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14 Lições
L. A. Tckeskiss
1922
Primeira Edição: O livro sobre o materialismo histórico é formado por uma serie
de preleções proferidas na Universidade Comunista1 para as minorias nacionais do
Ocidente, no ano letivo de 1921-1922.
1
A Universidade Comunista dos Trabalhadores do Oriente, sigla KUTV, foi uma Instituição de ensino
superior da União Soviética fundada em 21 de abril de 1921, com sede em Moscou, por resolução
da Internacional Comunista e inaugurada em 21 de outubro de 1921. Em 1930 foi descentralizada e suas
funções foram repassadas para um número maior de Instituições de ensino superior. Conhecida
também como Universidade do Extremo Oriente.
Sumário
Introdução.......................................................................................1
Preleção Introdutiva...................................................................3
Lição XIV........................................................................................77
Introdução
1
social e da historia); a 3ª as varias teorias sociológicas e a
critica da teoria organicista (spenceriana).
2
ensinamentos de Marx e Engels. Em algumas passagens tenta
o autor abordar a questão, empregando um método de
exposição diverso do usado habitualmente, diferindo também
a sua interpretação; terá sido original sem, contudo alterar o
aspecto geral da matéria.
Preleção Introdutiva
3
e, quando mais se desenvolve o proletariado, tanto mais se
deve desenvolver a sua concepção sobre a vida.
4
Á pergunta: qual é o objeto do materialismo histórico,
devemos responder que o materialismo histórico estuda os
fenômenos sociais e a historia.
5
natureza nem na vida um só fenômeno que não seja
cientificamente estudado.
6
Lição I: Fenômenos Sociais e Acontecimentos Históricos
7
investigação. Os atritos e movimentos do projétil, se a morte
foi produzida por bala, o jorrar do sangue, a destruição das
células e a morte como tal, não são ainda o momento social e
por isso não os estudaremos em nosso trabalho.
8
Ora, descoberto e determinado o objeto a ser estudado
numa ciência, já se pode encetar a sua construção.
***
9
certa modificação á vida social, e torna-se deste modo, ao
mesmo tempo, um acontecimento histórico.
10
fenômenos comuns da vida humana, mas somente os
acontecimentos que atraiam a atenção dos “historiadores” de
então.
11
de vista cientifico para os acontecimentos históricos,
encontramo-los até, anteriormente,
em Voltaire e Montesquieu).
12
À pergunta: podem esses fenômenos servir de objeto para
uma investigação cientifica rigorosa, responderemos que, não
sendo produto do acaso os fenômenos sociais puros que
destacamos, mas constantes, isto é, que se repetem e estão
relacionados entre si, podem, por isso ser estudados
cientificamente e por conseguinte previstos.
13
fenômenos complexos, ligados a muitos momentos estranhos,
criando por sua vez mais um obstáculo á investigação
cientifica2.
***
Um tanto diferente era a situação da historia: tínhamos diante de nós fatos, tais
2
como as revoluções e as guerras, que já não podiam ser explicadas pela vontade
exclusiva de um homem. Tentou-se a sua explicação pela vontade conjunta de
muitos homens. Mas aqui surge a pergunta: porque querem todos esses homens, a
mesma coisa? Temos então que procurar as causas da vontade coletiva dos
homens; mas enquanto os acontecimentos se explicavam pela vontade, seja
embora a vontade coletiva, ficavam estranhos á ciência e deixavam de ser passiveis
de uma investigação com esse caráter.
14
lembramos e passamos ás ciências naturais concretas
(ciências fenomenológicas).
15
semelhantes aquelas de que provieram. Assim, vemos que as
leis puramente químicas não nos podem replicar os
fenômenos da natureza orgânica (vida). Aqui deparamos com
fenômenos revestidos de um caráter novo, e submetidos,
portanto a leis especiais, com as quais se ocupa a biologia.
Essas leis são menos gerais e mais complexas que as da
química.
Para explicar os fenômenos da vida criou-se uma teoria que se chamou vitalista.
3
16
Todos os fenômenos da vida são fenômenos da mesma
espécie; não existem leis especiais da vida para vários
organismos4.
17
Lição III: A Teoria Organicista na Sociologia
18
sociologia, anteriormente formuladas, analisaremos contudo,
antes de passarmos a Marx, uma das mais importantes — a
teoria organicista, formulada por Kant, desenvolvida
por Spencer e levada ás suas últimas conseqüências por
Worms, Lilienfeld e outros.
19
Todos esses órgãos sociais estão integrados, unidos ao
organismo social, que não pode absolutamente existir em
qualquer deles.
20
São essas as leis básicas da estática e da dinâmica social
formuladas pela teoria organicista da sociologia.
21
diversos órgãos. Essa existência dos diversos órgãos ou
agrupamentos, ou melhor, das classes na sociedade, é,
segundo essa teoria, uma coisa natural e cada tentativa para
a modificação das formas sociais, não passará de uma loucura
e resultara improfícua.
que quanto á estática. A sociologia, oriunda da biologia, pode, talvez, ser aplicada
para investigação da vida e desenvolvimento dos seres inferiores. Entretanto a
sociedade humana tem outros aspectos inteiramente novos e peculiares que não
podem ser explicados pelas leis que regem as sociedades dos animais inferiores.
O publicista russo Mikailowsky, criticando esta teoria do “pregresso” de Spencer,
6
22
Lição IV: Os Conceitos Básicos do Idealismo e
Materialismo
originariamente por uma força sobrenatural pensavam ter sido criada desde logo
com certas propriedades, as quais lhe deram durante seu desenvolvimento a força
de um fator criador independente.
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tropeçava forçosamente, com o tal ponto de vista, num
entrave á verdadeira concepção da natureza.
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Lição V: O Materialismo Francês e a Filosofia Crítica de
Kant
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O materialismo que, como vimos, chegou ao ponto de
vista do determinismo, era no entanto ainda um materialismo
naturista. Os materialistas franceses tomando a natureza e
seus fenômenos como necessidade, entendiam que as leis,
segundo as quais se operam os fenômenos, devem ser
eternas, como a própria natureza. Do mesmo modo, no que
concerne à sociedade humana, entendiam que a vida deve aí
realizar-se segundo leis internas e imutáveis, por suporem
imutáveis e eternas as relações entre os fenômenos aí
observados. Quais eram, porem, essas leis, é que não
sabiam.
27
***
29
cada experiência8. Diz ainda Kant: não podemos imaginar
qualquer coisa fora do espaço e do tempo. O espaço e o
tempo não são por nós tomados dos fenômenos das coisas;
são por nós introduzidos nos fenômenos e nas coisas. Eles
não existem fora do nosso espírito. Para imaginarmos uma
coisa deve o nosso espírito colocá-la nessas duas formas
gerais.
30
gnosiologia — o estudo das condições e limites do nosso
saber, e que representou então um grande passo.
33
A atividade humana — a liberdade, está necessariamente
contida na determinação histórica9.
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natureza encontramos também nos seres inferiores. Na
simples adaptação há, portanto, pouco de humano, menos
ainda de social. Que é então o que distingue a adaptação
humana á natureza? Em primeiro lugar a forma social. Essa
adaptação se realiza não em forma individual; o homem se
adapta á natureza, socialmente. Duas formas de atividade
humana estão ligadas á sua adaptação à natureza: 1º, uma
atividade que serve diretamente à satisfação das
necessidades de sua existência (nutrição, reprodução). Para
satisfazer suas necessidades desta natureza precisa o homem
exercer certa atividade (por exemplo, comer, beber, respirar,
manter relações sexuais, etc.), mas essas atividades são
provocadas diretamente pelas proprias necessidades de
momento. 2º, há uma outra atividade que serve
indiretamente á satisfação das necessidades (cozinhar para
comer, puxar água para beber, colher frutas para comer,
etc.). A atividade do homem na primeira forma, serve-lhe
para satisfazer diretamente suas necessidades, só pode ser
útil ao individuo que exerce essa atividade (não se pode
comer por outros). A atividade da segunda forma (satisfazer
indiretamente suas necessidades) pode ser também útil a
outros (pode-se colher frutas para outros, pode-se trazer
água não só para si, como também para que outros bebam).
Essa atividade do homem, que serve diretamente a satisfazer
suas necessidades, tem uma característica especial, que
consiste na possibilidade de se tornar social. A essa atividade,
em geral, denominamos: trabalho.
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A historia nos mostra que com o desenvolvimento do
homem, ele adquire cada vez mais necessidades e novas
qualidades. Surge então a questão: qual a origem dessas
novas necessidades e dessas novas qualidades? Onde devam
ser procuradas as causas do seu aparecimento? Bem
entendido, as causas do aparecimento dessas novas
necessidades cada vez mais diversas não podem ser
encontradas no próprio homem, mas sim fora dele, isto é, na
influencia exercida sobre ele pela natureza que o circunda,
pelo meio. A própria natureza, muda, porem, muito
lentamente. Se a evolução do homem dependesse somente
da mutação do meio natural, no qual ele se encontra, essa
evolução seria tão lenta que se tornaria quase imperceptível.
Nas primeiras etapas do desenvolvimento humano notamos
quão lentamente se opera essa evolução. O meio natural age
pouco sobre o desenvolvimento das necessidades do homem,
sobre o aperfeiçoamento de suas habilidades, sobre a
mudança de sua natureza.
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Vemos, portanto que até a gênese, a raiz de conceito tão
elementar, somos também obrigados a procurar nos
instrumentos — na técnica. E quando o homem já pode ter
um conceito do “si” e do “não eu”, também pode formar o
conceito de outras coisas distintas e assim tornou-se possível
o continuo desenvolvimento da linguagem. A linguagem agiu
por sua vez sobre o processo do pensar. Ela quase obrigou o
homem a desenvolver o processo de generalizar e abstrair —
a formar conceitos gerais (seria impossível ao homem dar
nomes distintos a todos os fenômenos da natureza).
A atividade indireta foi no inicio, social. A primeira forma de relações sociais foi a
10
40
relações econômicas e delas é que nascem todas as outras
relações. Tomando por exemplo uma sociedade desenvolvida
vemos que o trabalho aí é representado por um processo
largamente ramificado; e investigando sua evolução devemos
tomar o trabalho em sua totalidade e em suas variadas
formas. Compreende-se que, quando desejamos conhecer um
fenômeno social complexo, devemos tomar em consideração
todas as diferentes relações existentes na sociedade. Só
então poderemos compreender, por exemplo, uma revolução
que se opera no momento em que forças produtivas
ultrapassam as relações ou formas sociais existentes se
levarmos em conta a totalidade das diferentes relações
existentes na sociedade, e que se acham já desligadas do
processo da produção11.
mostrando seu paradoxo, no sentido de que fenômenos tais como filosofia, moral,
arte e ciência, são explicados por simples interesses materiais. Um tal modo de
entender Marx, nada revela senão a ignorância e incapacidade em compreender o
marxismo. Marx não diz que os referidos fenômenos são explicados exclusivamente
pelos interesses econômicos; diz apenas que a base desses fenômenos, sua
origem, em ultima analise, e as causas de sua evolução, deve ser procurada na
evolução da técnica e das relações sociais que se criam no processo de trabalho.
Sua evolução não é determinada exclusivamente pelos interesses econômicos;
somente se diz que seu conteúdo e sua forma são causados pelos fatores acima
referidos. Querendo esclarecer e compreender o porque do aparecimento e da
realização de tal ou qual fenômeno, devemos antes de mais nada travar
conhecimento com os interesses materiais dos homens e com o estado da técnica
antes do aparecimento do fenômeno e analisando as relações econômicas e sociais
devidas a esses interesses e ao desenvolvimento da técnica e somente então é que
poderemos compreender porque surgiu ou se realizou este ou aquele fenômeno na
sociedade e na vida social.
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causa básica a parte material da sociedade que é o meio
natural, (estática); 2º, que a dinâmica da sociedade, a
mudança de sua estrutura também depende da evolução e da
modificação do meio artificial. Numa palavra, devemos
encarar o estudo do materialismo histórico, como uma
sociologia12.
Não obstante a escassez de literatura que tenha tratado dos fenômenos da vida
12
42
Lição IX: A Estrutura da Sociedade e a Divisão de Classes
43
Vendo na sociedade certos agrupamentos ligados á família
que, como esta desempenham grande papel na visa social,
surge então a seguinte pergunta: como se entrelaçam as
varias relações de família com as relações econômicas? Não
dependerão uma das outras?
Que a família é mais que uma união fisiológica, prova-o o fato de encontrarmos
13
também entre os seres inferiores relações fisiológicas; não obstante não se nota aí
vida familiar definida como entre os homens em geral, e mudança das formas da
família em particular. É, portanto, um erro supor que a família é somente a
expressão de relações fisiológicas. Para ser possível uma vida social, deve
naturalmente existir o homem como tal. Dá-se por isso a união fisiológica dos dois
sexos para a procriação que ocupa assim um dos mais importantes papeis na
perpetuação da espécie humana. Porem a forma que se elabora como conseqüência
da união — a família, dependeu sempre da situação econômica da sociedade. Com
efeito, alem das relações sexuais e das relações que se formam como conseqüência
de vários trabalhos, não notamos nas épocas primitivas outras relações entre os
homens. O conteúdo e a forma das relações sexuais permanecem, porem, mais ou
menos os mesmos, ao mesmo tempo em que as formas de cooperação modificam-
se rapidamente e se desenvolvem juntamente com a técnica. É claro, portanto, que
essas modificações na técnica, na forma da cooperação social, provocam por si as
modificações correspondentes na família, porquanto é esta alguma coisa mais do
que um simples convívio sexual.
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fisiológico, e tornam-se complexas devido às relações
econômicas existentes e integradas na sociedade14.
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a alargarem a sua luta contra a natureza; o resultado disso
foi a evolução do trabalho. Começa aqui a esboçar-se um
novo fator que desempenha um grande papel na evolução da
sociedade. Esse novo fator foi a técnica: — o meio artificial,
que é formado pelo homem em sua luta implacável pela
existência, para a satisfação de suas necessidades vitais. Uma
das condições preliminares para o desenvolvimento da técnica
foi o desenvolvimento da sociedade; mas quando a sociedade
cresce, forma-se nela, devido à evolução da técnica, a divisão
em grupos e em diferentes camadas econômicas, com
interesses opostos, mantendo-se em constante relação de
luta. Nasce assim e se desenvolve mais esse novo fator
agindo por sua vez no desenvolvimento posterior da
sociedade, determinando a sua estrutura com as mutações
gradativas da mesma, — a luta de classes.
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raças, (mascarando a luta econômica), antes da luta de
classes, porque esta se origina nas sociedades diferenciadas,
ao passo que a luta de raças e até mesmo a luta nacional não
exigem uma divisão de trabalho social desenvolvida. E
quando no cenário histórico surge a luta de classes ela não
expele a luta de raças ou nacional, mas complica-as. A luta
de classes assume, as vezes, a forma de luta de raças ou luta
nacional, porque para a burguesia é necessário e útil encobrir
a aguda luta de classes com o véu da luta nacional ou de
raças.
Devemos notar que o anti-semitismo, que traz a cor da luta de raças (luta contra
16
a raça semita), é pelo seu conteúdo uma luta econômica mal disfarçada, entre os
diversos grupos de uma mesma classe, ou um meio de desviar a consciência de
classe do proletariado e das massas populares oprimidas, a fim de enfraquecer a
luta de classes. O anti-semitismo é sempre reacionário, até mesmo quando toma o
caráter de um movimento das camadas oprimidas, porque desvia da luta de
classes.
Fato digno de ser observado é o seguinte: negros capitalistas convivem muito
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bem com brancos capitalistas e cultos. E ainda, que negros proletários vivem
pacificamente com proletários brancos; nem é isso de estranhar. Portanto, a idéia
de que o conteúdo da luta de raças é puramente econômico, não necessita de
comentários.
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Analisaremos agora a luta nacional que é um fenômeno
muito mais freqüente e que em nossos dias observamos
ainda em grande escala e em variadas formas. Aqui devemos
notar: primeiro, se essa luta nacional, como tal, é uma força
propulsora na historia; segundo, em que consiste em geral o
conteúdo da luta nacional.
50
O meio artificial, — a técnica, ao contrario, se modifica,
evolui e passo a passo com ela desenvolve também a força do
trabalho que a ela está ligada, e é determinada pela técnica
em desenvolvimento. Quanto mais se desenvolve a técnica,
tanto mais diferenciado se torna o trabalho, dividido
socialmente, e ao mesmo tempo a sociedade é igualmente
dividida em classes e grupos com interesses econômicos
opostos.
52
dirigir o seu progresso, mas, ao contrario, tornou-se mesmo
um entrave a organização e desenvolvimento das forças
produtivas da sociedade. E desde o momento em que essas
forças produtivas tentam vencer e destruir esses entraves,
imediatamente a burguesia faz um grande alarme dentro da
sociedade burguesa, gritando que ameaçam a destruição da
própria sociedade, quando na verdade, só é ameaçada a
propriedade burguesa. Marx disse:
***
53
A sociedade, porem, não é maquina que tem a tarefa de
desenvolver a técnica e a técnica tampouco não se
desenvolve por si só. A sociedade se compõe de homens que
têm certas necessidades materiais e espirituais, certas
aspirações humanas, que vivem e lutam; compõe-se de
homens com certa consciência que com a evolução da
sociedade se torna cada vez mais complexa. Devemos,
portanto, considerar o conteúdo humano e interno da luta de
classes; devemos compreender a luta de classes em toda a
sua complexidade e analisar as varias formas por ela
assumidas.
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A atividade individual tem sua primeira expressão no
trabalho (satisfação indireta das necessidades), o qual
assume o caráter de cooperação. E esse trabalho é a
expressão de uma forma simples de atividade. Mais tarde
essa atividade assume uma forma muito complexa por já se
achar ligada a consciência, ás idéias, etc. De que forma
aparece essa última, isto é a forma complexa da atividade
individual? Não podemos dizer que o espírito humano se
desenvolva independentemente (por si só). A evolução deve,
pois realizar-se como resultado de choques entre o homem e
a natureza externa, á qual ele está obrigado a se adaptar. A
causa do desenvolvimento humano não está nele próprio,
mas fora dele, na natureza á qual ele se deve adaptar. O
homem porem, só se adapta á natureza pelo meio artificial,
como já vimos, que ele cria com a técnica.
A bola rola e pode ela gritar bem alto que rola por sua
própria vontade mas, ela é obrigada a rolar sem poder parar.
Mas outra coisa se dá com o homem. Este ao praticar um ato
pode perguntar a si próprio: devo ou não praticar este ato? Já
aqui existe um momento de escolha. A atividade do individuo
é dessa forma, dependente de sua escolha. O homem ao
praticar um ato está às vezes diante de um dilema, pode
fazer ou de outro modo. Esse fato de escolher é fato que não
pode ser negado nem evitado. Devido a este momento de
escolha torna-se a questão da vontade livre mais fácil de
resolver.
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torna consciente não só do trabalho (ação) de correr (como
aconteceu com a bola), mas também das aspirações de
vencer a barreira. Encontrando o obstáculo desta, e forçando
os pontos fracos, está a água diante do problema de
encontrar a saída (a satisfação de seu desejo ou aspiração)
que ela própria pode escolher. A corrente d’água, que fora
dotada de certa consciência, encontrará na barreira um
entrave, um obstáculo de um lado e por outro há uma
vontade, uma aspiração de vencer esse obstáculo. A corrente
de água quer continuar a sua obra de correr, não obstante o
obstáculo encontrado. Trava-se aqui uma luta entre a
corrente consciente com a vontade de correr e a barreira. A
fresta por ela feita na barreira deixou passar a água. A
corrente forçou a barreira toda, procurando saída em todos os
pontos fracos que quis arrombar, mas somente conseguiu
passar pela fresta que havia arrombado. Aqui tivemos o
momento da consciência e o livre arbítrio.
61
atividade do homem com exatidão, podemos dizer sem receio
de errar que o homem, em geral, sempre aspirará a satisfazer
suas necessidades vitais e por isso desenvolverá seus meios
de luta contra a natureza — desenvolverá o trabalho e a
atividade social. Mas como e de que modo satisfazem os
homens suas necessidades? Aqui já não há mais
generalidade. Na sociedade feudal, por exemplo, a maioria da
sociedade é de camponeses; os camponeses como tais terão
em qualquer tempo o mesmo modo de adaptação á natureza,
por conseguinte, os mesmos modos de satisfazer suas
necessidades. Todos os camponeses terão mais ou menos os
mesmos interesses (pequenos traços característicos, não tem
aqui importância alguma). A classe camponesa inteira
representará um todo, uma unidade, com certos e
determinados interesses, pelos quais poderá ser
predeterminada a atividade de cada camponês (aspiração de
se libertar do jugo feudal, livre locomoção, conseguir uma
propriedade em terras, etc.). Tomando a classe feudal como
tal, poderemos segundo seus interesses mais ou menos
singulares também predizer a aspiração e atividade de cada
senhor feudal (aumentar o seu domínio sobre as terras,
ocupar um lugar superior na hierarquia do poder, limitar o
mais que for possível o poder do rei, escravizar na mesma
medida todos os camponeses, etc.). Tomando a sociedade
contemporânea, também poderemos fazer o mesmo.
Conhecendo os interesses de cada classe e até mesmo de
cada grupo, não é, portanto, difícil predizer e determinar suas
aspirações e suas atividades, bem como a dos indivíduos a
ela pertencentes. A classe operaria como um todo, porquanto
todos os operários se encontram em condições iguais, no
sentido de que todos são obrigados a vender o seu trabalho,
terá interesses gerais cuja expressão consiste na aspiração de
aumentar o salário e diminuir a exploração. A classe
capitalista, não obstante as divergências internas, também
apresentara uma aspiração geral, como em tudo,
determinada por interesses, que estarão diametralmente
opostos aos interesses da classe [operária] e terá sua
expressão na aspiração de diminuir o salário dos operários e
aumentar a exploração. Nessa direção determinada irá
também a atividade dessas classes na sociedade capitalista.
62
Vemos, portanto, que podemos predeterminar a direção
que tomará a atividade dos vários grupos sociais. Porque
conhecemos de antemão os motivos de sua atividade. Mais
ainda, conhecemos as causas pelas quais os motivos são
determinados — conhecemos os interesses.
64
Lição XII: Direito e Arte do Ponto de Vista Materialista
65
fenômeno histórico, naturalmente não existiu sempre e nem
existira.
Aqui não nos deteremos na gênese da arte em sua relação com o trabalho.
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Também não iremos falar do papel dos jogos na origem e desenvolvimento da arte.
Isso nos tomaria muito tempo. Queremos somente estabelecer aqui a ligação entre
a arte e as relações sociais e deste modo sua dependência da evolução das forças
produtivas e das relações de produção.
67
Qual a causa que determina essas expressões
harmônicas?
***
69
Devemos notar que lentamente se dá certa evolução no
conteúdo dos próprios sentimentos harmônicos. Os
sentimentos harmônicos não são constantes, eternos. Nem
sempre e em toda parte são sentimentos harmônicos os
mesmos (gostos estéticos). Os sentimentos dependem do
estado geral da cultura da sociedade dada, com suas
imaginações. Mas a principio, é difícil encontrar o conteúdo
social da própria estética. Deve-se analisar, aqui, a arte por
épocas. Em época de decadência, degeneração e crepúsculo,
são os sentimentos harmônicos o reflexo de abatimento
moral, pessimismos, melancolias, ascetismo, etc. Em época
de renascimento, são contrários aos da época de decadência:
exprimem a aspiração de combates e lutas, de gritos de
conquista e entusiasmo, etc. Em época de declínio,
encontramos a decadência e o romantismo. No que concerne
ao conteúdo da arte, a própria descrição e não a sua forma
harmônica (estética), está mais intimamente ligada á época
dada da evolução social e á classe ou grupo que representa20.
em certo sentido. Ele escreveu uma dissertação sobre estética na qual demonstrou
que o conceito do "belo" depende das condições de vida (o conceito de uma moça
bonita não é o mesmo na aldeia ou na cidade, na Rússia ou em Paris). O conteúdo
de beleza depende da sociedade em geral e da classe em particular. O mesmo se
dá em relação à música e à escultura.
70
formas de religiões existentes entre os povos primitivos.
Tentaremos somente explicar a gênese, o conteúdo social e o
papel que a religião desempenhou na história da humanidade.
74
causa na natureza, e enquanto procurava evitar os
sofrimentos exteriores, subornando a Deus, por meio de
sacrifícios ou preces, procurava ele evitar as dores interiores
por meio de ervas ou passes de mágicos feiticeiros. Deste
modo ficaram ligados os dois momentos. Os que acumularam
mais experiências puderam auxiliar outros homens, em suas
dores; tornam-se os intermediários entre o homem e as
forças da natureza externa, ou dos deuses, passando a ser
dirigentes e executores do culto. A atividade que está ligada
ao culto se destaca do trabalho comum. O culto pode
somente ser exercido por determinado grupo social. O mágico
liga-se ao sacerdote e se torna o intermediário entre Deus e o
homem.
75
de outro, das relações sociais. Os dois momentos se
entrelaçam intimamente, mas não se pode fundir, porque
seus conteúdos são opostos. O desenvolvimento da ciência
provoca a morte da religião, os interesses das classes
dominantes, exigem o fortalecimento da religião para que as
grandes massas continuem sob seu domínio. Mas apesar
disso, uma vez que a evolução das forças produtivas exige o
desenvolvimento da ciência, já a burguesia não pode impedir
seu desenvolvimento, pode apenas traçar-lhe certos limites,
sendo-lhe impossível detê-la. Desta forma sucede que,
juntamente com o desenvolvimento da ciência, desenvolve-se
a oposição á religião. A religião surgiu da necessidade de
explicar a compreender os fenômenos naturais; da busca de
explicação a esses fenômenos foi que se constituiu o inicio da
ciência. Mas com o decorrer do tempo, esta ultima abrange
cada vez mais fenômenos, e se torna por isso cada vez mais
largo seu campo e estreito o campo da religião, até que
chegara uma época em que não sobre mais lugar para esta.
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A religião, ao contrario, esta sempre ligada ao culto em
varias formas. Ela se acha ligada á submissão do homem a
uma força superior a ele e que por isso pode ser a ele
submetida. Uma tal crença tem por isso de provocar um
sentimento de impotência e submissão do homem, e levá-lo
rapidamente ao desprezo de si próprio e ao fatalismo.
Lição XIV
78
correspondente. Mas a época da Revolução Francesa não foi
por ele criada, antes, ela o criou como tal, e Napoleão, como
personalidade, é por isso um produto de sua época. Portanto:
— para que as grandes personalidades possam ser
aproveitadas, devem elas antes de tudo ter nascido numa
época correspondente. Somente a Revolução Francesa que
colocou no poder a burguesia comercial e industrial, com suas
aspirações naturais e vitais de expansão, deu lugar a que se
manifestasse o talento de Napoleão. Se não houvesse uma
pessoa tão hábil como Napoleão, não haveria talvez tantas
vitórias, mas a França, com as suas aspirações expansoras de
então, seria tal, com ou sem Napoleão; por outro lado devido
à supremacia técnica da Inglaterra na situação econômica e
política internacional, a França, mesmo com Napoleão, teve,
finalmente, que perder a guerra. Alem disso, deve-se tomar
em consideração que Napoleão recebeu certa educação, teve
certas idéias, realizou certas aspirações. Tudo isso não foi
tomado fora da sociedade. Ao contrário, era o resultado do
estado geral da sociedade francesa daquela época. Dessa
forma, acontece que Napoleão se tornou “Napoleão” devido
às condições sociais da época em que vivia. A própria
personalidade é em sua maior parte o resultado das relações
sociais, do meio social, que são determinadas, em última
análise, pelas relações de produção.
No presente por ter sido escrito em 1921 e Lenine ter morrido em 1924. (N.P)
23
79
sua marcha geral, porem, é determinada pela atividade das
grandes massas operárias e camponesas. Somente os
camponeses descontentes, por um lado, e a forjada
combatividade do operariado por outro, e a guerra, a crise no
organismo capitalista, somente esses três fatores é que
puderam ter determinado a Revolução. Lenine sabia muito
bem auscultar o pulso da Revolução, sabia como manobrar.
Em geral, porem, sua marcha é determinada pela
coletividade, pelas grandes massas e seus interesses. O
mesmo podemos dizer do papel de Marx no movimento
operário mundial, sobre o qual em certo sentido deixou ele
sua marca individual.
81
materialismo histórico sintetizou Marx a compreensão da
evolução da sociedade com a vontade modificá-la e nos deu o
instrumento para essa modificação. O materialismo histórico
tornou-se deste modo uma filosofia e um instrumento da
classe operária e revolucionária, em sua luta pela libertação e
na sua tentativa de formar um mundo novo.
82