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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAPÁ

CAMPUS BINACIONAL

ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE DA AVALIAÇÃO


PSICOLÓGICA EM CONCURSOS PÚBLICOS

Oiapoque
2018
ROBSON TIMOTEO DAMASCENO

ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE DA AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA


EM CONCURSOS PÚBLICOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado na


Universidade Federal do Amapá – Câmpus Oiapoque
como requisito básico para a conclusão do curso de
Direito
Orientador: Prof. Ms. José Caldeira Gemaque Neto

Oiapoque
2018
TERMO DE APROVAÇÃO
ROBSON TIMOTEO DAMASCENO

ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE DA AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA


EM CONCURSOS PÚBLICOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado na Universidade Federal do Amapá – Câmpus


Oiapoque como requisito básico para a conclusão do curso de Direito, aprovado pela seguinte
banca examinadora:

_____________________________________
Prof. Ms. José Caldeira Gemaque Neto
Orientador
Universidade Federal do Amapá

_____________________________________
Profa. Ms. Alice Aparecida Dias Akegawa
Membro
Universidade Federal do Amapá

_____________________________________
Prof. Ms. Francine Pinto da Silva Joseph
Membro
Universidade Federal do Amapá
RESUMO
O presente trabalho apresenta discussões a respeito da constitucionalidade do modelo
atualmente adotado para as avaliações psicológicas em concursos públicos brasileiros,
especialmente para a área de segurança pública e outros cargos nos quais essa avaliação é
prevista em lei. Apresentar-se-á qual o modelo de avaliação adotado no Brasil atualmente para
esses certames, desde as principais teorias psicológicas empregadas pela Psicometria, passando
pelas formas de desenvolvimento e validação dos testes psicológicos, pela forma de seleção dos
testes e aplicação pelas bancas até a apresentação dos resultados e a possibilidade de recursos
administrativos. Além disso, realizar-se-á a revisão literária da área jurídica nacional, bem
como da área de Psicologia, tanto nacional quanto internacional. Será feita também a análise
qualitativa e quantitativa de informações dessas avaliações, com dados dos principais certames
nos quais as avaliações em questão são aplicadas. Estudos comparados serão realizados,
apresentando o formato que outros países utilizam para o ingresso de profissionais em seus
quadros, em comparação ao modelo brasileiro. Com base em todos esses resultados, analisar-
se-á o atual modelo de avaliação psicológica frente aos princípios constitucionais, em especial
aqueles que regem a Administração Pública, buscando analisar se tal modelo se adequa aos
parâmetros constitucionais. Diante dos resultados, apontar-se-á quais os principais pontos a
serem aperfeiçoados nesse modelo, à luz dos estudos comparados.
Palavras-chave: Avaliação psicológica, Constitucionalidade, Concursos públicos, Psicometria
ABSTRACT
This work presents discussion about the constitutionality of the model currently applied to
physicological screening in brazilian admission to public service, especially for the area of
public security and others positions for which this evaluation is determined by law. The model
of evaluation adopted in Brazil to these processes of admission will be presented, presenting
the main psychological theories employed by Psychometrics, the forms of development and
validation of psychological tests, the way of selection of tests and application and the results
and the possibility of administrative appeals. In addition, there will be a literary review of the
national legal area, as well as the area of Psychology, both national and international. The
qualitative and quantitative analysis of information from these evaluations will also be made,
with data from the main processes in which the evaluations in question are applied.
Comparative studies will be carried out, presenting the format that other countries use for the
entry of professionals in their staff, in comparison to the brazilian model. Based on all these
results, the current model of psychological evaluation will be analyzed against the constitutional
principles, especially those that govern the Public Administration, seeking to determine if such
a model fits the constitutional parameters. In view of the results, it will be pointed out the main
points to be perfected in this model, in the light of the comparative studies.
Key Words: Psychological evaluation, Constitutionality, Admission in public service,
Psychometrics
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Quantidade de candidatos recomendados e não-recomendados nos concursos da Polícia


Federal e porcentagem de não-recomendação............................................................................. 56
Tabela 2 - Cálculo do intervalo de confiança para a recomendação de um candidato nas avaliações do
concurso da Polícia Federal......................................................................................................... 57
Tabela 3 - Intervalos de confiança com 95% de probabilidade, para a porcentagem da população
brasileira recomendada para os cargos da Polícia Federal .......................................................... 58
Tabela 4 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos concursos da Polícia
Federal ......................................................................................................................................... 59
Tabela 5 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos concursos de Agente
da Polícia Federal ........................................................................................................................ 60
Tabela 6 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos concursos de Delegado
da Polícia Federal ........................................................................................................................ 61
Tabela 7 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos concursos da Polícia
Federal realizados em 2009 ......................................................................................................... 62
Tabela 8 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos concursos da Polícia
Federal realizados em 2012 ......................................................................................................... 62
Tabela 9 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos concursos da Polícia
Federal realizados em 2014 (embora o edital seja de 2012, a avaliação somente se realizou dois anos
depois) ......................................................................................................................................... 63
Tabela 10 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos concursos da Polícia
Rodoviária Federal ...................................................................................................................... 64
LISTA DE SIGLAS

ABIN Agência Brasileira de Inteligência


ANOVA Análise de Variância
BGFM Bateria Geral de Funções Mentais
BPOL Bundespolizei
CEBRASPE Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção de Pessoal
CESPE Centro Brasileiro de Seleção e Promoção de Eventos
CFP Conselho Federal de Psicologia
CMPB Central Manpower Base
CNJ Conselho Nacional de Justiça
CONTEC Conselho Técnico
CPS Escala de Personalidade Comrey
DEPEN Departamento Penitenciário Nacional
DIF Funcionamento Diferencial do Item
EAP Exame de Aptidão Psicológica
EUA Estados Unidos da América
FBI Federal Bureau of Investigation
FCC Fundação Carlos Chagas
FSP Força Policial de Singapura
FUNCAB Fundação Professor Carlos Alberto Bittencourt
IACP International Association of Chiefs of Police
ICFP-R Inventário Fatorial de Personalidade Revisado
IFP Inventário Fatorial de Personalidade
IPA Instituto de Psicologia da Aeronáutica
IPSA International Police Science Association
ITC International Test Comission
LabPAM Laboratório em Pesquisa de Avaliação e Medida
MVT Teste de Memória Visual para o Trânsito
NBI National Bureau of Investigation
NCA National Crime Agency
NPIA National Policing Improvement Agency
PMK Psicodiagnóstico Miocinético
POLITEC Polícia Técnico-Científica
PRF Polícia Rodoviária Federal
RAS Escala de Assertividade Rathus
SATEPSI Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justiça
TCT Teoria Clássica dos Testes
TEMPLAM Teste de Memória de Placas
TMV Teste de Memória Visual
TRI Teoria de Resposta ao Item
WISPI World International Security and Police Index
SUMÁRIO
1 – INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 12
1.1 – Concursos públicos e sua subordinação aos princípios constitucionais...... 15
1.2 – Avaliação psicológica como etapa de concurso público e o modelo atual dessa
avaliação .................................................................................................................... 17
1.2.1 – Psicometria e as teorias que avaliam as propriedades psicométricas dos testes
psicológicos ............................................................................................................. 18
1.2.2 – Desenvolvimento e validação dos testes psicológicos ................................ 20
1.2.3 – Aprovação para uso do teste pelo CFP........................................................ 24
1.2.4 – Escolha do testes e montagem dos critérios de avaliação psicológica pelas bancas
de concurso público ................................................................................................. 25
1.2.5 – A aplicação da avaliação psicológica em concursos públicos .................... 27
1.2.6 – A correção da avaliação psicológica ........................................................... 28
1.2.7 – A publicação dos resultados da avaliação psicológica ................................ 29
1.2.8 – A sessão de conhecimento das razões de inaptidão e o recurso administrativo da
avaliação psicológica............................................................................................... 29
2 – MARCO REGULATÓRIO E JURISPRUDÊNCIA RELACIONADA À
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA EM CONCURSOS PÚBLICOS ..................................... 31
2.1 – Decreto 6944/2009 ............................................................................................ 31
2.2 - Leis de regência das carreiras que exigem avaliação psicológica para o ingresso
.................................................................................................................................... 33
2.3 – Editais de concursos públicos ......................................................................... 37
2.4 – Normativos do Conselho Federal de Psicologia ............................................ 38
2.5 – Jurisprudência relacionada à avaliação psicológica ..................................... 39
2.6 – Conclusão quanto aos aspectos legais e jurisprudenciais............................. 40
3 – REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA NACIONAL E ESTRANGEIRA SOBRE
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA ............................................................................................ 42
3.1 – Literatura jurídica nacional ........................................................................... 42
3.2 – Literatura da área de Psicologia nacional ..................................................... 46
3.3 – Literatura estrangeira ..................................................................................... 50
3.4 – Conclusão da revisão literária ........................................................................ 52
4 – ANÁLISE DOS RESULTADOS DA AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA NO ATUAL
MODELO ................................................................................................................................ 53
4.1 – Teoria dos erros e sua aplicação no contexto da avaliação psicológica ...... 53
4.2 – Análise da coerência dos resultados das avaliações psicológicas quando
comparadas em concursos diversos ......................................................................... 55
4.3 – Análise da coerência dos resultados entre os testes que compõe as avaliações
psicológicas quando comparadas entre si ............................................................... 64
4.4 – Análise dos resultados de avaliação psicológica quando aplicada ao mesmo
candidato em momentos distintos ........................................................................... 67
4.5 – Análise dos resultados da avaliação psicológica em relação à observação da
característica avaliada .............................................................................................. 70
4.6 – Avaliação das consequências dos erros nas avaliações psicológicas............ 71
4.7 – Análise da possibilidade de reversão dos resultados por meio de recursos
administrativos .......................................................................................................... 72
4.8 – Conclusão sobre os resultados da avaliação psicológica em concursos públicos no
modelo atual .............................................................................................................. 75
5 – BREVE APRESENTAÇÃO DE MODELOS ESTRANGEIROS DE AVALIAÇÃO
PSICOLÓGICA PARA INGRESSO EM CARGOS PÚBLICOS ..................................... 76
5.1 - Singapura .......................................................................................................... 78
5.2 - Finlândia ............................................................................................................ 79
5.3 - Dinamarca ......................................................................................................... 79
5.4 - Áustria ............................................................................................................... 80
5.5 - Alemanha........................................................................................................... 80
5.6 - Uruguai .............................................................................................................. 80
5.7 - França ................................................................................................................ 81
5.8 - Inglaterra ........................................................................................................... 81
5.9 – Estados Unidos da América ............................................................................ 82
5.10 – Conclusão sobre os modelos de avaliação psicológica estrangeiros .......... 83
6 – ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE DO MODELO ATUAL DE
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA ........................................................................................... 84
6.1 – As garantias fundamentais e os princípios constitucionais como delimitadores e
como orientadores da atividade estatal ................................................................... 84
6.2 – O modelo constitucional de concurso público, à luz da doutrina ................ 86
6.3 – Análise frente aos princípios constitucionais................................................. 87
6.3.1 – Análise frente ao princípio da legalidade .................................................... 87
6.3.2 – Análise frente ao princípio da impessoalidade ............................................ 91
6.3.3 – Análise frente ao princípio da moralidade .................................................. 92
6.3.4 – Análise frente ao princípio da publicidade .................................................. 94
6.3.5 – Análise frente ao princípio da eficiência ..................................................... 94
6.3.6 – Análise frente aos direitos sociais ............................................................... 95
6.3.7 – Análise frente a outros princípios constitucionais....................................... 96
6.4 – Conclusão da análise da constitucionalidade do modelo atual de avaliação
psicológica ........................................................................................................................... 98
7 – CONCLUSÃO .................................................................................................................................. 100
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................... 105
12

1 – INTRODUÇÃO

As avaliações psicológicas são previstas como etapa de concursos públicos em


diversas carreiras da Administração Pública. De acordo com o Supremo Tribunal Federal
(STF), nos termos da Súmula Vinculante 44, somente por lei se pode sujeitar a exame
psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público. Além disso, de acordo com a
jurisprudência do STF, além de previsão em lei deve haver um mínimo de publicidade e
objetividade com relação aos atos da avaliação psicológica.
No âmbito do Poder Executivo Federal, a questão é normatizada por meio do
Decreto 6944/2009, que define que a realização de avaliação psicológica está
condicionada à existência de previsão legal específica e deverá estar prevista no edital do
certame. Além disso, ainda de acordo com essa norma, essa etapa do concurso deverá ser
realizada mediante o uso de instrumentos de avaliação, capazes de mensurar, de forma
objetiva e padronizada, os requisitos psicológicos do candidato para o desempenho das
atribuições inerentes ao cargo em questão.
Diante disso, o entendimento atual é de que a etapa de avaliação psicológica é
constitucional, desde que haja previsão específica em lei e no edital do concurso e desde
que exista objetividade na avaliação, de acordo com critérios científicos previamente
estabelecidos. Com base nisso, diversas carreiras atualmente preveem a necessidade de
avaliação psicológica para ingresso em seus quadros, em especial os órgãos de Segurança
Pública (Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícias Civis e Militares).
Apesar desse entendimento, entretanto, a aplicação de avaliações psicológicas
apresenta concretamente diversos problemas, o que faz com que a questão seja
frequentemente judicializada, provocando um forte ponto de tensão entre os
administrados e a Administração Pública.
Na seara judicial há entendimentos dos mais variados sobre a questão. Esse quadro
leva à insegurança jurídica, posto que candidatos que foram inabilitados na etapa de
avaliação psicológica de um mesmo concurso têm soluções completamente diferentes
quando buscam a via judicial.
Mais grave do que isso, porém, são os frequentes resultados totalmente destituídos
de coerência trazidos por avaliações psicológicas, tais como os casos de policiais da ativa
que são reprovados em avaliações psicológicas para ingresso em cargo do mesmo órgão,
13

no qual trabalham há anos sem registros negativos, e dos casos em que em um mesmo
concurso o candidato é aprovado e depois reprovado (e vice-versa).
No Brasil, temos um verdadeiro cenário de vácuo legislativo sobre a questão,
especialmente nos Estados, que não seguem as regras do Decreto 6944/2009. Não
obstante a regulamentação nos certames federais, mesmo em relação a esses falta
regulamentação da questão, posto que as regras de aplicação dos testes, de aprovação e
de reprovação nas avaliações psicológicas seguem as normas do Conselho Federal de
Psicologia (CFP) apenas, o que não constitui lei em sentido formal. Logo, as regras para
avaliação psicológica são verdadeiras normas em branco, que são complementadas por
uma autarquia que sequer faz parte da estrutura da Administração direta federal.
Por fim, há uma séria dificuldade de diálogo entre os profissionais do ramo da
Psicologia, responsáveis pelas avaliações psicológicas, e os profissionais do ramo do
Direito, já que as regras dos testes psicológicos são restritas aos primeiros e não há a
devida preocupação dos operadores do Direito com essa relevante questão.
Nesse sentido, pondera SANTOS (2011), em aprofundado artigo, que os testes
psicológicos carecem de uma adequada reflexão jurídica e que a linguagem da Psicologia
– destinada aos seus iniciados – não tem a preocupação em fazer a ponte com o Direito
(ou vice-versa), dificultando, dessa forma, o acesso aos testes pelos profissionais do
Direito, transformando-os em verdadeiras caixas-pretas que precisam ser juridicamente
desvendadas sob pena de se amesquinhar direitos e garantias fundamentais.
Por conta dessa falta de reflexão jurídica em nosso país, são raros os artigos
científicos da área de Direito que se debruçam sobre a questão com a necessária
profundidade e seriedade, sendo que a maior parte da doutrina e jurisprudência se limita
a repetir os critérios de objetividade, previsão em lei e possibilidade de recurso
administrativo como suficientes para a legalidade e constitucionalidade da avaliação
psicológica em concursos públicos. Além disso, muitas vezes os artigos da área de Direito
produzidos em nosso país têm como origem os próprios institutos responsáveis pela
seleção de candidatos, o que pode indicar uma visão sem a necessária isenção sobre o
assunto.
Diversa é a situação, entretanto, em outros países, como, por exemplo, Estados
Unidos, no qual existe farta discussão a respeito dos limites de aplicação de testes
psicológicos e suas implicações jurídicas. CREECH (1948), por exemplo, há mais de
meio século discutia como o Congresso americano deveria tratar a questão da avaliação
psicológica, de forma a não ferir os direitos fundamentais garantidos pela quinta emenda
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constitucional daquele país. Para este autor, mesmo quando um interesse público superior
pode garantir uma invasão da privacidade pessoal, a intrusão deve ser acompanhada por
completas salvaguardas para os indivíduos afetados.
Assim, pretende o presente projeto de trabalho de conclusão de curso analisar a
questão da constitucionalidade do atual modelo de avaliação psicológica no Brasil,
mostrando os problemas práticos da aplicação deste modelo e ponderando-o dentro da
análise sistemática de nosso ordenamento, bem como comparando-o aos modelos
empregados em outros países. Para resumir tal problemática, trazemos a afirmação de
SANTOS (2011) no sentido de que é absolutamente ilegal e inconstitucional (por violação
ao conteúdo do artigo 37, II da Constituição da República e ao princípio da razoabilidade)
que o teste psicológico tenha cunho eliminatório, como parte integrante do próprio
concurso. O objetivo do presente trabalho é verificar se afirmações como essa, de fato, se
sustentam.
Na seção 2, serão apresentados o marco regulatório e a jurisprudência atual sobre
a avaliação psicológica em concursos públicos, apresentado os principais aspectos das
normas que regulam a questão, em especial o Decreto 6944/2009, as leis que regem os
cargos nos quais essa avaliação é aplicada, os normativos do CFP e a jurisprudência nas
cortes superiores.
Por outro lado, a terceira seção apresentará uma revisão crítica da literatura
nacional e estrangeira sobre o assunto, apontando tanto os aspectos jurídicos quanto os
aspectos do campo da Psicologia, com fundamento em especialistas no assunto.
Prosseguindo, a quarta seção trará uma discussão sobre os resultados do atual
modelo de avaliação psicológica, analisando-o sobre os aspectos da coerência dos seus
resultados quando comparados certames diferentes, quando comparados candidatos em
diferentes concursos e até mesmo quando comparados os mesmos candidatos em um
mesmo concurso. Essa seção apresentará uma discussão sobre a teoria dos erros, sua
aplicação e avaliação dentro do assunto em tela.
Por sua vez, a seção 5 apresentará uma breve apresentação de modelos
estrangeiros de avaliação psicológica, usando como paradigma de comparação os
concursos para ingresso nos órgãos de polícia judiciária nacional. Com base em estudos
internacionais, que listam os melhores países em termos de segurança pública, os modelos
de diversos países, entre eles França, Inglaterra, Estados Unidos da América e Alemanha,
serão apresentados.
15

Em seguida, a sétima seção apresentará a discussão sobre a constitucionalidade


do modelo de avaliação que está sendo discutido, frente às informações dos capítulos
anteriores e tendo como paradigma os princípios constitucionais que regem a
Administração Pública. Por fim, este trabalho será concluído apresentando sugestões para
adequação da avaliação psicológica ao modelo constitucional de concurso público, de
acordo com o que foi analisado.

1.1 – Concursos públicos e sua subordinação aos princípios constitucionais

Concurso público, na definição de CARVALHO FILHO (2017, p. 415), “é o


procedimento administrativo que tem por fim aferir as aptidões pessoais e selecionar os
melhores candidatos ao provimento de cargos e funções públicas”. Nesse sentido, afirma
também o autor que o concurso público é o instrumento que melhor representa o sistema
de mérito, posto que permite a participação de todos em igualdades de condições,
permitindo a seleção dos melhores candidatos (CARVALHO FILHO, 2017).
Confirmando tal entendimento, a exigência de concurso público para a investidura
em cargo ou emprego público possui fundamento constitucional, nos termos do art. 37,
II, da nossa Carta Maior. Além disso, a exigência e forma de aplicação do procedimento
de concurso público deve reger-se pelos princípios constitucionais, em especial aqueles
que regem a Administração Pública. Assim, tal como os demais procedimentos
administrativos, deve o concurso público obedecer aos princípios da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, conforme textualmente determina
o caput do art. 37 da Constituição. Especificamente, CARVALHO FILHO (2017) afirma
que o concurso público deve seguir ainda os princípios da igualdade, da moralidade
administrativa e da competição.
Analisando cada um desses princípios, quanto ao princípio da legalidade, de
acordo com MENDES (2017), traduz esse a concepção de lei como instrumento de
proteção de liberdades individuais, permitindo a formação de um Estado de Direito,
contraposto ao Estado Absoluto ou ao Estado de Polícia dos séculos anteriores. Dessa
maneira, o princípio da legalidade opõe-se a qualquer tipo de poder autoritário e a toda
tendência de exacerbação individualista e personalista dos governantes.
Ainda no que diz respeito ao princípio da legalidade, MENDES (2017) afirma que
o princípio da legalidade deve ser entendido como um verdadeiro princípio da
constitucionalidade (ideia extraída da obra de Canotilho), no sentido de que não basta a
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edição formal da lei para obrigar o cidadão, que somente pode ser obrigado a fazer ou
deixar de fazer algo em virtude da lei que esteja de acordo com o ordenamento jurídico,
cujo fundamento de validade material e formal é a própria Constituição.
Quanto ao princípio da impessoalidade, MENDES (2017) afirma que esse deve
ser entendido como o comando constitucional que impede a Administração de fazer
diferenciações que não se justifiquem juridicamente. Esse é o princípio que sustenta, em
última análise, a exigência de concursos públicos para o ingresso nos quadros do
funcionalismo público. Também no princípio da impessoalidade se fundamentam os
princípios da igualdade e da competição nos concursos públicos, já que todos os
administrados devem ser avaliados em igualdade de condições, não cabendo a
Administração favorecer a ninguém, buscando, ao contrário, aqueles que possuem as
melhores condições para o exercício das funções públicas.
No que se refere ao princípio da moralidade, trata-se de um comando no sentido
de atribuir ao ato jurídico uma dimensão ética. Conforme MENDES (2017), esse
princípio precisa ser analisado em conjunto com outros princípios, como a
proporcionalidade, a não arbitrariedade do ato administrativo e a isonomia, de forma a
avaliar a moralidade, que deve existir em todos os atos da Administração.
Por outro lado, o princípio da publicidade está relacionado ao dever de
transparência do Estado e ao direito de informação dos administrados. Especificamente
nos concursos públicos, tal princípio permite o amplo acesso às informações referentes
às etapas e regras do certame, bem como aos dados que constam do candidato no processo
seletivo.
Por fim, quanto ao princípio da eficiência, esse impõe a Administração da busca
pelos melhores resultados em sua atividade, que são aqueles que apresentam
economicidade, celeridade e satisfação dos objetivos buscados. No que se refere ao
processo de seleção para os cargos públicos, a eficiência está relacionada à seleção dos
candidatos que melhor desempenharão às atividades próprias do cargo.
Além dos princípios constitucionais expressos, CARVALHO FILHO (2017)
afirma que a Administração Pública deve se orientar ainda por outros princípios, que
denomina de princípios reconhecidos. Dentre eles, temos o princípio da supremacia do
interesse público, da autotutela, da indisponibilidade, da continuidade dos serviços
públicos, da segurança jurídica e da precaução.
Quanto ao princípio da supremacia do interesse público, esse nada mais é do que
a constatação de que o fim último da atividade do Estado é o benefício da coletividade.
17

Assim, quando a atuação estatal não beneficia tal objetivo há desvio de finalidade. No
que se refere ao princípio da autotela, a Administração tem o dever de rever seus atos,
seja no aspecto de legalidade, quanto no mérito, de forma a melhor adequá-los ao
interesse público.
Por sua vez, o princípio da indisponibilidade determina que os bens e interesses
públicos não pertencem à Administração ou a qualquer de seus agentes, mas sim a
coletividade, que a verdadeira titular dos interesses e direitos públicos. Dessa maneira,
todos os atos e procedimentos administrativos devem ser realizados no interesse da
coletividade e em benefício dela.
Em relação ao princípio da continuidade dos serviços públicos, CARVALHO
FILHO (2017) afirma que esse traz como consequência lógica a não interrupção da
prestação dos serviços públicos sem necessidade.
O princípio da segurança jurídica, por sua vez, traduz-se na perspectiva de certeza,
que implica o conhecimento seguro das normas e atividades jurídicas da Administração,
e na perspectiva de estabilidade, que se demonstra na consolidação das ações
administrativas e na criação de mecanismos de defesa do administrado, como o direito
adquirido e o ato jurídico perfeito.
Por outro lado, o princípio da precaução, nos dizeres de CARVALHO FILHO
(2017), tem sido invocado na seara administrativa no sentido de que a Administração
deve adotar postura de precaução para evitar que danos sejam provocados para a
coletividade, quando houver riscos envolvidos. Logo, deve a Administração privilegiar a
prevenção à correção.
Deste modo, a análise da constitucionalidade dos procedimentos administrativos,
dos quais os concursos públicos são uma espécie, deve-se pautar não apenas na mera
legalidade e formalismo, mas também na avaliação sistemática dos diversos princípios
que delimitam a atividade da Administração.

1.2 – Avaliação psicológica como etapa de concurso público e o modelo atual dessa
avaliação

Segundo a definição do Conselho Federal de Psicologia (2007, p. 8):

A avaliação psicológica é um processo técnico e científico realizado com


pessoas ou grupos de pessoas que, de acordo com cada área do conhecimento,
requer metodologias específicas. Ela é dinâmica, e se constitui em fonte de
informações de caráter explicativo sobre os fenômenos psicológicos, com a
18

finalidade de subsidiar os trabalhos nos diferentes campos de atuação do


psicólogo, dentre eles, saúde, educação, trabalho e outros setores em que ela
se fizer necessária. Trata-se de um estudo que requer um planejamento prévio
e cuidadoso, de acordo com a demanda e os fins aos quais a avaliação se
destina.

A avaliação psicológica deve ser diferenciada da testagem psicológica. Nesse


sentido, ainda de acordo com o CFP:

A avaliação psicológica é um processo amplo que envolve a integração de


informações provenientes de diversas fontes, dentre elas, testes, entrevistas,
observações, análise de documentos. A testagem psicológica, portanto, pode
ser considerada uma etapa da avaliação psicológica, que implica a utilização
de teste(s) psicológico(s) de diferentes tipos.

Por sua vez, testes psicológicos, de acordo com a definição dada pela Resolução
no 2/2003 do CFP são:

Procedimentos sistemáticos de observação e registro de amostras de


comportamentos e respostas de indivíduos com o objetivo de descrever e/ou
mensurar características e processos psicológicos, compreendidos
tradicionalmente nas áreas emoção/afeto, cognição/inteligência, motivação,
personalidade, psicomotricidade, atenção, memória, percepção, dentre outras,
nas suas mais diversas formas de expressão, segundo padrões definidos pela
construção dos instrumentos

A avaliação psicológica é utilizada em diversas situações, tais como


acompanhamento psicológico, tratamento clínico, exames para obtenção de carteira de
motorista e exames para obtenção de porte de armas de fogo. A utilização dessas técnicas
em concursos públicos é apenas uma dentre essas aplicações.
De forma a melhor compreensão do funcionamento dessa etapa dos certames,
ainda mais para aqueles que são leigos na área de Psicometria, faz-se necessária uma
pequena apresentação de como se procede a avaliação psicológica em concursos públicos,
pelo modelo atualmente empregado, desde a criação dos testes até o resultado final.

1.2.1 – Psicometria e as teorias que avaliam as propriedades psicométricas dos testes


psicológicos

A primeira questão a ser considerada é o desenvolvimento do teste psicológico, já


que embora não seja a avaliação psicológica limitada à aplicação de testes no contexto
dos concursos públicos ela se resume a isso. Nesse sentido, a primeira etapa de uma
19

avaliação psicológica pode ser considerada a criação de uma teoria que fundamente o
teste psicológico. O campo da Psicologia que se ocupa de tais teorias é a Psicometria. A
Psicometria, de acordo com PASQUALI (2009), é a teoria e também a técnica de medida
dos processos mentais, com ênfase em sua aplicação na área da Psicologia e da Educação.
Ainda de acordo com PASQUALI, temos a chamada Teoria Clássica dos Testes
(TCT) e a Teoria de Resposta ao Item (TRI) como as duas principais teorias que
fundamentam os testes psicológicos. SARTES (2013) apresenta ampla discussão e
explicação sobre os fundamentos de tais teorias.
Resumindo a ideia desses autores, podemos dizer que a Teoria Clássica dos
Testes (TCT) se preocupa a relacionar o resultado numa tarefa qualquer com uma
característica em estudo. Por exemplo, caso se queira saber o quanto uma pessoa é
agressiva, por essa teoria, faz-se uma série de perguntas, sendo que cada resposta
afirmativa terá valor 1 e cada resposta negativa terá valor 0. Assim, nesse caso hipotético,
após responder 30 itens, o avaliado obtém uma pontuação total de 15. Como base nos
estudos baseados na TCT haverá um significado para esse valor de 15 em termos de
agressividade. Esta é uma teoria mais antiga e tinha algumas falhas, como a maior
dependência do teste utilizado.
A segunda vertente é a já citada Teoria de Resposta ao Item (TRI). A teoria, que
surgiu em torno dos anos 1930, foi melhor sistematizada por volta dos anos 1960,
tomando conta de grande parte da psicometria nos anos 1980. Essa teoria postula que o
comportamento humano é resultado de processos hipotéticos chamados de traços latentes.
A TRI expressa a relação entre os comportamentos (chamadas variáveis observáveis) e
os traços latentes (as variáveis hipotéticas) através uma equação matemática chamada de
equação logística. Essa produz uma Curva Característica do Item (CCI). A CCI define os
parâmetros dos comportamentos, ditos itens (dificuldade, discriminação) em função do
tamanho do traço latente.
PASQUALI (2009, p. 2) diferencia as duas teorias da seguinte forma:

De um modo geral, a psicometria procura explicar o sentido que têm as


respostas dadas pelos sujeitos a uma série de tarefas, tipicamente chamadas de
itens. A TCT se preocupa em explicar o resultado final total, isto é, a soma das
respostas dadas a uma série de itens, expressa no chamado escore total (T). Por
exemplo, o T em um teste de 30 itens de aptidão seria a soma dos itens
corretamente acertados. Se for dado 1 para um item acertado e 0 para um
errado, e o sujeito acertou 20 itens e errou 10, seu escore T seria de 20. A TCT,
então, se pergunta o que significa este 20 para o sujeito? A TRI, por outro lado,
não está interessada no escore total em um teste; ela se interessa
especificamente por cada um dos 30 itens e quer saber qual é a probabilidade
20

e quais são os fatores que afetam esta probabilidade de cada item


individualmente ser acertado ou errado (em testes de aptidão) ou de ser aceito
ou rejeitado (em testes de preferência: personalidade, interesses, atitudes).
Dessa forma, a TCT tem interesse em produzir testes de qualidade, enquanto a
TRI se interessa por produzir tarefas (itens) de qualidade. No final, então,
temos ou testes válidos (TCT) ou itens válidos (TRI), itens com os quais se
poderão construir tantos testes válidos quantos se quiser ou o número de itens
permitir. Assim, a riqueza na avaliação psicológica ou educacional, dentro do
enfoque da TRI, consiste em se conseguir construir armazéns de itens válidos
para avaliar os traços latentes, armazéns estes chamados de bancos de itens
para a elaboração de um número sem fim de testes.

Portanto, resumida e simplificadamente, os testes psicológicos se fundamentam


na premissa de que as características de personalidade podem ser mensuradas através da
realização de tarefas por parte das pessoas avaliadas, sendo que a relação matemática
entre os resultados das tarefas e a característica de personalidade é baseada em uma teoria
psicométrica, sendo que a TRI é a teoria mais empregada atualmente.

1.2.2 – Desenvolvimento e validação dos testes psicológicos

Para a criação de um novo teste psicológico, utiliza-se as teorias anteriormente


explicadas, bem como outros fundamentos da Psicologia. Para a criação do teste, o
primeiro passo é definir o que se quer medir (o chamado traço latente - agressividade, por
exemplo), depois desenvolve-se uma teoria sobre como este se manifesta, em seguida
cria-se uma tarefa para medir por uma característica secundária o traço latente (respostas
a uma escala, por exemplo). Por fim, deve-se determinar uma relação entre os resultados
na tarefa e o traço latente, através do processo de padronização/validação. Como essas
etapas não são óbvias para aqueles que não são da área, uma explicação mais detalhada
faz-se necessária sobre a etapa de validação dos testes.
A etapa de validação inicia-se com a formulação de definições detalhadas da
característica que se deseja avaliar (traço ou construto), derivadas da teoria psicológica,
pesquisa anterior, ou observação sistemática e análises do domínio relevante do
comportamento. É exatamente na teoria aplicável que se encontram as maiores
dificuldades do desenvolvimento dos testes, pois há diversas teorias, às vezes até
contraditórias.
Escolhida a forma do teste, cria-se a tarefa que será realizada pelo avaliado. Por
exemplo, marcar as respostas certas em um teste de raciocínio ou avaliar sua
personalidade e comportamento frente a afirmações, dizendo o quanto concorda ou
discorda delas. De maneira a facilitar o entendimento, apresenta-se três exemplos
21

hipotéticos de testes. O primeiro seria um teste de personalidade, do tipo escala, para


medir a inibição do avaliado. O segundo, um teste de raciocínio verbal. O terceiro um
teste projetivo de personalidade. Primeiramente, teríamos escolhido as teorias sobre estas
características, na etapa inicial, já discutida. A segunda seria o desenvolvimento dos itens.
Apenas para facilitar a referência, atribui-se ao teste de personalidade o nome de
INIB, ao teste de raciocínio o de VERB e o teste projetivo o de TRAÇO.
Exemplificativamente, tem-se os itens seguintes para os três testes:

Teste INIB - Exemplo Hipotético

1 - Quando encontro uma pessoa pela primeira vez, tenho tendência de falar bastante e
procurar conhecê-la.

2 – Gosto de falar para grandes públicos.

Teste VERB – Exemplo Hipotético

1 - RODA está para BICICLETA assim como SAPATO está para...

A – CARRO B – CAVALO C – PESSOA

2 – TESTE está para RESULTADO assim como PROVA está para...

A – AVALIAÇÃO B – NOTA C - PECADO

Teste TRAÇO – Exemplo Hipotético

Reproduza os desenhos abaixo à frente do desenho apresentado:

Figura 1 - Testes hipotéticos, para compreensão do funcionamento da validação dos


testes psicológicos
22

Assim, através destes itens, suponha-se que se irá avaliar a inibição, o raciocínio
verbal e a agressividade das pessoas. Após criar os itens, é necessário criar uma forma de
correção.
No caso do primeiro teste hipotético, INIB, será pedido que o avaliado diga o
quanto acha que a frase tem a ver com ele, numa escala de 0 (não tem nada a ver, não me
identifico em nada com a afirmação) a 5 (tudo a ver, me identifico totalmente com a
afirmação). Assim, se um avaliado achar que as duas frases têm mais ou menos a ver com
ele, responderá 3 em ambas as afirmações e ficará com pontuação total 6 no teste. Outro
que ache que tem tudo a ver com ele, responderá 5 em ambas as afirmações e ficará com
pontuação 10. E um que ache que não tem nada a ver, ficará com pontuação 2.
Dessa forma, a escala do teste será de 0 a 10 no caso do teste INIB, com 0 sendo
o mais inibido e 10 sendo o mais desinibido. Esse tipo de teste é chamado de teste de
escala ou teste de inventário e o nome dado a esse tipo de escala de avaliação dos testes
de personalidade é escala Likert. É bastante usual que se apliquem testes com diversos
traços latentes sendo avaliados em conjunto, adotando-se o nome de bateria para esses
testes.
No caso do segundo teste hipotético, VERB, a resposta correta para os itens é 1-
C-PESSOA e 2-B-NOTA. Se a pessoa avaliada anotar essas respostas, ganhará um ponto
por cada resposta correta. Se marcar outra resposta, não ganhará nada. Assim, a pessoa
pode fazer 0, 1 ou 2 pontos. Este é um teste de habilidade específica, que mede o
raciocínio verbal do avaliado.
Por fim, no terceiro teste hipotético, TRAÇO, há um padrão a ser seguido nos
desenhos. Hipoteticamente, aqueles que desenharem com traço muito grosso ou que
fizerem desenhos muito grandes serão considerados como pessoas com tendências altas
à agressividade. Em nenhum momento o teste indica que está avaliando a agressividade
e nem pode haver tal indicação, mas esse é o traço latente avaliado. Esse tipo de teste é
chamado de teste projetivo, posto que o avaliado projeta uma característica de
personalidade na tarefa solicitada, sem que tenha ciência do que está sendo avaliado.
Os exemplos acima ilustram como se criam os testes e as escalas de avaliação. A
próxima etapa é a escolha da amostra de validação, que nada mais é do que as pessoas
nas quais o teste será avaliado. É usual escolher pessoas em uma escola, integrantes de
um curso ou uma amostra selecionada para representar a população. A escolha,
teoricamente, deve ser feita de forma que a amostra seja a mais representativa possível da
população a qual o teste é destinado.
23

Após a escolha, aplica-se o teste as pessoas que foram escolhidas para a amostra.
Com isso, obtém-se uma série de resultados para cada teste. Digamos, por exemplo, que
nossa amostra fosse composta de 3 pessoas: Fulano, Sicrano e Beltrano. Aplicando os
testes INIB tivemos que cada um fez, respectivamente, 2, 5 e 10 pontos. No teste VERB
eles obtiveram 0, 1 e 2 pontos respectivamente. Por fim, no teste TRAÇO somente Fulano
fez traços grossos nos desenhos. Por óbvio, na validação do teste não se usa uma amostra
tão pequena, mas sim mais de cem pessoas, por exemplo.
Com esses resultados, porém, ainda não se poderia concluir muita coisa, já que o
pesquisador nada sabe, a priori, sobre as pessoas que compõe a amostra, de maneira que
seria difícil para ele dizer se Fulano é mais desinibido do que Sicrano, se Beltrano tem
melhor vocabulário do que Fulano ou se Sicrano e Beltrano são menos agressivos do que
Fulano. Para isso, utilizam-se alguns parâmetros para padronizar os resultados. São
exemplos desses parâmetros:
- Desempenho acadêmico: usado principalmente nos testes de inteligência, consiste em
comparar os resultados dos testes com o quão bem os alunos vão nas tarefas escolares,
seja pelas notas, pela avaliação feita pelos professores ou por outro critério que meça essa
característica, como se o avaliado é repetente ou está adiantado nos estudos.
- Desempenho em treinamento específico: após um curso, como no caso de profissões
especializadas, observa-se o desempenho e correlaciona-se com os testes.
- Desempenho profissional: compara-se o desempenho do avaliado com o que ele tem
em seu local de trabalho. Por exemplo, o nível de inibição e relação interpessoal com o
que se observa no dia a dia do trabalho de um vendedor.
- Diagnóstico psiquiátrico: compara-se o resultado do teste com a avaliação psiquiátrica.
Muito comum em testes de personalidade. Assim, observa-se grupos específicos, como
psicopatas e depressivos.
- Diagnóstico subjetivo: usa-se avaliações feitas pelos colegas e amigos a respeito da
pessoa, de forma a comparar com o resultado dos testes. É utilizada esta técnica,
sobretudo, em testes de personalidade, onde é difícil encontrar avaliações mais objetivas.
Assim, os sujeitos avaliam seus colegas em categorias ou dão escores em traços de
personalidade (agressividade, cooperação, etc.), baseados na convivência que eles têm
com os colegas.
- Outros testes: uma forma comum de validação é usar outro teste disponível para
mensurar a mesma característica. Esse método, entretanto, faz com que a validação
depende de uma validação anterior.
24

Assim, quanto ao exemplo hipotético anteriormente apresentado, poder-se-ia


perguntar aos amigos de Fulano, Sicrano e Beltrano se estes são desinibidos e comparar
com suas respostas no teste INIB. Também se poderia usar as notas de língua portuguesa
dos três sujeitos da amostra para comparar com seu resultado no teste de raciocino verbal.
Por fim, poderia ser usado o histórico profissional e acadêmico dos três sujeitos para
verificar seus antecedentes quanto à agressividade.
Após coletar todos os resultados da amostra e os dados dos fatores acima listados
para comparação, o responsável pelo desenvolvimento do teste analisa todos os dados e
usa de técnicas e teorias que permitem que se extrapole os resultados da amostra para a
população. Dessa forma, cria-se uma tabela de resultados, geralmente em percentis.
Exemplificando, após padronizar o teste de inibição, poderia ter se analisado cem
pessoas. Com os resultados, chegar-se-ia a conclusão de que 10% da população apresenta
resultado abaixo de 2 no teste de personalidade, 50% da população abaixo de 6 e 95% da
população abaixo de 9. Portanto, uma pontuação 10 indica uma pessoa muito desinibida,
pois ela tem uma pontuação maior do que 95% da população quando avaliada no teste. Já
uma pessoa com pontuação 1 pode ser caracterizada como inibida, pois menos de 10% da
população apresenta resultado menor do que o dela. A tabela final do teste é algo parecido
com isso, só que, obviamente, mais completa. Geralmente, terminada esta fase há
acertos finais do teste e o pesquisador então o publica, terminando a etapa de
padronização / validação. Depois disso, ele monta o manual do teste. No manual está
explicado a forma de aplicação, o tempo de cada teste e todos os detalhes relevantes. Este
material é de acesso exclusivo dos psicólogos. Antes do teste poder ser usado em
concursos, entretanto, ele precisa ser aprovado. A próxima etapa, assim, é a aprovação do
teste para uso, que será apresentada logo em seguida.

1.2.3 – Aprovação para uso do teste pelo CFP

Diante dos inúmeros questionamentos e representações éticas decorrentes da


utilização de testes psicológicos sem respaldo científico, o CFP editou a Resolução CFP
no 2/2003, que regulamenta os procedimentos para a aprovação dos testes em avaliação
psicológica.
Assim, para ser aprovado para uso, o teste passa pelo crivo do CFP. Normalmente,
isso se faz pela análise do Manual de cada teste, que é enviado para apreciação por uma
25

comissão do órgão. A apreciação se faz pelo que está contido no teste, com base nos
critérios usados para validação, compilação das pesquisas realizadas, etc.
As condições de uso dos instrumentos devem ser consideradas apenas para os
contextos e propósitos para os quais os estudos empíricos indicaram resultados
favoráveis. Ou seja, o teste deve, em princípio, ser usado apenas no contexto para o qual
foi desenvolvido.
É falta ética a utilização de testes psicológicos que não constam na relação de
testes aprovados pelo CFP, salvo os casos de pesquisa. O psicólogo que utiliza testes
psicológicos como instrumento de trabalho deve observar as informações contidas nos
respectivos manuais e buscar informações adicionais para maior qualificação no aspecto
técnico operacional do uso do instrumento, sobre a fundamentação teórica referente ao
construto avaliado, sobre pesquisas recentes realizadas com o teste, além de
conhecimentos de Psicometria e Estatística. Assim, somente podem ser usados, no
contexto dos concursos, testes que sejam referendados pelo CFP.
De forma a facilitar o processo, após aprovado para uso, o teste passa a integrar
uma lista, sob controle do CFP, no chamado Sistema de Avaliação de Testes
Psicológicos (SATEPSI). Logo, existe um número limitado de testes disponíveis para os
psicólogos – e somente esses testes podem ser usados separadamente e de acordo com as
regras dos seus respectivos manuais em concursos públicos.
Todo o processo de validação, começando na teoria, passando pelas pesquisas,
aprovação da tese do teste, publicação do manual do teste e aprovação pelo CFP é custoso
e demorado, de forma que vários anos são necessários para que esse procedimento seja
concluído – de forma que poucos testes seguem até o final do processo, de forma a ter
parecer favorável pelo CFP. Após a validação do teste e aprovação pelo CFP, ele se
encontra disponível para uso. Com esses testes, a banca avaliadora do concurso público
irá passar para a próxima etapa da avaliação psicológica, que é a montagem da avaliação
psicológica (outros usos podem ser dados para os testes, mas este não é o enfoque neste
trabalho). A escolha do teste é apresentada no próximo tópico.

1.2.4 – Escolha do testes e montagem dos critérios de avaliação psicológica pelas


bancas de concurso público

Para que haja avaliação psicológica em concursos públicos atualmente é


necessário que haja previsão em lei desta etapa no concurso (Súmula 686 do STF e Art.
26

14 do Decreto 6944), algo que será mais bem discutido em outra seção deste trabalho.
Isso geralmente ocorre nos cargos de Segurança Pública, como Polícia Federal, Polícia
Rodoviária Federal, Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), Polícias Civis, Militares,
Bombeiros e outros. Sem previsão em lei, a etapa é irregular no concurso público.
Após essa previsão em lei, é necessário que seja fornecido pelo órgão um perfil
profissiográfico do cargo em questão. Esse documento, que é sigiloso, traz, por exemplo,
uma determinação no sentido de que o cargo de Agente da Polícia Federal exige esforço
mental moderado, capacidade de trabalhar sozinho e em equipe, memória auditiva para
nomes, fisionomia e números e etc. Esse documento é a base para o planejamento da
avaliação psicológica pela banca do concurso.
Diante do perfil profissiográfico, a banca de psicólogos da organizadora do
concurso, vai escolher entre os testes com pareceres favoráveis quais são adequados para
avaliar cada atributo desejado para o cargo. Por exemplo, o cargo exige memória para
nomes e fisionomias. Com base nisso, o psicólogo consulta o SATEPSI e descobre que
existem, por exemplo, os testes de nomes/siglas TMV, TEMPLAM, BGFM e MVT para
esse traço latente. Entre esses, a banca poderá escolher um ou mais de um destes para
avaliar a memória visual. Depois ela fará isso com os demais critérios, escolhendo testes
de atenção, raciocínio, memória, personalidade, etc. a depender do perfil do cargo.
Depois de escolhidos os testes, o próximo passo é a fixação dos critérios para
aptidão ao cargo, ou seja, quais serão os resultados necessários nos testes para ser
considerado apto na avaliação para o cargo em questão. Por exemplo, para ser
considerado apto no teste de memória seria necessário ficar acima do percentil 50 (o que
equivale a dizer que a pessoa deve ter melhor pontuação do que 50% da população na
tarefa do teste, de acordo com os critérios de validação). Cada teste é avaliado dessa
maneira.
Depois, cria-se um critério final, geral para todos os testes aplicados. Assim, por
exemplo, para ser aprovado em um cargo específico da Polícia Civil seria necessário ser
aprovado em dois dos três testes de personalidade e em um dos três testes de atenção.
Estes critérios de aprovação, que não são divulgados para os candidatos antes da
avaliação, ficam estabelecidos em documento da banca, que pode ser divulgado ao
candidato no seu laudo, após o resultado final da avaliação psicológica.
Criados estes critérios, após a escolha dos testes a serem usados e dos critérios
para a aptidão, passa-se à próxima etapa da avaliação psicológica, que é a aplicação dos
testes psicológicos.
27

1.2.5 – A aplicação da avaliação psicológica em concursos públicos

Escolhida a banca e determinados os critérios de recomendação, os candidatos são


convocados para serem submetidos à avaliação psicológica do concurso.
Rotineiramente a avaliação é feita em dois horários, em um mesmo dia (de manhã
e à tarde). Quando são usados testes que demandam uma aplicação individual (como o
teste Psicodiagnóstico Miocinético (PMK)), é usual que se empregue mais de um dia de
testes e os candidatos sejam separados em horários diferentes.
Em concursos públicos, é comum que se divida em turmas de 30 alunos
aproximadamente por sala e haja pelo menos dois psicólogos observando a aplicação dos
testes para cada sala, sendo um responsável pela apresentação dos testes e coordenação
do processo. Geralmente são contratados psicólogos apenas para o dia da apresentação,
já que as bancas de concursos, que são terceirizadas pela Administração, não possuem
funcionários suficientes para atender todas as salas. Estes psicólogos são treinados
anteriormente e no dia existe um psicólogo-chefe, funcionário da banca do concurso, que
orienta e supervisiona o processo.
Cada candidato é alocado em uma sala, com a supervisão do psicólogo
responsável pelo processo. Antes do início dos testes o psicólogo se apresenta e mostra
quais testes serão aplicados e quais os tempos que serão usados em cada teste. Isso está
impresso e colado na sala ou escrito na lousa. Como os testes são apresentados pelo seu
nome, que comumente é uma abreviatura, do tipo IFP ou TMV, para o candidato que não
teve contato anterior com os testes tal informação não é de grande valia.
Após explicar que os testes serão aplicados e quais os tempos, é feita uma
explicação, que vem redigida e é lida pelo psicólogo, com uma redação semelhante a esta:
Faremos hoje a avaliação psicológica para o concurso de Perito da Polícia Civil. O
candidato deve responder de acordo com sua personalidade, da maneira mais honesta
possível. Não existem respostas certas, etc.
Depois dessa apresentação inicial, o psicólogo começará a aplicar os testes. É
comum começar com um teste de atenção. Estes testes são rápidos (geralmente 5
minutos), o que faz o candidato aumentar seu nível de atenção para os testes posteriores.
Todos os testes vêm em envelopes lacrados e as folhas são distribuídas para todos os
candidatos antes de o psicólogo começar a explicar o teste. O candidato geralmente
28

escreve seu nome e assina o caderno de teste, de forma a manter uma ligação entre este e
o teste, para o caso de contestação posterior.
As explicações são escritas no Manual do teste e às vezes no próprio caderno que
é entregue ao avaliado. O psicólogo responsável pela avaliação lê o que está escrito e
confirma se todos os candidatos entenderam o que está escrito. Depois de explicado o
teste, o psicólogo dá o sinal e começa a execução. No caso dos testes de atenção, o
candidato tem, por exemplo, 5 minutos para riscar os desenhos selecionados entre outros
na folha. Após o sinal, todos os candidatos devem parar a execução imediatamente.
Após recolherem os testes, passa-se para o próximo teste. Repete-se o
procedimento: entrega dos testes, assinatura do candidato, explicação, perguntas, início
da execução, final da execução, recolhimento do teste.
Testes após testes são aplicados e recolhidos e quando todos os testes planejados
tiverem sido aplicados, a avaliação está encerrada e os cadernos resolvidos pelo avaliado
serão levados para a correção. Assim, esta etapa está encerrada.
Quando há testes de aplicação individual, como o já citado PMK, o protocolo de
aplicação muda um pouco. Ao invés de vários candidatos reunidos em uma sala, cada
candidato entra por vez com o psicólogo, ele lhe explica o teste e faz a aplicação,
recolhendo os resultados ao final.
A próxima etapa é a correção dos testes psicológicos, que é apresentada em
seguida.

1.2.6 – A correção da avaliação psicológica

Para chegar a um resultado final sobre o candidato (apto ou inapto, recomendado


ou não-recomendado), procede-se à correção dos testes realizados na etapa anterior. Essa
correção é feita na maior parte das vezes de forma computadorizada. No caso dos testes
com marcação para leitores óticos (leitura e comparação com gabarito), esse processo é
simplificado. Além disso, existem softwares especiais para leitura de outros testes mais
complexos.
Os resultados dos testes são transferidos para os softwares, nos quais são
confrontados com a escala feita na etapa de preparação, já discutida, e o resultado é
colocado como aprovado ou não em cada escala e em cada teste. Por fim, o software gera
o laudo do candidato, com o seu resultado em cada teste e o resultado é encaminhado para
a publicação pela banca.
29

1.2.7 – A publicação dos resultados da avaliação psicológica

A publicação dos resultados, por força da regulamentação atual, é feita apenas


com o nome dos candidatos considerados aptos/recomendados. Nada pode ser publicado
sobre o resultado negativo do candidato. Porém, já que o nome do candidato não é
publicado na lista, por exclusão é possível saber quais foram os candidatos considerados
inaptos para o cargo.
Quanto aos candidatos não recomendados, a esses é oportunizada uma sessão de
consulta dos motivos da não-recomendação. Para os candidatos aptos, a avaliação termina
nessa etapa. Todos os candidatos de concurso federais podem ter acesso ao laudo do seu
resultado na aptidão psicológica, nos termos do art. 14 do Decreto 6944/2009.

1.2.8 – A sessão de conhecimento das razões de inaptidão e o recurso administrativo


da avaliação psicológica

Na sessão de conhecimentos, que é o momento em que o candidato não-


recomendado terá informações sobre os motivos de sua reprovação, esse pode ser
acompanhado ou não por um psicólogo com registro no CFP.
Caso vá sozinho, o candidato receberá seu laudo, com os resultados. Além disso,
ele terá acesso ao perfil do cargo, onde estarão listadas as características desejadas. O
psicólogo da banca fará uma breve explicação para o candidato das razões de sua não-
recomendação e o candidato poderá fazer questionamentos, mas somente superficiais,
pois não terá acesso aos seus testes. Caso vá acompanhado de psicólogo, o psicólogo
que acompanha o candidato terá acesso aos testes realizados.
Em seguida, há um prazo, geralmente de dois dias, para que o candidato possa
recorrer do resultado da avaliação psicológica. Geralmente, o recurso é feito pela internet.
A resposta sai dentro de alguns poucos dias – e é muito incomum que haja alteração nos
resultados da avaliação por conta do recurso. Após a resposta recursal, somente pela via
judicial o candidato pode continuar no concurso público, já que essa etapa do certame é
eliminatória.
As taxas de sucesso no recurso da avaliação psicológica são praticamente zero.
Estudando os resultados preliminares e definitivos das avaliações psicológicas de
diversos concursos, não se encontrou nenhuma ocorrência de um candidato ser aprovado
30

administrativamente após recorrer do resultado preliminar. Existem casos em concursos


mais antigos nos quais alguns poucos candidatos conseguiram reverter o resultado
administrativamente, mas apenas porque houve um erro na contagem dos pontos nos
testes, ou seja, por erro material, não por uma questão de mérito.
Ainda no que diz respeito aos erros materiais no dia da avaliação, devido à entrega
de cadernos de testes com riscos e anotações, ocorreu de toda a avaliação psicológica ser
reaplicada para todos os candidatos, o caso do concurso da Polícia Civil de Pernambuco
de 2016, que será analisado em outra seção.
Apresentado o modelo atual de avaliação psicológica, com o detalhamento que se
faz necessário para a discussão de sua constitucionalidade, passa-se a apresentação da
regulamentação atual concernente à avaliação psicológica em concursos públicos no
Brasil.
31

2 – MARCO REGULATÓRIO E JURISPRUDÊNCIA RELACIONADA À


AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA EM CONCURSOS PÚBLICOS

As principais normas que regulamentam as avaliações psicológicas em concursos


públicos são o Decreto 6944/2009, as leis de regência das carreiras que exigem avaliação
psicológica para o ingresso, os editais de concurso e as resoluções do CFP. Além disso, a
jurisprudência vem construindo regras importantes para essas avaliações. Nos próximos
tópicos analisar-se-á cada uma dessas normas e os principais entendimentos
jurisprudenciais.

2.1 – Decreto 6944/2009

Esse decreto, que dispõe sobre normas gerais relativas a concursos públicos,
determina, em seus artigos 14 e 14-A, as principais regras aplicáveis ao serviço público
federal. Dessa forma, não se tratam de regras obrigatórias para os Estados, de forma que
nos concursos estaduais é possível que tais normas não sejam seguidas. Já para os
concursos federais que aplicam avaliação psicológica, essas normas são cogentes.
De acordo com BRUM (2010), o Decreto 6944/2009 foi editado devido às
sucessivas demandas judiciais envolvendo a União, tendo como matéria a avaliação
psicológica. Conforme o autor, o governo federal, reconhecendo a forma equivocada
como os testes estavam sendo previstos em edital e aplicados, resolveu regulamentar a
questão. O Decreto 6944/2009 foi alterado pelo Decreto 7308/2010, que alterou algumas
questões pontuais, mas importantes.
O art. 14 desse decreto traz em seu caput a previsão de que somente com previsão
legal específica e em edital pode ser aplicada a avaliação psicológica (o texto original,
antes da promulgação do Decreto 7308/2010 trazia a necessidade de previsão legal
expressa específica, o que era redundante). Assim, somente com lei prevendo a
necessidade da avaliação psicológica e com a previsão em edital pode ser aplicada a
avaliação psicológica. A previsão em edital nunca foi um problema, mas anteriormente
era comum que concursos aplicassem avaliação psicológica sem que houvesse previsão
específica na lei que rege os cargos, o que a jurisprudência já vinha considerando ilegal.
O texto original do Decreto 6944/2009 trazia a previsão de que a avaliação
psicológica deveria se limitar a detecção de problemas psicológicos que pudessem vir a
comprometer o exercício das atividades inerentes ao cargo ou emprego disputado no
32

concurso. Além disso, proibia a aferição de perfil profissiográfico, avaliação vocacional


ou avaliação de quociente de inteligência na avaliação psicológica. Entretanto, com o
Decreto 7308/2010 esses dispositivos foram revogados.
Por outro lado, com o novo decreto foi incluída a norma explicativa do parágrafo
primeiro, que define avaliação psicológica como o emprego de procedimentos científicos
destinados a aferir a compatibilidade das características psicológicas do candidato com
as atribuições do cargo.
O parágrafo segundo do art. 14, por sua vez, estabelece que a avaliação
psicológica será realizada após a aplicação das provas escritas, orais e de aptidão física,
quando houver tais provas. Tal previsão certamente visa diminuir os custos para a
Administração e o número de demandas judicias, já que a etapa de avaliação psicológica
é uma das mais questionadas pelos candidatos em juízo.
Os três parágrafos seguintes, também incluídos pelo Decreto 7308/2010, trazem
normas relativas à forma de aplicação da avaliação psicológica. Há, nesse sentido, a
previsão de que os requisitos psicológicos para o desempenho no cargo deverão ser
estabelecidos previamente, por meio de estudo científico das atribuições e
responsabilidades dos cargos, descrição detalhada das atividades e tarefas, identificação
dos conhecimentos, habilidades e características pessoais necessários para sua execução
e identificação de características restritivas ou impeditivas para o cargo. Esse estudo
científico é o chamado perfil profissiográfico, que foi comentado no tópico 1.2.4. Como
afirmado naquele tópico, tal documento é sigiloso.
Além disso, existem a previsão de que a avaliação psicológica deverá ser realizada
mediante o uso de instrumentos de avaliação psicológica, capazes de aferir, de forma
objetiva e padronizada, os requisitos psicológicos do candidato para o desempenho das
atribuições inerentes ao cargo. Essa é a principal norma do Decreto 6944/2009, já que
estabelece que os testes devem ser objetivos e padronizados, o que impede que, em
concursos federais, sejam usadas técnicas como entrevistas e dinâmicas de grupo na
avaliação psicológica. Tais técnicas ainda continuam sendo utilizadas em alguns
concursos estaduais, a despeito da subjetividade envolvida e dos inúmeros
questionamentos e decisões judiciais no sentido de que a avaliação psicológica em
concursos públicos deve ser objetiva. Por fim, o art. 14 determina que os requisitos
psicológicos devem ser previstos em edital, o que está de acordo com o princípio da
publicidade, pelo menos em tese.
33

O art. 14-A, que foi incluído pelo Decreto 7308/2010, por outro lado, trouxe regras
atinentes à divulgação dos resultados e aos recursos administrativos. Adotando nova
nomenclatura, há a previsão de que somente será publicado se o candidato é apto ou
inapto como resultado da avaliação psicológica (a nomenclatura anterior, usada em
muitos editais, era “recomendado” e “não-recomendado”).
Além disso, estabelece o artigo em questão que todas as avaliações psicológicas
serão fundamentadas e os candidatos poderão obter cópia de todo o processado
envolvendo sua avaliação, independentemente de requerimento específico e ainda que o
candidato tenha sido considerado aptos. Essa previsão é importante, já que no âmbito
estadual, por exemplo, em que não há a regulamentação, é comum que as bancas neguem
acesso aos candidatos aos seus resultados, em direta afronta ao princípio da publicidade.
Quanto aos recursos administrativos da avaliação psicológica, estabelece o art. 14-
A que os prazos e forma de interposição dos recursos serão previstos em edital. Tratando
propriamente da regulamentação dos recursos, primeiramente, há a previsão de que os
profissionais que efetuarem a avaliação psicológica não poderão atuar na análise dos
recursos. Em segundo lugar, prevê-se que o candidato poderá apresentar parecer de
assistente técnico na fase recursal, o que geralmente é feito pelo psicólogo que acompanha
o candidato na sessão de conhecimento das razões de inaptidão, como explicado
anteriormente. Por fim, prevê o art. 14-A que caso no julgamento de recurso se entenda
que a documentação e a fundamentação da avaliação psicológica são insuficientes para
se concluir sobre as condições do candidato, a avaliação psicológica será anulada e
realizado novo exame, o que é certamente necessário para que haja legalidade na
avaliação.
Em resumo, o principal diploma sobre avaliação psicológica traz os requisitos
essenciais para a legalidade da avaliação psicológica no atual modelo: previsão em lei da
carreira em questão, previsão em edital, uso de instrumentos psicológicos objetivos e
cientificamente aprovados, possibilidade de recurso administrativo e acesso do candidato
aos resultados de sua avaliação.

2.2 - Leis de regência das carreiras que exigem avaliação psicológica para o ingresso

Como visto no tópico anterior, para que possa ser aplicada a avaliação psicológica
em concursos do Executivo Federal é necessário que haja previsão na lei que rege os
cargos que estão sendo disputados. Nesse sentido, os principais órgãos federais nos quais
34

há essa etapa possuem normas autorizadoras da avaliação psicológica. Já nos Estados não
existe a necessidade de obediência ao Decreto 6944/2009, mas é comum, inclusive por
conta dos questionamentos judiciais, que as leis estaduais tenham tais previsões. Na
verdade, em respeito ao princípio da legalidade é possível se afirmar que a aplicação de
avaliação psicológica sem que haja lei instituindo tal etapa no concurso é totalmente
inconstitucional, de forma que, a despeito do Decreto 6944/2009 e sua abrangência,
sempre deveria existir tal previsão.
Como exemplos de leis que instituem a avaliação psicológica, temos que a Lei
4878/1965 estabelece no art. 9º, inciso VII, que um dos requisitos para matrícula no curso
de formação da Polícia Federal é “possuir temperamento adequado ao exercício da função
policial, apurado em exame psicotécnico realizado pela Academia Nacional de Polícia”.
Essa lei, que se encontra em franca desatualização, afirma que a avaliação psicológica
deve ser realizada pela Academia Nacional de Polícia, o que na prática não ocorre, já que
o processo de seleção é terceirizado para as bancas de concursos públicos.
No âmbito da Polícia Rodoviária Federal, a lei que disciplina a questão é a Lei
9654/1998, que em seu artigo 3º estabelece que o ingresso nos cargos da carreira de
Policial Rodoviário Federal “dar-se-á mediante aprovação em concurso público,
constituído de duas fases, ambas eliminatórias e classificatórias, sendo a primeira de
exame psicotécnico e de provas e títulos e a segunda constituída de curso de formação”.
Por outro lado, para os cargos da Agência Brasileira de Inteligência a lei que
normatiza a questão é a Lei 11766/2008, que determina no art. 14 que uma das etapas do
concurso é a avaliação psicológica. Como uma lei mais recente, a lei da ABIN utiliza a
expressão “avaliação psicológica”, ao invés de “exame psicotécnico” – que é expressão
antiga e em desuso.
Além dessas três carreiras citadas, ainda no Executivo federal há previsão de
avaliação psicológica para ingresso nos quadros do Departamento Penitenciário Nacional
(DEPEN). Inicialmente não havia tal previsão na lei que criou os cargos do órgão, mas
com a alteração legislativa, a Lei 11907, a avaliação psicológica passou a ser prevista,
como uma das etapas, em conjunto com provas escritas, prova de aptidão física, e
investigação para verificação dos antecedentes pessoais do candidato. Nesse caso, o
legislador utilizou o termo “aptidão psicológica”.
Por fim, também para ingresso nos quadros de oficiais das Forças Armadas é
necessária a aprovação em avaliação psicológica, mas com diferenças em relação ao
modelo dos demais concursos, que é aqui analisado.
35

No caso do Exército, a Lei 12705/2012 estabelece no art. 2º que a matrícula no


curso de formação de oficiais e sargentos depende de aprovação em concurso, no qual
uma das etapas é “ser aprovado em avaliação psicológica, realizada com o emprego de
procedimentos científicos destinados a aferir a compatibilidade das características
psicológicas do candidato com a carreira militar”.
Semelhante regulamentação é aplicada para a Aeronáutica, através da Lei
12464/2011, que estabelece no art. 20 que o ingresso nessa força se dá por aprovação
“em processo seletivo, que pode ser composto por exame de provas ou provas e títulos,
prova prático-oral, prova prática, inspeção de saúde, teste de avaliação do
condicionamento físico, exame de aptidão psicológica e teste de aptidão motora”.
Ainda no que se refere às Forças Armadas, a Lei 12704/2012 alterou a Lei
11279/2006 estabelecendo entre os requisitos para ingresso na Marinha “ser aprovado em
avaliação psicológica, realizada com o emprego de procedimentos científicos destinados
a aferir a compatibilidade das características psicológicas do candidato com a carreira
militar”.
Logo, as três forças armadas possuem a previsão de avaliação psicológica e os
moldes da avaliação são semelhantes. Por outro lado, os oficiais temporários e os praças,
advindos da prestação de serviço militar, não se submetem à avaliação psicológica. A
avaliação psicológica nas carreiras militares, como já afirmado, possui regramento
próprio. No caso da Aeronáutica, por exemplo, as normas reguladoras estão previstas na
NSCA 38-13, de 2012, que estabelece que a Divisão de Seleção (IPA) aplicará o Exame
de Aptidão Psicológica (EAP) aos ingressantes, por meio de testes psicológicos, provas
situacionais, testes informatizados, entrevistas e outras técnicas avaliativas. Após o
resultado, caso o avaliado seja considerado inapto, seu caso é submetido aos psicólogos
do Conselho Técnico (CONTEC) que reavaliarão o caso e darão o parecer final. Portanto,
o processo é diverso tanto na forma de avaliação como nas etapas, de forma que não será
objeto do presente trabalho.
Pelo que consta, esses são os únicos cargos do Executivo federal para os quais há
previsão em lei para avaliação psicológica. Cargos que também possuem possibilidade
de obtenção de porte de arma, por previsão expressa do art. 6º da Lei 10826/2003
(Estatuto do Desarmamento), como Auditor da Receita Federal, Auditor-fiscal do
Trabalho e Analista Tributário não possuem necessidade de avaliação psicológica para
ingresso no órgão, mas para obter o porte efetivamente precisam se submeter a avaliação
com psicólogo credenciado, nos termos da Lei 10826/2003. Já o Ministério Público não
36

possui regulamentação sobre o assunto, sendo que os concursos para o Parquet não têm
aplicado essa etapa nos seus certames.
Por outro lado, também os membros da Magistratura devem se submeter a
avaliação psicológica. A previsão está contida na Resolução 75 do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), que em seu artigo 5º determina que uma das etapas do concurso para
ingresso na Magistratura é o “exame psicotécnico”. Entretanto, diversamente dos
concursos anteriormente citados, a avaliação psicológica nesse concurso é feita por um
psicólogo ou psiquiatra, contratado pelo próprio candidato e às suas expensas, que o
avalia pessoalmente, sem a necessidade de testes padronizados. Por conta disso, o modelo
de avaliação psicológica para esses cargos não é o que este trabalho está analisando.
Portanto, a previsão de avaliação psicológica para ingresso em algumas carreiras
federais está em lei. Entretanto, somente alguns poucos cargos (Polícia Federal, Polícia
Rodoviária Federal, Departamento Penitenciário Nacional e Agência Brasileira de
Inteligência) o processo de avaliação psicológica é realizado pelo método que está sendo
analisado nesse trabalho.
Na esfera estadual, por outro lado, os concursos de Polícias Civis e Militares,
Corpos de Bombeiros Militares, Polícias Técnicas, órgãos penitenciários e outros órgãos
de segurança possuem avaliação psicológica, que deve ser prevista em lei estadual.
Tomando como exemplo o estado do Amapá, há previsão de avaliação psicológica para
ingresso na Polícia Civil na Lei 883/2005 (Lei Orgânica da Polícia Civil do Amapá), art.
32, que estabelece que um dos requisitos para ingresso no curso de formação dessas
carreiras é o exame psicológico, de caráter objetivo. Semelhante previsão, como já
afirmado, deve estar contida em lei estadual, de forma a permitir a avaliação psicológica
nos concursos. Assim, por exemplo, não há previsão de avaliação psicológica para os
quadros da Polícia Técnico-Científica do Amapá (POLITEC) na Lei estadual 1468/2010,
de forma que não é possível essa etapa nos concursos para esse órgão.
No âmbito estadual, entretanto, os concursos não se sujeitam ao Decreto
6944/2009, como comentado no tópico anterior. Assim, cada estado da federação deve
regulamentar a avaliação psicológica de seus concursos.
37

2.3 – Editais de concursos públicos

A avaliação psicológica, caso prevista em lei, deve ser aplicada de acordo com as
normas previstas no edital do concurso. Assim, as normas sobre avaliação psicológica
citadas nos tópicos anteriores são complementadas pelos editais.
Cada concurso possui um regramento e edital próprio para sua avaliação
psicológica. Está previsto no âmbito federal que os requisitos para a avaliação psicológica
sejam previstos no edital. Esses requisitos, em regra, são copiados do perfil
profissiográfico do cargo. Como cada órgão produz seu perfil profissiográfico e como
cada banca de concurso tem sem próprio método de trabalho, os editais costumam variar
bastante. Exemplo disso são os editais das Polícias Civis, Militares, Federal e Rodoviária
Federal.
Começando pela Polícia Federal, o último concurso realizado foi o de 2014, para
o cargo de Agente de Polícia Federal, organizado pela banca Centro de Seleções e
Promoções de Eventos – Universidade de Brasília CESPE (atualmente também
denominada por Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de
Eventos - CEBRASPE). De acordo com o edital de abertura desse concurso, em seu anexo
IV, os requisitos para o desempenho do cargo são “características de personalidade,
capacidade intelectual e habilidades específicas, definidas em consonância” com o estudo
científico realizado pela Polícia Federal. Percebe-se, portanto, que a Polícia Federal
sequer lista quais são esses requisitos, apenas remetendo ao perfil profissiográfico, que é
um documento sigiloso do órgão. Semelhantemente, a Polícia Rodoviária Federal teve
seu último certame em 2013, também com o CESPE e os requisitos para aprovação na
avaliação psicológica foram os mesmos acima citados, com mera remissão ao perfil
profissiográfico. Assim, esses editais meramente repetem as previsões do Decreto
6944/2009 e não trazem os requisitos para ingresso no cargo, apenas fazendo remissão a
um documento sigiloso.
Saindo do âmbito federal, nos concursos estaduais temos uma grande quantidade
de concursos, já que cada estado da federação possui seus próprios órgãos de segurança
pública. Usando novamente o Amapá como exemplo, no ano de 2017 foram lançados
concursos para as Polícias Civil, Técnica e Militar. Todos esses concursos foram
organizados pela Fundação Carlos Chagas (FCC).
Assim, para a Polícia Civil do Amapá, os requisitos para ingresso nos cargos são
listados no item 15.3 do edital de abertura, sendo alguns deles: controle emocional de
38

médio a superior, ansiedade de inferior a média, inteligência de média a superior,


responsabilidade superior, fobias inferior e agressividade média. Tais características são
previstas de forma idêntica para todos os cargos da Polícia Civil: delegado, oficial e
agente.
Já para a Polícia Técnico-Científica (POLITEC/AP), não há previsão de avaliação
psicológica para os cargos de Perito Médico Legista e Perito Médico Legista com
especialização em Psiquiatria, conforme o edital de abertura do concurso, seguindo o que
já foi afirmado anteriormente – não há previsão dessa avaliação na lei da carreira.
Por outro lado, para os cargos da Polícia Militar há previsão de que os requisitos
para a avaliação psicológica serão disponibilizados quando da convocação para essa etapa
(o concurso se encontra em fevereiro de 2018 ainda na etapa do resultado das provas
objetivas), mas cita que os requisitos estão de acordo com o Decreto estadual 2511/2009.
Esse decreto, por sua vez, determina que os critérios para a avaliação psicológica são,
comparando com os listados acima para a Polícia Civil e dentre outros, controle
emocional adequado, ansiedade diminuída, inteligência mediana, maturidade adequada,
fobias ausentes e agressividade levemente elevada.
Utilizando o exemplo de outro estado, o concurso de Delegado da Polícia Civil do
Pará, realizado pela Fundação Professor Carlos Augusto Bittencourt (FUNCAB), prevê
que os requisitos para ser considerado apto na avaliação psicológica são, dentre outros,
estabilidade emocional entre 2 e 4, ansiedade entre 2 e 4, inteligência verbal entre 3 e 5 e
não-verbal entre 2 e 5, capacidade de organização entre 2 e 4, estabilidade emocional
entre 2 e 4 e agressividade entre 2 e 4.
Os exemplos acima mostram de que forma as bancas normatizam a avaliação
psicológica. Somente por esses exemplos já se nota que não existe nenhuma uniformidade
no critério de avaliação entre os diversos concursos, algo que será discutido
posteriormente nesse trabalho.

2.4 – Normativos do Conselho Federal de Psicologia

Além das normas da Administração, também o CFP possui normativos que são
importantes para a aplicação das avaliações psicológicas.
Nesse contexto, a mais importante norma dessa autarquia é a Resolução CFP
1/2002, que regulamenta a avaliação psicológica em concursos públicos e processos
seletivos da mesma natureza. Dentre outras previsões, essa resolução afirma que no
39

processo de avaliação psicológica devem ser usados testes definidos com base no perfil
profissiográfico do cargo, ser incluído “nos instrumentos de avaliação, técnicas capazes,
minimamente, de aferir características tais como inteligência, funções cognitivas,
habilidades específicas e personalidade”, “proceder à análise conjunta de todas as técnicas
utilizadas, relacionando-as ao perfil do cargo e aos fatores restritivos para a profissão” e
“seguir sempre a recomendação atualizada dos manuais técnicos adotados a respeito dos
procedimentos de aplicação e avaliação quantitativa e qualitativa”.
Além disso, determina a Resolução CFP 1/2002 que o edital do concurso deve
conter informações, em linguagem compreensível ao leigo, sobre a avaliação psicológica
a ser realizada e os critérios para essa, relacionando-os aos aspectos psicológicos
considerados compatíveis com o desempenho esperado para o cargo em questão.
Por outro lado, os testes aplicados pela banca devem ser de acordo com os
requisitos da Resolução CFP 2/2003. Dentre outros requisitos, os testes devem estar de
acordo com referências, como os documentos da International Test Comission (ITC) e
outros, como o documento Guidelines for Educational and Psychological Testing
publicado pela Canadian Psychological Association. Além disso, estabelece essa
resolução alguns requisitos para os testes de inventário, escalas, projetivos, etc. tais como
fundamentação teórica, evidências empíricas de validade e precisão das interpretações,
apresentação de um manual de aplicação e correção, etc.
De forma a deixar claro quais os testes que podem ser usados na avaliação
psicológica e fortalecer as determinações da Resolução CFP 2/2003 foi criado o chamado
Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI), que lista os instrumentos de
avaliação psicológica com parecer favorável e desfavorável para uso. Em tese, assim,
somente os testes listados como favoráveis podem ser aplicados em avaliações
psicológicas de concursos.

2.5 – Jurisprudência relacionada à avaliação psicológica

Além das normas citadas acima, também as decisões judiciais e a jurisprudência


se consolidaram de forma a regulamentar a avaliação psicológica em concursos públicos.
Nesse quadro, por exemplo, o entendimento jurisprudencial de que a avaliação
psicológica sigilosa, irrecorrível e subjetiva é nula de pleno direito. Nesse sentido, o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nos autos do Recurso Especial
442.964/PR (relator Ministro Fernando Gonçalves, Sexta Turma, DJe 4/8/2003):
40

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. EXAME PSICOTÉCNICO.


CARÁTER SIGILOSO, IRRECORRÍVEL E SUBJETIVO. NULIDADE.
1. É nula de pleno direito a disposição editalícia, contendo previsão de exame
psicotécnico sigiloso, irrecorrível e subjetivo. 2. Provimento jurisdicional,
decretando a nulidade do exame não implica em suprimir uma fase do certame,
mas em consignar a sua total falta de aptidão para produzir efeitos.
Estabelecendo os requisitos mínimos para a avaliação psicológica ser considerada
legal, temos outro entendimento do mesmo STJ, no agravo regimental no recurso de
mandado de segurança 25571/MS:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE
SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. AGENTE PENITENCIÁRIO.
CANDIDATO REPROVADO EM EXAME PSICOTÉCNICO.
LEGALIDADE. PREVISÃO LEGAL. CRITÉRIOS OBJETIVOS. PODER
DE REVISÃO. RECURSO DESPROVIDO.
1. O exame psicotécnico tem sua legalidade subordinada a três pressupostos
necessários: sua previsão legal; a cientificidade dos critérios adotados, (de
modo a afastar a possibilidade teórica do arbítrio); e o poder de revisão, (para
o fim de evitar qualquer forma de subjetivismo que viole o princípio da
impessoalidade na Administração). 2. Esse entendimento tem contado com o
beneplácito da jurisprudência desta Corte, que admite a exigência de aprovação
em exame psicotécnico para preenchimento de cargo público, desde que
claramente previsto em lei e pautado em critérios objetivos, possibilitando ao
candidato o conhecimento da fundamentação do resultado, a fim de
oportunizar a interposição de eventual recurso. 3. Os requisitos de
objetividade, publicidade e recorribilidade foram devidamente respeitados
pelo certame, e atendidos pela Comissão Organizadora, o que atesta a
legalidade do referido exame. 4. Agravo Regimental desprovido.
Semelhante entendimento adota o Superior Tribunal Federal, como se verifica em
diversas decisões. Percebe-se que a jurisprudência vem repetir o que já consta nas normas
anteriormente citadas. Entretanto, o que ocorre é o inverso: a jurisprudência construiu, ao
longo dos anos, o entendimento dos requisitos necessários para a avaliação psicológica,
que foram sendo normatizados, como mostrados nos tópicos anteriores.

2.6 – Conclusão quanto aos aspectos legais e jurisprudenciais

Do exposto, pode-se concluir que as leis devem determinar a avaliação psicológica


para os cargos, de forma que essa etapa possa ser aplicada. Além disso, para ser válida a
avaliação psicológica deve ser aplicada de acordo com critérios científicos e objetivos, de
41

acordo com o perfil profissiográfico do cargo e com as resoluções do CFP. Além disso,
deve a avaliação ser aplicada nos termos do edital do concurso, que deve trazer os
requisitos para ser considerado apto na avaliação e as regras dessa etapa. Por fim, o
resultado deve ser recorrível.
Observando apenas essas questões, entretanto, não se pode concluir pela
constitucionalidade ou inconstitucionalidade desse modelo de avaliação, já que o que está
previsto e o que ocorre de fato muitas vezes andam distanciados. Dessa maneira, a
próxima seção fará uma revisão crítica da literatura de forma a analisar quais as críticas
que a avaliação psicológica e os testes psicológicos têm recebido.
42

3 – REVISÃO CRÍTICA DA LITERATURA NACIONAL E ESTRANGEIRA


SOBRE AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA

De acordo com MANCINI (2006), revisões da literatura são caracterizadas pela


análise e pela síntese das informações disponibilizadas em estudos relevantes publicados
sobre um determinado tema, de forma a resumir o corpo de conhecimento e levar a
conclusões sobre o assunto de interesse. Segue ainda afirmando a autora que a revisão é
importante como técnica para o aprimoramento de uma área de conhecimento.
Portanto, a presente seção apresentará uma revisão crítica sobre a avaliação
psicológica, trazendo os principais questionamentos apresentados sobre o tema, tanto na
literatura nacional quanto estrangeira.

3.1 – Literatura jurídica nacional

Como afirmado na introdução desse trabalho, poucos são os estudos jurídicos com
a devida profundidade sobre a avaliação psicológica como etapa de concursos públicos.
Entretanto, alguns trabalhos apresentam importante questões a serem consideradas.
Destaca-se, nesse sentido, o trabalho de SANTOS (2011). Em aprofundado artigo,
o autor, tece diversas considerações sobre o assunto em tela. Em primeiro lugar, afirma o
autor que a avaliação psicológica muitas vezes reprova candidatos em concursos públicos,
sem que esses saibam, muitas vezes, com clareza os motivos de sua reprovação,
impedindo-os de adentrar na promissora carreira no serviço público. De acordo com o
autor, a falta de recursos financeiros agrava essa situação, posto que dificulta o acesso
desses candidatos ao Judiciário.
Em segundo lugar, afirma o autor que os testes psicológicos carecem de adequada
reflexão jurídica. Para complicar tal situação, a linguagem da Psicologia, que é destinada
aos seus iniciados, não se preocupa em fazer a ponte com o Direito, além de dificultar o
acesso aos testes psicológicos pelos profissionais do Direito. Isso transforma os testes
psicológicos em verdadeiras “caixas-pretas” que” precisam ser juridicamente
desvendadas sob pena de se amesquinhar direitos e garantias fundamentais”.
De acordo com SANTOS (2011, p. 5):
O tema é fascinante e, em certa medida, nos remete à novela O Alienista, do
genial Bruxo do Cosme Velho. Afinal, a missão de dizer quem é normal e
quem é louco sempre desafiou o ser humano tanto na literatura como no
43

Direito. Guardadas as (in) devidas proporções, os testes psicológicos nos


concursos públicos visam justamente dizer quem está apto (normal) e quem
está inapto (louco) para ingressar no serviço público brasileiro.
Ainda de acordo com SANTOS (2011), para o candidato que foi eliminado, pior
do que a reprovação em si mesma considerada e a desclassificação do certame, é saber
que sua eliminação se deu não por suposta falta de capacidade ou de estudo, mas porque
não está apto psicologicamente para trabalhar, porque não se adequa aos padrões de
normalidade exigidos, porque algo dentro do seu ser não está como deveria ser.
Nesse mesmo raciocínio, SANTOS (2011) afirma que quanto mais o candidato se
insurge contra os testes ou mesmo quanto à inadequação das condições ambientais
relativas à sua aplicação - o que naturalmente o destaca dentre a massa amorfa de
candidatos, que nada questiona - mais estará sujeito a ver seu grau de “agressividade”
exacerbado pelos avaliadores. Assim, o autor considera esse cenário com a clássica
situação onde quanto mais o paciente nega sua condição de louco, mais a afirma perante
seus médicos.
Para o autor, é plenamente possível que o Judiciário analise a estrutura interna dos
testes – sua eficácia, resultados e forma de aplicação – quando no contexto dos concursos
públicos, dada a ampla sindicabilidade dos atos administrativos. Assim, não pode o
Judiciário limitar-se ao simples reconhecimento dos testes como válidos pelo Conselho
Federal de Psicologia para afirmar sua aplicabilidade no contexto dos concursos públicos,
podendo atuar ativamente com a solicitação de laudos especializados, que possam aferir
a validade dos construtos dentro do contexto em questão.
Para SANTOS (2011), há um perigo em se permitir que a avaliação psicológica
em concursos seja tratada apenas como um assunto da Psicologia, já que há diversos
aspectos jurídicos a serem considerados. Nesse sentido, afirma esse que o problema surge
quando tais testes ficam à margem da análise de qualquer outro profissional que não o da
psicologia, que queira acessar e entender seu conteúdo, enfrentando extrema dificuldade
de obtê-los (para não dizer impossibilidade). Igualmente grave, para o autor, é a falsa
premissa que isso é assunto para psicólogos e ninguém mais, sob o débil argumento que
ao descobrir-se o segredo da “caixa-preta” os testes perderiam sua eficácia.
Além disso, para SANTOS (2011) a constituição nada fala sobre avaliação
psicológica como etapa de concurso, de forma que não poderia ser aplicada como
verdadeira etapa do certame, como ocorre no processo atualmente empregado. Afirma,
além disso, que as discussões jurídicas sobre a avaliação psicológica não foram
44

adequadamente desenvolvidas no Brasil e que as resoluções do Conselho Federal de


Psicologia são insuficientes para normatizar o assunto, já que não são fonte formal do
Direito.
Ainda de acordo com SANTOS (2011), o debate jurídico sobre a avaliação
psicológica em concursos públicos é paupérrima e a normatização deficiente, de forma
que a avaliação psicológica deveria se limitar a mensurar a higidez psíquica dos
candidatos, sem jamais adentrar na análise de sua personalidade e adequação ao cargo
público. Portanto, qualquer teste psicológico que afirme a inadequação ao perfil do cargo
seria inconstitucional, por apresentar uma visão reducionista da personalidade humana.

Além disso, segue o referido autor afirmando que os “testes psicológicos devem
levar em conta os resultados das provas aplicadas nos concursos públicos quando
existirem coincidência de aptidões a serem mensuradas”. Assim, caso tenha havido uma
avaliação de língua portuguesa e uma redação, nas quais o candidato foi aprovado, seria
ilegal posteriormente afirmar que o candidato é inadequado ao cargo por ter raciocínio
verbal inadequado. Da mesma maneira, um engenheiro que tirou altas notas em
matemática ou física não poderia ser considerado posteriormente inapto por ter baixo
raciocínio abstrato. Por fim, a própria aprovação em um concurso com muitos candidatos
já seria um indicativo de que o candidato não possui baixa inteligência, de forma que a
avaliação psicológica por si só não poderia ser usada como conclusão nesse sentido.
Ainda analisando o estudo do autor, esse afirma que a realização de testes
psicológicos nos concursos deve considerar o tipo de função a ser exercida e não pode
invadir a esfera psíquica e dos direitos da personalidade dos candidatos, nas atividades
que não sejam periculosas ou que intrinsecamente não exijam tais testes. Assim, a
avaliação psicológica não poderia ser aplicada em carreiras que não apresentam riscos
para a sociedade, sob pena de irrazoável invasão da privacidade dos cidadãos envolvidos.
Outro destaque de SANTOS (2011) é a exigência de adequação a perfis
profissiográficos para aprovação na avaliação psicológica, sem a devida divulgação de
tais perfis e sem a devida publicidade dos critérios adotados para o ingresso nos cargos.
Assim, deveriam os editais de concurso, em respeito aos princípios constitucionais, trazer,
pelo menos, informações sobre os percentis de corte dos testes, tempo de aplicação,
critérios para aprovação na avaliação psicológica e nos testes psicológicos aplicados. Isto
porque ao deixar para a banca avaliadora a fixação de tais critérios, que poderia ocorrer
posteriormente ao teste, restariam violados os princípios da publicidade, impessoalidade,
45

isonomia, legalidade, igualdade, vinculação ao instrumento convocatório e segurança


jurídica.
Por fim, outra conclusão do autor é de que os testes psicológicos devem ser
aplicados em condições ambientais adequadas, sob pena de comprometimento da
precisão e fidedignidade do teste, conforme a exigência do artigo 1º, §2º, da Resolução
CFP nº 01/2002.
Apresentando visão menos crítica sobre a avaliação psicológica, DOUGLAS
(2009) defende a manutenção da avaliação psicológica em concursos públicos e seu
aprimoramento. Entretanto, o autor afirma que ainda são várias as falhas do atual modelo.
Em primeiro lugar, várias são as carreiras que possuem amplos poderes que não se
submetem a esse tipo de avaliação. Assim, outras carreiras deveriam ser submetidas a tal
avaliação, inclusive a de advogado.
Em segundo lugar, para DOUGLAS (2009) outra falha é a ausência de critérios
prévios para a avaliação psicológica, o que fere o princípio da segurança jurídica. Nesse
sentido, critica DOUGLAS (2009) a forma como muitas bancas apresentam os critérios
para a avaliação psicológica, apenas fazendo remissão a estudos científicos sigilosos. Tal
questão já foi apreciada anteriormente nesse trabalho, no tópico 2.3. De acordo com o
autor, a questão do edital da Polícia Rodoviária Federal, que trazia tal previsão, foi
judicializada, sendo considerada inválida a previsão editalícia, por ausência dos critérios
de avaliação.
Em seu trabalho de conclusão de curso, BRUM (2010) apresenta interessante
síntese sobre a avaliação psicológica em concursos públicos, trazendo muitas das
questões discutidas no presente trabalho. Além das questões acima já apresentadas, o
autor traz à discussão outros pontos importantes: a necessidade de aproveitamento de
avaliações psicológicas para os casos de candidatos que já exercem funções nas quais
foram anteriormente avaliados nesse sentido (o que o autor chama de “aproveitamento de
psicotécnico”) e as consequências da anulação da avaliação psicológica para os concursos
em andamento.
O que se percebe da literatura jurídica nacional é, portanto, a presença de pontuais
críticas ao modelo atualmente empregado de avaliação psicológica. Com poucas
exceções, a maior parte dos autores concorda com a possibilidade de avaliação
psicológica como eliminatória nos concursos públicos, desde que prevista em lei, aplicada
com requisitos prévios divulgados e que haja possibilidade de recursos. Minoritariamente
46

a posição de SANTOS (2011) e outros poucos autores, no sentido de que apenas a higidez
psíquica poderia ser avaliada, por ausência de lei e aprofundamento jurídico da questão.
Devido ao distanciamento entre os campos da Psicologia e Direito, citado por
SANTOS (2011), e à falta de conhecimentos da área por parte dos operadores de Direito,
é praticamente inexistente a literatura nacional que trate dos resultados das avaliações e
da forma de aplicação dos testes psicológicos, o que demonstra o quão raso ainda é o
debate da questão em nosso país.
Um dos poucos trabalhos que discute tais resultados é o de SANTOS, A (2016).
Nesse trabalho, o autor, que é o delegado responsável pelo processo de seleção de
candidatos da Polícia Federal, afirma que o modelo atual de avaliação psicológica é
deficiente, pois há muitas restrições a aplicação de entrevistas e testes projetivos. De
acordo com o autor, os candidatos estariam atualmente se preparando para as avaliações
psicológicas, de forma a apresentar respostas socialmente desejadas, através de acesso a
materiais na internet e por meio de treinamento com psicólogos. Assim, entende que as
restrições à avaliação psicológica deveriam ser diminuídas, indo em sentido contrário ao
entendimento jurisprudencial e doutrinário atualmente dominante.
Também seguindo entendimento minoritário, ZÉFIRO (2012) entende que a
avaliação psicológica deve ser aceita como constitucional e legal, devendo, inclusive, seu
resultado ser plenamente acatado pelo Judiciário, que não poderia adentrar no mérito do
profissional da Psicologia.

3.2 – Literatura da área de Psicologia nacional

Diante da conclusão sobre a falta de literatura sobre o assunto no meio jurídico,


necessário se faz buscar no campo da Psicologia mais subsídios para o enfrentamento da
questão em tela.
Inicialmente, vale destacar o trabalho de NORONHA (2004). Em seu artigo, a
autora afirma que em 2004 somente 28,8% dos instrumentos de avaliação psicológica
tinham estudos de precisão, validade e padronização. Segue a autora afirmando que nessa
época havia muitos questionamentos nas comunidades científicas e profissionais
brasileiras. Conclui a autora que a Psicologia brasileira se caracterizava por despender
pouca atenção aos fundamentos científicos de sua prática profissional.
47

A mesma autora, em artigo de 2002, realizou estudo de forma a identificar os


problemas mais graves e mais frequentes no uso dos testes psicológicos, utilizando como
amostra um total de 214 psicólogos inscritos no Conselho Regional de Psicologia da 6ª
Região. Como interessantes conclusões deste estudo, NORONHA (2002) demonstra que
existe grande crítica aos testes psicológicos pelos profissionais da área, em especial no
que se refere a aplicação indiscriminada e mecânica de tais testes, com supervalorização
do lado quantitativo e com o uso de apenas um instrumento de avaliação como resultado
definitivo. Além disso, o estudo de Noronha mostrou que existia má formação dos
psicólogos na área de psicometria, bem como desconhecimento ou preconceito para com
o uso de testes psicológicos no Brasil.
Além disso, de acordo com ANDRIOLA (1996), citando PASQUALI, os
instrumentos de avaliação psicológica brasileiros necessitam de revisões sistemáticas
visando a atualização de seu conteúdo, melhor determinação dos parâmetros
psicométricos do teste e elaboração de normas regionalizadas para apuração dos
resultados.
Nesse mesmo sentido, NOFFS (2002) ressalta o problema do uso de testes
estrangeiros traduzidos sem a adequada padronização e adaptação à realidade nacional.
Assim, é importante a aplicação de testes que sejam adequados ao Brasil, não sendo
recomendável a mera introdução no mercado nacional de testes estrangeiros.
Também é importante o artigo de THADEU (2012) no qual as autoras discutem
as especificidades da avaliação psicológica em processos seletivos no contexto da
segurança pública. Esse trabalho apresenta as principais técnicas utilizadas nesses
processos para, posteriormente, deter-se nos aspectos mais específicos da avaliação
psicológica em seleção de pessoal na área da segurança pública. Como conclusões, as
autoras afirmam que, no quadro atual, é necessário um maior investimento em evidências
de validade de instrumental e de processos aplicados, de forma a assegurar resultados de
medidas ou testes que sejam bons preditores do desempenho em um trabalho de grande
risco, como o da área de segurança pública.
Por outro lado, FAIAD (2014) afirma que são escassos os testes para aplicação no
contexto de seleção para cargos públicos. Além disso, existem outras dificuldades: faltas
de instrumentos que contemplem em suas amostras participantes da área de segurança
pública, poucos investimentos nessa área e a exposição de instrumentos de avaliação na
internet.
48

Ainda no que se refere à avaliação psicológica no contexto da segurança pública,


FAIAD (2012) afirma que um dos principais desafios enfrentados na área de avaliação
psicológica no contexto de segurança pública no Brasil, bem como na continuidade dos
processos que antecedem ou sucedem essa fase nas instituições, consiste da escassez ou
ausência de pesquisas científicas e documentos válidos que deem base para um
conhecimento real do cargo demandado.
Portanto, o que se nota é uma má qualidade dos instrumentos de avaliação
psicológica no Brasil, sendo que muitos dos testes não possuem adequada validação,
principalmente dentro do contexto de aplicação em concursos públicos.
Por outro lado, independentemente da qualidade dos testes psicológicos aplicados
no Brasil, é certo que os testes psicológicos e a avaliação psicológica não são infalíveis.
Nesse sentido, LINS (2017), em recente livro sobre avaliação psicológica, afirma que
apesar de a avaliação psicológica ser um procedimento amplo de coleta de dados, com
métodos e técnicas padronizadas, deve-se ressaltar que o processo possui um limite em
relação ao que é possível alcançar e prever. Para a autora, deve-se combater o pensamento
de que por meio da avaliação psicológica o psicólogo pode responder a qualquer tipo de
questionamento.
Ainda de acordo com LINS (2017), a avaliação psicológica deve ser diferenciada
da testagem psicológica, pois é um processo mais amplo e que leva em consideração
diversas questões, não apenas a aplicação de testes psicológicos. Assim, não se pode
privilegiar um resultado em um teste sobre o aspecto global da avaliação. Além disso, a
simples aprovação de um teste pelo Conselho Federal de Psicologia não significa que esse
teste possa ser usado em qualquer contexto, sendo necessário se verificar se o teste
escolhido é aplicável a uma determinada amostra a qual o examinando se assemelha.
De forma ainda mais clara, LINS (2017) afirma que a mera testagem psicológica,
que é o que ocorre em processos seletivos para concursos públicos, não é suficiente para
avaliar um sujeito, já para isso se deve levar em consideração o contexto, ponderando
inclusive os seus determinantes biopsicossociais. Logo, a avaliação psicológica somente
seria adequada, para a autora, caso envolvesse entrevistas, observação e dinâmicas, além
da testagem psicológica, sendo esta última com testes projetivos, gráficos e
psicométricos.
Quanto aos testes em si, LINS (2017) afirma que nem todos os testes aprovados
para uso no SATEPSI possuem evidências de validade de critério. Por isso, o psicólogo
49

responsável pela avaliação psicológica precisa ter conhecimento adequado para a seleção
do teste a ser empregado.
ANDRIOLA (2017, p. 35-44) apresenta outra questão essencial com relação à
avaliação psicológica: a presença do chamado funcionamento diferencial do item (DIF).
Resumindo as ideias do autor, o DIF nada mais é do que o viés que existe em testes
psicológicos, favorecendo, nos testes de inteligência verbal, por exemplo, um grupo
social em detrimento de outro. Ao usar nos testes elementos que são próprios de um grupo
determinado, os testes criam um viés que favorecerá esse grupo nos resultados dos testes,
em detrimento de outros grupos sociais. O foco do artigo é na análise no meio
educacional, mas as reflexões do autor são perfeitamente válidas no contexto da avaliação
em concursos. Segundo o autor, a presença do DIF é uma fonte de injustiça nos processos
seletivos, pois fazem com que não haja isonomia, pois os sujeitos que possuem o mesmo
grau na variável latente ou construto medido pelo item provavelmente irão obter melhores
resultados, vez que têm maiores probabilidades de acerto, pelo método de padronização.
De acordo com o autor, as pesquisas sobre a presença de DIF nos testes psicológicos é
ainda muito recente e necessita de aprofundamentos.
Outra questão essencial no que diz respeito à avaliação psicológica em concursos
é a adequada aplicação dos testes e a isonomia do processo seletivo. Nesse sentido,
FAIAD (2012) afirma a existência de sítios de internet que divulgam testes psicológicos
e orientações de como proceder nessas avaliações. Além disso, THADEU (2012) destaca
que há psicólogos que realizam treinamentos para candidatos que se submeterão à
avaliação em concursos públicos.
Confirmando esse cenário, GUARIENTI (2013) demonstra que em São Miguel
do Oeste/SC um total de 92 pessoas de uma amostra de 139 participantes de avaliação
psicológica para obtenção de Carteira Nacional de Habilitação já tinham conhecimento
prévio dos testes que seriam aplicados. Desses, em 38% dos casos os testes tinham sido
revelados por psicólogos.
Diante dessa situação, o próprio Conselho Federal de Psicologia lançou uma
campanha pela não banalização dos testes psicológicos, no ano de 2013. Segundo o CFP,
recentemente, vários instrumentos de avaliação psicológica estão sendo divulgados em
redes sociais e canais do YouTube.
Portanto, o que se nota nas publicações da área de psicologia é que, ao contrário
do que possa parecer ao leigo, existem muitas dificuldades inerentes ao processo de
avaliação psicológica, principalmente no Brasil, em que a preparação em psicometria
50

ainda é deficiente e os estudos adequados ao contexto local são poucos. Quando se analisa
os testes diretamente ligados aos concursos públicos, essa dificuldade apenas aumenta.
Alia-se a isso as diversas dificuldades na aplicação da avaliação psicológica em
concursos, como o conhecimento prévio dos testes pelos candidatos e esse é o quadro
atual desse tipo de avaliação que é representado pelos especialistas da área em nosso país.

3.3 – Literatura estrangeira

Ao contrário do Brasil, outros países há tempos vêm discutindo a questão da


avaliação psicológica em processos seletivos para cargos públicos. CREECH (1948), por
exemplo, há mais de meio século discutia como o Congresso americano deveria tratar a
questão da avaliação psicológica, de forma a não ferir os direitos fundamentais garantidos
pela quinta emenda constitucional daquele país. Para esse autor, mesmo quando um
interesse público superior pode garantir uma invasão da privacidade pessoal, a intrusão
deve ser acompanhada por completas salvaguardas para os indivíduos afetados.
Em 1992, STEIN publicou extensa reportagem no jornal Chicago Tribune a
respeito das avaliações psicológicas em seleção para órgãos policiais americanos. De
acordo com o autor, as críticas à avaliação psicológica para seleção de policiais existiam
desde que essas técnicas começaram a ser usadas por volta da década de 1960. Para o
autor, existe séria divergência dentre os profissionais da Psicologia a respeito da exatidão
dos testes psicológicos. Segundo a reportagem, Bill Geller, do Police Executive Research
Forum, entidade de pesquisa situada em Washington, afirmou que uma pesquisa da época
havia demonstrado como os testes usados para predizer comportamento agressivo dos
policiais eram “terrivelmente inadequados”. Além disso, muitas das psicólogas
entrevistadas pelo autor, que tinham diversos anos de experiência na aplicação de testes
psicológicos, demonstram que não acreditavam que os testes psicológicos poderiam
predizer acuradamente quem seria um bom policial. Uma delas, Katherine Ellison,
afirmou que as evidências eram muito claras no sentido de que os testes não eram capazes
de predizer o comportamento a longo prazo, pois a personalidade não é estável e depende
do meio em que se vive. Além disso, muitos profissionais afirmaram que a grande
dificuldade é que os testes eram criados para o contexto clínico, não para a seleção de
policiais.
Tais questões não foram ainda solucionadas adequadamente. Em artigo mais
recente e de bastante repercussão, DANTZKER (2011) afirma que os tipos de construtos
51

usados para a seleção de candidatos para os órgãos policiais nos Estados Unidos carecem
de consistência e padronização, havendo necessidade de criação de testes específicos para
este campo de conhecimento.
MARK (2014), por sua vez, demonstra que há inconsistência na avaliação
psicológica para ingresso nos órgãos policiais americanos, sendo que nem todos órgãos
policiais estariam seguindo as diretrizes da International Association of Chiefs of Police
(IACP), que visam a padronização das avaliações psicológicas. Assim, muitos candidatos
estariam sendo eliminados de um processo seletivo e sendo admitidos em outros. Nesse
mesmo sentido, JANY (2017) relata críticas à falta de transparência e às injustas
desclassificações nos processos seletivos da polícia de Minneapolis.
Portanto, é certo que em outros países há intenso debate sobre a avaliação
psicológica em concursos públicos. Os detalhes de como essa avaliação é realizada em
outros países são apresentados em outra seção deste trabalho.
Além disso, como afirmado anteriormente, a maior parte dos testes psicológicos
brasileiros são copiados e adaptados de outros países. Assim, é certo que o conhecimento
da área de psicometria é mais avançado nesses lugares. Portanto, é importante também
uma breve análise de alguns pontos que a literatura estrangeira da área de psicologia traz.
Com relação a isso, POPE (2010) lista diversas dificuldades na testagem
psicológica. Entre elas, o autor cita a questão do uso de um teste em contexto diferente
daquele que no qual sua validade foi apurada; a tendência de confirmação, a troca entre
acurácia retrospectiva e preditiva (em breve explicação, acreditar que o resultado em um
teste signifique uma condição, pois a maior parte das pessoas que a possuem apresentam
o mesmo resultado, ignorando que outras condições possam levar ao resultado em
questão); o uso de testes padronizados sem a padronização necessária na aplicação;
ignorar os efeitos dos falsos negativos e falsos positivos (comentar-se-á adiante essa
questão com mais detalhes); interpretar de forma errônea ocorrências com altas
porcentagens, associando que essas ocorrências tenham necessariamente relação entre si;
considerar que as condições de aplicação dos testes são perfeitas, quando não as são, na
verdade; ignorar os efeitos econômicos relacionados ao financiamento das pesquisas
(sejam eles propositais ou não) no resultado dessas; ignorar os efeitos ambientais nos
resultados das pesquisas (como a presença de pessoas estranhas ao processo, gravação
em vídeo, etc.) e a necessidade de sigilo com relação aos dados sensíveis obtidos com as
avaliações psicológicas.
52

O texto acima é apenas um exemplo das dificuldades que são apontadas na


literatura estrangeira para a avaliação psicológica, sendo que a testagem psicológica não
é de forma alguma uma unanimidade ou um método totalmente amadurecido também
nesses países. Foge ao escopo deste trabalho maior aprofundamento com relação aos
conceitos envolvidos na avaliação psicológica do que os já apresentados, aprofundamento
este que pode ser encontrado nas referências apresentadas e nas referências usadas por
estes autores.

3.4 – Conclusão da revisão literária

Da breve revisão da literatura apresentada, pode-se concluir que tanto no Brasil


quanto em outros países existem questionamentos, tanto teóricos quanto práticos, tanto
jurídicos quanto no próprio campo da Psicologia. Tal quadro é de certa forma esperado,
quando se observa que a ciência da Psicologia é relativamente recente. No Brasil,
principalmente, há necessidade de aprofundamento e aprimoramento técnico na área de
psicometria, de forma a trazer maior qualidade aos instrumentos de avaliação psicológica.
Da mesma forma, o próprio processo de avaliação psicológica, especialmente no contexto
dos concursos públicos, demanda amadurecimento e investimentos, de forma a obter os
melhores resultados, tanto para a Administração quanto para os administrados. Nesse
sentido, e em adição a presente seção, a próxima parte deste trabalho mostrará algumas
questões essenciais concernentes à forma de aplicação da avaliação psicológica no atual
modelo, bem como aos resultados dessas avaliações.
53

4 – ANÁLISE DOS RESULTADOS DA AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA NO


ATUAL MODELO

Após observar o que a literatura traz sobre o tema, é importante a realização de


uma análise dos resultados que a avaliação psicológica tem apresentado no atual modelo.
Para tanto, sem entrar em minúcias dos testes em si, que, em última análise, são material
de caráter privativo do profissional de psicologia, é possível ponderar o método atual e
os resultados apresentados na avaliação psicológica, através da análise de casos
concretos. Antes, entretanto, é preciso uma breve digressão sobre a teoria relacionada aos
erros, que é de fundamental compreensão para o bom entendimento do assunto.

4.1 – Teoria dos erros e sua aplicação no contexto da avaliação psicológica

Segundo SKOOG (2004), as medidas invariavelmente apresentam erros. Apenas


alguns deles são causados pelos equívocos do responsável pela análise dos resultados.
Outra parte dos erros são causados por padronizações e calibrações malfeitas. Outra parte
ainda é resultado das variações aleatórias e as incertezas presentes em todas as medidas.
Desse modo, é impossível realizar uma medida sem a presença de erros. Assim, pode-se
apenas minimizar os erros e estimar a grande dentro de uma faixa razoável, nunca
extinguir os erros totalmente nas medidas. Logo, em todas as medidas há a presença de
uma faixa de erro, pois todas medidas são influenciadas por muitas incertezas, que se
combinam para produzir uma dispersão de resultados.
Assim, o que ocorre nas medidas quantitativas é a estimativa de um intervalo de
confiança para o valor que está sendo medido, através de um método estatístico qualquer
(distribuições normais, t de Student, etc.) que indique qual é a faixa de erros aleatórios
presentes. Através do chamado teste de hipóteses, afirma-se, portanto, que o valor de uma
medida é, por exemplo, de 5,0 +/- 0,1 unidades (cinco mais ou menos zero vírgula um
unidades), a um nível de confiança de 95% - e não 5 unidades exatamente. Isso significa
que caso se realize a medida 100 vezes espera-se que a medida caia dentro dessa faixa de
valores em 95% dos casos. Logo, não é possível se afirmar com plena certeza o valor de
uma medida.
Já que não é possível plena certeza, os erros são um fato. Existem dois tipos de
erros possíveis. O primeiro é rejeitar a hipótese nula quando essa é verdadeira. No
exemplo anterior, esse erro equivaleria a dizer que o valor da medida é 4,0 (fora da faixa
54

de confiança estabelecida, portanto), quando na verdade ele é 5,0 (dentro da faixa


estipulada). Esse tipo de erro é conhecido como erro do tipo I ou falso negativo.
O segundo tipo de erro é aceitar a hipótese nula quando ela é na verdade falsa.
Assim, por exemplo, ao se afirmar que o valor da medida é 4,97 (dentro da faixa esperada)
quando na verdade ele é 4,0 estamos cometendo esse tipo de erro. Esse segundo tipo de
erro é chamado de erro do tipo II ou falso positivo.
Utilizando um exemplo afeito ao campo jurídico, que é interessante no contexto
em tela, SKOOG (2004) afirma que as consequências de se cometer erros nos testes de
hipóteses são frequentemente comparadas aos erros cometidos nos procedimentos
judicias. Assim, condenar um inocente seria um falso positivo, enquanto inocentar um
culpado seria um falso negativo. No campo jurídico, condenar um inocente é considerado,
usualmente, mais sério do que inocentar um culpado. A princípio, portanto, deveríamos
tentar tornar a chance de falsos positivos a menor possível. Ocorre, entretanto, que os dois
tipos de erros são diretamente relacionados. Dessa forma, ao tentar diminuir as chances
de falsos positivos, aumentamos as chances de falsos negativos.
Portanto, é necessário sempre se ponderar as consequências dos erros quando na
determinação da faixa de confiança de qualquer medida. Aplicando tal teoria às
avaliações psicológicas, é preciso ponderar as consequências dos falsos positivos e falsos
negativos. No caso dos falsos positivos, teremos, em tese, a admissão nos cargos públicos
de uma pessoa que não possui o perfil adequado (há, entretanto, outros métodos de
resolver a questão dos falsos positivos, como se comentará em seção posterior deste
trabalho). Por outro lado, no modelo atual um falso negativo equivale à eliminação do
candidato que tinha plenas condições de exercer o cargo, restando para esse apenas à via
judicial, sempre incerta com a atual jurisprudência sobre o assunto.
Ao leigo no assunto pode parecer que a teoria acima apresentada não se aplica à
avaliação psicológica, já que esta trata de pessoas e não de objetos quantificáveis.
Entretanto, a psicometria é exatamente uma forma de “tornar exata” a disciplina da
Psicologia, utilizando justamente dos métodos de estatística. Não por menos, termos
como padronização e calibração são usados na psicometria. Assim, plenamente aplicável
a teoria dos erros apresentada.
Apresentada a questão dos erros, como avaliar a extensão da existência desses
dentro da avaliação psicológica? Ora, para que os resultados dos testes psicológicos sejam
válidos, espera-se, pelo menos, que eles: 1 – apresentem resultados semelhantes quando
aplicados em diferentes amostras de pessoas, que pertençam ao mesmo contexto para o
55

qual foram desenvolvidos, 2 – apresentem resultados semelhantes a outros testes que


avaliam a mesma característica, quando aplicados nas mesmas pessoas, 3 – apresentem
resultados semelhantes quando aplicados à mesma pessoa em diversas ocasiões e 4 – seus
resultados sejam coerentes com a característica observada. Para ver que todas essas
qualidades são desejáveis, basta pensar em uma balança, por exemplo, que indicasse
pesos diferentes a cada medida ou que indicasse maior peso a um objeto que claramente
fosse mais leve do que outro.
Portanto, para analisar a extensão dos erros dentro da avaliação psicológica, é
suficiente analisar os quatro quesitos acima apresentados, que é o que será feito nos
próximos tópicos.

4.2 – Análise da coerência dos resultados das avaliações psicológicas quando


comparadas em concursos diversos

O primeiro aspecto a ser analisado é se as avaliações psicológicas apresentam


resultados coerentes quando analisados concursos diversos. Para realizar tal análise,
utilizar-se-á os dados de SANTOS, A. (2016). Em artigo no periódico Policing Advance
Acess, de 13 de fevereiro de 2016, o autor, responsável pela Divisão de Planejamento e
Execução de Seleção de Pessoal da Polícia Federal, lista os índices de candidatos
aprovados e reprovados nos diversos concursos da Polícia Federal desde 2004. Os dados,
extraídos da tabela 3 do trabalho do autor, são apresentados a seguir.
56

Tabela 1 - Quantidade de candidatos recomendados e não-recomendados nos concursos


da Polícia Federal e porcentagem de não-recomendação
Ano Cargo Recomendados Não-recomendados % Não-recom.
2004 Delegado 1259 312 19,9%
2012 Delegado 148 10 6,3%
2004 Perito 1440 374 20,6%
2012 Perito 184 12 6,1%
2004 Agente 4094 778 16,0%
2009 Agente 472 83 15,0%
2012 Agente 826 123 13,0%
2014 Agente 860 109 11,2%
2004 Escrivão 1092 300 21,6%
2009 Escrivão 863 148 14,6%
2012 Escrivão 588 29 4,7%
2004 Papiloscopista 511 62 10,8%
2012 Papiloscopista 138 14 9,2%

Percebe-se que os dados oscilam entre um mínimo de 6,1% a um máximo de


20,6% de candidatos eliminados. Contando todos os candidatos, temos uma média de
15,8% de candidatos não-recomendados (um total de 2354 candidatos, contra 12475
candidatos que foram recomendados).
Para determinar qual a porcentagem da população que é considerada recomendada
nas avaliações da Polícia Federal, considerar-se-á que os resultados de candidatos
recomendados sejam, por convenção, igual a 1 e os resultados de não recomendação
sejam 0. Com esses dados, podemos calcular uma média de aprovação e intervalo de
confiança para esse valor, considerando o teste t de Student de duas caudas, pois a
quantidade de candidatos é pequena frente à população brasileira e por ser possível tanto
que a avaliação subestime quanto superestime o total de candidatos recomendados.
Considerar-se-á o número de graus de liberdade igual a 3, pois o desvio-padrão da
avaliação psicológica dos candidatos avaliados não deve ser muito diferente do desvio-
padrão da população e que o intervalo de confiança será de 95%, o que resulta no valor
de 3,18 para a variável t. A próxima tabela apresenta os valores resultantes desses
cálculos.
57

Tabela 2 - Cálculo do intervalo de confiança para a recomendação de um candidato nas


avaliações do concurso da Polícia Federal
Desvio- Número de Valor do
Concurso Média Padrão avaliados Raiz de N intervalo
Delegado 2004 0,801 0,399 1571 39,6 0,032
Delegado 2012 0,937 0,244 158 12,6 0,062
Perito 2004 0,794 0,405 1814 42,6 0,030
Perito 2012 0,939 0,240 196 14,0 0,055
Agente 2004 0,840 0,366 4872 69,8 0,017
Agente 2009 0,850 0,357 555 23,6 0,048
Agente 2012 0,870 0,336 949 30,8 0,035
Agente 2014 0,888 0,316 969 31,1 0,032
Escrivão 2004 0,784 0,411 1392 37,3 0,035
Escrivão 2009 0,854 0,354 1011 31,8 0,035
Escrivão 2012 0,953 0,212 617 24,8 0,027
Papiloscopista
2004 0,892 0,311 573 23,9 0,041
Papiloscopista
2012 0,908 0,290 152 12,3 0,075

O que esta tabela mostra é a porcentagem de pessoas avaliadas que são


recomendadas nas avaliações psicológicas. Assim, por exemplo, existe 95% de chances
de a população brasileira ter 80,1% +/- 3,2% de pessoas com perfil para o cargo de
delegado, de acordo com a avaliação realizada em 2004. Por outro lado, em 2012 a
avaliação indicou que essa porcentagem é de 93,7% +/- 6,2%. Tabelando esses valores,
temos a próxima tabela.
58

Tabela 3 - Intervalos de confiança com 95% de probabilidade, para a porcentagem da


população brasileira recomendada para os cargos da Polícia Federal
Concurso Intervalo de confiança (%)
Delegado 2004 79,9 ± 3,2
Delegado 2012 93,0 ± 6,5
Perito 2004 79,2 ± 3,0
Perito 2012 93,3 ± 5,7
Agente 2004 84,0 ± 1,7
Agente 2009 84,6 ± 4,9
Agente 2012 86,8 ± 3,5
Agente 2014 88,6 ± 3,3
Escrivão 2004 78,2 ± 3,5
Escrivão 2009 85,1 ± 3,6
Escrivão 2012 95,2 ± 2,7
Papiloscopista 2004 88,9 ± 4,2
Papiloscopista 2012 89,7 ± 7,9

Sem maiores cálculos, percebe-se facilmente uma incoerência nos resultados. Ora,
se a população brasileira é relativamente constante em suas características (não é razoável
supor que a população tenha passado por uma mudança importante em cerca de dez anos,
de forma que o perfil psicológico foi alterado) as diferenças nos resultados somente
podem ser atribuídas à qualidade da avaliação psicológica aplicada em cada ano. Assim,
por exemplo, o concurso de Escrivão da Polícia Federal em 2004 considerou que cerca
de 78% da população seria recomendada para o cargo. Já em 2012 a avaliação realizada
pelo mesmo órgão (e pela mesma banca – CESPE) considerou que 95% da população
seria recomendada.
Sem ficar apenas na observação superficial dos resultados, para analisar se há
diferenças estaticamente significativas entre as diversas avaliações, podemos usar a
chamada análise de variância (ANOVA), que permite a comparação entre as diversas
médias de recomendação obtidas, conforme os resultados das tabelas anteriores.
Usaremos para esse método a hipótese nula de que todas as médias de resultados obtidos
são idênticas, o que equivale a dizer que todas as avaliações obtiverão resultados
coerentes entre si. A hipótese alternativa é de que pelo menos duas das avaliações
realizadas foram diferentes, com resultados significativamente diversos.
59

Para realizar tal cálculo, será utilizado o software EXCEL ®, versão 2013, com
sua ferramenta Anova de fator único. Será usado o valor de significância de 0,05, o que
equivale a 95% de confiança. Os resultados são mostrados na tabela a seguir.

Tabela 4 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos


concursos da Polícia Federal
Anova: fator único

RESUMO
Grupo Contagem Soma Média Variância
Delegado 2004 1571 1259 0,8014 0,159259
Delegado 2012 158 148 0,936709 0,059663
Perito 2004 1814 1440 0,793826 0,163757
Perito 2012 196 184 0,938776 0,057771
Agente 2004 4872 4094 0,840312 0,134215
Agente 2009 555 472 0,85045 0,127414
Agente 2012 949 826 0,87039 0,11293
Agente 2014 969 860 0,887513 0,099937
Escrivão 2004 1391 1091 0,784328 0,169279
Escrivão 2009 1011 863 0,85361 0,125083
Escrivão 2012 617 588 0,952998 0,044865
Papiloscopista 2004 573 511 0,891798 0,096663
Papiloscopista 2012 152 138 0,907895 0,084176

ANOVA
Fonte da variação SQ gl MQ F valor-P F crítico
Entre grupos 27,31503 12 2,276253 17,26731 2,03E-37 1,752825
Dentro dos grupos 1952,979 14815 0,131824

Total 1980,294 14827

Para que se conclua que a hipótese nula é verdadeira, ou seja, que todas as
avaliações realizadas possuem resultados coerentes entre si, seria necessário que o valor
F calculado fosse menor do que o valor crítico de F. Na tabela acima vemos que o F
calculado foi de 17,26731 enquanto o valor de F crítico é de 1,752825. Portanto, o valor
de F calculado é cerca de 10 vezes maior do que o valor crítico, o que mostra, sem sombra
de dúvidas, que as avaliações não podem ter sido realizadas com a mesma qualidade entre
os diversos concursos analisados.
60

Pode-se argumentar que a diferença é porque os cargos possuem diferentes perfis


profissiográficos. Para testar essa hipótese, a próxima tabela analisa apenas os concursos
para o cargo de Agente, que foram em maior quantidade no período em questão. O
resultado é mostrado a seguir.

Tabela 5 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos


concursos de Agente da Polícia Federal
Anova: fator único

RESUMO
Grupo Contagem Soma Média Variância
Agente 2004 4872 4094 0,840312 0,134215
Agente 2009 555 472 0,85045 0,127414
Agente 2012 949 826 0,87039 0,11293
Agente 2014 969 860 0,887513 0,099937

ANOVA
Fonte da variação SQ gl MQ F valor-P F crítico
Entre grupos 2,205101 3 0,735034 5,813608 0,000579 2,606119
Dentro dos grupos 928,147 7341 0,126433

Total 930,3521 7344

Mesmo comparando apenas um dos cargos, o valor de F é ainda mais do que o


dobro do valor crítico (5,813608 contra 2,606119). Assim, observando apenas os
concursos de Agente é 95% certo que as avaliações psicológicas realizadas não tiveram
o mesmo nível de qualidade na apuração da recomendação para o cargo.
Usando apenas o cargo de Delegado, os valores são ainda mais incisivos nesse
sentido, como se pode observar na Tabela 6.
61

Tabela 6 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos


concursos de Delegado da Polícia Federal
Anova: fator único

RESUMO
Grupo Contagem Soma Média Variância
Delegado 2004 1571 1259 0,8014 0,159259
Delegado 2012 158 148 0,936709 0,059663

ANOVA
Fonte da variação SQ gl MQ F valor-P F crítico
Entre grupos 2,628381 1 2,628381 17,49863 3,02E-05 3,846849
Dentro dos grupos 259,404 1727 0,150205

Total 262,0324 1728

Aqui temos um valor de F de 17,5 aproximadamente, contra um valor crítico de


3,8 aproximadamente, o que equivale a cerca de 4,5 vezes mais do que o valor esperado.
Portanto, também as avaliações para o cargo de Delegado não foram realizadas com o
mesmo nível de exigência entre os dois concursos. Semelhantes resultados são
encontrados para o cargo de Perito (F calculado de 24,21725 contra F crítico de 3,846094)
e Escrivão (F calculado de 47,8 contra 2,99 esperados). Somente para o cargo de
Papiloscopista os valores encontrados para as avaliações são significativamente
semelhantes (F calculado de 0,33 contra F crítico de 3,85).
Na verdade, o que muda é a avaliação e não os cargos. Para comprovar tal
afirmação, as próximas tabelas apresentarão os resultados dos testes de análise de
variância para as avaliações que foram realizadas no mesmo dia (por exemplo, as
avaliações para os cargos de Agente e Papiloscopista, que ocorreram na mesma data).
62

Tabela 7 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos


concursos da Polícia Federal realizados em 2009
Anova: fator único

RESUMO
Grupo Contagem Soma Média Variância
Agente 2009 555 472 0,85045 0,127414
Escrivão 2009 1011 863 0,85361 0,125083

ANOVA
Fonte da variação SQ gl MQ F valor-P F crítico
Entre grupos 0,003578 1 0,003578 0,028413 0,866162 3,847411
Dentro dos grupos 196,9217 1564 0,125909

Total 196,9253 1565

Tabela 8 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos


concursos da Polícia Federal realizados em 2012
Anova: fator único

RESUMO
Grupo Contagem Soma Média Variância
Papiloscopista 2012 152 138 0,907895 0,084176
Agente 2012 949 826 0,87039 0,11293

ANOVA
Fonte da variação SQ gl MQ F valor-P F crítico
Entre grupos 0,184288 1 0,184288 1,691035 0,193737 3,849934
Dentro dos grupos 119,7685 1099 0,10898

Total 119,9528 1100


63

Tabela 9 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos


concursos da Polícia Federal realizados em 2014 (embora o edital seja de 2012, a
avaliação somente se realizou dois anos depois)
Anova: fator único

RESUMO
Grupo Contagem Soma Média Variância
Delegado 2012 158 148 0,936709 0,059663
Escrivão 2012 617 588 0,952998 0,044865
Perito 2012 196 184 0,938776 0,057771

ANOVA
Fonte da variação SQ gl MQ F valor-P F crítico
Entre grupos 0,051971 2 0,025985 0,521112 0,594026 3,005023
Dentro dos grupos 48,26935 968 0,049865

Total 48,32132 970

Como se pode notar nas tabelas 7, 8 e 9, quando se analisam as avaliações


psicológicas realizadas no mesmo dia, é 95% certo que o nível de exigência foi idêntico
para todos os candidatos avaliados, sendo que os valores de F calculados são da ordem
de seis vezes menor do que o valor crítico.
Portanto, com base nessa análise pode-se concluir que as avaliações psicológicas
realizadas para ingresso na Polícia Federal possuem diferentes níveis de exigência para
recomendação para os cargos, a depender do ano da aplicação da avaliação.
Seria temerário extrapolar esses resultados para outros concursos
indiscriminadamente. Porém, podemos analisar as avaliações de outros órgãos. Para
tanto, usando os dados da Polícia Rodoviária Federal temos a tabela de análise de
variância mostrada abaixo. Os métodos de produção desse resultado são os mesmos
descritos anteriormente e detalhados para o concurso da Polícia Federal, sendo que os
dados foram obtidos do artigo de SANTOS, A. (2016), citado no início dessa subseção.
64

Tabela 10 - Resultado da análise de variância para as avaliações psicológicas dos


concursos da Polícia Rodoviária Federal
Anova: fator único

RESUMO
Grupo Contagem Soma Média Variância
PRF 2002 1029 832 0,808552 0,154946
PRF 2003 6676 5465 0,818604 0,148514
PRF 2013 3127 2851 0,911736 0,080499

ANOVA
Fonte da variação SQ gl MQ F valor-P F crítico
Entre grupos 19,94305 2 9,971526 77,00581 0 2,996561
Dentro dos grupos 1402,253 10829 0,129491

Total 1422,196 10831

Os valores falam por si só: o valor calculado para F é simplesmente mais de 25


vezes maior do que o valor crítico para 95% de confiança. Logo, é ainda mais certo que
as avaliações psicológicas do concurso da Polícia Rodoviária Federal não tiveram o
mesmo nível de exigência ao longo dos anos.
Portanto, as duas maiores forças policiais do Brasil apresentam resultados
incoerentes quando se avalia mais de uma avaliação psicológica desses órgãos. Assim, é
certo que as avaliações psicológicas apresentam resultados incoerentes entre si, quando
se analisam as testagens realizadas em anos diversos. Esse comportamento não é o
esperado, já que a população brasileira e os níveis de exigência para o ingresso nos órgãos
não mudaram ao longo de apenas dez anos.

4.3 – Análise da coerência dos resultados entre os testes que compõe as avaliações
psicológicas quando comparadas entre si

Uma das exigências para a validação de um teste psicológico é de que ele


apresente resultados semelhantes a outros testes que avaliam a mesma característica (o
chamado traço latente da Teoria de Resposta o Item, citado no tópico 1.2.1). Estudos de
validação de testes psicológicos sempre apresentam análise estatísticas para comprovar
que os resultados são semelhantes.
65

Entretanto, na prática dos concursos públicos não é o que se observa sempre. É


difícil realizar uma análise mais aprofundada nesse sentido, pois os laudos de avaliação
psicológica são fornecidos apenas para os candidatos que foram avaliados. Porém, na
internet é possível encontrar exemplos de laudos de algumas avaliações realizadas, que
permitem uma análise qualitativa desses resultados. Um sítio eletrônico de nome
Segredos do Psicotécnico, de autor desconhecido, postou um arquivo com laudos de
diversos concursos que permite essa análise. O endereço eletrônico para consulta desse
material está nas referências.
Observando, por exemplo, o laudo disponibilizado do concurso da PRF realizado
em 2002 (página 6 do arquivo), por exemplo, observa-se que o traço latente Ordem é
avaliado tanto no teste chamado Escala de Personalidade Comrey (CPS) quando no teste
Inventário Fatorial de Personalidade Revisado (ICFP-R). No mesmo dia de avaliação, o
candidato obteve um percentil de menos de 18 no teste CPS e outro de 50 no IFP-R. Logo,
para um teste o candidato teria mais “Ordem” do que 18% da população, enquanto para
outro teria mais do que 50%. São valores certamente díspares. Nesse mesmo laudo
observa-se que o candidato foi reprovado por ter assertividade baixa no teste Escala de
Assertividade Rathus (RAS) (página 8), mas aprovado na dinâmica de grupos por ter
iniciativa e dinamismo (página 7).
Em outro laudo, para Agente da Polícia Federal (página 41) o candidato foi
classificado como tendo autonomia na média da população (percentil 50) e baixa
dependência (percentil 25), sendo que as duas características são, ao que consta,
diretamente relacionadas. Esse mesmo candidato foi classificado como tendo um
percentil de apenas 5% em agressividade e de 30% em outro teste que foi aplicado para
medir o mesmo traço latente.
De forma semelhante, um candidato ao cargo de Agente da Polícia Civil do
Distrito Federal (página 106) obteve um percentil de 80% em autonomia e outro de 80%
em dependência – o esperado era algo próximo a 20% em uma das duas medidas. Esse
mesmo candidato foi considerado, no mesmo dia e na mesma avaliação, como sendo mais
agressivo do que 80% da população em um teste e do que 60% em outro teste (20% de
diferença pode ser a diferença entre ser aprovado ou não nas escalas desse tipo de teste –
ressalte-se que em um dos testes havia um valor mínimo para agressividade, enquanto no
outro teste esse valor não existia).
Em outro concurso, para o cargo de Agente da Polícia Civil de Pernambuco
(páginas 112), o candidato foi classificado como tendo mais do que percentil 98% em
66

estabilidade emocional, o que o colocaria como sendo uma pessoa mais estável
psicologicamente do que quase todos os demais. Entretanto, a mesma avaliação
psicológica determinou que esse candidato possuía índices de 10% de percentil para
depressão e de 20% para ansiedade.
Já no laudo do concurso de Investigador da Polícia Civil da Bahia (página 125), o
candidato foi considerado em um teste como sendo mais agressivo do que 70% da
população, enquanto outro teste o considerou mais agressivo do que apenas 10% da
população.
O material analisado apresenta outros laudos, mas a maior parte deles teve os
percentis de resultado apagados pelo autor do arquivo, o que prejudica a avaliação.
Entretanto, por essa pequena amostra é possível se observar que, no contexto dos
concursos públicos, cada teste pode levar a resultados muito diversos, mesmo avaliando
idêntico candidato e no mesmo dia. Essa é a provável razão para a diversidade de
resultados entre as diversas avaliações, que foi determinada no tópico anterior: a depender
dos testes escolhidos pela banca, os resultados são diferentes.
Estudos mais detalhados da correlação entre os resultados nos testes e validações
com amostras mais significativas de candidatos poderiam trazer mais dados no sentido
dos aqui apresentados – o que permitiria o aprimoramento de tais testes, inclusive.
Ainda nesse ponto, deve-se destacar que também pode ocorrer de um teste,
inicialmente considerado válido para uso ser posteriormente não mais recomendado pelo
CFP. Foi o que aconteceu com o teste Psicodiagnóstico Miocinético – PMK. Esse teste
foi aplicado como critério praticamente único para avaliação no concurso da Polícia
Federal de 2009. Assim, muitos candidatos que foram aprovados nos outros testes de
personalidade daquele concurso e não foram aprovados no PMK foram eliminados na
avaliação psicológica, pois era condição obrigatória ser aprovado nesse teste apenas.
Algum tempo depois, o CFP realizou novos estudos e entendeu pela não-recomendação
desse teste para uso. Os candidatos que foram eliminados pelo teste, entretanto,
continuaram fora do serviço público e nenhum tipo de repercussão causou esse fato. O
caso do PMK ilustra bem como a avaliação psicológica, que deveria ser um processo
integrado de observações, dinâmicas, entrevistas e avaliação conjunta dos resultados pelo
profissional da área, na prática se limita a correção de testes – e assim é extremamente
dependente da qualidade de tais instrumentos psicológicos.
67

4.4 – Análise dos resultados de avaliação psicológica quando aplicada ao mesmo


candidato em momentos distintos

Prosseguindo, para que os resultados da avaliação psicológica sejam considerados


consistentes, é necessário que o mesmo candidato seja recomendado todas as vezes que
realizar a avaliação, pelo menos se o intervalo de tempo entre essas avaliações for
pequeno, bem como seja não-recomendado em todas as vezes, se for o caso.
Na prática, entretanto, isso não se verifica. São diversos os casos na
jurisprudência, conforme pesquisa realizada, de candidatos que foram considerados
recomendados para um cargo para Polícia Civil e alguns dias fizerem a avaliação para a
Polícia Civil de outro Estado da federação e foram considerados inaptos para esse cargo.
Também comum é caso de candidatos aprovados para cargos nas polícias civis e que
foram considerados inaptos para a Polícia Federal ou Rodoviária Federal, e vice-versa.
Da mesma forma, também é bastante frequente o caso do candidato que é
recomendado para o cargo de Agente da Polícia Federal e não-recomendado para o cargo
de Policial Rodoviário Federal, ou vice-versa, sendo que os dois concursos ocorreram em
datas muito próximas. O candidato é considerado, por exemplo, inapto para o cargo de
Policial Federal por não ter atenção necessária e apto para o cargo de Policial Rodoviário,
por ter atenção adequada. Esse tipo de ocorrência é extremamente comum, pois os
candidatos geralmente participam de vários concursos diferentes na época que estão se
preparando para os certames, conseguindo aprovação em mais de um deles quando estão
em bom nível de preparação.
Pode-se argumentar que são cargos diversos ou forças policiais diversas, que em
seu poder de autotutela teriam definido requisitos diversos para ingresso em seus órgãos.
Portanto, somente a avaliação para um mesmo cargo, da mesma força policial e na mesma
época serviria como bom exemplo para a avaliação aqui realizada. Dificilmente tal
amostra é acessível, já que os candidatos são diferentes entre cada concurso – e os
candidatos já aprovados não continuam prestando concursos de salário e funções
idênticas, em regra.
Entretanto, existe um exemplo recente que permite tal análise. O último concurso
da Polícia Civil de Pernambuco teve a primeira avaliação psicológica anulada, pois alguns
candidatos receberam cadernos dos testes com anotações e riscos. Porém, a anulação
ocorreu depois que o resultado já havia sido publicado. Com a anulação, nova avaliação
psicológica foi marcada, para alguns dias depois, com todos os candidatos. Logo, os
68

mesmos candidatos foram submetidos à avaliação psicológica para o mesmo cargo, na


mesma época. Portanto, esse é o caso perfeito para análise desse ponto.
Os dois editais dos resultados estão disponíveis na página da organizadora do
concurso, bem como o edital de convocação para as duas avaliações e a nota de
esclarecimento sobre o caso. A banca responsável foi o CESPE. A convocação para as
duas avaliações ocorreu por meio do Edital no 20 – SDS/PE – Polícia Civil, de 14 de
outubro de 2016. O edital que trouxe o primeiro resultado foi o Edital no 23 – SDS/PE –
Polícia Civil, de 28 de novembro de 2016. Já o segundo resultado foi apresentado no
Edital no 28 – SDS/PE – Polícia Civil, de 9 de junho de 2017.
Analisando esses três documentos, temos que houve um total de 1527 aprovados
na 1ª avaliação, considerando apenas os candidatos regulares e desconsiderando os
candidatos subjudices e as cotas (por uma questão de exatidão, já que muitos candidatos
podem ter se tornado subjudices depois da 1ª avaliação apenas, o que impediria o correto
cálculo). Já na segunda avaliação o total de candidatos aprovados foi de 1622 candidatos,
usando as mesmas regras acima citadas. Considerando os cargos que estavam sendo
recrutados (Agente, Escrivão e Delegado), o total de aprovados em cada avaliação é
mostrado na Tabela 11. Para as duas avaliações foram convocados um total de 1810
candidatos.

Tabela 11: Quantidade de candidatos convocados e aprovados por cargo e avaliação


aplicada
Avaliação Número de convocadosNúmero de aprovados % Aprovação
Agente 1a 1369 1111 81,2%
Delegado 1a 327 310 94,8%
Escrivão 1a 114 106 93,0%
Agente 2a 1369 1212 88,5%
Delegado 2a 327 310 94,8%
Escrivão 2a 114 100 87,7%

Observa-se que para o cargo de Agente houve um total de 101 candidatos a mais
aprovados na segunda avaliação do que na primeira, houve a mesma quantidade de
candidatos aprovados para Delegado nas duas avaliações e para Escrivão houve 6
candidatos a menos classificados. Chama a atenção, nesses dados, o fato de que houve
7,4% mais candidatos aprovados na segunda avaliação psicológica para agente do que na
69

primeira, enquanto para escrivão ocorreu o contrário – houve 5,3% mais aprovação na
primeira avaliação. Para o cargo de Delegado, os índices continuaram constantes.
Para melhor compreender o que ocorreu nessa avaliação, entretanto, é necessário
se analisar o resultado de cada candidato nas duas avaliações. Para isso, é preciso
comparar as duas listas de resultados e ver quantos candidatos aparecem, dentre os
convocados para a avaliação, em cada lista. Realizando tal procedimento, chega-se ao
resultado da Tabela 12.

Tabela 12: Total de candidatos e resultados nas avaliações psicológicas no concurso da


Polícia Civil de Pernambuco
Cargo/aprovados Agente Delegado Escrivão
Nas duas avaliações 1009 294 93
Apenas na 1a 102 16 13
Apenas na 2a 203 16 7
Em nenhuma 55 1 1

Os números são bastante significativos: do total de candidatos, 1396 (ou seja,


77,12%) foram aprovados nas duas avaliações, 131 (7,23%) foram aprovados apenas na
primeira avaliação, sendo eliminados do concurso, 226 (12,48%) foram aprovados apenas
na segunda avaliação e continuaram no concurso, embora inicialmente estivessem sendo
eliminados e apenas 57 candidatos (3,15%), sendo que apenas um candidato para
delegado e um para escrivão, foram considerados inaptos nas duas avaliações, sendo
eliminados.
Comparando as duas avaliações, vemos que houve um total de 19,72% de
candidatos com resultados conflitantes entre as duas avaliações. Ou seja, cerca de um a
cada cinco candidatos tiveram resultados diferentes entre as duas avaliações.
Caso se considere o resultado da segunda avaliação como sendo correto, pois foi
esse o resultado oficial, teremos que a primeira avaliação apresentou 7,23% de falsos
positivos e 12,48% de falsos negativos – e um erro de cerca de 20% no total.
Esses dados falam por si mesmos – como pode ser considerado como confiável
uma avaliação com 20% de erros? Mesmo se considerarmos que alguns candidatos
faltaram em algumas das avaliações, isso não explica essa quantidade alta de erros, e
muitos candidatos questionaram judicialmente esse resultado, mostrando que, de fato,
houve diversos candidatos que fizeram as duas avaliações e obtiveram resultados
diferentes.
70

Deve-se observar que a banca responsável por essa avaliação em Pernambuco era
o CESPE, uma das mais tradicionais bancas do país, cujo laboratório de Psicologia, o
conhecido LabPAM, é referência no país. Logo, é provável se afirmar que as
probabilidades de erros em bancas menores e sem o mesmo nível de experiência devem
ser ainda maiores.
Além dos dados já apresentados, deve-se destacar que os candidatos subjudices
frequentemente conseguem liminar para terem sua avaliação refeita – e na imensa maioria
das vezes obtém resultado positivo nessa segunda avaliação. Trata-se de mais um
indicativo no sentido da inexatidão da avaliação psicológica.

4.5 – Análise dos resultados da avaliação psicológica em relação à observação da


característica avaliada

Por fim, uma última forma de analisar os resultados da avaliação psicológica seria
comparar os resultados dessa com a observação concreta do caso em questão. Entretanto,
tal análise seria tremendamente difícil e subjetiva. A despeito disso, alguns resultados
podem aclarar esse ponto.
Em pesquisa jurisprudencial, foram encontrados muitos casos de policiais e outros
agentes de segurança pública que resolvem trocar para outro órgão de segurança pública
e são considerados inaptos na avaliação psicológica para o novo cargo, mesmo tendo
vários anos de experiência policial e um currículo totalmente satisfatório no órgão que
ocupam.
Pode-se argumentar que esses policiais não têm mais o perfil para o cargo quando
realizam a nova avaliação. Entretanto, esses servidores estão exercendo normalmente o
cargo, com boas avaliações de suas chefias e pretendem continuar na atividade de
segurança pública, o que mostra que essa consideração não é razoável – ou a chamada
aptidão para o cargo na verdade não existe ou a avaliação psicológica não apresentou
resultados coerentes.
Outra questão que demonstra falhas no processo de avaliação psicológica é o
resultado de inaptidão dos candidatos em características nas quais obtiveram amplo
sucesso em outra etapa do concurso. Assim, por exemplo, ocorre de candidatos com altas
notas em redação e em língua portuguesa serem reprovados em testes de inteligência
verbal, como se observa em casos judicializados de alguns concursos. Da mesma forma,
71

são encontrados exemplos de reprovação por inibição e outros aspectos de personalidade


de candidatos que obtiveram excelente desempenho em provas orais, por exemplo. Tais
ocorrências indicam que a avaliação psicológica provavelmente foi falha nesse ponto – e
que há chances consideráveis de erros nos testes.

4.6 – Avaliação das consequências dos erros nas avaliações psicológicas

De todo o exposto, resta claro que é alta a probabilidade de erros nas avaliações
psicológicas. Mas, qual seria a natureza desses erros? Falsos positivos ou falsos
negativos? Ou ambos?
A princípio, parece que a maior parte dos erros é composta por falsos negativos,
já que a jurisprudência é farta de candidatos desclassificados em condições que parecem
indicar falha na avaliação realizada, como descrito nos itens anteriores. Entretanto, essa
é a face mais evidente das falhas nas avaliações apenas. Também os falsos positivos
ocorrem e com frequência.
De fato, são frequentes os relatos de servidores nos órgãos que se submetem à
avaliação psicológica descontentes com o serviço que realizam, problemas de ansiedade,
depressão e altos índices de suicídio nesses órgãos, além de relatos de servidores que se
queixam de colegas de trabalho sem o perfil adequado para o cargo. Portanto, também os
falsos positivos existem – sendo, entretanto, difícil mensurar essa ocorrência, posto que
seria necessário que se criasse um critério do que seria um servidor sem o perfil adequado
para o cargo e por ele se avaliasse todos os servidores em exercício para apurar quais os
que se adequavam a esse perfil.
Considerando os valores apresentados na tabela 1 e na tabela 3, podemos fazer
algumas projeções para ter uma ideia do nível de falsos positivos e falsos negativos
existentes nas avaliações psicológicas. Consideremos, por convenção, que a porcentagem
de candidatos que tem o perfil para os cargos da Polícia Federal fosse a média dos valores
apresentados na tabela 1, ou seja, cerca de 84%. Esse foi aproximadamente o valor de
recomendações para o concurso de Agente da Polícia Federal de 2004. Suponhamos,
portanto, que esse concurso não teria falsos positivos ou negativos (uma suposição que
não se sustenta provavelmente, como posteriormente analisado). Por outro lado, com
esses dados, no extremo, o concurso de escrivão de 2012 teria tido um total de cerca de
11% de falsos negativos, ou 65 candidatos que foram considerados aptos para o cargo
72

sem, em tese, o ser. No outro extremo, no concurso de escrivão de 2004 teria ocorrido um
total de 5,7% de falsos negativos, o que equivaleria a 62 candidatos eliminados
injustamente, mesmo tendo o perfil para o cargo. Esses valores podem ser confirmados
pelo caso analisado da Polícia Civil de Pernambuco, no qual se demonstrou que os falsos
positivos foram da ordem de 7,2% e os falsos negativos na ordem de 12,48%.
Esses dados permitem que se tenha uma ideia do efeito causado pelos erros na
avaliação psicológica. Mas, deve-se lembrar que um falso positivo e um falso negativo
podem se compensar, de forma a ocultar o efeito dos erros – por essa razão não se pode
afirmar que no concurso de Agente de 2004 não tenham ocorrido erros.
A questão é: o que é mais negativo? Ter 60 candidatos eliminados injustamente,
a despeito de anos de estudo para a carreira pública, ou permitir que 60 candidatos sem o
perfil para o cargo sejam admitidos nos quadros dos órgãos de segurança? A resposta
parece ser difícil, pois é necessário ponderar o interesse da Administração Pública e a
eficiência e qualidade dos serviços por ela prestados com as garantias de isonomia e
igualdade de condições que os cidadãos envolvidos possuem. Esse é o grande dilema do
atual modelo de avaliação psicológica, por tratar essa etapa do concurso como definitiva
e eliminatória. Entretanto, quando se pensa em modelos alternativos de avaliação, esse
dilema pode ser superado.

4.7 – Análise da possibilidade de reversão dos resultados por meio de recursos


administrativos

Como já afirmado anteriormente, uma das condições essenciais para que a


avaliação psicológica seja considerada legal é que haja a possibilidade de recursos
administrativos quanto ao resultado desse processo seletivo. A presente subseção
analisará, portanto, se essa possibilidade é de fato existente.
Quanto a isso, é notório que os editais preveem a possibilidade de recurso
administrativo. Logo, formalmente não há o que se discutir quanto a esse ponto.
Entretanto, a questão é se, materialmente, há ou não a possibilidade de reversão do
resultado administrativamente.
Para realizar tal análise, consideraremos os concursos mais recentes nos quais
houve avaliação psicológica, para os cargos da Polícia Federal, Polícia Rodoviária
Federal e Departamento Penitenciário Nacional. Esses órgãos serão escolhidos por se
73

sujeitarem ao Decreto 6944/2009 que prevê expressamente a possibilidade de recurso


administrativo para essa etapa do concurso (o que, aliás, não poderia ser diferente, posto
que todos atos administrativos ensejam recurso). A Agência Brasileira de Inteligência não
divulga o nome dos aprovados, razão pela qual não se analisará os dados dos concursos
desse órgão.
O método empregado na análise será a comparação dos nomes dos candidatos
aprovados no resultado provisório com os nomes dos candidatos aprovados no resultado
definitivo, de forma a buscar diferenças, que demonstrem que houve mudanças após a
interposição dos recursos administrativos. Para tanto, será selecionado o trecho dos
editais que traz o resultado e feito tratamento dos dados com os softwares Excel ® e Word
® (comparar documentos), de forma a encontrar nomes diferentes entre os dois
documentos. Serão usados apenas os dados de candidatos regulares, deixando de lado os
candidatos subjudices de outras etapas e os candidatos de cotas, de forma a deixar mais
confiável o resultado da análise.
Iniciando pelo último concurso da Polícia Rodoviária Federal, esse foi realizado
pela última vez pela banca CESPE em 2013, de acordo com o sítio oficial do órgão. No
sítio da banca organizadora constam os editais do resultado provisório da avaliação
psicológica desse concurso (Edital Nº 11 – PRF – Policial Rodoviário Federal, de 4 de
novembro de 2013) e o resultado definitivo dessa etapa (Edital Nº 13 – PRF – Policial
Rodoviário Federal, de 27 de novembro de 2013). Comparando os dois editais, vemos
que todos os nomes que constam no resultado definitivo constam também no resultado
provisório. Portanto, no concurso de 2013 da PRF nenhum recurso administrativo foi
aceito contra o resultado da avaliação psicológica.
Passando para o Departamento Penitenciário Nacional, o último concurso
realizado foi o de 2015, também realizado pela banca CESPE. Nesse concurso, o
resultado provisório da avaliação psicológica foi publicado no edital Nº 21 – Depen, de 7
de dezembro de 2015 e o resultado definitivo no edital Nº 26 – Depen, de 29 de janeiro
de 2016. Comparando os dois documentos encontramos algumas diferenças: os nomes de
alguns candidatos (Emerson Katsui Hirai, Juliano Ortmeier, Luan Chaves Sobrinho,
Douglas Henrique Spohr, Jaime de Campos Medeiros, José de Anchieta dos Santos
Nascimento Junior, Moises Halison Medeiros, Ana Livia Fontes da Silva, Bruna Carine
de Sousa Oliveira, Luciana Veloso Miranda Barbalho, Fernando Mantiganho de
Andrade, Daniel Valadão Vasconcelos e Rubens Nunes de Oliveira) apareceram apenas
no resultado provisório, mas não no definitivo. Entretanto, essa diferença se deve ao fato
74

de tais candidatos terem se tornado subjudice de outras etapas. Logo, também no concurso
de DEPEN não houve nenhum recurso administrativo aceito contra a avaliação
psicológica.
Prosseguindo, o concurso da Polícia Federal realizado mais recentemente foi o de
2014, para o cargo de Agente. O resultado provisório na avaliação psicológica foi
publicado no edital Nº 9/2015 – DGP/DPF, de 9 de junho de 2015 e o resultado definitivo
no edital Nº 14/2015 – DGP/DPF, de 15 de julho de 2015. A única diferença entre os dois
resultados é que o candidato Arthur Levy Queiroz Cavalcante consta como aprovado e
regular no resultado provisório e como aprovado e subjudice por conta de outra questão
no segundo resultado. Logo, nenhum recurso administrativo foi aceito quanto a esse
concurso também.
Logo, nos concursos mais recentes de PF, PRF e DEPEN não houve nenhum
recurso administrativo aceito quanto à avaliação psicológica. A mesma conclusão é obtida
quando se analisa os concursos da Polícia Federal de 2004 em diante até o mais recente,
acima analisado – não há recursos administrativos aceitos quanto à avaliação psicológica.
Todos esses concursos foram realizados pela banca CESPE, o que poderia indicar
um viés na análise. Entretanto, quando feita a mesma análise acima com os concursos
para Delegado da Polícia Civil do Pará (realizado pela FUNCAB em 2017) e Delegado
da Polícia Civil do Amapá (realizado pela FGV em 2010), para ficar nos estados mais
próximos, temos o mesmo resultado, embora com bancas diversas – não houve recurso
administrativo aceito.
Portanto, dos concursos analisados conclui-se que nenhum caso de recurso
administrativo deferido foi encontrado nos cinco certames analisados, embora muitos
candidatos tenham sido reprovados nesses concursos. Esse é um padrão que se repete em
outros concursos analisados. A apresentação de mais dados foge ao escopo desse trabalho,
mas uma pesquisa mais extensa poderia confirmar a praticamente inexistente
possibilidade de reversão de resultados de avaliação psicológica por meio de recurso
administrativo – o que torna esse recurso meramente uma formalidade.
75

4.8 – Conclusão sobre os resultados da avaliação psicológica em concursos públicos


no modelo atual

Do apresentado nesta seção, pode-se ponderar com mais dados a questão da


constitucionalidade do atual modelo de avaliação psicológica adotado nos concursos
públicos no Brasil. Pelo exposto, percebe-se que há a presença de significativos erros no
processo de avaliação psicológica adotado nos concursos dos órgãos de segurança pública
brasileiros. Antes de avaliar a constitucionalidade desse modelo, objeto principal desse
trabalho, entretanto, é importante analisar se existem outros modelos em outros países, o
que será feito na próxima seção.
76

5 – BREVE APRESENTAÇÃO DE MODELOS ESTRANGEIROS DE


AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA PARA INGRESSO EM CARGOS PÚBLICOS

Até o momento vem-se analisando o modelo brasileiro de avaliação psicológica


para ingresso em órgãos de segurança pública e outros órgãos (ABIN, órgãos
penitenciários). Como afirmado anteriormente, o modelo de avaliação de concursos de
magistratura é totalmente diverso desse modelo, assim como o processo para ingresso nas
Forças Armadas. Logo, mesmo no Brasil existem modelos diversos de avaliação
psicológica. A presente seção apresentará, por outro lado, uma breve apresentação de
modelos estrangeiros de avaliação psicológica.
Como paradigma, visto que são muitos os órgãos de segurança pública, tanto no
Brasil quanto em outros países, usar-se-á a Polícia Federal no Brasil, de forma que o
modelo buscado em outros países será o dos órgãos policiais que são equivalentes, ou os
mais próximos possíveis, da Polícia Federal, que é o órgão de polícia judiciária federal
em nosso país.
Definida essa questão, o próximo passo é selecionar os países para estudo. De
forma a não estender em demasia o presente trabalho, dado o seu objetivo, selecionar-se-
á um rol de sete países, que não o Brasil. Para a seleção desses países, usar-se-á como
critério o World Internal Security and Police Index (WISPI), documento da International
Police Science Association (IPSA – entidade não-lucrativa e reconhecida
internacionalmente, que trabalha com ciências policiais, com base em New Jersey/EUA)
que lista dados qualitativos e quantitativos sobre a segurança pública em diversos países.
Com base em critérios como, por exemplo, número de policiais por 100.000
pessoas, capacidade prisional, índices de corrupção, efetividade, taxas de resolução de
crimes e número de homicídios por 100.000 pessoas, o WISPI classifica os países com
base na qualidade de seus serviços de segurança pública, apresentando ao final os dados
conforme a Figura 2 (imagem retirada da página 4 do WISPI).
77

Figura 2 - Dados do WISPI sobre países com melhor qualidade de serviços de segurança
pública

Esse estudo da IPA lista os cinco melhores países em segurança pública como
sendo, no ano de 2018, os seguintes: Singapura, Finlândia, Dinamarca, Áustria e
Alemanha. Além desses, selecionar-se-á para os fins desse trabalho os EUA, por sua
semelhança e influência no Brasil, o Uruguai, que foi o melhor país sul-americano listado
nesse estudo e a Inglaterra e França, países de onde os estudos fundamentais da
psicometria surgiram, de acordo com PASQUALI (c2012).
Para conhecimento, o melhor país da América do Sul no ranking da WISPI, o
Uruguai obteve uma pontuação de 0,719 para sua segurança pública, contra 0,848 da
Alemanha, quinta colocada, por exemplo. Os EUA obtiveram 0,724, ficando na 33ª
78

colocação. O Brasil ficou com pontuação 0,479, na 96ª posição nesse ranking de
segurança pública, abaixo de países como Sudão, Mali e Camboja.

5.1 - Singapura

De acordo com o WISPI, Singapura obteve uma nota 0,898 de um máximo de 1


possível, sendo o país com a melhor classificação no ranking de segurança pública
mundial. O país apresenta alguns dos menores índices de criminalidade do mundo e um
dos maiores índices de confiança da população nas forças policiais.
A Força Policial de Singapura (FSP), ou Pasukan Polis Singapura, segundo o seu
sítio oficial (SINGAPURA, c2018), apresenta diversas oportunidades de ingresso nas
carreiras, seja nos níveis inferiores da carreira, seja nos postos mais graduados ou nos
quadros especializados. A força policial é dividida em diversos tipos de carreiras, como
regulares, voluntários, civis e outros. O ingresso nas forças policiais é feito, pelo que
consta, em conjunto com o ingresso nos quadros militares, a semelhança do serviço
militar no Brasil. O órgão responsável pelo ingresso dos voluntários é o Central
Manpower Base (CMPB).
Segundo o que consta no sítio oficial dessa força policial, existe avaliação
psicológica para ingresso no serviço militar, do qual posteriormente se passará para os
quadros da FSP. Nesse processo, os testes aplicados são testes psicométricos
computadorizados, aplicados em conjunto com a avaliação médica. A aplicação dos testes
psicológicos dura cerca de uma hora e meia e, pelo que consta, com aplicação individual
e acompanhamento para esclarecimento de dúvidas.
O sítio da CMPB apresenta inclusive exemplos e explicações de como funcionam
os testes aplicados, que são, basicamente, testes de inteligência verbal, espacial e abstrata.
Os testes não são idênticos para todos os avaliados, sendo que a diferença de nível é
baseada em um questionário prévio ao início da testagem. De acordo com os resultados
na avaliação os candidatos são indicados para setores específicos de treinamento, mas não
são eliminados. Pelo que consta, os testes não avaliam personalidade. Da mesma forma,
para ingresso nos órgãos policiais há previsão de uma avaliação psicológica, mas apenas
para indicar os setores mais indicados para o futuro policial, não havendo eliminação por
esse processo.
79

5.2 - Finlândia

Segundo o WISPI, 80% dos entrevistados em uma pesquisa do instituto Gallup


responderam confiar nas forças policiais do país. Apesar disso, a força policial no país é
muito pequena – cerca de apenas 149 oficiais de polícia por 100.000 habitantes, uma das
menores taxas do mundo. As taxas de violência são muito baixas, assim com as taxas de
percepção de segurança são muito altas.
O órgão policial finlandês mais próximo da Polícia Federal no Brasil é o National
Bureau of Investigation (NBI), ou Keskusrikospoliisi, em finlandês. Segundo o site oficial
da polícia finlandesa (FINLÂNDIA, c2018), há a previsão de avaliação psicológica no
processo de admissão para o curso de formação das forças policiais do país, na primeira
etapa e na segunda etapa do processo de seleção.
A etapa de avaliação psicológica avalia, segundo essa fonte de informação oficial,
a capacidade de resolução de problemas, interação e capacidade de trabalho em equipe,
bem como a responsabilidade no exercício das futuras atribuições. O candidato é avaliado
numa escala de 0 a 30 pontos e rejeitado para o cargo apenas se obtiver 0 pontos em
algumas das habilidades avaliadas. Além da avaliação com testes psicológicos, há
entrevistas (que valem entre 0 e 15 pontos) e dinâmicas de grupo (pontuação entre 0 e 5
pontos).

5.3 - Dinamarca

Segundo o WISPI ainda, a Dinamarca, que ficou em terceiro lugar, possui os


menores índices de corrupção no mundo e o terceiro menor índice de subornos pagos a
policiais no mundo. Além disso, as forças policiais e militares são as que menos utilizam
de seus cargos para proveito próprio no mundo. Além disso, 80% da população
dinamarquesa sente-se segura para caminhar à noite sozinha em suas vizinhanças, o que
equivale ao décimo-sexto melhor índice do mundo.
A Polícia Nacional da Dinamarca, ou Rigspolitiet, em dinamarquês, é o órgão
policial federal daquele país. Segundo a página oficial da polícia dinamarquesa
(DINAMARCA, c2018), o processo de seleção para ingresso nos cursos de formação
policial não inclui a aplicação de testes psicológicos. O processo envolve apenas
atividades em equipe, para testar as habilidades cooperativas do candidato e uma
entrevista, além de testes físicos e provas de conhecimento do inglês e do dinamarquês.
80

5.4 - Áustria

Classificada como quarto melhor país em segurança pública, a Áustria possui um


altíssimo índice de confiança (86%) nas suas forças policiais, baixíssimas taxas de
violência e uma das polícias menos truculentas do mundo.
A Polícia Federal da Áustria, criada em 2005, é o órgão que integra a polícia
judiciária federal e também as antigas gendarmeries, em um órgão único. Para exercer as
atividades de investigações e polícia judiciária federais (Austrian Civilian Police ou
Bundespolizei) os oficiais da ativa são convidados e recebem treinamento. Já o ingresso
nas outras forças policiais ocorre, pelo apurado em sítios oficiais dessas forças
(ÁUSTRIA, c2018), através de testes físicos, testes de inteligência, testes de
personalidade e entrevista, sendo que esses são avaliados em conjunto, para uma decisão
final sobre a admissão ou não nos cursos de formação.

5.5 - Alemanha

A Alemanha foi o país com maior população a se classificar dentre os melhores


em termos de segurança pública, ainda de acordo com o WISPI. As taxas de corrupção
dos órgãos policiais são muito baixas e as taxas de confiança nos órgãos policiais muito
altas. As taxas de violência estão na média da Europa, devido ao tamanho da população
e alguns desafios de segurança que o país enfrenta.
A Polícia Federal da Alemanha, Bundespolizei (BPOL), não possui funções tão
amplas quanto a Polícia Federal brasileira, sendo mais uma polícia de fronteiras e
ostensiva. Segundo o site oficial das forças policiais alemãs (ALEMANHA, c2018), o
processo de seleção para a polícia federal é composto de exames médicos, testes físicos,
testes de inteligência e de redação e entrevistas. Não há testes de personalidade para
ingresso nessa força policial.

5.6 - Uruguai

Melhor país da América do Sul no ranking da WISPI, o Uruguai obteve uma


pontuação de 0,719 para sua segurança pública, ficando na 35ª colocação, pouco abaixo
dos EUA.
81

A polícia judiciária, ostensiva e administrativa nacional do Uruguai é a Polícia


Nacional. Os editais de concursos para essa força policial podem ser acessados no sítio
do Ministério do Interior do Uruguai (URUGUAI, c2018).
Segundo esses editais, a chamada avaliação psicolaboral é uma das etapas dos
concursos. Entretanto, diversamente do Brasil, essa etapa é feita também de dinâmicas e
outras formas de avaliação em grupo. Além disso, essa etapa não é eliminatória, mas
apenas classificatória, valendo um total de 20 pontos de 100 possíveis, usualmente.

5.7 - França

Um dos berços da psicometria, através dos estudos de testes de inteligência de


Binet, a França ocupa a 22ª colocação no ranking WISPI, com nota global de 0,777. A
sua polícia judiciária nacional é a Polícia Nacional (Police Nationale).
De acordo com o site de recrutamento para a polícia francesa (FRANÇA, c2018),
os candidatos são submetidos no processo de admissão uma etapa consistindo de: testes
psicológicos escritos, como os adotados no Brasil, e prova de gestão de estresse, na qual
são avaliados por psicólogos – peso 2; análise de um caso concreto e apresentação oral
de resposta para o problema – peso 4; análise de um caso concreto e resolução em equipe
– peso 4; prova oral em língua estrangeira – peso 4 e entrevista com uma banca de
avaliadores (júri) – peso 7. A banca de avaliadores utiliza os resultados dos testes
psicológicos e do teste de estresse que são interpretados por um psicólogo e para ela
encaminhados, mas não fica a eles vinculados na sua avaliação. Portanto, os testes não
são usados como critério único de avaliação, mas apenas como um dos critérios no
processo de seleção, com a devida interpretação e importância, conforme os pesos acima
citados.

5.8 - Inglaterra

Considerado o país de onde os estudos da psicometria atual podem ser traçados,


através do trabalho de Galton, a Inglaterra / Reino Unido ficou em 20º lugar na
classificação do WISPI. O modelo de polícia inglês, adotado em outros países da
comunidade britânica, como Canadá e Austrália, é um dos mais bem-conceituados do
mundo.
82

O mais próximo de um equivalente à Polícia Federal na Inglaterra é a Agência


Nacional de Crimes, ou melhor National Crime Agency (NCA). Pelo apurado, o
recrutamento para a NCA é feito entre os oficiais de outras forças policiais, após o devido
treinamento. Por outro lado, os requisitos para ingresso nos quadros policiais como oficial
são descritos na circular da National Policing Improvement Agency (NPIA) de número
02 de 2011 (INGLATERRA, c2018), por exemplo. Segundo esse documento, há uma
detalhada investigação social do candidato bem como diversas declarações para que ela
possa concorrer a uma posição nos órgãos policiais. Dentro das etapas do processo de
seleção, uma delas é a chamada avaliação pelo Assessment Centre, no qual são realizadas
entrevistas, testes interativos, de raciocínio verbal e numérico. Essa etapa é eliminatória,
mas é realizada, pelo que consta, individualmente e com análise de todos os instrumentos
acima listados pelo profissional responsável pela seleção, que pertence ao próprio órgão
policial.

5.9 – Estados Unidos da América

Os Estados Unidos, potência global, é a maior influência atual do Brasil, razão


pela qual também está incluído nesse estudo, embora esteja atrás de outras potências
mundiais no quesito segurança pública, ocupando a 33ª colocação no ranking WISPI, com
nota 0,724.
O mais próximo da nossa Polícia Federal nos EUA é o Federal Bureau of
Investigation (FBI), embora esse possua menos atribuições do que a polícia brasileira.
Uma das etapas de seleção para o FBI, de acordo com o sítio oficial do órgão (ESTADOS
UNIDOS DA AMÉRICA, c2018), é a aplicação de testes psicológicos. Os testes
psicológicos são realizados na segunda fase do processo de admissão e são
computadorizados, envolvendo raciocínio lógico, testes de personalidade, preferências e
interesses e de julgamento situacional. O candidato pode ser eliminado nessa fase. A
aplicação dos testes é individual, durando cerca de 3 horas, e o candidato recebe o
resultado em cerca de uma hora, de acordo com as informações oficiais. O candidato
reprovado nos testes psicológicos pode solicitar uma nova avaliação dentro de 90 dias.
83

5.10 – Conclusão sobre os modelos de avaliação psicológica estrangeiros

Do que foi apresentado, nota-se que nenhum dos países estudados apresenta um
processo tão rígido quanto o brasileiro para a avaliação psicológica dos candidatos.
Mesmo os EUA, que tem um procedimento muito semelhante ao brasileiro, permite um
novo teste depois de 90 dias da primeira avaliação. E, ao contrário do modelo brasileiro,
nos EUA não há provas classificatórias antes dessa etapa de avaliação, de forma que o
candidato não precisa investir seu tempo em preparação para o processo seletivo antes da
avaliação psicológica.
Entre os países mais bem classificados no quesito segurança pública, nenhum
utiliza a testagem psicológica como requisito suficiente para eliminação, sendo que
muitos dos países avaliados sequer realizam avaliação psicológica em seu processo de
seleção. Entre os que a realizam, é comum que essa etapa ou seja apenas indicativa apenas
ou seja ponderada em conjunto com entrevistas e outras técnicas de avaliação.
Portanto, o modelo brasileiro de avaliação psicológica é exceção, sendo diferente
do modelo adotado nos países que são referência em segurança pública. Mesmo na França
e Reino Unido, onde a ciência da psicometria surgiu, os testes psicológicos não são
utilizados com a autoridade que possuem no Brasil, sendo, antes, avaliados globalmente
com outras técnicas.
Ainda em desfavor do modelo brasileiro, deve-se registrar que em outros países
não é comum que o ingresso nos órgãos policiais ocorra por meio de processos
classificatórios de provas tão rígidos quanto no Brasil. Assim, seria muito menos
dispendioso para os candidatos desses locais serem submetidos ao método brasileiro de
avaliação, já que não dedicaram tempo de estudo para concorrer a vaga, como acontece
na realidade local. A despeito disso, esse método não é aplicado.
Logo, no Brasil tem-se o processo mais árduo para se chegar até a avaliação
psicológica e o processo de avaliação mais rigoroso e com maior incidência de erros, que
sequer é realizado pelo próprio órgão contratante.
84

6 – ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE DO MODELO ATUAL DE


AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA

Tendo apresentado quais são os princípios constitucionais aplicáveis aos


concursos públicos e tendo analisado a avaliação psicológica no modelo atualmente
aplicado, é possível se avançar para a análise dos resultados – de forma a avaliar se o
modelo atual de avaliação psicológica é ou não constitucional. É o que será feito na
presente seção, com base nos dados que foram sendo apresentados e consolidados ao
longo deste trabalho.

6.1 – As garantias fundamentais e os princípios constitucionais como delimitadores


e como orientadores da atividade estatal

SARLET (2012, p. 15) afirma que os direitos fundamentais constituem uma


construção que está definitivamente integrada à história da sociedade humana e aos seus
valores. Assim, praticamente não existem, de acordo com o autor, países que não tenham
aderido a um dos principais pactos internacionais sobre direitos humanos e que não
tenham reconhecido um núcleo de direitos humanos em suas constituições. Entretanto,
pontua o autor que isso não significa que não haja diversos problemas a serem
solucionados em relação à aplicação dessas garantias, sendo que a eficácia e a efetividade
desses direitos ainda estão distantes de ser supridas.
Prossegue o autor afirmando que o estudo dos direitos fundamentais implica uma
tomada de posição quanto ao enfoque que será adotado, citando alguns dos diversos
enfoques possíveis (filosófico, universalista, estatal ou constitucional, sociológico,
histórico, político, econômico, etc.) e concluindo que todos esses enfoques se
interpenetram e complementam, tendo como único limite a criatividade e imaginação
humanas para as abordagens que se pode gerar.
Dentro desse contexto, todas essas abordagens podem ser utilizadas no caso em
questão, posto que, em face do vácuo legislativo que impede a concretização dos direitos
fundamentais das pessoas envolvidas com os concursos públicos necessário se faz
recorrer aos princípios e garantias fundamentais para complementar e preencher esse
vazio, de forma a corretamente adequar a situação ao que dita nossa constituição – e mais
85

do que isso, aos diversos direitos e garantias com as quais o Brasil se comprometeu em
plano internacional.
SARLET (2012), especificamente, adota um enfoque que se centra na dimensão
concreta dos direitos fundamentais, especialmente na eficácia jurídica, como precondição
da própria efetividade dos direitos fundamentais.
Adotando o enfoque das diversas dimensões dos direitos fundamentais, deve-se,
portanto, analisar a questão da constitucionalidade da avaliação psicológica em concursos
públicos frente a cada uma dessas dimensões, principalmente em relação à primeira
dimensão (igualdade, isonomia, legalidade, etc.) e à segunda dimensão (principalmente
no que diz respeito aos direitos sociais, especialmente ao direito ao trabalho), mas sem se
esquecer do caráter coletivo da questão, já que a eficiência e a qualidade do quadro de
servidores públicos é uma questão que a todos interessa.
Portanto, ainda seguindo as ideias do autor supracitado, que os direitos
fundamentais são condição sine qua non do Estado Constitucional de Direito. Assim, não
se pode contentar com um Estado de Direito que se limite ao mero formalismo de
“governo das leis”, buscando-se, antes, um Estado material de Direito, no qual os direitos
fundamentais são não apenas garantias contra a atuação estatal mas também metas e
parâmetros para a atividade estatal.
Assim, os direitos fundamentais são legitimadores do poder estatal e da ordem
constitucional, já que o poder se justifica somente para a realização dos direitos do homem
e para a concretização da justiça. Nesse sentido, os direitos fundamentais devem ser
encarados tanto em seu aspecto formal quanto em seu aspecto material – assim, tais
direitos se encontram no ápice do ordenamento jurídico, são normas diretamente
aplicáveis e vinculantes para os entes da Administração Pública e devem ser
compreendidos em seu sentido de influenciar nas decisões fundamentais sobre a estrutura
do Estado e da sociedade.
Portanto, à luz de tudo isso, não há espaço para nenhuma interpretação
constitucional que legitime a Administração Pública como um fim em si mesma. Assim
não pode ser – o poder estatal somente se justifica enquanto na sua função de
concretização dos direitos fundamentais e na promoção do bem-estar social.
Por isso, o atual modelo de avaliação psicológica se mostrará contrário a esse
modelo de Estado Constitucional de Direito caso afronte aos princípios constitucionais
que direcionam a atividade estatal. Não se pode pensar que uma etapa de concurso possa
ser usada apenas como instrumento do Estado para arbitrariedades ou para “se precaver”
86

quanto a questionamentos da sociedade – somente na busca da concretização dos direitos


fundamentais é que pode se fundamentar a atividade estatal.
Dito isso, portanto, nossa análise da constitucionalidade da avaliação psicológica
deve pautar-se na compreensão dos princípios constitucionais e na sua aplicação ao caso
em questão. Antes de realizar essa análise, entretanto, é importante, à luz da doutrina,
compreender como deve ser o modelo constitucional de concurso público.

6.2 – O modelo constitucional de concurso público, à luz da doutrina

De acordo com MELLO (1978) os concursos públicos não podem realizar


discriminações para o ingresso nos quadros públicos, exceto àquelas que sejam
compatíveis com a cláusula igualitária e quando houver um vínculo de correção lógica
entre a peculiaridade, residente no objeto, e a desigualdade de tratamento conferida a
partir dela. Assim, nos concursos públicos, de acordo com o autor, por meio da igualdade
o que a ordem jurídica busca é a impossibilidade de desequiparações fortuitas ou
injustificadas. Logo, deduz-se que os concursos públicos devem se utilizar de critérios de
seleção que sejam justificáveis e que permitam igualdade no processo, afastando qualquer
arbitrariedade por parte da Administração. Essa é a primeira característica de um modelo
constitucional de concurso público.
Da mesma forma, afirma DI PIETRO (2011) que o legislador deve estabelecer
critérios para admissão com obediência ao princípio da isonomia, somente com
exigências específicas pautadas nas atribuições do cargo.
CARVALHO FILHO (2017), por sua vez, afirma que os concursos públicos, por
serem procedimentos no qual há densa competividade, rendem conflitos entre o Poder
Público e os candidatos. Segundo o autor, a solução legítima desses conflitos somente
ocorre com a aplicação dos princípios da motivação e do contraditório e da ampla defesa.
Logo, deduz-se que sempre há a necessidade de permitir ao candidato a possibilidade de
contraditar as decisões administrativas, que, por sua vez, devem sempre ser motivadas.
Ora, esses princípios devem ser materialmente satisfeitos, não apenas formalmente. Logo,
os argumentos trazidos pelo candidato devem ser enfrentados e ponderados pela
Administração Pública, que deve motivar sua decisão, não apenas fazer referência a
normas editalícias ou apresentar alegações sem fundamento para a manutenção de seus
atos.
87

Ainda de acordo com CARVALHO FILHO (2017), o concurso público é o


procedimento que melhor representa o sistema do mérito, enquanto apresenta iguais
condições para todos os candidatos, permitindo que sejam escolhidos os melhores dentre
os interessados.
Portanto, o que se nota da doutrina é que o modelo constitucional de concurso
público é aquele que se apresenta de acordo com os princípios da isonomia, sendo essa
material, na medida em que permita a todos os concorrentes iguais condições no certame.
Além disso, esse modelo deve pautar-se na motivação das decisões administrativas e na
possibilidade de recursos administrativos.
Mais do que isso, entretanto, o que se depreende é que o concurso público somente
será de acordo com a Constituição quando se orientar pelos diversos princípios que regem
a atuação dessa, bem como aqueles que defendem os candidatos, enquanto sujeitos de
direito, possuidores de direitos fundamentais e cidadãos em busca de seu direito
constitucional ao trabalho. Nesse sentido, a análise que será feita na próxima subseção.

6.3 – Análise frente aos princípios constitucionais

Apresentados os fundamentos constitucionais que devem ser buscados para um


sistema de seleção de pessoal aos quadros públicos que seja de acordo com o ordenamento
jurídico, resta analisar se o atual modelo, objeto do presente trabalho, adequa-se a esse
sistema. Para tanto, usando as ideias dos conceituados autores apresentados como guia e
tendo os direitos fundamentais como norte, a presente subseção desse trabalho irá
relacionar os resultados obtidos no presente trabalho com os princípios constitucionais.

6.3.1 – Análise frente ao princípio da legalidade

De acordo com entendimento dominante, construído pelo legislador e pela


jurisprudência, a avaliação psicológica é legal quando satisfaça os seguintes requisitos: 1
– previsão em lei da possibilidade dessa etapa no concurso, 2 – previsão no edital do
concurso dessa fase, 3 – aplicação segundo critérios objetivos, 4 – aplicação de testes com
caráter científico e padronizados e 5 – previsão da possibilidade de recursos
administrativos dessa etapa.
88

Quanto ao primeiro desses critérios, a maior parte das carreiras nas quais é
aplicada a avaliação psicológica já prevê essa possibilidade. Entretanto, nem sempre a
previsão legal é obedecida. Assim, por exemplo, como afirmado anteriormente, a lei que
prevê a avaliação psicológica nos concursos da Polícia Federal afirma que essa avaliação
será realizada pela Academia Nacional de Polícia, não pela banca do concurso. Na prática,
entretanto, quem realiza essa etapa é a banca contratada, apenas com acompanhamento
pelos responsáveis pela seleção do órgão. Logo, em uma análise fria da lei essa previsão
não está sendo cumprida, o que atentaria contra o princípio da legalidade. Por outro lado,
concursos para cargos com grandes responsabilidades, tais como os outros que possuem
previsão de avaliação, como os concursos para Ministério Público e para órgãos de
segurança pública, tais como as polícias científicas de alguns estados, não possuem
previsão de avaliação psicológica, o que mostra uma falta de uniformidade no tratamento
do tema, o que é um problema de legalidade, quando se analisa sistematicamente o
ordenamento jurídico. De qualquer forma, esse primeiro critério é satisfeito atualmente,
mesmo que seja necessário dar interpretação aos termos usados pelas leis de regência de
alguns cargos. Atualmente, além disso, praticamente deixaram de existir, mesmo nos
Estados, concursos que tenham a etapa de avaliação psicológica sem previsão legal.
Por outro lado, em relação ao segundo critério, esse é plenamente satisfeito
atualmente, inexistindo relatos de concursos que tenham aplicado avaliação psicológica
sem previsão em edital dessa etapa – mesmo que a previsão em edital não seja suficiente
clara sobre os critérios, o que concerne à publicidade, como será posteriormente
analisado.
Entendendo que os dois primeiros critérios são atendidos pelo atual modelo, as
dificuldades residem nos três critérios finais. Com relação ao terceiro critério – aplicação
segundo critérios objetivos –, nos concursos estaduais ainda são aplicadas formas de
avaliação essencialmente subjetivas, como dinâmicas de grupo e entrevistas. Assim,
diante da ausência de uma uma lei nacional, ainda é possível que existam avaliações
subjetivas em concursos públicos estaduais, de forma que tais avaliações iriam contra o
critério legal atualmente consolidado para os concursos federais. De qualquer maneira,
pelo que foi avaliado até o momento, pelo menos nos concursos federais esse critério de
objetividade dos critérios de aptidão está sendo respeitado.
A grande dificuldade para adequação da avaliação psicológica é o quarto critério
– caráter científico e padronização dos testes aplicados. Em primeiro lugar, os testes,
como se analisou em outra seção, apresentam grandes diferenças de resultado entre si,
89

quando aplicados no contexto dos concursos públicos. Além disso, existem testes
aprovados para uso que carecem de estudos de validade. Por outro lado, é consenso na
área de Psicologia que os testes nacionais ainda têm baixa qualidade psicométrica e que
muitos são copiados de outros países, sem a necessária adequação ao contexto brasileiro.
Com relação aos concursos públicos, existem pouquíssimos testes que tenham
sido desenvolvidos e validados exatamente para esse contexto e praticamente inexistentes
são os testes que tenham sido desenvolvidos para a seleção para cargos de segurança
pública. Logo, é temerário se afirmar que, analisando esse contexto, os testes sejam
aplicados com padronização para esse contexto. Quanto ao caráter científico dos testes
psicológicos, não se nega que tais testes são desenvolvidos com caráter científico.
Entretanto, a Psicologia é uma ciência recente e, como todas as outras, em
desenvolvimento e passível de erros. Assim, seus resultados não são absolutos – como os
próprios profissionais da área afirmam e se depreende das diversas citações da seção
dedicada à revisão dos artigos da área da Psicologia.
Além disso, a maior parte dos testes foi produzida para o contexto clínico da
Psicologia e para ser aplicado como apenas mais uma ferramenta no processo de avaliação
psicológica – e não como ferramentas para dar respostas definitivas a respeito da
personalidade de uma pessoa sendo avaliada para um cargo público. Logo, faltam estudos
– e caráter científico – na extrapolação e supervalorização que se faz dos testes
psicológicos no atual modelo de avaliação psicológica, mesmo que os testes estejam
sendo aplicados em condições inadequadas e diversas daquelas que foram empregadas
para a padronização.
Portanto, frente ao estudo realizado, as evidências apontam claramente que os
testes psicológicos não possuem adequada padronização para uso em concursos públicos.
Assim, esse critério legal não é adequadamente satisfeito, embora se pretenda que assim
seja. Como visto anteriormente, o único critério para uso de um teste é a recomendação
pelo CFP no SATEPSI – logo não há mecanismos atualmente para verificação desse
critério por outros profissionais que não sejam da área de Psicologia, já que os testes
psicológicos são exclusivos e sigilosos.
Por fim, quanto ao último critério, que é a possibilidade de recurso administrativo,
esse é totalmente desatendido, como já se demonstrou em outra seção desse trabalho.
Embora formalmente sempre exista a previsão de recurso aos candidatos, materialmente
não há possibilidade de reversão do resultado na avaliação psicológica, já que as bancas
tratam seus critérios de avaliação como sendo infalíveis e os profissionais dessas bancas
90

são extremamente reticentes à possibilidade de questionamento do mérito de sua


avaliação. Logo, não se pode afirmar que exista possibilidade de recurso se o recurso
nunca é aceito. Mesmo em casos em que é evidente a falha na avaliação, como os policiais
com larga experiência e currículo invejável que são considerados inaptos para outro cargo
policial, ou nos casos de inaptidão por baixo raciocínio verbal de candidatos com nota
máxima na redação e em língua portuguesa no concurso, as bancas nunca revertem o
resultado. Portanto, pelo que foi analisado é certo que esse critério é materialmente
desrespeitado, embora formalmente seja respeitado. No atual sistema constitucional,
satisfação formal apenas não é admitida, como é cediço.
Assim, considerando apenas os critérios para a legalidade que são estabelecidos
pela doutrina e jurisprudência majoritárias, já se percebe que o atual modelo viola a
legalidade, por ausência de padronização e por ausência da possibilidade real de recurso.
Entretanto, os critérios anteriormente analisados não são suficientes por si só para
determinar se há legalidade ou não na avaliação psicológica. De fato, como aponta uma
parcela da doutrina, como já discutido, as próprias normas dos testes e da avaliação não
são estabelecidas em lei, mas sim em resoluções do CFP. Ora, essas resoluções não são
lei, pois emanadas de uma autarquia e não da chefia do Executivo. Além disso, os próprios
perfis profissiográficos, que são usados como parâmetros para a fixação dos critérios de
aprovação não são estabelecidos em lei geralmente, mas sim em documentos internos – e
sigilosos – dos órgãos. Portanto, de nada adianta a lei fixar normas gerais e deixar à
questão totalmente aberta para ser complementada por resoluções e outros atos
administrativos, destituídos da atribuição do poder regulamentar necessário.
Mesmo que se considere que o CFP possui autonomia e atribuição para
regulamentar a questão, todavia, a questão ainda não se resolve. De fato, fica à margem
da atual regulamentação do CFP os critérios para escolha de quais testes serão usados e
de quais serão os critérios para a aptidão para os cargos. Essas questões são inteiramente
decididas pelas bancas de concursos e pelo departamento de seleção de pessoal dos
órgãos. Ora, nenhum destes possui poder de regulamentar tais questões, sendo que, dessa
maneira, toda a questão da avaliação acaba sendo feita a arrepio da legalidade.
Desse modo, não é incomum, como já analisado, que as bancas selecionem apenas
um teste como critério obrigatório para aprovação ou que fixem critérios totalmente
distintos para um mesmo cargo em Estados diferentes. Todas essas questões, pelo que
constam, não são devidamente fiscalizadas pelo CFP. Junte-se a isso o fato de tais
critérios serem sigilosos e está estabelecido um cenário em que, em última análise, a
91

decisão sobre quais os critérios para aprovação acaba recaindo sobre quem não tem
atribuição para regulamentar tais questões. Com as devidas proporções e para
exemplificar, seria como deixar para a banca do concurso a determinação do grau de
escolaridade necessário para o ingresso em um cargo qualquer.
Interessante se observar que é o entendimento dominante na Psicologia que a
avaliação psicológica é um processo amplo, que envolve diversas técnicas, como
entrevistas, observações e testes, todos sendo avaliados de forma integrada pelo
profissional. Entretanto, o que é feito nos concursos públicos é apenas a testagem
psicológica, posto que todo o contexto biopsicossocial do avaliado é desconsiderado e
tudo se resume a frios índices e percentis para aprovação – valores esses fixados ao
alvedrio da banca avaliadora. Portanto, o modelo atual de avaliação psicológica em
concursos públicos sequer pode ser considerado como sendo, de fato, “avaliação
psicológica”, no sentido que a Psicologia o define.
Assim, o que é previsto em lei é a avaliação psicológica. A definição do que seria
essa deve ser buscada na Psicologia. Porém, o que é aplicado não é avaliação psicológica
nos termos usados por essa ciência, mas mera testagem psicológica. Assim, o modelo
atual, em última análise, desrespeita a previsão legal.
Logo, no que diz respeito à legalidade, o atual modelo carece de regulamentação
para que se possa dizer que esse princípio é respeitado. O que se percebe é um verdadeiro
vácuo legislativo, que gera um estado de inconstitucionalidade, posto que a
Administração Pública deve fazer apenas aquilo que a lei determina, principalmente
quando impondo restrições aos administrados, como é o caso da eliminação de candidatos
a cargos públicos. Visto por outro prisma, a avaliação psicológica sequer é prevista como
etapa eliminatória dos concursos pela constituição, sendo construção do legislador.
Portanto, deve esse construir os parâmetros necessários para efetivar essa etapa, sob pena
de ferir o princípio constitucional da legalidade, como ocorre atualmente.

6.3.2 – Análise frente ao princípio da impessoalidade

Continuando, no que diz respeito ao princípio da impessoalidade, deve-se registrar


a preocupação, muito válida, trazida pela doutrina. Ao deixar para a banca avaliadora a
fixação dos critérios para aprovação, que somente serão divulgados depois do resultado
dessa etapa, abre-se a oportunidade para que os critérios sejam fixados de forma a
prejudicar ou ajudar pessoas em específico.
92

Se é certo que a boa-fé se presume, também é certo que é válido ter a preocupação
com a lisura do procedimento administrativo, sob pena de se criarem suspeitas, que
poderiam facilmente serem afastadas. Assim, no que diz respeito a esse princípio
constitucional, há uma brecha no sistema, que permite que os critérios de aprovação sejam
fixados a posteriori da avaliação.
Mesmo se aceitando que os processos são feitos sem favorecimentos a nenhum
candidato, é certo que a própria escolha dos testes muda a dificuldade da avaliação, como
já se demonstrou em outra parte desse trabalho. Portanto, ao determinar para a banca que
escolha testes e critérios mais rigorosos, ou “difíceis”, o órgão público poderia aumentar
ou diminuir a quantidade de candidatos aprovados nessa etapa, o que é outra brecha para
que o processo possa ser “pessoalizado”.
Mais do que isso, entretanto, o princípio da impessoalidade é seriamente
ameaçado pelo chamado funcionamento diferencial do item (DIF). Ora, se há evidências
científicas de que grupos diferentes do grupo para os quais os testes foram padronizados
podem ser prejudicados em seu desempenho nos testes, é certo que o processo deixa de
ter a devida impessoalidade, já que pessoas pertencentes a grupos minoritários poderiam
ser discriminadas no processo de seleção para os órgãos públicos.
Dessa forma, no que diz respeito ao princípio da impessoalidade, há brechas no
atual modelo que permitem que esse possa ser desrespeitado, embora nenhuma evidência
concreta nesse sentido tenha sido determinada pelo presente estudo.

6.3.3 – Análise frente ao princípio da moralidade

Quanto ao princípio da moralidade, trata-se de um princípio extremamente


abstrato, que demanda interpretação para a sua aplicação pelo profissional do Direito. A
despeito disso, existem vetores para a concretização desse princípio, como a não-
arbitrariedade, a proporcionalidade e outros.
Analisando, dessa maneira, a questão do atual modelo de avaliação psicológica
em concursos públicos, nota-se que o atual modelo apresenta, fundamentalmente, um
profundo viés de imoralidade: os candidatos que presumem boa-fé e exatidão na avaliação
psicológica e que participam do processo sem nenhum tipo de preparação anterior são
extremamente prejudicados, posto que suas chances de reprovação são aumentadas.
Utiliza-se o termo “reprovação”, pois é o termo adequado para essa situação. Como a
etapa é eliminatória, não há que se falar em mera “não-recomendação”, de forma a
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disfarçar o verdadeiro caráter de etapa de concurso que a avaliação psicológica possui


atualmente. Por outro lado, os candidatos que buscam informações na internet sob os
testes ou procuram profissionais da Psicologia e “burlam” as regras da avaliação são
favorecidos. Assim, totalmente imoral a situação atual, já que favorece quem responde de
forma enviesada aos testes psicológicos, muitas vezes com plena ciência de quais
resultados estão sendo buscados.
Além disso, o próprio processo de avaliação psicológica traz uma grande margem
de erros, tanto de falsos negativos quanto de falsos positivos. Esses valores foram
estimados no decorrer desse trabalho como sendo acima da casa dos 10%, pelo menos.
Assim, é certo que existe uma boa parcela de sorte em ser aprovado ou não na avaliação
psicológica – tudo pode depender de quais testes foram selecionados pela banca. Não há
como deixar de se apontar o fato de que um processo com tanta margem de erro e que
envolve o acaso é injusto – e se há injustiça, há imoralidade.
Essa injustiça fica ainda mais patente quando se analisam casos concretos: o
candidato que é policial e é eliminado em outra avaliação; o candidato que foi aprovado
na primeira avaliação e eliminado na segunda meses depois, para o mesmo cargo e pela
mesma banca; o candidato que foi afastado do cargo para o qual estudou por anos por
meras diferenças de percentis, fixados ao arbítrio da banca; o candidato que foi reprovado
por um teste que afirmava que ele possuía um temperamento que é conhecido de todos
que não possui; o candidato que teve resultados diversos para a mesma característica em
dois testes aplicados no mesmo dia e outros casos concretos. Ao mesmo tempo,
noticiários relatam servidores públicos despreparados e sem perfil atendendo à
população. Todo esse quadro é claramente de injustiça e afronta a moralidade, que se
espera dos processos seletivos da Administração Pública.
Analisando filosoficamente a questão da avaliação psicológica, resta ainda um
questionamento importante: se a personalidade muda continuamente, como fixar de
forma justa um momento no tempo para que essa possa ser avaliada, de forma a decidir
pelo ingresso ou não do candidato nos quadros públicos; se ela não muda, por que motivo
os resultados das avaliações psicológicas aplicadas em momentos distintos apresentam
resultados tão diversos? Não há como deixar de visualizar a arbitrariedade que está
envolvida nesse processo – e onde há a ausência de regras claras, sobra a injustiça.
Considerando, por outro lado, a questão dos erros, outro questionamento se
coloca: ao procurar evitar falsos positivos, aumenta-se a chance de falsos negativos. Quais
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os resultados práticos da escolha que se faz quanto a isso? Seria justo eliminar muitos
candidatos aptos para impedir que alguns candidatos inaptos entrem no serviço público?
Por tudo isso, conclui-se que o princípio da moralidade é afrontado pelo atual
modelo de avaliação psicológica, posto que esse modelo gera muitas injustiças e favorece
quem age de má-fé.

6.3.4 – Análise frente ao princípio da publicidade

No que diz respeito à publicidade, a primeira questão é que os próprios testes são
sigilosos, bem como os critérios de sua correção. Portanto, não há como questionar os
testes e seus resultados, pois os profissionais que não são psicólogos não podem ter acesso
a tais testes. Mais do que isso, sequer os critérios de aprovação nos testes são divulgados
antes da avaliação, como se comentou anteriormente. Em alguns casos, a banca limita-se
a afirmar que os critérios são de acordo com estudos científicos e com o perfil
profissiográfico do cargo – sendo que ambos são sigilosos. Além disso, nos concursos
estaduais é frequente que as bancas neguem acesso aos resultados da avaliação dos
candidatos considerados aptos.
Por tudo isso, fica claro que o princípio da publicidade não é respeitado no atual
modelo de avaliação psicológica. Pelo contrário, o atual modelo é feito para ser sigiloso
e incontestável pelos candidatos avaliados. Sem sombra de dúvidas, o aspecto mais claro
da inconstitucionalidade do modelo atual da avaliação psicológica é sua ausência de
publicidade, que acaba por ocultar os outros vícios existentes nesse modelo, posto que
esses acabam não se tornando conhecidos daqueles que não são da área de Psicologia –
ou que não se dediquem muito a buscar os conhecimentos necessários para essa avaliação.

6.3.5 – Análise frente ao princípio da eficiência

O princípio da eficiência, último dos cinco princípios da Administração Pública a


ser expressamente declarado, é também um dos mais importantes para o atendimento
constitucional das atribuições do Estado. No que diz respeito à avaliação psicológica, essa
seria um importante mecanismo para impulsionar a eficiência dos órgãos públicos, pela
seleção de pessoas com adequado perfil para os cargos.
Entretanto, devido ao formato atual da avaliação, que apresenta muitos erros, essa
etapa acaba se colocando com um entrave à eficiência na Administração Pública: elimina
candidatos com o perfil adequado (falsos negativos), permite a entrada de pessoas sem o
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adequado perfil (falsos positivos) e gera altos custos para o Judiciário, com a grande
judicialização dessa etapa do concurso. De fato, a imensa maioria das eliminações nas
avaliações psicológicas são questionadas na Justiça, principalmente por haver muitas
brechas e resultados incoerentes, como já analisado.
Com a judicialização dessa etapa e os entendimentos diversos no Judiciário,
muitos cargos públicos deixam de ser providos, por ficarem dependentes do trânsito em
julgado de ações judiciais envolvendo candidatos eliminados na avaliação psicológica.
Em outros casos, não tão frequentes, profissionais são exonerados depois de vários anos
por sucumbirem ao final da análise de suas ações judiciais.
Logo, o modelo atual de avaliação psicológica fere o princípio da eficiência, posto
que não seleciona os melhores candidatos sempre, permitindo muitos falsos positivos e
negativos. Além disso, por ser um método questionável de seleção, gera muitas demandas
judiciais, que oneram o Poder Judiciário e acabam deixando cargos públicos desprovidos,
deixando assim de atender aos cidadãos.

6.3.6 – Análise frente aos direitos sociais

De acordo com LENZA (2012), os direitos sociais, enquanto direitos de segunda


dmensão, apresentam-se como “prestações positivas a serem implementadas pelo Estado
(Social de Direito)” e tem como função a busca de uma isonomia substancial e social em
busca de melhores condições de vida, sendo verdadeiros fundamentos da República
Federativa do Brasil.
Assim, para o mesmo autor, os direitos sociais têm aplicabilidade imediata e
podem ser implementados, no caso de omissão legislativa, pelas técnicas de controle
constitucional, tais como mandado de injunção e ação direta de constitucionalidade por
omissão.
Quanto a isso, o direito ao trabalho é um dos direitos sociais essenciais, posto que
é um dos instrumentos essenciais para assegurar uma existência digna, nos termos do art.
170, caput da Constituição. Logo, o Estado deve incentivar a busca do pleno emprego e
a valorização do trabalho humano.
Dessa forma, os casos de falso negativo atentam contra o direito social ao trabalho,
ao afastar o cidadão de uma possibilidade de trabalho – muitas vezes uma para qual esse
se preparou por anos.
96

Nesse mesmo sentido, o inciso XXX do art. 7º da nossa Carta Maior proíbe
diferença de critérios de admissão que sejam discriminatórios. Assim, fica claro que
“nosso sistema constitucional é contrário a tratamento discriminatório entre pessoas que
prestam serviços iguais a um empregador” (RE 161.243, Rel. Min. Carlos Velloso, voto
do Min. Néri da Silveira, julgamento em 29-10-1996, Segunda Turma, DJ de 19-12-
1997).
Ora, se é defeso ao empregador particular estabelecer critérios de admissão
discriminatórios, a fortiori a Administração, que deve, aliás, impedir esses
comportamentos, muito menos pode criar critérios discriminatórios, sem fundamento
constitucional, para a seleção de pessoal para seus quadros. Entretanto, a possibilidade de
testes com funcionamento diferencial do item (DIF) faz com que, por consequência,
exista a possibilidade de critérios discriminatórios nos certames públicos.

6.3.7 – Análise frente a outros princípios constitucionais

Além dos cinco princípios expressos no caput do art. 37, outros princípios são
violados pelo atual modelo de avaliação psicológica nos concursos públicos.
Primeiramente, no que concerne ao princípio da isonomia, deve-se destacar
novamente o que já foi observado com relação a presença do funcionamento diferencial
do item (DIF), que faz com que pessoas pertencentes ao grupo social diverso daquele no
qual os testes psicológicos foram padronizados sejam prejudicados, como, por exemplo,
nos testes de raciocínio verbal.
Além disso, deve-se observar que a própria aplicação dos testes psicológicos pode
prejudicar a isonomia da avaliação psicológica. Quanto a isso, é conhecido que os
psicólogos que ficam responsáveis pela aplicação em cada local de prova nem sempre
possuem conhecimento adequado dos testes e das regras de avaliação. Assim, as
explicações dos testes e o esclarecimento das dúvidas dos candidatos fica prejudicada nos
locais em que os examinadores não tem o adequado conhecimento.
No mais, as condições de aplicação do teste podem influenciar no resultado,
especialmente em testes de atenção, de forma que fatores como iluminação, nível de
ruídos e outros podem gerar influência nos testes. Em concursos de grande porte, tais
como os da Polícia Federal e Rodoviária Federal, por exemplo, as avaliações são
aplicadas em diversas capitais ao mesmo tempo, nem sempre em condições iguais. É claro
97

que isso ocorre com outras etapas do concurso, mormente as provas de conhecimento,
mas nessas não se pretende haver padronização da forma de aplicação das provas – e nos
casos mais extremos há a possibilidade de anulação também dessas etapas. Além disso,
as provas objetivas, discursivas, etc. são etapas do concurso previstas
constitucionalmente, enquanto a avaliação psicológica não deveria ser considerada uma
etapa extra do certame.
Por outro lado, também é importante ressaltar-se que o formato atual de avaliação
psicológica fere o princípio da competição, que rege os concursos públicos, posto que
os candidatos que já se submeteram a anterior avaliação psicológica tendem a se sair
melhor em uma futura avaliação, até mesmo por já terem tido contato com os testes
aplicados. Claro que isso se aplica também às provas de conhecimento – mas se deve
lembrar que a avaliação psicológica não é considerada constitucionalmente uma etapa de
concurso, tal qual as provas de conhecimento, como afirmado acima. Além disso, o
modelo atual de avaliação favorece os candidatos mais abastados, que pagam para terem
treinamento com psicólogos antes da avaliação – embora os profissionais que realizam
tais treinamentos ajam de forma antiética e contrária aos normativos de sua categoria, é
certo que o CFP não consegue impedir tais práticas por seus profissionais, como ficou
demonstrado nos dados trazidos por esse trabalho. Até mesmo a divulgação na internet
dos testes psicológicos deve ser atribuída aos psicólogos, já que somente esses possuem
acesso aos manuais dos testes, de forma que somente por um psicólogo tais testes
poderiam ter sido divulgados. Portanto, o modelo atual de avaliação não é isonômico.
Continuando, também o princípio da segurança jurídica resta violado pelo atual
modelo de avaliação, especialmente pela ausência da previsão dos critérios que serão
avaliados e pela jurisprudência ainda vacilante sobre os candidatos que foram
considerados inaptos na avaliação. Não é nada incomum que candidatos que foram
igualmente considerados inaptos numa avaliação encontrem totalmente diversas soluções
no Judiciário. Logo, resta uma melhor consolidação jurisprudencial do assunto e melhor
regulamentação das avaliações.
Quanto ao princípio da supremacia do interesse público, que deve ser um norte
para todos os atos administrativos, exige esse que o processo de seleção de pessoal dos
órgãos públicos seja adequado, não eliminando candidatos aptos e eliminando os inaptos.
Entretanto, o atual modelo não consegue realizar adequadamente tais tarefas, dado seu
alto nível de erros. Portanto, clama o interesse público por aprimoramento das avaliações
psicológicas.
98

Da mesma forma, também o princípio da continuidade do serviço público é


violado pelos cargos que ficam vagos por conta de candidatos subjudices, bem como
pelos candidatos que são exonerados no trânsito em julgado de suas ações.
Ainda no que se refere aos erros presentes nas avaliações psicológicas, o princípio
da precaução indica que se deve evitar ao máximo os prejuízos para os administrados e
para a Administração. Assim, conhecendo que a taxa de erros nessas avaliações é alta,
clama esse princípio pela ponderação e aprimoramento do modelo atual.
Por fim, em última análise, até mesmo o princípio da dignidade humana é
violado pelo atual modelo de avaliação, posto que apresenta um modelo reducionista e
determinista da personalidade humana, que impede o cidadão de comprovar por seus atos
que possui capacidade e aptidão para o exercício do cargo público – cargo que, aliás, já
se habilitou nas etapas anteriores para exercer, competindo com diversos outros
candidatos.

6.4 – Conclusão da análise da constitucionalidade do modelo atual de avaliação


psicológica

Portanto, do exposto fica claro que o atual modelo de avaliação psicológica é


inconstitucional, por ofender os princípios que regem a Administração, em especial o
princípio da legalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, bem com outros
princípios constitucionais.
O que se nota, do que foi analisado ao longo desse trabalho, portanto, é que o atual
modelo de avaliação psicológica nos concursos públicos, em especial para os órgãos de
segurança pública, é apenas formalmente constitucional, posto que materialmente viola
os princípios constitucionais que regem à Administração Pública, bem como garantias
fundamentais dos candidatos injustamente eliminados dos processos seletivos. Os
critérios atualmente apontados como suficientes para a legalidade da avaliação
psicológica não são suficientes para garantir a exatidão dessa etapa e as taxas de falsos
positivos e falsos negativos são muito altas, o que demonstra a ausência de razoabilidade
na manutenção do modelo de testagem psicológica atualmente vigente. Os critérios de
aprovação nessa etapa não são regulados pela lei e sequer pelas normas do Conselho
Federal de Psicologia, havendo possibilidade de arbitrariedade por parte das bancas de
concurso na seleção dos testes e dos critérios para indicação dos candidatos. Todo esse
99

quadro é preocupante, especialmente por ser a avaliação psicológica uma etapa


eliminatória. Além disso, a possibilidade de recursos é meramente figurativa, posto que
as bancas nunca aceitam ter seus testes questionados, mesmo contra fortes evidências de
erros na avaliação. Portanto, esse modelo de avaliação precisa ser repensado, de forma a
se tornar adequado ao nosso sistema constitucional administrativo.
100

7 – CONCLUSÃO

Ao longo do presente trabalho, concluiu-se que o atual modelo de avaliação


psicológica é inconstitucional, por ferir materialmente princípios da Administração
Pública e garantias fundamentais dos candidatos. O formato atual de avaliação
psicológica, que se resume ao emprego de testes psicológicos objetivos - pelo menos no
âmbito federal -, é incapaz de realizar adequadamente a seleção de pessoal. Entretanto,
nos Estados é que a situação é mais crítica com relação à avaliação psicológica, já que
não existe adequada regulamentação do assunto. O modelo sob análise foi devidamente
apresentado e detalhado nas seções iniciais desse trabalho.
Pelo apresentado ao longo do trabalho, há diversos questionamentos, tanto
jurídicos quanto da Psicologia, sobre a qualidade e validade dos testes psicológicos
empregados para a seleção de pessoal para os órgãos públicos atualmente, bem como
quanto aos resultados da avaliação psicológica como um todo, pelo modelo atual.
Nesse sentido, demonstrou-se com dados concretos como os erros envolvidos na
avaliação psicológica são muito altos, girando em torno de 20% nos casos estudados - o
que é um índice inaceitável para uma etapa que é eliminatória.
Modelos alternativos de avaliação foram apresentados, mostrando como outros
países, que são referência em segurança pública, tratam a questão. Como resultado,
determinou-se que em nenhum deles há o emprego da testagem psicológica como critério
único de eliminação de candidatos, como ocorre no Brasil.
Assim, frente aos dados avaliados e em comparação aos preceitos constitucionais,
concluiu-se que o modelo de avaliação psicológica é inconstitucional. Como resposta a
essa constatação, sugestões foram feitas, com base nos modelos alternativos
apresentados, para adequação do modelo brasileiro à Constituição.
Conclui-se, portanto, que há necessidade de alterações no modelo atual, de forma
a aprimorar o processo de seleção de pessoal para os quadros de segurança pública e
outros no Brasil, de forma a melhorar a qualidade do serviço prestado ao cidadão, já que
a supremacia do interesse público é voltada justamente para atender a este.
Diante das conclusões pela inconstitucionalidade do modelo vigente de avaliação
psicológica, algumas sugestões podem ser feitas, com base no que foi pesquisado e nos
modelos estrangeiros de avaliação.
A principal dificuldade do atual modelo reside no fato de ser uma etapa única e
eliminatória dos concursos. Com isso, as regras para a avaliação acabam por ter de ser
101

muito rígidas, com o emprego apenas de testes objetivos e sem a possibilidade de uso de
testes projetivos, dinâmicas, entrevistas, observações, etc. Logo, o que é feito, como já
foi afirmado anteriormente, é a mera testagem psicológica, não uma avaliação psicológica
de fato. O ideal seria, de forma a permitir um processo de avaliação mais amplo, que a
avaliação psicológica deixasse de ser eliminatória e passasse a ser um processo indicativo
para as habilidades e aptidões dos candidatos selecionados, que permitisse que a
Administração pudesse alocar seus futuros servidores em funções que fossem adequadas
ao seu perfil. Sem a possibilidade de eliminação, não haveria questionamentos judiciais
a respeito dessa etapa e, com isso, haveria flexibilidade para que a avaliação psicológica
fosse realizada de forma aprofundada.
Além disso, em prol de uma avaliação mais ampla, poder-se-ia durante os cursos
de formação dos cargos, que geralmente duram mais de dois meses e nos quais há o
acompanhamento diário dos candidatos, realizar observações sobre o comportamento e
aptidões dos concursandos, sendo que, em casos em que o candidato demonstre
problemas psicológicos durante a formação poder-se-ia pensar em uma nova avaliação
por parte dos psicólogos que compõem o órgão.
É duvidoso o raciocínio de que a avaliação psicológica por meio de meros testes
objetivos consegue determinar o perfil de pessoas com problemas psicológicos, como
ficou demonstrado nesta pesquisa. Não por menos, nenhum dos países analisados neste
trabalho possuem um modelo como o brasileiro, no qual há emprego apenas de testes
psicológicos e eliminação com base em índices diferentes do mínimo (como no modelo
finlandês).
Por outro lado, durante o curso de formação, no qual o candidato pode ser
observado durante meses, a possibilidade de detecção dessas patologias é muito alta.
Logo, como o curso de formação ainda é uma etapa do concurso, o momento adequado
para aprofundar a avaliação do perfil dos candidatos é nesse curso, não em apenas um dia
de testes psicológicos, como ocorre atualmente.
Com avaliações mais profundas e ao longo de um período maior de tempo, as
chances de falsos negativos seriam extremamente reduzidas, o que acabaria com a
principal injustiça do atual modelo, que é a eliminação dos candidatos aptos por erro nas
avaliações. Da mesma forma, os falsos positivos, que são decorrência dos erros do modelo
atual e também do treinamento prévio dos candidatos, também seriam diminuídos,
permitindo que o quadro dos órgãos pudesse ser fortalecido.
102

Sem o caráter eliminatório da avaliação psicológica, poderiam ser usadas bases


computadorizadas de testes psicológicos, com um grande volume de avaliações, como
ocorre em Singapura, de forma que não haveria mais a possibilidade de conhecimento
prévio dos testes pelos candidatos, como ocorre atualmente. Essas bases poderiam ser
alteradas de tempos em tempos, além disso. No mais, com o emprego de técnicas
psicométricas seria possível a melhor padronização desses testes ao longo do tempo,
dentro do contexto específico da seleção de pessoal para órgãos públicos, o que difere
totalmente do que atualmente ocorre. Da mesma forma, estudos poderiam ser realizados
de forma a impedir a presença de funcionamento diferencial dos itens (DIF), de forma a
não haver viés nas avaliações.
Entretanto, a avaliação não poderia ficar restrita apenas a testes psicológicos
objetivos. Esse modelo de emprego apenas de testes padronizados pelo SATEPSI é
incapaz de avaliar adequadamente, pois os testes não são padronizados para concursos e
pelo fato de os candidatos treinarem os testes. Assim, como ocorre na maior parte dos
países, deve haver um processo de entrevistas, dinâmicas, etc. Para permitir esse processo
aprofundado de avaliação, deve-se usar o período de curso de formação dos policiais e
outros agentes de segurança pública. Logo, o que se busca é um processo avaliativo
completo e prolongado, durante a formação do servidor. Somente assim haverá segurança
para o processo decisório.
Com esse modelo alternativo, é possível também uma alocação mais adequada
dos candidatos depois da posse, de forma a aproveitar todo o potencial dos candidatos e
impedir a desmotivação, que é alta atualmente nos órgãos de segurança pública
brasileiros.
Portanto, deve-se repensar o atual modelo, eliminando sua característica
eliminatória e pontual, em prol de um processo de avaliação prolongado e completo, que
permita um real conhecimento das aptidões e perfil dos candidatos, de forma a valorizar
o quadro de pessoal dos órgãos. No meio científico da Psicologia há consenso de que a
avaliação psicológica deve ser um processo amplo e com emprego de mais de uma técnica
e instrumento para avaliação por parte do profissional. Desse modo, esse modelo
alternativo vai ao encontro tanto das conclusões da Psicologia quanto das questões
jurídicas envolvidas, buscando a isonomia, a moralidade e a eficiência no processo de
seleção para os quadros públicos.
Não se pode argumentar quanto à sugestão acima que ela encareceria o processo
de seleção, por duas razões. Primeiramente, já existem profissionais que acompanham os
103

candidatos durante o curso de formação usualmente – pelo menos na Polícia Federal


existe um orientador para cada turma e um corpo de psicólogos que trabalha junto aos
candidatos durante toda a formação, que dura quatro meses. Logo, não haveria maiores
custos – bastaria que esses profissionais realizassem suas tarefas de forma adequada a
observar o perfil dos candidatos. Em segundo lugar, não se deve considerar os valores
empregados para a qualidade da segurança pública como um gasto, mas sim como um
investimento, ainda mais em um país com tão altas taxas de violência como o Brasil.
Obviamente que para que as sugestões como as acima possam ser utilizadas há a
necessidade de investimentos, estudos e também alterações legislativas. No entanto, é
consenso que a segurança pública é prioridade em nosso país.
Do que foi analisado de outros países, que são referências no assunto de segurança
pública, a avaliação psicológica deve ser realizada de forma mais ampla, não usando os
testes psicológicos como critério único de avaliação. Da experiência internacional é
possível se deduzir até mesmo que a avaliação psicológica não é requisito para um quadro
eficiente e qualificado de pessoal, como demonstram os exemplos analisados.
Na verdade, o verdadeiro momento para avaliação dos candidatos é durante o
curso de formação da carreira e durante as várias etapas que compõem o processo de
seleção, momento em que os candidatos são testados em suas aptidões. Relegar o
acompanhamento durante essa etapa em prol de um dia de testagem psicológica é
inaceitável. Pelo que foi apresentado, resta claro que um dia de avaliação com testes
psicológicos não pode fornecer o mesmo nível de informações que o acompanhamento
do candidato por meses, durante o curso de formação, pode fornecer.
Além disso, o que se percebe dos processos de seleção de outros países é que a
avaliação fica a cargo do próprio órgão, ou recebe um acompanhamento muito próximo
desse em cada etapa. Diversa é a situação no Brasil, em que há um verdadeiro processo
de terceirização das etapas de concurso, deixando a seleção dos candidatos para as bancas
de concursos, que sequer possuem conhecimento das reais necessidades dos órgãos
públicos.
Em resumo, o modelo atual, de mera testagem psicológica, terceirizada para
bancas de concursos, deve ser substituído por um modelo mais amplo de avaliação, com
uso, se necessário, de testes de bases computadorizadas, e de outros métodos avaliativos,
como entrevistas, por exemplo. Essa avaliação deve ser aplicada pelo próprio órgão, de
forma individual, se possível, e com caráter indicativo e não eliminatório, de preferência.
Caso se entenda pelo caráter eliminatório, deve-se avaliar os testes dentro de um quadro
104

maior, como ocorre em outros países – e mesmo permitir a realização de novas avaliações,
como ocorre nos EUA, de forma a evitar falsos negativos. O que não se pode permitir é
que o Brasil continue dando um peso aos testes psicológicos que outros países, muito
mais avançados em segurança pública e em psicometria, não dão. Sequer o Conselho
Federal de Psicologia considera o modelo atual de avaliação como sendo adequado, como
foi já discutido. Portanto, é urgente que nosso modelo de avaliação psicológica seja
repensado.
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