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0.1 EQUAÇÕES A DIFERENÇAS


Existem vários problemas de interesse em diferentes áreas como fı́sica, biologia,
quı́mica, economia e ecologia que utilizam modelos matemáticos em que o tempo é uma
variável discreta, ou seja, analisam a evolução do sistema em etapas isoladas de tempo.
Estes modelos discretos recebem o nome de equações a diferenças, equações que
relacionam o valor de uma variável x ∈ R na etapa de tempo t a valores de x em tempos
anteriores. São adequadas para descrever a dinâmica de uma população para a qual o
crescimento ocorre em perı́odos de tempo bem definidos.
O matemático italiano Leonardo de Pisa (1175 - 1250) foi um dos primeiros a
utilizar equações a diferenças para resolver um problema cuja solução é a sequência de
números (1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, ...), que satisfaz a relação recursiva:

nk+2 = nk + nk+1 . (1)

Ou seja, cada termo, exceto o primeiro, é igual à soma dos seus dois antecessores imediatos.
A forma das equações a diferença lineares é dada por:

an xn + an−1 xn−1 + ... + a1 x1 + a0 x0 = bn+1 , (2)

onde a0 , a1 , ..., an e bn+1 são constantes.


A ordem de uma equação a diferenças é dada pelo número de gerações anteriores
que estão diretamente relacionadas ao valor de x numa dada geração. Desta forma a
equação (2) é de ordem n. Ainda, se bn+1 = 0 a equação (1) é definida como uma equação
a diferenças linear homogênea.
Populações que não apresentam sobreposição de gerações, isto é, os adultos morrem
e são totalmente substituı́dos por seus descendentes, são melhor descritas por equações a
diferenças (EDELSTEIN-KESHET, 1998).
Uma equação a diferenças de primeira ordem em dinâmica de populações tem a
forma:
xt+1 = f (xt ), (3)

onde xt representa a densidade da população na geração t e f a função que descreve a


dinâmica da população. Assim, dada uma população inicial e uma equação a diferenças,
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é possı́vel calcular recursivamente o número de indivı́duos após n gerações.


No que segue, analizaremos um exemplo de equações a diferenças em modelos
biológicos.

Exemplo 1. Suponha uma população em que a reprodução ocorre de maneira


sincronizada, com cada indivı́duo produzindo c descendentes, com c > 0 para ser biologi-
camente viável. O número de indivı́duos na n - ésima geração será representado por Nn
(EDELSTEIN-KESHET, 1998).
Uma equação que relaciona as gerações sucessivas é:

Nn+1 = (c + σ)Nn , (4)

onde σ é a fração de sobreviventes de geração anterior. Denotando r = c + σ, temos

Nn+1 = rNn , (5)

Consideramos uma população inicial de N0 indivı́duos, aplicando recursivamente


a equação (5), obtemos:

N1 = rN0 ,

N2 = rN1 = r(rN0 ) = r2 N0 ,

N3 = r(N2 ) = r(r2 N0 ) = r3 N0 ,

..
.

continuando este processo, na n-ésima geração teremos:

Nn = rn N0 , (6)

a qual constitui uma solução da equação 5.


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Na expressão (6) observamos que o valor de c determina se a população irá crescer,


decrescer ou se manter constante com o tempo. Ou seja, se:

|r| > 1 Nn cresce com o tempo;

|r| < 1 Nn decresce com o tempo;

|r| = 1 Nn mantem-se constante com o tempo.


Nt+1
Neste modelo, como a taxa de crescimento per capita é Nt
= r constante, dize-
mos que o crescimento é independente da densidade. Como resultado, se r > 1 população
cresce indefinidamente. Do ponto de vista biológico, esperamos que o crescimento seja
limitado pois haverá fatores como escassez de recursos ou espaço, que limitarão o cres-
cimento da população. Desta forma, pasaremos a estudar o chamado Modelo de Ricker
que apresenta crescimento dependente da densidade.

Modelo de Ricker

Neste trabalho usaremos a função de Ricker para descrever o crescimento da po-


pulação, cuja equação é dada por:

Ht
Ht+1 = Ht eλ e− k = f (Ht ) , (7)

onde eλ é o fator de crescimento máximo da população e k é a capacidade suporte. O fator


Ht
e− k representa a mortalidade dependente da densidade (KAWASAKI e SHIGESADA,
2007).
Fazendo a adimensionalização de (7), com o objetivo de reduzir o número de
parâmetros e obter agrupamentos de parâmetros relevantes para a dinâmica do modelo,
usaremos a seguinte mudança de variáveis:

Ht
ht = , (8)
k
e desta forma obtemos a versão adimensional do modelo:

ht+1 = ht eλ−ht , (9)


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com ht sendo a densidade populacional adimensional de indivı́duos na geração t.

Soluções de Equilı́brio

O conceito de equilı́brio está associado à ausência de mudanças em um sistema, ou seja,


soluções de equilı́brio são constantes ao longo do tempo. Nas equações a diferenças, as
soluções de equilı́brio não sofrem variação entre as gerações, isto é, a população no tempo
t+1 é a mesma do tempo t (EDELSTEIN-KESHET, 1998). Deste modo, x̄ é uma solução
de equilı́brio da equação xn+1 = f (xn ). Isto é, uma solução de equilı́brio x deve satisfazer
x = f (x).
Para obter uma solução de equilı́brio de 9, fazemos

h = heλ−h , (10)

h − heλ−h = 0,

h(1 − eλ−h ) = 0.

Assim obtemos h1 = 0, que representa a extinção da espécie e h2 = λ, que é


biologicamente viável quando λ > 0.

Estudo da Estabilidade dos pontos de equilı́brio

A estabilidade dos pontos de equilı́brio é garantida através do seguinte critério de


estabilidade (EDELSTEIN-KESHET, 1998):

Teorema 1. Um ponto de equilı́brio x̄ de uma equação a diferenças da forma (3) é as-


sintoticamente linearmente estável se, e somente se, |f 0 (x̄)| < 1, com f 0 sendo a derivada
primeira da função f .

Aplicamos o critério de estabilidade para as soluções de equilı́brio da equação de


Ricker. Para isto, calculemos
f 0 (h) = eλ−h (1 − h). (11)

Deste modo, h1 = 0 é estável se, e somente se,

|eλ−0 (1 − 0)| < 1,


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|eλ | < 1, (12)

ou seja, λ < 0.
Agora, h2 = λ é estável se, e somente se,

|eλ−λ (1 − λ)| < 1,

|e0 (1 − λ)| < 1,

|(1 − λ)| < 1, (13)

ou seja, 0 < λ < 2.


O diagrama de bifurcação da figura 1, ilustra graficamente os valores as-
sintóticos que a solução da equação (12) assume em função do parâmetro λ.

Figura 1: Diagrama de bifurcação do modelo (9) com relação a λ.

Fazendo uma análise do diagrama de bifurcação, percebemos que os resultados


obtidos anteriormente são confirmados, pois para λ < 0 o equilı́brio h1 = 0 e h2 não
existe. Para λ = 0 h1 perde a estabilidade e surge o equilı́brio h2 = λ, que permanece
estável para 0 < λ < 2. Ao aumentarmos o valor de λ, ciclos de perı́odo dois, quatro, oito
e assim por diante são obtidos e para valores de λ suficientemente grandes, observamos a
formação do regime caótico (KOT, 2001).

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