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CAPITULO V HOMOLOGACAO DE SENTENCA ESTRANGEIRA 1. NOGOES GERAIS Cada Estado exerce os atributos inerentes & soberania apenas sobre pessoas, bens c relagbes juridicas que se encontram em seu territ6rio e sobre determinados espacos exteriores a seu ambito territorial, mas que so alcancados por sua jurisdicio. Uma das prerrogativas dos entes estatais ¢ decidir sobre os conflitos de interesses que ocorram dentro do ambito alcangado por suas competéncias. Tal missio ¢ cumprida por érgios como o Poder Judicidrio, cujas decisdes deverdo, portanco, gerar efeitos apenas dentro do territério nacional cou sobre aquelas telacées juridicas que, ainda que tenham lugar no exterior, possam ser objeto da atengio do Estado, por forga, por exemplo, de tratados ou do Direito Internacional Privado. Entretanto, € possivel que uma decisao judicial deva gerar efeitos em outros Estados. Consi- derando, porém, que cada ente estatal tem poderes pata fazer valer os provimentos jurisdicion proferidos por suas autoridades competentes apenas no Ambito alcancado pelos respectivos poderes soberanos, a eficicia de uma decisio judicial em tertitério estrangeiro esté condicionada, funda- mentalmente, ao consentimento do Estado em cujo territério a sentenca deva ser executada, que normalmente é materializado por meio da homologacio. A homologagao da sentenga estrangeira é 0 ato que permite que uma decisio judicial profe- rida em um Estado possa ser executada no territério de outro ente estatal. £, portanto, o instituto que viabiliza a eficicia juridica de um provimento jurisdicional cstrangeiro em outro Estado. E também conhecido como “reconhecimento”, “ratificagdo” ou “execugio” de sentenga estrangeira, Homologar a sentenga estrangeita significa, como afirma Marzuoli, tomé-la “semelhante (em seus efeitos) a uma sentenga aquti proferida”', O autor destaca, ainda, que “por meio da homolo- gacdo, a sentenca estrangeira passa a estar apta a gerar efeitos no pais que a homologou”, ¢ que “a homologacio nao cria eficicia interna para as sentengas estrangeiras, mas faz. com que ela tenha os seus efeitos estendidos ao territério do Estado onde se pretende que ela opera. A isso dé-se o nome de ‘importagao de cficicia’ da sentenca estrangeira para o verritétio nacional de outros Estados” Uma vez homologada, a sentenga poder produzir os mesmos efeitos de uma sentenga nacional. © fundamento da possibilidade de eficdcia de uma sentenca estrangeita em outro Estado é objeto de debate na doutrina. Dentre as teorias existentes, Dell’Olmo aponta a comitas gentium, ou cottesia internacional, a da comunidade de direito, de Savigny, e a dos direitos adquiridos. Entretanto, o mesmo autor acredita que “o ideal de justiga e 0 espirivo de solidariedade ¢ de 1 MAZZUOU, Valério, Direfto Internacional publico: parte geral, p. 112. 725 PARTE I ~ DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO interdependéncia dos povos podem set apresentados como fundamentos para a execugio, cada vex maior, da sentenga de um pais em outro”. Entendemos que, com a possibilidade de homologacéo das sentengas estrangeiras, facilicam-se as relagdes internacionais. Nesse sentido, Prangois Rigaux afirma que “toda circulacao de pessoas ficaria paralisada se os Estados nao reconhecessem mutuamente os atos de estado civil ditados em outro Estado ou se negassem sistematicamente toda eficécia as decisées estrangeiras em matéria de estado de pessoas". Com efeito, caso isso ocorresse, haveria sérios entraves aos fluxes de bens, se de pessoas, que dependeriam de intimeros procedimentos judiciais para que se de- de servi senvolyessem de maneira dinamica e eficiente. E nesse contexto que é pertinente a afirmagao de Mazzuoli quando defende que a homologagio visa a “facilitar 4 parte de uma causa julgada por um tribunal estrangeiro a satisfacéo de seu dircito em territério nacional, dispensando-a de ter de iniciar aqui novo processo a fim de ver reconhecido seu direito”! Enrretanto, a homologagao nao é automatica, dependendo essencialmente do cumprimento de exigéncias estabelecidas pelo ordenamento jutidico do Estado ao qual é solicitada a homolo- gasao. E nesse sentido que Rechsteiner afirma que “conforme o direito costumeiro internacional, nenhum Estado est obrigado a reconhecer no seu territério uma sentenga proferida por juiz ou tribunal estrangeiro”. Com efeito, é possivel que o instituto sequer exista na ordem juridica estatal, embora Del- l’Olmo defenda que “a eficacia extraterritorial da sentenga tende a ser admitida pelas ordens juridicas de praticamente todos 0s paises, com a atenuacio da rejeigdo antes oferecida por muitos Estados”, até mesmo porque, como afirmamos anteriormente, os Estados que nao homologuem sentengas estrangeiras podem impor dificuldades para o bom desenvolvimento de suas relagoes na sociedade internacional. Em suma, podemos afirmar que a maioria dos Estados homologaré sentencas estrangeiras, observados certos requisitos legais, estabelecidos livremente pelos préprios entes estatais, dentro de suas préprias leis ou dos eratados de que facam parte. Aplicam-se, portanto, & possibilidade de homologacio da sentenga estrangeira os critérios que o proprio Estado estabeleceu ou com os quais consentiu, Nao havendo cratados regulando a matéria, celebrados entre o ente estatal de origem da sentenga ¢ 0 Estado onde deva ser homologada, aplica-se somente o Dircito interno deste tiltimo. Entretanto, havendo tratado, ¢ entrando em conflito as disposigoes deste, mais rigidas, ¢ as normas internas, entende a doutrina de Direito Internacional Privado que devam ser aplicadas as normas gue facilitem a homologaca DELL'OLMO, Florishal de Souza. Direito internacional privado, p. 70 (grifos do autor). RIGAUX, Frangol privado, p. 69-70. MAZZUOLI, Valério. Direito internacional pablico: parte geral, p. 111. RECHSTEINER, Beat Walter. Direito internacional privadio: teoria ¢ orética, p. 269. DELL'OLMO, Florisbal de Souza. Direito internacional, p. 70, Derecho internacional privado, p. 237, Apud DELL'OLMO, Florisbal de Souza, Direito internacional 'Nesse sentido, Beat Walter Rechsteiner afirma que “a doutrina postula, com razio, a aplicagtio da legislacdo mais liberal de origem interna’”. RECHSTEINER, Beat Walter. Direito internacionol, p. 272. HOMOLOGAGAO DE SENTENGA ESTRANGEIRA A homologacio de sentencas escrangeiras obedece também a critérios vinculados a métodos (ou sistemas) doutrindrios, a exemplo dos seguintes*: * — Revisio do mérito da sentenca: deve haver novo processo judicial no Estado homologante, como se nio existisse sentenga estrangeira anterior a homologar, e, somente apds o julga- mento do proceso nacional, ¢ dependendo de seu resultado, poder a decisio estrangeira ser homologadas © Revisio parcial de mérito: a homologagao depende da verificagéo da boa ou mé aplicagao da Ici do Estado onde a sentenga estrangeira gerard efeitos; * — Reciprocidade diplomatica: a homologagio é fundamentada em tratados que envolvam © Estado de origem da sentenga ¢ aquele onde a decisio judicial deverd surtir efeitos, sem os quais nao serd possivels * Reciprocidade de fato: a homologagio s6 pode ocorrer quando o Estado de origem da sen- tenga também homologa sentengas estrangeiras; * — Delibagio: nao se entra no mérito da decisio a ser homologada, examinando-se apenas certos pressupostos formais. £ 0 sistema adotado no Brasil A homologacio é uma modalidade de aplicagio do Direito estrangeiro, pelo que uma decisao judicial de outro Estado s6 poder ser homologada se nfo violar as restrigGes referentes 4 aplicagso de notmas estrangeiras?, E nesse sentido que afirmamos que a sentenga homologada poderd estender seus efeitos 20 territério de outro Estado, exceto aqueles nao admitidos pelo ordenamento estatal. A respeito, Rechsteiner afirma que “uma sentenga estrangeira apenas pode tet os efeitos juridicos dentro do territério nacional que lhe concede o pais de origem. Mas esses efeitos juridicos jamais podem ir além daqueles que um pais admire para as senteneas proferidas pelos juizes com base na lex fori. Dessa forma, a sentenca estrangeira, apés o seu reconhecimemt, estard, no maximo, apta a produzir os mesmos efeitos juridicos de uma sentenga nacional”"” Quadro 1. Homologagaa: nogoes gerais + Permite que uma decisio judicial de um Estado possa ser executada em outro Estado > implica a extensdo dos efeitos de uma sentenca ao territdrio de outro ente estatal ~> Nenhum Estado esta obrigado a homologar uma sentenca > Ahomologaglo depende de critérios estabelecidos pelas normas do Estado que homologa (ou seja, pela lex fori) e por tratados > Métodos: revisio do mérito: revisdo parcial de mérito; reciprocidade diplomatica; reciprocidade de fato; delibacdo 8 AMORIM, Edger Carlos de. Direito internacional privado, p. 51. Ver também: DELL'OLMO, Florgbal de Souza. Direito internacional privado, p. 73. 9 Arespeito, Florisbal Souza Dell‘Olmo afirma que “A aplicacSo do direlto estrangeiro pode apresentar-se de duas ‘maneiras: emprego pelo julz do fora, na composigao da lide, de lei de outro pais (eplicaco direta) ¢ execugéo de sentenge proferida pela justiga estrangeira(eplicacSo Indireta)”. DELL'OLMO, Florisbal de Soua, Dieito internacional rivade, p. 69. 10 RECHSTEINER, Beat Walter, Direito internacionol privado, p. 263-270. 727 PARTE I~ DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO 2. AHOMOLOGACAO DA SENTENGA ESTRANGEIRA NO BRASIL © Brasil € um dos Estados que admite a homologagao de sentengas estrangeiras, definindo © Poder Judicidrio como érgio competente para decidir acerca do reconhecimento e da execugio de decisbes judiciais proferidas em outros Estados. No Brasil, 2 homologacéo dependerd, portanto, da apreciagéo judicial, ¢ 0 regramento a respeito encontra-se dividido pelos seguintes diplomas legais: Constituicao Federal, artigos 105, I, “i, € 109, Xj Lei de Introdugao as Normas do Direito Brasileiro (LINDB), artigos 15 a 175 Codigo de Processo Civil (CPC), artigos 483 ¢ 4845 Lei 9.307, de 23/09/1996, artigos 34 a 40; ca Resolugio n° 9, do ST], que regula temporariamente a apreciagio da matéria no ambito da- quela Corte até que sejam aprovadas disposig6es regimentais préprias. A homologacao tmbém é regulada por tratados, que setao objeto de breve exame dentro deste capitulo (item 2.5). 2.1 Competéncia O brgio competente para homologar a sentenga estrangeira ¢ © Superior ‘Tribunal de Justi¢a (ST]), nos termas do artigo 105, I, “i”, da Constituicao Federal, dispositivo incluido pela Emenda Constitucional 45, de 2004. ATENCAO: até 2004, a competéncia origindria para a homologaco de sentencas estrangelras no Brasil pertencia ao Supremo Tribunal Federal (STF), a teor da redaco anterior do artigo 102, 1, "h”, da CF/88. Entretanto, a EC/45 atribuiu esse poder ao STJ, pelo que todas as normas infr constitucionais que ainda mencionam o STF como competente para decidir acerca da homolo- aco devem ser interpretadas como aludindo ao ST!, em vista da superioridade hierérquica da Carta Magna. A exccugao de sentenga estrangcira homologada pelo ST] é competéncia dos juizes federais de primeira instincia (CF/88, art, 109, X) ¢ far-se-4 “por carta de sentenga extraida dos autos da homologacio ¢ obedecerd as regras estabelecidas para a cxecugio da sentenga nacional da mesma natureza” (CPC, art. 484). ATENCAO: a competéncia do ST) ndo impede que 0 STF continue a conhecer de processos sobre i t 1 homologaco que envolvam matéria constitucional e que sejam levados a sua apreciacéo em 1 | Brau de recurso, como veremos posteriormente.. 2.2 Condigées para a homologacio de uma sentenga estrangeira no Brasil A primeira condigao para a execugio de uma sentenga estrangeira no Brasil é portanto, sua homologacio pelo Superior Tribunal de Justica (ST)). Todas as decisoes judiciais estrangeiras dependem de homologacao para gerar efeitos no Brasil, inclusive aquelas de natureza cautelar ¢ aquelas meramente declaratdrias do estado das pessoas. Entretanto, as decis6es interlocurdrias ¢ os despachos de mero expediente nao sio homologiveis, por nao terem natureza de sentenga, sim de meros atos processuais, que devem ser cumpridos no Brasil por meio de carta rogatéria ou por outros meios de cooperagao judicial. 728 HOMOLOGAGAO DE SENTENGA ESTRANGEIRA Cabe ressaltar que o fato de haver acordo de cooperacao juridica entre o Brasil ¢ o Estado estrangeiro onde foi proferida a sentenga no afeta a necessidade de homologag4o, mormente quando existe ato de constticgéo patrimonial!', Na homologa¢o, o Brasil adota 0 método da delibacao. Com isso, caber4 ao ST] simples- mente verificar se a sentenca estrangeira se coaduna com os prinefpios bésicos do ordenamento brasileiro, nao se detendo no exame de scu mérito, salvo para demonstragao de eventual afronta 4 ordem publica, & soberania nacional e aos bons costumes’. A propésito, a dogo do método da delibagéo ¢ confirmada pela jurisprudéncia desde a época em que a homologacio ainda era competéncia do STE”. ATENCAO: apesar de o STF nao mais tratar do tema, a jurisprudéncia do Pretérlo Excelso sobre homologacao ainda é habil para orientar o tratamento da matérla. (O julgamento do caso SEC 651-FR tevela exatamente como o ST] aplica 0 método da deli- bagéo na homologacao de sentencas estrangeiras: “O Ministério da Justiga da Republica Francesa formulou pedido de homologacao de deciséo proferida pelo Tribunal de Grande Instancia de Bor deaux, em 25/9/2003, no processo de divércio que concede provisoriamente a guarda das criangas ao pai e o diteito de visitas 4 mie, com a proibigio de safda das menores do territdrio francés. O requerente alega que as ctiangas encontram-se retidas no Brasil pela mae desde 7/12/2003 e requer a aplicagéo da convengio franco-brasileira de cooperacao judiciaria em matéria civil, de 8/3/1996, para reconhecer e executar a decisio que fixa a residéncia das menores no domicilio do pai. Inicialmente, 0 Min, Relator entendeu que a alegagio da requerida na contestagéo de que 0 pai nao é pessoa de boa indole ¢ pode trazer riscos 4 integridade das criangas nao pode ser acolhida, porquanto a questéo confunde-se com 0 proprio mérito da sentenca, 0 qual, conforme a jurisprudéncia do STF e deste Superior Tribunal, nao pode ser apreciado, jf que 0 ato homolo- gatério da sentenga estrangcira restringe-se & andlise dos seus requisitos formais. Sobre a questio, 10 estrangeira também menciona o cardter da © pronunciamento ministerial ressalta que a decis mi, nfo obstante o mérito da sentenga néo poder ser objeto da andlise deste STJ"". O emprego do método da delibacao foi ainda melhor delineado pelo STJ no julgamento da SEC 3.932/GB, ocasiéo em que “A Corte Especial reiterou que, nas homologagées de sentenca estrangeira, compete ao ST] verificar 0 preenchimento dos requisitos formais desctitos nos arts. 5° © 6° da Res. n° 9/2005-STJ, ¢ ndo 0 mérito da causa, ressalvado o exame dos aspectos atinentes a ordem publica, soberania nacional, contraditério, ampla defesa e devido processo legal”"’. O ST] 11 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Informativo 644, Brasilia, DF, 10 a 14 de outubro de 2011, Processo: HC 105.905/ MS, Relator: Min, Marco Aurélio. 12 SUPERIOR TRIBUNAL DEJUSTIGA. Corte Especial. SEC 2.052/0E, Relator: Min. Castro Meira. Brasilia, DF, 19.dez.07. Di de 21.02.08, p. 30. 13. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tribunal Pleno. Rcl-AgR/1908. Relator: Min, Celso de Mello. Braslia, DF, 242ut.01. Di de 03.12.04, p. 00013. 14 SUPERIOR TRISUNAL DE JUSTICA. Informativo 407. Brasflia, DF, 14.a 18 de seterbro de 2009, Processo: SEC 651-FR Relator: Min, Fernando Goncalves. 15 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informativo 468. Brasflia, DF, 28 de marco @ 8 de abril de 2011, Processo: SEC 3.932-6B, Rel. Min, Fel Fischer, julgada em 6/4/2011 729 PARTE |i ~ DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO reiterou ainda, nessa ementa, que é “Incabivel a andlise do mérito da sentenga que se pretende homologar, uma vez que o ato homologatério est adstrito ao exame dos seus requisitos formais”™. Por adotar 0 método da delibagao, 0 Dircito brasileiro ndo elenca, dentre os requisitos legais para a homologacao, exigencias como um pedido do Estado estrangeiro ou a reciprocidade em telacio ao reconhecimento de sentengas brasileiras no exterior. © artigo 15 da LINDB apresenta alguns dos requisitos para a homologacao da sentenga cestrangeira, que sio os seguintes: haver sido proferida por juiz. competente; terem sido os partes citadas on haver-se legalmente verificado a revelia; ter passado em julgado ¢ estar revestida das formalidades necessdrias para a execucéo no lugar em que foi proferidas estar traduzida por intér- prete autorizado; ¢ ter sido homologada pelo ST]. ATENCAO: a LINDB menciona o STF como 6rgéo competente para a homologacdo. Reiteramos, porém, que todos os textas infraconstitucionais sobre o Instituto que se refiram ao STF devem los como aludindo ao STI. As exigéncias apontadas pela LINDB sio reiteradas pelos artigos 5 ¢ 6 da Resolugéo n° 9 do STJ, os quais acrescentam que a sentenca estrangeira deve também estar autenticada pela autoridade consular brasileira e acompanhada de tradugao por tradutor oficial ou juramentado no Brasil”, ATENCAO: dessa forma, a nocio de “intérprete autorizado” da LINDB deve ser Interpretada como referindo-se a “tradutor oficial ou juramentando no Brasil”. Entretanto, 0 ST] decidiu que “As exigencias de que a sentenca estrangeira esteja autenticada pelo consul brasileiro e de que tenha sido traduzida por tradutor juramentado no Brasil cedem quando o pedido de homologasao tiver sido encaminhado pela via diplomatica ‘Ainda de acordo com o SJ, “Presume-se a legitimidade, veracidade e legalidade do ato admi nistrativo consular de chancela, a menos que seja infirmada, com base em elementos probatorios robustos que possam gerar diwvida plausivel acerea da competéncia da autoridade signatdria””. ‘A falta da assinacura da autoridade competente na decisio homologanda néo necessariamente é ébice para a homologacdo, desde que a autenticidade da decisio esteja comprovada por outros meios permitidos em Direito”. 16 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial. SEC 3.932/GB. Relator: Min. Félix Fischer; Brasilia, DF, 06.ab¢.11, Die de 11.04.11. Ainda a respeito do cardter delibatério do proceso de hamologaclo: STI — SEC 4.788/EX. 17 Sobre-a legalizagSo consular, ver: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA, Corte Especial, SEC S87/CH. Relator: Min. Teori Albino Zavascki, Brasilia, DF, 11.fev.08, Die de 03.02.08. 38 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA, Corte Especial, SEC 2.108/FR, Relator: Min. Ari Pargendler; Brasilia, DF, 20.mai.09. Die de 25.08.09. 19 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial Die de 19.nov.12, 20 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA, Corte Especial, SEC 563/DE. Relator: Min, Teori Albino Zavascki. Brasilia, DF, 15.ag0.07. Dl de 03.09.07, p. 110. EC 4.788/EX. Relator: Min. Castro Meira. Brasilia, DF, 07:nov.12, 730 HOMOLOGACAO DE SENTENGA ESTRANGEIRA Para a homologagao de sentenga proferida em processo que tramitou, no exterior contra pessoa domiciliada no Brasil, é indispensavel que a citagao tenha sido regular de acordo com a lei do Estado onde foi proferida a sentenga objeto de pedido de homologacio. A respcito, julgados recentes do STJ tém destacado que “Nao € possivel impor as regras pre- vistas na legislagao brasileira para citagao praticada fora do pais. A citacao é instituto de direito processual ¢, por estar inserida no ambito da jurisdigéo e da soberania, deve ser realizada de acordo com a legislagao de cada pais”, acrescentando que “A alegada auséncia de comprovasao de citagao valida nos autos principais deve ser examinada cue grano salis”™. © ST] também destaca que 0 comparecimento & audiéncia realizada pelo jufzo estrangeiro supre a falta de citagio, Nao impede, porém, a homologagio o fato de o réu ter sido citado por edital, quando 0 réu se encontrar em lugar ignorado, incerto ou inacessivel, a teor do artigo 231, II, do CPC”, Entretanto, quando a citacio foi feita por edital, e quando “provado nos autos que a outra parte estava ciente do endereco do brasileiro ¢ nao processou o feito por meio de carta rogatéria”, nao pode haver a homologacio™. Entretanto, quando a sentenca estrangeira objeto de pedido de homologagio disser respeito a pessoa que tenha domicilio em cerritério brasileiro, deve-se observar que “A citagao de pessoa domiciliada no Brasil para responder a processo judicial no exterior deve realizar-se necessariamente por meio de carta rogatéria, sendo inadmissivel a sua realizagao por outras modalidadcs”. A nao observancia dessa exigéncia impede a homologa¢io, no Brasil, de uma sencenga estrangeira que correu contra individuo domiciliado em territério brasileiro”. Ainda no tocante & essencialidade da citacio regular para a homologagéo de sentenga estran- geira no Brasil, o ST] entende que “Nao pode scr homologada sentenca estrangeira que dectete divércio de brasileira que, apesar de residir no Brasil em local conhecido, tenha sido citada na aco que tramitou no exterior apenas mediante publicacao de edital em jornal estrangeiro, sem que tenha havido a expedigio de carta rogatéria para chamé-la a integtar o processo”™*. 21 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informativo 508. Brasilia, 5 a 14 de novembro de 2012. Processo: SEC 5.268-GE, Relator: Min. Castro Meira. Julgada em 7/11/2012, Preceentes: SEC 3.341-£X, DJe 29/6/2012, e SEC 4,730-EX, De 28/6/2012. 22 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA, Corte Especial. SEC 2.259/CA, Relator: Min, José Delgado. Brasilia, DF; 04,jun.08. Die de 20.06.08. 23 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informative 497, Brasilia, DF, 7 a 18 de malo de 2012. Proceso: SEC 5,709/US, Relator: Min. Amaldo Esteves Lima. Julgada em 16/5/2012. Precedentes citados: SEC 5.613-EX; AgRg na SE 1.950- DE e SE 2.848-G8, No texto disponivel no Informativo em apreco, restou também ragistrado que homologar uma sentenga de processo em que houve cita¢ao por edital tampouco configura ofensa a soberania e & ordem publica, 24 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial. SEC 1.970/EX. Relator: Min. Humberto Martins. Brasfia, DF, 19,501.12. Dle de 049ut.12. 25 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial. SEC 1.970/EX. Relator: Min. Humberto Martins. Brasilia, DF, 19.set.12, De de 042ut.12. Na ementa, hd varios precedentes quanto 30 assunto, 26 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informative 543. Brasilia, DF; 13 de agosto de 2014. Processo: SEC 10.154-EX. Relator: Min. Laurita Vaz. Julgado em 01/07/2014. 731 PARTE Il ~ DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO Nao é exigivel a prova da citagdo dos réus no proceso original quanda a homologago é requerida por eles mesmos”. Quanto 20 processo homologatério que corre no Brasil, 6 permitida a citagio por edical quando 0 requerido se encontrar em local ignorado, incerto ou inacessivel*. ‘A Stimula 420 do STF enfatiza que “Nao se homologa sentenga profetida no estrangeito sem prova do transito em julgado”. Entretanto, hé decisées no STJ que dispensam esse requisite, Eo caso do julgamento da SEC 651-ER, relativa 3 homologagio de sentenca que decidiu a guarda de menores proferida por tribunal francés, em que se aplica o artigo 18 da Convengdo franco-brasileira de cooperagio judicidtia em matéria civil, de 8/3/1996, que dispensa 0 transito em julgado de decisio sobre questao de guarda de menores para que seja reconhecida no territério brasileiro, desde que cenha forca executéria”. ‘Também é dispensado o trinsito em julgado de decisio judicial estrangeira no caso de sentenga escrangeira de divércio, na hipétese em que, preenchidos os demais requisitos para a homologacio, tenha sido comprovado que a parte requerida foi a autora da ado de divércio ¢ que o provimento judicial a ser homologado teve carter consensual” O artigo 17 da LINDB determina que no poderio ser homologadas as sentencas que “ofen- derem a soberania nacional, a ordem piblica e os bons costumes”, condigao que se aplica, aliés, a qualquer hipétese de aplicagio do Direito estrangeiro no Brasil. ‘A norma € secundada pela Resolugéo N° 9 do ST] (art. 6), que elimina, porém, a referéncia aos “bons costumes”, o que néo significa a derrogagao da regra da LINDB, inclusive porque a nocio de “bons costumes” pode se inserit na de “ordem pidblica’. Nesse sentido, no serio passiveis de homologacao sentengas relativas a iméveis situados no Brasil, por forga do artigo 89, I, do CPC, que determina que “Compete a autoridade judiciaria brasileira, com exclusio de qualquer outra: Brasil”. Tampouco se homologam sentengas telativas a inventério e partilha de bens, situados no Brasil, ainda que o autor da heranca seja estrangeiro e tenha residido fora do territério nacional, por conta da competéncia absoluta do Judiciario brasileiro para tal (CPC, art. 89, II). = conhecer de agies relativas a iméveis situados no ATENCAO: no se homologam, portanto, sentencas estrangeiras relativas a matérias que repou- sam na competéncia exclusiva da autoridade judiciaria brasileira. 27 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informative 468, Brasilia, DF, 28 de marco a 8 de abril de 2013. Proceso: SEC 3,932/GB, Rel. Min. Fellx Fischer. Outrossim, a ementa do referido julgado acrescenta que “Ademais, amaas as partes se manifestaram no processo, por meio de advogado, e foram ouvidas em juizo”. 28 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informative 450. Brasilia, DF, 4 a8 de outubro de 2010. Processo: SEC 1.325/PY. Relatora: Min. Nancy, 28 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informative 407. Brasilia, DF, 14 a 18 de setembro de 2009. Processo: SEC 651/ FR, Relator: Min. Fernando Goncalves. 30 SUPERIOR TRIBUNAL DEJUSTICA. informativo 521. Brasilia, DF, 26 de junho de 2013. Processo: SEC 7.746-US. Relator: Min, Humberto Martins, Julgado em 15/5/2043, Precedentes citados: SEC 3.535-IT, Corte Especial, Dle 16/2/2011; e SEC 6.5124, Corte Especial, Die 25/3/2013. 732 HOMOLOGAGAO DE SENTENGA ESTRANGEIRA Entretanto, a jurisprudéncia permite a homologacio quando a decisio disponha acerca de bem a respeito do qual renha havido acordo entre as partes e que somente ratifica 0 que restou pactuado”!. Nesse mesmo sentido, o fato de o imével estar no Brasil nao impede a homologac4o da sentenga estrangeira de partilha de bens no divércio quando houver acordo entre as partes quanto ao referido imével®, Em nenhum dos dois casos configure-se, portanto, ofensa a soberania nacional e & ordem publica. Fere frontalmente a ordem publica a homologacéo de sentenca desprovida de qualquer fundamentagao®. De acordo com o STJ, nao é possivel a homologagio de sentenga estrangeira “na parte em que ordene, sob pena de responsabilizacao civil e criminal, a desisténcia de ago judicial proposta no Brasil”, visto que “essa determinagao claramente encontra obstaculo no principio do acesso a Justiga (CF, art. 5°, XXXV), que é clausula pétrea da Constituigao brasileira”. Nio é possivel tampouco homologar a sentenga estrangeira, ainda que esta preencha adequa- damente os requisitos indispensaveis 4 sua homologagao, “na parte em que verse sobre guarda ou alimentos quando jé exista decisio do Judiciério Brasileiro acerca do mesmo assunto, mesmo que esta decisio tenha sido proferida cm carter provisério e apds o trnsito em julgado daquela”™*. De acordo com o STJ, a homalogagao nesse caso configura ofensa a soberania da jurisdicao nacional. Em sintese, entendemos que hé ofensa & ordem publica, impeditiva da homologacao de sentengas estrangeiras, quando estas firam dispositivos constitucionais, contemplem matéria que repousa na competéncia exclusiva da autoridade judicidcia brasileira ou se choquem com premissas bésicas de qualquer ramo do Dircito interno brasileiro, sem prejuizo de outras possibilidades que possam ser reconhecidas pela jurisprudéncia patria. Por outro lado, nao fere a soberania nacional e a ordem piiblica a homologagio de sentenca judicial estrangeira que, “considerando valida cléusula compromissdria constante de contrato firmado sob a expressa regéncia da lei estrangeira, determine ~ em face do anterior pedido de arbitragem realizado por uma das partes ~ a submissio a justica arbitral de conflito existence entre ‘0s contratantes, ainda que decisao proferida por juizo estatal brasileiro tenha, em momento pos- terior ao transito em julgado da sentenga a ser homologada, reconhecido a nulidade da clausula com fundamento em exiggncias formais tipicas da legislagio brasileira pertinentes ao contrato de adesao”*, 31 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial. SEC 1.304/US. Relator: Min. Gilson Dipp. Brasilia, DF, 19.dez.07, Die de 03.03.08, 32 _ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial. SEC 878/PT. Relator: Min. Carlos Alberto Menezes Direito. Brasfla, Df, 18.mai.05. Di de 27.06.05, p, 203. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial, SEC 2.222/US. Relator: Min, José Delgado, Brasilia, DF, 05.deu,07. DJ de 11.02.08, p. 52, 33 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial. SEC 684/US. Relator: Min. Castro Meira, Brasilia, DF, O1.jul.10. Di de 16.ago.10. 34 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informative 533. Brasilia, DF, 12 de fevereiro de 2014. Processo: SEC 854/US. Relator origindrio: Min. Massami Uyeda, Relator para acérd3o: Min. Sidnei Benet. Julgado em 16/10/2013. 35 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. informativo 548. Brasilia, DF, 22 de outubro de 2014. Processo: SEC 6.485-EX. Relator: Min. Gilson Dip. Julgado em 03/09/2014. 35 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informative $33, Brasilia, DF, 12 de fevereira de 2024. Processo: SEC 854-US, Relator origindrio: Min. Massami Uyeda. Relator para acérdda: Min. Sidnei Senet, Julgedo em 16/10/2013. 733 PARTE I! ~ DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO O parigrafo Ginico do artigo 15 da antiga LICC (atual LINDB) previa, em sua redagao ori- ginal, que nao dependiam de homologagao as sentengas meramente declaratérias do estado das pessoas. Entrecanto, a Lei 12,036, de 01/10/2009, revogou esse dispositivo, com 0 que restou consolidada a regra segundo a qual também dependem de homologagio as sentencas meramente declaratérias do estado das pessoas. O STF decidiu que “Nao é homologével, « titulo de sentenga estrangeira, a formalizagao em consulado estrangeiro, no Brasil, de divércio consensual de cdnjuges esttangeiros, domiciliados no pais”, visto que a competéncia para decretar 0 divércio de estrangeiros domiciliados no Brasil é das autoridades brasileiras. Ainda no tocante ao divércio, a Simula 381 do STF determina que “nao se homologa sentenga de divércio obtida, por procuracio, em pais de que os cdnjuges nao eram nacionais”. Acé 0 ano de 2009, a LINDB dispunha, em seu artigo 7°, § 6°, que “O divércio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os conjuges forem brasileiros, sé ser reconhecido no Brasil depois de trés anos da data da sentenga, salvo se houver sido antecedida de separacio judicial por igual prazo, caso em que a homologacao produziré efeito imediato, obedecidas as condigbes estabelecidas para cficicia das sentencas estrangeiras no Pais”. Agquela época, defendfamos que o dispositive em tela havia sido detrogado pela antiga re- dacio do artigo 226, § 6°, da Carta Magna, entendendo, com fulero na propria jurisprudéncia do ST], que 0 divércio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cOnjuges fossem brasileiros, produziria efeitos a0 Brasil apés um ano da sentenga, ou mais de dois anos de separagio de faro, © que estaria condicionado, abviamente, & homologagao prévia™. O entendimento em apreco foi finalmente incorporado ao arcabouco legislative patrio pela Lei 12.036, de 01/10/2009, que altcrou o § 6° do artigo 7° da atual LINDB, o qual passou a ter a seguinte redagéo: “O divércio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os conjuges forem brasileiros, s6 ser reconhecido no Brasil depois de 1 (um) ano da data da sentenga, salvo se hou- ver sido antecedida de separacio judicial por igual prazo, caso em que a homologagio produziré efeito imediato, obedecidas as condigées estabelecidas para a eficacia das sentengas estrangeiras no pais. © Superior Tribunal de Justica, na forma de seu regimento interno, poder reexaminar, a requerimento do interessado, decisbes j4 proferidas em pedidos de homologacao de scntengas cio de brasileiros, a fim de que passem a produzir todos os efeitos legais”. estrangeiras de dives Cabe destacar que a prépria Lei 12.036 foi expressa em salientar que seu objetivo cra adequar a entio Lei de Introdugéo 20 Cédigo Civil (LICC) *& Constituigao Federal em vigor”. nesse sentido, alids, que entendemos que o novo dispositive da atual LINDB deve ser interpretado a luz da EC 66, de 13/07/2010, que alterou o § 6° do artigo 226 da Carta Magna, fixando que “O casamento civil pode ser dissolvide pelo divorcio”, que suprimiu o requisito de 37 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tribunal Pleno. SE-AgR/3.846. Relator: Min. Rafael Mayer. Brasilia, OF, 18.mai.88, Di de 10.06.88, p. 14401. 38 Nesse sentido: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial. SEC 2.258/CA, Relator: Min. José Delgado. Bra- silla, DF, 04,jun.08, Die de 30.08.08. Lembramos que o § 62 do artigo 226 da CF/88 foi modificado pela EC 66, de 13/07/2010. Antes, o casamento podia dissolver-se pelo div6rcio, obtide apés prévia separacao judicial por mais de 4 (um) ano ou comprovada separagio de fato por mais de 2 (dois) anos, Atualmente, o prazo pare a obtencio do divércio foi suprimido. 734 HOMOLOGAGAO DE SENTENGA ESTRANGEIRA prévia separacio judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separacio de fato por mais de 2 (dois) anos para o fim do casamento. Com isso, acreditamos que o divércio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os conjuges forem brasileiros, poderd ser reconhecido no Brasil independentemente de prazo de separacio judicial prévio”, dependendo, obviamente, da homologagao do provimento jurisdicional estran- geiro que declarou o divércio. Quando a homologagao implicar a aplicacio de norma estrangeira, 0 artigo 16 da LINDB determina que “ter-se-4 em vista a disposigao desta, sem considerar-se qualquer remiss por ela feita a outra lei”. E, portanto, proibido o reenvio também no ambito da homologacio das decis6es judiciais estrangeiras. Para fins de homologaco de provimentos jurisdicionais estrangeiros, as nog6es de “senteng: e de “tribunal” devem ser entendidas de maneira ampla, nos termos da Resolugio 9 do ST], que dispde que “Serao homologados os provimentos nao-judiciais que, pela lei brasileira, teriam na- cureza de sentenga” (art, 4°, § 19). Aqui incluimos atos administrativos equivalentes a sentencas cstrangeiras, cipicas de paises onde determinados pedidos que s6 podem ser arendidos pela via administrativa®’, Portanto, além da sentenga judicial, também esto sujeitos & homologacao atos que tenham as mesmas caracteristicas e efeitos de uma decisio judicial, ainda que nao sejam tecnicamente sentencas, que no tenham a mesma nomenclatura ou que néo tenham sido proferidos por juizes Exemplo disso so 0s divércios decretados por autoridades administrativas em pafses como 0 Ja- pio, onde prefeituras proferem decisées relativas ao fim do casamento, configurando no exterior meros atos administrativos, mas que no Brasil podem ser homologados como se decisoes juiciais fossem*'. O termo “cribunal” também deve ser interpretado de maneira abrangente, de forma a incluir drgios do Poder Judicidtio de qualquer instincia, bem como entidades ¢ agentes estatais ¢ privados que, apesar de nao integrarem instincias judiciais, atuam como se assim 0 fosse. Exemplo disso s4o as prefeituras dinamarquesas e japonesas competentes para assuntos de Direito de Familia Esse entendimento do ST] certamente tem fulcro no respeito & soberania dos Estados estran- geitos, que tém o diteito a estabelecer as respectivas leis e Srgaos estatais, e na boa fé que também deve governar o desenvolvimento das relacoes internacionais®. 39 Emtodo caso, salientamos que esse é um entendimento nosso, que no se fundamenta em nenhur julgado even- tualmente jé proferido sobre o caso, e cujo acerto somente poderd ser confiermado com futuro pronunciamento dos ‘tribunais nacionais a respeito de casos que envolvam a homologa¢do, no Brasil, de divércios obtidos no exterior dentro da ordem constitucional brasileira, apés as modificacdes trazides pela EC 66. 40 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA, Corte Especial. SE 7312/EX. Relator: Min, Humberto Martins Brasilia, DF, 05.set.22, Die de 18 set.12. 41 A respeito: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial. SEC 4.403/EX. Relator: Min, Ammaldo Esteves Lima Brasilia, OF, 01.agosto.11. DJ de 14.20.11. Ver também: STI - Informative 480. Brasilia, DF, 1° 2 12 de agosto de 2011. Ver, por fim, o interessante caso de homologac30 de uma deciséo de adocdo proferida pelo Conselho Distrital ra Suiga no julgamento da SEC 3.335/EX (ST). 42 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIGA, Corte Especial, SEC 3.335/EX, Relator: Maria Thereza de Assis Moura. Brasfla, DE, 24.0g0.11, Die de 16.mar.12. 735 PARTE Il ~ DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO Os laudos arbitrais estrangeiros também se incluem entre as decisbes que deverdo ser homo- logadas para produzir efeitos no Brasil, nos termos dos artigos 34 2 40 da Lei 9.307/96*. Cabe destacar, entretanto, que, embora se revistam das mesmas caracteristicas das sentengas judiciais para fins de execugao, os titulos executivos extrajudiciais prescindem de homologagio para serem executados no Brasil‘, ‘A sentenga estrangeira pode ser homologada apenas parcialmente, nos termos da Resolugio ne 9 do STJ (are. 4°, § 2°). A propésito, a propria jurisprudéncia anterior & EC/45 jé abria essa possibilidade, que nao era prevista no Regimento do STE®. Podem coexistir proceso de homologacio de sentenga estrangeira no STJ e lide na Justica brasileira idéntica, semelhante ott conexa ao processo que gerou a decisto objero de pleito ho- mologatério, de acordo com o artigo 90 do CPC, que determina que “A agao intentada perante tribunal estrangeito nao induz litispendéncia, nem obsta a que a autoridade judicidria brasileira conheca da mesma causa e das que lhe sio conexas”. A respeito, a propria jurisprudéncia do ST] enfatiza que “A pendéncia de julgamento, no Brasil, de apclagao contra sentenga proferida em ago que discute alimento e guarda dos filhos dos ex-cOnjuges ndo impede a homologagio da sentenca estrangeira que teve 0 mesmo objeto, na medida em que, conforme dispdc o art. 90 do Cédigo de Processo Civil”, destacando ainda que “o trimice de processo semelhante na Justiga brasileira nfo inviabiliza a homologagéo da sentenga estrangeira”””, Entretanto, Dell’Olmo afirma que “tio logo ocorra homologacio de decisio forasteira, a lide na Justica nacional deverd ser extinta, porque passa a haver coisa julgada. A homologacio pelo Superior Tribunal de Justica teré tornado executével a decisio sobre a lide, niio mais havendo, perante nossa ordem juridica, 0 que ser submetido a julgamento™, ‘Ademais, a concomitancia de ayo em foro nacional e de feito de homologacao de sentenga estrangeira s6 é possivel quando 0 feito é de comperéncia concorrente da Justi¢a brasileira. Nao ha, no caso, ofensa 4 soberania nacional. O fato de “ter sido proposta acao na Justica brasileira apés 0 transito em julgado das decisoes estrangeiras nao impede o deferimento da homologacio pleiteada””. 43 As condigdes especificas para a homologacdo de sentencas arbitrais proferidas em outros paises sero examinadas mais detidamente no capitulo desta obra que referente a arbitragem no Direito internacional Privado (Parte Il — Capitulo vi). 44 Nesse sentido: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Tribunal Pleno. Rcl-AgR/1.908. Relator: Min. Celso de Mello. Brastlia, DF, 248ut.01. DJ de 03.12.04, p. 00013. 45 Nesse sentido: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tribunal Pleno, SEC/5.041. Relator: Min. Néri da Silveira. Brasflia, DF, 28,jun.96. DJ de 11.04.03, p, 00028. Na doutrina, ver DELL'OLMO, Florisbal de Soua. Direito internacional privado, p.76. 45 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Corte Especial, SEC 3.668/US. Relator: Min. Laurite Vaz. Brasilia, DF, 15.dez.10. Die de 16.02.11. 47 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Carte Especial. SEC 6.069/EK. Relator: Min. César Asfor Rocha. Brasilia, DF, 24.nov.l2. Die de 16.12.11. 48 DELL'OLMO, Florisbal de Souza. Direito internacional privado, p. 76-77. 49. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informativo 468. Brasilia, DF, 28 de marco a 8 de abril de 2011, p. 1. Proceso: SEC 3,932/GB, Relator: Min. Felix Fischer. 736 HOMOLOGAGAO DE SENTENCA ESTRANGEIRA Nio ¢ ébice para a homologagéo “o eventual inadimplemenco de obrigagbes dela decorrentes, a teor do art, 9° da Resolugio/ST] n° 09, de 4 de maio de 2005. Uma vez homologada, a sentenga estrangeira é considerada titulo executivo judicial, nos termos do artigo 475-N, VI, do CPC. 2.3 Processo As condigées da aco de homologacio, como matéria de natureza processual, obedecem & lex fori, ou seja, 3 norma brasileira”. A competéncia para homologar sentengas estrangeiras dentro do ST] é do préprio Presidente daquele Tribunal. O artigo 3° da Resolugao n° 9 do STJ determina que a homologagao seré requerida pela parte interessada, devendo a exordial obedecer &s determinacées da lei processual sobre petigées iniciais, delineadas nos artigos 282 € 283 do CPC, e ser instrufda com a certidao ou edpia auténtica do texto integral da sentenea e com outros documentos indispenséveis, devidamente traduzidos para verndculo por tradutor juramentado e autenticados pelas autoridades consulares brasileiras no caterior, Admite-se tutela de urgéncia nos procedimentos de homologagao de sentengas estrangeiras (Resolugéo n° 9 do STJ, artigo 4°, § 3°). A parte interessada tem quinze dias para contestar 0 pedido de homologagéo, podendo a defesa, porém, versar apenas sobre a autenticidade dos documentos, a inteligéncia da decisio ¢a observancia dos requisitos estatuidos pela Resolucéo n° 9 do STJ, consagrando, pois, o mécodo da delibacao e a proibigao do exame do mérito da causa, Caso haja contestacao, 0 processo ser julgado pela Corte Especial, cabendo 2o Relator os demais atos relativos ao andamento ¢ & ins- crucéo do proceso. O Ministério Pablico vend vista dos autos pelo prazo de dex dias, podendo impugnar a homologacao. Quando o requerido for citado por rogatéria, mas nfo apresentar contestagao, poder scr nomeado curador especial para velar por seus interesses. Entretanto, é majoritéria a tese de que 0 curador especial nao faz jus a honordrios advocaticios™. Das decisbes do Presidente sobre a homologagao cabe agravo regimental. Em todo caso, 0 indeferimento do pedido néo impede que a parte interessada 0 renove, atendendo aos requisitos legais cabiveis para a homologario”. O STF admite recurso extraordinério contra homologaséo de sentencas estrangeitas quando existe interpretagio de preceito constitucional em debate e & luz da permisséo do artigo 102, III, 50 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA, Corte Especial. SEC 3.668/US. Relator: Min. Laurita Vaz. Brasilia, DF, 15.dez.10. Die de 16.02.11. 51 SUPERIOR TRIBUNAL DEJUSTICA. Carte Especial, SEC 596/US, Relator: Min. Ari Pargendler. Brasilia, DF, 29.mai.08, Die de 21.08.08. 52 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTICA. Informativo 330. Brasilia, DF, 03 2 07 de setembro de 2007. Processo: SEC 485/ EX, Relator: Min. Felix Fischer. 53 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Tribunel Pleno. SE 4.269/DF- Relator: Min. Octévio Galott Brasilia, DF, 16.2g0.91. Di de 13.09.91, p. 12489, 737 PARTE Il ~ DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO da Constituigao Federal, que autoriza a interposigao de recurso extraordinario contra decisées tomadas em tiltima ou iinica instincia, quando a decisio recorrida envolver matéria constitucio- nal®, O entendimento em aprego foi retomado no julgamento do RE 598770/Republica Italiana, em que o Pretério Excelso “Salientou a possibilidade de controle das decisoes homologatdrias de sentencas estrangeiras proferidas pelo ST]”, mas registrou, no entanto, “a necessidade de rigor no exame da alegacio de afronta a Constituigéo nessas hipéteses (CF, art, 102, II, a), sob pena de criagéo de nova instincia revisional”®, 2.4 A homologacdo de sentencas penais para efeitos civis © Codigo de Processo Penal regula, entre os artigos 787 e 790, 0 instiruro da homologagio da sentenca penal. © Dircito brasileiro nao acolhe a possibilidade de homologacio das sentencas penais para fins ligados a esse ramo do Dircito. Nesse sentido, Mazzuoli afirma que “Em regra, s6 se homologam sentengas civels, ndo se podendo homologar no Brasi! uma sentenga penal para fins propriamente penais"™*, Na jurispru- déncia, o proprio STF reafirma que nao é vidvel a homologacao de sentenga penal estrangeira para feito de execugio da pena privativa de liberdade ou de outra sangio tipica do Direito Penal”. Em todo caso, salientamos que é possivel que uma sentenga penal seja homologada para surtir efeitos civis. E 0 que determina expressamente o artigo 790 do CPR, que dispée que “O interessado na execugao de sentenga penal estrangeira, para a reparacio do dano, restituigio ¢ outros efeitos civis, podera requerer ao Supremo Tribunal Federal a sua homologacéo, observando-se o que a respeivo prescreve 0 Cédigo de Processo Civil”. No campo da cooperagao juridica internacional no ambito penal, especula-se acerca da ne- cessidade de homologacéo de decisio judicial criminal estrangeira que tenha condenado individuo que, preso, pede transferéncia para o Brasil, para aqui vir a cumprir o restante de sua pena”. A respeito, o Superior Tribunal de Justiga (STJ) vem se manifescando no sentido de que “ha- vendo procedimento especific, previsto em tratado ou convengio internacional, para a transferéncia de condenados no estrangeito para o Brasil, °o proceso de homologacao torna-se dispensivel”, deixando evidente com isso que nao € necessdria a homologacio, pelo ST], da sentenga estrangeira 54 Ver, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ministro admite RE de filho de exjogador contra homologacao de sentenca pelo ST Dispanivel em: . Acesso em: 01/02/2015 55 Ver’ SUPREMO TRISUNAL FEDERAL. Informatvo 735. Brasilia, DF, 10 a 14 de feverelro de 2014. Processo: RE'598770/ Republica italiana. Relator originrio: Min, Merco Aurélio, Relator p/ 0 acérdao: Min. Roberto Barroso. 58 MAZZUOLI, Vlétio. Direito internacional publico: parte geral, p. 112-113. 57 Nesse sentido: SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Informativo 722. Brasilia, DF, 30 de setembro a 4 de outubro de 2013. Processo: HC 119056 QO/DF. Relator: Min. Carmen Lia. Julgado em 03/10/2013. 58 Cabe recordar que toda lei brasileira que se refira ao STF como competente para a homologacao de sentenca estrangeira deve ser lida como aludindo ao STI 59 O tema da transferéncia de presos ¢ tratado no Capitulo XV da Parte | deste livro. 738 HOMOLOGAGAO DE SENTENCA ESTRANGEIRA condenatéria do individuo que vem cumprir a pena em territério brasileiro. Acrescenta o STJ que, nesses casos, “a homologagao da sentenga condenatéria ndo constitui requisito para a concess4o de beneficios legais" e que “havendo procedimento especifico previsto em tratado ou convengio internacional”, 0 processo homologatério deixa de ser necessétio. 2.5 A homologagao nos tratados A homologacao também é regulada por tratados, cujo objetivo principal é harmonizar a regulamentago quanto ao tema entre certo ndimero de Estados, com vistas a impedir que marcos legais muito diferentes na matéria acabem por criar entraves as relagécs internacionais. © Brasil é parte de atos internacionais que regulam a homologacao de sentengas estrangeiras, dentre os quais destacamos: o Cédigo de Bustamante (Decreto 18.871, de 13/08/1929) encre 08 artigos 423 e 433; a Convengio sobre 0 Reconhecimento e a Execugéo de Sentengas Arbitrais Estrangeiras, de 1958 (Convengao de Nova lorque — Decreto 4.311, de 23/07/2002); a Convengéo Interamericana sobre a Eficacia Territorial das Sentengas ¢ Laudos Arbitrais Estrangeiros, de 1979 (Convencio de Montevideu — Decreto 2.411, de 02/12/1997); 0 Protocolo de Las Lefias sobre Gooperagio e Assisténcia Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa do MERCOSUL, de 1992 (Decreto 2.067, de 12/11/1996), entre os artigos 18 e 24; e tratados bilaterais com Estados como Argentina, Espanha, Itdlia e Uruguai. No geral, as normas dos acordos internacionais relativos ao tema nao sio muito diferentes das encontradas no Dircito interno brasileiro. Em todo caso, 0 exame dos tratados revela algu- mas normas peculiares, como a encontrada na Convencio de Montevideu de 1979, pela qual 0 beneficio de justica gratuita reconhecido no Estado de origem da sentenga seré mantido no de sua apresentacao. Nos processos homologat6rios regidos pelo Protocolo de Las Lefias, 0 pedido de homolo- gagao tramitard por carta rogatéria ¢ por intermédio da Autoridade Central, que no Brasil é 0 Ministério da Justica. Ainda nos termos do Protocolo de Las Lefias (art. 22), quando o laudo a ser reconhecido ‘ou executado tiver as mesmas partes e objeto ou for fandamentado nos mesmos fatos de outro processo judicial ow arbitral no Estado onde a homologacio é requerida, scu reconhecimento ¢ executoriedade dependerdo de que a decisio néo seja incompativel com outro pronunciamento anterior ou simultineo proferido no Estado requerido. Do mesmo modo, nao se reconhecerd nem se procederd & execugdo quando se houver iniciado um procedimento entre as mesmas partes, fandamentado nos mesmos Fatos € com o mesmo abjeto, perante qualquer autoridade jurisdicional da Parte requerida, anteriormente & apresentagao da demanda perante a autoridade jurisdicional que teria pronunciado a decisie da qual haja solicitacéo de reconhecimente. 60 A respeito, ver informago constante do sitio da Assessorie de Cooperaggo Juridica Internacional do Ministério Piiblico Federal (MPF), disponivel em ‘Acesso em 09/01/2013. Processos: SE 3.521/PT; SE 4.181/PT; SE $.237/US e SE 5.269/PT. 739 PARTE It ~ DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO 2.6 A homologagéo no novo Cédigo de Processo Civil A homologagéo também é objeto de regras constantes do texto do novo Cédigo de Proceso Civil (NCPC), aprovado pelo Congresso Nacional em 2014, mas ainda pendente de sangao presidencial até o momento de fechamento desta edigao. ONCPC define quea cooperacao juridica internacional para execugio de decisio estrangeira dar-se-d por meio de carta rogatéria — aplicdvel & execugio de decisées interlocutérias estrangei- ras — ou de aca de homologacao de sentenga estrangeira, cabivel para a execugao, no Brasil, de decis6es rerminativas de processos judiciais. Ainda de acordo com o NCPC, a sentenca estrangeira somente ter’ eficécia no Brasil apés a stia homologagio, salvo disposicao em sentido contrério de lei ou tratado. E passivel de homologacao no Brasil a decisao judicial definitiva, bem como a nao judicial que, pela lei brasileira, teria narureza jurisdicional. Entretanto, a sentenga estrangeira de divéreio consensual produziré efeitos no Brasil, independentemente de homologagio pelo Superior Tribunal de Justiga, a qual fica, portanto, dispensada. A homologagao de decisdo estrangeira ser requerida por agio de homologagao de decisto estrangeira, salvo disposicao especial em sentido contrério prevista cm tratado. A homologacao obedecerd ao que dispuserem os tratados em vigor no Brasil ¢ o regimento interno do Superior Tribunal de Justiga (STJ), bem como o texto legal do NCPC. Jaa homo- logacao de decisdo arbitral estrangeira obedecera ao disposto em tratado € na lei, aplicando-se, subsidiariamente, as disposicdes pertinentes & homologagao constantes do NCPC. Sao requisitos elencados pata a homologacéo de uma sentenca estrangeira: ser proferida por auroridade compecente; ser precedida de citagao regular, ainda que verificada a revelia; ser cficaz no pais em que foi proferida; nao ofender a coisa julgada brasileira: estar acompanhada de traducio oficial, salvo disposicio que a dispense prevista em tratado; ¢ nao haver manifesta ofensa & ordem piiblica. Nio se exigité a reciprocidade referida no § 1° para homologacao de senrenca estrangeira. ‘A autoridade judicidria brasileita poclerd deferir pedidos de urgéncia e realizar atos de execugio proviséria no processo de homologacéo de deciséo estrangeira, Havers homologacao de decisio estrangeira para fins de execugio fiscal quando prevista em tratado ou em promessa de reciprocidade apresentada a autoridade brasileira. ‘A pendéncia de causa perante a jurisdigao brasileira nao impede a homologacio de sentenga judicial estrangeira quando exigida para produzir efeitos no Brasil. Por outro lado, nao serd ho- mologada a sentenga estrangeira relativa a casos de competéncia exclusiva da autoridade judiciaria brasileira. A deciséo estrangeira poderd ser homologeda parcialmente. O cumprimento de decisio estrangeira far-se-4 perante o juizo federal competente, a reque- rimento da parte, conforme as normas estabelecidas para o cumprimento de decisio nacional. O pedido de execucao da sentenca estrangeira homologada deverd ser instruido com cépia autenticada da decisio homologatéria pertinente. 740 HOMOLOGACKO DE SENTENGA ESTRANGEIRA 3. SENTENGAS PROFERIDAS POR TRIBUNAIS INTERNACIONAIS Como afirmamos anteriormente, a homologagio de sentengas estrangeiras ¢ 0 ato que permite que a decisao judicial ou equivalente, proferida pelas autoridades competentes de um Estado, gere efeitos em outro. E, portanto, o meio pelo qual um ente estatal consente que uma sentenga oriunda de drgios afetos a uma soberania estrangeira estenda seus desdobramentos a0 espaco sobre o qual exerce seu poder soberano. E certo que a decisio de corte de um Estado deve ser homologada para ser executada em outro Estado. Entretanto, ainda hé davidas acerca da necessidade de homologar sentencas de tribunais internacionais, as quais, cabe destacas, também podem ter efeitos civis. Com efeito, 0 tema € objeto de polémica no universo jutidico, e autores como Mazzuoli registram o relativo siléncio da doutrina brasileira quanto 2o assunto. Num primeiro momento, a jurisprudéncia patria entendia que sentenga estrangeira era toda aquela que nao era proferida por tribunal nacional, pelo que mesmo as decisoes prolatadas por cortes internacionais deveriam ser homologadas. De nossa parte, entretanto, parece evidente que no hd que se conferir o mesmo tratamento a dois tipos de provimento jurisdicional de natureza juridica distinta®. Com efeito, a necessidade da homologaeio da sentensa emanada de tribunais estrangeiros parte da premissa de que tais 6rgios se encontram vinculados & soberania de outro Estado, com jurisdicdo sobre scus respectivos territérios, julgando com base no Dircito estrangeiro ¢ regu- lando, assim, as relagées juridicas que ocorrem no ambito do exercicio de sua soberania. Serio estrangeiros, por exemplo, um uibunal argentino ou chileno. Desse modo, constituiria violagao da soberania estatal a aplicagio da deciséo judicial oriunda de um ente estatal em outro sem 0 consentimento deste. Por outro lado, as cortes internacionais sao estabclecidas pelos préprios Estados, por meio de tratados, para decidir sobre temas de interesse comum, com base no Direito Internacional, nao estando vinculadas a nenhuma soberania em particular e tendo jurisdicio sobre os préprios entes estatais que os conceberam, os quais, ao criar ou decidir participar nessas entidades, abrem mao de parte de seu poder soberano, permitindo a tais érgaos decidir sobre questées que os envolvam. Exemplos de tribunais internacionais sio a Corte Internacional de Justica (CIJ), 0 Tribunal Penal Internacional (TPI) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). ‘Com isso, entendemos que nao é correta a nogio de que as sentengas proferidas por tribunais internacionais necessitem de homologasao, em vista de sua nacureza juridica de decis6es prolatadas por érgios internacionais, que decidem com fulcro no Direito das Gentes, ser distinta daquela das decisées emanadas de érgaos afetos & soberania de outros Estados, que decidem com base no Direito estrangeiro. Outro fundamento para néo exigit a homologacio de sentengas de tribunais intemacion: relaciona-se com a prépria eficdcia do Direito Internacional Piblico. 61 MAZZUOLI, Valério. Diretto internacional publico: parte geral, p. 113-114. 62 Sobre o tema, ver também: MAZZUOU, Valério. Direito internacional publico: parte geral, p. 113-117. 744 PARTE Il ~ DIRFITO INTERWACIONAL PRIVADO De fato, os tribunais internacionais existem para garantir a correta aplicagio do Direito das Gentes, contribuindo assim para permitir a convivéncia na sociedade internacional dentro de certos valores. ‘A construgao do Dircito Internacional Piblico, num ambiente internacional em que a sobe- rania estatal ainda é um dos fundamentos das relagées internacionais, é marcada frequentemente pela necessidade de que os Estados concordem em se submeter &s normas internacionais. Nesse sentido, o Estado s6 se encontra obrigado, via de regra, a cumprir os tratados com os quais tenha liyremente consentido. A figura do consentimento existe rambém no tocante aos uibunais internacionais, os quais, além de normalmente serem ctiados por tratados, muitas vezes sao limitados por clausulas pclas quais o Estado somente pode se submeter a julgamento por tais entidades se consentir com a competéncia da corte respectiva para tal. Eo caso da Corte Interamericana de Dircitos Humanos (CIDH), que s6 passou a poder julgar 0 Brasil a partir do momento em que este aceitou sta competéncia contenciosa®’. Em suma, 0 ambiente juridico internacional é marcado, por um lado, pela relevancia do principio pacta sund servanda, ©, por ouuro, por dificuldades no tocante 2 regulamentacio das relagdes internacionais ¢, em especial, quanto A efetivagao do cumprimento das normas de Di- reito Internacional. Dessa forma, exigir a homologacao de sentenca de tribunais internacionais € impor novo gravame 3 eficicia do Direito das Gentes, condicionando-a a uma etapa adicional de confirmagao do consentimento estatal e limitando ainda mais a capacidade de agao dos orga- nismos internacionais, Na pritica, as sentengas da Corte Inveramericana de Dizeitos Humanos no tocante ao Brasil tém sido executadas 110 Estado brasileiro independentemente de homologagao, como no caso em que o Brasil foi condenado a pagar uma indenizagao A familia de Damiéo Ximenes Lopes, que foi a primeira sentenga de tribunal internacional relativa ao Estado brasileiro. Por fim, esse entendimento doutrindrio poderd em breve ser confirmado pela lei brasileira, caso 0 atual anteprojeta do nove Cédigo Penal seja aprovado com a inclusio do artigo 10, § 2°, que prevé que “Nao dependem de homologacéo as decisdes de corte internacional cuja jurisdi¢ao foi admicida pelo Brasil”, que dispée sobre a aplicacao do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (TPI) no Brasil € que ora se encontra sob apreciacéo da Camara dos Deputados, que deverd fixat, na redacio A nogao em tela também ¢ encontrada no Projeto de Lei 4.038/2008, 63 Apropésito, o Brasil reconheceu a competéncia contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos pelo Decreto n® 4.463, de 08/11/ 2002, que promulgou a Declaracao de Reconhecimento da Competéncia Obrigatoria de Corte Interamericana de Direitos Humanos. A respeito, ver 0 inteiro teor do Decreto em aprego, que se encontra disponivel em: . Acesso em: 01/02/2015. 64 © Brasil foi condenando em processo na Corte Interamericana de Direitos Humans (CIDH), movido pela familia de amido ximenes Lopes, falecido dentro de estabelecimento voltado ao tratamento de portadares de deficiéncia mental na cidade de Sobral (Cearé). Dentre as medidas reparatorias, foi incluida indenizacdo a familia no valor de 136,500 délares, entre danos materials e morais. A respeito, ver a sentenca, em portugués, de acordo com os seguintes dados: DEA. Corte interamericana de Direitos Humanos. Caso Ximenes Lopes versus Brasil. Disponivel em chtlp://au.corteidh.orer/dacs/casos/articulos/seriec_149_porpdfo, Acesso em: 01/02/2015, Ressaltamos, orém, que o tema interessa, sobretudo, a0 estudo da aplicagio das normas internacionais de direitos humans ‘no Brasil, restringindo-se sua pertinéncia ac tema da homologaco das sentencas estrangelras ao assunto aqui indicado. 742

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