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INTRODUÇÃO

O contexto histórico no qual a filosofia de Hume está inserida é marcado por


mudanças no âmbito político e econômico da Inglaterra. O conjunto de eventos que culminou
no fim do absolutismo inglês e a instauração de uma monarquia parlamentarista é o que se
convencionou chamar de Revolução Inglesa. Nesse momento também começavam a se
desenvolver as atividades que mais tarde se convencionariam como a Revolução Industrial.

Hume (1711-1776) é um filósofo escocês empirista, ou seja, que explica que o


conhecimento origina-se a partir das experiências, aplicando assim o método indutivo. Apesar
de ter desenvolvido uma teoria acerca do conhecimento e de certos fenômenos, neste trabalho,
temos como objetivo apresentar as concepções do "eu", a existência do "eu" começa quando
se questiona a identidade pessoal onde relaciona que uma pessoa é a mesma em outro
momento através das percepções acreditando na realidade entre elas.

A relação de Hume com Descartes se dá através de um longo debate sobre a


substância pensante, partindo da frase " eu penso logo existo" (DESCARTES, 1973 a, p.54)
com o "primeiro princípio da filosofia". No entanto, Hume não concorda com esta visão
cartesiana do "eu", ele classifica a ficção ou a ilusão da imaginação um equívoco cartesiano,
como se o "eu" possível dizer que sentimos sua existência e a continuidade de sua existência.
As impressões não são tão prováveis a ponto de dizer que existe uma pessoa em si mesma,
por causa disso Hume não considera a concepção do "eu" cartesiano rejeitando-a.

David Hume, considera que a existência do "eu" parte das percepções, questiona que durante
um sono profundo quando estas percepções são suprimidas por um determinado tempo é
como se o "eu" não existisse, como se suprimisse todas as suas percepções e sensações do seu
corpo, então, o que faz a ideia do "eu" existir são as percepções particulares, como dor e
prazer; as sensações que provocam o ser humano a elaborar a ideia de uma consciência pura
de si mesmo.

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A ORIGEM DA IDEIA DE “EU”

Para o filósofo empirista David Hume o conhecimento baseia-se na experiência, por


meio das impressões. Um assunto discutido por filósofos da época era o da identidade
pessoal, onde um dos primeiros a abordar sobre esse tema foi René Descartes que retratava a
existência do “eu pensante”, é importante salientar que Descartes adotara o racionalismo em
sua teoria, doutrina que Hume criticava, outro ponto divergente entre os dois era o método
seguido, enquanto Descartes adotara o método dedutivo, baseado na ideia, Hume aplica o
método indutivo, baseado na experiência.

Para Hume um desafio a ser solucionado era explicar porque as pessoas acreditam na
existência continuada do “eu” e um problema em torno dessa concepção seria encontrar uma
impressão que correspondesse a essa ideia. Segundo Mondim a questão para Hume não é
saber se podemos conhecer a existência do nosso eu, mas como se forma a concepção da
existência continuada do eu e não da existência momentânea. Hume critica severamente a
ideia cartesiana do eu, quando questiona de que impressão deriva essa concepção.

Para Hume não há uma impressão particular que defina o “eu”, pois estas não são
constantes e invariáveis a ponto de gerar a ideia na mente humana de sua existência
continuada, pelo contrário são distintas e variáveis, mesmo assim as pessoas em geral
acreditam na existência do seu eu. Outro questionamento importante a ser considerado é o
seguinte: se as impressões que temos de nós mesmos em dado momento são completamente
distintas e variam o tempo todo, como acreditamos no “eu” que existe continuamente mesmo
cessadas as impressões?

Para Hume é através das representações que o homem formula a crença no eu, é por
meio da imaginação, que utilizando leis de associação, tendem a correlacionar, criar
semelhanças entre as diversas impressões distintas e invariáveis, criando a ilusão da existência
do eu. Nesse processo é de fundamental importância, segundo Hume, a memória, uma vez
que esta será responsável pelo armazenamento das diversas ideias que derivam das
impressões, são essas ideias distintas que serão associadas pela imaginação, que por sua vez
desenvolverá a ficção da existência continuada do “eu”.

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UM TEATRO DE PERCEPÇÕES

Para hume, a mente humana seria apenas um fluxo de percepções que se sucedem de
uma maneira rápida e o “eu” seria somente fruto da imaginação do homem. Ele define a
noção do eu fazendo uma comparação entre a mente humana e um palco de teatro onde são
apresentados diversos espetáculos (percepções da natureza humana) e no palco, estaria as
diversas e sucessivas percepções que dão consistência a estrutura do “eu”. Hume, ao mesmo
tempo que tece uma crítica direcionada aos filósofos metafísicos por terem a crença no eu
substâncial (alma), conceitua a noção de identidade pessoal. Segue o fragmento da crítica: “À
parte alguns metafísicos dessa espécie, arrisco-me, porém, a afirmar que os demais homens
não são senão um feixe ou uma coleção de diferentes percepções (...)”.

“A mente é uma espécie de teatro, onde várias percepções fazem sua aparição
sucessivamente; passam, repassam, esvaem-se e se misturam em uma variedade infinita de
posições e situações. Nele não há propriamente nenhuma simplicidade em um momento, nem
identidade em momentos diferentes, embora possamos ter uma propensão natural a imaginar
essa simplicidade e identidade. Contudo, a comparação com o teatro não deve nos enganar.
Há apenas percepções sucessivas, que constituem a mente. Não temos a menor noção do lugar
onde essas cenas são representadas, ou do material de que ele é composto.” (HUME, 2001, p.
285, grifos do autor)

“A noção do eu consiste num feixe de diferentes percepções que adquirem uma união
ocasionada pela ficção da identidade dessas percepções”. Em outras palavras, a identidade
atribuída ao homem seria a uma associação entre percepções que possuem uma relação de
semelhança e causalidade. Sendo que a semelhança seria a mais importante, porém, a
causalidade desempenha, também, um papel relevante na produção das ficções da
imaginação. Tal associação, citada anteriormente, seria proveniente da imaginação. A
ausência dessas percepções resultaria na não obtenção de uma ideia sobre si mesmo.

Levando em conta que a imaginação criaria a ficção de que possuímos identidade e


simplicidade, pode-se afirmar que os filósofos metafísicos se enganam ao acreditar na noção
substancial do eu. Isso ocorre porque, segundo Fogelin, eles não preservam a ingenuidade dos
homens comuns, que conseguem viver em um mundo exclusivamente de objetos, por esse
motivo, há essa necessidade de uma noção de substância pois, tais filósofos não conseguem
reprimir sua crença que mudando os objetos preservaria sua identidade no tempo. Hume ainda
afirma: “É assim que criamos a ficção da existência contínua das percepções de nossos
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sentidos, com o propósito de eliminar a descontinuidade; e chegamos à noção de uma alma,
um eu e uma substância, para encobrir a variação.” (HUME, 2001, p. 287, grifos do autor)

Com tudo isso, conclui-se que a ideia de identidade pessoal provem da relação entre
percepções diversas, não possuindo, assim, nenhuma relação com a metafísica.

O EXPERIMENTO DA MASSA E MATÉRIA

Para explicar o mecanismo da imaginação ao provocar o erro e a ilusão, bem como a


crença na ideia de “eu”, Hume arrola vários exemplos ilustrativos. Entre eles, o exemplo da
massa de matéria pode elucidar com clareza o nascimento das ficções da imaginação. Basta
concebermos uma massa que constitui um corpo idêntico a si mesmo. Por exemplo, uma
pedra. À medida que se subtrai ou se adiciona uma parcela de massa a esse corpo, sua
identidade modifica-se. Com efeito, quando a diminuição ou o aumento da massa é mínimo e
insignificante, a tendência da mente é continuar a considerar o referido corpo ainda como o
mesmo objeto, preservando a identidade dessa massa de matéria. Uma pedra que rola na beira
de um rio, por exemplo, tem o seu corpo estilhaçado e, consequentemente, diminuído. Mesmo
assim, a mente diria se tratar da mesma pedra.

Afirma Hume: “A rigor, isso destrói por completo à identidade do todo; entretanto,
como nunca pensamos de maneira tão precisa, sempre que encontramos uma alteração tão
insignificante não hesitamos em afirmar que a massa de matéria é a mesma.” Pequenas
alterações num corpo não servem para a mente dizer que se trata de outro corpo. Mesmo o
corpo sendo diferente, a tendência natural da mente é dizer que se trata sempre do mesmo
objeto.

A natureza humana se ilude quanto à medição da grandeza da massa porque a


mudança, em muitas ocasiões, é sutil, sentida aos poucos pela mente. A mudança nas partes
do corpo, por menor que seja, extingue a sua identidade, pois fabrica um novo corpo,
diferente do anterior. Porém, quando a mudança é proporcional, a tendência da mente é
ignorá-la, como se não houvesse nenhuma variação nas partes do corpo. “(...) embora a
alteração de uma parte considerável de uma massa de matéria destrua a identidade do todo,
devemos medir a grandeza da parte, não de maneira absoluta, mas proporcionalmente ao
todo.”

A imaginação engana a mente porque, a partir da mudança gradual e progressiva da


massa de matéria, dá a sensação de que o corpo observado ainda é o mesmo. “A alteração de
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uma parte considerável de um corpo destrói sua identidade; mas é de se notar que, quando a
alteração se produz de forma gradual e insensível, nossa tendência a atribuir a ela esse mesmo
efeito é menor.” Isso explica porque consideramos uma pessoa sempre como a mesma pessoa,
embora ela já tenha mudado muitas vezes ao longo de sua vida, tendo sido criança e depois
adulta.

A sensação de que ocorre um progresso ininterrupto do pensamento na percepção dos


objetos produz a ideia de identidade. Outro modo de explicar a atribuição de identidade às
coisas que mudam durante a sucessão temporal diz respeito ao fim ou ao propósito comum
entre as partes de um composto: “(...) produzir uma referência das partes umas às outras, e
uma combinação tendo vista algum fim ou propósito comum.”

Os exemplos fornecidos por Hume continuam muito instrutivos nesse ponto, no


sentido de que, por maiores, que sejam as mudanças e as alterações sofridas por um corpo,
quando a finalidade de suas partes é mantida, estamos autorizados a dizer que observamos o
mesmo e único corpo de antes. “Um navio que teve uma parte considerável alterada por
sucessivos concertos ainda é considerado o mesmo” a diferença do material não nos impede
de atribuir a ele uma identidade. Além disso, Hume ainda adiciona à finalidade das partes a
noção natural de simpatia, mostrando que esta contribui para a manutenção da identidade dos
corpos: “(...) a esse fim comum, acrescentamos uma simpatia entre as partes, e supomos que
elas mantêm entre si a relação recíproca de causa e efeito em todas as suas ações e
operações.”

Com isso, verifica-se que não somente as variações proporcionais e gradativas


auxiliam na conservação da identidade, mas também a finalidade dos componentes do corpo,
o seu propósito comum e a simpatia de suas partes, justificam a atribuição de identidade às
coisas por parte da natureza humana. Os exemplos dados por Hume não param por aí, embora
ele esteja falando da massa de um corpo físico qualquer, como um navio ou uma pedra, o seu
principal interesse é enfatizar a existência do “eu”. Vários são os exemplos que comparam a
identidade dos seres humanos não somente à identidade dos seres corpóreos inanimados, mas
também à identidade, dos animais e dos vegetais. O homem, assim como os bichos, cresce e
se desenvolve. Quando nasce não passa de um bebê desamparado, que logo cresce e vira uma
criança. Em seguida, a mesma pessoa transforma-se num indivíduo adulto, tendo o seu corpo
já completamente alterado e crescido. O mesmo ocorre com as plantas e os animais. Uma
semente que, quando plantada na terra, cresce até transformar-se numa árvore, é sempre
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considerada a mesma planta, mesmo após mudanças significativas na estrutura física das suas
folhas e dos seus galhos.

DIZ HUME: “Um carvalho que, de uma pequena planta, cresce até se transformar em
uma grande árvore, é sempre o mesmo carvalho, embora nenhuma de suas partículas materiais
nem a forma de suas partes continuem as mesmas. Uma criança se torna um homem, e ora
engorda, ora emagrece, sem sofrer nenhuma mudança em sua identidade.”

A MEMÓRIA DAS IMPRESSÕES COMO A FONTE DA IDENTIDADE

David Hume contraria o sistema filosófico cartesiano, negando a realidade de “sujeito”


e consequentemente sua validade como fundamento de todo o conhecimento. Para
compreender a concepção de Hume sobre identidade pessoal, precisamos compreender alguns
pontos principais de sua teoria do conhecimento. Para Hume, todo conhecimento deriva da
experiência.

Só há impressões particulares em constante movimento. Em nenhum momento


deixamos de experienciar algumas impressões como dor, calor ou alergia, para experienciar
um “eu” puro, que esteve o tempo todo fixo por trás das múltiplas percepções. “o espírito é
uma espécie de teatro onde várias percepções aparecem sucessivamente, passam, voltam a
passar se deslizam e se misturam em uma infinita variedade de posições e situações”. E estas
percepções não apresentam nenhuma “identidade” entre si. Sendo assim, a identidade pessoal
é apenas uma ficção. Mas, de que maneira se forma esta ficção? Pela memória e associação de
ideias, ganhando força e vivacidade pela ação de costume e da crença. “A identidade que
atribuímos ao espírito humano é tão somente fictícia”.

Como dissemos anteriormente, as impressões em fluxo que constituem nosso espírito


são particulares e não tem nenhuma identidade ente si. A identidade não é nada que realmente
pertença a estas percepções diferentes e as uma entre si, mas somente uma qualidade que lhes
atribuímos por causa da união de suas ideias na imaginação quando refletimos sobre elas.
Como a memória por si só nos faz conhecer a continuidade extensão desta sucessão de
percepções, deve ser considerada, por esta razão, capitalmente, Como a fonte da identidade
pessoal. Se não tivéssemos memória, jamais poderíamos ter uma nação da causalidade, nem,
por consequência, da cadeia de causa e efeito que constituem nosso eu ou pessoa.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MONDIN, Battista. Curso de Filosofia, v. 2. 9. Ed. São Paulo: Paulus, 2003.

http://www.ufjf.br/eticaefilosofia/files/2009/08/17_1_olivier.pdf

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