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Aspectos da Regência

A arte da regência é uma ciência como qualquer outra, utilizada como um meio de
fazer arte, no entanto a esta arte são impostas implicações técnicas que devem ser
desvendadas e dominadas por todos os candidatos a regentes, não importa que tipo de
grupo se predispõe a dirigir. Não há diferença no dirigir um coro, orquestra ou banda.

A técnica do dirigir é igual para todos os tipos de grupo, o que muda são os
conhecimentos específicos de cada um. O que é a regência? Segundo o maestro Roberto
Duarte:

"dirigir é muito mais que abanar os braços. É acima de tudo saber se relacionar com as
pessoas. È lembrar que do outro lado de uma estante de música encontra-se um ser
humano, que tem alegrias, tristezas, preocupações e problemas como todos, inclusive o
maestro, e que ele deve ser tratado com respeito".

O ato de dirigir engloba diversos conhecimentos importantes, como o


conhecimento do relacionamento humano, o domínio dos conhecimentos gerais, o
domínio dos conhecimentos musicais em geral, o domínio dos conhecimentos específicos
da regência e por último o domínio da técnica do gesto. Nenhum destes conhecimentos
isolados desempenham sua função dentro do “ser um regente”, mas só a soma do
conjunto destes conhecimentos vai contribuir para que o regente se torne um bom
regente.

O maestro Duarte ainda sugere (os valores apresentados nas porcentagens são
fictícios, mas servem como sugestão para a reflexão que se pretende) que a formação da
regência é composta por uma pirâmide, formada da seguinte forma (o maior valor de
porcentagem corresponde à base da pirâmide e o menor valor da porcentagem
corresponde ao vertice superior da pirâmide):

Isto quer dizer que o gesto encontra-se no alto da pirâmide da arte da regência,
mas que para que ele aconteça é necessário que na base da pirâmide haja os demais
conhecimentos.

O ato de dirigir está mais intimamente ligado a como se relaciona o maestro com
seus comandados que com o gestual propriamente dito. O gesto tem sua importância na
comunicação. Observe esta palavra: Table. O que significa? Como se pronuncia? O
significado é um só: table = mesa, mas a pronúncia vai depender do idioma: francês ou
inglês. O que desejo mostrar é que cada um tem seus meios de expressão, mas o
significado é o mesmo. Há diversas maneiras de dizer a mesma coisa, dependendo
apenas como você a diz. No entanto a linguagem que você usa deve ser compreensível
para todos.

O gesto tem um padrão universal, que pode variar dependendo do contexto da


obra. O gesto não é um símbolo independente, ele está associado ao domínio e
conhecimento da partitura, adquirido pelo estudo diário e pela dedicação ao que faz.
Dirigir, não é apenas conduzir os elementos melódicos. Alguns maestros se tornam
maestros dos primeiros violinos, dos sopranos ou das palhetas solistas. Dirigir é muito
mais que dirigir uma linha melódica, com toda a certeza ela é importante, mas nem
sempre a regência deverá se ater a linha melódica, visto que algumas linhas melódicas
dependem de algum elemento rítmicos ou harmônico, e é aí que o maestro deverá
verificar a importância destes elementos: a melodia, ritmo ou harmonia.

Só para clarear um pouco mais, muitas vezes a linha melódica depende do bom
desempenho de uma passagem rítmica ou de uma passagem harmônica. O maestro se
preocupa tanto com o desempenho melódico e esquece de observar o que lhe dá
sustentação.

O olhar, as mãos, os braços, dedos, enfim o corpo todo deve participar na função
da regência e estes não devem ser desperdiçados.

A comunicação do maestro é feita por meios não verbais, e por este motivo os
sinais devem ser claros, objetivos e precisos. Todo o processo de reger exige do maestro
muito estudo e dedicação. O gesto deve ter objetivo claro e possuir uma estratégia bem
definida. Tudo o que se faz a mais é desperdício e desvia a atenção podendo induzir ao
erro. Todo o processo do gestual, não acontece por acaso. Alguns regentes se preocupam
com a marcação de compassos, mas o ato de reger envolve muito mais que marcar
compassos. Os músicos não desejam que um maestro marque compassos e sim que
dirija a obra.

O que desejo mostrar aqui é justamente o que está por trás de uma partitura
simples ou complexa. O gesto é portador de uma ideia, de uma frase, de um efeito, de
uma dinâmica, de uma passagem ou de um encadeamento harmônico. É pra isso que
serve o gestual. Quando marcamos apenas um compasso, estamos nos tornando um
metrônomo gigante, que na maioria das vezes não tem qualquer utilidade musical.

Convido a você a acompanhar o meu raciocínio numa abordagem sucinta de


alguns tópicos, aspectos importantes da regência válidos para todo e qualquer tipo de
grupo que necessite de um regente:

a) O poder que temos em nossas mãos ao nos colocarmos frente a um grupo, pode de
alguma forma contribuir ou prejudicar a eficiência do trabalho. Como desfrutar dos
benefícios da autoridade, sem agredir nossos músicos, e sem prejudicar o resultado de
nosso trabalho?

b) A memória e a importância que ela desempenha na direção musical?

c) A percepção do maestro frente aos fatos que se sucedem a cada instante dentro do
grupo que dirigimos.

d) O domínio da partitura, a importância de saber a partitura de memória e dominar todo o


conteúdo.

e) A batuta, como e porque usar.

f) As técnicas do gestual.

g) Como organizar o ensaio.

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I) Poder

A autoridade do maestro frente ao grupo de trabalho pode ser resumida em dois


aspectos:· autoridade pessoal· autoridade técnica.

Na regência, a autoridade é o substractum de sua arte, e é como se fosse parte


integrante da natureza das coisas, sendo lastreada pelo conhecimento, experiência e
competência do maestro. Na atividade humana, raras vezes o poder de um único
indivíduo se mostra tão evidente nas exigências de obediência e lealdade. O gestual do
maestro é dominador e sua imagem exprime suas intenções e expressões que devem ser
seguidas. Exercer a atividade da regência, pressupõe ter virtudes de liderança, poder de
comunicação, precisão técnica e senso de autoridade.

O regente moderno não tem mais a ascendência autoritária como Karajan, que era
chamado de Pontifex Maximus, que usava de mão de ferro para dirigir seus músicos.

Hoje o “maestro sugere, não impõe sua vontade”. Bernard Haitink.

O maestro Carlo Maria Giulini, falando sobre a autoridade do maestro:

“Não nos sentimos absolutos sobre o podium. Devemos pedir constantemente aos
músicos que executem e aos cantores que cantem. Se formos autoritários é para pedir”.

Ainda falando sobre o assunto, o maestro ainda comenta:

“Entre o maestro e os músicos não deve haver trocas desiguais e que a obediência deve
vir da convicção: eu prefiro convencer”

O maestro Pierre Monteaux fala sobre o assunto da seguinte forma:

“O maestro nunca deve faltar com o respeito aos seus músicos, que tem o direito a ter
direitos”.

Há um provérbio italiano que sintetiza essas afirmações:

“Tu recebes o que me destes”.

O autoritarismo absoluto não existe mais, mantendo-se o respeito, o diálogo, sem abdicar
de nosso senso de perfeição e musicalidade.

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II) Memória

A memória é a possibilidade do indivíduo de disponibilizar conhecimentos


adquiridos sem o auxílio de referências escritas.

Nesse sentido a memorização, segundo a psicologia, passa por três etapas


principais:

a. a aquisição do conhecimento

b. tratamento da informação

c. a lembrança, quando a informação é transferida para o momento do uso.


O maestro Von Bülow sempre dirigia de memória e exigia que seus músicos o
fizessem. Ele sempre afirmava que:

“mais vale a pena ter a partitura na cabeça, que ter a cabeça na partitura”.

O século XX tornou-se célebre que os grandes maestros dirijam seus concertos de


memória, com a ascensão do maestro virtuose.

Muitos regentes gostam de dirigir seus concertos totalmente de memória e outros,


como Mendelssohn-Bartholdy (1809-1847), usava a partitura apenas como apoio, não
necessitando utilizar o texto para toda a direção. No entanto, alguns regentes podem
possuir lapsos, déficits ou perturbações de memória que o impedem de dirigir sem a
partitura.

Muitos consideram que dirigir de memória é um ato de exibicionismo e outros


consideram que é um ato que demonstra o talento do maestro, no entanto não há uma
unanimidade sobre o assunto. Cabe ao maestro considerar os riscos e os caprichos de
dirigir com ou sem a partitura durante uma apresentação pública. De qualquer forma
conhecer a obra de memória, com ou sem a partitura na sua frente no ato do espetáculo,
é extremamente importante para o bom desempenho do maestro. Quando o uso da
partitura for necessário, deve ser utilizada somente como apoio para eventuais consultas
durante a execução.

O trabalho de memorização do regente é fruto de paciente e demorado estudo e


perseverança ao trabalho anterior ao primeiro ensaio, ou seja o domínio absoluto da
partitura. A prática contribuirá para o desenvolvimento artístico, contribuindo dessa forma
para o domínio do gesto, da expressão, da comunicação e da concentração, ou seja, o
regente sabendo a partitura de memória, com ou sem ela à sua frente, passará a dominar
os aspectos visuais, táteis, musculares analíticos, rítmicos e auditivos de sua música.

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III) Percepção

A percepção do músico de um conjunto instrumental ou vocal, que está sempre em


estado receptivo é bem complexa, determinada pela associação do senso de acuidade
visual, estabelecida por sinais gerados pela fisionomia, gestual e atitudes do maestro,
somados à percepção auditiva do coletivo, sem deixar de lado as informações da
partitura, que este transformará em linguagem musical, na elaboração do senso musical
coletivo.
Esse processo de percepção começa a partir do momento que se determina a
afinação do conjunto, quando o maestro ergue os braços, chamando a atenção para o
início do processo sonoro musical, seguido pelo principal sinal que se chama levare, do “i”
ou seja, a preparação para a emissão do primeiro som do coletivo. A partir deste
processo, o músico instrumentista ou cantor inicia a sua postura de receptáculo das
informações. Todos os sentidos estão voltados para o maestro, e respondem as suas
indicações, entrando num grau máximo de concentração.

O gesto deve conter todas as informações necessárias para a interpretação, entre


muitas estão as seguintes:

a. Fazer todo o efetivo musical tocar ou cantar junto.

b. Indicar o tempo.

c. Indicar as principais entradas.

d. Indicar os andamentos.

e. Indicar as dinâmicas.

f. Controle dos planos sonoros entre os naipes.

g. Indicar acelerandos e ritardandos.

h. Qualidade sonora do instrumento ou cantor.

i. Indicações e saída de fermatas.

j. Dirigir os fraseados.

k. Linhas melódicas.

l. Manter a fidelidade na interpretação.

m. Indicar articulações diversas, entre muitas outras indicações.

Ao mesmo tempo em que se pede a concentração dos músicos cantores ou


instrumentistas, se faz necessário à mesma concentração do maestro, pois não havendo,
pode-se ter a sensação de vazio no podium, sem saber o que fazer podendo provocar um
desastre artístico.

O maestro que não possui gestos claros, ou que possui gestos tencionados, que
não olha para seus conduzidos, marcando apenas os compassos, perde a sua função
como maestro, ou seja o músico não sente a necessidade de interagir com ele.
“A função de maestro não é só o marcar de compassos, ser maestro vai muito mais além,
é a arte de se comunicar com as mãos, ou ainda saber utilizar a comunicação não verbal,
saber inspirar seus músicos, controlar o som do seu grupo em cada detalhe, usar todos
os recursos intuitivos para dominar a técnica e saber dosar a mente e o coração em
partes iguais” são palavras de Arnold Schoenberg.

O maestro Lorin Maazel referindo-se ao desafio de ser um maestro, comenta:

“o desafio do maestro é o de dirigir um grupo, guiando-o, conduzindo-o, inspirando-o e


coordenando-o, ao mesmo tempo em que modela, mede e dosa, nisso consiste a
grandeza do maestro”.

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IV) Domínio da partitura

O estudo de uma partitura começa muito antes do primeiro ensaio. Os principais


objetivos que o regente deve observar quando do estudo de uma partitura é a
compreensão do caráter da obra, seu estilo, forma, técnica e meios de expressão. Cabe
ao maestro conhecer os conteúdos temáticos, harmônicos, contrapontísticos, rítmicos e
instrumentais da musica. Este estudo detalhado do contexto leva o regente a estabelecer
uma visão global da obra através do que chamamos de “audição interna”, isto é a
representação mental do som. É este processo que permite ao maestro ouvir sem o
auxílio de instrumentos aquilo que, por exemplo Beethoven, escrevia e sentia em si
próprio, sem jamais ter ouvido uma só nota delas externamente. O maestro deve ter a
capacidade de obter pleno domínio da partitura, sendo capaz de recriar a imagem sonora.
A audição interna deve ser tão perfeita quanto terá o próprio compositor ao escrevê-la.

Um outro ponto a ser estudado é o detalhamento do gestual, sinais de expressão,


como esses sinais devem ser realizados, como traduzir os significados da obra através da
mímica, com gestos simples, claros e eficientes. O gestual deve resultar da capacidade
de traduzir a representação mental da audição interna da obra. Quando isso não
acontece, o maestro passará a ser um “metrônomo gigante”, um marcador de compassos,
abdicando assim de sua função de maestro.

“A obra musical deverá amadurecer em nós até que se torne parte de nós mesmos”.
Karajan.

Uma obra, mesmo executada diversas vezes pelo maestro, esta deveria ser
estudada a cada exibição, pois somente dessa forma o processo de aperfeiçoamento e
maturidade musical da obra se concretiza na memória do maestro. Este estudo
permanente sempre revela algum novo elemento.

Segundo Georg Solti,

"o processo mobiliza a concentração, paciência e tenacidade, preferindo não utilizar


instrumento algum”.

Para ele o melhor método é sentar-se à mesa de trabalho e ler minuciosamente


cada linha e detalhe da partitura. Ele assegura que o processo de estudo e a assimilação
não acontece de um dia para o outro.

“O músico que diz não precisar desse processo é um mentiroso e não é um bom músico
com toda a certeza”. Georg Solti.

O primeiro passo é conhecer a estrutura, em seguida examinar detalhadamente


cada parte, decompondo as frases, iniciando pelas cordas, madeiras e por último metais e
percussão.

Finalizando o processo, observar os mínimos detalhes de informações e


expressões indicados pelo compositor. Havendo dificuldade em um trecho, o ideal é
sentar ao piano e tocar as passagens, objetivando a imagem sonora do trecho.

Um outro ponto importante é que o maestro absorva de tal forma o conteúdo sem
introduzir modificações próprias, ou seja, alguns dos maestros desejam tanto impor sua
personalidade que introduzem elementos não especificados pelo compositor, como
fermatas, acelerandos ou ritardandos, ou simplesmente alterar o movimento em
detrimento do caráter ou indicação explícita do compositor. O mais fiel intérprete, é sem
dúvida aquele que não dá a sua própria interpretação, e sim aquele que procura exprimir
a intenção desejada pelo autor.

Hoje em dia com a facilidade dos recursos tecnológicos, é comum ver maestros
copiarem o que os outros fazem, ou melhor, dependem de uma gravação para poder
realizar seu estudo musical, refletindo a imaturidade ou pior, a falta de conhecimentos
musicais necessários para ocupar a função de maestro.

O trabalho do regente é constituído pelas seguintes atividades básicas:

a. “A de decifrar e estudar a partitura no seu aspecto formal e estrutural, interiorizando-a


nos seus elementos: linhas melódicas, fraseados, andamentos, estilos, caráter,
personalidade do compositor, obtendo pleno domínio mental da partitura” Herman
Scherchen.

b. Examinar isoladamente cada detalhe e problemas expostos na partitura, não só em seu


caráter formal, mas também relacionando à instrumentação.

c. Compreender, identificar, observar as indicações do compositor e saber traduzir as


intenções do compositor em cada momento da obra musical.

d. Desvendar os múltiplos e variados significados expressos pelos signos da partitura,


sabendo direcionar a intenção do sentimento, expressão dramática, emocional, os climas
de tensão e repouso, a natureza, os contornos melódicos de cada naipe, ornamentos,
entre outros.

e. Definição da intensidade sonora da orquestra, equilíbrio dos naipes no plano sonoro do


contexto, dosagem dos timbres e matizes, dominar a melhor sonoridade de cada
instrumento da orquestra ou de cada voz de um coro.

f. “Saber moldar a obra, buscando um senso de equilíbrio e precisão rítmica, o elaborar


de fraseados, domínio da linguagem”. Leonard Bernstein.

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V) Batuta

Usar ou não usar? Eis a questão! Muitos maestros não concebem a direção de um
grupo instrumental ou vocal sem o auxílio de uma batuta. Para que serve a batuta?

A batuta foi utilizada pela primeira vez provavelmente por Louis Spohr (1784-1859),
por volta de 1820, substituindo o barulhento e antimusical bastão que era utilizado nos
séculos XVII e XVIII pela chamado marcador de compasso.

A batuta pode funcionar como um prolongamento da mão direita, um


prolongamento ótico, mão esta que tem como principal função a marcação dos
compassos, marcação rítmica, simboliza a ordem e clareza, podendo auxiliar a esquerda
em suas funções inerentes, já a mão esquerda, com suas sutilezas, exprime nuances,
fraseados, cores, indica as entradas dos instrumentos, suscita a expressão e indica
nuances, entre muitas ouras funções. O maestro Charles Munch, dizia que “a mão direita
representava a razão e a mão esquerda o coração” e dizia mais se referindo á mão
esquerda, “o coração não deve ter razões que a razão não possa conhecer”. Ainda o
maestro referindo-se ao uso da batuta, dizia ele:

“a batuta não é indispensável, mas serve para tornar mais visíveis e claros os
movimentos do maestro, devendo integrar-se a ele como se fosse um só corpo”.

Às vezes, as duas mãos podem variar de funções ou até mesmo uma mão servir
de espelho para outra, como numa passagem difícil ou que assim o exige a partitura. As
mãos devem ser movimentadas de maneiras independentes, obedecendo a uma
coerência e de forma integrada. A utilização de gestos simétricos nos dois braços, pode
provocar confusão visual para os músicos, criando duas referências.

Toscanini sempre comentava com seus músicos que não olhassem a mão direita e
sim a mão esquerda, porque ela realmente é a mais importante.Alguns maestros não
gostam de utilizar a batuta, um dos primeiros a dirigir uma orquestra sem a batuta foi o
maestro russo Vassily Safonoff (1852-1918). Outro maestro que se destacou também pela
abstinência do uso da batuta foi o maestro russo Leopold Stokowski (1882-1977).

Já o maestro italiano Arturo Toscanini (1867-1957) não dispensava a batuta, pois


achava que suas mãos não eram suficientemente expressivas. Vários maestros acham
que a batuta é um economizador de energia, outros acham que a batuta é uma
necessidade expressiva, dá maior precisão á marcação de compassos, enquanto para
outros a batuta inibe a expressão da mão, é um complicador, é um objeto que precisa
ficar na mão o tempo todo, e alguns também acham que não há necessidade de um
prolongamento ótico.

Alguns maestros utilizam a batuta para movimentos de precisão rítmica e


movimentos rápidos, já nos movimentos lentos preferem a utilização das mãos por ser
muito mais expressivo. Os regentes antigos achavam que a batuta era um símbolo de
poder e domínio.

A batuta deve ser utilizada como ferramenta, deixando que a mão esquerda seja
mais comunicativa, caso deseje não utilizar a batuta, utilize as mãos com critérios,
precisão, sinais objetivos, claros e sempre comunicativas.

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VI) Gestual

Para o público em geral, uma questão torna-se evidente: como o músico aprende
as informações resultantes do gesto? Como eles podem tocar suas partes, traduzindo a
leitura para o som do seu instrumento e ao mesmo tempo seguir as informações geradas
pelo gestual das duas mãos do maestro?

Não podemos deixar de mencionar a habilidade do instrumentista. Ele deve ler a


sua partitura, decodificar as informações contidas e associá-las ao mesmo tempo com as
informações advindas do gestual do maestro traduzindo-as, convertendo-as em som
musical, tocando corretamente seu instrumento. Não esquecendo que seu ângulo de
visão é bastante limitado em relação ao maestro.
“É o poder de ver sem ver”, assim diz o maestro inglês Colin Davis, ainda o poeta francês
Paul Claudel criou a expressão “o olho escuta”, para indicar que a visão e a audição se
fundem como receptores cinestésicos buscando a tradução do significado musical.

É importante que o gestual do maestro seja claro, sintético e objetivo.

O maestro deve dizer o máximo com o mínimo de palavras e fazer o máximo com o
mínimo de gestos.

O gesto deve ser sempre claro, evitando que o músico seja confundido pela
ambigüidade de gestos impróprios. O gestual é o único canal de comunicação entre os
músicos e o maestro. Por isso a capacidade de comunicação pelas mãos e olhos,
associada á expressão do rosto e corpo, constituem qualidades essenciais.

“Quando o maestro não faz nada no gesto, deixa que cada um toque o que deseja. Os
músicos estão abandonados à sua sorte... Os braços são o centro da vida emotiva do
homem como ser, o centro de nossa fala como maestro, é o centro eufônico. Por isso o
gesto deve sempre convergir para o centro, ao nos afastarmos desse centro, não
podemos fazer música... O que eu faço na mão pode afetar o resultado sonoro que
desejo obter .” Sergius Celebidache.

Meu professor em S. Paulo, o maestro Eleazar de Carvalho, sempre me dizia,


quando meus gestos não diziam nada, ou quando fazia gestos demais sem sentido ou
aleatórios:

"se não tem o que fazer com as mãos é preferível que elas estejam dentro do seu bolso",

numa alusão à utilização consciente e produtiva do gestual. Se vai usar um gesto,


pergunte-se, para que serve?.

O regente pinta esse quadro partindo das informações contidas na partitura pelo
compositor. Inegavelmente um só olhar pode servir de indicação de entrada para um
determinado instrumento, ou mesmo para encorajar um músico em uma passagem
importante ou difícil, aprovar ou reprovar. A indicação de entrada de um instrumento, deve
ser vista como um convite a tocar e não uma imposição. Isto se reflete na maneira como
nos expressamos a nossos músicos ou cantores.

O rosto também possui importância vital na comunicação e na expressão, por outro


lado, deve-se cuidar para que esses sinais não se tornem inúteis, ou mesmo cacuetes
que venham a desviar a atenção dos músicos.

É importante mencionar os cuidados que o maestro deve ter para que não
desperdice energia supérflua com gestos excessivos. Muitos regentes utilizam-se de
gestos extraordinários para expressar alguma coisa, desperdiçando suas energias, gestos
esses que poderiam ser re-estudados de forma mais concisa e que produziriam maior
efeito onde um simples olhar resolveria. A economia e a eficiência do gesto é fruto de um
longo trabalho de estudo da comunicação não verbal. O gesto deve ser dinâmico, flexível
e não estático, usar todas as possibilidades que o braço pode oferecer, da ponta dos
dedos ao ombro. Quanto maior a complicação da partitura torna-se pertinente a utilização
de gestos dominados, controlados, especialmente gestos precisos, o que ajuda a
compreensão a um primeiro olhar ou a um olhar periférico. O gesto deve ser adequado ao
contexto musical, como por exemplo, uma frase, ou um elemento rítmico. E ainda é
pertinente que o regente dirija seguindo a topografia e a geografia do grupo que dirige.

O excesso do gestual pode levar ao caminho do exibicionismo, alguns maestros


utilizam-se deste artifício para chamar a atenção do público sobre si, por vezes exibindo
proezas mirabolantes. Essa atitude do maestro faz despertar uma reação negativa nos
comandados, interferindo na qualidade interpretativa, anulando todo o potencial de
receptividade, podendo criar um clima de tensão e de insegurança. Segundo o maestro
Viegas Muniz Martins,

“a técnica regencial é tanto mais importante quanto mais realizada sem esforço, quando
então o que se vê é a música”.

O maestro Benjamin Zander[1] esboça alguns pensamentos sobre a regência da seguinte


forma:

“A música faz com que nos alinhemos a cada instante. Não é só tocar um instrumento, ou
fazer que uma orquestra toque junto. Não é só isso, os compositores ao escreverem suas
obras não se interessam apenas por fatores, mas também pela relação com a obra, como
ela virá ao mundo”.

Num curso de regência não se ensina a dirigir... apenas aprendemos juntos, é um


ato excitante. Quando se dirige o mais importante é ter uma idéia clara do conteúdo da
obra, se a mente tem essa clareza as mãos seguem o pensamento. Este é o processo.
Cada um tem seu próprio modo para dirigir. A base do gesto é igual para todos: dirigir 1,
2, 3 ou 4 é a única coisa comum a todos os dirigentes, a diferença está na maneira como
cada um executa a obra. Gente diferente, música diferente.

A música é um idioma, uma linguagem e é uma das forças mais poderosas das
emoções humanas. Nossa tarefa é dominar esse idioma em todos os detalhes, conhecer
seu vocabulário, como tudo funciona, as diferenças entre, por exemplo, uma frase, onde
temos compassos iguais e as formas da linguagem são bem diferentes. É isso que se
deve aprender, estudar e, sobretudo entender. Uns podem levar vinte minutos para
entender como uma frase foi criada e desenvolvida, e outros mais ou menos tempo para
isso. Não conseguiremos fazer grande música se não tivermos partido nossos corações.
É isso que devemos fazer, transcender a arte, elevar-nos do pessoal e do imediato para o
universal. È uma das expressões mais gratas.

A inibição der ser sublimada, temos de ser crianças quando precisamos e um


bailarino quando houver necessidade, de uma certa forma esquecer que as pessoas
estão te olhando, sublimar e representar o que a música sugere, explorar o afeto, a
contensão emocional da música, não somente compreender, mas demonstrar poder com
as mãos, com o corpo, os olhos, todo o ser deve se expressar. Convencer o músico do
seu desejo e intenção: sorte, triunfo, tristeza, melancolia, terror, o que for, e assim os
músicos derramam sobre os seus instrumentos o que você lhe passou, por sua vez,
passando essa informação ao público, que é o objetivo final, ou seja, como traduzir a
minha música em gestos.

Do que trata a música? Podemos responder a essa pergunta? Então qual o gesto?
Se não pode responder a essas indagações então só estarão marcando compasso ou
abanando os braços e não causará nenhuma sensação a ninguém nem aos músicos,
nem ao público, portanto a necessidade de verificar o que acontece na obra e sentir o
corpo. Portanto em momentos mais enérgicos os movimentos são mais perto do corpo,
se não veja o caso dos boxeadores, quando eles desejam maior concentração de força
eles fecham os gestos perto do tórax para poder desfechar golpes com maior poderio de
impacto.

O gestual pode ter grande força. Quando os instrumentos de arco, exemplo os


violinistas tocam perto da ponte, imprimem mais força e poderio sonoro, se fechando
sobre o instrumento. É exaustivo, e deverá ser assim. Nos movimentos enérgicos, quanto
mais claro o gesto, mais claro os músicos entenderão suas intenções.Tudo o que se fizer
com as mãos, braços, olhos e corpo, deve sugerir o que vai e está dizendo, pensar a
cada momento da música e tentar passar o máximo de informações com o máximo de
concentração”.

Ainda comentando sobre o gesto, o maestro Sergius Celibidache falava o seguinte


para seus alunos:
“O gesto grande o tempo todo, priva o maestro das possibilidades de expressão, o que o
impede de chegar onde deseja. Esse tipo de gesto contradiz com o caminho natural do
som para o gesto que se coloca entre o som e a música”.

A função primordial do maestro: da parte técnica, gostaria de enfatizar alguns pontos:

a. “Dirigir é estabelecer uma relação com o conjunto de seres humanos: quanto mais
simples, mais verdadeira e intensa essa relação, mais compreensível e eloqüente será a
mensagem, e os músicos, com bem estar e entusiasmo, poderão melhor reconstituir a
execução como uma verdadeira obra de arte”. Hermann Scherchen.

b. “Transmitir à orquestra o mesmo controle fantástico de uma revoada de pássaros, eles


não pensam se vão para a direita ou para a esquerda, apenas voam”. Karajan.

c. As entradas não começam com um golpe, mas nascem progressivamente do repouso.


As indicações devem ser prévias, antes que elas aconteçam. O início deve merecer uma
atenção especial do maestro, é um dos momentos mais importantes da regência.

d. O ato preparatório, é o grande segredo da boa regência. O modo preparatório


determina a qualidade do som com uma exatidão absoluta. A precisão e a clareza do
gestual são algumas das virtudes que deve acompanhar o maestro. Os gestos em
nenhum momento podem se contradizer. As informações devem ser precisas, não exigir
do músico um staccato, quando se demonstra um cantabile, um legato.

e. Não é possível provocar emoção, se não se está emocionado.

f. “Numa obra musical, tudo tem sua importância e cada detalhe tem sua razão de ser”.
Feliz Weingartner.

Cuidar dos detalhes sempre pensando que não existe nada inútil.

g. “O maestro deve saber provocar no músico o desejo de tocar”. Leonard Bernstein. O


que se deseja obter é que o músico seja sensibilizado a amar a música como você a ama,
se necessário utilizar-se de todos os meios disponíveis para mostrar suas intenções.

h. Fazer tocar juntos qualquer quantidade de músicos ou cantores, como se fosse um só


instrumento, cuidando das qualidades essenciais do domínio dos diversos planos
sonoros, da variedade de cores e refinada delicadeza dos tons. Cuidar das variações das
dinâmicas sejam elas de mudanças bruscas ou progressivas, das articulações em todas
as suas formas, destacar um fraseado, precisão rítmica, observando as variações de
andamentos ocasionais assim como todas as possibilidades de efeitos explícitos no texto
musical.
i. Segundo Leopold Mozart, "a técnica do rubato é uma das mais difíceis. É mais fácil
mostrar que falar sobre o assunto. No entanto o rubato pode ser logrado abreviando-se
ligeiramente um determinado tempo para alongar um outro. Dessa forma atinge-se uma
certa relação de andamento que não é a forma maquinal do compasso. Essa técnica
exige muito estudo, pois é necessário muito tempo de dedicação para efetuar um rubato
inteligente, é uma técnica perigosa que deverá estar a serviço do estilo".

j. “Quando o maestro não faz nada no gesto, deixa que cada um toque o que deseja. Os
músicos ficam abandonados à sua sorte”. Sergius Celebidache.

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VII) Ensaios

São seções de trabalho que precedem a uma apresentação, neles, o maestro e os


instrumentistas definem o espírito da execução, da interpretação da obra musical.

É no ensaio que a partitura é destrinchada, analisada nos seus mínimos detalhes e


cabe ao maestro orientar os músicos a fim de atingir o máximo de perfeição na
apresentação. Cabe ao maestro dividir a partitura em blocos para poder trabalhar por
partes. Em geral as partituras estão marcadas com número ou letras de ensaio ou
números de compasso, facilitando assim a localização por todas as partes do trecho a ser
estudado. Num ensaio, entre muitas coisas, deve ser observado seguinte:

a. Afinação: afinação dos naipes e a afinação geral da orquestra, realizada pelo spalla.

b. Precisão Rítmica

c. Estudo: estudar a obra por sessões. Os trechos de maior dificuldade técnica em cada
naipe, devem ser passados e repassados, não desistindo até que a passagem esteja de
acordo com as intenções do maestro. Observar as estruturas, estilos e os diversos planos
sonoros, levando em conta as características sonoras peculiares de cada instrumento e
da obra. Nos instrumentos de cordas, cada um deles possui características próprias. Por
exemplo, os contrabaixos são instrumentos mais lentos e as cordas graves não possuem
grande brilhantismo, comparando com as cordas mais agudas. Com relação à precisão de
ataques, cada instrumento tem características específicas que pode ser influenciada pela
respiração. O gestual influencia no tipo de ataque.

d. Arcadas e articulações: em parceria com os chefes de naipe e o spalla definir as


arcadas e as articulações não indicadas na partitura. Estabelecer acentos, articulações,
tensões e dinâmicas, mudanças de andamentos.
e. Obter o melhor equilíbrio e melhor qualidade timbrística de cada instrumento ou naipe.

f. Determinar a quantidade ideal de instrumentistas, observando as características da


obra, estilos, compositor e período inerentes à obra.

g. Observar o fluxo do tecido musical, estabelecendo o melhor fraseado; estabelecer a


escala de intensidades e expressões para manter uma coerência no equilíbrio da
execução musical; cuidar para que a interpretação não altere o caráter da obra, entre
outras; controlar as mudanças e variações de andamento, como rallentandos e
accelerandos.

h. O maestro deve observar para que suas orientações sejam anotadas na partitura, a
lápis. Por quê lápis? Porque cada regente tem suas características e por isso se a
orquestra toca uma mesma obra com vários regentes deverá anotar essas mudanças,
podendo apagar e reescrever o que precisar. Usando anotações a tinta ou outro meio
definitivo de indicação pode prejudicar a leitura da obra. Essas anotações podem ser as
arcadas, dinâmicas, expressões, alterações na intensidade, mudanças de tempo, entre
outras.

i. Observar as características de cada instrumentos. Neste trabalho artesanal, o maestro


deve cuidar de forma especial, dos instrumentos de cordas, porque se as cordas forem
bem o restante da orquestra irá bem. Não há necessidade de saber tocar os instrumentos,
mas conhecer suas características e técnicas peculiares. Há instrumentos que tem
características mais ligeiras que outros, como por exemplo, as cordas são mais ágeis que
os instrumentos de sopro e percussão, por isso os tempi devem ser cuidadosamente
escolhidos observando essas características. Por exemplo, as flautas são muito mais
ágeis que as trompas e os violinos mais ágeis que os contrabaixos, e assim por diante.
Quando se fala que o maestro deve falar, isso não significa que o maestro deve
utilizar o tempo todo a linguagem verbal e sim, de forma especial a linguagem gestual da
regência. O que o maestro faz é a lei? Não, se acha que não funciona, deve mudar
sem constrangimento, e mudar quantas vezes for preciso. É óbvio que o maestro ao
chegar em frente à orquestra deve saber exatamente o que deseja. Não deve deixar
passar nada, nem mesmo uma entrada imprecisa, um erro, ou uma negligência, devendo
parar e recomeçar as passagens que tiveram erros e recomeçar quantas vezes forem
necessárias, mesmo que os músicos não demonstrem agrado por essas repetições. Para
que isso possa acontecer com disciplina e qualidade, deve haver o máximo de
concentração por marte do maestro e por parte dos músicos.

A preparação dos músicos para uma apresentação começa com os ensaios. São
neles que o maestro pode experimentar mudanças, sonoridades, dinâmica, indicações,
gestual, correção de problemas técnicos e disposição física. È no ensaio que as
mudanças devem acontecer e nunca durante a apresentação, que é o momento sublime.
O resultado de um bom concerto é consequência de bons ensaios. O respeito deve
ser um ponto importante no relacionamento entre maestro e músicos. Não se pode
esquecer que o músico é um ser humano, e por isso deve ser respeitado como tal. A troca
de experiências também é fundamental, especialmente nos dias de hoje onde um bom
número possui um grande cabedal de conhecimentos que pode vir a enriquecer a visão
da obra.

O maestro funciona na orquestra como um músico, regente, organizador,


psicólogo, pedagogo, entre outras funções, porque numa só vontade ele funde a vontade
de todos os integrantes da orquestra.

O maestro deve ser flexível ás opiniões dos músicos, sempre atento a novas
possibilidades, anotando-as na própria partitura. O maestro Stokowsky, é um dos
maestros que utilizava dessa técnica. Ele oferecia opções mas também aceitava
sugestões, e quando esta funcionava, anotava esta opção em sua partitura para poder
utilizá-la numa outra oportunidade.

Fonte:http://tecnicasderegencia.blogspot.com.br/2007/05/aspectos-da-regncia-arte-da-regncia-uma.html

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