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Comitê Gestor Institucional de Formação Inicial

e Continuada de Profissionais da Educação Básica

Especialização em Gênero e Diversidade


na Escola
Módulo 4 - Relações Étnico-Raciais

São Paulo | 2015


Presidenta da República
Dilma Vana Rousseff

Vice-Presidente
Michel Miguel Elias Temer Lulia

Ministro da Educação
Renato Janine Ribeiro

Universidade Federal de São paulo (UNIFESP)


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Pró-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa: Maria Lucia Oliveira de Souza Formigoni
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Comitê Gestor da Política Nacional de Coordenação de Produção e Desenho


Formação Inicial e Continuada de Profissionais Instrucional
da Educação Básica - CONAFOR Felipe Vieira Pacheco
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Coordenação de Tecnologia da informação
Coordenação geral do Comitê Gestor Daniel Lico dos Anjos Afonso
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de Profissionais da Educação Básica - COMFOR
Secretário: Manuel Palacios da Cunha e Melo
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Vice-Coordenadora: Romilda Fernández Felisbino Secretaria de Educação Continuada,
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Módulo 4 - Relações Étnico-Raciais

SEMANA 1
INTRODUÇAO E ORIENTAÇOES
APÓS RECESSO
Módulo 4 - Relações Étnico-Raciais

Introdução e orientações após recesso


Primeiramente desejamos a tod@s um bom início de ano e de continuidade do curso Gênero
e Diversidade na Escola.

De maio a dezembro de 2015 pudemos estudar e discutir no nosso curso diferentes temáticas
relativas às questões da diversidade, gênero e sexualidade. O curso procurou desenvolver a
capacidade crítica diante das transformações políticas, econômicas e socioculturais que vi-
vemos atualmente e requerem o reconhecimento e o respeito à diversidade sociocultural do
povo brasileiro – o reconhecimento de que negros e negras, índios e índias, heterossexuais e
homossexuais, dentre outros grupos discriminados, devem ser respeitados/as em suas identi-
dades, diferenças e especificidades, porque tal respeito é um direito social inalienável.

Seguindo nosso calendário, iniciaremos em fevereiro o módulo IV – Relações Étnico-raciais.


O material elaborado pretende que os/as professores/ras possam refletir sobre a importância
das instituições escolares serem espaços de promoção da igualdade étnico-racial; Conhecer
as alterações Legais que preveem o tratamento educacional para a diversidade étnico-racial;
Alterar o currículo escolar para contemplar a igualdade étnico-racial; Analisar a prática peda-
gógica identificando rupturas com as normatividades de Branquitude; Pautar o trabalho com
a igualdade racial nos documentos oficiais: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africanas
e Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil e suas determinações em relação
a inclusão da história e cultura afro-brasileira nas experiências desenvolvidas com as crianças
e jovens.

Teremos também, a partir desse momento do curso, atividades destinadas diretamente para a
elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Conforme orientado anteriormente, o
TCC é obrigatório para a certificação do curso de especialização, deverá versar sobre os temas
abordados no curso e relacionados a escola. Neste sentido, a primeira atividade de 2016, será a
socialização no fórum, dos temas de pesquisa que vocês definiram durante o período de férias.

Atenciosamente,

Equipe de Coordenação do Curso.

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SEMANA 2
REFLETINDO SOBRE OS
DIREITOS DOS POVOS
INDÍGENAS
Autor: Marco Antônio de Oliveira
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Objetivos:

• Refletir sobre aspectos relacionados aos povos indígenas na promoção de práticas es-
colares de alteridade; Perceber as experiências e práticas próprias como forma de con-
quista de direitos e reconhecimento das diferentes formas de expressão cultural desses
povos, em relação ao processo de escolarização.

Refletindo sobre os direitos dos povos indígenas


Historicamente, vimos até aqui como a escola oscila entre ser promotora de direitos e ir ao
extremo oposto de estar a serviço do reforço de práticas marginalizantes ou excludentes. Suas
faces de acolhimento ou repulsa estão diretamente relacionadas ao contexto histórico e social
da qual faz parte e portanto, “vir a ser uma coisa ou outra, ou algo diferente, é questão dos
agentes envolvidos” (Flecha e Tortajada, 2000. p. 29). Assim como quem torna o livro didá-
tico, um bom livro é, fundamentalmente, o bom professor, as escolas e, como consequência,
suas práticas são determinadas em última instância mais pelos seus diferentes sujeitos e, ape-
nas em parte, pelas determinações e formulações dos agentes externos.

Entre os dois polos, da promoção de direitos e da marginalização/exclusão, as variantes são


muitas para o vir a ser da escola. No entanto, é importante compreender a influência dos agen-
tes externos, por exemplo, na definição das políticas públicas e o peso que exercem nas prá-
ticas escolares. Quando há má definição ou execução, essas políticas podem produzir efeitos
danosos, em particular derivados da falta de diálogo com os sujeitos diretamente envolvidos
no processo de escolarização.

Umas das maiores vítimas do processo de escolarização brasileiro têm sido os povos indíge-
nas. Discutiremos as formas de luta pelo direito à educação e a escola como promotora de
direitos por parte dessa população.

SAIBA MAIS
Para iniciarmos leia o relato do educador José Ribamar Bessa
Freire, que trata das escolas bilíngues interculturais em comunidades
indígenas, prevista pela Constituição de 1988. Link: http://www.
taquiprati.com.br/cronica.php?ident=1059

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Charge Fernando Assaz Atroz (http://assazatroz.blogspot.com/)
Fonte: http://www.taquiprati.com.br/cronica.php?ident=1059

O relato do professor José Ribamar, nos ajuda a inferir sobre o trato das sociedades indíge-
nas por parte das políticas públicas e das práticas escolares. De um lado temos as dificul-
dades impostas pelo estado brasileiro quanto ao direito à escola por parte dessa população.
Do outro, averiguam-se abordagens e práticas escolares que condenam a cultura e história
indígenas ao desaparecimento, ao desconsiderarem seus valores e impor a cultura contra-
tual de matriz europeia.

A pluralidade de formas como as culturas indígenas se apresentam impõem natural dificulda-


de de entendimento e trato no universo escolar. Porém, via de regra, a diversidade que carac-
teriza essa riqueza de elementos culturais é reduzida e estigmatizada por práticas generalizan-
tes e pré-conceitos tornados preconceitos, esvaziados do necessário esforço de compreensão.

A diversidade dos povos indígenas foi retratada pelo antropólogo e educador Darcy Ribeiro
como uma “miríade de povos” falantes de línguas que cresciam e se bipartiam, se diferen-
ciavam, por vezes se desconheciam. A dinâmica de organização de suas sociedades antes da
chegada dos europeus levou Darcy Ribeiro a inventariar que:

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

“Se a história, acaso, desse a esses povos tupi uns séculos mais de liberdade e au-
tonomia, é possível que alguns deles se sobrepusessem aos outros, criando chefa-
turas sobre territórios cada vez mais amplos e forçando os povos que neles viviam
a servi-los, os uniformizando culturalmente e desencadeando, assim, um processo
oposto ao de expansão por diferenciação” (RIBEIRO, 1995. p.30).

O desdobramento desse processo caminhou para uma história de dominação, desagregação,


não aceitação das populações indígenas como portadoras de direitos. Seus efeitos ainda são
sentidos nos dias atuais e continuam a produzir danos às populações indígenas. Dentre esses
danos, ainda podemos mencionar as tentativas de dominação ecológica pela apropriação dos
territórios indígenas e suas riquezas. A dominação econômica e social, advinda, entre outras,
das diferentes formas de marginalização e escravização. Também os processos que levam à
tentativa de desengajamento do modo de viver dessas mesmas populações.

Podemos mencionar o processo de escolarização e as práticas tecidas nesse processo refor-


çando estigmas e dificultando às populações indígenas o pleno exercício de seus direitos. Em
parte porque as práticas escolares ainda valem-se de referências constituídas a partir de visões
distorcidas, reducionistas ou parciais sobre as populações indígenas, presentes, por exemplo,
em materiais didáticos e paradidáticos. No caso desses materiais ainda é possível averiguar
definições sobre as populações indígenas pela ausência de certas instituições ou negação de
determinados traços culturais ocidentais, como indica a pesquisadora Adriane Costa da Silva:

“Grosso modo, as caracterizações [dos povos indígenas] assemelham-se muito e


são desenvolvidas a partir das seguintes categorias descritivas (não necessaria-
mente assim ordenadas): aspectos físicos, costumes, indústria, organização social
e política, guerra, família, religião, governo, leis, língua e cultura. Mesmo os
autores que retratam as sociedades indígenas de outra perspectiva, isto é, como
portadoras de cultura em muitos pontos equivalente à europeia, o fazem a partir
de tais categorias. ” (SILVA, 2000. p. 53)

Dentre as ideias do senso comum, amplamente divulgadas nas escolas é ade extinção da popu-
lação indígena, estudos têm demonstrado o aumento dessa população em território brasileiro.
Segundo Monteiro (1995) esse aumento se deve a alguns fatores como:

• Os esforços dessa mesma população em suas organizações políticas;

• A atuação de organizações de proteção e luta pelos direitos dos povos indígenas;

• A revisão dos estudos histórico-antropológicos estruturalistas.

Os direitos da população indígena têm sido solapados não apenas pela atuação de grupos sec-
tários, mas pela própria ação do estado. Em uma dessas ações foi criado em 1910, o Serviço de
Proteção aos Índios (SPI), instituição antecessora da Fundação Nacional do Índio (FUNAI),
que expressa os paradoxos das relações entre o estado nacional e os direitos da população in-

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dígena. Um dos motivos da criação do SPI foi a acusação de ser o estado brasileiro conivente
com o assassinato indiscriminado de indígenas, em particular pela ação de bugreiros na região
sul do país. Paradoxalmente a proposta do SPI era de criar condições materiais para que os
índios pudessem livremente progredir e ultrapassar o suposto estado animista em que viviam.
Essa seria a chave para integração da população indígena, seu aculturamento, assimilação e
consequente desaparecimento. Em 1967, o governo militar criou a FUNAI com funções mais
burocratizadas e mantendo a política de aculturamento do SPI.

Diante de tal retrospecto e, em alguns casos de permanência de ações de extermínios, acultu-


ramento e tentativas de tutela, averigua-se as grandes dificuldades enfrentadas pelos povos
indígenas na luta pela conquista de direitos e cidadania. Não por acaso, dados de meados dos
anos de 1990, apontavam que no cenário americano, o Brasil era o país que apresentava a
menor porcentagem de indígenas, embora as pesquisas apontassem para o crescimento dessa
população em território nacional (MELATTI, 2004).

As políticas educacionais e o papel da escola no trato com os povos indígenas, cabe ressaltar
a importância das práticas que visam tornar os próprios indígenas sujeitos ativos das lutas por
direitos. Uma dessas práticas de luta pelo direito à escola, que visa dar sentido próprio a atua-
ção dos próprios indígenas como sujeitos de direitos, é desenvolvida no bairro paulistano de
Parelheiros. A partir do engajamento da própria comunidade os indígenas têm se organizado
fazendo da escola o lugar de luta pela continuidade de sua cultura, tradições, história e língua.
Trata-se da escola Estadual Indígena Gwyra Pepó, na aldeia indígena Tenondeporã.

Além de conhecer um pouco o processo e experiências desenvolvidas em torno da escola e


de seus professores temos o depoimento da historiadora Circe Bittencourt (FEUSP e PUC-SP),
especialista em ensino de história e história da educação indígena. Importante notar que essas
práticas que partem das próprias comunidades indígenas, longe de serem isoladas, têm ganha-
do força no cenário educacional e na luta pelos direitos no Brasil. Temos como componentes
principais dessas práticas:

• O cuidado na formação de preparação de quadros entre os próprios indígenas (forma-


ção de professores nativos);

• A preparação de material didático próprio;

• A luta pela preservação e transmissão de valores, história, tradição e língua;

• O entendimento e a compreensão dos valores da sociedade nacional mais ampla como


forma de compreensão dos códigos que a regem, a fim de possibilitar uma luta mais
eficaz visando à preservação dos direitos desses povos, particularmente o direito à vida
e a sobrevivência de suas culturas.

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SAIBA MAIS
A temática indígena na escola: novos subsídios para professores de
1o. e 2o. graus. O texto discute um dos preconceitos mais arraigados
na sociedade brasileira sobre as populações indígenas: Estariam
essas populações com mais terras do que deveriam ter? A obra
está disponível em domínio público. Para a leitura acesse http://
www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_
action=&co_obra=26725
População indígena - acesse a página do ISA (Instituto
Socioambiental) na internet: http://www.socioambiental.org/pt-br.
Nela você poderá encontrar uma série de informações sobre os mais
variados grupos indígenas.
Veja também, da série “Índios no Brasil”, o vídeo “Índios no Brasil: uma
outra história” https://www.youtube.com/watch?v=WppQ3Lx6-Jo

Determinadas práticas podem levar ao ocultamento, desconsideração e mesmo negação das


tradições e valores. Nesse sentido as práticas escolares tornam-se deseducadoras. No caso das
culturas indígenas foram necessárias, e ainda são, diferentes estratégias por parte dessa mes-
ma população para fazerem valer os seus direitos.

Referências bibliográficas
FLECHA, Ramón e TORTAJADA, Iolanda. Desafios e saídas educativas na entrada do século.
In.: IMBERNÓN, Francisco (org.) A educação no século XXI. Os desafios do futuro imediato.
Porto Alegre, Arte Médicas Sul, 2000.

MELATTI, Julio Cézar. População Indígena. Brasília, Unb, 2004. (Série Antropológia, 345).
http://www.dan.unb.br/images/doc/Serie345empdf.pdf Acesso 22/junho/2015.

MONTEIRO, John Manuel. O desafio da história indígena n Brasil. In.: SILVA, Maria Aracy
de Pádua e GRUPIONI, Luis Donizete Benzi . A temática indígena na escola: novos subsídios
para professores de 1o. e 2o. graus. São Paulo, Global. Brasília, MEC, 1995. http://www.do-
miniopublico.gov.br/download/texto/me002103.pdf Acesso, 11/maio/2015.

RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo, Cia. das Le-
tras, 1995.

SILVA, Adriane Costa da. Versões didáticas da história indígena (1870 - 1950). Dissertação de
Mestrado. Faculdade de Educação, USP, 2000.

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SEMANA 3
DIREITO À EDUCAÇAO E A
CULTURA AFRO-BRASILEIRA
Autor: Prof. Marco Antônio de Oliveira
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Direito à Educação e a cultura afro-brasileira

Objetivos:

• Problematizar a temática da cultura afro-brasileira nas práticas educativas. Discutir so-


bre os processos de construção dos direitos humanos via formação de cultura de alteri-
dade em relação às manifestações da cultura afro-brasileira.

A lei federal nº 11.645, de 10 março de 2008 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-


2010/2008/lei/l11645.htm Acesso 16/ junho/ 2015) agregou à obrigatoriedade do ensino de
história da África e cultura afro-brasileira, a história e cultura dos povos indígenas.

Entre os propósitos dessa lei estão expressas as preocupações em relação às práticas escola-
res no trato dessas culturas. Também é possível mencionar o fato paradoxal do pouco que
os escolares brasileiros aprendem e o quanto tal desconhecimento dificulta a prática de uma
cultura de alteridade em nossa sociedade. Na construção dessa lei cabe ressaltar o papel dos
movimentos sociais na sua criação e no processo de sua execução.

Dentre os princípios herdados da lei anterior (lei no. 10.639/2003) temos:

1. A consciência política e histórica da diversidade;

2. O fortalecimento de identidades e de direitos e

3. As ações educativas de combate ao racismo e a discriminação.

Em linhas gerais, como reza a lei, tais princípios visam conduzir à igualdade básica da pessoa
humana como “sujeito de direitos”, a compreensão de que a sociedade é formada por pes-
soas que pertencem a grupos étnico-raciais distintos, que possuem cultura e história próprias,
igualmente valiosas e que em conjunto constroem, na nação brasileira, sua história.

Mais especificamente no tocante à população negra, a lei objetiva o conhecimento e à valo-


rização da história dos povos africanos e da cultura afro-brasileira na construção histórica e
cultural brasileira. Por fim a objetivação da superação da indiferença, injustiça e desqualifica-
ção com que os negros, os povos indígenas e também as classes populares às quais os negros,
no geral, pertencem, são comumente tratados. Nesse sentido a escola permanece com papel
fundamental na execução desses princípios.

Como toda lei que visa estabelecer direitos, não pode ser tomada como garantia da materiali-
zação e concretude desses direitos. Dentre os temas contemporâneos, as referencias culturais
de matriz africana tem colocado a nu o quanto a escola tem servido a práticas pouco amisto-
sas no trato das diferenças. A partir do meio social as diferentes questões relativas à cultura
afro-brasileira transbordam para dentro e de dentro para fora das escolas, não raro eivadas de
manifestações de intolerância.

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Frequentemente nos deparamos com casos de atitudes racistas, mas também de práticas ben-
fazejas no trato de temas da cultura afro-brasileira, como de sua referência matriz ao lado da
brasileira, a cultura africana em seus diferentes aspectos.

A professora de História da África da Universidade de São Paulo, Marina de Mello e Souza


acredita que ao se abordar conteúdos que trazem para sala de aula a história da África e do
Brasil africano estaríamos cumprindo nossos grandes objetivos como educadores, quais sejam:

“Levar a reflexão sobre a discriminação racial, valorizar a diversidade étnica,


gerar debate, estimular valores e comportamentos de respeito, solidariedade e
tolerância..., oportunidade de levantar a bandeira de combate ao racismo e às
discriminações que atingem em particular a população negra, afro-brasileira ou
afrodescendente.” (SOUZA, 2007. p.7)

O diretor de cinema Joel Zito Araújo deu valiosa contribuição às escolas e educadores a pen-
sarem suas práticas ao lançar, em 2003, o curta “Vista Minha Pele” (disponível em https://
www.youtube.com/watch?v=LWBodKwuHCM. Provocador, ao mesmo tempo em que é ca-
paz de mobilizar uma discussão franca sobre o problema do racismo na sociedade brasileira.
O curta ambienta a discussão sobre o racismo no espaço escolar, para dele fazer uma reflexão
da sociedade brasileira mais ampla, a partir de sugestiva inversão e desnaturalização do tema.

Para melhor compreensão do universo de composição da cultura afro-brasileira vejamos o que


nos diz Marina de Mello e Souza:

“Elementos africanos estão na base da maioria das nossas manifestações culturais


populares. Assim, quando falamos em mestiçagem do povo brasileiro, estamos
nos referindo basicamente às misturas entre os africanos e os povos que eles en-
contraram aqui, principalmente portugueses e indígenas. Foi essa a mestiçagem
que, apesar de atormentar as elites brasileiras que tentaram diluí-la com outras
misturas, se impôs como consequência da importação de cerca de 5 milhões de
africanos ao longo de mais de trezentos anos.” (SOUZA, 2007. p.128)

Sem desconsiderar a importância da mestiçagem no processo de formação cultural brasileira,


é igualmente importante, como sugere outro estudioso do tema, o antropólogo Kabengele Mu-
nanga, não tornar a mestiçagem um novo mito na formulação de uma pressuposta identidade
nacional, uma espécie de “Nova Roma” como entendia Darcy Ribeiro (MUNANGA, 1999).

Da mesma forma que o mito da democracia racial, a construção da mestiçagem enquanto


elemento articular de tal identidade nacional promove o esvaziamento das especificidades da
etnicidade negra. Em síntese poderíamos dizer que somos também um povo mestiço, ou mes-
mo, predominantemente mestiços sem que isso signifique a perda de especificidades próprias
a determinados grupos ou segmentos sociais ou uma nova forma de homogeneização forçada
das diferenças étnico-culturais. Em sentido mais contundente, de diluição de uma cultura em

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

outra na promoção de seu “amigável” desaparecimento como vislumbrava o pintor Modesto


Brocos, em seu quadro de 1895 “A Redenção de Cam.” - Quadro-tese que previa a decompo-
sição do sangue negro em diferentes cruzamentos raciais ao longo de gerações. Como conse-
quência, o branqueamento da população brasileira.

Fonte: Tela “A redenção de Can”, de 1895

SAIBA MAIS
• Sobre mestiçagem recomendamos a leitura do livro de Kabengele
Munanga “Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional
versus identidade negra”. Petrópolis, Vozes, 1999.
• Universo cultural e musical negro paulistano assista aos extras do
documentário “Mil trutas e mil tretas”: https://www.youtube.com/
watch?v=slwalSi03g8

O direito à educação e a escola no caso dos representantes da cultura afro-brasileira é marcada


pela negação. Mesmo levando-se em conta os tempos da escravidão, nota-se comparativamen-
te um processo mais lento de acesso dessa população à escola.

No caso dos EUA, por exemplo, há registros de escolarização da população negra escrava que
datam do século XVIII. É o caso, por exemplo, da experiência na Carolina do Norte (EUA). Se-
gundo Schama (2009), em 1731, alguns escravos da Carolina do Norte, sob tutela de membros
da Sociedade dos Amigos, sabiam ler e escrever após vivenciarem processo de escolarização.

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Tempos mais tarde, em 1821, quakers da Carolina do Norte abriram uma escola para negros
que deveria funcionar dois dias por semana, por três meses. Dos estudantes negros esperava-se
que frequentassem a escola até saberem ler, escrever, contar e até a regra de três, e as mulhe-
res até ler e escrever. Essas experiências seguiram ao longo do século XIX, em geral por grupos
de missionários quakers, presbiterianos, batistas, metodistas, que usavam como estratégia, a
persuasão dos senhores de escravos (SCHAMA, 2009).

Fonte: Chama, Simon. “O futuro da América”. São Paulo, Cia das Letras, 2009.

Enquanto isso, no Brasil, o estado imperial seguia a risca a política de vetar ou dificultar ao
máximo à população negra ao acesso à escola. O decreto nº 1.221 de 17 de fevereiro de 1854,
por exemplo, estabelecia que nas escolas públicas do país não seriam admitidos escravos.
Que a previsão para adultos negros, provavelmente libertos, dependia da disponibilidade de
professores. Já o decreto nº 7.031-A, de 6 de setembro de 1878 estabelecia que os negros só
podiam estudar no período noturno. Cabe lembrar que no caso brasileiro, a escola era algo
ainda restritivo às camadas menos favorecidas da população, de modo geral.

SAIBA MAIS
Indicação de Vídeos
1. “Vista minha pele”: https://www.youtube.com/
watch?v=LWBodKwuHCM. Acesso 16/junho/2015.
2. “Mil trutas e mil tretas”: https://www.youtube.com/
watch?v=slwalSi03g8 . Acesso 16/junho/2015.

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Referências bibliográficas
BRASIL, Lei Nº. 11.645 de 10 de março de 2008, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm. Acesso 16/ junho/ 2015.

CAPUTO, Stela Guedes. Educação nos terreiros e como a escola se relaciona com crianças de
candomblé. Rio de Janeiro, FAPERJ, Pallas, 2012.

MUNANGA, Kabengele. Mestiçagem como símbolo da identidade brasileira. In. Rediscutindo


a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus identidade negra. Petrópolis, Vozes, 1999.

SCHAMA, Simon. O futuro da América: uma história. São Paulo, Cia das Letras, 2009.

SEYFERTH, Giralda. O futuro era branco. In. Revista de História. http://www.revistadehisto-


ria.com.br/secao/perspectiva/o-futuro-era-branco. Acesso 02/agosto/2015.

SOUZA, Marina de Mello e. África e Brasil africano. 2ª. São Paulo, Ática, 2007.

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SEMANA 4
TEMÁTICA RELIGIOSA,
MATRIZ AFRICANA E O
UNIVERSO ESCOLAR
Autor: Prof. Marco Antônio de Oliveira
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Temática religiosa, matriz africana


e o universo escolar
Objetivos:

• Compreender as manifestações religiosas, problematizar a intolerância religiosa e o


preconceito racial.

Em relação às manifestações religiosas de matrizes africanas, o número de casos de ações


discriminatórias parece ter aumentado, na mesma proporção da expansão de antigos e novos
credos religiosos. No interior das escolas têm aflorado situações conflituosas advindas, por
vezes, da doutrinação e tentativa de conversão de estudantes. Casos igualmente comuns de
intolerância são direcionados aos que comungam determinados credos ou simplesmente não
professam qualquer tipo de credo religioso.

Em grande medida isso vem acontecendo devido ao aumento no número de educadores que
se portam como missionários a serviço desta ou daquela crença religiosa, fazendo de suas prá-
ticas verdadeiras pregações. Doutrinamento acaba por se sobrepor ao ensino. Ao se confundir
o espaço escolar público e leigo, com o espaço de culto, acaba-se interpondo a fé ao ensino e
a produção de conhecimento.

Abordagens crítico-reflexivas (cujas referências provém ou são geradas a partir do campo das
ciências) acabam sendo deixadas em segundo plano. Os efeitos dessas práticas tem sido os
mais nefastos para a educação, apenas ajudando a aumentar o número de casos de intolerân-
cia religiosa e assédio moral que se disseminam nas escolas.

NA PRÁTICA
No final de 2014, uma mãe denunciou a escola onde a filha de
oito anos estudava, por discriminação racial por parte de professora
evangélica. O caso ocorreu na cidade de Porto Velho, RO)
Casos como esse sempre foram comuns nas escolas, envolvendo
diferentes sujeitos. Mas, como se pode notar pelo noticiário, a
cultura afro-brasileira e as religiões de matrizes africanas têm sido
alvo preferencial desses ataques.
Link: http://www.rondoniaovivo.com/noticias/professora-
evangelica-e-denunciada-por-racismo-e-preconceito-religioso-
contra-crianca/121615
Acesso em 30/nov./2014.

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Em trabalho que reúne quase vinte anos de pesquisa, a jornalista e professora da UERJ, Stela
Guedes Caputo, relata as estratégias desenvolvidas por crianças praticantes do candomblé
para fugirem ao assédio e discriminação que sofriam na escola.

A escola representava uma forma de inserção, porém marginal às crianças que fizeram parte
da pesquisa que desenvolveu, pois “precisavam silenciar e omitir sua pertença religiosa para
se protegerem das situações de preconceito, discriminação e intolerância religiosas vividas
cotidianamente” (CAPUTO, 2012). Caputo desvela a ação enviesada de uma instituição, que
embora, em certa medida tenha introduzido o propalado respeito à diversidade em nossa gra-
mática pedagógica, deixava transparecer notoriamente práticas conservadoras, excludentes e
autoritárias (CAPUTO, 2012, p. 21).

Essas práticas de não reconhecimento e negação do direito do outro de ser respeitado em seus
valores, reforçam efeitos danosos. Efeitos que se traduzem em estigmas e geram sentimento
de culpa entre as suas próprias vítimas, condenadas por julgamentos explícitos ou práticas
implícitas cristalizadas que estão em hábitos e ritos do cotidiano escolar como deixa claro o
relato colhido por Stela Guedes Caputo:

“‘Eu quero ser crente. Na escola só gostam dos alunos crentes!´ Vi Luana Navarro
crescer no terreiro da avó. Não houve um dia sequer que não a tenha visto feliz
no candomblé, religião que sempre disse amar e desejar seguir. Quando Yánsán
anunciou que ela seria sucessora da avó, seu destino no culto cobriu-se de hon-
ras. No dia 27 de setembro de 2007, depois de vivenciar com alegria uma noite
inteira de festas, ela me disse que na escola começou a sentir vergonha de sua fé
e que desejava escolher outra religião para ser aceita e amada na escola, tanto
pelas professoras quanto pelos demais alunos e alunas” (CAPUTO, 2012, p. 197).

Entende-se que essas práticas escolares não estão isoladas, mas articuladas aos processos políti-
cos, sociais e culturais mais amplos. Na escola, tem se assistido muito desses processos ao invés
de tratados de forma crítica, reforçando valores de alteridade e tolerância, ganharem força ne-
gativa, ricocheteando com mais intensidade contra formas de respeito e convívio democrático.

Podemos notar a permanência de práticas que ajudam a perpetuar formas sociais discrimina-
tórias no interior das escolas. Como alvo direto temos entre outras, a religiosidade de matriz
africana em meio ao crescimento do conservadorismo e formas enviesadas de ver e pensar o
outro. A prática pedagógica por vezes se transforma em ação de doutrinamento ou profissão
de fé favorecendo determinadas crenças e descartando e/ou criminalizando outras.

SAIBA MAIS
Educação nos terreiros e como a escola se relaciona com crianças
do candomblé https://www.youtube.com/watch?v=Wp5ZtyfzhfI
Acesso 16/junho/2015.

19
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Referências bibliográficas
BRASIL, Lei No. 11.645 de 10 de março de 2008, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm. Acesso 16/ junho/ 2015.

CAPUTO, Stela Guedes. Educação nos terreiros e como a escola se relaciona com crianças
de candomblé. Rio de Janeiro, FAPERJ, Pallas, 2012.

20
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SEMANA 5
IGUALDADE ÉTNICO-RACIAL
NA ESCOLA
Autores: Lucimar Rosa Dias
Waldete Tristão Farias Oliveira
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Igualdade étnico-racial na escola


Objetivos:

• Compreender o significado de uma educação antirracista e não eurocêntrica nas es-


colas. Debater “como a sua escola está trabalhando a igualdade racial?” e reconhecer
se a sua escola tem uma cor.

“Escola sem cor”


Em uma sociedade em que se valoriza a mistura de “raças” é possível pensar em uma escola
sem cor? Essa é a nossa primeira indagação e nosso ponto de partida para discutirmos o con-
teúdo desta semana: igualdade étnico-racial também se aprende na escola.

NA PRÁTICA
Faça o seguinte exercício... Observe ao seu redor e constante o
que há. Pessoas? Objetos? Plantas? Animais? Qualquer um desses
elementos que você conseguir perceber terá muitas características
tais como: cor, tamanho, espessura, dimensões, etc.

Mesmo quando identificar um grupo de objetos iguais, por exemplo, cadeiras. É possível notar
que elas apresentam distinções entre si. Podem ter a mesma cor, mas não terão as mesmas
marcas. Podem ter o mesmo tamanho, mas não terão a mesma textura. Seja porque uma foi
mais usada que a outra, seja porque uma tem mais cor que a outra. Enfim, é possível apontar
especificidades em cada uma delas. Imagine se transportamos este exemplo para pessoas. As
singularidades de cada uma, provavelmente, serão tantas que é impossível contabilizá-las. Por
isso, é muito comum dizermos que cada pessoa é única. E isso não é força de expressão. É uma
realidade científica. Leia as informações do quadro a seguir.

22
SAIBA MAIS
Os conceitos de fenótipo e genótipo
Dois conceitos importantes para o desenvolvimento da genética, no começo do século XX, foram os
de fenótipo e genótipo, criados pelo pesquisador dinamarquês Wilhelm L. Johannsen (1857 – 1912).
1. Fenótipo
O termo “fenótipo” (do grego pheno, evidente, brilhante, e typos, característico) é empregado para
designar as características apresentadas por um indivíduo, sejam elas morfológicas, fisiológicas e
comportamentais. Também fazem parte do fenótipo características microscópicas e de natureza
bioquímica, que necessitam de testes especiais para a sua identificação. Entre as características
fenotípicas visíveis, podemos citar a cor de uma flor, a cor dos olhos de uma pessoa, a textura do
cabelo, a cor do pelo de um animal, etc. Já o tipo sanguíneo e a sequência de aminoácidos de uma
proteína são características fenotípicas revelada apenas mediante testes especiais. O fenótipo de um
indivíduo sofre transformações com o passar do tempo. Por exemplo, à medida que envelhecemos o
nosso corpo se modifica. Fatores ambientais também podem alterar o fenótipo: se ficarmos expostos
à luz do sol, nossa pele escurecerá, por exemplo.
2. Genótipo
O termo “genótipo” (do grego genos, originar, provir, e typos, característica) refere-se à constituição
genética do indivíduo, ou seja, aos genes que ele possui. Estamos nos referindo ao genótipo quando
dizemos, por exemplo, que uma planta de ervilha é homozigota dominante (VV) ou heterozigota
(Vv) em relação à cor da semente.

Fenótipo: genótipo e ambiente em interação


O fenótipo resulta da interação do genótipo com o ambiente. Consideremos, por exemplo, duas
pessoas que tenham os mesmos tipos de alelos para pigmentação da pele; se uma delas toma sol
com mais frequência que a outra, suas tonalidades de pele, fenótipo, são diferentes. Um exemplo
interessante de interação entre genótipo e ambiente na produção do fenótipo é a reação dos coelhos
da raça himalaia à temperatura. Em temperaturas baixas, os pelos crescem pretos e, em temperaturas
altas, crescem brancos. A pelagem normal desses coelhos é branca, menos nas extremidades do corpo
(focinho, orelha, rabo e patas), que, por perderem mais calor e apresentarem temperatura mais
baixa, desenvolvem pelagem preta.
Fonte: Blog Só Biologia http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Genetica/leismendel4.php Acesso
em Nov. 2014

Quando tratamos de pessoas algumas características se sobressaem entre as muitas existentes,


não é mesmo? Quais seriam? Certamente se pedirmos que enumere o que distingue uma pes-
soa da outra, a cor da pele, o tipo de cabelo, a altura, o sexo, etc, serão apontados. Todos são
aspectos físicos de identificação, ou seja, o fenótipo é um importante recurso que usamos para
distinguirmos alguém dentro de um grupo. Se na sociedade de modo geral é assim, também
nas instituições escolares encontraremos pessoas com diferentes características físicas e elas
serão utilizadas para distinguir as pessoas. Nada disso seria um problema se essa distinção não
produzisse hierarquias.

23
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Por isso, a afirmativa “escola sem cor”, problematiza uma perspectiva usualmente difundida
de que no ambiente escolar não há distinção entre as pessoas. Todos são tratados da mesma
forma independentemente das suas características físicas, culturais ou de gênero. No entanto,
pesquisas e várias denúncias feitas por diferentes grupos demonstraram que na escola dois
grupos de modo majoritários têm sido sistematicamente desfavorecidos, quais sejam: negros e
indígenas, ou seja, a “cor da escola é branca” na medida em que é essa a cor valorizada.

Chamamos isso de branquitude normativa porque não se trata sim-


plesmente da cor da pele e sim de privilégios destinados a determi- Branquitude
nados grupos em detrimento de outros1. “[...] branquitude é
entendida como uma
posição em que sujeitos
Um exemplo dessa normatização e privilégio são os currículos es-
que ocupam esta posição*
colares que silenciavam sobre a História e Cultura afro-brasileira, foram sistematicamente
Africana e Indígena, ou quando muito apresentavam essas popu- privilegiados no que diz
lações e suas histórias, apenas na perspectiva da subserviência e respeito ao acesso a recur-
não da resistência. sos materiais e simbólicos,
gerados inicialmente pelo
colonialismo e pelo impe-
Para questionar essa normatização no ambiente educacional em
rialismo, e que se mantêm
relação ao tratamento dado a diversidade étnico-racial, muitos e são preservados na
movimentos foram instaurados e desembocaram na constituição contemporaneidade.
de leis educacionais que visam alterar essa realidade.
(*) é unanime, nos estu-
dos sobre branquitude,
É importante saber que o início das discussões sobre a temática que sujeitos descendentes
das relações raciais na educação não aconteceu com o advento da de europeus sejam os que
alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 93994/96 mais ocupam este lugar.
pelas Leis nª 10.639/03 e 10. 645/08 na verdade, a lei é fruto da No entanto, dependendo
da configuração histórica,
ação dos movimentos sociais negros, bem como da produção e
econômica e social, outros
envolvimento de muitos intelectuais negros engajados na luta an- sujeitos podem ocupar
tirracismo há muitos anos. De fato, foram necessários quase meio este lugar” (SCHUCMAN,
século para que o estudo da história do continente africano e dos 2104, p.84).
africanos, da luta dos negros no Brasil, da cultura negra brasilei-
ra e do negro na formação da sociedade nacional brasileira se tornasse obrigatoriedade nos
currículos das escolas da educação básica. Assim como, a história e cultura das populações
indígenas.

Contudo, torná-los obrigatórios através da legislação não é condição suficiente para a sua
implementação ocorrer no cotidiano das escolas e das instituições de educação infantil. A
valorização da contribuição dos negros e negras para a construção da formação e história do
Brasil e o fim do “embranquecimento cultural” do sistema de ensino brasileiro, embora este-
jam garantidos na legislação brasileira ainda precisam estar mais efetivamente nas práticas
desenvolvidas em boa parte das instituições de ensino.

1 Há outras formas de diferenciação negativa no âmbito escolar, gênero por exemplo é uma delas, mas nos
deteremos, nessa unidade, nas questões relativas a raça e etnia.

24
SAIBA MAIS
Livro/ artigo
DIAS, Lucimar Rosa, SILVA JÚNIOR, Hédio, BENTO, Maria
Aparecida da Silva. Subsídios para o desenvolvimento de práticas
pedagógicas promotoras da igualdade racial na educação infantil.
Cadernos do Aplicação, v.25, n.1, 2012
SILVA, Paulo Vinicius Baptista da. O silêncio como estratégia
ideológica no discurso racista brasileiro. Currículo sem Fronteiras,
v.12, n.1, pp. 110-129, Jan/Abr 2012.
Filmografia
Formação em direitos humanos - Maria Lúcia da Silva - identidades,
branquitude e pertencimento. Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=eopvsk0uyo8> acesso em nov. 2014
A História do Racismo e do Escravismo (BBC)
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=0NQz2mbaAnc
Acesso em Nov. 2011.
A Rota do Escravo - A Alma da Resistência.
Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=HbreAbZhN4Q> Acesso em Nov. 2014.
Lápis cor de Pele. Oficina “Pintando o Set” – Escola do amanhã
Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=NmjicgJi-q4

Referências Bibliográficas
SCHUCMAN, Lia Vainer. Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude pau-
listana. Psicologia & Sociedade, 2014, 26(1), 83-94.

25
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SEMANA 6
RACISMO E A PROMOÇAO
DA IGUALDADE ÉTNICO-RACIAL
Autores: Lucimar Rosa Dias
Waldete Tristão Farias Oliveira
Racismo e a promoção da Igualdade étnico- racial
Objetivos:

• Compreender o que mudou com a Lei n° 10.639/2003. Reconhecer como está pre-
sente em sua escola a temática das relações raciais e como tais questões fazem parte
do currículo.

Racismo e a promoção da Igualdade étnico-racial


A despeito de termos uma legislação que atendeu às reivindicações e pressões históricas dos
movimentos negros e antirracista brasileiros, é patente a ausência de compromisso vigoroso
dos gestores com a sua execução e, principalmente, com sua eficácia e monitoramento, uma
vez que não é a totalidade das universidades a formarem professores(ras) qualificados(as)
para uma educação antirracista e não eurocêntrica.

O que se constata é a necessidade de uma mudança significativa nos programas e/ou currí-
culos das licenciaturas das universidades, uma vez que atualmente elas não cumprem inte-
gralmente sua função formativa em acordo com os objetivos da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (alterada em seus art. 3º, 26-A e 79-B). Em função disso, os cursos de formação
continuada são muito importantes para possibilitar aos professores(ras) que se apropriem das
discussões relativas à igualdade racial e comecem a mudança curricular, tornando a escola
um espaço que valorize a diversidade e promova a igualdade de fato. É necessário pensar em
estratégias para toda a educação básica, pois o tratamento das relações raciais também deve
estar presente na educação infantil.

Para esta revisão da escola é relevante definirmos o que é currículo, por isso, trazemos a se-
guir algumas possíveis interpretações desse termo:

1. Currículo é a organização do conhecimento social historicamente acumulado pela hu-


manidade traduzido nas práticas escolares.

2. Currículo não é apenas uma relação de conteúdos.

3. Currículo envolve questões de poder: professor/aluno, direção e coordenação pedagó-


gica/professores(ras), quanto às demais relações que permeiam o cotidiano da escola,
entre outras: as relações de classes (classe dominante/classe dominada) e questões
raciais, étnicas e de gênero, entre outras.

4. Currículo envolve escolhas, portanto, não é neutro, e sim, ideologicamente construído.

27
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

5. Currículo é um conjunto de práticas que buscam articular as experiências e os saberes


das crianças com os conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico,
ambiental, científico e tecnológico, de modo a promover o desenvolvimento integral de
crianças de 0 a 5 anos de idade (Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil)

IMPORTANTE
Uma campanha do UNICEF lançada em 2010 “Infância sem
racismo”, divulga a lista das dez maneiras de combater o racismo na
infância, para orientar atividades a serem realizadas na sua escola:
1. Eduque as crianças para o respeito à diferença. Ela está nos tipos
de brinquedos, nas línguas faladas, nos vários costumes entre os
amigos e pessoas de diferentes culturas, raças e etnias. As diferenças
enriquecem nosso conhecimento.
2. Textos, histórias, olhares, piadas e expressões podem ser
estigmatizantes com outras crianças, culturas e tradições. Indigne-se
e esteja alerta se isso acontecer – contextualize e sensibilize!
3. Não classifique o outro pela cor da pele; o essencial você ainda
não viu. Lembre-se: racismo é crime.
4. Se seu filho ou filha foi discriminado, abrace-o, apoie-o. Mostre-
lhe que a diferença entre as pessoas é legal e que cada um pode
usufruir de seus direitos igualmente. Toda criança tem o direito de
crescer sem ser discriminada.
5. Não deixe de denunciar. Em todos os casos de discriminação,
você deve buscar defesa no conselho tutelar, nas ouvidorias dos
serviços públicos, na OAB e nas delegacias de proteção à infância e
adolescência. A discriminação é uma violação de direitos.
6. Proporcione e estimule a convivência de crianças de diferentes
raças e etnias nas brincadeiras, nas salas de aula, em casa ou em
qualquer outro lugar.
7. Valorize e incentive o comportamento respeitoso e sem preconceito
em relação à diversidade étnico-racial.
8. Muitas empresas estão revendo sua política de seleção e de pessoal
com base na multiculturalidade e na igualdade racial. Procure saber
se o local onde você trabalha participa também dessa agenda. Se
não, fale disso com seus colegas e supervisores.
9. Órgãos públicos de saúde e de assistência social estão trabalhando
com rotinas de atendimento sem discriminação para famílias
indígenas e negras. Você pode cobrar essa postura dos serviços de
saúde e sociais da sua cidade. Valorize as iniciativas nesse sentido.
10. As escolas são grandes espaços de aprendizagem. Em muitas,
as crianças e os adolescentes estão aprendendo sobre a história e a
cultura dos povos indígenas e da população negra; e como enfrentar o
racismo. Ajude a escola de seus filhos a também adotar essa postura.
Link: http://www.unicef.org/brazil/pt/multimedia_19296.htm

28
SAIBA MAIS
Livro/ artigo:
DIAS, Lucimar Rosa, SILVA JÚNIOR, Hédio, BENTO, Maria
Aparecida da Silva. Subsídios para o desenvolvimento de práticas
pedagógicas promotoras da igualdade racial na educação infantil.
Cadernos do Aplicação, v.25, n.1, 2012
SILVA, Paulo Vinicius Baptista da. O silêncio como estratégia
ideológica no discurso racista brasileiro. Currículo sem Fronteiras,
v.12, n.1, pp. 110-129, Jan/Abr 2012.
Filmografia:
Formação em direitos humanos - Maria Lúcia da Silva - identidades,
branquitude e pertencimento. Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=eopvsk0uyo8> acesso em nov. 2014
A História do Racismo e do Escravismo (BBC)
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=0NQz2mbaAnc
Acesso em Nov. 2011.
A Rota do Escravo - A Alma da Resistência.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=HbreAbZhN4Q>
Acesso em Nov. 2014.
Lápis cor de Pele. Oficina “Pintando o Set” – Escola do amanhã
Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=NmjicgJi-q4

Referências Bibliográficas
BRASIL. Senado Federal. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: nº 9394/96.
Brasília : 1996.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes curriculares na-


cionais para a educação infantil / Secretaria de Educação Básica. –Brasília : MEC, SEB,
2010.

29
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SEMANA 7
ESTEREÓTIPOS
E PRECONCEITOS
ÉTNICO-RACIAIS NO
CURRÍCULO ESCOLAR
Autoras: Lucimar Rosa Dias
Waldete Tristão Farias Oliveira
Estereótipos e preconceitos étnico-raciais no
currículo escolar
Objetivos:

• Identificar estereótipos e preconceitos no campo das relações raciais e étnicas. Re-


fletir e analisar o currículo escolar fazendo uma reflexão sobre os modos como vem
sendo abordadado a temática étnico-racial.

A reflexão sobre o currículo escolar é impor-


Estereótipo: [...] No campo das relações raciais
tante porque é por meio dele que muitos pre- e étnicas, um estereótipo é frequentemente defi-
conceitos e estereótipos são mantidos e as nido com uma generalização excessiva a respeito
vezes reproduzidos nesses espaços. Por exem- do comportamento ou de outras características
plo, muitos educadores deixam de tratar do de membros de determinados grupos. Os este-
dia 13 de maio – que enfatiza a libertação dos reótipos étnicos e raciais podem ser positivos ou
negativos, embora sejam, com maior frequência
negros pela princesa Izabel - acreditando que
negativos. (p.194)
seja mais adequado trabalhar o dia 20 de no-
vembro – Dia Nacional da Consciência Negra. Preconceito: Este termo pode ser definido como
conjunto de crenças e valores aprendidos, que
No entanto o que se pode observar em várias
levam um indivíduo ou grupo a nutrir opiniões
situações é uma simples troca de datas e não de a favor ou contra os membros de determinados
perspectiva, pois as atividades desenvolvidas grupos, antes de uma efetiva experiência com
concentram-se em apresentar a população ne- estes. (p.438)
gra como submissa e não avança para além de Fonte: CASHMORE, Ellis. Dicionário de relações
uma visão exótica da cultura afro-brasileira e étnicas e raciais. São Paulo: Selo Negro Edições,
africana, apresentando apenas fragmentos seja 2000.
sobre a alimentação, as danças ou linguagens
de uma rica cultura. Uma experiência desse tipo pode contribuir para reforçar o preconceito
das crianças, jovens e adultos que frequentam o ambiente escolar em relação a essa cultura e
não ajudam a conhecer e compreender a complexidade dessa herança. Para Santomé (1998,
p.133)

“Um currículo democrático, que respeite a diversidade política, cultural e linguis-


tica, tem de oferecer a possibilidade de que tosos os alunos e alunas compreen-
dam a história, tradição e idiossincrasias da sua própria comunidade. Isto implica
necessariamente em conhecer também a dos demais povos do Estado, no marco
de uma filosofia de respeito, colaboração e solidariedade”.

Outro aspecto importante é considerar os casos de discriminação racial que ocorrem dentro da
escola. De modo geral os educadores tentam minimizá-los apenas coibindo as manifestações
com restrições dizendo “não faça isso, ele/ela é igual a você”. Esta intervenção não é suficiente
porque não problematiza as situações de discriminação. É necessário, por meio de ações pedagó-

31
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

gicas, colaborar na construção de novos conceitos acerca das diferenças fenotípicas e culturais,
trazer elementos da história e identidade de povos negros que o valoriza como ser humano.

A problematização de um evento de discriminação ou manifestação de preconceito na escola


é uma oportunidade de discutir que somos todos seres humanos e temos o direito a igualda-
de com relação ao respeito mas “ninguém é igual a ninguém” e que ser diferente é parte da
nossa condição de humanos e que por isso essa singularidade deve ser valorizada. Tratar com
indiferença essas situações é uma maneira de perpetuar preconceitos e ainda uma prática que
promove a valorização de uma história única que privilegia a população branca, superando a
invisibilidade da temática étnico-racial no currículo.

É importante fazer uma revisão de todo o currículo, inclusive da educação infantil, pois preci-
samos que o currículo vivo das instituições de ensino, daquele que está presente no cotidiano,
nos afazeres e nas vivências realizadas nesses espaços dê conta de sustentar uma educação
antirracista. Só assim vamos superar nas instituições o pseudo cumprimento da legislação que
exige das instituições o trabalho com a história e cultura afro-brasileira e africana, no entanto,
em geral inclui-se no texto escrito dos projetos e propostas pedagógicas, mas não se insere nas
práticas cotidianas ou quando muito “arranja-se” um dia específico durante o ano letivo no
qual fotografa-se alguma atividade eventual realizada e envia para as secretarias justificarem
os ministérios públicos de vários estados que começaram a exigir que se efetive a legislação.
Cumpre-se uma tarefa.

Santomé (1998) chama isso de “Currículo de Turistas”, ou seja, essa perspectiva nesse forma-
to vai ajudar a “[...] transformar as culturas das etnias minoritárias ou sem poder, o mundo
feminino, a classe trabalhadora, etc., em suplementos do currículo escolar; em temas comple-
mentares para que nossa consciência fique tranquila.” (p.147).

Já existem várias iniciativas que vão em sentido contrário a esse tipo de currículo apontado
por Santomé. Muitas instituições educacionais no Brasil, estão construindo rupturas nessa
lógica e incluem em suas práticas projetos, ações, atividades, programas que se sustentam na
concepção de que a igualdade étnico-racial se conquista a medida em que o trabalho com a
diversidade identifica os sujeitos negros e indígenas na sua mais plena humanidade, reconhe-
cendo ao longo da aprendizagem dos mais diferentes conhecimentos os valores civilizatórios
dessas culturas na construção dos bens materiais e simbólicos da humanidade e em particular
da sociedade brasileira. O Prêmio Educar para a Igualdade Racial (http://www.ceert.org.br/premio-
-educar/), organizado pelo CEERT - Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualda-
de, possui um banco de experiências exitosas em todo o Brasil.

O primeiro passo para mudarmos o curso do trabalho nas instituições e fazendo uma reflexão
honesta sobre os modos como vem sendo abordado, pois é só por meio do reconhecimento da
situação real que podemos fazê-la avançar.

32
SAIBA MAIS
1. COELHO. Wilma de Nazaré Baía. A questão racial na
escola: representações dos agentes da escola sobre os conteúdos
etnicoculturais. Belém, PA. Editora: UNAMA, 2010

2. FAZZI, Rita. O drama racial das crianças: socialização entre


pares e preconceito. Editora Autêntica, 2000.

3. SOUZA, Yvone Costa de. Atravessando a Linha Vermelha:


Programa “Nova Baixada” de Educação Infantil - discutindo a
diversidade étnico-racial e cultural na formação docente. 2009.
p.119. Dissertação. (Mestrado) - Universidade do Estado do Rio
de Janeiro, Faculdade de Educação da Baixada Fluminense. 2009.

4. “Os perigos de uma história única” Chimamanda Adichie.


Disponível em<https://www.youtube.com/watch?v=ZUtLR1ZWtEY>.
Acesso em 2 Mar. 2015

5. “Por uma infância sem racismo”. Disponível em < https://www.


youtube.com/watch?v=_aPYuKiKFMg>. Acesso em 2 Mar. 2015

Referencias Bibliográficas
CASHMORE, Ellis. Dicionário de relações étnicas e raciais. São Paulo: Selo Negro Edições,
2000.

SANTOMÉ, Jurjo Torres. Globalização e Interdisciplinariedade: o currículo integrado. Por-


to Alegre: ArtMed, 1998.

33
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SEMANA 8
DO COMBATE AO RACISMO
À PROMOÇAO DA
IGUALDADE ÉTNICO-RACIAL
Autoras: Lucimar Rosa Dias
Waldete Tristão Farias Oliveira
Do combate ao racismo à promoção da igualdade
étnico-racial
Objetivos:

• Conhecer alguns movimentos sociais históricos de combate ao racismo e suas rein-


vidicações.

A seguir detalharemos alguns dos movimentos históricos de combate ao racismo na intenção


de discutir ao final o significado da promoção da igualdade étnico-racial. Desde a década de
1950, ao perceberem a inferiorização dos negros, ou melhor, a produção e a reprodução da
discriminação racial contra os negros e seus descendentes no sistema de ensino brasileiro, os
movimentos sociais negros (bem como os intelectuais negros militantes) passaram a incluir
em suas agendas de reivindicações junto ao Estado Brasileiro, no que tange à educação, o es-
tudo da história do continente africano, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira
e o negro na formação da sociedade nacional brasileira. Parte desta reivindicação já constava
na declaração final do I Congresso do Negro Brasileiro, que foi promovido pelo Teatro Ex-
perimental do Negro (TEN), no Rio de Janeiro, entre 26 de agosto e 4 de setembro de 1950,
portanto, há mais de meio século. Nesse congresso recomendou-se, dentre outros pontos, “o
estímulo ao estudo das reminiscências africanas no país bem como dos meios de remoção das
dificuldades dos brasileiros de cor e a formação de Institutos de Pesquisas, públicos e particu-
lares, comesse objetivo” (NASCIMENTO, 1968: 293).

Segundo Carlos Hasenbalg (1987), o ressurgimento dos movimentos sociais negros em 1978
traz em sua agenda de reivindicações basicamente as seguintes áreas: racismo, cultura negra,
educação, trabalho, mulher negra e política internacional. Na educação, as reivindicações
eram, entre outras, as seguintes:

1. Contra a discriminação racial e a veiculação de ideias racistas nas escolas.

2. Por melhores condições de acesso ao ensino à comunidade negra.

3. Reformulação dos currículos escolares visando à valorização do papel do negro na His-


tória do Brasil e a introdução de matérias como História da África e línguas africanas.

4. Pela participação dos negros na elaboração dos currículos em todos os níveis e órgãos
escolares (HASENBALG, 1987).

Outro momento marcante nas reivindicações do movimento negro foi A Marcha Zumbi dos
Palmares Contra o Racismo, Pela Cidadania e a Vida (1996), culminou com a entrega do
Programa de Superação do Racismo e da Desigualdade Racial ao chefe de Estado brasileiro,
o então presidente Fernando Henrique Cardoso. O documento continha várias propostas an-
tirracistas. No que diz respeito à educação podemos citar, entre outras:

35
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

1. Implementação da Convenção Sobre Eliminação da Discriminação Racialno Ensino.

2. Monitoramento dos livros didáticos, manuais escolares e programas educativos contro-


lados pela União.

3. Desenvolvimento de programas permanentes de treinamento de professores (ras) e


educadores(ras) que os habilite a tratar adequadamente com a diversidade racial e
identificar as práticas discriminatórias presentes na escola e o impacto destas na eva-
são e repetência das crianças negras (EXECUTIVA, 1996).

Santos (2005) destaca alguns pontos desta histórica reivindicação dos movimentos sociais
negros que foram, alguns já em parte outros integralmente atendidos pelo governo brasileiro,
na segunda metade da década de 1990:

1. A revisão de livros didáticos ou mesmo a eliminação de vários livros didáticos em que


os negros apareciam de forma estereotipada, ou seja, eram representados como subser-
vientes, racialmente inferiores, entre outras características negativas.

2. Em vários estados e municípios brasileiros, reconheceram a necessidade de reformular


as normas estaduais e municipais que regulam o sistema de ensino. Alguns municípios
passaram a impedir a adoção de livros didáticos que disseminavam preconceito e dis-
criminação raciais.

Várias Leis surgiram no Brasil com o intuito de regulamentar práticas promotoras da igualda-
de racial. A seguir apresentamos algumas:

Legislação, alguns exemplos, antes da Lei 10639/03:


- As Leis Orgânicas dos Municípios de Salvador e Belo Horizonte, por exemplo, estabelecem
no artigo 183, § 6ª e no artigo 163, § 4ª, respectivamente, que “é vedada a adoção de livro
didático que dissemine qualquer forma de discriminação ou preconceito”

- Lei Orgânica do Município de Teresina, promulgada em 26 de julho de 1999, artigo 223,


inciso IX, que estabelece a “garantia de educação igualitária, com eliminação de estereótipos
sexuais, racistas e sociais os livros didáticos, em atividades curriculares e extracurriculares”
(Lei Orgânica do Município de Teresina apud SOARES, 2001).

- Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, promulgada em 5 de abril de 1990, no artigo


321, inciso VIII, a qual estabelece que o ensino será ministrado com base no princípio de uma
“educação igualitária, eliminando estereótipos sexistas, racistas e sociais das aulas, cursos,
livros didáticos ou de leitura complementar e manuais escolares”

- Inclusão, por meio de leis, de disciplinas sobre a História dos Negros no Brasil e a História
do Continente Africano nos ensinos fundamental e médio das redes estaduais e municipais de
ensino:

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• Constituição do Estado da Bahia, promulgada em 05 de outubro de 1989:

Art. 275. É dever do Estado preservar e garantir a integridade, a respeitabilidade e permanên-


cia dos valores da religião afro-brasileira e especialmente:

... IV- promover a adequação dos programas de ensino das disciplinas de geografia, história,
comunicação e expressão, estudos sociais e educação artística à realidade histórica afro-brasi-
leira, nos estabelecimentos estaduais de 1ª, 2ª e 3ª graus.

Art. 288. A rede estadual de ensino e os cursos de formação e aperfeiçoamento do servidor


público civil e militar incluirão em seus programas disciplina que valorize a participação do
negro na formação histórica da sociedade brasileira

Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003


A Lei altera a Lei no9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da
temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências.

A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 26-A,
79-A e 79-B:

“Art. 26-A.Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e par-


ticulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o
estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cul-
tura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a
contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à
História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministra-
dos no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação
Artística e de Literatura e História Brasileiras.
“Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacio-
nal da Consciência Negra’.”

PARA REFLETIR
Quais dessas reivindicações e Leis já foram trabalhados na sua
escola? Houve ações concretas para respeitar as determinações que
elas trazem? Procure identificar quais as práticas desenvolvidas na
sua escola que estão em consonância com os pressupostos das Leis
abordadas.

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Referências Bibliográficas
CONVENÇÃO Nacional do Negro Pela Constituinte. Brasília: mimeo, agosto de 1986. Exe-
cutiva Nacional da Marcha Zumbi. Por uma política nacional de combate ao racismo e à
desigualdade racial: Marcha Zumbi contra o racismo, pela cidadania e vida. Brasília: Cultura
Gráfica e Editora, 1996.

HASENBALG, Carlos A. Entre o mito e os fatos: racismo e relações raciais no

HASENBALG, Carlos A. O Negro nas Vésperas do Centenário. Estudos Afro-Asiáticos. (13):


79-86, 1987. Discriminação e Desigualdades Raciais no Brasil. Rio de Janeiro: Graal, 1979.

NASCIMENTO, Elisa Larkin (org.). A África na escola brasileira. Rio de Janeiro: Ceafro,
1993.

SILVA JUNIOR, Hédio. Anti-Racismo: Coletânea de Leis Brasileiras - Federais, Estaduais e


Muncipais. São Paulo: Editora Oliveira Mendes, 1998.

SANTOMÉ, Jurjo Torres. Globalização e Interdisciplinariedade: o currículo integrado. Por-


to Alegre: ArtMed, 1998.

SANTOS, Sales Augusto dos. A Lei Nº 10.639/03 como fruto da luta anti-racista do mo-
vimento negro. In. Secad/MEC. Educação anti-racista: caminhos abertos pela Lei Federal nº
10.639/03. p. 21-38.

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

SEMANA 9
DIRETRIZES CURRICULARES
PARA A EDUCAÇAO DAS
RELAÇOES ÉTNICO-RACIAIS
Autoras: Lucimar Rosa Dias
Waldete Tristão Farias Oliveira
Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Diretrizes Curriculares para a educação das


relações etnico-raciais
Objetivos:

• Compreender os marcos legais que orientam a promoção da igualdade racial na


educação.

A primeira ação do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao tomar posse, em 2003, foi a sanção
da Lei 10639/03 alterando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação para incluir no currículo
das escolas brasileiras públicas e privada a obrigatoriedade da presença da temática “História
e Cultura Afro-Brasileira e Africana”.

A assinatura ocorre graças às históricas pressões dos movimentos sociais e, consequentemen-


te, de suas articulações com políticos mais sensíveis à questão racial brasileira, em especial
do Movimento Negro, e sem dúvidas é uma conquista desses atores sociais. No parágrafo pri-
meiro, o texto da lei cita que o conteúdo programático incluirá a luta dos negros no Brasil, a
cultura negra e formação da sociedade nacional “resgatando a contribuição do povo negro nas
áreas social, econômica e política pertinente à História do Brasil”.

O detalhamento do conteúdo estabelecido na lei é encontrado no texto das Diretrizes Curri-


culares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História
e Cultura Afro-Brasileira e Africana, de outubro de 2004. Por meio dele as instituições de
ensino, gestores e professores (ras) são amparados por orientações, princípios e fundamentos
para o planejamento e execução do conteúdo afro-brasileiro e africano dentro de sala de aula.

Construído a partir do diálogo com a sociedade civil, militantes, pesquisadores da universida-


de dedicados à questão da temática racial, o conteúdo apresenta um panorama histórico sobre
a condição da criança negra na educação ao longo da história. O texto apresenta questões
significativas ao Movimento Negro como a necessidade de políticas de reparação, a urgente
desconstrução do mito da democracia racial, trata dos questionamentos comuns dos educado-
res como se deve ou não designar seus alunos como negros e desmistificar afirmações equivo-
cadas como a de que negros se discriminam entre sim e são racistas também.

O documento pondera que não se trata de mudar um foco etnocêntrico marcadamente de raiz
europeia por um africano, mas de ampliar os currículos escolares para a diversidade cultural,
racial, social e econômica presente na sociedade brasileira. Desse modo, as Diretrizes apre-
sentam e apontam todo o embasamento teórico e prático que auxiliarão os educadores na
concepção e execução de uma educação mais igualitária e diversa.

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IMPORTANTE
Vale destacar que, há quase uma década, exemplares das DCNs da
Educação das Relações Etnico-raciais (DCNERER) foram publicados
e distribuídos pelo MEC a todos os sistemas de ensino no território
nacional. Ainda hoje o texto está disponibilizado em domínio
público na página do MEC e inserido em outras publicações, como
no livro Orientações e Ações para Educação das Relações Etnico-
raciais, publicado pelo MEC/SECAD em 2006, também com larga
distribuição.

Nesse contexto de divulgação e estimulo a implementação da legislação, é produzido em 2009


o Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das
Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana sendo
um importante documento para referendar a instituição de políticas de promoção da igual-
dade na escola. Seu conteúdo detalha os direitos e obrigações dos estados e municípios da
federação frente à LDB alterada pela Lei 10.639?03, assim como amplifica temas tratados no
texto das Diretrizes. Após a alteração da LDB pela Lei 10.639/2003 o artigo 26-A foi nova-
mente alterado pela Lei 11.645/2008, que incluiu a obrigatoriedade do estudo da história dos
povos indígenas.

Outro aspecto relevante dentre os marcos legais foi a instituição da revisão das Diretrizes Cur-
riculares Nacionais para a Educação Infantil - DCNEI que em seu artigo 8, inciso IX, reforçou
a obrigatoriedade das propostas pedagógicas incluírem experiências que tratam da cultura
afro-brasileira e africana nessa etapa, pois era comum encontrar, alguns profissionais que con-
sideravam que a Educação Infantil, não estava submetida as alterações da LDB nos seus Art.
26-A e 79-B, com a revisão das DCNEI a inclusão da temática das relações étnico-raciais ficou
garantida na educação infantil.

Nas últimas duas décadas várias diretrizes oficiais de âmbito nacional foram estabelecidas
para apoiar a elaboração do Projeto Político Pedagógico das instituições de educacionais, para
contemplarem o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.

PARA REFLETIR
Quais desses documentos já foram trabalhados na sua escola? Houve
ações concretas para respeitar as determinações que eles trazem?
Procure identificar quais as práticas desenvolvidas na sua escola que
estão em consonância com os pressupostos das Diretrizes abordadas.

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Módulo 4 - Educação, Relações Étnico-Raciais e Cultura

Referências Bibliográficas
BRASIL. Lei nª 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Diário Oficial da União de 10 de janeiro de
2003.

BRASÍLIA. Lei nª 1.187, de 13 de setembro de 1996. Diário Oficial do Distrito Federal de


14 de setembro de 1996.

BRASIL. Educação anti-racista: caminhos abertos pela Lei Federal nº 10.639/03 / Secreta-
ria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. - Brasília: Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. 236 p. (Coleção Edu-
cação para todos) p.p. 21-37

CONVENÇÃO Nacional do Negro Pela Constituinte. Brasília: mimeo, agosto de 1986. Exe-
cutiva Nacional da Marcha Zumbi. Por uma política nacional de combate ao racismo e à
desigualdade racial: Marcha Zumbi contra o racismo, pela cidadania e vida. Brasília: Cultura
Gráfica e Editora, 1996.

SANTOMÉ, Jurjo Torres. Globalização e Interdisciplinaridade: o currículo integrado. Porto


Alegre: ArtMed, 1998.

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