You are on page 1of 10

Dar-se uma vida: autobiografia como

metodologia filosófica no jovem Nietzsche


Fabiano de Lemos Britto1

Resumo: No imbricamento entre a dimensão estilística e o conteúdo


positivo das teses filosóficas de sua obra, a autobiografia surge para
Nietzsche como o dispositivo segundo o qual ambos se reúnem, tor-
nando-se indissociáveis. Esse procedimento é evidente em textos como
Ecce Homo, mas está presente em textos muito mais antigos, como as
tentativas autobiográficas de sua época de estudante secundarista. A
análise do surgimento, nesse momento, do problema da escritura de si
mesmo como prática político-filosófica pode nos levar a propor um
princípio estratégico coerente para a leitura dos escritos de Nietzsche
como “obra”.
Palavras-chave: Nietzsche – autobiografia – Bildung – metodologia
filosófica.

Poucos autores em filosofia foram objetos de apropriações tão


numerosas e diversas quanto Nietzsche – da leitura nazista de Bäumler,
2
no começo do século XX , às interpretações de Deleuze, Foucault e Der-
rida, na França imediatamente pré e pós-maio de 1968, um grande
esforço interpretativo colocou em disputa o sentido desse difícil arqui-
pélago que se convencionou, não de forma unívoca ou definitiva, cha-
mar sua “obra”. A maior dificuldade dessa tarefa – e indicá-la tornou-se
um lugar-comum entre os comentadores de Nietzsche nas últimas déca-
das – se deve, em grande parte, à própria resistência que esse grupo de
textos oferece em fornecer um critério de unidade constante ou, ao

1 Doutorando em filosofia política na UERJ. Orientador: Prof. Dr. Ricardo José Correa
Barbosa. E-mail: fabianolemos@gmail.com
2 Cf. Montinari (1999).
22 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38. Dar-se uma vida: autobiografia como metodologia filosófica no jovem Nietzsche 23

menos, uniformemente indexável. Nesse sentido, é impossível abordar recondução da língua ao seu caráter originário, ele é o resultado de um
esses escritos sem que se decida, antes, que tipo de intenção se procura certo espaço para onde a narrativa é conduzida, onde, entre conteúdo e
fazer funcionar em seu interior, e mesmo uma proposta como a da edi- forma, já não é possível distinguir um do outro. O performativo, que
ção das obras de Nietzsche precisa levar em conta seu risco – é Derrida muitos comentadores de Nietzsche pretendem assinalar como o proce-
quem levanta esse problema, questionando o critério de unidade que dimento-chave de seu discurso filosófico como um todo, assume aqui
3
está em jogo na mais recente dessas edições. uma função bastante específica – a de tornar presente, a partir de um
Do ponto de vista estilístico, a herança romântica do fragmento gesto discursivo, a própria origem à qual esse discurso se refere.
como forma filosófica – recebida, ainda que difusamente, através de Nietzsche concebe, assim, uma defesa do “estilo apresentado estética e
4
Novalis ou Schlegel – adotada e redimensionada em textos como os de empiricamente, que se compara a uma performance estética, como uma
7
A gaia ciência, parece se contrapor, ponto a ponto, ao condensado cará- arte que se reflete como a demonstração e a produção encenadas” .
ter argumentativo de O nascimento da tragédia ou das Considerações Tal concepção, como na maioria das idéias desenvolvidas a respeito
extemporâneas. É verdade que entre a pesquisa sobre as fontes de Dio- do uso da língua alemã, pode ser assinalada como, em maior ou menor
genes Laertios, que Nietzsche havia elaborado ainda como estudante de medida, inscrita na visão geral defendida por Schopenhauer. É bom lem-
filologia em Leipzig (De Laertii Diogenis fontibus, publicado em 1868) e brar que o conceito de estilo ocupa um lugar fundamental na avaliação
o cuidadoso e extenso índice que elaborou para o Rheinisches Museum que este último faz da produção literário-filosófica da Alemanha de sua
für Philologie a pedido de seu professor Friedrich Ritschl (publicado em época, e se o nega a esta, como signo de sua decadência, é porque a ela
1872), se impunha uma certa intenção sistemática a seus textos. Algo lhe falta aquilo que ele define como “a fisionomia do espírito”: pois “o
dessa tendência se observa nos incontáveis planos, fatalmente abando- estilo mostra o caráter formal de todos os pensamentos de um homem
8
nados, de concluir grandes séries de textos, que forneceriam uma visão (...)”. Muitas passagens de sua obra insistem na predominância estraté-
5
ampla e aprofundada de suas reflexões filosófico-estéticas. Mas gica do estilo sobre o conteúdo positivo dos trabalhos de um autor:
Lacoue-Labarthe conclui, contudo, que esses seriam os únicos esforços “Para se fazer uma primeira avaliação acerca do valor [Werth] do pro-
levados a cabo no sentido de dar uma forma não fragmentária a um de duto intelectual de um escritor, não chega a ser necessário saber sobre o
seus textos, e, nesse caso, o livro sobre a tragédia seria “no limite, o que ou o que ele pensou; para isso seria necessário que se lesse profunda-
6
único ‘Livro’ de Nietzsche”. mente toda sua obra – ao invés disso, basta saber apenas como ele pen-
9
Tudo isso parece se complicar se levarmos em conta que a dimensão sou”.
estilística de uma obra não era, para Nietzsche, extrínseca ou de natu-
reza diversa do conteúdo positivo que ela deveria veicular: entre o estilo Assimilando, portanto, como divisa a máxima de Buffon, Le style c’est
e as teses de um trabalho, portanto, uma forma de tangência elíptica l’homme même [O estilo é o próprio homem], a própria idéia de obra em
impossibilita que se analise o primeiro sem que as últimas surjam no Nietzsche comporta em seu núcleo a questão intermitente da autobio-
horizonte da análise – e vice-versa. O estilo deve ser o difícil trabalho de grafia. Se o ato da escritura – assim como seu resultado – está investido
por essa compreensão do escrever como escrever sobre si, em torno de
3 Cf. Derrida (1978a, p. 104). si e a partir de si, toda tese filosófica é, em última análise, uma narrativa
4 Adrian Del Caro relativizou recentemente essa influência – cf. Del Caro (1989 , p. 161).
7 Simonis (2001, p. 58).
5 Nietzche, F. Sämtliche Werke. Kristische Studienausgabe (doravante citada como KSA),
Bd. VIII, pp. 754-755. 8 Schopenhauer (1877, p. 550).
6 Lacoue-Labarthe (1971, p. 57). 9 Ibidem.
24 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38. Dar-se uma vida: autobiografia como metodologia filosófica no jovem Nietzsche 25

11
memorial. Esse dispositivo é evidente em obras como Ecce Homo, mas problema fundamental de sua vida e de sua filosofia”.
pode ser observado em textos muito anteriores, em suas tentativas de Os diferentes desenvolvimentos dados ao projeto de uma autobio-
escrever uma autobiografia de sua época de estudante secundarista em grafia, desde o mais antigo documento de que dispomos, até o
Pforta. O que esses trabalhos juvenis articulam é bem mais que o conte- momento em que Nietzsche reorienta tal projeto em função do fim de
údo ingênuo de que eles pretendem dar conta, às vezes de forma ana- um ciclo – o que o caracterizava como estudante secundarista [Schüler] –
crônica: eles funcionam, antes, como protocolo de leitura para um e o início de outro – o de Student, de aluno universitário, perfazem uma
procedimento filosófico que insistirá sobre a autobiografia como prope- trajetória extremamente importante para as questões que se colocarão
dêutica, como método, mas também como escatologia para um pensa- ao professor universitário em seguida. Trajetória que pode ser demar-
mento ocupado com sua superação e seus limites. cada, de forma estratégica, cronologicamente. Entre 1856 e 1864,
É desnecessário insistir sobre o fato de que não se trata aqui, absolu- Nietzsche escreve, segundo os registros que ainda sobrevivem, ao
tamente, de reconstruir, ainda que como em sobrevôo, uma biografia, menos oito tentativas de autobiografia. Elas figuram entre alguns outros
pessoal ou intelectual. Essa tarefa está, invariavelmente, aberta. E é fragmentos de caráter autobiográfico, tentativas abandonadas de memó-
nesse sentido, como uma tarefa que se impõe indefinidamente, e não rias, lembranças ou relatórios escolares de viagens, mas esse pequeno
como resultado monolítico mais ou menos legítimo, mais ou menos conjunto se sobressai por seu caráter mais abrangente. Outros textos de
autorizado, mais ou menos científico, que Nietzsche compreendia essa Nietzsche desse período e do que imediatamente lhe segue se detêm,
escritura: uma prática filosófica, política, de si mesmo. Desde muito sobretudo, em narrativas sobre seus anos letivos escolares, que podem
cedo a questão da relação entre biografia e pedagogia, ou antes, entre o ser lidas como relatórios. É o caso de Retrospectiva de meus dois anos em
desenvolvimento histórico de uma vida e o percurso de sua formação Leipzig [Rückblick auf meine zwei Leipziger Jahre], de 1868. De dimen-
intelectual-espiritual, sua Bildung, em um sentido amplo, se apresentou são variável, mas nunca extremamente longa, algumas vezes interrompi-
para Nietzsche. Na realidade, toda sua filosofia pode ser entendida das subitamente, numa linguagem que varia entre a afetação poética e
como uma tentativa sempre retomada de elaborar a difícil relação entre uma descrição pormenorizada dos fatos, a primeira delas surge em 1856,
o tornar-se, como indica o subtítulo de Ecce Homo, e o formar-se. É essa ainda sem título. A esse rascunho dos doze anos seguem-se os textos
a razão pela qual as recentes análises de Nietzsche, como lembra Volker que recebem, enfim, o reconhecimento de sua natureza, com o título
Gerhardt, têm “situado Nietzsche na conexão entre as considerações que varia pouco, entre Mein Leben [Minha vida] e Mein Lebenslauf
10
sobre a vida e sobre o ato de escrever”. O olhar retrospectivo de [Minha trajetória de vida]. Lebenslauf designa, também, uma espécie de
Nietzsche na direção de sua infância, e, mais tarde, de toda sua vida, curriculum vitae, próximo daquilo que em português conhecemos
assumiu ao longo de sua obra filosófica a função de uma dinâmica capaz como memorial, em que o autor se apresenta, através de uma pequena
de fazer emergir boa parte dos problemas que ela discute. É o caso, por dissertação sobre sua vida, como candidato a um cargo qualquer, a uma
exemplo, de Joergen Kjaer, que, tomando como exemplo as interpreta- bolsa de estudos a uma vaga em uma universidade. Um dos exemplos
ções de Deleuze e Richard Rorty, pretende sustentar a tese de que desse uso do Lebenslauf pelo próprio Nietzsche nos é fornecido na nar-
“Nietzsche vivenciou o fato de sua origem [Herkunft] e de sua socializa- rativa anexada à carta de 1° de fevereiro de 1869 ao professor Wilhelm
ção como uma contingência estranha, e que não quis se conformar a Vischer-Bilfinger, diretor do Conselho de Professores da Universidade
elas sob nenhuma circunstância”; assim, “essa recusa representa um de Basiléia, por ocasião de sua candidatura à cadeira de Filologia

10 Gerhardt (1992, p. 30). 11 Kjaer (1994, p. 213).


26 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38. Dar-se uma vida: autobiografia como metodologia filosófica no jovem Nietzsche 27

Clássica, que passaria a ocupar logo depois. Com algumas escassas a sua transformação naquilo que ele é que o exercício escolar, monó-
variáveis, os fatos narrados nesses textos remontam à infância em tono e repetitivo, deve intervir. Mais tarde, a insistência com que seus
Naumburg após a morte prematura do pai e a vida como estudante, até o textos exaltarão esse modelo de disciplina [Zucht] como o único capaz
período do Gymnasium de Pforta. Mas a monótona repetição que os de realmente formar, como a resposta para uma pretensão de autono-
atravessa perde em importância diante da considerável modificação no mia [Selbständigkeitsdünkel], responsável pela miséria intelectual dos
sentido que Nietzsche vê nessas suas lembranças e no empreendimento estabelecimentos de ensino, não deixará nenhuma dúvida quanto à rela-
13
de tomar nota delas, na medida em que se sucedem. São os motivos que ção de Nietzsche com esse passado . O que essa disciplina faz surgir em
determinam a tarefa que se deixarão entrever no modo como ela se rea- Nietzsche, como sua vida e sua história intelectual, eis o que o percurso
liza; eles construirão o sentido de uma escritura autobiográfica, do qual das autobiografias nos permite tentar responder.
se lançará mão mais tarde, no âmbito de uma reflexão filosófica. Deve-se acrescentar a essa argumentação o fato de que, de acordo
O fato de que Nietzsche, desde os doze ou quatorze anos, já se pro- com vários indícios, Nietzsche fez da tarefa da autobiografia também um
ponha o problema de sua biografia, e encontre nele um lugar central assunto privado. Em carta a Wilhelm Pinder de 28 de novembro de
14 15
para o tema da Bildung, por si só, não representa em nada algo excepci- 1858 e à sua mãe, datada do dia seguinte , Nietzsche faz referência aos
onal. Isso por, pelo menos, dois motivos. Em primeiro lugar, por se apre- cadernos in-octavo, que gostaria de usar para escrever sua biografia, em
sentarem, formalmente, como textos que, talvez, respondiam apenas uma lista de presentes de Natal: junto ao Réquiem de Mozart e às Esta-
aos exercícios escolares requeridos em Pforta. A cronologia de seu sur- ções de Haydn, encontramos esses “Oktavebücher für meine Biograp-
gimento parece confirmar essa hipótese. Em segundo lugar, a relevância hie”. Pouco depois, em meados de fevereiro do ano seguinte, em outra
da cultura e da formação cultural em uma biografia pode ser entendida carta a Pinder, Nietzsche envia um parágrafo narrando sua partida da
como o modelo geral para esse tipo de empreendimento literário que se Naumburg por ocasião de seu exame de admissão em Pforta – o que
encontra nas raízes de nossa modernidade, especialmente no roman- ocorrera pouco mais de um ano antes – e que deveria se seguir de outras
16
tismo alemão, embora se estendam muito além dele: entre o jovem folhas que comporiam sua biografia. Por fim, em carta à mãe escrita
Werther, de Goethe, e o jovem Törless, de Musil, a herança intermitente entre abril e maio de 1861, Nietzsche lhe solicita que lhe envie de casa
de uma questão se apresenta para esses que, como Nietzsche, mal dei- sua “biografia”, pois precisa entregar em Pforta uma redação sobre esse
12
xaram para trás os anos da infância . Mas não é a uma possível origina- tema. Esses dados são suficientes para tornar relativa a pertinência do
17
lidade de Nietzsche que fazemos apelo; talvez seja, muito antes, o exercício de autobiografia às tarefas escolares, de Naumburg ou Pforta.
contrário. E a natureza escolar desses escritos nada depõe contra o que
nos interessa fazer surgir: ela se oferece mesmo como ocasião para veri-
ficarmos o modo como Nietzsche revela ao seu leitor, seja o professor 13 KSA, I, 740: “Tempo feliz aquele onde os jovens eram suficientemente sábios e cultivados
[weise und gebildet] para poderem manter a si mesmos sob rédeas [um sich selbst am
ou um olhar anônimo qualquer, a imagem de sua vida. E se falamos de Gängelbande führen zu können]! Insuperáveis Ginásios, que conseguem implantar a
imagem, Bild, é para lembrarmos sua íntima afinidade com a Bildung, a autonomia lá onde outras épocas acreditavam dever implantar a dependência, a disciplina, a
submissão, a obediência [Abhängigkeit, Zucht, Unterordnung, Gehorsam] e afastar qualquer
imagem anterior, a imagem em formação: é essa, e não a memorabilia pretensão de autonomia [Selbständigkeitsdünkel]”.
precoce de Nietzsche, que deverá tomar, aos poucos, o lugar no proce- 14 Briefwechsel, Bd. I-1, pp. 31-32, doravante citada como KGB, seguida da numeração do
volume e das páginas, respectivamente.
dimento autobiográfico. É precisamente para promover no jovem aluno
15 KGB, I-1, 33.

12 Werke in drei Bänden, Bd. 3, p. 3 – doravante abreviada simplesmente como WdB, 16 KGB, I-1, 47-50.
seguida do número do volume e da página WdB III, 13. 17 KGB I-1, 155-156.
28 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38. Dar-se uma vida: autobiografia como metodologia filosófica no jovem Nietzsche 29

A princípio, os temas da formação cultural, da escola e de sua fun- [“nur durch Tradition”: literalmente, “apenas através da Tra-
ção, ainda se vinculam de maneira pouco refletida, quase sazonal, ao dição”].19
empreendimento da autobiografia. O primeiro texto de memórias, de
1856, revela uma outra preocupação: a de resgatar uma história pessoal Tudo isso sublinha a dificuldade da decisão. Primeira tentativa autô-
que ameaça, incessantemente, se apagar para sempre – noma, primeiro afastamento voluntário de uma tradição que se instaura
apenas no limite do verossímil, ou do provável. Não que esse afasta-
Finalmente minha decisão [Entschluss] está tomada; escre- mento coloque em questão a relação de Nietzsche com uma tradição no
ver um diário em que se transmita tudo à memória, quer sentido mais amplo; trata-se mesmo de um afastamento necessário, da
tenha afetado o coração alegre ou tristemente, para lembrar tradição, e em seu próprio seio. Pois tomar para si o fio narrativo da vida,
ainda, após anos, da vida e das atividades dessa época, poder assinar sua própria biografia, ao final de uma ponderada reflexão
especialmente das minhas. Possa essa decisão não se tornar sobre o passado, eis o exercício imposto ao bom protestante de então,
vacilante, ainda que consideráveis obstáculos se coloquem como lembra Jean-Louis Backès: “Ela [a autobiografia] não serve, nesse
no caminho.18
meio protestante, de substituto ao exame de consciência que em outra
20
parte, na Igreja romana, supõe a confissão?”. Herança paternal, sobre-
O ciclo das autobiografias juvenis de Nietzsche se inicia, então, por
tudo, essa apropriação mantém sua dupla acepção: um tomar para si e
esse gesto difícil que é a decisão de narrar a si mesmo, ou a um possível
um tornar próprio; dar-se uma vida e dar a ela um nome.
leitor interessado, o movimento de uma vida, de suas atividades [Trei-
Mas há algo para além da autobiografia que, contudo, se anuncia
ben, no sentido de ocupações]. O diário se apresenta, portanto, como o
nela exatamente em suas primeiras versões, e que se desloca, em
resultado de uma decisão, cuja necessidade há muito tempo já havia
seguida, do domínio das memórias para um domínio mais amplo de
sido pressentida. Essa dificuldade é imanente ao que há de fundamental
reflexão. Trata-se de uma política da memória, ou antes, de uma política
no projeto, pois a redação dos dias e de seus trabalhos só é possível no
do esquecimento. O motivo inicial da autobiografia, através do registro
momento em que se abandona a força do tempo que tende ao completo
da lembrança, anuncia uma formulação que é, ao mesmo tempo, base
esquecimento. A autobiografia, cuja forma elementar é o diário, consti-
conceitual e axiomática para a produção intelectual de Nietzsche em seu
tui esse salto para fora do tempo, para o lugar mesmo em que se encon-
período em Basiléia. A leitura de Sobre verdade e mentira no sentido
trará o personagem principal da narrativa, apenas adivinhado entre as
extra-moral, texto elaborado por Nietzsche à margem da primeira Con-
linhas. Em 1858, em um outro texto semelhante, a posição é confirmada:
sideração extemporânea, em 1872, indica a perspectiva segundo a qual
é preciso, enfim, resgatar a vida que não pára de se perder:
o esquecimento [Vergessenheit] recobre o espaço múltiplo e caótico das
Quando se é adulto, lembramos habitualmente apenas dos intuições originárias para fazer valer uma outra origem, conceitual, abs-
21
pontos mais marcantes [der hervorragendsten Punkte] da trata, metafórica . É quando o homem esquece a primeira origem,
primeira infância. Ainda não sou realmente adulto, mal quando ele faz valer o tempo da tradição, do que se convencionou
deixo para trás os anos da infância e da meninice [Kindheit dizer, que ele perde a realidade de seu mundo – e só poderá recuperá-la
und Knabenzeit], e, no entanto, muitas coisas já me desapa- ao fazer valer, igualmente, um outro tempo, o que retorna à verdadeira
receram da memória, e o pouco que disso lembro foi apa-
rentemente conservado apenas através do que se contou 19 WdB III, 13.
20 Backès (1994, p. 10).
18 WdB, III, 9. 21 KSA I, 878-879 e ss.
30 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38. Dar-se uma vida: autobiografia como metodologia filosófica no jovem Nietzsche 31

origem para tomar posse dela. Embora alguma frágil continuidade possa Peço, inicialmente, que as considerações de minhas pró-
ser desenhada, estamos aqui bem longe da política do esquecimento prias poesias não sejam entendidas como vão interesse pes-
ativo de 1887, quando a Genealogia da moral pretenderá ver no esque- soal [eitles Selbstinteressantsein]. Estou bem longe do tempo
cimento não a “vis inertiae”, mas a força produtiva que orienta o ato de em que tentava representar através dos efeitos delas sobre
mim, para escrever críticas auto-satisfatórias. Pelo contrário,
criação, que recusa a promessa e o comprometimento moral da respon-
22 penso em mostrar não como se é poeta, se nasce [poeta],
sabilidade . O encadeamento esquecimento–origem abstrata–tradição
mas como alguém se torna poeta, quer dizer, como, pelo
se opõe, ponto a ponto, ao mais tardio, esquecimento–amorali- assíduo trabalho de rima [Reimschmied], à medida de uma
dade–liberdade. Ao socorro do primeiro, deveria vir a memória, o pro- crescente habilidade espiritual, pode-se tornar, finalmente,
cedimento-chave já presente na autobiografia juvenil; o segundo, uma um pouco poeta.(...)
vez perdida a ilusão do nome próprio e apagada a assinatura, será a res-
posta de uma genealogia. Não é somente interessante, mas sobretudo necessário,
Essa motivação, entretanto, deverá se apagar do domínio da tarefa colocar diante dos olhos, tão fiel quanto possível, o pas-
autobiográfica seguindo o movimento mesmo pelo qual ela passa a atra- sado, especialmente os anos de infância, pois nunca pode-
vessar outras esferas do pensamento de Nietzsche. Deslocamento que mos chegar a um juízo claro sobre nós mesmos se não
nos faz reconhecer a mudança: aos poucos, a autobiografia encontrará considerarmos suficientemente as circunstâncias em que
fomos educados [wir erzogen sind] e medirmos sua influên-
seu núcleo na questão da Bildung. A vida como coletânea de fatos
cia sobre nós.24
empíricos, eternamente fixados, tornados estáticos pelo registro da lem-
brança, deverá ceder lugar a uma descrição móvel dos processos de for-
A nova crítica surge no momento em que a história natural, o qua-
mação cultural e a uma reflexão em torno deles.
dro geral das classificações, cede lugar ao procedimento biológico,
Um exemplo dessa progressiva modificação se dá no modo como
atento aos movimentos subterrâneos, ao trabalho silencioso do tempo
Nietzsche opera a autocrítica de seu trabalho poético. Em 1858, ao nar-
que se escoa sob a superfície meramente histórica. A época da crítica
rar seus anos de juventude (Die Jugendjahre, 1844 bis 1858, subtítulo
auto-satisfatória, das memórias afetivas, insiste Nietzsche sob forma de
dado por Nietzsche a sua biografia de então), Nietzsche traça o desenho
apelo ao seu leitor, está longe – e assim ele nos anuncia uma ruptura, ou
de sua produção poética até a data: três fases distintas, classificadas de
23 talvez, um alargamento. Através de uma intenção autocrítica precoce – e
acordo com o estilo e com a forma . Sua autocrítica se detém longa-
que se estenderá por toda sua obra – encontramos a tensão que une,
mente sobre a ocasião e o modo de composição íntimo desses poemas,
pela primeira vez, a biografia, sob a forma de uma biologia, e a
e nos fornece uma lista com os principais deles. Durante muito tempo
pedagogia.
ainda, essas listas de trabalhos já executados – produção poética, ensaís-
Toda essa nova economia da tarefa crítica estará à frente das consi-
tica, musical – constará de seus cadernos. Mas algo se transforma sensi-
derações de Mein Lebenslauf em maio de 1861; pode-se afirmar que ela
velmente poucos anos após essa primeira tentativa de crítica regulada
é sua origem. O que as memórias devem garantir agora, contra a força
pela forma e pela história emocional de cada verso: em 1862, dois curtos
do esquecimento e de sua terrível política, está para além dos gestos
parágrafos dão conta de um novo procedimento, agora explicitamente
individuais: a imagem que agora se mostra urgente não é a do contorno
relacionado ao tema da educação –
estável, mas a do caminho subjacente, a da Bildung enquanto processo.
22 KSA V, 291-293.
23 WdB III, 21 e 35. 24 WdB III, 107-108.
32 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38. Dar-se uma vida: autobiografia como metodologia filosófica no jovem Nietzsche 33

É nesse sentido que as memórias abandonarão a preocupação com o essa mesma inclinação. Podemos encontrá-la de forma menos implícita,
traço, com o desenho cada vez mais preciso na direção da verossimi- ainda – mas não menos importante – na recepção de sua leitura de Scho-
lhança, e deverão reconstruir a ordem do percurso intelectual, espiritual penhauer, que em certo sentido, promove em Nietzsche a passagem do
– Nietzsche passa a escavar a imagem de seu passado no sentido de sua problema da origem de uma abordagem filológica para outra, mais
profundidade. Por princípio, a legitimidade da biografia se sustenta: ampla, precisamente filosófica. O problema da origem apresenta-se no
qualquer um que tenha em vista seu próprio desenvolvimento espiritual centro da temática filosófica de Schopenhauer como um todo. Ele direci-
e intelectual não pode simplesmente “achar desinteressante examinar o ona, em um sentido muito amplo, suas investigações no âmbito da teo-
passado e relacionar os pensamentos [Gedanken] sobre seus eventos ria do conhecimento – e acaba por promover, através de uma
25
mais importantes.” Mas é o modelo biológico que aqui se apresenta de interpretação bastante particular da filosofia de Kant, uma reflexão que,
27
modo extremamente claro: sob muitos aspectos, poderia ser compreendida como genealógica. O
pathos da origem passa a animar toda a tarefa de interferir na política do
Pois, tanto quanto os germes de nossas disposições morais e esquecimento; já não basta fazer funcionar, contra esta última, a maqui-
espirituais já estão enterrados em nós e o caráter fundamen- naria da memória, pura e simplesmente – a interpretação deve substituir
tal [Grundcharakter] de cada homem é como que inato, o registro. A origem que Nietzsche, nos anos de juventude, e até os pri-
também as influentes circunstâncias exteriores, que em sua
meiros anos em Basiléia, pretende fazer surgir é da ordem do universal:
grande diversidade afetam mais profunda ou mais ligeira-
ela diz respeito a qualquer um, ao homem, à sua formação. A coletânea
mente os homens, os forma como homens, tanto em relação
à moral quanto ao espiritual.26 das memórias deve promover, a partir daí, um redimensionamento,
deve erguer a vida íntima ao interesse público – nunca podemos esque-
Se o ateliê do escritor se transforma no laboratório de um biólogo é, cer que é a um leitor que Nietzsche se dirige, seus textos autobiográficos
essencialmente, porque Nietzsche não pode mais se contentar em apre- quase sempre se distinguem de notas pessoais – deve superar a curiosi-
sentar os quadros de sua história pessoal; ele precisa analisá-los, refletir dade particular.
28
sobre eles em seu conjunto, deve reenviar a série de eventos e toda sua “Como se desenhar a imagem de um homem que se conheceu?” A
multiplicidade a um estado embrionário que se combina a essas “influ- autobiografia nasce explicitamente dessa questão e essa emergência
entes circunstâncias exteriores” para revelar a identidade que se forma. solicita a elaboração de um método próprio; mas em 1863 ela precisa
O simples retrato esconde a principal característica da vida: sua repensar sua tarefa: é a imagem que se torna problemática aqui. Inicial-
dinâmica. mente, lembra Nietzsche, podemos traçar a fisionomia característica de
29
Devemos insistir ainda sobre o quanto a descrição dessa dinâmica – cada um, riscar o mapa dos relevos, descrever a cor do céu . Mas esse
da vida, da Bildung – se conecta ao tema sorrateiramente obsessivo da modelo mineral, inorgânico, apenas descritivo, resulta no relatório de
origem [Ursprung, mas também nascimento, Geburt]? O trabalho paci- um mundo morto – nele, nada se singulariza, pois nada está dotado de
ente do biólogo-biógrafo – análise, composição, enfim, uma leitura em vida. As rochas e as massas montanhosas possuem a mesma fisionomia,
aprofundamento – não pode se livrar desse pathos da origem. Mais a mesma imagem, em latitudes diferentes: por isso a biografia não pode
tarde, o interesse de Nietzsche pela filologia estará comprometido com ser uma cartografia. O biólogo precisa do particular para erguê-lo ao

27 Cf. Rosset (1967, p. 1-61).


25 WdB III, 88. 28 WdB III, 107.
26 Ibidem. 29 Ibidem.
34 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38. Dar-se uma vida: autobiografia como metodologia filosófica no jovem Nietzsche 35

universal; sem isso, seu trabalho é apenas o de um colecionador, e o que Após esse parágrafo, Nietzsche acrescenta um outro, curto, que se
ele coleciona interessa apenas a ele. A grande dificuldade, e, ao mesmo resume a uma frase: “Enquanto planta, nasci próximo de um cemitério,
tempo, a maior tarefa que Nietzsche precisa se colocar é reconciliar um enquanto homem, na residência paroquial”. Essa passagem parece se
30
conjunto de informações que apenas interessa a ele próprio com sua afinar com a fórmula, em forma de enigma [Räthselform], com que
inscrição em um conjunto maior, capaz de suscitar a atenção dos que Nietzsche reconhece seu destino em Ecce Homo: “como meu pai, já
33
têm a evolução moral e espiritual como preocupação. Somente nesse morri, como minha mãe, ainda vivo e envelheço”. Se pudéssemos ten-
sentido podemos considerar o aparente paradoxo de Mein Leben, de tar uma aproximação entre esses dois textos tão distantes, encontraría-
1863, quando lemos no que seria o primeiro rascunho de sua introdu- mos o modelo orgânico, especificamente vegetal, como a metáfora (ou
ção: “Parece, segundo essa introdução, que eu gostaria de escrever um o enigma) da origem mais profunda de sua personalidade – a proximi-
livro sobre minha vida. Jamais. O que gostaria, entretanto, de indicar, é dade com a morte, especialmente a do pai – contraposta à sua vida his-
como gostaria que os esboços de vida [Lebensumrisse] que seguem fos- tórica, que se inicia (Nietzsche nasce em uma Pfarrhaus em Röcken,
31
sem compreendidos”. Tudo o que seguirá, toda a história pessoal dos Licht der Welt) e se desenvolve no ambiente da casa paroquial, repre-
dezessete anos de Friedrich Nietzsche, nada poderá ensinar por si só: sentada pela mãe (a família de Franziska Nietzsche se orientou muito
somente essa introdução, ao indicar um modo de leitura, recuperará seu mais veementemente à carreira eclesiástica, enquanto a de Karl-Ludwig,
significado universal. O núcleo pedagógico da autobiografia se deslo- pai de Nietzsche, à sua exceção, se firmou no ramo comercial ou indus-
34
cará, portanto, para esse questionamento sobre como ler, que Nietzsche trial). Esse par origem paternal/educação maternal também se desdo-
deverá sugerir aos que o acompanham, antes mesmo de iniciar o espetá- brará ao longo do pensamento de Nietzsche sob diferentes formas.
culo, talvez enfadonho, de suas memórias. Indicamos aqui apenas a prematuridade do tema. Sobre ele, nos remete-
35
Não um livro sobre sua própria vida, mas um livro sobre a vida em mos mais uma vez a Jacques Derrida e às leituras de Pierre Klossowski
geral, e sobre como a sua história pessoal se forma nela. Um livro sobre em torno das autobiografias de juventude de Nietzsche e do modo como
36
a Bildung, cujo modelo orgânico nos remete à figura do biólogo, e elas denunciam o que ele denomina a “sombra paternal” .
agora, explicitamente. Pois o modo de leitura é indicado por ele: Percebe-se assim o quanto se modifica o projeto inicial da autobio-
grafia. Procedendo por um alargamento progressivo da função mesma
A saber, como um naturalista perspicaz [geistvoller Natur- da narrativa – registrar, interpretar, reconhecer a origem primitiva e,
forscher], ao reconhecer a história e as características de enfim, universalizar – Nietzsche revela para si mesmo o difícil aprendi-
cada uma de suas coleções de plantas e pedras, ordenadas zado da relação entre vida e educação. Na derradeira autobiografia, de
segundo as regiões; enquanto a criança ignorante só encon-
1864, ele reconhece o fim de um ciclo: em breve deixará Pforta para
tra aí pedras e plantas para jogar e brincar, e o homem prag-
ingressar na Universidade de Bonn e um longo caminho, no qual ele
mático [Nützlichkeitsmensch] despreza, como algo sem 37
finalidade para a alimentação ou para se vestir.
32 aprendeu a se reconhecer, é deixado pra trás . Não como um fardo que

33 KSA VI, 264.


30 Em Mein Lebenslauf [II], de 1861, Nietzsche reconhece o impasse: “Mas esses eventos são 34 Sobre o ambiente em que Nietzsche nasceu e o conflito – ou a diferença – entre a visão do
mesmo significativos apenas para mim, e devem ter poucos atrativos para os outros” (WdB III, pai e a da família da mãe, cf. GOCH, K., “Franziska Nietzsche in Röcken – Ein Blick auf die
90). deutsch-protestantische Pfarrhauskultur”in Nietzscheforschung, Bd. 2, pp. 107-140.
31 WdB III, 108. 35 Derrida (1978a, p. 60-69).
32 WdB III, 108. 36 Cf. Klossowski (1978, p. 253-284).
36 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38. Dar-se uma vida: autobiografia como metodologia filosófica no jovem Nietzsche 37

40
se abandona, mas como o passado que não deixará de se apresentar. verdade . Mas o escárnio de Nietzsche não cessará de revelar a urgência
Pois o passado deve vir se alojar no presente sem que precisemos, a dessa tarefa cada vez mais abrangente que quer resgatar a legitimidade
todo tempo, reescrever os gestos que o compõem: um pouco como da vida e a imprevisibilidade de sua trajetória – embora não mais em
Bergson, esse passado deve se dar no presente como ação. Essa memó- nome de uma origem universal, certamente, como nos anos de aluno e
ria ativa é o desdobramento de uma memória reflexiva como segunda de professor universitário, mas para fazer do pensamento filosófico um
natureza: trabalho biológico. Mesmo porque, de todas as autobiografias de
Nietzsche, a única definitiva talvez tenha sido escrita no silêncio. E sem
Que se pense em um soldado de infantaria, que começou a o socorro de uma assinatura.
ter medo de esquecer completamente como andar quando
ficou preocupado com a consciência com que deve erguer o
pé, e, ao mesmo tempo, manter os erros diante dos olhos. Give Oneself a Life: autobiography as philosophical methodology
Isso depende de que ele venha a formar [anzubilden] nele in the young Nietzsche
uma segunda natureza, para que ele ande, assim, livre como Abstract: At the carrefour between the stylistic dimension and the posi-
38
antes. tive content of the philosophical thesis in his works, autobiography rises
as the device according to which both of them are reunite, becoming
É a esse estágio que Nietzsche pretende já ter erguido sua Bildung,
indissociable. This procedure is obvious in texts like Ecce Homo, but it is
quando, em 1867, na universidade de Leipzig, ele se propuser a falar de
already present in older works, like the autobiographical essays from his
sua história. E se ainda se olha para trás, já não é mais para percorrer o
secondary school time. The analysis of how, at this point, the problem of
caminho de volta, mas para identificar a legitimidade do presente. Do
the writing of oneself as a political-philosophical practice comes up, can
passado, apenas o mínimo, como que por polidez para com esse leitor
lead us to propose a coherent strategical principle to the reading of
que nada sabe sobre aquele de cuja própria vida se propõe a falar:
Nietzsche’s writings as “work”.
“Desejo considerar [betrachten] a mim mesmo, e como não devo come-
Key-words: Nietzsche – autobiography – Bildung – philosophical
çar com um abrupto ‘hoje’, remeto, antes, a algo sobre o percurso dos
39 methodology.
dois últimos anos” . Como se a autobiografia atingisse, enfim, a encruzi-
lhada onde pressentimos outros rumos; onde ela deveria encontrar,
enquanto tal, seu fim. Para fazer surgir novas trilhas.
A vida, a educação. A recorrência e a incompletude dos textos com
os quais ele pretende se dar uma vida, reconhecer a espessura de seu Bibliografia
nome, apenas atestam o esforço do percurso que os reúne. Parte funda- BACKÈS, J.-L. Préface. In: NIETZSCHE, F. Premiers écrits, Paris: Le cher-
mental na construção de toda sua filosofia, o ensaio autobiográfico che midi, 1994.
serve-lhe de limite. Mais de vinte anos depois, a Genealogia da moral DEL CARO, A. Nietzsche contra Nietzsche. Luoisiana: Luoisiana State
ridicularizará o caráter prudente dos biógrafos comprometidos com a University Press, 1989.
DERRIDA, J., Éperons – les styles de Nietzsche. Paris: Flammarion, 1978a.
37 Cf. WdB III, 116-118.
______. Otobiographies. Paris: Galilée, 1978b.
38 WdB III, 127.
39 WdB III, 127-128. 40 Terceira dissertação, 19 (KSA, V, 384-387).
38 Britto, F. L. Cadernos de Ética e Filosofia Política 12, 1/2008, p. 21-38.

GERHARDT, V. Friedrich Nietzsche. München: C. H. Beck, 1992.


GOCH, K. Franziska Nietzsche in Röcken – Ein Blick auf die de-
utsch-protestantische Pfarrhauskultur. Nietzscheforschung, Bd. 2,
1995.
KJAER, J. Die Relevanz der Berücksichtung von Nietzsches Kindheit
beim Interpretieren und Gebrauch seiner Philosophie. Nietzsche-
forschung, Bd.1, 1994.
KLOSOWSKI, P. Nietzsche et le cercle vicieux. Paris: Mercure de France,
1978.
LACOUE-LABARTHE, Ph. Le détour. Poétique, v. 5, 1971.
MONTINARI, M. Intrepretações nazistas. Cadernos Nietzsche, v. 7, 1999.
NIETZSCHE, F. Briefwechsel. Hrgb. von Colli, Montinari, 16 Bände. Ber-
lin und New York: De Gruyter, 1974-84.
______. Sämtliche Werke. Kristische Studienausgabe in 15 Bänden.
Hrgb. von Giorgio Colli und Mazzino Montinari. Munchen, Berlin
und New York: Deutscher Taschenbuch Verlag und Walter de
Gruyter, 1980.
______. Werke in drei Bänden. Hrgb. von K. Schlechta. München: C.
Hanser, 1956.
ROSSET, C. Schopenhauer, philosophe de l’absurde, Paris: PUF, 1967.
SCHOPENHAUER, A. Parerga und Paralipomena, zweiter Band. In:
Sämmtliche Werke, sechster Band. Leipzig: Brockhaus, 1877.
SIMONIS, Linda. Der Stil als Verführer: Nietzsche und die Sprache der
Performativen. Nietzsche-Studien, Bd. 31, 2001.

You might also like