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1 INTRODUÇÃO
Na busca por essa competitividade, as indústrias têm mudado seu perfil produtivo de modo a
torná-lo ágil suficiente para suprir o mercado com produtos de boa qualidade, baixos preços e
entregues com o menor tempo possível. Dentro desse panorama muitas indústrias vêem
implementando técnicas japonesas de produção, especialmente o Just-in-time. Dentro da filosofia
Just-in-time uma das técnicas que mais tem sido implementada na indústrias brasileiras é o sistema
Kanban.
O sistema Kanban, caracterizado por puxar a produção, foi especialmente projetado para ser
utilizado em conjunto com os princípios da filosofia Just-in-time, porém o que se tem observado é
sua implantação de forma isolada, sem a preocupação de, por exemplo, mudanças no lay-out
produtivo ou o incentivo pelo envolvimento da mão de obra. O presente artigo tem o objetivo de
comparar os princípios do sistema KANBAN com casos de indústrias que o implantaram. A
necessidade de tal pesquisa surgiu ao observar que praticamente todas as indústrias pesquisadas
tiveram que “adaptar” o KANBAN à sua realidade produtiva e, partindo desse ponto, fica a dúvida
em saber se os princípios básicos que caracterizam o sistema KANBAN foram realmente
implementados.
2 O SISTEMA KANBAN
O sistema KANBAN, palavra japonesa que significa cartão ou sinal, foi desenvolvido na década
de 60 pela empresa japonesa Toyota Motors Cia, com o objetivo de facilitar as atividades de
programação e controle da produção. O sistema KANBAN é um elemento da filosofia Just-in-time
caracterizado por “puxar” a produção, enquanto que no sistema tradicional a produção é
“empurrada”.
Na produção puxada nada se produz até que o cliente (interno ou externo) solicite determinado
item ou produto. Dessa forma, somente serão emitidas ordens de fabricação para o último estágio
do processo produtivo e este, através da utilização dos Kanbans, vai consumindo o estoque em
processo que, por sua vez, aciona diretamente o processo produtivo a produzir os itens consumidos.
O acionamento da produção e a movimentação de materiais entre os setores funcionam através de
sinalizações. As sinalizações são em sua maioria realizadas pelo uso de cartões KANBAN e painéis
Porta-Kanban.
O sistema KANBAN pode ser adaptado para operar em diferentes situações, porém existem
algumas condições básicas que devem ser seguidas no sentido de se obter o máximo proveito desse
sistema. Essas condições são conhecidas como regras de funcionamento do sistema KANBAN:
Regra 1: O processo subseqüente (cliente) deve retirar no processo precedente
(fornecedor) os itens de sua necessidade somente nas quantidades e no tempo
necessário;
Regra 2 : O processo precedente (fornecedor) deve produzir seus itens somente nas
quantidades requisitadas pelo processo subseqüente (cliente);
Regra 3 : Produtos com defeito não devem ser liberados para o cliente;
Regra 4 : O número de KANBAN do sistema deve ser minimizado;
Regra 5 : O sistema KANBAN deve adaptar-se a pequenas flutuações na demanda.
3 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA
As expressões “adaptar à realidade” e “adaptar às restrições” têm sido uma constante quando se
trata da implantação das técnicas japonesas de produção em empresas brasileiras. Porém, durante
essas adaptações muitos dos conceitos básicos são esquecidos e os resultados nem sempre são os
esperados. Com o propósito de conhecer o processo de implantação do KANBAN em algumas
indústrias brasileiras, e como se processaram as “adaptações”, foram pesquisados 5 (cinco) artigos
que tratam do assunto. O resumo de cada um dos artigos encontra-se abaixo.
O estudo relatado nesse artigo foi realizado em uma indústria metalúrgica situada no estado
do Rio Grande do Sul. A referida empresa apresentava problemas para atender aos pedidos dos
clientes, o que resultava em atrasos na entrega e, consequentemente, em seu faturamento. No intuito
de resolver o problema, a empresa resolveu implantar o KANBAN, pois, como tal sistema puxa a
produção a partir do mercado, somente seriam fabricados os produtos que o mercado estaria
precisando e, com isso, os atrasos seriam eliminados. Para atingir esse objetivo, se fazia necessário
que a empresa aumentasse a variedade de bens em produção e com isso passasse a trabalhar com
lotes menores. Para verificar qual o impacto da modificação sobre a produção, foram realizadas
simulações com lotes menores e uma maior variedade de produtos. Como resultado foi verificado
que o sistema produtivo em questão encontra-se muito distante de um modelo flexível e just-in-
time, pois, o aumento da variedade de produtos em produção foi acompanhado de um aumento no
número de setups e como estes eram muito demorados, tornava-se praticamente impossível
administrar a produção de forma a se conseguir atender à demanda. O autor conclui que, apesar da
indiscutível eficácia do sistema KANBAN, não basta que este seja implantado para trazer bons
resultados, é necessário que toda a empresa sofra um processo de mudanças de forma a tornar-se
apta a produzir de forma sincronizada e com qualidade assegurada. O autor sugere que a simples
adoção de um sistema KANBAN sem a realização de grandes mudanças em termos de flexibilidade
da produção pode ocasionar uma produtividade extremamente baixa em determinados setores da
empresa, dado o grande número de setups necessários e os altos tempos de preparação, portanto o
caminho a ser percorrido para a implantação do sistema KANBAN e sua plena utilização passa por
um processo que requer uma série de modificações que quebram com o atual paradigma da
produção.
A empresa Schrader, fabricante de válvulas para pneus situada em São Paulo, identificou que a
produção apresentava problemas do tipo: grande capital de giro investido em estoques; freqüentes
atrasos nas entregas aos clientes; altos índices de refugos e demora na execução de serviços de
manutenção. Como agravante, foi verificado que os problemas eram encobertos pela cômoda
situação de se trabalhar com altos níveis de estoque. Ciente da situação, a diretoria resolveu
implantar um novo sistema de produção que deveria diminuir o nível dos inventários e facilitar o
fluxo das informações necessárias ao controle do processo produtivo. Após análise de vários
sistemas optou-se pelo KANBAN. Para garantir o sucesso da implantação foram realizados
treinamentos para os funcionários com objetivo de divulgar as “regras básicas” de funcionamento
do novo sistema e tirar dúvidas/preconceitos que pudessem atrapalhar sua execução. Foram criadas
13 regras básicas e as mais importantes seguem abaixo:
Todas as peças estocadas nos supermercados devem estar em contentores;
O cartão deve ficar no painel ou junto com as peças no contentor;
Assim que o operador começar a produzir uma nova peça, deve virar o cartão respectivo
no painel e quando completar o contentor, retirar o cartão e colocá-lo junto com as
peças;
Só devem ser montadas ou usinadas as quantidades de peças eu constam no cartão;
Quando dois itens tiverem o mesmo número de cartões no painel, deve ser produzido
aquele que gastar menos tempo de preparação;
Apenas o PCP tem o poder de abrir novos cartões.
No dia determinado para a implantação do novo modelo, foram espalhadas faixas e cartazes
com frases de incentivo ao projeto; tanto as equipes responsáveis pela implantação, como equipes
de manutenção estiveram de “plantão” durante os três turnos de funcionamento do setor produtivo:
o objetivo era fazer com que quando os diversos problemas, que até então estavam encobertos,
viessem à tona, estes fossem solucionados rapidamente sem atrapalhar o processo de implantação
do KANBAN. Durante a primeira semana foram realizadas pequenos ajustes no sistema. Os
resultado obtidos no primeiro mês de utilização do KANBAN, conhecido na Schrader por P.A.C.
(Produção Auto-controlada), foram: redução de 35% no inventário da empresa; maior facilidade
para o trabalho do PCP; solução definitiva para vários problemas que ocorriam anteriormente e que
eram encobertos pelos estoques.
3.3 Estudo da implementação dos sistema Kanban em uma empresa brasileira de autopeças:
dificuldades e caminhos (Colin, 1995)
Antes da implementação do KANBAN nesta empresa, o PCP era realizado de maneira
convencional, ou seja, as montadoras enviavam para os fornecedores uma previsão de demanda, que
poderia ser alterada quantas fossem as vezes que a montadora achasse conveniente. De posse dessa
previsão e dos pedidos já efetuados, o PCP elaborava o programa mestre de produção para o mês
subseqüente. Devido a forma como a produção era gerenciada, ocorriam vários problemas
relacionados com atrasos na produção e falta de componentes, tanto de fornecimento externo como
de fornecimento interno; outro grande inconveniente estava relacionado com os altos níveis de
estoque intermediário e de produtos acabados. Baseados na grande quantidade de problemas, a
média administração resolveu criar um plano piloto para a implantação do sistema KANBAN. Os
principais objetivos eram a diminuição dos estoques intermediários (visando diminuir os custos) e
proporcionar um melhor atendimento aos clientes. O plano piloto preocupava-se apenas com a
construção de cartões e painéis e, por isso, tanto o treinamento da mão-de-obra diretamente ligada
ao sistema, como ajustes no layout fabril foram esquecidos. Após os primeiros momentos da
implantação, a produção passou a operar de forma mista: os dois primeiros setores continuaram a
trabalhar no sistema tradicional e os dois últimos começaram a trabalhar no sistema KANBAN.
Segundo o autor, quando se analisam os resultados, pode-se constatar uma considerável melhora no
atendimento aos clientes, dado que os atrasos não mais aconteceram, porém, constatou-se um
grande aumento nos níveis de estoque intermediário (devido ao mal dimensionamento dos cartões)
e o principal objetivo, a diminuição nos custos, não foi alcançada. O autor atribui o fracasso do
projeto à forma como a administração conduz a empresa, ou seja, segundo os moldes da
“rotinização do trabalho”. Segundo o autor as características de tal “filosofia” de trabalho são:
Não permite a qualificação e o aperfeiçoamento da mão-de-obra;
Procura impedir o contato entre os operários e inibir sua organização;
Mantém baixos os salários individuais;
Induz a rotatividade da mão-de-obra.
3.5 A utilização do sistema Kanban por empresas da região de São Carlos: o caso de duas
indústrias do setor de linha branca (Ribeiro e Cortês, 1996)
O referido artigo traça paralelos entre duas indústrias (Multibrás e Prosdócimo) que apresentam
processos produtivos semelhantes e implantaram o KANBAN. Apesar da semelhança entre os
processos produtivos, a implantação resultou em peculiaridades inerentes a cada uma das empresas,
as quais são mostradas abaixo:
Multibrás – Unidade Rio Claro:
Movimentadores, e não os operadores, são responsáveis por suprir os postos de
trabalho;
A existência de caixas vazias, e não os cartões, dispara a produção indicando que
aquele item deve ser fabricado;
Os cartões utilizados possuem, além do nome e código, uma foto do item. Apesar de
aumentar o custo do cartão, facilita a visualização por parte do movimentador e do
operador;
Os cartões e painéis foram dimensionados para garantir estoques para três dias;
O tamanho do lote corresponde ao peso de uma caixa cheia, o que implica em
pequenas variações;
Durante a implantação não foram realizadas modificações no layout, mas houve
preocupação em desenvolver com maior rigor programas como: Programa SOL
(Limpeza e Arrumação), Programa de Manutenção Preventiva e Programa de
Qualidade Total.
Prosdócimo – Unidade São Carlos:
O Sistema trabalha com dois cartões: um de movimentação e outro de produção;
O quadro de Kanban é extremamente necessário para a produção, mas perde sua
função na movimentação devido à utilização das caixas.
4 ANÁLISE PESSOAL
Pelas condições acima, podemos traçar paralelos entre os princípios do sistema KANBAN e os
resultados relatados nos artigos:
Kanban na indústria de roupas: avaliação das características de uma aplicação: Para ser
implantado nessa indústria o sistema KANBAN passou por uma série de “adaptações”. Tubino
(1997) sugere que essa adaptações possam existir desde que sejam respeitadas algumas condições
básicas simples, as quais já foram citadas no presente artigo. O que se observa, no entanto é que
algumas dessa regras foram quebradas, como exemplo podemos citar o fato de que o processo de
encaixe e corte das peças utiliza uma “super-máquina”, o que já vai de encontro à filosofia Just-in-
time, e por isso trabalha adiantado em relação à produção, o que acaba empurrando, e não puxando,
material para dentro dos outros setores produtivos. Em relação ao dimensionamento do número de
cartões, Tubino (1997) sugere que o número de cartões deve ser minimizado, mas capaz de absorver
pequenas flutuações na demanda. Segundo o autor do artigo, para absorver tais flutuações foi
somado à quantidade de cartões necessários uma fração de até 20%, o que apesar de concordar com
a regra 4 (...absorver pequenas flutuações na demanda...) vai contra à regra 3 (... minimizar o
número de cartões...). Por outro lado, tem-se fatos que justificam a implantação do KANBAN, tais
fatos aparecem quando o autor do artigo fala que, após a implantação do novo sistema somente são
enviadas para os setores produtivos as quantidades necessárias de material; esse material é enviado
em pequenos lotes de forma a permitir um fluxo uniforme de produção.
A utilização do sistema Kanban por empresas da região de São Carlos: o caso de duas
indústrias do setor de linha branca: Enquanto no artigo anterior foram realizadas adaptações no
sistema KANBAN para adequá-lo ao processo produtivo, nesse caso, onde as empresas apresentam
processos semelhantes, as adaptações foram realizadas para adequar o novo sistema às
particularidades de cada empresa. A análise do resultado obtido em cada uma das empresas
encontra-se abaixo:
Multibrás – Unidade Rio Claro: enquanto o Just-in-time prega que devem ser eliminadas
atividades que não agregam valor ao produto, tais como desperdícios por atividades de
movimentação e transporte (Tubino, 1997), a empresa realiza a atividade de
abastecimento entre os setores produtivos por intermédio de “movimentadores”; apesar
de não estar explícito, mas tomando com base essa mentalidade, pode-se concluir que a
polivalência dos funcionários não é estimulada. O tamanho do lote correspondente a um
cartão foi dimensionado através do peso de uma caixa cheia, o que certamente leva a
variações na quantidade de material enviado aos setores; dessa forma a premissa que diz
que somente a quantidade necessária de material deve ser enviado aos setores é
quebrada. Os autores comentam que para implantar o sistema KANBAN houve a
preocupação de desenvolver com maior rigor programas de limpeza e arrumação, de
manutenção preventiva e de qualidade Total. Como tais programas, inclusive o sistema
KANBAN, buscam dentre outros objetivos a eliminação de estoques, os problemas antes
encobertos são identificados de forma mais fácil, o que facilita sua solução definitiva e,
por conseqüência, permite que a produção seja coordenada de forma coerente.
5 CONCLUSÕES
Analisando o processo através do qual as empresas têm implantado o sistema KANBAN, pode-
se verificar que em muitos casos as “adaptações às características inerentes aos processos
produtivos” acabam por descaracterizar o sistema em implantação. As adaptações são em muitos
casos necessárias, mas devem ser administradas de forma a não atrapalhar o processo de
implantação. Essa afirmação pode ser confirmada quando se verifica que nos casos acima, nenhuma
empresa preocupou-se em verificar o que o mercado realmente estava precisando e por isso
continuaram a produzir para estoque (estoque de produtos acabados), ou seja, continuam a
“empurrar” a produção e a trabalhar com consideráveis níveis de estoque. É importante salientar
que a integração entre fornecedores e clientes, quer estes sejam internos ou externos, deve ser
sempre buscada.
Quando se está buscando a implantação de uma nova filosofia (ou sistema) de trabalho deve-se
primar pelo total envolvimento da mão-de-obra. A gerência deve estar comprometida de forma a
proporcionar treinamentos, não só em conhecimentos específicos mas também em educação formal,
e atividades em equipes que tenha como objetivo a integração entre os funcionários e o
reconhecimento pelos bons serviços prestados. É importante que os funcionários estejam treinados e
motivados a participar do novo projeto; deve-se criar nos funcionários a mentalidade de que todos
são importantes e estão diretamente ligados com o sucesso do novo projeto. Dessa forma os
funcionários acabarão por aumentar seu nível cultural, o que facilita a implantação futura de novos
processos de mudanças para a qualidade, e desenvolverão um sentimento de propriedade em relação
à empresa, passando a colaborar de forma efetiva na busca pela melhoria constante. Deve ser criado
um ambiente agradável no setor de trabalho.
Quando se começa um projeto de melhoria para a qualidade, este não deve ser isolado. Deve-se
procurar a integração entre os diversos setores envolvidos e ter como objetivo constante a busca do
gerenciamento pela qualidade total.
A simulação mostrou ser de grande utilidade como uma ferramenta de apoio à tomada de
decisões, pois através de sua aplicação é possível prever resultados futuros e, dessa forma, evitar
que resultados desastrosos aconteçam, e grandes prejuízos sejam cumulados, por conseqüência da
aplicação errônea de alguma modificação.
Em resumo, as técnicas japonesas de produção têm se mostrado de eficácia inquestionável
quando implantadas em indústrias brasileiras. Essa eficácia é indispensável para o fortalecimento
das indústrias nacionais frente ao novo paradigma de mercado dentro de uma economia globalizada.
Contudo, parece que as empresas não perceberam a necessidade de articulação entre os diversos
sistemas (Kanban, redução de setup, manutenção preventiva, por exemplo) que levam à gestão pela
qualidade total.
6 BIBLIOGRAFIA