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Opinião

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Lourdes H
Maria de

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segundo os mesmos dados2.

44 | P&C Nº56 | Janeiro > Junho 2014


S e é fácil atribuir a razões
históricas, económicas e educacionais a “
fraca capacidade de mobilização social ou
Se é certo que o turismo cultural, nacional
agregação associativa em torno de valores e estrangeiro, está de boa saúde, o impacto
“pós-materialistas”, mais interessante será
verificar que a mesma sociedade, que antes !"#$%&!"'( )) )'*+,")'#-"'.'(&/&0&("'12/2'2'
prefere confiar nas ONGs, nas empresas
(índice que poderia ser capitalizado no
recuperação e valorização do Património, desde
reforço do mecenato cultural) e nos média, logo porque nunca existiu legislação nesse
que nas instituições governativas3, vê a
degradação do Património Cultural como sentido nem ao nível central nem local. A relação
um destino inevitável, mas por exclusiva
responsabilidade do Estado, atitude coerente
dos portugueses com o Património, é pois uma
com a fraca mobilização social, a par da relação emocional e afetiva mais do que uma
persistência num discurso de exigência pura
e simples sem apresentação de alternativas relação mental ou civilizacional. Sucede que a
exequíveis, paradoxalmente mesmo pelas
camadas sociais mais letradas. Assim se
relação das populações com o seu Património,
vai formando uma opinião pública que se ) 32'45(&!2'"+'&( #6&67/&28'#-"'.')+9!& #6 '12/2'
julga plena de direitos mas sem quaisquer
deveres de proteção do Património,
travar a degradação ruinosa dos bens e estruturas
responsabilidade legalmente partilhada desde patrimoniais, uns à vista, outros escondidos.
1985 mas só recentemente consagrada
constitucionalmente4.

O desconhecimento dos instrumentos
judiciais e extra judiciais de denúncia,
pressão, e coação sobre a administração
pública do Património Cultural5, e a ausência
de ações de educação patrimonial nesta lúdica ou identitária, não é suficiente para protegidas; e poderíamos continuar o rol
matérias que deveriam ser realizadas pelas travar a degradação ruinosa dos bens e de questões que parecem não ter relação
associações, agrava este quadro, uma vez estruturas patrimoniais, uns à vista, outros entre si mas que subterraneamente se ligam
que o exercício de uma cidadania ativa escondidos. A sociedade civil compõe-se por um fio condutor que revela uma só: o
pressupõe, mais que a consciência das de cidadãos e organizações, estas podendo extermínio progressivo da representação da
ameaças, a utilização de mecanismos legais atuar, ou não, como “agentes protetores”. Se sociedade civil nos órgãos da administração
eficazes bem como o debate coletivo, que um anónimo transeunte conhecerá o nome pública que tutela o Património, seja
surge normalmente a uma micro escala, em de uma associação de defesa do Ambiente, eliminando órgãos ou membros com
situações limite, contrariando o princípio ou de âmbito local por proximidade, ou de funções de consulta10, seja fundindo os dois
da prevenção, despoletando a militância âmbito nacional por via dos média (ex. do associativismos, desta forma controlando
patrimonial de tipo terminal (e assim, frágil Minuto Verde), não existe na comunicação um potencial contra poder, em nome de uma
no fundamento e na eficácia), como se as social um espaço de visibilidade equivalente latitude conceptual que retira força e ação
comunidades quisessem ressuscitar o que para o Património, seja de iniciativa cívica ao movimento associativo do Património
até então julgavam infinito, demonstrando seja didático, findo o saudoso A Alma e Cultural que, por alguma razão, tem uma
uma falta de noção da insubstituibilidade a Gente; assim, as reações dos grandes tutela e legislação distintas.
dos bens patrimoniais, explicável em parte movimentos associativos, quando existem,
pela ação do Estado Novo, que com as não têm a projeção necessária à educação O futuro da Cidadania do Património está
suas reconstruções historicistas legou a cívica patrimonial, desde logo porque se na criação espontânea de verdadeiras
convicção de que os monumentos podem dirigem prioritariamente ao Ambiente, apesar redes sociais (não me refiro às
ser legitima e integralmente reconstituídos. de estatutariamente visarem a proteção dos informáticas) que reivindiquem um debate
Por outro lado, a memória de um passado dois valores6. Sintomaticamente, nos 40 lúcido sobre o destino do Património
recente amargo desvaloriza a arquitetura anos do 25 de Abril não se fez um balanço em todas as suas vertentes-função,
popular ou industrial, que não é vista como deste tema7 que deveria questionar porque é reconversão, financiamento, manutenção,
Património histórico. que as associações de defesa do Património compreendendo que nem tudo pode ser
Cultural estão sob a égide da Agência recuperado mas que as comunidades têm
Se é certo que o turismo cultural, nacional Portuguesa do Ambiente8 e não da Direção- de ser ouvidas sobre essas escolhas. Para
e estrangeiro, está de boa saúde, o impacto -Geral do Património Cultural, quando que estes grupos de interesse surjam é
económico desses fluxos não é dirigido para existem duas Leis de Bases distintas para preciso, apenas, que deixemos de ver
a recuperação e valorização do Património, o Ambiente e para o Património Cultural9; o Património não como um peso para a
desde logo porque nunca existiu legislação ou porque englobam as ONGs do Ambiente sociedade mas, pelo contrário, como um
nesse sentido nem ao nível central nem as associações de defesa do Património, aliado na prestação de funções sociais
local. A relação dos portugueses com o que por seu lado não estão inter federadas; − habitação, educação, cultura, desporto,
Património, é pois uma relação emocional porque é que a arquitetura popular é lazer − com a vantagem de fazer parte da
e afetiva mais do que uma relação mental arrasada pela Direção de um Parque nossa identidade como povo e do nosso
ou civilizacional. Sucede que a relação das Natural em nome de uma padronização destino comum enquanto civilização. Afinal
populações com o seu Património, seja estética contrária à legislação sobre áreas somos nós os destinatários e pagadores

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Opinião


O tabú que, por efeito de manipulação político partidária e
ingenuidade académica, representa ainda a abordagem da dimensão
económica do Património, pretende desacreditar a capacidade
lucrativa de um recurso económico cultural que pode ser gerido
com critérios empresariais que suportem a sua conservação e criem
riqueza, curiosamente alimentado por quem simultaneamente não
contesta a entrega de Monumentos Nacionais a associações ou
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alojamentos ou bares que aceleram a degradação dos bens sem criar
fundos que suportem uma recuperação nas próximas décadas; ou
ao invés contesta a oferta pública à exploração privada ou público-
-empresarial de estruturas que se encontram fechadas por falta de
fundos ou corte de funcionários, mas teoricamente bem entregues à
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do Património, mas ao não vermos que fundos ou corte de funcionários, mas 3
Estudo do Edelman Trust Barometer de 07.02.2011.
utilidades dele podemos retirar não teoricamente bem entregues à administração Índices de confiança: 9% na Governação; 69% nas
ONGs; 47% nas empresas; 39% nos media.
nos interessamos pela sua salvaguarda pública, a mesma em quem a sociedade não 4
Art.º 78.º, n.º 1 da CRP, introduzido na revisão de
(relação inversamente proporcional já confia. Este preconceito foi esgrimido de 2001. Lei de Bases do Património 13/85 de 06 de
demonstrada). E aqui a responsabilidade tal forma que não permite um debate sério, julho, art.º 2.º.
recai nas universidades que desperdiçam racional, e orientado aos fins de salvaguarda 5
Por razões de espaço remete-se para o Código do
Procedimento Administrativo e para a Lei da Ação
centenas de teses, trabalhos, projetos, que e valorização do Património para usufruto Popular, Lei 83/95 de 31 de agosto, garantida pela
ficam arquivados em gavetas e bibliotecas social e desenvolvimento económico CRP desde 1976.
sem chegar às Câmaras Municipais, sustentado e sustentável, constituindo 6
As Organizações Não Governamentais do Ambiente
às empresas, aos investidores, aos uma barreira mental transversal que só os (ONGA) são as associações sem fins lucrativos que
visam, exclusivamente, a defesa e valorização do
proprietários, numa clara e infelizmente excelentes resultados de gestão empresarial ambiente ou do património natural e construído – art.º
clássica desresponsabilização do meio sustentável de sociedades como a Monte da 2.º da Lei n.º 35/98 de 18 de julho.
académico pelo destino dos bens que Lua, S.A. reverterá, por forma a dar o salto 7
Nos “Encontros com o Património” da TSF de dia 26,
cinco notáveis, alguns deles ex-dirigentes de equipa-
constituem afinal um seu objeto de estudo. para a introdução da gestão privada mas
mentos afetos ao ex IGESPAR, constataram a apatia
controlada do Património, que queremos da sociedade sem apontar causas ou medidas para a
O tabú que, por efeito de manipulação conservar, valorizar e transmitir, recuperando contrariar.
político partidária e ingenuidade académica, um atraso de 20 anos no tratamento desta
8
O registo nacional das ONGA é tutelado pela APA,
ao abrigo da política de aglutinação de dois tipos de
representa ainda a abordagem da dimensão questão, sem a qual não será possível associativismo que vem desde os anos 80 do século
económica do Património, pretende fornecer dados essenciais para informar XX e que nunca foi contestada pelas interessadas. Ver
desacreditar a capacidade lucrativa de e formar cidadãos ativos, obstaculizando www.apa.pt.

um recurso económico cultural que pode o processo de construção da Cidadania


9
Respetivamente, a Lei n.º 19/2014 de 14 de abril e a
Lei 107/2001 de 08 de setembro.
ser gerido com critérios empresariais que Patrimonial onde todos temos um papel a 10
Entre 1980 e 1992, o IPPC foi dotado de um Conselho
suportem a sua conservação e criem desempenhar Consultivo (CC), regulamentado em 1981, que previa 3
riqueza, curiosamente alimentado por quem lugares para representantes das Associações de Defesa
do Património (ADPs), que em 1985 aumentam para 9,
simultaneamente não contesta a entrega um por cada secção, a nomear pelo Ministro da Cultura,
de Monumentos Nacionais a associações sob proposta do presidente do IPPC, depois de ouvida
ou “grupos de amigos” sem concurso nem a FADEPA – Federação das Associações de Defesa do
NOTAS Património, formalizada em 1981, que teve um papel de
fiscalização, que ali instalam alojamentos 1
Manuela Reis, “Noções de Património na socieda- pressão neste processo, desagregada precocemente
ou bares que aceleram a degradação dos de portuguesa”, in Memória e Artificio: a matéria do cerca de 1985. Sucede em 1992 o IPPAR, que mantêm
Património II, Lisboa, Soc. Geografia de Lisboa, 2009. o CC sem o regulamentar, garantindo genericamente
bens sem criar fundos que suportem uma 2
Da mesma autora, “Património e ambiente: duas a existência de lugares para representantes de insti-
recuperação nas próximas décadas; ou ao dimensões da cidadania moderna”, in Atitudes sociais tuições com atribuições nesta matéria. A referência às
invés contesta a oferta pública à exploração dos portugueses 4 - Ambiente e Desenvolvimento, ADPs desaparece em 1996 de todos os organismos da
Lisboa, ICS/ISSP, 2004. Cultura.
privada ou público-empresarial de estruturas
que se encontram fechadas por falta de

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