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Ana Maria Cunha – 2017.

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DIREITO DE FAMÍLIA
Prof. Técio Spínola
Ana Maria Cunha – 2017.2 2

Introdução ao Direito de Família


O direito de família busca dar solidez as relações pessoais, que por natureza
são inseguras.

Só se tem direito de família efetivamente no Brasil no séc. XX. Antes, o


casamento, por exemplo, era regido exclusivamente pela Igreja Católica.
Regulamentavam o casamento o Concílio de Trento e as constituições do
arcebispado da Bahia. Posteriormente, com grande influência de Ruy Barbosa,
surge um decreto que institui o casamento civil.

Percebe-se que a história do direito de família se confunde com a história do


mundo, com suas mudanças sociais, que repercutem no direito.

Pluralidade de formações familiares

A família pode formar-se por união estável, casamento, por mãe e seu filho,
por mais de uma mãe/pai, por irmãos que criam filhos, etc. Ou seja, pode
ocorrer de diversas formas.

Princípio da intervenção mínima

Tal princípio é a ideia de que o Estado deve intervir o mínimo possível nas
relações familiares. Contudo, tal intervenção mínima pode se mostrar como
uma tutela forte, a exemplo do caso de violência doméstica e demais casos
onde isto se mostra necessário.

Introdução ao casamento

O casamento foi um advento tão relevante historicamente que possui uma


grande força simbólica, bem como jurídica.

Tem como principal vantagem a segurança jurídica que confere.

Evolução histórica

Até 1890 – Concílio de Trento (séc. XVI) e Constituições do Arcebispado da


Bahia.
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Decreto 181/1890 – Instituiu o casamento civil logo após a Proclamação da


República. Tirou o casamento das regras canônicas, trazendo para o direito
civil. Contudo, este casamento ainda era imbuído de muitas características
religiosas.

Até hoje são importantes para muitos as regras canônicas para o casamento,
a exemplo daqueles que buscam a anulação do casamento, haja vista não
ser possível o divórcio pelas regras católicas.

Constituição de 1891 – primeiro diploma a trazer o casamento civil.

Código Civil de 1916 – considerava a mulher relativamente incapaz ao casar.

1962 – surge o Estatuto da Mulher Casada, que estabeleceu que a mulher era
capaz mesmo casada.

1977 - As constituições dessa época traziam a indissolubilidade do casamento.


Tal situação só mudou neste ano, surgindo o divórcio.

1988 – A Constituição previa 2 anos de separação de fato ou 1 ano de


separação judicial (com imputação de culpa) para que o divórcio ocorresse.

2010 – admitiu-se o divórcio direto e não bifásico através da EC 66/2010.

2011 - O STF (ADPF 132/RJ; ADin 4277/DF) e o STJ (RESp 183378/RS) decidiram
positivamente acerca das uniões homoafetivas (o STF, acerca da união
estável, o STJ acerca do casamento). É importante salientar que o STF decidiu
na contramão do texto constitucional o que, embora neste caso tenha tido
resultado louvável é temerário por criar perigoso precedente: dar ao Supremo
o poder de afrontar a Constituição.

2013 – Joaquim Barbosa, como presidente do STF e do CNJ, editou a


Resolução 175/CNJ, que prevê que é infração a recusa de habilitações de
casamento ou escrituras de lavratura de uniões estáveis. Trata-se, contudo,
somente de infração disciplinar.

Definição e requisitos
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Alguns elementos do direito romano são emprestados como requisitos do


casamento. Um deles é advindo do jurisconsulto Modestino, que escreveu no
Digesto (D [Digesto]. [livro]23; [título]2; [fragmento] 1.):

“As núpcias são a união do homem e da mulher,


que se associam para toda a vida, a comunhão do
direito divino e do direito humano.”

A definição de Clóvis Bevilaqua vai no sentido de que:

“Casamento é um contrato bilateral e solene, pelo


qual um homem e uma mulher se unem
indissoluvelmente, legitimando por ele suas relações
sexuais; estabelecendo a mais estreita comunhão
de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar
e educar a prole que de ambos nascer.”

Já para Portalis, o matrimônio é:

“(...) a sociedade do homem e da mulher, que se


unem para perpetuar a espécie, para ajudar-se
mediante socorros mútuos a carregar o peso da
vida, e para compartilhar seu comum destino.”

San Tiago Dantas entende que, inobstante as finalidades do casamento sejam


distintas, a melhor definição tem como pressuposto justamente o fim a que o
matrimônio se destina: a união de vidas e de afetos.

Imperioso é, também, transcrever aqui as definições trazidas por nosso diploma


substantivo:

Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão


plena de vida, com base na igualdade de direitos e
deveres dos cônjuges.

Art. 1.514. O casamento se realiza no momento em


que o homem e a mulher manifestam, perante o
juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal,
e o juiz os declara casados.
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Neste último dispositivo é possível perceber a presença de três requisitos para o


casamento:

 Dualidade de sexos, que não subsiste mais desde 2011;


 A manifestação de vontade, que se confunde com o consentimento
válido;
 Autoridade celebrante competente.

Tipologia básica do casamento

O casamento pode ser:

 Civil: celebrado perante o Estado, através de Juiz de Direito ou Juiz de


Paz.
 Religioso com efeitos civis: é o casamento religioso que é registrado.

Finalidades do casamento

São várias, mas a finalidade principal do instituto é a comunhão de vidas.

Natureza jurídica do casamento

Tem natureza contratual, fazendo jus ao fato de ser um acordo de vontades.

Caracteres do casamento

As características que mais merecem destaque são a liberdade e a


solenidade.

Promessa de casamento

Introdução: tipologia das relações contemporâneas

O status jurídico das pessoas (esponsais) não muda em razão da promessa de


casamento, o chamado noivado. A legislação prevê somente a situação de
casamento e união estável, quanto a todo o resto não há qualquer previsão.

Interessante observar a distinção feita por Maluf, que distingue o namoro


simples, que diz respeito ao que chamamos de “ficar”, do namoro qualificado,
que diz respeito ao que chamamos efetivamente de namoro.
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Trata-se de importante precedente a RESP 1416580/RJ, que estabeleceu a


possibilidade de aplicação da Lei Maria da Penha nos casos de violência
contra namorada.

Interessante pontuar que o STJ já se utilizou da palavra “ficar” na RESP


557365/RO, conceituando-a como relação casual, podendo ter reflexos
jurídicos.

Escorço histórico

A promessa de casamento hoje não possui grande significado jurídico.


Contudo, antigamente este instituto possuía grande significação,
principalmente patrimonial, além de possuir muitas vezes o objetivo de
manutenção do poder.

Hoje a importância da promessa de casamento é, sobretudo, social.

Responsabilidade civil por ruptura injustificada

Só ocorre quando há lesão aos direitos de personalidade, aplicando-se o art.


186 do CC.

O dano moral não se confunde com abalo psicológico, mas sim se trata de
lesão a direitos da personalidade, a exemplo do nome, da honra, da
integridade moral.

Romper noivado é direito personalíssimo, tratando-se de direito potestativo. Por


esta razão, não há possibilidade de ajuizar ação contrária ao rompimento.

Doações

Há que se observar o disposto no art. 546 do CC quando há uma doação


após um casamento e este último funciona como uma condição. Neste caso,
não ocorrendo o casamento, a condição é ineficaz.

Art. 546. A doação feita em contemplação de


casamento futuro com certa e determinada pessoa,
quer pelos nubentes entre si, quer por terceiro a um
deles, a ambos, ou aos filhos que, de futuro,
houverem um do outro, não pode ser impugnada
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por falta de aceitação, e só ficará sem efeito se o


casamento não se realizar.

Noivado, sociedade de fato e união estável

Embora traduza uma intenção mais séria de unir-se em matrimônio, a simples


promessa de casamento, que é o noivado, não possui efeitos jurídicos
significativos para nenhum dos esponsais, a salvo se gerar dano à direito da
personalidade com sua ruptura injustificada.

É tênue a linha que separa o noivado da união estável, mas ainda assim é
possível de ser traçada. Quando vivem como companheiros (união estável),
há entre os consortes uma união pública, contínua e duradora com o objetivo
de constituir família. Isto é, a nota distintiva da união estável é sua finalidade.
Em assim sendo, a promessa de casamento, por si só, não configura a procura
por esta finalidade, comportamento que tingiria o enlace com o cariz da
união estável.

A sociedade de fato está prevista no art. 988 do CC, enquanto a união estável
é regida pelo art. 1723.

A sociedade de fato é aquela que apesar de visível, não é formalizada. Por


vezes esta sociedade é reconhecida no direito de família. Isto ocorreu, por
exemplo, com uniões de pessoas do mesmo sexo.

A união estável, por sua vez, ainda será tratada, mas faz-se necessário ao
menos citar o art. 1723.

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a


união estável entre o homem e a mulher,
configurada na convivência pública, contínua e
duradoura e estabelecida com o objetivo de
constituição de família.

Capacidade para o casamento


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Trata-se de capacidade de praticar determinado ato de forma específica, ao


contrário da generalidade da capacidade civil. Existe um conceito mais
específico, que é a legitimidade, capacidade especifica, que pode ser
utilizada nesse caso.

Art. 1.517. O homem e a mulher com dezesseis anos


podem casar, exigindo-se autorização de ambos os
pais, ou de seus representantes legais, enquanto
não atingida a maioridade civil.

Parágrafo único. Se houver divergência entre os


pais, aplica-se o disposto no parágrafo único do art.
1.631 [recorrer ao juiz para dirimir o conflito].

 Autorização para menores de 18 anos: pode ocorrer através da


autorização dos pais.
 Antecipação da idade núbil:

Art. 1.520. Excepcionalmente, será permitido o


casamento de quem ainda não alcançou a idade
núbil (art. 1517), para evitar imposição ou
cumprimento de pena criminal ou em caso de
gravidez.

Técio, assim como alguns autores, acredita que o


artigo se aplica também aos homens quanto à
gravidez.

Ademais, em um passado não tão distante, alguns delitos podiam ter


sua punibilidade extinta se o agressor se casasse com a vítima.
Atentado violento ao pudor e estupro são exemplos de alguns destes
crimes.
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Habilitação para o casamento

 Requerimento: faz-se necessário fazer requerimento para a habilitação,


o que hoje acontece online.
 Edital de proclamas: possibilita que quem quiser possa se opor ao
casamento. Em situações de urgência pode ser dispensado.
 Oposição à habilitação: possibilidade de impugnação através do edital
de proclama.
 Certificação da habilitação: transcorrido o prazo, será emitido o
certificado, que tem eficácia por 90 dias.

Celebração do casamento:

Art. Art. Certificado


Edital de Art.
Requerimento
1527 - de Casamento
1525 Proclamas habilitação 1531
15 dias

Há a necessidade de pelo menos 2 testemunhas.

Art. 1.525. O requerimento de habilitação para o


casamento será firmado por ambos os nubentes, de
próprio punho, ou, a seu pedido, por procurador, e
deve ser instruído com os seguintes documentos:

I - certidão de nascimento ou documento


equivalente;

II - autorização por escrito das pessoas sob cuja


dependência legal estiverem, ou ato judicial que a
supra;

III - declaração de duas testemunhas maiores,


parentes ou não, que atestem conhecê-los e
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afirmem não existir impedimento que os iniba de


casar;

IV - declaração do estado civil, do domicílio e da


residência atual dos contraentes e de seus pais, se
forem conhecidos;

V - certidão de óbito do cônjuge falecido, de


sentença declaratória de nulidade ou de anulação
de casamento, transitada em julgado, ou do registro
da sentença de divórcio.

Faz-se necessário observar ainda o art. 1538:

Art. 1.538. A celebração do casamento será


imediatamente suspensa se algum dos contraentes:

I - recusar a solene afirmação da sua vontade;

II - declarar que esta não é livre e espontânea;

III - manifestar-se arrependido.

Parágrafo único. O nubente que, por algum dos


fatos mencionados neste artigo, der causa à
suspensão do ato, não será admitido a retratar-se
no mesmo dia.

Formas especiais de casamento

CASAMENTO POR PROCURAÇÃO

É o casamento que se dá através de um contrato de mandato, a partir do


qual uma parte outorga à outra poderes para celebrar o pacto matrimonial
em seu nome.

A procuração deve ser na forma de instrumento público e conceder poderes


especiais para o casamento. É importante salientar, ainda, que o mandato
não pode apontar cônjuge indeterminado: a pessoa com quem se deseja
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casar deve estar delimitada e explicitada no contrato. É também vedado que


o contrato seja estabelecido para durar por mais de 90 dias.

Como uma das obrigações do mandatário é exercer as suas funções da


melhor forma possível, entende-se que se ele tomar conhecimento de alguma
causa que seria prejudicial ao casamento, que é desconhecida do mandante
(traição, pessoa já casada, etc.), não está ele obrigado a casar o contratante.

É justamente esta possibilidade de recusar, no caso de motivação devida, que


diferencia o procurador de um núncio, mero portador do consentimento já
externalizado.

A revogação do mandato não precisa chegar ao conhecimento do


mandatário para produzir efeitos, mas se o casamento for celebrado pelo
mandatário e o outro cônjuge não for notificado, obrigará o mandante a
perdas e danos (art. 1542, §1º do CC). Ademais, tal casamento será anulável,
como versa o artigo 1550 do Código Civil:

Art. 1.550. É anulável o casamento:

(...)

V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o


outro contraente soubesse da revogação do
mandato, e não sobrevindo coabitação entre os
cônjuges;

CASAMENTO COLETIVO

Dá-se quando vários matrimônios são celebrados simultaneamente em uma


mesma localidade, com alguns atos sendo iguais. Não há qualquer problema
de existência, validade ou eficácia no casamento que é celebrado
coletivamente.

CASAMENTO NUNCUPATIVO OU IN EXTREMIS

Art. 1.540. Quando algum dos contraentes estiver


em iminente risco de vida, não obtendo a presença
da autoridade à qual incumba presidir o ato, nem a
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de seu substituto, poderá o casamento ser


celebrado na presença de seis testemunhas, que
com os nubentes não tenham parentesco em linha
reta, ou, na colateral, até segundo grau.

É o casamento feito em situações de iminente risco de vida para um dos


cônjuges. É forma bastante particular de casamento, onde inclusive se
dispensa autoridade celebrante, em que pese exija a presença de seis
testemunhas que não sejam parentes em linha reta ou colateral até o
segundo grau.

As testemunhas devem comparecer perante autoridade judicial mais próxima


em até dez dias do matrimônio e declarar que:

Foram convocadas por parte do enfermo; este


parecia em perigo de vida, mas em seu juízo; em
sua presença, declararam os contraentes, livre e
espontaneamente, receber-se por marido e mulher

O casamento nuncupativo apenas tem relevância quando o cônjuge vem


realmente a falecer. Se sobreviver à condição perigosa a sua vida deve
buscar casar-se da maneira ordinária.

CASAMENTO EM CASO DE MOLÉSTIA GRAVE (ART. 1539)

Art. 1.539. No caso de moléstia grave de um dos


nubentes, o presidente do ato irá celebrá-lo onde se
encontrar o impedido, sendo urgente, ainda que à
noite, perante duas testemunhas que saibam ler e
escrever.

São os casos onde um dos consortes está impossibilitado de comparecer


perante à autoridade celebrante, devendo ela se deslocar até o local do
enfermo para, então, celebrar as núpcias.

CASAMENTO EM NAVIO

Em que pese haja Norma da Autoridade Marítima autorizando que um


capitão de navio celebre casamentos, é importante salientar que capitães de
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navio não são autoridades celebrantes, de forma que o matrimônio perante


eles celebrado é inexistente.

CASAMENTO CELEBRADO FORA DO PAÍS, PERANTE AUTORIDADE DIPLOMÁTICA


BRASILEIRA

Os artigos 18 e 19 da LINDB cuidam de dar às autoridades consulares brasileiras


a autoridade para celebrar casamentos, de modo que o ato realizado
perante um destes funcionários públicos terá plena validade e eficácia
(obviamente, se respeitados os requisitos legais).

Entretanto, dispõe o Código Civil:

Art. 1.544. O casamento de brasileiro, celebrado no


estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou
os cônsules brasileiros, deverá ser registrado em
cento e oitenta dias, a contar da volta de um ou de
ambos os cônjuges ao Brasil, no cartório do
respectivo domicílio, ou, em sua falta, no 1o Ofício
da Capital do Estado em que passarem a residir.

Técio entende que a volta que obriga o registro do matrimônio celebrado no


estrangeiro perante autoridade brasileira é apenas aquela que se dá com
ânimo de residência definitivo. Não faria sentido obrigar o casal a se registrar
se sua passagem pelo Brasil se der apenas por um período diminuto de tempo
(para passar as férias, por exemplo).

CASAMENTO PERANTE AUTORIDADE ESTRANGEIRA

Aqui serão aplicáveis as normas do país da autoridade celebrante. É possível


que se registre este matrimônio em solo pátrio.

Importante entender que é irrelevante que o casamento tenha sido celebrado


entre brasileiros ou entre um brasileiro e um estrangeiro: se o ato foi praticado
perante autoridade estrangeira e segundo os ditames legais deste local, o
regime matrimonial será ditado pelas normas deste país específico.

Prova do casamento
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Certidão

Art. 1.543. O casamento celebrado no Brasil prova-


se pela certidão do registro.

Parágrafo único. Justificada a falta ou perda do


registro civil, é admissível qualquer outra espécie de
prova.

Posse do estado de casados

A posse do estado de casadas serve de prova da constituição fática de um


matrimônio quando as partes dele componentes não podem mais manifestar
sua vontade. É meio de comprovação do matrimônio que se vale de uma
exteriorização, no mundo da vida, dos elementos e circunstâncias que formam
um casamento.

Art. 1.546. Quando a prova da celebração legal do


casamento resultar de processo judicial, o registro
da sentença no livro do Registro Civil produzirá,
tanto no que toca aos cônjuges como no que
respeita aos filhos, todos os efeitos civis desde a
data do casamento.

Este casamento, se a prova de estado de casadas se instruir suficientemente


(com documentos, relatos, testemunhos, etc.), não pode ser impugnado, salvo
uma exceção: se algum dos cônjuges já era casado com pessoa diversa.

Advocacia na área de família e sucessões

Deus nos livre.

Planos da existência, validade e eficácia do


casamento

Introdução:
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Existência Validade Eficácia

Agente Capaz Termo

Manifestação de Livre e sem Condição


vontade impedimentos
Encargo
Forma Livre ou não defesa
em lei

Objeto Idôneo (lícito, possível


e determinado)

Aqui há de se observar se há
consentimento e autoridade
celebrante competente.

Isto porque, partindo da premissa de que o casamento é um contrato, este é


um negócio jurídico bilateral e os planos sobreditos devem ser analisados.

Plano da Existência

O plano da existência do casamento pode ser caracterizado com contornos


mais simples, necessitando apenas de dois elementos:

 A celebração por autoridade competente;


 Consentimento (expresso) dos nubentes.

O requisito da diferença dos sexos, anteriormente postulado por alguns setores


da doutrina, já resta afastado há muito tempo dadas as decisões, inclusive de
tribunais superiores, admitindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Ana Maria Cunha – 2017.2 16

Técio chama a atenção para o disposto no art. 1554 do CC, que soluciona
uma hipótese de casamento inexistente:

Art. 1.554. Subsiste o casamento celebrado por


aquele que, sem possuir a competência exigida na
lei, exercer publicamente as funções de juiz de
casamentos e, nessa qualidade, tiver registrado o
ato no Registro Civil.

Plano da Validade

Impedimentos matrimoniais

O código anterior reunia todos os defeitos do vínculo matrimonial sob o pálio


do mesmo artigo (art. 183). A redação, neste sentido, era extremamente
atécnica e confusa, afinal reunia sob um mesmo caput (não podem casar)
situações completamente diversas e com soluções e consequências
igualmente diferentes. É que nem todas as hipóteses ali elencadas eram de
proibição absoluta do casamento, algumas, por exemplo, apenas eram
singelas irregularidades corrigíveis.

A nova sistematização, contida no Código de 2002 cuidou de arrumar a


disciplina, que anteriormente havia sido elencada de maneira inconsistente e
desorganizada. As novas categorias são:

 Impedimentos: tornam nulo o casamento;


 Causas de anulabilidade: tornam anulável o casamento;
 Causas suspensivas: afetam apenas a eficácia do casamento.

Impedimentos

Atualmente, segundo a redação do art. 1548 a única causa que torna o


casamento nulo é a infringência de impedimento.

Para Técio, o ato nulo produz efeitos, assim como o anulável. O que diferencia
os dois vícios é o seu grau de gravidade e que tipo de providência será
Ana Maria Cunha – 2017.2 17

tomada pelo ordenamento em razão dele. Nesta toada, o casamento nulo


produziria efeitos, mas deverá ser corrigido ou desconstituído a depender da
situação concreta.

Importante consignar, ainda, que os efeitos jurídicos da nulidade, no que é


atinente ao casamento, ganham contornos especiais. É que enquanto na
teoria geral a nulidade pode ser apontada de ofício pelo magistrado, no caso
do matrimônio depende ela de provocação e da necessária ação direta de
nulidade, que pode ser proposta pelo Ministério Público ou por qualquer
interessado.

Os impedimentos estão elencados no artigo 1521 do Código Civil:

Art. 1.521. Não podem casar:

I - os ascendentes com os descendentes, seja o


parentesco natural ou civil;

II - os afins em linha reta;

III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado


e o adotado com quem o foi do adotante;

IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais


colaterais, até o terceiro grau inclusive;

V - o adotado com o filho do adotante;

VI - as pessoas casadas;

VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por


homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu
consorte.

Neste ponto cabe esclarecer que afins em linha reta são aquelas pessoas que
acabam por ser da família a partir do casamento, como enteada, sogra, etc.
Ana Maria Cunha – 2017.2 18

É importante salientar que a proibição ainda persiste mesmo depois de


dissolvido o vínculo matrimonial, não existindo ex-sogra ou sogro, etc.

Ademais, quanto ao inciso IV, é Importante destacar que existe decreto que
permite que colaterais de 3º grau se casem a partir de parecer médico. Trata-
se do decreto 3200/41, art. 2º. É difícil precisar qual o exame médico que seria
aplicável, afinal não se sabe que situação objetiva, exatamente, se quer
atestar.

Oposição de impedimentos

Art. 1.522. Os impedimentos podem ser opostos, até


o momento da celebração do casamento, por
qualquer pessoa capaz.

Parágrafo único. Se o juiz, ou o oficial de registro,


tiver conhecimento da existência de algum
impedimento, será obrigado a declará-lo.

Art. 1.529. Tanto os impedimentos quanto as causas


suspensivas serão opostos em declaração escrita e
assinada, instruída com as provas do fato alegado,
ou com a indicação do lugar onde possam ser
obtidas.

Plano da Validade

Casamento nulo

Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:

II - por infringência de impedimento.

O casamento produzirá efeitos até que desfeito, haja vista o vício não se
confundir com o próprio ato.

Casamento anulável
Ana Maria Cunha – 2017.2 19

Só podem perseguir a anulabilidade aqueles afetados. Neste sentido, há que


se provar o prejuízo.

As causas de anulabilidade estão previstas no art. 1550 do CC:

Art. 1.550. É anulável o casamento:

I - de quem não completou a idade mínima para


casar;

II - do menor em idade núbil, quando não


autorizado por seu representante legal;

III - por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a


1.558;

IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo


inequívoco, o consentimento;

V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o


outro contraente soubesse da revogação do
mandato, e não sobrevindo coabitação entre os
cônjuges;

VI - por incompetência da autoridade celebrante.

§ 1o. Equipara-se à revogação a invalidade do


mandato judicialmente decretada.

§ 2o A pessoa com deficiência mental ou


intelectual em idade núbia poderá contrair
matrimônio, expressando sua vontade diretamente
ou por meio de seu responsável ou curador.

Vício de vontade no casamento

Observando o disposto no inciso III há que se pensar se houve omissão


legislativa em relação a outros vícios para além do dolo e do erro. Ou seja, há
Ana Maria Cunha – 2017.2 20

na doutrina a dúvida se os demais vícios da vontade também tornariam


anulável o casamento.

Apesar disso, mesmo que nem todos os vícios do negócio jurídico possam ser
aplicados ao casamento (a exemplo do estado de perigo ou da fraude
contra credores), alguns deles podem, a exemplo da simulação.

Silvio Venosa acredita que admitir que o dolo, por exemplo, pudesse ser
alegado como razão de anulação de casamento, traria para o tecido social
uma grande situação de instabilidade, afinal vícios que poderiam ser
prontamente resolvidos na vida doméstica seriam trazidos para um processo
estatal e judicializados.

Técio, por sua vez, comenta que várias seriam as arguições possíveis, o que
geraria uma grande instabilidade.

Erro sobre a pessoa do cônjuge

Dispõe o Código Civil:

Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício


da vontade, se houve por parte de um dos
nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à
pessoa do outro.

O erro não se resume a uma simples ignorância sobre algo, mas sim se trata de
um falso estado de percepção, causado pela pessoa em si mesma sobre a
realidade. Isto é, não basta para a configuração desta espécie de vício da
vontade que uma das pessoas não saiba algo sobre o outra, deve também
acreditar que o outro ostenta uma característica que em verdade ele não
possui.

É ainda importante que o erro quanto a uma das pessoas dos cônjuges seja
uma falsa impressão de características que sejam essenciais da pessoa, isto é,
o casamento não se realizaria se não houvesse a distorção dos fatos.

Ademais, o erro deve ser escusável, isto é, não partiu de mero desleixo ou
afobação da parte que o cometeu: mesmo uma pessoa média, com
Ana Maria Cunha – 2017.2 21

inteligência e atenção normais poderia também ser enganado por aquela


situação.

Como terceiro requisito, temos que o erro torne a vida conjugal insuportável,
isto é, o erro deve ser grave, sério, não apenas um mero defeito de menor
importância. Inclusive, como se verá abaixo, o próprio Código Civil reitera este
requisito no seu texto diversas vezes.

O código busca apontar algumas hipóteses do que seja erro sério o suficiente
a ponto de caracterizar este tipo de vício, em seu artigo 1.557, vejamos:

Art. 1557

I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e


boa fama, sendo esse erro tal que o seu
conhecimento ulterior torne insuportável a vida em
comum ao cônjuge enganado;

II - a ignorância de crime, anterior ao casamento,


que, por sua natureza, torne insuportável a vida
conjugal;

Em assim sendo, não se deve observar a gravidade objetiva do crime, mas sim
o peso que aquela conduta específica tem para cada pessoa.

Exemplo: Uma pessoa que foi condenada pelo crime de gestão fraudulenta.
Este tipo de conduta criminosa, para a linha média da moral social, é de
pouca gravidade, de modo que a extensa maioria das pessoas não se
importaria de convolar núpcias com este tipo de “criminoso”. Mas ao pensar
numa situação de uma pessoa que é membro da Comissão de Valores
Mobiliários e que se casa com indivíduo condenado por este tipo penal,
veremos que este crime tomará outra faceta: se revelará como conduta muito
mais grave e difamante, lançando em vergonha o outro cônjuge, que poderá
inclusive sofrer perseguições no local de trabalho em razão disto.

III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito


físico irremediável que não caracterize deficiência
ou de moléstia grave e transmissível, por contágio
Ana Maria Cunha – 2017.2 22

ou por herança, capaz de pôr em risco a saúde do


outro cônjuge ou de sua descendência;

Este inciso foi inserido pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, alterando os
dois anteriores. Foi inserida a partícula “que não caracterize deficiência” e foi
retirado o inciso que tratava a doença mental como hipótese de erro quanto
à pessoa de um dos cônjuges.

Muitas vezes a questão da impotência é trazida a lume como hipótese de erro


essencial sobre a pessoa do cônjuge. Este problema pode ser de duas
espécies: couendi, quando se refere à impotência para o ato sexual em si;
generandi, quando em verdade se trata de infertilidade, sendo o indivíduo
capaz para o ato sexual, mas não para gerar filhos.

Quaisquer destas duas formas de impotência, se de conhecimento prévio por


parte do cônjuge que a(s) possui, e sem o devido aviso ao outro consorte,
pode suscitar a anulabilidade por vício da vontade (erro).

Coação

Art. 1.558. É anulável o casamento em virtude de


coação, quando o consentimento de um ou de
ambos os cônjuges houver sido captado mediante
fundado temor de mal considerável e iminente para
a vida, a saúde e a honra, sua ou de seus familiares.

A coação pode ser absoluta (quando física), ou relativa (quando moral).


Quando absoluta não há manifestação da vontade, enquanto na moral há
certa margem de vontade.

Neste sentido, ocorrendo a coação absoluta a manifestação de vontade é


inexistente, enquanto que ocorrendo a coação relativa a manifestação de
vontade é inválida.

A ameaça feita deve ser séria e de mal grave o suficiente a causar fundado
temor na vítima. Estes critérios (gravidade e seriedade) serão analisados
levando-se em consideração características da pessoa que foi ameaçada
(idade, sexo, classe social, nível de escolaridade, por exemplo).
Ana Maria Cunha – 2017.2 23

Ficam excluídas do rol da coação: a ameaça de um mal justo (protestar uma


dívida, por exemplo) e o temor reverencial, respeito que se tem a figuras de
autoridade (um pai, um padre, um tio).

Prazo

O prazo para a anulação de casamento é decadencial, pois corresponde a


um direito potestativo, e segue o disposto no art. 1.560.

Art. 1.560. O prazo para ser intentada a ação de


anulação do casamento, a contar da data da
celebração, é de:

I - cento e oitenta dias, no caso do inciso IV do art.


1.550;

II - dois anos, se incompetente a autoridade


celebrante;

III - três anos, nos casos dos incisos I a IV do art. 1.557;

IV - quatro anos, se houver coação.

Legitimidade

A nulidade absoluta pode ser arguida por qualquer interessado e até mesmo
pelo Ministério Público, já a relativa é disciplinada pelos art. 1.552 e 1.559:

Art. 1.552. A anulação do casamento dos menores


de dezesseis anos será requerida:

I - pelo próprio cônjuge menor;

II - por seus representantes legais;

III - por seus ascendentes.


Ana Maria Cunha – 2017.2 24

Art. 1.559. Somente o cônjuge que incidiu em erro,


ou sofreu coação, pode demandar a anulação do
casamento; mas a coabitação, havendo ciência
do vício, valida o ato, ressalvadas as hipóteses dos
incisos III e IV do art. 1.557.

Neste sentido, a nulidade relativa só pode ser arguida pelo prejudicado.

No casamento de menor de 16 anos:

 O próprio cônjuge menor;


 Seus representantes legais;
 Seus ascendentes.

No casamento feito por erro ou coação: apenas a própria pessoa que errou
ou foi coagida, sendo que, se coabitar com seu cônjuge, sabendo do vício
fica este convalidado.

Contudo, há hipóteses de convalescimento:

Art. 1.551. Não se anulará, por motivo de idade, o


casamento de que resultou gravidez.

Art. 1.553. O menor que não atingiu a idade núbil


poderá, depois de completá-la, confirmar seu
casamento, com a autorização de seus
representantes legais, se necessária, ou com
suprimento judicial.

Natureza jurídica

A natureza jurídica da sentença que decreta a nulidade não é declaratória,


mas sim desconstitutiva. O que se busca não é declarar que o vício existe, mas
que a partir do vício uma providência seja tomada, com o desfazimento do
casamento.

Consequências da anulação
Ana Maria Cunha – 2017.2 25

Art. 1.564. Quando o casamento for anulado por


culpa de um dos cônjuges, este incorrerá:

I - na perda de todas as vantagens havidas do


cônjuge inocente;

II - na obrigação de cumprir as promessas que lhe


fez no contrato antenupcial.

Chama atenção neste viés o casamento putativo, pois as consequências da


anulação deste são diferentes. No casamento putativo a pessoa acredita que
o casamento foi perfeito, sem vícios. Neste caso, em face da boa-fé subjetiva
da pessoa, os efeitos serão conservados para ela, conforme se observa:

Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se


contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o
casamento, em relação a estes como aos filhos,
produz todos os efeitos até o dia da sentença
anulatória.

§ 1o Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao


celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e
aos filhos aproveitarão.

§ 2o Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao


celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos
filhos aproveitarão.

Yussef Cahali defende a putatividade aplicada a inexistência, de maneira


totalmente minoritária na doutrina.

Plano da eficácia

Trata-se do plano dos efeitos, que podem ser divididos em 3 grupos:

 Sociais: são efeitos exógenos, fora da relação de casamento. É


exemplo o fato da pessoa passar a ser casada, assumir esse estado.
Outro exemplo é a assunção do nome.
Ana Maria Cunha – 2017.2 26

 Pessoais: há deveres matrimoniais a serem cumpridos.


 Patrimoniais: o principalmente deles é o regime de bens, bem como a
necessidade de auxílio material.

Com a instituição do CC de 2002, com a igualdade entre os cônjuges, houve


a horizontalização da relação matrimonial, conforme se observa:

Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher


assumem mutuamente a condição de consortes,
companheiros e responsáveis pelos encargos da
família.

Art. 1.567. A direção da sociedade conjugal será


exercida, em colaboração, pelo marido e pela
mulher, sempre no interesse do casal e dos filhos.

Parágrafo único. Havendo divergência, qualquer


dos cônjuges poderá recorrer ao juiz, que decidirá
tendo em consideração aqueles interesses.

Técio questiona a ausência de critérios por parte do juiz para diversas decisões
que se enquadrem no Parágrafo Único.

Ademais, faz-se necessário destacar o que dispõe o art. 1.570:

Art. 1.570. Se qualquer dos cônjuges estiver em lugar


remoto ou não sabido, encarcerado por mais de
cento e oitenta dias, interditado judicialmente ou
privado, episodicamente, de consciência, em
virtude de enfermidade ou de acidente, o outro
exercerá com exclusividade a direção da família,
cabendo-lhe a administração dos bens.

Nome de casado

Já foi obrigatório, hoje é facultativo, sendo facultado a ambas as partes


assumir o nome do outro.
Ana Maria Cunha – 2017.2 27

É possível após o casamento alterar os sobrenomes da maneira que desejar,


preservado o prenome.

Planejamento familiar

Há que se observar o disposto no art. 226, §7º da CF, bem como no §2º do

art. 1.565 do Código Civil:

Art. 226

§ 7o Fundado nos princípios da dignidade da


pessoa humana e da paternidade responsável, o
planejamento familiar é livre decisão do casal,
competindo ao Estado propiciar recursos
educacionais e científicos para o exercício desse
direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte
de instituições oficiais ou privadas.

Art. 1.565

§ 2o O planejamento familiar é de livre decisão do


casal, competindo ao Estado propiciar recursos
educacionais e financeiros para o exercício desse
direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte
de instituições privadas ou públicas.

Há ainda disposição nesse sentido na Lei 9.263/1996, contudo, não há nada


muito efetivo/consistente nesta e nas disposições anteriormente mencionadas.

Neste sentido, não há qualquer política de Estado consistente.

Deveres Matrimoniais no CC de 2002

Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:

I - fidelidade recíproca;
Ana Maria Cunha – 2017.2 28

Para Técio, trata-se de direito a ser respeitado em razão do princípio da


monogamia, por questões culturais. Para ele a poligamia traria diversos
problemas no âmbito do casamento e da união estável.

II - vida em comum, no domicílio conjugal;

Não se confunde com o dever de morar na mesma casa, não há obrigação


de coabitação. O que, em verdade, pretendeu o legislador foi demonstrar o
dever de comunhão de vida.

Técio menciona uma espécie de usucapião pouco usual: a usucapião por


abandono do lar conjugal, prevista no art. 1240-A.

Antigamente não se aceitava a possibilidade de estupro no casamento em


razão da visão ultrapassada de que haveria entre os cônjuges um débito
conjugal, ou seja, um dever de manutenção do matrimônio, incluindo as
relações sexuais.

III - mútua assistência;

Tal dever subsiste inclusive com o fim do casamento, o dever de pagamento


de pensão alimentícia é exemplo disso.

IV - sustento, guarda e educação dos filhos;

É dispositivo que se encontra deslocado no código: casamento e filiação são


noções que não se confundem. É disciplina antiga, herdada da época onde o
casamento tinha como sua única perspectiva a geração da prole. O dever de
guardar os filhos é dos pais, não necessariamente dos cônjuges.

V - respeito e consideração mútuos.

O seu descumprimento pode resultar em ação de danos morais.

Causas suspensivas do casamento

Art. 1.523. Não devem casar:


Ana Maria Cunha – 2017.2 29

I - o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge


falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do
casal e der partilha aos herdeiros;

II - a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez


por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses
depois do começo da viuvez, ou da dissolução da
sociedade conjugal;

III - o divorciado, enquanto não houver sido


homologada ou decidida a partilha dos bens do
casal;

IV - o tutor ou o curador e os seus descendentes,


ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a
pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não
cessar a tutela ou curatela, e não estiverem
saldadas as respectivas contas.

Parágrafo único. É permitido aos nubentes solicitar


ao juiz que não lhes sejam aplicadas as causas
suspensivas previstas nos incisos I, III e IV deste artigo,
provando-se a inexistência de prejuízo,
respectivamente, para o herdeiro, para o ex-
cônjuge e para a pessoa tutelada ou curatelada;
no caso do inciso II, a nubente deverá provar
nascimento de filho, ou inexistência de gravidez, na
fluência do prazo.

As causa suspensivas, portanto, podem ser afastadas caso se demonstre a


ausência de prejuízo.

Importante mencionar que o enunciado 377 do STF de 1964 continua sendo


aplicado, mesmo considerado ultrapassado, na opinião de Técio.

Introdução ao regime de bens


Ana Maria Cunha – 2017.2 30

O regime de bens está relacionado a três aspectos:

 Liberdade de escolha;
 Variabilidade;
 Mutabilidade: hoje é possível alterar o regime, desde que haja acordo e
autorização judicial.

Existem quatro regimes de bens no Código Civil, são eles:

 Comunhão parcial de bens: caso nada seja estabelecido entre os


cônjuges, este será o regime aplicado;
 Comunhão universal de bens: era o regime aplicado pelo CC/1916;
 Separação total de bens;
 Participação final dos aquestos: durante o casamento há separação de
bens, mas quando o regime chega ao fim a separação é parcial.

No entanto, é possível que se estabeleça disposições especificas, conforme


dispõe o art. 1639:

Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado


o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que
lhes aprouver.

Técio chama atenção para o fato de que os pactos antenupciais só dispõem


sobre aspectos patrimoniais, não dizendo respeito a direitos pessoais. Sua
importância se deve ao fato de por estabelecer o regime do casamento.

Nesse sentido, cumpre observar o que dispõe o CC quanto a forma do pacto


antenupcial:

Art. 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for


feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe
seguir o casamento.

Ademais, dispõe o Código que:

Art. 1.655. É nula a convenção ou cláusula dela que


contravenha disposição absoluta de lei.
Ana Maria Cunha – 2017.2 31

Art. 1.657. As convenções antenupciais não terão


efeito perante terceiros senão depois de registradas,
em livro especial, pelo oficial do Registro de Imóveis
do domicílio dos cônjuges.

Início e fim do regime de bens

O inicio do regime de bens é o casamento. Não obstante, o CC não deixa


claro quando se dá o fim deste. Para que cheguemos a essa resposta, faz-se
necessário observar o art. 1723,§1º:

§ 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem


os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a
incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada
se achar separada de fato ou judicialmente.

Através do artigo se extrai que há contração da união estável com a


separação de fato ou judicial. A partir disso, se interpreta que o regime de
bens tem fim a partir também da separação de fato, divórcio ou morte.

Regime legal supletivo

Tem como marco a Lei 6515/1977, a lei do divórcio. Antes dela, o regime
utilizado era o universal. Ou seja, caso não fosse estabelecido nenhum pacto
antenupcial, o regime utilizado deveria ser o da comunhão universal de bens.
Com a lei do divórcio se estabeleceu que o regime supletivo institui a
comunhão parcial de bens, o que ocorre até hoje.

Regime legal obrigatório

Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de


bens no casamento:

I - das pessoas que o contraírem com inobservância


das causas suspensivas da celebração do
casamento;
Ana Maria Cunha – 2017.2 32

II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; (Redação


dada pela Lei nº 12.344, de 2010)

III - de todos os que dependerem, para casar, de


suprimento judicial.

Mudança no regime de bens

Art. 1.639

§ 2o É admissível alteração do regime de bens,


mediante autorização judicial em pedido motivado
de ambos os cônjuges, apurada a procedência das
razões invocadas e ressalvados os direitos de
terceiros.

São requisitos para a mudança do regime:

 Consensualidade dos cônjuges;


 Autorização judicial.

Administração dos bens do casamento

A previsão constitucional de igualdade entre os cônjuges também se aplica à


administração dos bens. Diante da impossibilidade fática de um dos cônjuges
praticar a administração, fica a cargo do outro tal função.

Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens,


tanto o marido quanto a mulher podem livremente:

I - praticar todos os atos de disposição e de


administração necessários ao desempenho de sua
profissão, com as limitações estabelecida no inciso I
do art. 1.647;

II - administrar os bens próprios;

III - desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham


sido gravados ou alienados sem o seu
consentimento ou sem suprimento judicial;
Ana Maria Cunha – 2017.2 33

IV - demandar a rescisão dos contratos de fiança e


doação, ou a invalidação do aval, realizados pelo
outro cônjuge com infração do disposto nos incisos
III e IV do art. 1.647;

V - reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis,


doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao
concubino, desde que provado que os bens não
foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o
casal estiver separado de fato por mais de cinco
anos;

VI - praticar todos os atos que não lhes forem


vedados expressamente.

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648,


nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do
outro, exceto no regime da separação absoluta:

I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens


ou direitos;

III - prestar fiança ou aval;

IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de


bens comuns, ou dos que possam integrar futura
meação.

Parágrafo único. São válidas as doações nupciais


feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem
economia separada.

Art. 1.651. Quando um dos cônjuges não puder


exercer a administração dos bens que lhe incumbe,
segundo o regime de bens, caberá ao outro:
Ana Maria Cunha – 2017.2 34

I - gerir os bens comuns e os do consorte;

II - alienar os bens móveis comuns;

III - alienar os imóveis comuns e os móveis ou imóveis


do consorte, mediante autorização judicial.
Ana Maria Cunha – 2017.2 35

II UNIDADE

REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS

É um dos regimes matrimoniais mais antigos, defendido inclusive pela Igreja


sob o argumento de que se o casamento representaria o entrelace de almas,
representaria também o entrelace de patrimônios.

No passado, onde não havia ainda a possibilidade jurídica do divórcio, mas


apenas do desquite, bem como a colocação da mulher casada na posição
de relativamente incapaz, o regime da comunhão universal de bens era o
mais justo quanto possível, afinal a posição de subjugação econômica na qual
era colocada a mulher a fazia, com o fim do vínculo matrimonial, ficar
completamente desassistida.

O art. 1.667 do Código Civil dita o que seria o regime da comunhão universal:

Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa


a comunicação de todos os bens presentes e
futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as
exceções do artigo seguinte.

É regime de bens de tamanha violência que há quem questione sua natureza


jurídica: alguns afirmam que seria uma forma de condomínio; outros, que o
casamento sob a égide deste regime patrimonial criaria uma pessoa jurídica.

Bens incomunicáveis

Inobstante a regra geral da comunhão universal seja a comunicabilidade


absoluta dos bens (presentes, futuros e dívidas passivas), comporta ela
algumas exceções, os chamados bens incomunicáveis. Estão eles previstos no
art. 1.668:

Art. 1.668. São excluídos da comunhão:

I - os bens doados ou herdados com a cláusula de


incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;
Ana Maria Cunha – 2017.2 36

Sobre este inciso, é necessário explicar o seguinte: três são as formas de


restrição voluntária à propriedade: 1) inalienabilidade; 2) impenhorabilidade;
3) incomunicabilidade. A inalienabilidade pressupõe os outros dois, mas o
inverso não se confirma.

Assim, um bem doado com esta cláusula pode ser alienado ou penhorado,
mas não participa do regime de bens do casal.

II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do


herdeiro fideicomissário, antes de realizada a
condição suspensiva;

O fideicomisso é a instituição de um herdeiro ou legatário (fiduciário – quem o


estabelece é o fiduciante) para que este transmita bens a uma outra pessoa
(fideicomissário) a partir de implemento de termo ou condição, ou por morte.

É hipótese deveras restrita no código atual, posto que apenas podem figurar
como fideicomissários os não concebidos ao tempo da morte do fiduciante.
Se já nascidos, o direito do fiduciário se converterá em usufruto até que
chegue o tempo de transferir os bens.

Se um dos cônjuges, portanto, possuir bens a título de fiduciante, não se


comunicarão estes ao outro consorte, posto que isto inviabilizaria o
cumprimento do fideicomisso.

III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se


provierem de despesas com seus aprestos, ou
reverterem em proveito comum;

Assim, as dívidas anteriores de cada um dos cônjuges não farão parte do


regime de bens da comunhão universal, excetuando-se: as dívidas contraídas
com o próprio casamento (celebração, buffet, fotógrafo...) e as dívidas que se
convertam em proveito para o casal (empréstimo havido para comprar o
apartamento em que residem os cônjuges, por exemplo).

A razão de ser é que resta vedado o enriquecimento ilícito, de modo que se os


débitos se revertem em vantagens para os consortes, injusto seria que não
pudessem eles se comunicar.
Ana Maria Cunha – 2017.2 37

IV - as doações antenupciais feitas por um dos


cônjuges ao outro com a cláusula de
incomunicabilidade;

As razões do inciso I aqui se aplicam integralmente.

V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.

Conforme se verá, esta incomunicabilidade é estabelecida para proteger os


bens adquiridos com os esforços individuais dos cônjuges, valorizando seu
trabalho.

Stolze e Pamplona apontam ainda para a existência de hipóteses não


codificadas de bens incomunicáveis, a exemplo das pensões decorrentes de
seguro por invalidez.

Administração dos bens

No que se refere à administração de bens, faz o código remissão às regras


explicitadas no regime da comunhão parcial de bens.

Quanto aos bens particulares, qualquer autorização do outro cônjuge é


desnecessária, já no que é atinente aos bens comunicáveis, esta anuência é
sempre requerida.

Frutos e rendimentos

Os frutos e rendimentos são comunicáveis, mesmo que o bem em si mesmo


não o seja. Por óbvio, apenas aqueles que já existam no momento do divórcio.

Extinção da comunhão

Por fim, dispõe o Código Civil:

Art. 1.671. Extinta a comunhão, e efetuada a divisão


do ativo e do passivo, cessará a responsabilidade
de cada um dos cônjuges para com os credores do
outro.
Ana Maria Cunha – 2017.2 38

Assim, desfeita a comunhão universal, os cônjuges apenas responderão


perante seus respectivos credores. Importa mencionar que este artigo se
aplica não apenas no caso de extinção do casamento em si, mas também
nos casos de alteração de regime de bens no decurso do casamento.

Esta regra não pode ser aplicada em prejuízo de terceiros.

REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS

Aqui ficam separados os bens adquiridos antes do casamento e se


comunicam os bens adquiridos na constância do matrimônio e onerosamente.

Há, portanto:

Patrimônio Patrimônio
particular dos comum dos
cônjuges cônjuges
• Bens adquiridos antes do • Bens adquiridos
casamento; onerosamente na
• Bens adquiridos constância do casamento,
gratuitamente na incluindo-se as hipóteses
constância do matrimônio, legalmente previstas.
bem como as exceções
legalmente estabelecidas.

Bens Bens
particulares particulares
da esposa* do marido*

BENS COMUNS
Ana Maria Cunha – 2017.2 39

*meramente exemplificativo.

Ou seja, há dois requisitos a serem observados: o temporal e a onerosidade.


Isto porque serão divididos os bens adquiridos onerosamente ao longo do
casamento. Aquilo que cada um possuía antes do casamento não será
dividido.

Técio comenta, então, situações possíveis quando da partilha de bens:

1) Partilha de tudo, pois as pessoas só adquiriram bens após o casamento;

2) Não se dividir nada, pois não adquiriram bens após o casamento;

3) Apenas um dos cônjuges possuía bens e ambos constroem um patrimônio


no casamento. Nesse caso, somente se dividirá o adquirido após o matrimônio.

Bens excluídos da comunhão

Art. 1.658. No regime de comunhão parcial,


comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal,
na constância do casamento, com as exceções dos
artigos seguintes.

Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:

I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os


que lhe sobrevierem, na constância do casamento,
por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu
lugar;

Aqui vale a regra geral de que os bens adquiridos antes do matrimônio não se
comunicam, apenas os adquiridos durante o casamento e de forma onerosa
(daí a exclusão dos bens havidos por doação ou sucessão).

Importante, entretanto, atentar-se para os bens sub-rogados, que também


não se comunicam. Serão tais bens aqueles que forem adquiridos em
substituição ao patrimônio já existente de um dos cônjuges antes do
casamento. Esta é situação de pouca clareza, no mais das vezes, e, portanto,
é importante inserir, em contrato de compra e venda de tais bens uma
Ana Maria Cunha – 2017.2 40

cláusula de sub-rogação, para que reste incontroversa a incomunicabilidade


do bem.

Exemplo 1: Antes de casar, o cônjuge X possuía um automóvel no valor de R$


50.000. Durante o casamento, vende este carro e compra outro de igual valor.
Este novo automóvel substituiu, isto é, sub-rogou o anterior, e, portanto, não se
comunica.

Exemplo 2: Imaginemos agora situação análoga a do exemplo 1, mas ao invés


de comprar automóvel de igual valor, o cônjuge adquire um de valor superior
(R$ 100.000,00, por exemplo). Nesse caso, o bem apenas substitui parcialmente
o anterior, afinal parte de seu valor foi paga com patrimônio nascido na
constância do casamento. Assim, este novo bem pode integrar a meação, na
parte excedente da sub-rogação.

II - os bens adquiridos com valores exclusivamente


pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação
dos bens particulares;

Este inciso conecta-se fortemente com o anterior, e, em interpretação


conjunta deles, podemos extrair a seguinte regra: os bens adquiridos com
esforço comum dos cônjuges se comunicam, os demais, não.

III - as obrigações anteriores ao casamento;

IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo


reversão em proveito do casal;

V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de


profissão;

Resta claro que os bens de uso mais íntimo e pessoal de fato não se
comunicam (roupas, sapatos, escova de dentes, etc.). Entretanto, quanto aos
livros e instrumentos de profissão, esta regra merece ser matizada.
Ana Maria Cunha – 2017.2 41

É que se tais bens foram conseguidos com patrimônio conjunto do casal, não
os colocar na meação faria o cônjuge que os recebeu incorrer em
enriquecimento ilícito, situação vedada por nosso ordenamento.

É só pensar no caso de um profissional da odontologia que tem seus caros


equipamentos de consultório adquiridos em conjunto com sua esposa. Ora, o
patrimônio do casal é que proporcionou a ele aqueles bens, e não seria justo
que o outro cônjuge não pudesse reaver nada disso posteriormente.

VI - os proventos do trabalho pessoal de cada


cônjuge;

A regra que fica fixada neste dispositivo é que o direito à percepção de


salário, periodicamente, não integra a partilha dos bens.

Lado outro, os valores já insertos no patrimônio, se comunicam. Assim, as coisas


que foram compradas com o salário, por exemplo, integram a meação.

Importante se atentar para o fato de que já existem jurisprudências do STJ no


sentido de que os valores recebidos a título de indenização trabalhista, bem
como os sacados a título de FGTS (na parcela adquirida durante o
casamento) integrariam a meação dos bens.

VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras


rendas semelhantes.

São tais valores recebidos a título previdenciário ou verbas percebidas por


militares.

Os comentários tecidos acerca do inciso anterior aqui se aplicam, mutatis


mutandis, ou seja, o que fica verdadeiramente vedado é a meação da
percepção dos valores. Uma vez já inseridos no patrimônio, se comunicam.

Art. 1.661. São incomunicáveis os bens cuja


aquisição tiver por título uma causa anterior ao
casamento.

Títulos são causas aquisitivas de direitos reais (a exemplo de um contrato de


compra e venda). A aquisição de um direito real se dá efetivamente pelo
Ana Maria Cunha – 2017.2 42

modo (registro da escritura pública, no exemplo citado). Quando o título é


anterior ao matrimônio, ainda que o modo se dê na constância do casamento
o bem é incomunicável.

Se as parcelas foram quitadas depois da vigência do casamento, entretanto,


haverá a comunicabilidade, mas na proporção das parcelas que foram
pagas na constância do matrimônio (se 60% das parcelas foram quitadas na
constância do matrimônio, 60% do bem será comunicável, por exemplo).

Importante mencionar que podem existir outras hipóteses de


incomunicabilidade estabelecidas em legislação extravagante.

Bens comunicáveis

Art. 1.660. Entram na comunhão:

I - os bens adquiridos na constância do casamento


por título oneroso, ainda que só em nome de um
dos cônjuges;

II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem


o concurso de trabalho ou despesa anterior;

Suponhamos que alguém jogou na mega sena, o prêmio obtido é dividido?


Sim, pelo exposto no artigo acima.

Aqui se inserem, portanto, os ganhos extraordinários, como os percebidos a


título de sorteio, loteria, rifa, bingo, etc.

III - os bens adquiridos por doação, herança ou


legado, em favor de ambos os cônjuges;

IV - as benfeitorias em bens particulares de cada


cônjuge;

Benfeitorias são acréscimos a uma coisa que não criam nada novo ou
ampliam seu volume, apenas melhoram o que já é existente. No dispositivo
transcrito, o que se quer vedar é o enriquecimento sem causa de um dos
cônjuges. É só se pensar em um cônjuge que auxilia significativamente na
Ana Maria Cunha – 2017.2 43

reforma do imóvel do outro. Terá ele, por justiça, direito à meação pelo valor
acrescido ao bem.

V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de


cada cônjuge, percebidos na constância do
casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a
comunhão.

Frutos, mesmo de bens incomunicáveis, são comunicáveis. Todo fruto é


partilhado.

Art. 1.662. No regime da comunhão parcial,


presumem-se adquiridos na constância do
casamento os bens móveis, quando não se provar
que o foram em data anterior.

Administração dos bens

Art. 1.663. A administração do patrimônio comum


compete a qualquer dos cônjuges.

§ 1o As dívidas contraídas no exercício da


administração obrigam os bens comuns e
particulares do cônjuge que os administra, e os do
outro na razão do proveito que houver auferido.

§ 2o A anuência de ambos os cônjuges é necessária


para os atos, a título gratuito, que impliquem cessão
do uso ou gozo dos bens comuns.

§ 3o Em caso de malversação dos bens, o juiz


poderá atribuir a administração a apenas um dos
cônjuges.

Art. 1.664. Os bens da comunhão respondem pelas


obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher
para atender aos encargos da família, às despesas
de administração e às decorrentes de imposição
legal.
Ana Maria Cunha – 2017.2 44

Art. 1.665. A administração e a disposição dos bens


constitutivos do patrimônio particular competem ao
cônjuge proprietário, salvo convenção diversa em
pacto antenupcial.

Art. 1.666. As dívidas, contraídas por qualquer dos


cônjuges na administração de seus bens
particulares e em benefício destes, não obrigam os
bens comuns.

REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS

Há aqui dois regimes: o da separação obrigatória e o da separação


convencional.

Separação obrigatória/legal Separação convencional

• São aqueles casamentos • Regime de separação que


realizados sob a tem como sua base a livre
infringência de uma causa emissão de vontade das
suspensiva de celebração partes.
do casamento, ou da
pessoa maior de 70 anos
(inciso inconstitucional);
• Da pessoa cujo casamento
dependa de provimento
judicial.

A separação obrigatória está disposta no art. 1641:

Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de


bens no casamento:

I - das pessoas que o contraírem com inobservância


das causas suspensivas da celebração do
casamento;

II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; (Redação


dada pela Lei nº 12.344, de 2010)
Ana Maria Cunha – 2017.2 45

III - de todos os que dependerem, para casar, de


suprimento judicial.

Importante, ainda, mencionar a Súmula 377 do STF:

Súmula 377 (STF). No regime de separação legal de


bens, comunicam-se os adquiridos na constância
do casamento.

Esta súmula foi editada na vigência do código anterior, e, portanto, sob a


égide do artigo 219 e tudo que o mesmo implicava. Em que pese o código
atual não possua mais dispositivo equivalente, bem como as razões que o
motivaram não mais existirem, a súmula permanece válida e sendo aplicada.

Importante frisar, entretanto, que apenas se aplica tal enunciado a quem tem
regime de separação obrigatória ou legal, jamais na hipótese da separação
convencional.

A separação convencional, por sua vez, está prevista no art. 1.687:

Art. 1.687. Estipulada a separação de bens, estes


permanecerão sob a administração exclusiva de
cada um dos cônjuges, que os poderá livremente
alienar ou gravar de ônus real.

A separação convencional, portanto, advém da vontade dos consortes.

Importante ainda observar o art. 2039:

Art. 2.039. O regime de bens nos casamentos


celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei
no 3.071, de 1o de janeiro de 1916, é o por ele
estabelecido.

REGIME DA PARTICIPAÇÃO FINAL DOS AQUESTOS

Aquestos são os bens adquiridos na constância do casamento. É regime onde


a participação nos bens apenas se dá ao fim do casamento, isto é, na
Ana Maria Cunha – 2017.2 46

vigência do matrimônio os bens são de maior de disponibilidade por parte dos


consortes.

É regime de pouca utilização no direito brasileiro, dadas tanto a


complexidade de suas regras quanto a dificuldade de aplicar o regime.

Art. 1.672. No regime de participação final nos


aqüestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio,
consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à
época da dissolução da sociedade conjugal, direito
à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título
oneroso, na constância do casamento.

Art. 1.673. Integram o patrimônio próprio os bens que


cada cônjuge possuía ao casar e os por ele
adquiridos, a qualquer título, na constância do
casamento.

Parágrafo único. A administração desses bens é


exclusiva de cada cônjuge, que os poderá
livremente alienar, se forem móveis.

Não se deve confundir este regime com o da comunhão parcial de bens:


enquanto que no regime da participação final dos aquestos os bens que vão
compor a meação são aqueles que são adquiridos em conjunto pelo casal,
na comunhão parcial se comunicam os adquiridos por qualquer dos cônjuges,
isto é, em conjunto ou não.

UNIÃO ESTÁVEL

Desde o Império Romano a ideia de união estável já existia através da lex julia
e lex poppea.

No Brasil, a união estável surge de maneira tardia em razão do Cristianismo.


Isto porque algumas relações eram consideradas inapropriadas para a
proteção do Estado, a exemplo do concubinato. Neste sentido, só era digna a
família advinda do matrimônio (sacramento da Igreja), ideia esta
sedimentada no Concílio de Trento.
Ana Maria Cunha – 2017.2 47

Com o tempo houve proteções previdenciárias e direitos crescentes para as


famílias de fato.

Ao lado disso, há o instituto da sociedade de fato, fenômeno que ocorre


quando se tem uma sociedade irregular (não registrada/formalizada), mas
que existe de fato, atuando enquanto sociedade. Este instituto era aplicado
antes da normatização da união estável como forma de regular o regime
patrimonial dos conviventes. Isto ficou consubstanciado na súmula 380 do STF
18 . Posteriormente, este instituto passou a ser utilizado para organizar o regime
de bens em relações homoafetivas.

Mas o grande marco de toda essa história é a Constituição de 1988, que


trouxe a proteção das sociedades de fato pelo Estado. Contudo, a união
estável entre pessoas do mesmo sexo só surgiu em 2011, através da ADPF
132/RJ.

Em 2013, Joaquim Barbosa, através da resolução 175/2013, aprovou que se


torna infração administrativa à recusa a lavratura de escritura de união estável
entre pessoas do mesmo sexo.

Técio destaca o fato de que o prazo para a união estável não é de 2 anos. Já
foi de 5 anos com a lei 9278 de 1996, mas nunca foi de 2 anos.

Natureza jurídica

A união estável se trata de um contrato. Ainda que se forme ela de forma


fática, entende-se que o que houve é a criação de um negócio jurídico a
partir da manifestação de vontade por um comportamento concludente.

Requisitos

O requisito maior para a conformação da união estável é que a finalidade


seja a constituição de família, é o chamado requisito teleológico. Não há
qualquer necessidade de tempo mínimo, diversidade de sexos, coabitação,
etc.

A união ainda deve ser pública, contínua e duradora.

Uniões estáveis plúrimas


Ana Maria Cunha – 2017.2 48

Plúrimas são as situações onde uma pessoa vive, simultaneamente, em


diversas uniões estáveis, ou na constância de um casamento (sem separação
de fato). Em que pese já existam entendimentos (de Maria Berenice Dias, por
exemplo) que ratificam estas, se trata de interpretação feita contra legem,
afinal a lei expressamente diz que não se pode constituir união estável na
vigência de um casamento, a menos que tenha havido separação de fato.

Aparte disto tudo, é conformação rechaçada pelo STJ.

O CNJ já julgou pedido de providência quanto a algumas certidões públicas


de uniões estáveis plúrimas que estavam sendo impugnados justamente em
razão da facilidade de impetração de fraudes a partir disto. O Conselho
emitiu, então, recomendação formal de que nenhuma serventia extrajudicial
realize estes registros.

Impedimentos

As pessoas que são impedidas, pelo código civil, de casarem (art. 1.521) não
podem ter a união estável reconhecida. A sua relação cairá sob o rótulo – e
regime jurídico – do concubinato. É o que disciplina o parágrafo primeiro do
artigo 1.723.

Há, entretanto, uma exceção: a causa de impedimento de estar casado não


se aplica desde que a pessoa esteja separada de fato ou judicialmente. Isto é,
os casados, separados de fato ou judicialmente podem constituir união
estável.

Não estão igualmente impedidos de ter reconhecida a sua união estável os


sob infringência de causa suspensiva do casamento, apenas sendo
obrigatória a adoção do regime de separação obrigatória de bens.

Lado outro, a doutrina já tem se movimentado no sentido de admitir a


possibilidade de uma união estável putativa. Isto é, nos mesmos casos em que
o casamento se daria putativamente, poderia ocorrer a união estável, com as
mesmas consequências jurídicas. É entendimento que, entretanto, ainda não
possui ratificação por tribunal superior.

Deveres dos companheiros


Ana Maria Cunha – 2017.2 49

Art. 1.724. As relações pessoais entre os


companheiros obedecerão aos deveres de
lealdade, respeito e assistência, e de guarda,
sustento e educação dos filhos.

A grande tendência é que sejam igualados os deveres da união estável aos


do casamento. Técio entende que qualquer diferenciação feita entre os
institutos nesse sentido seria inconstitucional, por serem ambas conformações
familiares de igual valor.

Contrato de união estável

Segundo o artigo 1.725 do CC, salvo contrato escrito entre os companheiros,


valerá o regime de comunhão parcial de bens. Não é necessário que seja
feito por escritura pública, em que pese possa ser feito por instrumento
particular, inclusive por expressa disposição do STF.

Funciona da mesma forma que o pacto antenupcial, apenas podendo dispor


sobre a parcela patrimonial da união, jamais sobre direitos pessoais.

Conversão em casamento

A própria Constituição já determina a facilitação da conversão da união


estável em casamento. É processo simples, que pode ser feito perante o
próprio cartório.

Art. 226

(...)

§3º Para efeito da proteção do Estado, é


reconhecida a união estável entre o homem e a
mulher como entidade familiar, devendo a lei
facilitar sua conversão em casamento.

Dissolução

É feita a partir da ação de reconhecimento e dissolução de união estável.


Ana Maria Cunha – 2017.2 50

DIVÓRCIO

O divórcio é forma de dissolução do vínculo matrimonial através da vontade


do(s) cônjuge(s). É importante também apontar que o divórcio não é a única
forma de encerrar este vínculo, afinal também são vias para isto a morte e a
invalidação do casamento.

Devemos ainda dizer que a ação de divórcio apenas tem uma finalidade
específica: o desfazimento do vínculo matrimonial por vontade. Inobstante
isto, pode ela ser cumulada com pedidos diversos, tais como o de guarda dos
filhos, alimentos, etc.

Escorço histórico do divórcio no Brasil

Alguns marcos históricos devem ser considerados, são eles:

 Art. 226, §6º CF;


 L.D. 6515/1977 (surge o divórcio);
 E.C. nº 9/1997;
 Lei 11.441/2007 – Divórcio Extrajudicial;
 CPC/2015.

Por muito tempo, os casamentos no Brasil se davam de maneira indissolúvel,


isto é, não havia qualquer possibilidade jurídica de um pedido de divórcio. O
instituto mais aproximado que possuíamos era o desquite, que simplesmente
significava o rompimento da sociedade conjugal, enquanto que o vínculo
matrimonial era mantido.

Apenas em 1977, com a Lei 6.515 (Lei do Divórcio), amparada pela EC nº


9/1977, feita à Constituição de 1967, é que a trava constitucional ao divórcio
foi retirada. Entretanto, ainda era previsto período que os cônjuges deveriam
suportar entre a solicitação do divórcio e este propriamente dito: três anos de
separação judicial ou cinco anos de separação de fato.

Com a promulgação da Constituição de 1988, houve uma significativa


alteração nos prazos: agora apenas eram mandatórios dois anos de
separação de fato ou um ano de separação judicial.
Ana Maria Cunha – 2017.2 51

O divórcio pela via direta somente foi alcançado com a EC 66/2010, que
alterou o texto constitucional para a seguinte redação:

Art. 226. Omissis

(...)

§6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo


divórcio

Como se vê, apenas é dito que o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio,
não estabelecendo, para isso, qualquer requisito ou condição.

Importante salientar que mesmo as pessoas que estavam em vigência de


separação de fato ou judicial quando da edição de emenda 66 não se
encontraram imediatamente divorciadas, devendo solicitar isto.

Tendo sido retirada a necessidade de qualquer imputação de culpa à parte


contrária (o que era imprescindível no caso da separação judicial); ou de
tempo mínimo de dissolução da sociedade conjugal (o que subsidiava a
separação de fato), o divórcio passa a ser entendido como um direito
potestativo, afinal não admite qualquer defesa, mesmo em abstrato, da parte
contrária.

Em que pese as diversas discussões doutrinárias acerca da permanência ou


não da separação judicial, contida na Lei do Divórcio, ou ainda da
necessidade de o Código Civil incorporar o divórcio direto para que este
valesse, é de se dizer que com a existência do divórcio direto, a separação
(judicial ou extrajudicial) passa a ser completamente desnecessária.

Com a lei 11.441/2007, o divórcio extrajudicial foi permitido, aqueles feitos


através de serventias extrajudiciais (cartório). Seus requisitos são simples: o
consenso e a inexistência de filhos menores, incapazes ou nascituros (este
último inserido pelo CPC/2015).

Separação de Fato x Separação Judicial

A primeira não é jurídica, ocorrendo tão somente no plano fático, enquanto a


segunda ocorre através da Justiça.
Ana Maria Cunha – 2017.2 52

Ou seja, a separação de fato, como o próprio nome faz pressupor, é aquela


que se dá faticamente, isto é o casal não mais usufrui, no plano da vida, da
sociedade conjugal.

A separação de direito, por sua vez, se trata da modalidade de separação


onde há a imputação de culpa ao outro cônjuge.

Há ainda a separação de corpos, decisão de natureza liminar que determina


a suspensão do dever de coabitação dos cônjuges. Este mecanismo perdeu
muita importância em face da Lei Maria da Penha, que consagra instrumentos
muito mais eficazes na resolução dos conflitos domésticos antes por ele
contemplados.

Cumpre incorporar a este humilde caderno, ainda, tópico trazido pelo


ilustríssimo colega Pedro Santos Barral, qual seja:

Nome de casado após o divórcio

Com a derrocada do instituto da separação judicial, bem como do


banimento da demonstração de culpa dos cônjuges para viabilizar o divórcio,
Stolze e Pamplona vão na linha de que, findo o casamento, a regra geral é
que se retome o nome de solteiro. Esta regra, entretanto, para os autores,
comporta temperamentos:

 Se o divórcio for consensual (judicial ou administrativo), o acordo


firmado deve versar sobre a questão do nome;
 Sendo litigioso o divórcio, se aplica a regra geral, sendo retomado o
nome de solteiro, regra essa que será excepcionada se presente
alguma das hipóteses do art. 1.578, quais sejam:
 Evidente prejuízo para a identificação do cônjuge;
 Manifesta distinção entre o nome de família do cônjuge e o dos
filhos havidos da união dissolvida;
 Dano grave reconhecido na decisão judicial.

Poder Familiar
Ana Maria Cunha – 2017.2 53

É ideia não somente de poder, mas também de dever, dever este de conduzir
bem os filhos, para que cresçam e se desenvolvam enquanto menores e
incapazes.

Art. 1.631. Durante o casamento e a união estável,


compete o poder familiar aos pais; na falta ou
impedimento de um deles, o outro o exercerá com
exclusividade.

Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao


exercício do poder familiar, é assegurado a
qualquer deles recorrer ao juiz para solução do
desacordo.

Em relação ao parágrafo único, em que pese critique este, Técio comenta


que não há alternativa melhor.

Cumpre mencionar ainda que o poder familiar inclui o poder de


representação e assistência. Os pais são os representantes e assistentes de seus
filhos enquanto menores e incapazes.

Art. 1.690. Compete aos pais, e na falta de um deles


ao outro, com exclusividade, representar os filhos
menores de dezesseis anos, bem como assisti-los até
completarem a maioridade ou serem emancipados.

Parágrafo único. Os pais devem decidir em comum


as questões relativas aos filhos e a seus bens;
havendo divergência, poderá qualquer deles
recorrer ao juiz para a solução necessária.

Quantos aos limites da representação e assistência, dita o art. 1.691:

Art. 1.691. Não podem os pais alienar, ou gravar de


ônus real os imóveis dos filhos, nem contrair, em
nome deles, obrigações que ultrapassem os limites
da simples administração, salvo por necessidade ou
Ana Maria Cunha – 2017.2 54

evidente interesse da prole, mediante prévia


autorização do juiz.

Parágrafo único. Podem pleitear a declaração de


nulidade dos atos previstos neste artigo:

I - os filhos;

II - os herdeiros;

III - o representante legal.

Ou seja, para tudo aquilo que foge da simples administração dos bens faz-se
necessária a autorização judicial.

Importante salientar que os direitos e deveres do menor pertencem ao próprio


menor, não podendo o mesmo ser considerado como um “fantoche” ou um
“laranja” de seus pais.

Por fim, insta dizer que o divórcio ou a contração de novo matrimônio não
altera os direitos e deveres dos pais quanto a seus filhos. A lógica que o código
procurou abrigar é a da filiação como um direito de todos os filhos,
independentemente da relação que os vincula aos pais.

Há que se falar ainda da extinção, suspensão e destituição:

Extinção

Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar:

I - pela morte dos pais ou do filho;

II - pela emancipação, nos termos do art. 5o,


parágrafo único;

III - pela maioridade;

IV - pela adoção;

V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.


Ana Maria Cunha – 2017.2 55

Suspensão

Já a suspensão é a retirada temporária do poder familiar em razão do


acontecimento de alguma das hipóteses prevista no artigo 1.637:

Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua


autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou
arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz,
requerendo algum parente, ou o Ministério Público,
adotar a medida que lhe pareça reclamada pela
segurança do menor e seus haveres, até
suspendendo o poder familiar, quando convenha.

Parágrafo único. Suspende-se igualmente o


exercício do poder familiar ao pai ou à mãe
condenados por sentença irrecorrível, em virtude de
crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.

Destituição

Ocorre através de decisão judicial por motivações muito sérias.

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o


pai ou a mãe que:

I - castigar imoderadamente o filho;

II - deixar o filho em abandono;

III - praticar atos contrários à moral e aos bons


costumes;

IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no


artigo antecedente.

V - entregar de forma irregular o filho a terceiros


para fins de adoção.
Ana Maria Cunha – 2017.2 56

Guarda dos Filhos

Se rompida a união presente entre um casal, seja ela o matrimônio ou união


estável, é importante estabelecer mecanismos para gerir a atuação do poder
familiar dali em diante, para que o menor não possa ter sua criação muito
prejudicada em razão desta separação.

A guarda dos filhos serve, portanto, para as situações em que os pais do


menor não exercem o poder familiar de maneira conjunta. A guarda serve
justamente como mecanismo para gerir a criação da criança.

São modalidades de guarda:

 Guarda unilateral (exclusiva de um dos pais);


 Guarda alternada (alterna períodos de unilateralidade pré
determinados);
 Guarda compartilhada (de ambos os pais, não sendo exercida de
maneira pré determinada);
 Guarda de nidação ou aninhamento (quando a criança é que possui a
casa e seus pais se alternam na casa da criança).

Quanto à guarda compartilhada, cumpre observar a alteração do art. 1.584,


§2º, que determinou que a guarda compartilhada é aquela indicada pelo CC,
de maneira que tornou-se quase obrigatória, o que é alvo de críticas de Técio,
que afirma que a guarda compartilhada deve ser tão somente a guarda
preferencial, mas não imposta.

Em relação às visitas, dispõe o art. 1.589:

Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não


estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua
companhia, segundo o que acordar com o outro
cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar
sua manutenção e educação.

Parágrafo único. O direito de visita estende-se a


qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os
interesses da criança ou do adolescente.
Ana Maria Cunha – 2017.2 57

Importante observar que mesmo que o regime de guarda seja o unilateral ou


o alternado, os pais têm o direito de periodicamente ter a companhia de seus
filhos, bem como de fiscalizar sua manutenção e educação.

Técio destaca ainda o que traz o art. 1.584, §6º:

§ 6o Qualquer estabelecimento público ou privado


é obrigado a prestar informações a qualquer dos
genitores sobre os filhos destes, sob pena de multa
de R$ 200,00 (duzentos reais) a R$ 500,00 (quinhentos
reais) por dia pelo não atendimento da solicitação.

Alienação Parental

Tem como base legal a Lei 12.318/2010, cujo art. 2º é destacado por Técio:

Art. 2º. Considera-se ato de alienação parental a


interferência na formação psicológica da criança
ou do adolescente promovida ou induzida por um
dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a
criança ou adolescente sob a sua autoridade,
guarda ou vigilância para que repudie genitor ou
que cause prejuízo ao estabelecimento ou à
manutenção de vínculos com este.

Em resumo, a alienação parental é a campanha de desmoralização da figura


de um dos progenitores em face do outro, buscando afastar – física e
espiritualmente – seu filho dele. A síndrome da alienação parental, mais
especificamente, é a sequela emocional deixada por esta tentativa de um
dos pais desabonar a imagem do outro, fazendo com que o filho passe a
rejeitar aquele cônjuge, nutrindo sentimentos negativos quanto ao mesmo.

Os incisos do parágrafo único exemplificam práticas desta natureza:

I - realizar campanha de desqualificação da


conduta do genitor no exercício da paternidade ou
maternidade;

II - dificultar o exercício da autoridade parental;


Ana Maria Cunha – 2017.2 58

III - dificultar contato de criança ou adolescente


com genitor;

IV - dificultar o exercício do direito regulamentado


de convivência familiar;

V - omitir deliberadamente a genitor informações


pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente,
inclusive escolares, médicas e alterações de
endereço;

VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra


familiares deste ou contra avós, para obstar ou
dificultar a convivência deles com a criança ou
adolescente;

VII - mudar o domicílio para local distante, sem


justificativa, visando a dificultar a convivência da
criança ou adolescente com o outro genitor, com
familiares deste ou com avós.

No entanto, pode haver ampla possibilidade de repressão através, por


exemplo, de restrição de horários e até mesmo da suspensão do poder
familiar.

Filiação

Inicialmente, Técio chama a atenção para o fato de que o exame de DNA


não serve como prova absoluta de filiação.

A filiação, em termos técnicos e jurídicos, é tão somente o vínculo de


ascendência direta, em primeiro grau, entre sujeitos.

Muito embora em épocas passadas se admitisse a diferenciação (e


consequente discriminação) entre filhos havidos dentro e fora do casamento,
é de se dizer que esta situação já foi de há muito proscrita, afinal segundo
afirma a Constituição:
Ana Maria Cunha – 2017.2 59

Art. 277. omissis

§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do


casamento, ou por adoção, terão os mesmos
direitos e qualificações, proibidas quaisquer
designações discriminatórias relativas à filiação.

Fica estabelecido, portanto, que independe se o filho tem como genitora uma
amante, uma mulher divorciada, etc.

Para parte da doutrina, este dispositivo, repetido no artigo 1.596 do CC


enunciaria um princípio da igualdade dos filhos. Técio acredita que o termo
“princípio” seja uma denominação equivocada da doutrina, posto que não o
artigo se configura em um mandado de otimização, tal qual designou Alexy.

Reconhecimento voluntário (perfilhação)

Trata-se de termo deveras rebuscado utilizado pra denominar um ato bastante


simples. O pai cujo filho nasceu que vai ao cartório efetuar o registro, ao fazê-
lo, está reconhecendo a paternidade voluntariamente, praticando a
perfilhação.

Presunção de paternidade

O nosso código civil consagra um sistema de presunção de paternidade,


elencando hipóteses onde a reunião de certos indícios são suficientes para
fazer presumir (presunção relativa, juris tantum) que um sujeito é pai de outro.

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância


do casamento os filhos:

I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois


de estabelecida a convivência conjugal;

II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à


dissolução da sociedade conjugal, por morte,
separação judicial, nulidade e anulação do
casamento;
Ana Maria Cunha – 2017.2 60

III - havidos por fecundação artificial homóloga 24 ,


mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de


embriões excedentários, decorrentes de
concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga,


desde que tenha prévia autorização do marido.

Como se vê, pela redação do inciso V, o diploma atual busca demolir a


noção de que a paternidade se confunde com a condição de genitor: pai
não é tão aquele que cede o material genético, mas sim quem tem um
vínculo afetivo com seu filho.

Não incidindo nenhuma presunção, o reconhecimento da paternidade pode


se dar como dita o art. 1.609:

Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora


do casamento é irrevogável e será feito:

I - no registro do nascimento;

II - por escritura pública ou escrito particular, a ser


arquivado em cartório;

III - por testamento, ainda que incidentalmente


manifestado;

IV - por manifestação direta e expressa perante o


juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o
objeto único e principal do ato que o contém.

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder


o nascimento do filho ou ser posterior ao seu
falecimento, se ele deixar descendentes.

Importante atentar para a regra de que os filhos maiores não podem ser
reconhecidos sem o seu consentimento, e os menores podem impugnar isto
Ana Maria Cunha – 2017.2 61

nos quatro anos que se seguirem à sua maioridade ou emancipação. É o que


dita o art. 1.614 do CC.

Além disso, com o advento do exame de DNA há a presunção juris tantum de


paternidade àquele que se recusa a realizar o exame. É o que dispõe a
Súmula 301 do STJ, bem como os artigos 231 e 232 do CC. No entanto, é
possível a recusa lícita, em caso, por exemplo, de pessoa que reside em local
muito distante e não poderia ter engravidado a mulher.

No que diz respeito à paternidade sócio afetiva, Técio explica que esta é a
paternidade de criação. Uma vez consolidado o estado de pai na prática,
mesmo advindo posteriormente uma verdade biológica diversa, a
jurisprudência do STJ considera que a paternidade sócio afetiva deve ser
preferida.

No entanto, na Rep. Geral 622 do STF, surgiu a discussão quanto a


possibilidade de multiparentalidade, consolidada no voto do Ministro Luiz Fux,
que divergiu um pouco dos entendimentos doutrinários mais recorrentes, afinal
submeteu a admissão de parentalidade plúrima ao interesse único e exclusivo
do menor, mesmo não havendo sido construída história de vida alguma com o
pai biológico.

Ademais, a ideia de parto anônimo é trazida por Técio. A mulher aqui poderia
optar por não ser mãe, não havendo qualquer registro do nascimento da
criança no momento do parto. No Brasil esta ideia foi proposta com o Projeto
de Lei 3320/2008.

Alimentos

Para demonstrar a importância dos alimentos, o professor conta que Maslow


organizou as necessidades humanas em uma pirâmide. Nela, as necessidades
fisiológicas são a base, englobando, consequentemente, os alimentos.

No entanto, Técio chama atenção para o fato de que alimentos não são só
comida, mas as diversas necessidades.
Ana Maria Cunha – 2017.2 62

Aqui há um binômio a ser observado: possibilidade x necessidade, conforme


dita o CC:

Art. 1.694

Ademais, Técio chama atenção para o fato de que os alimentos não podem
servir de estímulo para a ociosidade. Tal fundamentação fora utilizada
inclusive no RESP. 440.192/RJ. Através dessa decisão o STJ definiu que a pensão
para ex-cônjuge é temporária e excepcional. Neste mesmo sentido decidiu o
STJ no RESP 1025769/MG.

Ademais, a pensão alimentícia possui caráter sucessivo: incialmente se pede


aos ascendentes, posteriormente aos descendentes e por fim aos irmãos.

Não se pode renunciar previamente os alimentos, conforme o art. 1.697.

A possibilidade de pedir alimentos não prescreve.

A lei 11.804/2008 traz disposições a respeito dos alimentos gravídicos.

Aqui, para Técio, pode haver discussão sobre culpa.

No que diz respeito a prisão civil, esta funciona como forma coercitiva e
ocorre pelo prazo de 1 a 3 meses.

Revisão, suspensão e extinção

A revisão pode ocorrer a qualquer tempo, desde que haja uma alteração das
condições fáticas.

Em relação a extinção, esta nunca á automática, estando sujeita a decisão


judicial no caso de maioridade do filho, por exemplo.

OBS.: faltei a ultima aula.

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