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PUC-SP
São Paulo
2017
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC-SP
São Paulo
2017
Ana Claudia Mei Alves de Oliveira
Banca Examinadora
Rosana Paulino
Peço a benção àqueles que vieram antes, luzes que me guiam e me povoam
e que estão comigo não importa onde eu vá.
Dedico este trabalho a essa memória ancestral, em especial, a da minha bisavó,
Maria Catarina de Souza. Assim, agradeço:
À mamãe, Danúsia Maria Sousa da Silva, por acreditar, confiar e ser a pessoa de
quem herdo o desejo pelo caminho e devo a realização de todos os meus sonhos.
À minha irmã Denise, que ao traçar o seu destino, tornou possível o meu.
À vovó Dag, por ser a guardiã da nossa história. Aos meus tios e tias, primas
e primos, pela nossa união.
À Prof. Ana Claudia de Oliveira pela generosidade e por ter me ensinado a
decifrar os segredos do significado da vida. À Fernando Cordeiro, pelo com-
panheirismo, amor incondicional e por estar comigo em todos os momentos
com a sua tranquilidade e paz. Ao amigo de longa data, Tarcísio Almeida, por
todo o suporte emocional, pelas horas discutidas e pelo alimento do corpo e
do espírito. Agradeço aos dois ainda pelo projeto gráfico que conceberam, e
a Fernando pelas horas de diagramação.
À professora Leda Maria Martins, pela inestimável contribuição do seu conhe-
cimento. À Ana Godoy, pela revisão e acompanhamento. À Mayra Fonseca,
Yasmin Thayná e Juliana Luna, pelo incentivo, amor e carinho de sempre.
Aos colegas do CPS e da PUC-SP. À Jaqueline Zarpellon e Cida Bueno, pelo
suporte e colaboração. À Alexandre Bueno e Luciana Chen, pelas contribui-
ções na qualificação.
À todos os encontros que me fizeram sentir o sentido desta pesquisa e a todos
os artistas e intelectuais aqui reunidos, passagens de criação e transformação.
RESUMO
ABSTRACT
TORNAR-SE MESTRA 9
CONSIDERAÇÕES INICIAIS 13
2 FAZER-SE NEGRO 71
2.1 ESTEREÓTIPOS 73
2.2 RESISTÊNCIA 99
2.2.1 E começa iconoclasta a demolir os mitos 99
2.2.2 Os jogos ópticos em Exu 105
2.2.3 Correntes marítimas 111
2.2.4 Um retorno ao país natal 124
3 PRÁTICAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS AFRO-
BRASILEIRAS NO SÉCULO XXI 141
3.1 AÇÃO BANDEIRAS – FRENTE 3 DE FEVEREIRO 144
3.2 A TRANSMUTAÇÃO DA CARNE – AYRSON HERÁCLITO 153
3.3 BOMBRIL – PRISCILA REZENDE 157
3.4 WHITE FACE, BLOND HAIR – RENATA FELINTO 162
3.5 ACEITA? – MOISÉS PATRÍCIO 166
3.6 NOTÍCIAS DA AMÉRICA / BANANA MARKET – PAULO NAZARETH 172
REFERÊNCIAS 195
9
TORNAR-SE MESTRA1
Nesta missão que é dada no diálogo com o invisível, que pode ser nessa ou
em outra vida, é que se reconhece que o tornar-se mestre não se reduz à
cerimônia de titulação, mas na capacidade de crescimento encontrado em
cada desafio pelo caminho. Foi assim na minha casa, com a minha bisavó
Catarina que, atualizando a seu modo em gestos, por vezes cotidianos e
corriqueiros, uma herança coletiva tradicional, faleceu ano passado com
103 anos, sendo uma mulher muito respeitada e consultada por todos, em
nossa cidade, Mundo Novo, interior da Bahia. O que ela nos ensinou com o
fato de só saber escrever seu próprio nome é que o conhecimento não está
atrelado somente a uma função científica, mas sobretudo à consciência
1. Título inspirado na
obra Tornar-se Negro – As relativa às ideias de compreensão e convivência com as coisas e pessoas.
Vicissitudes da Identidade Uma consciência espiritual que respeita o tempo. Que ao ler como o ven-
do Negro Bra sileiro to se move, criando as relações e mudando as coisas de lugar, consegue
em Ascensão Social de
Neusa Santos Souza. Rio enxergar que, por trás de toda adversidade, há sempre uma mensagem
de Janeiro: Graal, 1983. a ser escutada.
10
É assim, ao menos, que a mensagem tem chegado aqui, e talvez por isso eu
tenha necessitado de tempo, pois é como se, antecedendo e circundando o
problema da dissertação proposta, eu precisasse compreender algo muito
maior. Semiotizar o significado da própria semiótica na vida: entender o que ela
diz, como ela diz e o que ela me traz. Foi quando tudo passou a fazer sentido.
Tornar-se mestra
é tornar-se negra.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
14
A arquitetura deste
trabalho está enraizada
no temporal. Todo
problema humano deve
ser considerado do ponto
de vista do tempo.
Franz Fanon
15
Negro.
(A) n.m 1 (cor) noir 2 (raça) noir; um negro africano
Como adjetivo, revela-se no Negro do francês Noir, aquilo mesmo que lhe
dá consistência e vida. Dizendo “fazer-se negro”, anuncia-se que ele não
passa de um processo de criação, ficção e efabulação, que, como veremos
no primeiro capítulo, se constrói a partir da Lei da Raça; uma invenção do
pensamento ocidental moderno que, num conjunto de enunciados teo-
rizados cientificamente, transforma o Negro numa figura pré-humana,
sinônimo da inferioridade e subalternidade, com o objetivo de fazer dele
um corpo de exploração. Esta cor e esta raça têm origem e localização.
Marca o território onde o negro africano passa a assumir o papel temático
17
S.m
11. indivíduo de raça negra
12. escravo
S.f
1. Mulher de cor preta
2. Escrava, cativa
Sob a ideia de uma nódoa negra, vemos os traços e sinais que o fazem
virar uma mancha. Sujeira e borrão que contamina a superfície alva e clara,
mas que também pode ser lido como um estigma: a desonra e a infâmia, a
indignidade, a vulgaridade, a miséria e a lama. Ainda, uma afronta, termo
que, apesar de carregar a ofensa e a humilhação, foi na contemporaneidade
positivado pelos jovens como símbolo da resistência afrodescendente.
Carregando os seus nomes e derivados, fez surgir no cotidiano mani-
festações culturais de todas as ordens, os denominados afrontamentos,
o enfrentamento afrodescendente, na busca pela enunciação das suas
verdades e instauração da sua identidade.
Negra.
N.f. 1 (raça) 2. Ferida; ter o corpo coberto de negras;
trabalhar como uma negra.
18
Negrume.
S.m. 1. Escuridão, trevas, negror, negridão, negrura.
2. Nevoeiro espesso; cerração. 3. Tristeza, melancolia.
Negrura.
S.f 1. Qualidade de negro; negridão. 2. Negrume.
3. Fig. Crueldade, perversidade, ruindade.
4. Fig. Falta, erro, culpa.
S.m
13. a cor de um corpo que absorve integralmente toda
a radiação luminosa visível que sobre ele incide.
Negro.
S.m 1. A cor do piche; preto
adj. s.m. 2 diz-se de ou individuo de etnia negra
adj. 3 que apresenta a cor negra 4 diz-se dessa cor
5 ÓPT que absorve todos os raios luminosos visíveis
incidentes <buraco n.> <corpo n.>
[...]
ETIM lat. [...] é XV é a data para o subst. ‘a cor do piche’.
Piche
S.m
Substância de coloração negra, excessivamente
grudenta, de textura resinosa e gomosa, obtida a
partir da destilação do alcatrão e da terebintina; pez.
15. Nego;
16. homem, pessoa, indivíduo; nego | Negro
velho. Tratamento familiar carinhoso mais ou
menos equivalente ao de meu negro. | Meu Negro.
Tratamento familiar, carinhoso, e algumas vezes algo
irônico, equivalente a meu bem, meu amigo, meu
nego | Trabalhar como um negro. Trabalhar Muito
20
Negro.
Adj.
1. De cor preta. 2. Diz-se dessa cor; preto.
3. Diz-se do indivíduo de raça negra; preto. 4. Preto.
5. Sujo, encardido, preto 7. Muito triste; lúgubre;
8. Melancólico, funesto, lutuoso 9. Maldito, sinistro.
10. Perverso, nefando
Negrada.
1. negraria
2. Fig. Grupo de indivíduos dados a pândegas ou a
desordens
3. pessoal, gente
Arte negra apresenta ainda dois pontos centrais: o primeiro quando marca
a arte produzida por negros em sua característica também racial, fazendo
dela diferença em face da universalização do que seria a arte-arte, hege-
mônica e ocidental. Esse mesmo marcador em arte, bem como em tudo
que se refere aos afrodescendentes, será tomado posteriormente como
elemento afirmativo da negritude, ideologia e movimentação política de
positivação e ressignificação do Negro:
21
Negro.
(A) n.m 1 (cor) noir 2 (raça) noir; um negro africano
Negritude
S.f. 1. Estado ou condição das pessoas da raça
negra. 2. Ideologia característica da fase de
conscientização, pelos povos negros africanos, da
opressão colonialista, a qual busca reencontrar
a subjetividade negra, observada objetivamente
na fase pré-colonial e perdida pela dominação da
cultura branca ocidental.
Nègre
[Fr.] S. M.
Pessoa que esboça ou escreve obras assinadas
por outrem (escritor, político, etc).
Nègre
[Fr., lit. ‘negro’]
S.m. (sXIX) p.us. verdadeiro autor de uma ou mais
obras publicadas sob assinatura(s) de outrem;
ghost-writer | ETIM fr. Nègre (1529) ‘individuo
de raça negra’, (1704) ‘negro usado no trabalho
escravo’ (1757) fig. ‘pessoa que escreve obras
assinadas por outrem’.
negrume
+ Nego: humano
- irônico +: Eufórico
- piche: grudento - : Disfórico
Esquema 1:
Análise léxica do mito negro.
Elaboração nossa.
Assim, esse corpus, que não tem a pretensão de ser uma mostra cartográ-
fica e quantitativa, foi recortado de modo a apresentar uma diversidade
topográfica tendo em vista estratégias de visibilidade. Dizendo que a relação
entre sujeito e objeto é articulada pelo corpo, Ana Claudia de Olivera nos
indica a urgência de se edificar uma semiótica da corporeidade (OLIVEIRA,
2012) e é essa relação com o corpo como instaurador de sentido em ato,
que justifica a escolha das obras selecionadas. São elas: “Ação Bandeiras”
intervenção da Frente 03 de Fevereiro criada e realizada em 2005; “A
Transmutação da Carne” performance dos anos 2000 do artista Ayrson
Heráclito; “Bombril”, performance de Priscila Rezende criada em 2010;
“White Face Blond Hair”, performance de Renata Felinto realizada na Rua
Oscar Freire, São Paulo em 2012; “Aceita?”, 2013, foto-performance de
Moisés Patrício utilizando a rede social Instagram; e as ações realizadas
entre 2011 e 2012 “Notícias de América”, hospedado em espaço virtual e
“Banana Market”, do artista Paulo Nazareth.
Figura 1:
Mestre Didi. Èsù Amuniwa, 1972.
Fonte: SANTOS, 2014.
Segundo Neusa Santos Souza (1983, p.27), “uma das formas de exercer
autonomia, é possuir um discurso sobre si mesmo”. No plano das estratégias
discursivas e das práticas identitárias, construídas como vimos em uma
relação assimétrica, é através de processos de efabulação de estereótipos
que a branquitude adquire o privilégio de produzir a diferença como forma
de afirmar a sua própria identidade.
[...] Há imagens que, seja o que for que mostrem, são construídas
de modo tal que nos dizem, primeiramente, que são imagens, a
serem recebidas enquanto tais. Outras, ao contrário, são arran-
jadas de modo a nos fazer esquecer, na medida do possível, o
que são – simulacros –, e que, mediante outros efeitos plásticos,
outros modos de organização dos jogos entre figuras, pretendem
colocar-nos em contato direto com o que elas “representam”.
Nisso exatamente reside a obscenidade, noção portanto aqui
empregada num sentido puramente epistemológico, remetendo
ao estatuto que o próprio objeto visual construído atribui a si
mesmo na sua relação com o “real”.
Figura 2:
Frans Post. Île de Itamaracá, 1637.
Fonte: MOURA, 2000.
27
[...] Não causa estranheza, portanto, que sua aplicação defina tam-
bém a estesia. Importa assinalar, porém, que a percepção estética
se caracteriza, por um lado, pela descontinuidade (de isotopia
semântica e veredictoria, de tempo, de espaço), por outro, pela
continuidade da relação de fusão ou de absorção do Sujeito e do
Objeto ou da ‘eternidade temporal’. Não são, porém, movimentos
opostos, pois é necessária a descontinuidade nos vários níveis para
que se produza, sobre o descontínuo, o efeito de sentido de uma
continuidade outra: não a da conjunção, mas a da fusão, não a
da duração, mas a da eternidade, não a do espaço sem limites,
mas a da continuidade das diferentes dimensões [...], e assim por
diante. É esse jogo entre a continuidade e a descontinuidade que
constitui o traço mais genérico da estesia. (BARROS, 1999, p. 123).
Figura 3:
Reis Congos, 1950.
Fonte: MARTINS, 1997.
Esta relação mediada acaba por ser reflexo de uma atualização perante
o sistema social, político e cultural fazendo com que tais ressignificações
do presente, de alguma forma, se distanciem da tradição. Assim, em tais
intervenções, além de não haver uma tradução mimética nem no plano
34
Dessa forma, a relevância que damos a escolha desse conjunto de seis ar-
tistas, não estão balizadas pelos crivos de mercado, nomes de galeria nem
pelos seus currículos mas, pelo efeito de sentido que proporcionam e fazem
ressoar quando se aproximam da cotidianidade e da vida. Quando interpelam
e fazem pulsar a comunidade e a cidade, ou mesmo, quando se apropriando
de recursos midiáticos ou de novas mídias, percorrem as ondas, partilham
desejos, anseios e criam poderosas redes colaborativas. Também, quando
irrompem a monotonia com uma figuratividade imprevisível, recombinan-
do expressão e conteúdo de forma improvável, ainda que este seja apenas
presença: para muitos, deslumbramento, momento em que a presença,
aparência e estética do corpo negro é o suficiente para provocar estesia.
1
SIMULACROS ENGESSADOS: A LEI DA RAÇA E A RAZÃO NEGRA
40
Humilhado e profundamente
desonrado, o Negro é, na ordem
da modernidade, o único de
todos os humanos cuja carne
foi transformada em coisa, e o
espirito em mercadoria. […] Mas –
e esta é a sua manifesta dualidade
–, numa reviravolta espetacular,
tornou-se o símbolo de um desejo
consciente de vida, força pujante,
flutuante e plástica, plenamente
engajada no acto de criação e até
de viver em vários tempos e várias
histórias ao mesmo tempo.
Achille Mbembe
41
1.1
A DIMENSÃO ENUNCIATIVA DA LEI DA RAÇA
Feita essa afirmação, seria inquietante passar por aqui e não contestar essa
imagem fixa e estática da ciência e o seu discurso taxionômico, que, numa
dança entre uma sintaxe e uma semântica perfeitas, organiza o discurso
da racionalidade, que vemos preencher os “nomes próprios” de que fala
Greimas, “esses lugares vazios”, que transformou Negro em Raça e fez de
ambos coisa nenhuma:
Figura 4:
Jaime Lauriano.
Terra Brasilis:
invasão, etnocídio e
apropriação cultural,
2015.
Foto: Filipe Berndt.
Fonte: internet.
Nesse âmbito, antes de chegarmos a uma luta de corpos objetiva, com suas
torturas e avassalamentos comuns ao regime de escravidão, o que temos é
uma guerra semiótica, um confronto interactancial na tentativa de realizar
um investimento cognitivo desumanizante: energia a ser tomada e atraída
45
1.2
A RAZÃO NEGRA E A CONSCIÊNCIA OCIDENTAL
DO NEGRO: MEMÓRIAS DA PLANTAÇÃO
Apesar de reconhecer que muito desse olhar sobre a África e seus des-
cendentes data da Antiguidade, Mbembe (2014) salienta que é a Idade
Moderna o momento decisivo para a sua formação, pelo trânsito constante
de coisas e pessoas e, também, pela elaboração de uma ciência colonial
na qual repousa o Africanismo, o total desprezo.
Figura 7:
Joaquim Pinto de Oliveira Tebas,
Pedra Fundamental da fachada da
Igreja de são Bento, colocada na
base do cunhal, 1766.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
Figura 8:
Ex-voto. Colhido no Cruzeiro
da Menina, Patos, PA.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
Figura 9:
Gutê. Borbuleta, 1986.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
Figura 10:
Paulo Pardal. Hermafrodita
em autocoito, 1987.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
47 48
Figura 5:
Rabelo. O menino Jesus aparece a Santo Antônio,
1749. Detalhe do anjo do teto do coro da Igreja e
Mosteiro de Santo Antônio.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
Figura 6:
Octávio Araujo, François Boucher por que ou
O Promontório, 1987.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
Figura 11:
Lista dos principais quilombos brasileiros.
Fonte: Bantos, malês e identidade negra. (1988).
49
Definindo todas as gentes como almas vazias em terras sem lei, o olhar
ocidental apropriou-se delas, incorporando-as e cooptando-as, e as violou,
destruindo-as física, material, cultural e humanamente. No interior das
regras do direito e nos procedimentos de apropriação e violência, a Lei da
Raça passa a ter uma correlação direta com a extração de valor e a produção
do capital, fazendo emergir, a partir do trabalho escravo e das instituições
criadas com o tráfico negreiro, uma nova consciência planetária:
1.3
PRODUZINDO A DIFERENÇA: ALTERIDADE X IDENTIDADE
Mas o que justifica olhar o outro como um alien (do latim outro), um estranho,
e não como um outro com o qual possamos nos constituir como coletividade
humana? Uma das proposições de que trata os estudos da subjetividade,
refere-se ao medo. Medo de perder a si mesmo, receio da dissolução, tor-
nando necessário, quase de forma vital, controlar qualquer fluxo externo
que signifique ameaça ao equilíbrio interno e à estabilidade que se constitui
53
CONJUNÇÃO DISJUNÇÃO
(inclusão)
Assimilação Exclusão
Admissão Segregação
(agregação)
NÃO-DISJUNÇÃO NÃO-CONJUNÇÃO
Esquema 2:
Organização esquemática das relações
Fonte: LANDOWSKI, 2002.
1.4
DA MANIPULAÇÃO À PROGRAMAÇÃO: ATUALIZAÇÕES
E DISSEMINAÇÕES NO BRASIL COLÔNIA
O que comprova a eficácia social desse discurso que, à primeira vista, parece
tão longínquo da nossa realidade, é a sua capacidade de fazer-crer e fazer-ser
operando um programa determinado para o sujeito e, em seguida, manipu-
lando estrategicamente para que, em coletividade, se cumpra o programa-
do: fazer o outro fazer. Mais do que fundar o objeto Negro, o pensamento
ocidental transforma o racismo em uma prática, atualizando o corpo negro
como objeto de exploração não somente do ponto de vista econômico, mas
sobretudo no plano simbólico. Para transformar o negro em mercadoria, foi
preciso destituí-lo da sua humanidade, descaracterizar sua identidade e todo
o rico e complexo sistema simbólico que, da África, esses corpos traziam,
como nos mostra Leda Maria Martins, em seu livro Afrografias da Memória:
Silenciar, apagar, omitir e fazer esquecer foram algumas das principais es-
tratégias utilizadas durante séculos para reprimir não somente a identidade
negra como também sua participação na formação da nação brasileira.
Um dos elementos mais representativos do fazer calar e manter a tortura,
o medo e a dor nesse regime de silenciamento, próprio da política sádica
do colonialismo, foi a Máscara de Flandres. Além de cumprir a função de
↔↔ VEJA A FIGURA 14 NA
A minha tese, pois, é que a vitória na luta pela vida, entre nós, per-
tencerá no porvir ao branco; mas que este, para essa mesma vitória,
atento às agridas do clima, tem necessidade de aproveitar-se do
que é útil as outras duas raças lhe podem fornecer, máxime a preta,
com quem tem mais cruzado. Pela seleção natural, todavia, depois
de prestado o auxílio de que necessita, o tipo branco irá tomando a
preponderância até mostrar-se puro e belo como no velho mundo.
Será quando já estiver de todo aclimatado no continente. Dois
fatos contribuirão largamente para tal resultado: de um lado a
extinção do tráfico africano e o desaparecimento constante dos
índios, e de outro a imigração européia! (BENTO, 2002, p. 37).
grupo que o acolhe, mas, além disso, o que ele precisa perder de
si mesmo para aí se dissolver como lhe recomendam não conta,
estritamente falando, para nada. (LANDOWSKI, 2002, p. 7).
Nesse sentido, recalcar e rejeitar foram os primeiros passos para dar vida
ao desejado branqueamento nacional e agregar valor positivo à ideia de
60
mistura. Como nos mostra Lopes, no trecho citado acima, não é à toa que a
teoria de branqueamento coincide com o processo de industrialização. Neste,
por trás da ferverosa campanha para a promoção da imigração européia,
escondia-se a ideia de que não havia mão de obra especializada no Brasil,
resultando numa monopolização dos postos de trabalho pelos imigrantes e
na exclusão definitiva do negro na sociedade de classes. Impedido de colher
os frutos da universalização do trabalho livre, o branqueamento, como uma
invenção da elite branca, passa a ser incutido no negro como um ideal a
seguir, já que embranquecer-se seria, ao fim, símbolo de ascensão social.
Essa coerção, fruto de manipulação, deixa traços traumáticos na formação
da personalidade e na construção da identidade do negro, assunto sobre
o qual iremos nos ater com mais profundidade no próximo capítulo, já que
é plasmando-se na estética e em suas diversas manifestações e práticas
artísticas que ela se faz e se refaz, produzindo rupturas e resistência.
1.5
O MITO DA DEMOCRACIA RACIAL E O
PROJETO DE EMBRAQUECIMENTO
Gente misturada, povo de uma nação multicor, onde todos vivem pacifica-
mente, sem conflitos e sem vestígios de atraso. Foi assim que se formou,
como política nacional, a identidade do povo brasileiro. Estratégia de apaga-
mento, o mito da democracia racial tornou-se uma das principais armadilhas
para as políticas afirmativas, tanto no processo de construção da identidade
negra quanto no que diz respeito ao despertar de uma consciência coletiva
sobre a importância de olhar para a história na luta por direitos. Presente
no senso comum até os dias de hoje, o mito heróico das três raças foi o
estereótipo consolidado no nosso imaginário que, ao se valer do atributo
cor e de seu uso flexível, numa extensa propaganda oficial ocorrida nos
anos de 1920 e 1930, transformou o que era uma imagem negativa numa
visão enaltecida expressa pela ideia de democracia racial. Seus efeitos são
o nascimento de uma tolerância racial e o desenvolvimento de um racismo
silencioso e molecular, que se disfarça, se esconde e se atualiza diariamente:
Ainda segundo Iray Carone (2014, p.14), o racismo de Gobineau estava fun-
dado “numa visão poligenista da humanidade e condenava o cruzamento
inter-racial, que teria como consequências a perda da pureza do sangue
da raça branca e a produção de seres inférteis”, misturas que comprome-
teriam o desenvolvimento da nossa civilização. Essa concepção nos ajuda
a explicar de onde surge um termo tão amplamente disseminado e uma
imagem tão freqüentemente revisitada, tendo sido, posteriormente, posi-
tivada na TV, na literatura e, sobretudo, na música nacional: a do mulato e
da mulata brasileira. Serve-nos também como alicerce para compreender o
porquê de, nos dias de hoje, essa imagem ser um dos alvos prioritários de
desconstrução e crítica: “o mestiço seria o mulato, o equivalente ao mulo,
animal híbrido e infértil derivado do cruzamento do jumento com a égua
ou do cavalo com a jumenta.” (CARONE, 2014, p. 14).
Equívoco dos mais comuns nos dias de hoje, e discurso dos mais introje-
tados nas relações sociais do presente, esse tortuoso e ardiloso caminho,
tão custoso para ser desmistificado, chamado democracia racial, só mostra
o quão esculpido e estrategicamente manipulado ele foi, e o quão violento
foi e é a ação sobre o negro na história desse país. Ainda versando sobre os
efeitos das relações de admissão, Landowski nos ajuda a entender como
essa trama coercitiva, alimentada pela branquitude, levou-nos a essa crise
de identidade, dizendo que:
Sobre o conceito de Raça social, Schwarcz explica que esta é uma “ex-
pressão encontrada por Nelson do Valle e Silva para explicar esse uso
travesso da cor e para entender o ‘efeito branqueamento’ existente no
Brasil” (SCHWARCZ, 2017, p.112). Isto é, o modo como estariam imbricadas
as discrepâncias entre cor atribuída e cor autopercebida e como “no país
esses fatores estão entrelaçados com as condições socioeconômicas e
culturais dos indivíduos.” (SCHWARCZ, 2017, p. 112).
É preciso lembrar que praticar o racismo era uma constância nas relações
sociais cotidianas. Diminuir, invisibilizar e menosprezar as atitudes, o com-
portamento e a aparência dos negros e negras era normal e corriqueiro. Não
que hoje ainda não o seja, mas o fato de o racismo só ter sido considerado
crime a partir de 1989, com a Lei nº 7.716, fazia com que a discriminação
racial fosse uma condição existencial ainda mais intensa do que agora.
Com a constância dessa violência, sucumbir ao embranqecer-se se tornava,
então, uma verdade a ser perseguida para que não houvesse dor; verdade
essa que se transformou em padrão e repetição, jeito de ser e modo de vida.
Com o crescente distanciamento dos seus elementos identitários e em um
66
1.6
ESTEREÓTIPOS E RESISTÊNCIA
Com base nos discursos de poder que se expandem nas práticas de saber
e toma o mundo das palavras e das imagens, as linguagens assumem
papel central em aprisionar e dar contorno a esse corpo negro. Tomando
o teatro como investigação, Leda Maria Martins no seu célebre A Cena em
Sombras, diz que, no início do século XX, a presença dos personagens
negros e negras chega ao limite da invisibilidade:
2
FAZER-SE NEGRO
72
O amanhã é escuro.
Maria Catarina de Sousa
73
2.1
ESTEREÓTIPOS
Figura 12:
Autoria não identificada
e Willem Blaeu (sculpt.).
Africae nova descriptio, 1665.
Fonte: MOURA, 2000.
75
Este jogo interacional está implicado, pois, nas posições que ocupam
e na visibilidade ostentada por aqueles que detêm as competências de
poder-fazer, um ato nefasto de violação que carrega como intenção não
somente construir um sentido global do negro, como também convencer e
criar um discurso de verdade de inferioridade do negro sobre ele mesmo.
Retomaremos a nossa preocupação em torno dos regimes de visibilidade
quando, na próxima secão, tratarmos da relação destes com as práticas
de resistência.
Figura 21:
Figura 17: Figura 18: Johann Nieuhoff. Negers
Hercule Florence. Nègre Auça, 1828. Hercule Florence. Nègresse Rebolo, 1828. Speelende op KalabaSen, 1682.
Fonte: MOURA, 2000. Fonte: MOURA, 2000. Fonte: MOURA, 2000.
79 80
Figura 13:
Joaquim Lopes de Barros. Preto
de máscara, 1841.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 22:
Zacharias Wagener. Aldea.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 23:
Figura 14: Joaquim Candido Guillobel.
Edward Hildebrandt. Punishments Sem título, 1812-1816.
(castigos), 1846-1849. Fonte: MOURA, 2000.
Fonte: MOURA, 2000.
81
Nas Revistas Ilustradas do século XIX “um dos fatos que chamam a atenção
é a reprodução (ou recriação) de uma linguagem repleta de vícios que, se-
gundo os caricaturistas, era própria do negro escravizado.” (MOURA, 2000,
p. 31). Nestas concepções jocosas, satíricas e grotescas há uma integração
entre sentidos de ordem biológica, representações hiperbólicas dos traços
fenotípicos, bem como de ordem patêmica e moral, já que também tinham
como intenção a depreciação e a ironia sobre qualquer tentativa do negro
em participar da vida social e ocupar o espaço de cidadania no pós-abolição:
Figura 25:
Arnaud Julien Palliere. Esposa
do artista com o filho no colo.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 29:
Henrique Fleiuss. Passeio
hygienico dos bemaventurados
guardas fiscaes pelas ruas da
Figura 26: cidade os astros teem seus
Carlo Evangelisti. Impudica. satéllites os guardas fiscais tem
Typo negro brasiliense, 1898. seus tigrellites.
Fonte: MOURA, 2000. Fonte: MOURA, 2000.
85 86
Figura 30:
Johann-Moritz-Rugendas (del.) e
Maurin (lith.). Negros novos, 1835.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 31:
Modesto Brocos. A redenção de
Cam, 1895.
Fonte: Internet.
Figura 24:
Angelo Agostini. Cuidado, bellas filhas de terpsichore. As frutas são
saborosas, mas a quitandeira amarella é terrível e sem piedade.
Fonte: MOURA, 2000.
87
Sobre este fato, em meio a tantos, merece atenção, como símbolo dessa
romantização, a obra A Negra, de 1923, de Tarsila do Amaral, caricatura
inspirada em uma das senhoras que trabalhavam em uma das fazendas
da sua família e que cumpre o papel temático da ama de leite. Ainda que
tenha rosto (algo já ousado, por dar ao negro alguma personificação), a
negra não carrega consigo uma identidade e apresenta algo reiteradamente
usado pelos artistas para situar-la sob a ideia de degeneração, salientando
lábios e mamas que aparecem exageradas, desproporcionais e disformes,
recurso plástico usado nas mais representativas obras da história do mo-
dernismo brasileiro.
Figura 35:
Christiano Jr. Sem título,
1846-1866.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 36:
Christiano Jr. Sem título, Figura 41:
1846-1866. Lasar Segall. Perfil de
Fonte: MOURA, 2000. Zumira, 1927.
Fonte: Internet.
Figura 37:
Christiano Jr. Sem título,
1846-1866.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 38:
Christiano Jr. Sem título,
1846-1866.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 42:
Lasar Segall.
Bananal, 1927.
Fonte: Internet.
Figura 39:
Autoria não identificada.
A market woman.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 40:
Christiano Jr. Sem título,
1846-1866.
Fonte: MOURA, 2000.
97 98
2.2
RESISTÊNCIA
Não há outro modo de começar este capítulo senão negando a sua própria
divisão, organização e linearidade. Pois, se há algo que atravessa este
trabalho, é a noção de tempo: tempo, aqui, torna-se então o elemento que
nos corta e nos faz ser.
2.2.1
E começa iconoclasta a demolir os mitos
Figura 44:
Octávio Araujo. Iemanjá,
Rainha do Mar, 1972.
Fonte: Internet.
101
Esta revolução começa na palavra de tal forma que podemos dizer que
passada a própria sobrevivência às condições da travessia, a comunica-
ção com o gesto, com os sons e a língua, possa ser compreendida, como
o nosso primeiro ato de resistência. Dessa relação entre corpo e sentido,
Landowski nos diz que, no campo das pesquisas referentes às linguagens,
é preciso reconhecer no corpo,
Figura 45:
Planta do quilombo
chamado Buraco do
Tatu para a costa da
Itapoam. Salvador. Autor
desconhecido, 1764.
Fonte: Internet.
2.2.2
Os jogos ópticos em Exu
Evocando Exu, Martins traça então uma analogia da entidade com o que
seria o Regime de Manipulação em sua interação e intencionalidade: carac-
terísticas que definem o próprio Exu como aquele que produz significado e
faz a comunicação com o divino no panteão das religiões de matriz africana:
Figura 51:
Pantagomes.
Fonte: MARTINS, 1997.
Figura 52:
Gungas, 1996.
Fonte: MARTINS, 1997.
Figura 53:
Cantares. Capitão: Alceu
Valério de Lima, 1995.
Fonte: MARTINS, 1997.
Figura 54:
Sem título.
Fonte: MARTINS, 1997.
Figura 55:
Jean Baptiste Debret.
Le Vieil orphée africain
oricongo, 1826.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 46:
Processo de crescimento
do Òkòtò, caracol,
símbolo de Exu.
Fonte: SANTOS, 2014.
Figura 47:
Caracol-pião, símbolo do
crescimento.
Fonte: SANTOS, 2014.
Figura 48:
Unidades dinâmicas.
O triângulo tem três
lados. O 3 é o 2+1; o mais
1 simboliza a dinâmica
da ressurgência. Èsù
Òjíse-Ebo – Princípio de
reparação.
Fonte: SANTOS, 2014.
Figura 56:
Opon Ifà, a táboa de Ifá sobre a qual o
babalaô marca os sinais que indicam o
odu, a resposta à consulta feita ao Ifá.
A representação de Exu está presente
no Opon Ifà, algumas vezes apenas
os olhos, porque é ele quem fala e
dinamiza todo o sistema.
Fonte: SANTOS, 2014.
109
Não por acaso, muitos dos artistas populares são negros e mesti-
ços, muitos iletrados e que vivem em condições socioeconômicas
extremamente humildes e encontraram nas Artes Visuais um
modo de, em meio à massa populacional desassistida de baixa
renda, expressar suas essências, subjetividades e individualidades.
(SANTOS, 2016, p. 133).
Nestas relações culturais, também à portas fechadas, um centro de re- ↔↔ CONFIRA AS FIGURAS 7, 8, 9 E
10 NA PÁGINA 47.
sistência, proteção, manutenção e recriação fundamental são os espaços
dedicados ao culto das religiões de matriz africana, os quais servem de
sustentação filosófica para que outras manifestações aconteçam nas
relações entre o profano e o sagrado. Seja no Candomblé e suas diferen-
tes nações (ketu, angola ou jeje), na Umbanda, no Sistema Ifá, no Tambor
de Mina, Tambor de Caboclo, na Jurema ou no Batuque, todo um aparato
epistemológico plasmado em objetos, artefatos, indumentárias, ritmos,
instrumentos, ferramentas, gestualidades, sabores, tratamentos e arquite-
turas se constrói como um legado afirmativo da condição negra no Brasil.
2.2.3
Correntes marítimas
Segundo Mbembe, para pôr em prática tal projeto, foi preciso fazer uma
leitura atenta do tempo do mundo. Se o que pautava as relações entre o
escravo e o senhor era o monopólio deste último sobre o futuro, Garvey
propôs uma redefinição do desejo negro que deveria ser o de se governar
por si mesmo, através de uma teoria do acontecimento produzida no futuro,
em que seria possível formar um grande império africano. Apoiando-se
na maior organização negra conhecida na história, a Universal Negro
Improvement Association (UNIA), o projeto político garveyista se desdo-
brava numa afirmação valorizadora e defensiva da raça negra: “descon-
sidero fronteiras no que diz respeito ao negro; o mundo inteiro é a minha
província até que o negro seja livre”. (MOORE, 2010, p.15).
Figura 62:
Augusta Savage. Detalhe
da escultura The Harp.
Harlem Renaissance, 1939.
Fonte: Internet.
Figura 63:
L’Étudiant noir, número 1, 1935.
Fonte: Internet.
Figura 64:
Survey Graphic, revista editada
por Alain Locke.
Fonte: Internet.
115 116
All Art is propaganda and ever must be, despite the wailing of the
purists. [...] Whatever art I have for writing has been used always
for propaganda for gaining the right of black folk to love and enjoy.
I do not care a damn for any art that is not used for propaganda.7
7. W. E . B . D u B ois .
“Criteria of Negro Art”.
Apesar de influenciar as Américas, é certo que estes ideais criaram as
The Crisis, n. 32, out.
1926,, rpd. W.E.B. Du Bois suas divisões de opinião na época e nas gerações seguintes, no que diz
Reader, p. 324-328. respeito a uma definição da identidade racial do artista e de como ele deve
se manifestar, caracterizando-se como um dos primeiros embates entre
a dimensão utilitária e a dimensão artística da linguagem nas expressões
das culturas negras.
118
Na França, junto com Léon Gontran Damas e Léopold Sédar Senghor, Césaire
firma o pacto triunviral que funda formalmente a Negritude, criando, em
1935, em plena guerra ítalo-etíope, a revista L’Étudiant Noir [O Estudante
Negro]. Em companhia de outros martiniqueses, como Etienne Léro, René
Menil, J. M. Monerot, Pierre Yoyotte, e sua irmã Simone Yoyotte, funda, em
1932, o jornal Légitime Défense. Pautando a plena assunção de uma iden-
tidade racial que viria através de um re-enraizamento africano, o jovem
martinicano Césaire escreve, em 1939, o Diário de um Retorno ao País
Natal, “poema-manifesto que consagra, de maneira formal, a existência
da negritude como movimento, pensamento e ação” (MOORE, 2010, p. 16):
Sendo, no poema, o lugar onde pela primeira vez a palavra irrompe, Césaire,
ao rejeitar qualquer tentativa assimilacionista, exalta o protagonismo negro,
defendendo que o racismo deveria ser confrontado no próprio terreno de
sua enunciação: a raça:
For them, when poetry is freed from all literary restraints, all-logical
and moral prejudices, it becomes eminently revolutionary. Such
poetry could stimulate realistic dreams or incite to the vision of a
New World order, which could induce the readers to get engaged
in revolutionary acts of liberation. For the surrealists, the poet must
be a leader, among those who have committed themselves in the
struggle for a New World of justice and love. This concept of poetry
as action, knowledge, and foresight was also the concept held
by the majority of Negro-African poets. (MICHEL, 2000, p. 2).
Isto posto, o que nos interessa, portanto, aqui, explanar é que não se
trata exclusivamente de nomes de batismo e nem de como a história da
arte ocidental vai oficializar o movimento surrealista. O importante é ver
como os artistas negros e negras, declaradamente “surrealistas” ou não,
desenvolveram uma poética e uma forma de expressão única, capaz de
buscar nas profundezas de uma epopeia espiritual o que seria a essência
ontológica do ser negro. Buscando a destruição das palavras, rejeitando
a prosa, destituindo a língua do colonizador, Sartre vai reconhecer que,
2.2.4
Um retorno ao país natal
Nas artes visuais, Conduru relata que, no final do século XIX e início do XX,
a representação de negros e negras entra em uma nova etapa:
↔↔ VEJA A FIGURA 5 PÁGINA 47.
[...] embora haja muito ainda para saber do trabalho dos artistas
negros que se formaram na Academia Imperial e, depois, na
Escola Nacional de Belas Artes, a autoimagem não parece ser
a questão central, nem mesmo muito relevante em suas obras,
que parecem ocupadas em exibir o domínio das ditas belas
artes para atender os anseios de uma clientela ocupada em
mimetizar o gosto europeu. Se a afro-descendência de autores
como Firmino Monteiro, Pinto Bandeira, Estevão Silva, os irmãos
Arthur e João Thimóteo da Costa não obriga suas paisagens,
retratos e naturezas-mortas, a imediatamente delinearem um
estilo afro-brasileiro, vincula suas obras à problemática cultural
afro-brasileira justo por serem complexas auto-representações:
não figuram temas afro-referidos, mas externam suas visões do
outro, da cultura ocidental. (CONDURU, 2012, p. 51).
Figura 66:
Rubem Valentim. Altar
Sacral, 1968.
Fonte: MOURA, 2000.
Figura 67:
Emanuel Araújo. Flexa de
Xangô, 1987.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
131
Nesta segunda metade do século XX, nas artes visuais, alguns artistas deixam
marcas importantes, seja na produção de um pensamento preocupado com
o universo cultural afro-brasileiro, seja do ponto de vista da construção da
sua subjetividade. Entre eles, Rubem Valentim, Abdias do Nascimento, Jorge
dos Anjos, Mestre Didi, Yêda Maria, Emanoel Araújo, Heitor dos Prazeres e
Otávio Araújo, os quais, em sua maioria, fazem suas incursões no universo
mítico-poético-religioso de matriz africana. Segundo Conduru (2012, p. 65),
No entanto, segundo Renata Felinto (2016, p.148), dos anos 1950 até a década
de 90, “há um silêncio no que diz respeito à produção de arte com temática
ligada à cultura afro-brasileira por parte de artistas negros e mestiços […]”,
observação que a autora faz tendo em vista os espaços institucionaliza-
dos da arte ou aqueles onde se consagra o erudito. A pesquisadora ainda
relata que, até os anos 1990, as “obras de arte que tratam da temática
afro-brasileira por muito tempo se restringiram ao tema afro-religioso”
(SANTOS, 2016, p.151), fazendo com que a arte afro-brasileira ou enunciada
por artistas negros e mestiços se tornasse sinônimo de arte afro-religiosa.
Figura 68:
Rosana Paulino, Parede da Memória9, 1994-2015.
Fonte: internet/site da artista.
9. No catálogo da
mostra Territórios: ar-
tistas afrodescendentes
no acervo da Pinacoteca
(2016), curada por Tadeu
Chiarelli, consta que a
obra de Paulino encontra-
-se em processo de tom-
bamento segundo confir-
ma a sua importância um
dos textos que compõe o
catálogo escrito pela pes-
quisadora Fabiana Lopes:
“na obra Parede da
Memória, 1994, Rosana
Paulino organiza em gra-
de pequenas almofadas
de tecido que podem tota-
lizar 1.500 unidades. (...)
Os retratos são de onze
membros da família da
artista (homens, mulhe-
res, adultos e crianças).
Na montagem da obra,
as imagens se repetem
num jogo de combinações
que aciona nossa memó-
ria dos álbuns familiares.
(...) Costurando trechos
da sua memória pessoal
com tradições populares
coletivas (do coletivo fe-
minino, do coletivo religio-
so, de crenças populares
regionais), Paulino cria um
monumento, um memorial
para o sujeito negro, e
usa, num ato subversivo,
operações estéticas para
fechar as lacunas da me-
mória nacional sobre esse
sujeito”. (LOPES, 2016,
p,39-40).
133
Apesar de tais fluxos, difícil é precisar os fatores que fizeram com que,
a partir dos anos 1990, houvesse, nessa área de expressão, o desenvol-
vimento de uma produção que vem se apropriando da linguagem como
veículo de ressignificação através da noção do tempo: olhando para ela,
vemos uma tomada da competência estésica da estética como forma de
promover um descontínuo que, ao fazer uma incursão nas temporalidades
e espacialidades do ser negro, enuncia o seu discurso crítico. Analisando
estas características, parece-nos que o conceito de contemporâneo da
arte afro-brasileira não é outra coisa que não aquela produção que leva
o outro a sentir estesicamente, atualizando passado, presente e futuro
numa complexa trama semi-simbólica, em que se alternam as dimensões
artísticas e utilitárias da linguagem.
protestos que ocorreram nas redes sociais em maio de 2015, com o adven-
to do uso do blackface10 na peça de teatro A Mulher do Trem, inserida na
10. Maquiagem usada
programação do Itaú Cultural, evento que, ganhando grande repercussão por não negros sendo um
na internet e na mídia, acabou levando a instituição a rever sua estru- reconhecido e recorrente
recurso na história da dra-
tura racial em seus modos de produção. Tal fato gerou a primeira ação
maturgia para representar,
realizada com foco na cultura afro-brasileira em 30 anos de instituição, caracterizar e reforçar es-
nomeadamente, a criação do programa Diálogos Ausentes, o qual ajudei tereótipos racistas atribu-
ídas aos negros.
a construir e do qual fui mediadora durante um ano e meio de atividades.
O objetivo do programa foi, através de mais de 18 ciclos de encontros,
discutir a presença de negros e negras nas artes visuais, cinema, teatro,
dança, literatura e música, encerrando suas atividades com a exposição
Diálogos Ausentes, que aconteceu no final de 2016, no Itaú Cultural, em
São Paulo, e em 2017, em uma nova montagem no Galpão Bela Maré, no
Rio de Janeiro. Dessa exposição fui a curadora10 juntamente com a artista 11. N a o c a s i ã o e s -
Rosana Paulino, fato que levantamos o questionamento, se não pode ser crevi o texto “Diálogos
Ausentes e a Curadoria
considerado, ainda do ponto de vista de um diálogo institucional, uma das
como Ferramenta de
primeiras exposições curadas por mulheres negras no contexto brasileiro12. Invisibilização das
Também no Itaú Cultural, desenvolvi um programa de seis meses com Práticas Artísticas
Contemporâneas Afro-
foco em conscientização racial que nomeei “A.gentes – Um programa de
Brasileiras” disponível em:
não-ficção artístico-científico para conscientização racial e descoloniza- <http://d3nv1jy4u7zmsc.
ção do pensamento”, que aconteceu durante seis meses no Auditório do cloudfront .net/wp -
content/uploads/2017/01/
Ibirapuera e era formado por aproximadamente 20 a 25 colaboradores de
di%C3%A1logosausentes_
todos os setores da instituição. dianelima-rev_02.pdf>.
Figura 78:
Luíz Gama, Correio Paulistano, 1870.
Fonte: Internet.
Figura 79:
TEN – Teatro Experimental
do Negro.
Fonte: Internet.
Figura 80:
Black Rio no Jornal do
Brasil, 1976.
Fonte: Internet.
135 136
Figura 69:
Abdias Nascimento (Otelo) e
Ruth de Sousa (Desdêmona) em
Otelo de Shakespeare.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
Figura 70:
Abdias Nascimento. Raízes, 1988.
Fonte: ARAÚJO, 1988.
Figura 81:
Eustáquio Neves, da série “A boa
aparência”, 1999-2000.
Fonte: Internet.
137
Figura 82:
Mostra Diálogos Ausentes. Curadoria:
Diane Lima e Rosana Paulino, 2016/2017.
Itaú Cultural, São Paulo.
Foto: André Seiti.
Fonte: Acervo pessoal.
↔↔ PARA VER O TRABALHO DO Ainda segundo Cesar, boa parte da historiografia e da crítica de arte “avalia
ARTISTA JAIME LAURIANO
ACESSE A PÁGINA 44. os dois momentos paradigmáticos da arte nacional, a Semana de 22 e as
experimentações neoconcretas, como resistentes à dimensão pública da
arte” (CESAR, 2014, p. 125). De modo que, com isto, podemos reafirmar
as nossas incursões sobre o racismo estrutural presente nas instituições
artísticas do país, já que se há algo que vimos nestes dois últimos capítulos,
é a quem as ruas e a categoria popular está subjugada e pertence.
↔↔ PARA VER O TRABALHO DO
ARTISTA SIDNEY AMARAL
ACESSE A PÁGINA 194.
Figura 83:
AFROTRANSCENDENCE
– Tempo de Cura. Filme.
Direção: Ana Paula
Mathias. Direção Criativa/
Curadoria: Diane Lima.
Produção: NoBrasil. São
Paulo, 2016.
Disponível em:
<https://www.
youtube.com/
watch?v=WttKnEldnD0>.
Figura 84:
Dalton Paula. A Cura, 2016.
Foto: Paulo Rezende.
Fonte: Site do artista/internet.
A CURA
Como falar das ausências, Reescrevo,
se eu não podia falar?
Me conto,
Forças resistentes passeiam
E curo o seu olhar sobre mim.
Movimentam a boca
Nesses diálogos ausentes, sou presença
Boca, há muito controlada por ferro
Fratura no que seu projeto criou
Sou livre sem máscara
Desestabilizo e me experimento
Vozes ecoam
Me lanço
Suspiro
Não espero mais pelo que não sou
Quem cura, cura o que?
Não sou mas o seus olhos em mim
Discurso.
Minha arte é da desconstrução
Um genocídio da memória
Afeto
Enuncio:
Nesse espaço-tempo sou dispositivo
Onde está a cura para o meu trauma?
Crio uma contra-história
Quem, me invisibiliza?
E falo a minha própria língua
Sou parte de um projeto colonizador.
É curando que eu me curo.
E por isso, parto de mim
Me desnudo.
Desenho a minha própria cor e forma.
Diane Lima para
Meu gesto, meu movimento Diálogos Ausentes, 2016.
140
Por fim, o que estes enunciados estão a construir, mais do que obras de
arte autorreferenciadas, é um espaço onde se pode instaurar um sistema
de circulação de valores, construído na e pela relação interativa entre artista
e público, onde a emergência do sentido se dá na experiência do vivido em
espaços e tempos distintos, fazendo-nos sentir o sentir do outro através
da sua copresença sensível e contagiante.
141
3
PRÁTICAS ARTÍSTICAS CONTEMPORÂNEAS AFRO-BRASILEIRAS
NO SÉCULO XXI
142
Among me
from my self
to my self
outside any constellation
clenched in my hands only
the rare hiccup of an ultimate
raving spasm
keep vibrating
word.
Lost Boy, Aimé Césaire
Figura 85:
Ação Bandeiras. Intervenção
realizada pela Frente 3 de
Fevereiro, 2015.
Imagem: Frente 3 de Fevereiro.
Fonte: internet.
3.1
AÇÃO BANDEIRAS – FRENTE 3 DE FEVEREIRO14
Mais eis que surge, como herói pop, milagro, vislumbre de padim,
raio de xangô, o 3 de Fevereiro, o grupo um tanto comitiva guerreira,
liga da justiça e bloco. Do saco surge a bandeira, azougue para não
terminar o carnaval. E ela vai se desfraldando sem hinos, no síncope
do gupo. Aberta como um símbolo, não da nação, coisa maior, mas
daquelas pequenas e senhoras selvagerias. Escancarada clama os
céus a incerteza do sentido. Estandarte anunciado a derrota da
certeza unívoca. Zumbi Somos Nós. Frase gravada no ar, incógnita na
calçada. Zumbi Somos Nós. Zumbi guerreiro ou párias? Vencedores
ou vencidos? Imortal herói ou mortos vivos? Zumbi Somos Nós.
Senhores ou fantasmas? Estandarte ou mortalha? Uma ferida expos-
ta no meio da rua, uma questão colocada para todos sem nenhum 14. Assista ao regis-
floreio. Não mais a opção por ser marginal ou ser herói, mas pelo tro da intervenção dis-
menos poder ser. Aquela bandeira ali aberta era de solução do linear ponível em: <https://
e a dispersão dos sentidos até então possíveis. Zumbi Somos Nós. w w w.yo u tu b e . co m/
Ricardo Muniz Fernandes (FRENTE 3 DE FEVEREIRO, 2006) watch?v=hX3GFEHsTSs>.
145
É contra essa edição da vida e por sua série de contratos que recortam a
cidade selecionando o que deve ficar oculto e apagado e visibilizando o
que deve ser apreensível, que tais práticas artísticas se impõem, na busca
por afetar os sujeitos e a própria cidade, que do dia a dia passa a ser velada
por outras narrativas.
Uma das ações que o grupo realizou e que trazemos para análise foi a
intervenção Bandeiras. Nela, discutiam o racismo e o futebol, tendo o
campo, o estádio e as relações que deles emanam como lugar por exce-
lência onde se reconfigura o mito da democracia racial. A motivação do
grupo veio do episódio acontecido no dia 13 de abril de 2005, quando, na
147
reparação nacional. Aqui, Zumbi dos Palmares, símbolo maior da luta contra
a escravidão e dos levantes quilombolas é convocado a trazer aquilo que
está por trás do seu nome: a força do espírito presente, guerreiro, imortal,
mágico e invisível reiterando, na intervenção, sua memória ancestral e sua
probabilidade mítica. O valor de oposição de base é Morte versus Vida.
3.2
A TRANSMUTAÇÃO DA CARNE – AYRSON HERÁCLITO15
15. Assista ao registro
da intervenção disponí-
vel em: <https://vimeo.
Artista visual e curador, doutor em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia
com/27360990>.
Universidade Católica de São Paulo e professor do curso de Artes Visuais
do Centro de Artes, Humanidades e Letras da Universidade Federal
do Recôncavo da Bahia (UFRB), Ayrson Heráclito nasceu em 1968, em
Macaúbas, na Bahia. Vivendo entre as cidades de Cachoeira e Salvador,
suas obras transitam pela instalação, performance, fotografia e audiovisual.
Entre os trabalhos mais relevantes da sua carreira está a performance e
videoinstalação A Transmutação da Carne, apresentada no Goethe Institute,
na capital baiana, nos anos 2000.
Figura 86:
Ayrson Heráclito, Transmutação da Carne, 2000.
Foto: Reprodução.
Fonte: Site do artista.
154
Ao fundo, uma voz em off narra uma carta. Trata-se do relato do comissário
do Santo Ofício ao senhor reverendo Antônio Gonzalez Fraga sobre as
heresias feitas pelo mestre de campo García de Ávila Pereira de Aragão.
As ditas heresias detalham algumas das torturas praticadas contra os
negros pelo mestre.
Figura 87:
Ayrson Heráclito,
Transmutação da Carne,
2000.
Foto: Reprodução.
Fonte: Site do artista.
156
Figura 88:
Ayrson Heráclito, Transmutação
da Carne, 2000.
Foto: Reprodução.
Fonte: Site do artista.
157
Figura 89:
Priscila Rezende.
Bombril, Memorial MInas
Gerais Vale, 2013.
Foto: Guto Muniz.
Fonte: Acervo da artista.
3.3
BOMBRIL – PRISCILA REZENDE16
16. Assista ao registro da
intervenção disponível em:
<https://www.youtube.com/
Priscila Rezende (Brasil, 1985) é artista visual de Belo Horizonte, Minas Gerais,
watch?v=2uEWS9eNPmE&t=18s>.
graduada em Artes Visuais pela Escola Guignard – UEMG (Belo Horizonte)
com habilitação em Fotografia e Cerâmica. Trazendo o corpo como centro
da sua produção artística, Priscila criou, em 2010, a performance Bombril,
obra que mais do que discutir a aparência, reconstitui a violência presente
em um dos mais reiterados estereótipos: a isotopia do cabelo crespo com
o Bombril, nome de uma marca de esponja de aço que, de tão presente no
consumo das casas, passou ela mesma a significar a própria coisa.
Figura 90:
Priscila Rezende.
Bombril, Memorial MInas
Gerais Vale, 2013.
Foto: Guto Muniz.
Fonte: Acervo da artista.
Outros dois pontos importantes que dialogam com a obra é, primeiro, o fato
de que, em 2013, o estilista Ronaldo Fraga usa em seu desfile no São Paulo
Fashion Week, o maior evento de moda do país, penteados para os quais
se vale também do Bombril. Visivelmente partindo de uma construção de
imagem de moda no mínimo acrítica e fetichizante, o fato ganhou grande
repercussão na mídia a partir do posicionamento de artistas negros que
não concordaram com a defesa do estilista ao dizer, em meio a muitas
contradições, que estaria fazendo uma crítica ao racismo. Sendo um enun-
ciador não negro que fala, em um espaço que, muitas vezes, se esvazia de
criticidade, a licença poética a qual diz ter usado o estilista acabava por
somente reforçar a isotopia entre o cabelo crespo e o Bombril, diferente
da performance de Rezende que, em todos os recursos plástico utilizados,
pautou-se numa contundente denúncia.
Figura 91:
Desfile do estilista
Ronaldo Fraga em
desfile no São Paulo
Fashion Week, 2013.
Foto: Internet.
161
Figura 92:
Priscila Rezende.
Bombril, Memorial MInas
Gerais Vale, 2013.
Foto: Guto Muniz.
Fonte: Acervo da artista.
162
A obra, no intuito de querer ser vista, ainda carrega como traço fundante
o risco, em razão das grandes variações de estados patêmicos que pode
despertar, principalmente entre transeuntes. Nesta interação, o olho é
conduzido para que se veja a estruturação do mito racista sobre o negro,
que, segundo Grada Kilomba (2010), pode encontrar cinco diferentes
mecanismos de defesa do ego até o estado de conscientização: negação,
frustração, ambivalência, identificação e descolonização. Assim, observa-
mos o uso do mesmo recurso de linguagem visto na performance anterior,
uma figura metonímica em que o Eu-Negro, numa reviravolta em face de
sua capacidade de enunciação, reflete e reencena criticamente, de modo a
deflagrar, na manifestação sensível, a dramaticidade do ato de violação que
acomete sua existência, tomando e levando até as últimas consequências
seus sentidos significantes para fins de ressignificação.
3.4
WHITE FACE, BLOND HAIR19 – RENATA FELINTO
Figura 93:
Renata Felinto. White Face and
Blonde Hair, 2012.
Foto: Reprodução.
Fontes: Site da artista / internet.
Em uma das suas obras, a videoperformance White Face and Blonde Hair,
da série Também Quero Ser Sexy, de 2012, Felinto cria uma personagem
que joga com as relações de alteridade entre o Eu-Branco e o Outro-Negro,
discutindo classe e raça. O próprio nome da obra em inglês já carrega
o valor do importado e do estrangeiro como uma correspondência ao
dispositivo topológico no qual a performance está inserida: a rua Oscar
Freire, lugar onde se situam as grifes internacionais, avaliado como um
dos metros quadrados mais caros da América Latina e reduto oficial do
turismo e consumo de luxo da cidade de São Paulo.
Assim, o que fica posto na rua Oscar Freire é que, além da ausência de
negras e negros como consumidores, há ainda a sua ausência como ven-
dedores: levando em consideração um lugar onde o padrão de beleza da
branquitude é fundamental para efetivação do consumo, o Outro-Negro
sequer pode servir de espelho, sendo relegado a cargos como os de limpeza
e serviços gerais, funções que enfatizam a sua invisibilidade como aqueles
que não ocupam, com a aparência vista como fora dos padrões, o espaço
central da compra, santuário do luxo e altar da beleza.
Este desejo incontido pela pele branca se concretiza na face, mas também
na gestualidade: encena bocas de frivolidade e olhos de surpresa. Brinca
com o tempo livre, a liberdade sempre perseguida e o desejo pelo ócio, um
vivido gasto entre goles de café e leituras de revista num pomposo bistrô.
Assim, se a lógica do capital se baseia na relação trabalho X tempo, observar
a vida e vagar também se coloca como uma contradição inquestionável
para o corpo negro.
a questiona: sendo ela uma criação nossa, será ela uma verdade ou uma
mentira? Será ela uma ficção da nossa ficção?
Essa interrogação fica suspensa por não haver ninguém que a sancione,
apenas a personagem manipulando o destinatário: fazer-crer para fazer-
-fazer seu jogo. No contrato fiduciário presente no interior do discurso
enunciado, as marcas que vão organizar o dizer verdadeiro no contrato de
veridicção é a própria realização do consumo. Dessa forma, a personagem
está à mercê do Eu-Branco, do imprevisível, e em busca dos possíveis efeitos
que se colocam no espaço como fratura: “por meio de uma relação dialogal
e intersubjetiva, […] a interatividade é uma condição para a existência da
obra”. (OLIVEIRA, 2002, p. 55).
3.5
ACEITA? – MOISÉS PATRÍCIO21
21. Veja a intervenção
disponível em: <https://
w w w.instagram .com/
Artista visual, Moisés Patrício (São Paulo, 1984) trabalha com fotografia,
moisespatricio>.
vídeo, performance, rituais e instalações. Desde 2013, iniciou a série de
imagens Aceita? – uma foto por dia da mão direita em um período de
dois anos, usando como plataforma de mediação institucional a rede
social instagram22. 22. N o endereço
@moisespatricio
Figura 94:
Moisés Patrício. Aceita?
Foto: Reprodução.
Fonte: Internet/ Instagram do
artista.
168
Figura 95:
Moisés Patrício. Aceita?
Foto: Reprodução.
Fonte: Internet/ Instagram do
artista.
de negro tem uma isotopia com chocolate e com um terceiro sentido que,
segundo o Dicionário Caldas Aulete, quer dizer:
Negrito. [De negro + -ito] Adj. E s.m. Tip. Diz-se do, ou tipo de
traços acentuadamente mais fortes que o normal, especialmente
quando usado em certos destaques tipográficos (entradas de
catálogos, cabeças de verbetes, etc.); normandinho.
Assim, o artista joga com esses valores positivos para oferecer o negrito
como algo bom e gostoso, ainda que com “seus traços acentuados” onde
o valor está na relação ser versus não poder ser.
3.6
NOTÍCIAS DA AMÉRICA / BANANA MARKET – PAULO NAZARETH23
23. O resíduo da intervenção
encontra-se disponível em:
<https://www.youtube.com/
Nascido em 1977, na cidade de Governador Valadares (MG), Paulo Sérgio
watch?v=L15IQrwBWqc>, e
da Silva é o Paulo Nazareth, artista formado pelos caminhos, pelo escultor em <http://latinamericanotice.
baiano Mestre Orlando (1944-2003), com quem aprendeu a entalhar ma- blogspot.com.br/>.
Figura 96:
Paulo Nazareth. Banana Market.
Foto: Reprodução.
Fonte: Internet/site do artista.
Destino mítico
de um sobrevir
Entre os anos de 2011 e 2012, Notícias de América consistiu em uma viagem
feita a pé, em que o artista valeu-se de diferentes conduções, como barco e
ônibus, quando assim se fez necessário. Numa espécie de residência móvel
em trânsito, em que se recorre ao destino, o seu objetivo prático era chegar
aos Estados Unidos cruzando a América Latina. Seu agravante era cortar
desertos, terras, águas e florestas sem, no entanto, molhar os pés: tomado
por pó e poeira, ele devia trazer impresso, do sul ao norte, memórias-solo
da América. Na página principal do blog onde documentava a viagem,
o artista dizia: “proyecto:noticias de América [America news] residencia
en transito + residency by accident = atraviesar America Latina antes de
llegar a los EUA:que todo el polvo del camino se quede en mis pies + viver
en blooklin y saber lo que se pasa ahi _ go to Blooklin,NY /USA living there
and know what happane there, but before walk by Latin America: that
every Latina America land to be in my foot _”.
Como a criação
nos cria?
175
Desse modo, Notícias de América talvez seja uma das práticas das quais
tratamos que mais pode ser representativa do que Greimas chamou da
‘espera do inesperado’, e que define, entre aleatoriedade e sensibilidade, o
próprio acontecimento ou acidente estético: “estranho regime de interação
no qual o comportamento do outro – agora, o puro acaso – não dá motivo
à interpretação alguma fundada na razão e não oferece garantia alguma
no plano prático.” (LANDOWSKI, 2014, p. 72).
Este catastrófico nos leva a retornar com mais cautela para ver como este
fenômeno do corpo a aleatoriedade remete a uma probabilidade mítica,
176
Figura 97:
Paulo Nazareth.
Notícias de América.
Foto: Reprodução.
Fonte: NAZARETH,
2012.
177
Figura 98:
Paulo Nazareth. Notícias de América.
Foto: Reprodução.
Fonte: Nazareth, 2012.
179
Figura 99:
Paulo Nazareth. Notícias de
América / Banana Market.
Foto: Reprodução.
Fonte: Nazareth, 2012.
4
CONSIDERAÇÕES FINAIS
182
4.1
ENUNCIAR PARA ANUNCIAR: REGIMES DE VISIBILIDADE,
ENCONTROS ISOTÓPICOS E SENTIDOS
Condição escrava
Poder/querer não ser visto ----------------------------- Querer não ver/ Não querer ver
Pós-abolição
Não poder se fazer ver ----------------------------- Poder ser visto pelo outro.
Fazer ver através de si
Contemporâneo
Querer ser visto ----------------------------- Querer ver
Não querer ver
Não querer não ver
Quadro 1:
Regimes de visibilidade
Este quadrado semiótico relativo aos regimes de visibilidade foi elaborado baseado no proposto por Eric
Landowski (1992) onde:
S1 – actante;
S2 – observador;
---------- – contrariedade (eixos).
contrária ou um não querer por ser interpretado como um dizer falso, gera
novos limites na comunicação intersubjetiva, configurando-se um quadro
de ignorância mútua em relações transgressoras de base polêmica, na qual
os actantes passam a ser vistos como antissujeitos com um estatuto de anti-
valor: alternam-se entre um e outro os efeitos de sentido relativos às paixões
como exibicionismo, repugnância, fetichismo, atrevimento e recato, ou ainda,
frustração, cólera, indiferença, medo e aversão. Persistência, decepção e
revolta são um dos efeitos passionais que se reiteram continuamente no Eu-
Negro, ao não conseguir cumprir o seu programa narrativo, que consoante
com o seu desejo de expressão, intenta também, como sujeito semiótico, a
modificar os estados de alma e refundar o social.
[...] por mais frágil e vaga que seja essa intuição, ela fundamenta
para o sujeito a possibilidade de um outro modo de construção de
sua identidade, e, por isso mesmo, abre caminho, tanto no plano
cognitivo quanto no plano prático, para outros tipos de atitudes
e de relações perante outrem. Seu poder libertador se deve ao
fato de ela fornecer um ponto de apoio a partir do qual cada um,
se quiser, pode tentar pensar e gerir sua própria identidade en-
quanto positividade, ou, em outras palavras, sem ter mais que, para
fundamentá-la, passar necessariamente pela negação do Outro.
Então, e somente então, a partir desse ponto de ruptura (de ordem
“epistemológica”, como deve ser), desaparecem os sintomas da
crise de alteridade e começam de fato a colocar-se os problemas
de uma autêntica busca de identidade. (LANDOWSKI, 1997, p. 27). 25. O Programa
Narrativo (PN) do regime
de junção é assim formu-
Dentre os encontros isotópicos relativos aos valores das obras analisadas, lado por Greimas: PN= F
vimos que é alvo recorrente de denúncia, nos programas narrativos das [S1 à (S2 Ov )], no qual:
F = função
ações, a oposição objeto versus sujeito, já que o objeto de valor, na maior à = transformação
parte das intervenções em situação, será o risco que se coloca o próprio corpo: S1 = sujeito do fazer
S1 = sujeito do estado
= conjunção
PN25 = F (ver/experienciar a intervenção) {S1 (Eu-negro) à Ov = objeto-valor
[S2 (Outro-Branco/público) Ov (sujeito/objeto-corpo)]}. (GREIMAS; COURTÉS,
1979, p. 353).
187
Esta relação fica posta, por exemplo, nas intervenções Bombril, Banana
Market/ Notícias de América, White Face Blond Hair, A Transmutação
da Carne e Aceita?. Na Ação Bandeiras, o objeto de valor será a bandeira.
Quadro 2:
Encontros isotópicos
188
4.2
JOGOS ÓPTICOS INSTITUCIONAIS
Nessa direção, duas questões ainda são centrais: a curadoria como fer-
ramenta de invisibilização dessas práticas e a noção de liberdade da qual
falamos anteriormente. Diante das estruturas e dos valores, já tratados por
nós, e que são centralizados na figura de um curador chefe ou de um grupo
de gestores, estes, ao se colocarem numa posição de não querer ver, podem
ter como posição contrária, por parte dos artistas, reserva, intimidação ou
prévia retaliação, quando se trata de expressar suas identidades. Tal fato
nos faz pontuar que a liberdade não é expressa integralmente, da mesma
forma que não o é quando estes corpos são vigiados pelos sistemas de
controle nos espaços públicos. É nesta falta de espontaneidade do corpo
negro enunciador que a violência racista obtém seu máximo efeito:
4.3
FAZER SENTIDO PARA FAZER SENTIR:
RUPTURAS E RESSIGNIFICAÇÕES
USURA ˜
= NÃO VIDA
FRATURA
Fazer-sentir
Passado Competência estésica Futuro
Memória Promessa
Não-aqui | Não-agora
Ancestralidade Esperança
Descontínuo
Ressignificação
TEMPO NEGRO
Esquema 3:
Tempo negro
Elaborado com base na obra Da Imperfeição de GREIMAS, 2002.
191
É esse equilíbrio que faz destas práticas, significativas, no que diz respeito
aos desafios propostos pela negritude em seu projeto de tomar o fazer
sensível da arte como prática de resistência, já que estas também rompem
a dicotomia falsamente debatida de que o fato de se enunciarem tendo em
vista questões políticas poderia levá-las a uma redução ou esvaziamento
da sua esteticidade – ao nosso ver, o maior desafio que temos para expe-
rimentar e transpor, uma vez que as noções de belo estão implicadas em
um dizer que, para o destinador-julgador, pode ser falso ou verdadeiro.
Contudo, isto não quer dizer que agir na perspectiva utilitária de fazer uma
crítica social seja sempre o seu destino, pois está implícito na busca por
193
Figura 100:
Um artista a frente do seu tempo. Nossa
homenagem.
Sidney Amaral. Castigo. 2014.
Fonte: O Menelick 2º Ato.
195
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