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acervo.paulofreire.org
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lembra a relação senhor-escravo de Hegel. Depois veio Marx, Gramsci, Habermas. Seu
pensamento é humanista e dialético.
A afirmação da utopia como práxis docente e discente lembra o paradigma
humanista, cristão e socialista. O que há de original em Freire, com relação ao
marxismo ortodoxo é que ele afirma a subjetividade como condição da revolução, da
transformação social. Daí o papel da educação como conscientização. Ele afirma o
papel do sujeito na história e a história como possibilidade. A história é possibilidade.
Não através de um movimento mecanismo de luta de classes, pura e simplesmente, mas
pela ação consciente de sujeitos históricos organizados. Depreendo de Freire que ele
admitia que o socialismo é uma utopia que precisa ser renovada pela educação. Isso
havia escapado a Marx, a Lênin e aos marxistas em geral que pouca importância deram
à educação. Por isso Paulo Freire foi criticado pelos marxistas ortodoxos.
A relação entre educação e utopia está na base do pensamento freireano. Ela
pode ser resumida em quatro pontos:
1º - Para construir o futuro é preciso primeiro sonhá-lo, imaginá-lo. No seu
último livro, Pedagogia da autonomia, ele critica o neoliberalismo exatamente por
negar o sonho, por ser fatalista, por negar a possibilidade de mudança. Para ele o
neoliberalismo se apresenta, arrogantemente, como a plenitude dos tempos, não
reconhece que a história continua se fazendo. O neoliberalismo afirma o “fim da
história” porque não lhe interessa que a história mude. Interessa sim que ela continua
como está.
2º - A pedagogia é um guia na construção do sonho. Não basta sonhar. É preciso
saber como construir o sonho. Paulo Freire apresentou os seus “saberes necessários”
para realizar o sonho. Ofereceu em Pedagogia da autonomia, a mediação pedagógica
necessária para conquistá-lo. Todos os livros de Paulo Freire são livros de pedagogia,
isto é, são livros destinados à educação para construir o sonho.
3º - A pedagogia vê primeiro o futuro, um futuro melhor para todos, a utopia.
Depois é que ela se volta para o presente e para o passado.
4º - A pedagogia freireana é dialógico-dialética. Não mecânica. A dialética
continua válida desde que não exclua a subjetividade. Caso contrário ela se transforma
numa mecânica sem sentido que lembra a divina providência cristã. A dialética
mecanicista é idealista e idealizadora da realidade.
A contribuição de Paulo Freire ao pensamento educativo mundial não se limita
ao que ele diretamente escreveu ou realizou, mas ao que se está fazendo com o seu
legado. O que vem sendo feito pelo Instituto Paulo Freire e pelas Cátedras Paulo Freire,
entre outros grupos e instituições que estão dando continuidade e reinventando sua obra,
é também extremamente relevante hoje, e merece ser acompanhado. Por isso, desejo
destacar, pela sua originalidade, duas contribuições recentes ao pensamento pedagógico,
inspiradas em Freire e que já estão chamando a atenção de educadores em vários países,
muito além das fronteiras onde elas surgiram.
para o desenvolvimento. Mas, para isso, não basta modernizá-la. Será preciso
transformá-la profundamente.
A escola precisa ter projeto, precisa de dados, precisa fazer sua própria inovação,
planejar-se a médio e a longo prazos, fazer sua própria reestruturação curricular,
elaborar seus parâmetros curriculares, enfim, ser cidadã. As mudanças que vêm de
dentro das escolas são mais duradouras do que as impostas de fora. Da sua capacidade
de inovar, registrar, sistematizar a sua prática/experiência, dependerá o seu futuro.
Nesse contexto, o educador é um mediador do conhecimento, diante do aluno que é o
sujeito do sua própria formação. Ele precisa construir conhecimento a partir do que faz.
Para isso ele também precisa ser curioso, buscar sentido para o que faz e apontar novos
sentidos para o quefazer dos seus alunos.
Em geral temos a tendência de desvalorizar o que fazemos na escola e de buscar
receitas fora dela quando é ela mesma que deveria governar-se. É dever dela ser cidadã
e desenvolver na sociedade a capacidade de governar e controlar o desenvolvimento
econômico e o mercado. A cidadania precisa controlar o Estado e o Mercado. A escola
precisa dar o exemplo, ousar construir o futuro. Inovar é mais importante do que
reproduzir com qualidade o que existe. A matéria prima da escola é sua visão do futuro.