. O exemplo do abandono moral, ou o do rompimento de um
noivado, são casos que suscitam dúvidas justamente quanto à justeza ou não do dano: dano
moral há, é fato; mas é este justo ou injusto?
A questão é altamente controvertida, exatamente por não se conseguir consenso
sobre a exigibilidade ou não da conduta diversa daquela que causa o dano. Não se pode
impor a ninguém que se case, que mantenha o noivado, por exemplo, sob pena de se
interferir demais na vida privada e nas liberdades pessoais. O mesmo se dá com a relação
paternal: não se pode impor a ninguém sentir afeto pelo filho. Se não é imponível uma
conduta, o dano decorrente da conduta contrária não pode ser indenizável – é um dano
justo. O STJ, a respeito do abandono moral, é claramente refratário à indenizabilidade do
dano moral: entende que há dano, mas não é indenizável (reputando que a sanção por esse
dano já existe, qual seja, a perda do poder familiar).
A ruptura de um noivado, mesmo que cause dano moral, também não é indenizável:
impor-se indenizabilidade a tal fato seria interferir demasiadamente na liberdade das
pessoas, nas relações privadas, pois rompimento de noivado não é ato ilícito apto a ensejar
7
Aula ministrada pelo professor Rafael Viola, em 27/8/2010.
8
Por curiosidade, a jurisprudência entende que o disparar indevido de um alarme antifurto, em loja, não gera
dano moral, em regra; só haverá dano moral se o preposto da loja agir com indelicadeza e alarde. Outro caso
curioso, em que o STJ entendeu que não houve dano moral, foi o fato de consumidor encontrar inseto em sua
garrafa de refrigerante, se não bebeu o líquido, por não chegar a haver qualquer perturbação efetiva de
nenhum aspecto da psique do autor.
33
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Ocorre que o dano moral, nesse leading case, pautou-se numa concepção iniciada
no aspecto material da perda dos filhos – como era concepção da época, de fato. Entendeu,
a Corte, que o fato de o pai ter envidado esforços patrimoniais na criação das crianças lhe
gerava indenizabilidade pela perda de seus “investimentos”. Na esteira desse raciocínio, se
emitiu, inclusive, a súmula 491 do STF:
“Súmula 491, STF: É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor,
ainda que não exerça trabalho remunerado.”
É claro que essa concepção material não tem mais vigência. O dano moral, hoje, é
puro, autônomo, dissociado do patrimonial, e com esse cumulável, na forma da súmula 37
do STJ:
“Súmula 37, STJ: São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral
oriundos do mesmo fato.”
O dano moral não pode ser confundido com a consequência do dano moral. Não é
correto falar apenas que o dano moral é a perturbação psicológica: esse distúrbio é uma
consequência do dano moral. A definição do que seja exatamente o dano extrapatrimonial
precisa ser objetivada ao máximo, e para isso se adotou um critério essencial fundamental:
o dano moral decorre da violação a direitos da personalidade: honra, privacidade, imagem,
integridade física, são direitos da personalidade que, se violados, danificados, demandam
indenização. O restante, o que daí decorre – a perturbação psicológica, que é mais ou
menos intensa a depender do caso –, se presta não a definir dano moral, mas sim a
mensurar a intensidade da indenizabilidade, ou seja, o valor da indenização.
34
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Mas nem mesmo essa doutrina, que assim define o dano moral, é perfeita. Imagine-
se, novamente, a perda de um filho: o direito violado é puramente a integridade psíquica,
que não é arrolada como direito da personalidade. É por isso que a doutrina mais moderna
vai ainda além: não se atém à violação a direitos da personalidade como alvo dos danos
morais, trazendo como objeto de violação, em última análise, a cláusula geral de tutela da
pessoa humana, ou seja, a dignidade da pessoa humana – pois essa sim engloba a
integridade psíquica como objeto puro.
Assim, o dano moral é a patologia da dignidade da pessoa humana. É a ofensa ao
imo do ser humano. Com a relevância dessa constatação, diz-se que o dano moral
prevalece, inclusive, sobre danos materiais, em havendo eventual conflito.
O STJ ainda tem uma visão um pouco menos técnica dessa questão, reputando
como dano moral tanto a própria dor, sofrimento, quanto a violação a direitos da
personalidade e à dignidade da pessoa humana.
Acerca dos critérios de quantificação do dano moral, veja a ementa e trecho de um
julgado desse TJ/RJ que elege bons elementos:
“Processo:0038484-43.2004.8.19.0001(2009.001.36369).1ªEmenta– APELACAO.
DES. MARCO AURELIO BEZERRA DE MELO - Julgamento: 10/11/2009 -
DECIMA SEXTA CAMARA CIVEL.
DIREITO DO CONSUMIDOR E RESPONSABILIDADE CIVIL. PRETENSÃO
COMPENSATÓRIA DE DANOS MORAIS. NEGATIVAÇÃO INDEVIDA DO
NOME DO AUTOR NO CADASTRO DE INADIMPLENTES. RÉ QUE NÃO
LOGROU ÊXITO EM COMPROVAR A REGULARIDADE DO DÉBITO.
INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL. ALEGAÇÃO DE FRAUDE
EFETUADA POR TERCEIRO QUE NÃO AFASTA A RESPONSABILIDADE
CIVIL OBJETIVA DA RÉ. APLICAÇÃO DO ARTIGO 17 DO CODECON.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. INCONFORMISMO DO RÉU
PUGNANDO PELA IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO OU EM CASO DE SUA
MANUTENÇÃO, A REDUÇÃO DA VERBA INDENIZATÓRIA FIXADA.
RECURSO CONHECIDO. FATO DO SERVIÇO CARACTERIZADO.
QUANTUM FIXADO EM R$ 10.000,00, QUE SE MOSTRA EM
DISSONÂNCIA COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E
PROPORCIONALIDADE E COM OS PARÂMETROS ADOTADOS POR ESTA
CORTE, EM CASOS SEMELHANTES, PELO QUE MERECE SER REDUZIDO
PARA O VALOR DE R$ 5.000,00. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 89 DO TJRJ.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
O dano moral é de natureza altamente subjetiva, e a verdade é que toda e qualquer
quantia que se atribua como compensatória de um evento moralmente danoso não
passa de uma tentativa vã, porém imperiosa, de se oferecer resposta ao lesado, em
atenção ao neminem laedere, postulado regente da vida em sociedade que apregoa
que não se pode permitir que alguém lese outrem sem resposta social vigorosa.
Vale considerar a preciosa lição de José de Aguiar Dias, que sobre o tema diz:
“O dano moral é o que se sofre com a repercussão de um mal ou dano não
conversível em dinheiro. A indenização por dano moral tem por fim ministrar uma
sanção para a violação de um direito que não tem um dominador econômico. Não é
possível sua avaliação em dinheiro, pois não há equivalência entre o prejuízo e o
ressarcimento. Quando se condena o responsável a reparar o dano moral, usa-se de
um processo imperfeito, mas o único realizável, para que o ofendido não fique sem
uma satisfação.” (grifo nosso)
Destarte, ainda que imperfeito, o processo compensatório que se vale da pecúnia
aparece como a única solução para problemática aparentemente insolúvel: a
35
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
reparação de algo que é irreparável, em essência. Esta matéria é das que mais se
deduz em juízo, contribuindo muito para o abarrotamento de trabalho do Poder
Judiciário, mas esta repetição diuturna tem um lado positivo: o processo de
quantificação do dano moral tem sido depurado e aperfeiçoado com a análise
reiterada da matéria. Por conta dessa depuração, alguns critérios puderam ser
eleitos como norteadores das quantias compensatórias, dentre os quais podemos
citar a tão em voga razoabilidade como o mais adequado. Isto porque a equidade,
substrato da razoabilidade, é tão subjetiva quanto o próprio dano moral, podendo
acompanhar as variações extremamente sutis que este impõe. O critério de justum,
que nos vem positivado no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, é
inafastável em qualquer mensuração de dano moral. Veja:
“Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às
exigências do bem comum.”
É certo que foi com tudo isto em mente que a jurisprudência deste Tribunal de
Justiça diligenciou pela edição do enunciado 89 de sua súmula, in verbis:
“APONTE DO NOME COMO DEVEDOR INADIMPLENTE. INDENIZAÇÃO.
FIXAÇÃO DO VALOR. FIXAÇÃO EM MOEDA CORRENTE. Razoável, em
princípio, a fixação de verba compensatória no patamar de até 40 (quarenta)
salários mínimos, em moeda corrente, fundada exclusivamente na indevida
negativação do nome do consumidor em cadastro restritivo de crédito.”
O patamar que nesta súmula se estabeleceu tem por escopo não criar uma média,
mas sim um teto recomendado, percebido como satisfatório na análise de
reiterados casos de violações similares pela jurisprudência.
Diante deste escorço, é sabido que não deve constituir, a indenização, meio de
locupletamento indevido do lesado e, assim, deve ser arbitrada com moderação e
prudência pelo julgador. Algo que deve ser levado em conta, pelo julgador de um
caso como este, além de todos os demais aspectos que a doutrina tem considerado
para fins de quantificação do dano moral, é a situação econômica do local em que
se dá a relação jurídica debatida. No Brasil, dificilmente se terá espaço para
indenizações de grande porte, como as vistas em potências econômicas do mundo
capitalista desenvolvido. Nossos parâmetros devem, decerto, ser compatíveis com
nossa realidade econômica.
(...)”
É legitimado para demandar pela reparação do dano aquele que o sofre. Isso é
óbvio. A problemática questão da legitimidade reside é na transmissibilidade do dano
moral.
Vejamos um exemplo: indivíduo sofre inscrição de seus dados, indevidamente, em
cadastros restritivos do crédito. Antes de ajuizar a ação, ele morre. Seus herdeiros têm
legitimidade para ajuizar o pleito?
O dano moral é personalíssimo, porque é uma violação, como dito, a direitos da
personalidade ou à dignidade da própria pessoa. Sendo assim, não seria transmissível.
Contudo, o dano moral é surgido em vida; a lesão moral, uma vez ocorrida, gera um crédito
potencialmente exigível, e esse crédito é transmissível.
Repare que não se está falando que o direito da personalidade é transmissível. Não é
a personalidade, que se extinguiu com a morte, que será transmitida. O que a sucessão
36
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
abarca, nesse caso, passando-se aos herdeiros, é o direito de crédito que surgiu, em vida,
pela violação da personalidade, direito creditício esse que é perfeitamente transmissível
pela saisine, eis que patrimonial. É nesse sentido que vige o artigo 943 do CC:
A leitura que se faz de outro artigo do CC, o 12, parágrafo único, é diferente: ali se
encartam as ofensas aos mortos praticadas quando já obituados, ou seja, a ofensa à
memória, à imagem, etc, do morto, são reclamáveis pelos sucessores, porque é uma ofensa
a direitos próprios dessas pessoas, e não porque o morto ainda permanece com direitos
vigentes – vez que isso é impossível, pois a personalidade deixa de existir com a morte.
“Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade,
e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida
prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou
colateral até o quarto grau.”
Casos Concretos
Questão 1
Em comemoração dos 15 anos de sua filha, Alba ofereceu uma grande festa no
hotel X (cinco estrelas) para parentes e amigos. A festa foi um fracasso, pois, além de a
comida estar fria, ser pouca e de péssima qualidade, faltou também bebida e garçons. Alba
quer pedir indenização. Esclareça o fundamento da ação e o que poderá ser pleiteado,
justificadamente.
37
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 1
38
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 2
Resposta à Questão 2
39
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
40
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
praticado pelos policiais militares e que a ação somente foi proposta após sua
morte porque aguardava-se o trânsito em julgado da ação penal.
10. Com essas considerações doutrinárias e jurisprudenciais, pode-se concluir que,
embora o dano moral seja intransmissível, o direito à indenização correspondente
transmite-se causa mortis, na medida em que integra o patrimônio da vítima. Não
se olvida que os herdeiros não sucedem na dor, no sofrimento, na angústia e no
aborrecimento suportados pelo ofendido, tendo em vista que os sentimentos não
constituem um "bem" capaz de integrar o patrimônio do de cujus. Contudo, é
devida a transmissão do direito patrimonial de exigir a reparação daí decorrente.
Entende-se, assim, pela legitimidade ativa ad causam dos pais do ofendido, já
falecido, para propor ação de indenização por danos morais, em virtude de ofensa
moral por ele suportada.
11. Recurso especial do Estado de São Paulo conhecido, mas desprovido.”
Questão 3
Resposta à Questão 3
41
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema V
Dano estético. Dano à imagem. Dano à imagem da pessoa falecida. Dano reflexo. Liquidação do dano.
Verbas indenizáveis.
Notas de Aula9
1. Dano estético
9
Aula ministrada pelo professor Renato Lima Charnaux Sertã, em 30/8/2010.
42
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Dano é tudo aquilo que é afetado na esfera jurídica de alguém, do lesado. Pode ser
material ou imaterial, como visto. Mas há algumas subespécies de dano que não se
encartam com precisão nem na categoria material, nem na moral. Um deles é o dano
estético.
Consiste, o dano estético, na lesão a algum aspecto físico do ser humano, alguma
faceta de sua aparência física. É o que o STJ chama de enfeiamento. Por assim ser, já se
destaca logo que a pessoa jurídica jamais padecerá desse tipo de dano.
A alteração provocada pelo dano estético, no corpo da pessoa, teria natureza moral
ou material, ou autônoma? Há duas correntes doutrinárias disputando a solução: a primeira,
capitaneada por Caio Mário e Sérgio Cavalieri, entende que o dano estético é moral, pois a
repercussão de ter-se deformado é essencialmente psicológica, sem a natureza patrimonial
que é da essência do dano material. A segunda corrente, abraçada pela maioria dos
Ministros do STJ, entende que o dano estético não se confunde com o dano moral, sendo
espécies destacadas, passíveis de serem mensuradas em separado, de forma autônoma – o
dano estético seria um tertium genus, por essa questão pragmática da quantificação em
separado. Essa corrente aparece com mais força, contando até com súmula a sustentá-la, o
enunciado 387 do STJ:
“Súmula 387, STJ: É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano
moral.”
É no “outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido” que se enquadraria o dano
estético.
2. Dano reflexo
Também chamado dano em ricochete, consiste no dano causado a pessoa que não é
aquela que diretamente foi alvejada pelo evento danoso. A imagem do ricochete é bastante
precisa para ilustrar esse dano, exatamente porque traduz a ideia de uma repercussão
indireta, além de evidenciar que deve existir proximidade entre a vítima direta e a reflexa, e
quão mais próxima maior a severidade do dano repercutido.
O dano em ricochete pode ser tanto material quanto imaterial, moral, e sua
caracterização, como dito, depende intimamente da proximidade jurídica do lesado com a
vítima reflexa. Aplica-se a teoria da causalidade adequada, como em qualquer tipo de dano,
pois o dano reflexo também deve ser causado direta e imediatamente pelo evento danoso.
43
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
O dano material reflexo, mesmo fora dessa hipótese legal supra, é de simples
constatação, como no exemplo dos músicos, supra. Já o dano moral em ricochete é de mais
difícil apuração – é muito mais sutil, pois muitas das vezes se está falando de um dano
direto, e não reflexo. É por isso que, de fato, há quem defenda que inexiste dano moral
reflexo: será sempre direto, decorrente da ligação da pessoa àquela que foi diretamente
lesada pelo eventum damni.
É assim que o filho daquele que sofre um atropelamento e padece de seqüelas
(tendo danos morais, portanto), sofre dano moral próprio, por ver seu pai naquelas
condições10.
O julgado abaixo é relevante, mesmo não tratando especificamente do dano reflexo,
porque trata bem do nexo causal:
44
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
3. Dano à imagem
O dano à imagem passa por discussão semelhante ao dano estético, no que diz
respeito à sua natureza: é moral, material, ou misto? Há, aqui também, divergência
doutrinária. Há uma nota bastante clara de natureza moral, aqui, tal como no dano estético,
mas há também uma presença de repercussão material muito mais palpável do que no
estético. Isso porque a imagem é protegida, no CC, no artigo 20, que diz:
45
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
46
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
seus atos. O TJ/RJ, por maioria, não reconheceu esse direito ao esquecimento, por haver o
interesse público no conhecimento dos fatos, como se vê no julgado abaixo:
“Art. 42. Os direitos patrimoniais do autor perduram por toda sua vida.
§ 1º Os filhos, os pais, ou o cônjuge gozarão vitalíciamente dos direitos
patrimoniais do autor que se lhes forem transmitidos por sucessão mortos causa.
§ 2º Os demais sucessores do autor gozarão dos direitos patrimoniais que este lhes
transmitir pelo período de sessenta anos, a contar de 1º de janeiro do ano
subseqüente ao de seu falecimento.
47
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 41. Os direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos contados de
1° de janeiro do ano subseqüente ao de seu falecimento, obedecida a ordem
sucessória da lei civil.
Parágrafo único. Aplica-se às obras póstumas o prazo de proteção a que alude o
caput deste artigo.”
Essa previsão norteia o interesse referente à pessoa falecida, ao menos no que diz
respeito aos direitos autorais. Veja também, nesse intento, os julgados abaixo:
4. Verbas indenizáveis
48
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Súmula 43, STJ: Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da
data do efetivo prejuízo.”
49
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Se se tratar de ato ilícito, os juros correm do próprio fato, porque é ali que surgiu a
obrigação de ressarcir, ou seja, no exato instante em que se deu o dano. Veja a súmula 54 do
STJ:
“Súmula 54, STJ: Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de
responsabilidade extracontratual.”
A taxa de juros é de um por cento ao mês, na forma da conjugação dos artigos 406
do CC e 161 do CTN:
“Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem
taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados
segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos
devidos à Fazenda Nacional.”
Casos Concretos
Questão 1
50
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 1
51
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
O que essa súmula estabelece é que quando o seguro for feito pelo causador
do dano – como no caso do DPVAT pago pelo causador do acidente –, o valor deve
ser descontado da indenização devida, eis que parte dessa será paga pelo próprio
pool de seguradoras à vítima.
Questão 2
52
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 2
53
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
processuais, a redução da verba indenizatória para 300 salários mínimos para cada
uma das autoras da ação, a título de indenização por ambos os óbitos. No tocante à
alegada ofensa ao disposto nos arts. art. 20, § 4º e 70, inciso III, do CPC, 1.524 do
Código Civil e 38 do Código de Trânsito Brasileiro, impõe-se o não conhecimento
do recurso ante a ausência de prequestionamento (Súmulas ns. 282 e 356/STF).
Divergência jurisprudencial não demonstrada. Recurso especial provido em parte
para reduzir verba indenizatória para 300 salários mínimos para cada uma das
autoras da ação, a título de indenização pela morte de sua genitora e do nascituro.”
Questão 3
João, funcionário público, ingressa com uma ação pleiteando indenização por
dano moral em face do Jornal X porque, no dia 20 de janeiro de 2008, foi publicada
notícia acerca do envolvimento de funcionários públicos, cedidos para atuar na empresa Y,
em um esquema que a ela repassava informações fiscais sigilosas. Alega o autor que a sua
honra foi atingida porque a matéria do Jornal X fez expressa menção ao seu nome, sem
nenhum respaldo, e que a reportagem se baseia somente no fato de ser o autor funcionário
público cedido à empresa Y. Aduz, ainda, violação de seu direito à privacidade, já que não
é interesse da sociedade tomar ciência das suas atividades profissionais. Por tais motivos,
pleiteia indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), com
fundamento no Art.5º, X da CF/88, que determina a indenização por dano moral quando o
direito à honra e à vida privada forem violados. Em sede de contestação, alega o Jornal X
que a informação colocada na reportagem teve por base uma investigação realizada pela
Polícia Federal, que o inquérito policial menciona expressamente os nomes dos
funcionários públicos envolvidos, e que dentre eles consta o nome do autor. Alega, ainda,
que em nenhum momento foi feito juízo de valor sobre o autor, e que a matéria limitou-se a
informar sobre a investigação e a trazer os nomes dos investigados. Desta forma, não há
que falar em violação da honra e da vida privada do autor, pois o Jornal apenas exerceu a
sua função de informar sobre o fato, baseado na liberdade de imprensa assegurada pela
Constituição, em seu Artigo 5º, XIV. Merece procedência o pedido do autor? Decida a
questão.
Resposta à Questão 3
54
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema VI
Responsabilidade Civil Objetiva. Evolução Histórica. Teoria do risco. Responsabilidade Objetiva no novo
Código Civil. Abuso do Direito (art. 187). Responsabilidade pelo desempenho de atividade de risco (art. 927,
parágrafo único). Responsabilidade por dano causado por produto (art. 931).
Notas de Aula11
11
Aula ministrada pelo professor Renato Lima Charnaux Sertã, em 30/8/2010.
55
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
A cultura da restitutio in integrum não é muito antiga. Até não muito tempo atrás, a
indenização só era esperada quando se constatava algo de muito relevo a imputar o
causador, como o dolo ou a culpa grave na causa. Fora isso, sequer se buscava o Judiciário.
A responsabilidade civil objetiva veio no esteio da evolução da concepção da
indenizabilidade. Passou-se a perceber que a violação deveria ser indenizada, mor das
vezes, e não como exceção. A imputabilidade, consubstanciada em dolo ou culpa,
especialmente nos primórdios da responsabilidade civil, consistia exatamente em vincular à
consciência de alguém a conduta danosa, o que vige, ainda, na responsabilidade subjetiva,
clássica, e ainda regra geral: é necessário um querer, dirigido (dolo) ou não (culpa).
A responsabilidade sem o elemento culpa é, por isso, excepcional, ainda por estar o
ordenamento afeito à clássica concepção da vinculação da psicológica do agente ao fato.
Na responsabilidade objetiva, é correto se falar que a culpa, lato sensu, é irrelevante
para a imponibilidade da indenização. Pode até haver culpa ou dolo, mas mesmo se não
houver, há a responsabilidade, do mesmo modo.
O fundamento teórico da responsabilidade objetiva não é, portanto, a culpa, em
sentido amplo. Na objetiva, reconhece-se no agente um dever prévio de cuidado, que impõe
que a danificação seja-lhe imputada, a despeito de qualquer cogitação de sua culpa: é
responsável, a priori, porque não observou aquele dever de cuidado que lhe era imanente.
Bom exemplo é a responsabilidade do Estado. O Estado é “pago” pelos cidadãos
para garantir a boa prestação de serviços públicos, e o dever de bem prestar se considera
inobservado quando, dos serviços estatais, venha algum dano. É a teoria do risco
administrativo.
O mesmo se dá com os fornecedores, na seara consumerista. São responsáveis
objetivamente pelos danos que os consumidores padecerem, porque, além de o consumidor
ser vulnerável, aquele que se coloca no mercado para auferir bônus precisa suportar os ônus
do que essa atividade acarreta. Ao se colocar no mercado, o fornecedor apregoa,
tacitamente, que oferta seus produtos e serviços com qualidade e segurança, e se há danos,
é porque descumpriu seu dever de implementar essa segurança e qualidade. É a teoria do
risco do empreendimento.
Outro exemplo é o da atividade rotineira de transporte, que, mesmo eventualmente
alheada da seara consumerista, por ser arriscada, gera a irrelevância do elemento culpa
quando da ocorrência de dano.
O que se percebe, hoje, é que mesmo não sendo a regra jurídica, a responsabilidade
objetiva vem se tornando a regra geral fática, porque a enorme maioria das reclamações por
indenizações são hipóteses de responsabilidade civil objetiva. O Estado e sua longa manus
(concessionárias, permissionárias, etc), os fornecedores do consumo, e uma infinidade de
outras hipóteses de atividades que se tornam de risco são, de fato, os exemplos de maior
incidência fática de responsabilização civil, e são todos objetivos, cada um por sua previsão
legislativa – artigos 37, § 6º, da CRFB; 12 e 14 do CDC; e 927, parágrafo único, do CC:
56
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,
nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida
pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes.”
Assim o é porque, ao abusar de um direito, incidindo na ilicitude, o agente tem toda
a consciência desse avanço deliberado. Na verdade, então, o ato abusivo é doloso, e a
responsabilidade daí decorrente é objetiva por motivo diverso da teoria do risco: é objetiva
porque há o dolo, sempre, e não porque este é irrelevante.
Vale ainda mencionar o artigo 931 do CC, que aparece como um verdadeiro
embrião da responsabilidade hoje presente na seara consumerista – tendo sido absorvido
pelo CDC, de fato:
57
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
58
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
O julgado segue a regra geral, mas é interessante notar-se que há voto vencido, do
Des. Celso Peres, que entendeu que o Estado tinha responsabilidade, por conta de se
configurar omissão específica desse quando o local do evento é notoriamente sede de
eventos similares, pelo que há previsibilidade, e a consequente responsabilidade.
Casos Concretos
Questão 1
59
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 1
Houve lesão, de fato, e por isso há que se indenizar aquele que sofreu o dano. Nesse
caso, prevalece a imagem sobre o direito de informar. Veja:
60
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
61
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 3
62
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 4
63
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 4
Tema VII
Responsabilidade por Fato de Outrem. Responsabilidade direta e indireta. Responsabilidade do pai por atos
dos filhos menores. Responsabilidade dos tutores e curadores. Responsabilidade dos incapazes (art. 928).
Responsabilidade do empregador ou comitente.
Notas de Aula12
12
Aula ministrada pelo professor Renato Lima Charnaux Sertã, em 31/8/2010.
64
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que
não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali
referidos.”
Outro motivo dessa imputação objetiva é o fato de o legislador ter presumido que
faltou, daquele imputado, a atenção ao dever de cuidado na escolha ou educação daquele
65
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
causador do dano direto. Não se tratará da culpa in eligendo ou in vigilando, porque não se
perquire da culpa: se trata de uma constatação de que houve a quebra desses elementos –
cuidado na escolha ou na vigilância –, o que é presumido tão só pela própria causação do
dano.
O artigo 928 do CC, já visto, diz o seguinte:
“Art. 928. O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele
responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios
suficientes.
Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não
terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem.”
Veja que há responsabilidade dos pais, porque essa verificação é objetiva. Todavia, a
jurisprudência reconhece que deve ser um critério para a quantificação do dano moral. É
claro que o dano deverá ser integralmente reparado, pois o parágrafo único supra está
66
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
jungido ao caput – a indenização não pode ser menor, tampouco maior que o dano –, mas a
compensação moral pode levar em conta tal critério como mais um dos vieses em sua
mensuração.
Ainda outra questão diz respeito à emancipação, que deve ser levada em conta na
responsabilidade dos pais: havendo emancipação, cessa a responsabilidade dos pais, a não
ser quando se tratar de emancipação voluntária, porque isso poderia gerar uma porta aberta
a fraudes.
A mesma lógica se repete, pelos mesmos fundamentos, nas relações consumeristas,
que, como visto, tiveram origem no artigo 931 do CC:
“Art. 934. Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que
houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente
seu, absoluta ou relativamente incapaz.”
67
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
13
Essa responsabilidade do inciso III do artigo 932 do CC, em verdade, é de incidência residual, pois a maior
parte das vezes a relação que envolve essa responsabilidade, na praxe, é em relações de transporte público,
caso em que se aplica o artigo 37, § 6º, da CRFB, cuja repetição aqui se dispensa.
68
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as
vítimas do evento.”
69
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Casos Concretos
Questão 1
70
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 1
O condomínio não responde, nesse caso, porque não é possível se lhe atribuir
nenhuma responsabilidade pelo fato de terceiro, eis que não há dever de agir na evitação da
casuística, não se enquadrando em nenhuma hipótese do artigo 932 do CC, tampouco cai na
vala comum da culpa in vigilando. Houvesse a exigibilidade de tal atuação impressa pela
convenção de condomínio, talvez fosse possível responsabilizar o ente formal, mas como
não é o caso, não responde.
Veja:
Questão 2
71
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
ônibus. Colegas de serviço de João, uniformizados, saíram em sua defesa; partiram todos
contra Carlos, que veio a falecer em decorrência das agressões sofridas. Em ação própria,
ajuizada em face da Transportadora X, a esposa de Carlos pleiteia indenização por danos
morais e materiais. Alega culpa presumida da ré pelos atos de seus prepostos.
Em contestação, a ré sustenta inexistir nexo causal, já que o fato teve como causa remota
um incidente de trânsito, que não teria maiores conseqüências, se a vítima não tivesse
perseguido o preposto da ré até a garagem no propósito de agredi-lo com uma barra de
ferro. Decida a questão, indicando os fundamentos de fato e de direito aplicáveis à espécie.
Resposta à Questão 2
Questão 3
72
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 3
Tema VIII
Responsabilidade pelo Fato das Coisas. Teoria de guarda. Furto ou roubo de veículo. Fatos de animais.
Ruína de edifício. Coisas caídas do prédio.
Notas de Aula14
14
Aula ministrada pelo professor Ricardo Cyfer, em 31/8/2010.
73
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
A responsabilidade por fatos causados por animais remonta ao direito romano, pois
desde aquele tempo já havia o problema dos danos causados por animais privados a
terceiros, impondo responsabilidade a seu dono. À época, porém, o mero fato de
abandonar-se o animal fazia cessar a responsabilidade de seu ex dono, o que hoje não é
verdade: não se esgota a responsabilidade pelo fato de não mais haver posse direta sobre o
animal.
A responsabilidade por fatos de coisas inanimadas, mesmo que já presente
timidamente no código napoleônico, só veio mesmo a ter expressão jurídica de relevo
quando da revolução industrial, pois é ali que se percebeu uma grande gama de ocorrências
envolvendo máquinas e danos por essas causados.
“Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se
não provar culpa da vítima ou força maior.”
“Art. 1.527. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se
não provar:
I - que o guardava e vigiava com cuidado preciso;
II - que o animal foi provocado por outro;
III - que houve imprudência do ofendido;
IV - que o fato resultou de caso fortuito, ou força maior.”
74
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
civil objetiva genérica, como se viu no artigo 927, parágrafo único, do atual codex. O artigo
936 em análise é um exemplo em que se alterou a culpa presumida, que vigia no artigo
1.527, supra, para a responsabilidade objetiva.
Hoje, na redação do atual dispositivo, a responsabilidade objetiva só é afastada nas
hipóteses excludentes clássicas, quais sejam, o fato exclusivo da vítima ou de terceiro, a
força maior ou o fortuito externo. O fato exclusivo da vítima, em regra, só se faz presente
quando há uma clara provocação do animal por parte dessa, capaz de dar causa ao ataque.
Mas, mesmo nos casos em que há instigação do animal pela vítima, mor das vezes se
reconhece ali um fato concorrente da vítima, mitigador da indenização, mas não causador
exclusivo do dano.
A principal discussão, no que pertine a esse artigo em estudo, gira em torno da
relevância da posse do animal, direta ou indireta. A posse direta, de fato, gera as hipóteses
de mais simples identificação do nexo, porque se o animal está sob a posse direta do dono,
a responsabilidade objetiva fica claramente evidenciada se não há excludentes, pois ele é o
guardião presuntivo do animal. A intensidade dos cuidados exigidos do dono com o animal
vai variar na proporção do tipo de semovente de que se trate, sendo certo que os cuidados
exigidos do possuidor direto de um touro são muito diferentes dos cuidados exigidos do
dono de um cachorro de pequeno porte. A mensuração é casuística.
Já quando há a transferência da posse direta do animal pelo dono a um terceiro,
surge a questão sobre a permanência da responsabilidade do dono pelos fatos de tal animal.
Transferido o animal por meio de comodato ou locação a outrem, esse que passa a ser
possuidor direto assume responsabilidade pelos fatos do semovente, pela lógica da teoria da
guarda, mas o dono, locador ou comodante, que é possuidor indireto, remanesce
responsável?
A questão é um tanto controvertida, mas prevalece o entendimento de que aquele
que tem apenas a posse indireta do animal não mais responde pelos fatos deste, nos termos
do artigo 936 do CC. Poderá até ter responsabilidade, o possuidor indireto, mas essa será
subjetiva, pautada na eventualidade de se perceber culpa in eligendo em referência àquele
possuidor direto a quem cedeu o animal. É possível se traçar uma analogia com o
tratamento jurídico dispensado, hoje, à responsabilidade do locador de veículos pelos fatos
dos locatários, na forma da súmula 492 do STF:
“Súmula 492: A empresa locadora de veículos responde, civil e solidariamente com
o locatário, pelos danos por este causados a terceiro, no uso do carro locado.”
75
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua
indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto
com a do autor do dano.”
Ilustrando esse parágrafo único do artigo supra, pode-se narrar a hipótese em que
alguém, arremessando um cigarro aceso pela janela, causa incêndio de enorme proporções,
gerando prejuízo patrimonial absurdamente alto. Nesse caso, a conduta culposa de
arremessar um toco de cigarro pela janela, apesar de causar enorme dano, é extremamente
desproporcional ao resultado, e por isso a imposição de reparação de todo o dano se torna
incongruente com a reprovabilidade da conduta, pelo que o juiz está autorizado a reduzir o
quantum, excepcionalmente, em detrimento do restitutio in integrum, com base na
equidade.
A culpa concorrente deve ser amiúde analisada: deve ser realmente concorrente,
porque se houver culpa prevalente de uma das partes, a responsabilidade recairá somente
sobre si. A participação pouco significativa da vítima não tem o condão de reduzir a
indenização a si devida, portanto.
Os ataques de animais e os acidentes em rodovias são as ocorrências mais comuns,
como dito. Acerca dos acidentes em rodovias, há que se enfrentar a discussão sobre qual a
responsabilidade atribuível quando não se identifica o dono ou possuidor do animal. O
entendimento majoritário é de que a responsabilidade de uma eventual concessionária
exploradora e mantenedora daquela via é subsidiária em relação à do dono do animal, e por
isso não se o descobrindo, poder-se-á imputar a concessionária por sua omissão em evitar a
invasão da pista por animais. Embora seja extracontratual, essa responsabilidade da
concessionária pode assumir feição contratual, na forma do artigo 17 do CDC, sendo o
prejudicado consumidor por equiparação, pelo fato do serviço. É caso de responsabilidade
objetiva, decerto.
Não havendo concessionária, sendo a estrada administrada pelo Estado diretamente,
a responsabilidade do Estado segue o mesmo raciocínio: é subsidiária em relação ao dono
ou possuidor do animal, que responde quando identificado, e é objetiva, na forma do artigo
37, § 6º, da CRFB – sendo necessária a omissão específica do Estado para configurar tal
76
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem
de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.”
77
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano
proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.”
78
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
a ser pontual de cada unidade, e a ação deve ser proposta em face de todos, em
litisconsórcio passivo necessário.
Pode-se sintetizar os requisitos da responsabilidade do artigo 938 do CC, portanto,
a: que o prédio seja habitado; que haja objeto atirado ou caído, não integrante da edificação
(ou será ruína, e não objeto lançado); e que haja dano a terceiros.
Casos Concretos
Questão 1
79
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
síntese, que a responsabilidade sobre o dano causado com seu filho, é concorrente entre o
1º e o 2os réus, ao permitirem e promoverem a realização de festa em lugar sem nenhuma
segurança para os convidados. O Instituto réu, por sua vez, requereu a improcedência do
pedido com base na preliminar de ilegitimidade ad causam ao argumento de que o evento
fora organizado por seu grêmio estudantil e ainda que houve cessão gratuita do imóvel por
um dos diretores eleitos, com convites pagos. A ré Solange Azevedo contestou a ação, ao
fundamento de que naquele dia encontrava-se fora da cidade por motivos de trabalho e
que a casa não era explorada para fins comerciais e sim, para a sua moradia e de seus
filhos. Paulo Morais contestou a ação, ao argumento de que fora determinado na sentença
do divórcio que a mãe ficaria com guarda dos filhos e, portanto, se exime de qualquer
culpa pelos atos praticados pelos menores. Aduz também que, na mesma sentença fora
determinado, que o referido imóvel ficasse em condomínio, na proporção de 50% para
cada cônjuge, o que o isenta totalmente de qualquer responsabilidade em relação ao fato
ocorrido. Decida, fundamentadamente, a questão com abordagens sobre os aspectos da
Responsabilidade Civil de cada personagem envolvido no caso concreto.
Resposta à Questão 1
Questão 2
80
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
réu requer a improcedência do pedido com base no laudo pericial acostado às fls., que
restou inconclusivo ao omitir de onde proveio o objeto lançado, e demonstrou tão somente
a sua trajetória. E, afirma, ainda que a testemunha JOSÉ MAURICIO DAS NEVES não foi
muito convincente ao revelar que ¿não chegou a ver o objeto em queda livre¿, o que
demonstrou, contudo, prova insegura para uma avaliação precisa do ocorrido. Decida,
fundamentadamente, a questão com base na jurisprudência dos Tribunais Superiores em
15 (quinze) linhas.
Resposta à Questão 2
Questão 3
MARIA SOFIA ATHAÍDE, aos 08 anos de idade, representada por sua mãe MARIA
PAULA ATHAÍDE, ingressou com ação de reparação por danos materiais e morais em
face de DAGOBERTO PEREIRA, ao argumento de que no dia 15 de junho de 2009, foi
atacada por um cão de propriedade do réu da raça "pitbull", o que lhe acarretou lesões em
várias partes do corpo. Alega que, naquele dia, brincava com outros amiguinhos na praça
81
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
perto da sua residência e que, de repente foi atacada pelo cão, sem que o réu demonstrasse
qualquer cautela ao conduzir o animal. O dono do animal contestou a ação ao fundamento
de que, a autora encontrava-se acompanhada por sua babá e, esta seria a garantidora de
sua proteção, o que se constata nos autos a culpa exclusiva da autora. Por fim, requer a
improcedência do pedido, uma vez que não restou comprovado nos autos os danos
materiais e morais alegados e, ainda, pelos argumentos expostos está caracterizada a
excludente de sua responsabilidade. Decida, fundamentadamente, em até 15 (quinze)
linhas, com base na jurisprudência dos Tribunais Superiores.
Resposta à Questão 3
Notas de Aula15
“Art. 15. As pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis por
atos dos seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros,
procedendo de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito por lei,
salvo o direito regressivo contra os causadores do dano.”
15
Aula ministrada pelo professor Marcelo Junqueira Calixto, em 1/9/2010.
82
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
83
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
genérica e específica é muito dificultosa, por vezes, gerando uma insegurança conceitual
muito grande.
Exemplo dessa dificuldade em se definir seria o de um veículo que, saindo da
revisão anual do Detran, com o licenciamento concedido, causa acidente porque estava, na
verdade, com os pneus em péssimo estado. A omissão do Estado em bem fiscalizar as
condições daquele veículo é genérica ou específica? Vê-se claramente a dificuldade em se
definir tal natureza.
Por isso, uma quarta fase doutrinária sobre a responsabilidade civil do Estado, da
qual compartilha Gustavo Tepedino, por exemplo, entende que a responsabilidade é
objetiva em qualquer caso, porque assim se deve depreender dos artigos constitucional e
legal transcritos, 37 § 6º da CRFB e 43 do CC. O fato de se defender que a
responsabilidade é sempre objetiva não significa, entretanto, que o Estado vai sempre
responder: é claro que não se fala em risco integral: a não ser que seja uma das hipóteses
expressas desse tipo de responsabilidade, as excludentes da responsabilidade são cabíveis –
fato de terceiro, fato da vítima, fortuito externo e força maior.
Um caso relevante na jurisprudência, especialmente porque é recorrente, se refere à
responsabilidade do Estado por atos cometidos por condenados fugitivos da prisão. Veja o
precedente:
84
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
85
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Casos Concretos
Questão 1
86
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 1
87
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 2
Antonio estava lendo o jornal na pequena varanda de sua casa, quando foi atingido
mortalmente por uma bala proveniente de uma troca de tiros entre policiais e traficantes
em um morro próximo. Esposa e filhos de Antonio querem ser indenizados pelo estado por
danos materiais e morais. Provado que o projétil partiu efetivamente da referida troca de
tiros, examine a responsabilidade do estado nas seguintes hipóteses:
a) a bala partiu da arma do traficante;
b) a bala partiu da arma do policial;
c) não foi possível apurar de que arma partiu a bala.
Fundamente sua resposta com base na lei, na doutrina e na jurisprudência.
Resposta à Questão 2
Responde o Estado objetivamente pelos danos causados por seus agentes, que nesta
qualidade causarem a terceiros. A expressão “seus agentes” não indica a necessária relação
causal da ação ou omissão de algum agente do Estado e o dano. O Estado tem o dever de
segurança e incolumidade em relação a terceiros mesmo quando está desempenhando
atividade lícita mais perigosa. Tem a obrigação de desempenhar essa atividade com
segurança. Nisso consiste a chamada teoria do risco administrativo. No caso, não há dúvida
de que a bala que atingiu Antonio partiu da troca de tiros entre a polícia e traficantes. Logo,
foi atividade administrativa que deu causa à morte de Antonio. Sendo assim, desinfluente
que o disparo tenha partido de um dos policiais ou e um dos bandidos. Em qualquer caso, o
Estado terá que indenizar. O Estado responderá mesmo que não seja possível apurar de que
arma partiu o disparo final. Em caso de bala perdida o Estado só não responde quando não
se sabe de onde veio o tiro. Vale dizer, bala perdida, mesmo, sem conexão com conflito ou
enfrentamento algum entre bandidos e o Estado.
Questão 3
88
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 3
Veja também:
“ACRN 2009.227.01633 TJRJ – Rel. DES. REINALDO P. ALBERTO FILHO, j.
26/05/2009, 4ª CCTJ
Agravo Inominado. Art. 557 do C.P.C. Apelação que teve o seu seguimento negado
por R. Decisão Monocrática deste Relator. Indenizatória. Apelação de ambas as
Partes e em Reexame Necessário. I – Ressarcimento a titulo de Dano moral em
face de agressões verbais proferidas por Servidora Pública Estadual de Educação,
no interior da sala de aula. II - Comprovada à conduta da professora em sala de
aula. Relato de ofensas desferidas contra a aluna, chamando-a de "burra" e
"mentirosa" na presença de todos os colegas, denotando a responsabilidade do
Estado em indenizar, bem como o defeito no serviço prestado. III - A
responsabilidade civil do Estado, por atos comissivos ou omissivos de seus
agentes, é de natureza objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa. IV -
Caracterização do direito à indenização concorrendo todas as condições, quais
sejam: a efetividade do dano; o nexo causal; a oficialidade da atividade causal e
lesiva imputável ao agente do Poder Público e a Ausência de causas excludentes. -
O Poder Público, ao receber o estudante em qualquer dos estabelecimentos da rede
oficial de ensino, assume o grave compromisso de velar pela preservação de sua
integridade física e moral, devendo empregar todos os meios necessários ao
integral desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em
responsabilidade civil pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno. VI - Os fatos
narrados na inicial não foram em momento algum negados pelo Ente Estatal e, o
dano suficientemente comprovado pela prova testemunhal colhida. Assim,
evidenciada a responsabilidade do Estado em indenizar, pois responde
objetivamente pelo funcionamento irregular e insatisfatório dos estabelecimentos
públicos de ensino. VII - Forçoso o afastamento das alegações recursais, restando
amplamente demonstrado em linhas acima a ocorrência de ato ilícito praticado por
agente público, sendo dever do Agravante indenizar os lesados, ora Recorridos,
encontrando-se, ainda, a verba relativa ao dano moral de acordo com o
estabelecido pelos princípios e entendimentos jurisprudenciais atinentes ao tema.
Manifesta improcedência do Recurso que autoriza a aplicação do art. 557 do C.P.C.
c.c. art. 31, inciso VIII do Regimento Interno deste Tribunal. Negado Provimento.”
Questão 4
89
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 4
90
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
prover com urgência as obras necessárias à segurança do local, fato que caracteriza
negligência, ensejadora da responsabilidade subjetiva. 7. Em atenção à
jurisprudência da Corte e aos limites do recurso especial, deve a indenização ser
fixada no montante de 2/3 do salário mínimo, a partir da data em que a vítima
completaria 14 anos de idade (28 de agosto de 1994) até o seu 25º aniversário (28
de agosto de 2005), calculado mês a mês, com correção monetária plena. 8. Os
honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor atualizado da
condenação, a ser apurado em liquidação de sentença. 9. Recurso especial
conhecido e provido em parte.”
Tema X
Responsabilidade Subjetiva do Estado. Culpa anônima. Responsabilidade do Estado por danos decorrentes
de atos judiciais e atos legislativos. Responsabilidade dos Prestadores de Serviço Público.
Notas de Aula16
91
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
92
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tepedino – defende que há solidariedade, com base no artigo 22 do CDC, combinado com
os artigos 7º, parágrafo único, e 25, § 1º, do mesmo diploma:
93
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
concedente não é subsidiária, na forma da novel lei das concessões (Lei n.º 8.987
de 13.02.95), mas objetiva e, portanto, solidária com o concessionário de serviço
público, contra quem possui direito de regresso, com espeque no art. 14, § 1° da
Lei n.º 6.938/81. Não se discute, portanto, a liceidade das atividades exercidas pelo
concessionário, ou a legalidade do contrato administrativo que concedeu a
exploração de serviço público; o que importa é a potencialidade do dano ambiental
e sua pronta reparação.”
Na imputação dos danos ao Estado, na forma do artigo 37, § 6º, o STF tem
reconhecido que há ali uma dupla proteção em detrimento do Estado: o dispositivo protege
a vítima, quando empresta responsabilidade objetiva ao Estado; e protege o agente público,
quando veda implicitamente a denunciação da lide pelo Estado ao seu agente. Todavia, há
julgados que também reconhecem solidariedade nessa responsabilidade entre Estado e
agente.
94
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Vale dizer, por fim, que a interrupção da prestação do serviço público, por falta de
pagamento, não é dano indenizável, porque é uma providência válida. Muito já se discutiu
sobre o tema, mas o artigo 6º, § 3º, II ,da Lei 8.987/95 tem sido apontado como permissivo
dessa conduta:
95
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“(...)
LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que
ficar preso além do tempo fixado na sentença;
(...)”
Nos casos do artigo supra, o Estado responde pelos atos do magistrados, para parte
da doutrina, prevalecendo, porém, a corrente que defende que apenas o juiz responderá.
Por fim, vale mencionar que o artigo 5º, LXXVIII, da CRFB, garante a razoável
duração do processo a todos; o descumprimento dessa garantia é causa de dano
indenizável?
“(...)
LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável
duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
(...)”
96
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Casos Concretos
Questão 1
97
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 1
Questão 2
Paulo de Souza propõe ação, com pedido de indenização por danos morais, em
face do Estado do Rio de Janeiro, em virtude de ter sido preso no dia 13/10/2003 por força
de ordem de prisão em razão de débito alimentar, que havia sido revogada em 18/9/2003.
Alega ter havido falha do Cartório, tendo em vista que os autos contendo a decisão
revogatória estavam em poder dessa serventia desde 22/09/2003.
Contestando o feito, sustenta o Estado que do ato judicial típico não exsurge o
dever de indenizar. Aduz, ainda, que o autor foi libertado no mesmo dia em que foi preso, e
que naquele momento era devedor de pensão alimentícia a seus filhos. Afirma que a ordem
de prisão só fora revogada porque o autor efetuou parte do pagamento dos alimentos.
Entretanto, não cumpriu com o pactuado. Alega que o autor é descumpridor contumaz do
seu dever de alimentar, ensejando, inclusive, novo pedido de prisão pelo mesmo motivo do
mandado revogado. Decida a questão, fundamentando-a com a legislação pertinente.
Resposta à Questão 2
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 3
Resposta à Questão 3
99
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema XI
Notas de Aula17
Em regra, tudo aquilo que antecede a efetiva celebração do contrato deve ser
considerado fase pré-contratual, de tratativas. Já a fase contratual, em si, pode ter duração
mais longa ou mais curta, a depender do objeto contratual – contratos instantâneos ou de
execução diferida, ou fracionada. E há a fase pós-contratual, que é aquela que se passa
quando findaram-se ou não as obrigações, cumpriram-se ou não os deveres, mas não há
mais contrato em curso.
A fase preliminar, pré-contratual, não se confunde, de maneira alguma, com o
contrato preliminar, chamado pré-contrato. Nesse contrato preliminar já há contrato, e não
apenas tratativas. Já há um negócio jurídico em fase contratual. Por isso, qualquer
responsabilidade nessa fase é já uma responsabilidade contratual, e não aquiliana.
A responsabilidade pré-contratual, portanto, é aquiliana, e é pautada na existência de
abuso de direito por uma das partes, que interrompe a negociação em curso, mas com
17
Aula ministrada pelo professor André Roberto de Souza Machado, em 2/9/2010.
100
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
violação de deveres anexos da boa-fé objetiva, que já se encontram vigentes nas tratativas.
Entenda-se que é direito de qualquer propenso contratante deixar de pactuar o contrato,
abandonando as tratativas; mas é abuso desse direito abandonar a puntuação quebrando as
expectativas legitimamente criadas na outra parte.
O inadimplemento do contrato preliminar, hoje, leva à pretensão preferencial pela
tutela específica, como qualquer inadimplemento contratual. O artigo 464 do CC dá essa
nota:
101
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
negociação, ou seja, investimentos que só seriam feitos diante de uma expectativa robusta
de contratação.
Há ainda um terceiro pressuposto, que é a ausência de justa causa para não
contratar: se o abandono das tratativas for justificado, não importa o quanto tenha sido
criada a expectativa de contrato: esse abandono não gerará responsabilidade.
Sobre a boa-fé objetiva nas fases pré e pós contratuais, veja o artigo 422 do CC e os
enunciados 25 e 170 do CJF:
“Enunciado 25, CJF - Art. 422: o art. 422 do Código Civil não inviabiliza a
aplicação pelo julgador do princípio da boa-fé nas fases pré-contratual e pós
-contratual.”
“Enunciado 170, CJF – Art. 422: A boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes
na fase de negociações preliminares e após a execução do contrato, quando tal
exigência decorrer da natureza do contrato.”
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes.”
102
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Quanto ao dano, não é que não possa haver dano moral ou dano estético, ou mesmo
dano punitivo, causado pelo inadimplemento do contrato. É possível, só não é a regra.
As principais diferenças da responsabilidade contratual para a responsabilidade
extracontratual são: pré-existência de relação jurídica negocial entre ofensor e vítima;
inversão do ônus da prova quanto à culpa; e a responsabilidade do incapaz. Quanto a esse
último elemento, a responsabilidade extracontratual do incapaz existe, mas é subsidiária a
de seus responsáveis; na contratual, sua responsabilidade é direta, e não subsidiária.
O inadimplemento contratual, quanto à possibilidade ou utilidade, pode ser absoluto
ou relativo (mora). Quanto à extensão do inadimplemento, esse pode ser total ou parcial.
Quando há mora, a prestação continua sendo devida, mas agora adicionada de encargos
moratórios – juros de mora, atualização monetária, honorários e custas, se for o caso, e
outras perdas e danos decorrentes do atraso.
Além disso, pode haver também uma cláusula penal moratória a ser cumprida,
multa cuja função é desestimular o atraso, reforçando a pontualidade, sanção pelo
inadimplemento relativo – a qual nunca pode ser igual ao valor da própria prestação, por
óbvio, pois se trataria de bis in idem causador de enriquecimento sem causa. O limite da
multa moratória, nas obrigações pecuniárias, é de dois por cento, nas relações de consumo e
de condomínio, e dez por cento nas paritárias, sobre a prestação inadimplida atualizada
(sem incluir ali os juros moratórios). Sobre os juros remuneratórios não pagos, é possível a
incidência de juros moratórios, no percentual que for possível. Veja a súmula 379 do STJ:
“Súmula 379, STJ: Nos contratos bancários não regidos por legislação específica,
os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês.”
“Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais
juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado.
Parágrafo único. Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este
poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos.”
103
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 390. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o
dia em que executou o ato de que se devia abster.”
“Súmula 54, STJ: Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de
responsabilidade extracontratual.”
Até aí, nada de novo. No entanto, há, em todo e qualquer contrato, mais do que a
simples obrigação pactuada, com um devedor e um credor: há deveres oriundos de uma
cláusula geral, que está inscrita em todos os contratos, mesmo que não expressa: a cláusula
geral da boa-fé objetiva.
Dessarte, os deveres anexos, decorrentes da boa-fé objetiva – autocooperação,
informação, lealdade, confiança, transparência, coerência, etc – também são passíveis de
inadimplemento. E esse inadimplemento pode vir sob a peculiaríssima situação de um
fazer, enquanto a regra é que o inadimplemento da obrigação contratual seja um não fazer,
um deixar de prestar.
A quebra dos deveres da boa-fé objetiva pode ser observada mesmo quando o
devedor cumpre a prestação a que é obrigado: se a prestação operada, mesmo que
aparentemente cumpra o contrato, revelar-se imprestável, diante do que era esperado, há o
que se chama de violação positiva do contrato. Um exemplo: empresa de marketing se
obriga a instalar dez outdoors pela cidade; não consta do contrato os locais em que deve
instalá-los; então, instala-os todos em locais ermos e sem iluminação. Nesse caso, apesar de
o contrato estar aparentemente adimplido, há essa violação positiva, porque é claro que a
prestação não foi feita a contento. Veja:
“Enunciado 169, CJF – Art. 422: O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor
a evitar o agravamento do próprio prejuízo.”
104
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
105
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
106
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
3) Responsabilidade Subjetiva - artigo 159 do Código Civil, mas nesse caso teria
que se provar a culpa do seu preposto - falta de vigilância.
4) No caso seria, inaplicável o artigo 37, § 6°, da Constituição Federal porque há
contrato entre as partes e o citado artigo só se aplica à responsabilidade extracontratual. A
Constituição fala em terceiros. Ver nesse sentido o acórdão do STF no Recurso
Extraordinário 2555731-SP, logo abaixo.
5) Há entendimento no sentido de que a CET-RIO não responderia porque não teria
celebrado contrato com o proprietário do veículo; não teria havido depósito, nem guarda,
mas mero exercício do poder de polícia quanto ao uso de vagas públicas para
estacionamento.
Veja os julgados:
107
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 2
"A", produtor de tomates, mantinha relação com a indústria "B", que adquiria de
"A" o produto para industrialização. Durante vários anos (1995-2002), a indústria "B"
forneceu ao produtor "A" as sementes para o plantio das safras. Esse procedimento era
adotado com outros produtores da região.Na safra 2000/2001, a indústria, muito embora
tendo fornecido gratuitamente as sementes para o plantio, deixou de adquirir o produto
porque não iria exercer a atividade de industrialização dos tomates naquele ano.Em face
disso, o produtor "A" promoveu ação de indenização contra a indústria "B", buscando
indenização pelos danos sofridos com a perda da produção, pois não teve a quem vender
os tomates colhidos naquela safra. A indústria "B" contestou. Alegou não ter assumido
qualquer compromisso de adquirir a produção, tendo apenas doado sementes a "A" e para
alguns produtores da região, não havendo, por isso, dever de indenizar. Isto posto, quanto
à existência ou não do dever de indenizar da indústria "B", definir, fundamentadamente,
pela procedência ou improcedência da ação indenizatória proposta.Observação
importante: a fundamentação da solução dada é extremamente importante, devendo conter,
obrigatoriamente, os conceitos pertinentes devidamente explicitados.
Resposta à Questão 2
A boa-fé deve ser avaliada tanto na execução contratual quanto na etapa pré-
contratual. Veja:
“AC 591028295 TJRS – Rel. Relator: Ruy Rosado de Aguiar Júnior, j. 06/06/1991,
5ª CCTJ
CONTRATO. TRATATIVAS. "CULPA IN CONTRAHENDO".
RESPONSABILIDADE CIVIL. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA
ALIMENTICIA, INDUSTRIALIZADORA DE TOMATES, QUE DISTRIBUI
SEMENTES, NO TEMPO DO PLANTIO, E ENTAO MANIFESTA A
INTENCAO DE ADQUIRIR O PRODUTO, MAS DEPOIS RESOLVE, POR
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 3
Resposta à Questão 3
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema XII
Notas de Aula18
1. Responsabilidade do transportador
O contrato de transporte, regulado nos artigos 730 e seguintes do CC, que serão
abordados pontualmente, também sofre aplicação de outras legislações, especialmente
pactos internacionais.
Trata-se de um contrato de alta densidade social, com forte presença nas relações
sociais, operando efeitos bastante além da própria relatividade contratual inter partes.
Mesmo por isso, é um contrato que sofre muita intervenção estatal, altamente regulado,
especialmente os contratos de transporte coletivo, e essa preocupação com a função social
se incrementa ainda mais quando se constata que a absoluta maioria desses contratos é
pautada em relação consumerista.
Grande parte dos serviços de transporte é prestada por entidades privadas, sob
concessão do Poder Público, justamente por conta da necessidade dessa maior regulação
estatal desse serviço.
O contrato de transporte é consensual, e não real, o que significa que já há contrato
desde quando há a aceitação da oferta feita pelo transportador, e não quando se dá
efetivamente o embarque das pessoas ou coisas. A oferta, no serviço de ônibus, por
exemplo, consiste na mera circulação dos ônibus de linha; a aceitação, como se sabe, está
18
Aula ministrada pelo professor Ricardo Cyfer, em 2/9/2010.
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
manifestada quando o pretenso passageiro faz sinal para que o ônibus pare. Se o ônibus não
pára após receber sinal, já há inadimplemento contratual.
Mesmo consensual, os artigos 739 e 746 do CC trazem possibilidades de recusa à
prestação do serviço, à contratação, pelo transportador:
“Art. 739. O transportador não pode recusar passageiros, salvo os casos previstos
nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o
justificarem.”
“Art. 746. Poderá o transportador recusar a coisa cuja embalagem seja inadequada,
bem como a que possa pôr em risco a saúde das pessoas, ou danificar o veículo e
outros bens.”
A regra geral, dos contratos paritários, é que há autonomia para contratar ou não.
Porém, quando se trata de relação de consumo, o fornecedor não tem tanta liberdade assim:
só poderá não contratar, não fornecer o serviço, quando a recusa se justificar. No contrato
de transporte, a recusa é considerada justa quando se der uma das hipóteses legais acima
mencionadas.
O contrato de transporte é bilateral, com reciprocidade de obrigações, e é oneroso.
De fato, sempre se disse que é essencialmente oneroso, ou seja, não haveria contrato de
transporte sem onerosidade. Veja os artigos 730 e 736 do CC:
“Art. 392. Nos contratos benéficos, responde por simples culpa o contratante, a
quem o contrato aproveite, e por dolo aquele a quem não favoreça. Nos contratos
onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em
lei.”
111
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia
antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio.”
112
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
prova de que não houve prejuízo incumbe ao transportado, mas o ônus pode ser invertido, a
depender do caso.
Uma cláusula que preveja que, por conta de um preço bastante reduzido, a
desistência pelo consumidor não dará direito à restituição de nenhum valor, é válida? A
jurisprudência entendeu que sim: o desconto extremamente vantajoso ao consumidor traz o
ônus do risco de, se desistir, não obter nada de volta – e por isso a cláusula é equilibrada.
A obrigação do transportador é de resultado – levar o transportado, incólume, até o
destino. O artigo 734 do CC trata dessa responsabilidade:
O artigo seguinte, 735 do CC, tem que ser lido em consonância com o artigo supra:
“Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua
indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto
com a do autor do dano.”
113
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as
vítimas do evento.”
“Art. 737. O transportador está sujeito aos horários e itinerários previstos, sob pena
de responder por perdas e danos, salvo motivo de força maior.”
“Art. 753. Se o transporte não puder ser feito ou sofrer longa interrupção, o
transportador solicitará, incontinenti, instruções ao remetente, e zelará pela coisa,
por cujo perecimento ou deterioração responderá, salvo força maior.
114
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
115
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Artigo 20.
(1) O transportador não será responsavel so provar que tomou, e tomaram os seus
prepostos, todas as medidas necessarias para que se não produzisse o damno, ou
que. lhes não foi possivel tomal-as.
(2) No transporte de bagagem, ou de mercadorias, não será responsavel o
transportador se provar que o damno proveiu de erro de pilotagem, de conducção
da aeronave ou de navegação, e que, a todos os demais respeitos, tomou, e
tomaram os seus propostos, todas as medidas necessarias para que se não
produzisse o damno.”
O CC, no artigo 732, permite a aplicação de normas outras, tais como esses tratados
internacionais, desde que compatíveis com nosso sistema:
116
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 732. Aos contratos de transporte, em geral, são aplicáveis, quando couber,
desde que não contrariem as disposições deste Código, os preceitos constantes da
legislação especial e de tratados e convenções internacionais.”
117
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
118
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
desvinculado do contrato de transporte; fato que não guarda conexão com o dever de
transportar o passageiro incólume ao seu destino, pelo que excluiu a responsabilidade civil
da CBTU.
Veja:
Questão 2
119
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Resposta à Questão 2
120
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 3
Resposta à Questão 3
Embora a questão ainda desperte certa polêmica, a 2ª seção do STJ (RESP. 435865-
RJ, rel. Min.Barros Monteiro, j.09.10.2002 ), uniformizando o entendimento daquela corte,
decidiu que constitui causa excludente da responsabilidade da empresa transportadora o
fato inteiramente estranho ao transporte em si, como é o assalto ocorrido no interior do
coletivo, a romper o nexo causal, como fortuito externo. Tal decisão pacificou uma
divergência anteriormente existente entre a 3a e a 4a turmas, afastando a súmula n° 187 do
Supremo Tribunal Federal ("a responsabilidade contratual do transportador, pelo acidente
com o passageiro, não é elidida por culpa do terceiro, contra o qual tem ação regressiva").
Defende o professor Sérgio Cavalieri Filho que se trata de evento absolutamente
imprevisível e inevitável, não guardando qualquer relação com o risco atribuído ao
transportador. Outras posições são defendidas no TJ/RJ, que se encontra dividido: Apelação
cível n° 2003.001.02461 - Relator Dês. José carlos Figueiredo Apelação Cível n°
2004.001.05471 - Relator Dês. Marco Aurélio Froes.
121
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 4
Jorge, estudante universitário, combina com Álvaro, seu colega de turma, que
sempre voltarão juntos da faculdade no carro do primeiro. Em certa ocasião, Jorge, ao
efetuar uma manobra visando desviar de um buraco na pista, causa séria lesão à coluna
de Álvaro, que vem a ser vitimado de tetraplegia. Inconformado, Álvaro propõe ação
indenizatória em face de Jorge por danos materiais, morais e estéticos sofridos,
sustentando não ser a hipótese em tela um transporte de cortesia pelo fato de ele sempre
contribuir para a despesa de combustível. Diante dos fatos narrados, responda se existe
contrato de transporte e, sendo cabível o dever de indenizar, qual seria o fundamento?
Resposta à Questão 4
122
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
123
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema XIII
Notas de Aula19
“Art. 615. Concluída a obra de acordo com o ajuste, ou o costume do lugar, o dono
é obrigado a recebê-la. Poderá, porém, rejeitá-la, se o empreiteiro se afastou das
instruções recebidas e dos planos dados, ou das regras técnicas em trabalhos de tal
natureza.”
Os vícios que afetam a solidez e segurança não necessariamente são aqueles que
levam ao desabamento do imóvel, mas também apenas partes desse.
19
Aula ministrada pelo professor Marcelo Junqueira Calixto, em 3/9/2010.
124
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
O prazo de cinco anos a que alude o artigo 618 supra tem natureza de garantia legal,
segundo a doutrina. Não é prescricional nem decadencial. Havendo dano, porém, há prazo
prescricional para a reparação, que não é esse de cinco anos, do caput, mas também não é o
de cento e oitenta dias, do parágrafo único. O prazo prescricional para o ressarcimento do
dono da obra é de dez anos, na forma do conhecido artigo 205 do CC, por falta de previsão
de outro prazo em lei. Veja a súmula 194 do STJ, que deve ser adaptada para o atual CC, eis
que se referia ao CC de 1916:
“Súmula 194, STJ: Prescreve em vinte anos a ação para obter, do construtor,
indenização por defeitos da obra.”
Poder-se-ia questionar, porém, se esse prazo não é o de três anos, do artigo 206, §
3º, V, do CC, crítica que não é levada em consideração pelo STJ, apesar de ser bem
coerente, pois não há por que não se enquadrar o direito do dono da obra de ressarcir-se dos
danos a si causados pelo empreiteiro nesse dispositivo específico:
125
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
126
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
desta Lei e se transcreva o disposto no § 4º, do art. 35, para concluir todos os
negócios tendentes à alienação das frações ideais de terreno, mas se obrigará
pessoalmente pelos atos que praticar na qualidade de incorporador.
§ 2º Nenhuma incorporação poderá ser proposta à venda sem a indicação expressa
do incorporador, devendo também seu nome permanecer indicado ostensivamente
no local da construção.
§ 3º Tôda e qualquer incorporação, independentemente da forma por que seja
constituída, terá um ou mais incorporadores solidàriamente responsáveis, ainda
que em fase subordinada a período de carência, referido no art. 34.”
“Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem
de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.”
127
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados
por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se
a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
Parágrafo único. (Vetado).”
Isso porque o prazo de dez anos, a que se refere a súmula 194 do STJ (adaptada,
como visto), é mais favorável ao consumidor, e por isso deveria prevalecer. No entanto, o
STJ, em precedente mais recente, entendeu que é aplicável, sim, o artigo 27 supra, porque é
prazo específico para relações de consumo.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
128
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 2
129
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
havendo nada que justificasse a sua condenação. Por fim, o Diretor sustenta que as
empresas possuem personalidade jurídica própria e postula por sua exclusão do pólo
passivo.
Decida a questão, indicando os fundamentos de fato e de direito aplicáveis à
espécie.
Resposta à Questão 2
Questão 3
130
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
O desabamento do Prédio Castelo de Areia II, deu causa aos seguintes resultados:
a)Morte de dez moradores, proprietários de unidades imobiliárias e a perda total
de todos os imóveis e bens de uso pessoal;
b)Morte de uma jovem de 20 anos que visitava uma amiga;
c)Lesão gravíssima em um senhor que, na hora do desabamento, passava pelo
local;
d)Abalo na estrutura do prédio vizinho, pertencente à empresa W, que necessitará
de obras de reforço.
O Prédio Castelo de Areia II foi construído pela Construtora X, pelo regime de
empreitada de fornecimento de material e mão de obra, para a Incorporadora Y, cujo sócio
majoritário é H.
Responda fundamentadamente:
a) Quem poderá ser responsabilizado perante cada uma das vítimas e com que
fundamento?
b) A proprietária do prédio (Incorporadora Y) terá ação de regresso contra a
construtora? Se positiva a resposta, com que fundamento?
Resposta à Questão 3
131
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Tema XIV
Notas de Aula20
1. Contrato de seguro
1.1. Risco
20
Aula ministrada pelo professor André Luiz Miranda, em 3/9/2010.
132
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 778. Nos seguros de dano, a garantia prometida não pode ultrapassar o valor
do interesse segurado no momento da conclusão do contrato, sob pena do disposto
no art. 766, e sem prejuízo da ação penal que no caso couber.”
“Art. 782. O segurado que, na vigência do contrato, pretender obter novo seguro
sobre o mesmo interesse, e contra o mesmo risco junto a outro segurador, deve
previamente comunicar sua intenção por escrito ao primeiro, indicando a soma por
que pretende segurar-se, a fim de se comprovar a obediência ao disposto no art.
778.”
“Art. 784. Não se inclui na garantia o sinistro provocado por vício intrínseco da
coisa segurada, não declarado pelo segurado.
Parágrafo único. Entende-se por vício intrínseco o defeito próprio da coisa, que se
não encontra normalmente em outras da mesma espécie.”
133
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Há um princípio geral de que o segurado não pode lucrar com evento danoso. Esse
princípio se colhe da leitura dos artigos 778 e 781, supra, combinado com o artigo 11, § 4º,
do DL 73/66, que versa sobre o sistema nacional de seguros privados:
“Art 11. Quando o seguro fôr contratado na forma estabelecida no artigo anterior, a
boa fé da Sociedade Seguradora, em sua aceitação, constitui presunção " juris
tantum ".
(...)
§ 4º É vedada a realização de mais de um seguro cobrindo o mesmo objeto ou
interêsse, desde que qualquer dêles seja contratado mediante a emissão de simples
certificado, salvo nos casos de seguros de pessoas.”
De acordo com doutrina, portanto, mesmo que o segurado tenha pago por mais do
que o valor mercadológico, não vai receber esse valor, valendo como limitação o valor de
mercado do bem à época do sinistro. Todavia, a jurisprudência do STJ está assentada, há
muito, em sentido exatamente contrário, como se vê no julgado abaixo:
“REsp 182686 / MG. RECURSO ESPECIAL. Relator Ministro BARROS
MONTEIRO. Órgão Julgador - QUARTA TURMA. Data do Julgamento:
15/10/1998. Data da Publicação/Fonte DJ 14/12/1998 p. 254.
Ementa: SEGURO AUTOMÓVEL. PERDA TOTAL DO BEM. INDENIZAÇÃO.
VALOR AJUSTADO NO CONTRATO.
134
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Entende o STJ que se o segurador não atentou para o valor de mercado, fixando na
apólice valor estipulado entre as partes, nada há que justifique não observar esse objeto
contratual – inclusive porque foi esse valor de apólice um dos elementos de fixação do
preço do prêmio pago pelo segurado, que seria desequilibrado se o valor da indenização
fosse a menor, pelo mercado.
Nos seguros de danos podemos encontrar o co-seguro ou o seguro conjunto, ou
cumulativo. Co-seguro é o risco distribuído entre dois ou mais seguradores, cabendo a cada
um deles parte do risco total, na forma do artigo 761 do CC. Nesse caso, a obrigação é
divisível.
“Art. 762. Nulo será o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso do
segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro.”
O seguro de pessoas não tem caráter indenizatório, e por isso não tem limitação.
Não há valor aferível para a vida, a integridade de uma pessoa. Assim, o segurado pode
fazer quantos seguros quiser, e pelo valor que quiser. Veja o artigo 789 do CC:
“Art. 789. Nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente estipulado pelo
proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o
mesmo ou diversos seguradores.”
135
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
O segurador pode limitar o patamar de sua responsabilidade, mas nada impede que
o segurado contrate outras apólices com outras seguradoras.
O beneficiário pode ser o próprio segurado, como no caso de invalidez, ou terceiro o
que ocorre no caso de morte. Nesse caso, estamos diante de uma estipulação em favor de
terceiro.
No seguros de pessoas podemos encontrar os seguros em grupo, que popularizaram-
se em razão de seus preços e da necessidade de socialização do riscos. Esse contrato é
marcado pelo espírito de solidariedade.
A formação do contrato de seguro em grupo obedece a duas relações: primeiro, há
um contrato mestre entre o estipulante, representante dos segurados, na forma do artigo 21,
§ 2º, do DL 73/66, e o segurador, relação essa que é bilateral e estática; e há diversos
contratos entre o estipulante e os segurados, por adesão, relação essa que é plurilateral e
dinâmica, comportando o ingresso e saída de segurados a todo tempo. Os beneficiários,
nesses contratos, são os próprios segurados ou seus indicados.
Há uma regra basilar desse seguro em grupo: os segurados não podem exigir nada
do estipulante, que não passa de seu representante perante o segurador. Qualquer
irresignação será perante o segurador, no que tange à proteção securitária – o estipulante
não tem qualquer responsabilidade pela indenização devida por sinistros. A obrigação do
estipulante, e pela qual responde se falhar, é a de recolher os prêmios e repassar ao
segurador.
1.2. Mutualidade
136
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
1.3. Boa-fé
Como o CDC incide nas relações securitárias, a boa-fé é imposta como padrão de
conduta.
137
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela
autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de
produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar
substancialmente seu conteúdo.
(...)
§ 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser
redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.”
“Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas
ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por
vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou
disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor
pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;
(...)”
Assim, é vedado ao segurador limitar sua responsabilidade por uma cobertura que
esteja prevista no seu contrato. Pode, sim, dizer que não cobre determinado risco, mas uma
vez coberto, deverá responder por toda sua forma e extensão, se ocorrido o sinistro
correspondente.
138
EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
“Súmula 188, STF: O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano,
pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto no contrato de seguro.”
Somente o fato exclusivo do segurado pode ser excludente, e ainda assim quando
houver dolo, mesmo eventual, ou má-fé. Como exemplo, a fraude tarifária, em que o
consumidor mente sobre detalhes de seu risco subjetivo para minorar sua taxa de
sinistralidade, e com isso pagar menor prêmio.
As declarações do segurado determinam o valor do prêmio, ao lado de outros
critérios. Por isso, veja o que dispõe o artigo 766 do CC:
“Art. 799. O segurador não pode eximir-se ao pagamento do seguro, ainda que da
apólice conste a restrição, se a morte ou a incapacidade do segurado provier da
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Para Cavalieri, antes de dois anos é preciso provar que não houve premeditação;
após, há presunção de que não houve premeditação. Veja o que o STJ entendeu no seu
informativo 440:
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Veja que mesmo ante o artigo 798 do CC, continuaria sendo a prova da
premeditação ônus da seguradora, porque o que se deve provar é a premeditação no
momento da contratação, e não a premeditação do suicídio, que poderá ser premeditado
sem que a contratação do seguro o tenha sido.
Outro ilícito que afasta a responsabilidade do segurador é quando o segurado
mandar matar o estipulante do seguro de vida: nesse caso, a condição implementada de má-
fé – a morte do estipulante – considera-se não implementada, na forma do artigo 129 do
CC:
“Art. 129. Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a condição cujo
implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer,
considerando-se, ao contrário, não verificada a condição maliciosamente levada a
efeito por aquele a quem aproveita o seu implemento.”
“Art 12. A obrigação do pagamento do prêmio pelo segurado vigerá a partir do dia
previsto na apólice ou bilhete de seguro, ficando suspensa a cobertura do seguro
até o pagamento do prêmio e demais encargos.
Parágrafo único. Qualquer indenização decorrente do contrato de seguros
dependerá de prova de pagamento do prêmio devido, antes da ocorrência do
sinistro.”
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Mas ressalte-se que o prazo fica suspenso enquanto não houver decisão da
seguradora, negando a cobertura, na forma da súmula 229 do STJ:
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
Questão 2
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
declarou no R.O. que reside na Ilha do Governador, o que é verdade, enquanto que na
ocasião da celebração do contrato de seguro, afirmou residir numa cidadezinha pacata do
interior do Estado. Além disso, omitiu o fato de que o veículo era utilizado para transporte
de mercadorias.
Argumentou a seguradora que a capital do Estado é local onde o risco de roubos,
furtos, colisões e outros sinistros é extremamente superior ao de cidades pequenas, o que
majora consideravelmente o valor do prêmio a ser pago pelo segurado.
E mais. O fato de o veículo ser utilizado para transporte de mercadorias também
faz com que o valor do prêmio seja majorado.
Agindo assim, prossegue a ré, o autor infringiu o princípio da boa-fé, praticando
conduta fraudulenta.
Pleiteou a improcedência do pedido.
Decida a questão.
Resposta à Questão 2
Questão 3
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EMERJ – CP VI Responsabilidade Civil
em virtude do local em que se procedeu à cirurgia (na testa), impossível o alojamento ali
de uma gaze do tamanho da alegada - pleitearam a improcedência de pedido; Bradesco
Seguros S/A alegou que não é prestadora de serviços médicos, mas empresa de seguros,
não sendo concebível se vislumbrar nexo de causalidade entre o cumprimento integral do
contrato e o dano causado à vítima - requereu, quanto a ela, a extinção do processo sem
julgamento do mérito, por ser parte ilegítima para figurar na relação processual. Além
disso, asseverou a seguradora que conta com vários médicos e clínicas credenciadas,
apenas para maior comodidade de seus clientes, podendo assim realizar com mais
facilidade o pagamento dos gastos por conta e em nome dos usuários, sem necessidade de
requerimento de reembolso; e que os segurados não são obrigados a utilizar os
profissionais e estabelecimentos credenciados, pois têm liberdade de consulta em locais e
com médicos de sua escolha. Sustentou, ainda, ter o evento danoso decorrido de fato de
terceiro, excludente de sua responsabilidade, e inexistirem os alegados danos morais -
requereu a improcedência do pedido, caso, eventualmente, o Juiz não a considere parte
ilegítima.Decida, enfrentando, especialmente, a questão de haver ou não solidariedade da
Bradesco Seguros S/A.
Resposta à Questão 3
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