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'A ideologia é de um
tipo de fim do mundo',
diz o filósofo Markus
Gabriel
Autor de ‘Por que o mundo não existe’ propõe acesso
irrestrito a verdades ‘transfinitas’
O filósofo alemão Markus Gabriel: é na divergência e no contexto, e não na convergência
e no consenso, que se pode atingir a verdade © Volker Lannert Originalfilename:
D5V_7086.jpg Volker Lannert / Volker Lannert
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RIO — Um dos expoentes do novo realismo, corrente
filosófica vanguardista, o alemão Markus Gabriel, da
Universidade de Bonn, virou bestseller ao lançar “Por que o
mundo não existe”, livro em que apresentou a tese de que
todas as coisas, materiais ou pensadas, podem ser
compreendidas e serem verdadeiras, ou ao menos objetivas,
em diversos campos de sentido, mas nunca reunidas num
lugar que englobe todas elas. Assim, existiriam vários
EM DESTAQUE Paul Verhoeven Alex Cohen atende a
mundos e, jamais, um só. Virou inimigo número um da pós Roberto Carlos e Obras de arte e
CULTURA retoma a pegada pedido de fãs na Jennifer Lopez posam objetos de decoração
polêmica de ‘Instinto... internet tocando... para foto após... DE LIVROS
ÚLTIMAS de David Bowie vão a...
Alex Cohen atende a
ÚLTIMAS DE LIVROS
modernidade (no que toca a tudo ser ilusório) e de nomes cultuados, Alex Cohen atende a
pedido de fãs na
vivos ou mortos, como Stephen Hawking, Deleuze, Nietzsche e internet tocando
músicas diariamente
Descartes. Em seu novo livro, “O sentido da existência” (Civilização18/10/2016 10:27
Brasileira), defende que só na divergência e no cruzamento de
diversos mundos podese encontrar um caminho ético, que o
Roberto Carlos e
Jennifer Lopez posam
consenso é a morte de tudo e que a pósmodernidade está superada. para foto após
gravação 18/10/2016 10:16
Nesta entrevista em português, por telefone, direto de Haia
revolucionário para cada um estar mais certo de si, do mundo externo
e da verdade, em busca de um planeta mais justo.
múltiplos. O que não existe é um lugar onde tudo está ao mesmo
tempo, o “mundo”.
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Mas se você pensa nesse lugar, então esse lugar existe.
Aí é que está: se neste momento estou pensando num lugar que
engloba tudo, “o mundo”, esse objeto do meu pensamento é “menos”
que o mundo que o inclui. Então, esse “todo” não é um objeto. Isso é
importante porque no momento em que percebermos que esse “todo”
não existe, colocamonos numa situação mais abrangente, com mais
objetos e riqueza de sentidos.
Você não estaria falando do infinito?
A realidade tem mais a forma do infinito do que a de um objeto. Mas
EM DESTAQUE Paul Verhoeven Alex Cohen atende a Roberto Carlos e Obras de arte e
CULTURA retoma a pegada pedido de fãs na Jennifer Lopez posam
não é o infinito da matemática, e sim uma série de objetos bem objetos de decoração
polêmica de ‘Instinto... internet tocando... para foto após... de David Bowie vão a...
distintos. 2 + 1 = 3, certo? Porém, 2 gotas de água + 1 gota de água não
é igual a 3 gotas de água. O Rio, uma cidade, ou o GLOBO, uma
entidade social, são objetos vagos. Não dá pra ter uma teoria
matemática sobre isso. Por isso, falo de campos de sentidos em que
aparecem objetos “transfinitos”.
Você diz que o universo descrito pela Ciência é apenas uma
parte do mundo, e não o todo. Mas o pensamento onde estão
os sentidos não nasce nesse universo, não “está” nele?
Há muito mais objetos, materiais ou não, do que os que a Física e as
Ciências Naturais descrevem, e não há nada de sobrenatural no que
digo. Não é possível uma teoria biológica que descreva todo o
pensamento e as mecânicas de raciocínio, pois estes não seguem
regras estritamente lógicas. São regras sui generis, caso a caso. O
universo é só uma província. O problema é que na visão do mundo
contemporâneo existe essa fantasmagoria de que é o universo
abrangeria tudo.
Mas, insisto: o ser não apareceu no universo?
Desde a Grécia antiga, o ser humano achava que existia um lugar que
abrange tudo. “Ser”, “cosmo” são palavras gregas para designar um
lugar onde tudo tem lugar. Isso definiu o ser humano até nossa época.
Por isso, na nossa época, a ideologia é de um tipo de fim do mundo.
Referese à pósmodernidade?
A pósmodernidade é a negação da filosofia. Ela diz que tudo é uma
alucinação gigante, tudo é ideologia, construção social. O novo
realismo diz que podemos conhecer como são as coisas em si e não só
os fenômenos. Há muitos objetos reais, e podemos conhecêlos nas
suas essências.
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Essa ideia rompe com Descartes e o popular “Penso,
logo existo”.
“Matrix”, filme de sucesso, radicaliza esse ceticismo
cartesiano. Se é assim, como podemos saber que nossas
opiniões acerca do mundo externo, da política, dos amigos,
são verdadeiras? Como acertar se estamos alucinando? Ora,
já sabemos muita coisa. No plano ético, sabemos que
demasiada desigualdade gera violência. Isso é um fato
objetivo que não tem nada a ver com opinião. Não podemos
EM DESTAQUE Paul Verhoeven Alex Cohen atende a Roberto Carlos e Obras de arte e
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fugir ao domínio dos fatos, mesmo os subjetivos: a subjetividade é um
fato também. Mas está na moda achar que não há fatos.
Seus arquiinimigos são figuras da moda: Deleuze, por
exemplo.
Eu digo, como piada, que meus inimigos são o Quartier Latin, de
Paris, inteiro. É que os maiores pensadores pósmodernos eram
franceses nietzschianos em certo grau. Deleuze, Foucault, Lacan.
Então, talvez Nietzsche seja meu arquiinimigo. Mas eu o respeito.
Porque ele conhece muito bem os problemas do seu pensamento, é
honesto. Mas o construtivismo está mais para uma moda. Por
exemplo, os físicos que discutem se o universo é uma simulação de
uma inteligência artificial são construtivistas.
Você critica duramente a teoria do tudo, com a qual a Física
tenta explicar todos os fenômenos. Mas a teoria do
multiverso, que fala de múltiplos cosmos, faz lembrar seu
pensamento.
Sim, só que a pluralidade deles é distante, “lá fora”, totalizadora, como
a relatividade de Einstein. Na minha ontologia, procuro localizar a
pluralidade onde já estamos.
E onde estamos?
Qualquer lugar onde estejamos são muitos lugares. Um país complexo
como o Brasil tem rostos, regiões, gente, visões do que deve ser o
Brasil. O Brasil são essas visões transfinitas. O multiverso está aqui,
não lá fora. Repito: não há nada sobrenatural nisso. Há agora alguém
no Japão fazendo algo que nem imagino, enquanto falamos de
filosofia aqui, ao telefone. O cara no Japão, com os seus pensamentos,
já está num “universo paralelo” e até em outro tempo (risos). Não dá
para “somar”, totalizar, nossa conversa e os pensamentos dele num
todo.
O transfinito é infinito?
É mais do que o infinito. Ora, até na Matemática há vários tipos de
infinitos, com regras para somas. E na minha ontologia, abrese uma
cadeia de infinitos objetos em infinitos campos de sentido que se
relacionam em diferentes categorias. Não há uma regra que os
governe. É ainda mais. Um “mais” qualitativo, e não quantitativo,
porque não se pode contar exatamente. O matemático alemão Georg
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CULTURA Cantor, que inventou a teoria dos conjuntos, faz uma distinção entre o
retoma a pegada pedido de fãs na Jennifer Lopez posam objetos de decoração
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infinito da matemática, sempre quantitativo, e o chamado “absoluto
transmitido”, um infinito qualitativo.
No Brasil existe uma expressão, a síndrome do Fla x Flu,
que remete ao fato de as pessoas não mais trocarem ideias,
mas tentarem vencer com argumentos, ou adotar um, para
“resolver” a parada.
O Fla x Flu é extremamente difundido, e vem de um malentendido
sobre a natureza da democracia. É um tipo de debate que dá a
impressão de que é democrático, de que não é dogmático, mas que, na
verdade, dá lugar à mentira. Um cara como Donald Trump, por
exemplo, só pode funcionar num contexto em que os fatos já não têm
valor. Por isso tenho uma visão da “democracia com verdade, com
fatos”. Nosso modo de democracia hoje pode parecer bacana,
relaxado, mas é uma falsa maneira de chegar à paz social, à justiça.
Precisamos ajudar nossos amigos, nossas famílias a ver a verdade.
Nem sempre a ilusão é uma boa coisa.
Mas como saber qual é a verdade num mundo em que
especialistas passam o dia inteiro dizendo o que é a
verdade?
Precisamos de um pensamento bem informado, estruturado, e que
não seja o pensamento do “especialista”. Esse pensamento é o da
filosofia. De certa maneira, todos os seres são filósofos, mas não
sabem. Todos querem saber se somos agregados de célula ou imortais.
Essas questões a respeito de quem somos são filosóficas. Precisamos é
de mais filosofia no espaço político.
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Essas questões, no senso comum, são colocadas
para soluções imediatas, e não para reflexão.
Pois é. Mas na filosofia tratase de uma reflexão que, em
princípio, não tem nenhuma meta além da reflexão, trocar
ideias em torno de uma questão sem querer nada com isso, o
que é um conceito importante da liberdade: a ideia de um R$ 55,92
pensamento sem fim que nos liberta, que produz
conhecimento e autoconhecimento. É uma forma de
liberdade e de resistência. Por isso o grande gênio da
Filosofia, Sócrates, resistiu ao sistema político da democracia grega ao
insistir que ele não sabia nada.
EM DESTAQUE Como dar às pessoas acesso à reflexão numa dinâmica em
Paul Verhoeven Alex Cohen atende a Roberto Carlos e Obras de arte e
CULTURA retoma a pegada pedido de fãs na Jennifer Lopez posam objetos de decoração
que elas não têm tempo?
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Um critério para uma sociedade mais justa deveria incluir o direito
humano a ter tempo na vida para discutir a questão de quem somos.
Quem não tem sequer tempo para isso jamais poderá viver uma “boa
vida”. Para mim é um imperativo categórico que haja espaço de
educação e reflexão para todos. Sou universalista radical nesse
sentido. Mas é difícil chegar com os pressupostos econômicos em
vigor.
A internet é um bom lugar para revoluções?
Já vimos uma tentativa, a da Primavera Árabe. Mas foi um grande
fracasso. O problema dos movimentos digitais é que as regras, a
seleção da informação, ainda são efetuadas na Califórnia. A forma
lógica com que a informação está sendo trocada é definida por um
grupo que tem interesse econômico. São plataformas boas para uma
melhor forma de comunicação global que poderiam impulsionar
grandes transformações. Mas o uso econômico é em demasia.
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