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Introdução à Educação
• Nunca se esquece que o objetivo central é aprender o conteúdo, e não apenas terminar o curso. Qualquer um
termina, só os determinados aprendem!
• Lê cada trecho do conteúdo com atenção redobrada, não se deixando dominar pela pressa.
• Sabe que as atividades propostas são fundamentais para o entendimento do conteúdo e não realizá-las é deixar
de aproveitar todo o potencial daquele momento de aprendizagem.
• Explora profundamente as ilustrações explicativas disponíveis, pois sabe que elas têm uma função bem mais
importante que embelezar o texto, são fundamentais para exemplificar e melhorar o entendimento sobre o
conteúdo.
• Realiza todos os jogos didáticos disponíveis durante o curso e entende que eles são momentos de reforço do
aprendizado e de descanso do processo de leitura e estudo. Você aprende enquanto descansa e se diverte!
• Executa todas as atividades extras sugeridas pelo monitor, pois sabe que quanto mais aprofundar seus
conhecimentos mais se diferencia dos demais alunos dos cursos. Todos têm acesso aos mesmos cursos, mas o
aproveitamento que cada aluno faz do seu momento de aprendizagem diferencia os “alunos certificados” dos
“alunos capacitados”.
• Busca complementar sua formação fora do ambiente virtual onde faz o curso, buscando novas informações e
leituras extras, e quando necessário procurando executar atividades práticas que não são possíveis de serem feitas
durante as aulas. (Ex.: uso de softwares aprendidos.)
• Entende que a aprendizagem não se faz apenas no momento em que está realizando o curso, mas sim durante
todo o dia-a-dia. Ficar atento às coisas que estão à sua volta permite encontrar elementos para reforçar aquilo que
foi aprendido.
• Critica o que está aprendendo, verificando sempre a aplicação do conteúdo no dia-a-dia. O aprendizado só tem
sentido quando pode efetivamente ser colocado em prática.
Aproveite o seu
aprendizado!
Conteúdo
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Sobre a Educação do Olhar na Escola
1: A recepção muda tudo: Sobre a Educação do
Olhar na Escola
Edgar Morin
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Por favor, ponham esta página de ponta-cabeça e observem
novamente a figura. E então?
Como vocês puderam observar, o quadro acima reproduz um
recipiente com legumes e hortaliças, mas também reproduz a
figura de um homem – depende do ângulo de onde
observamos a figura, depende do ponto de vista do nosso
olhar.
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Refletir sobre o olhar é a proposta que trazemos para este
momento. E dentro desta proposta, queremos considerar os
vários significados do olhar. Entre eles, os que apresentamos
a seguir:
Eu vi
o cheiro do boi.
Eu vi
cheiro de pasto
maduro, crestado, amarelado.
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vários ângulos e, com isto, identificar as intenções que subjazem nas
exposições que ocorrem nos espaços sociais.
Mas como alcançar esta competência? Como desenvolver a
habilidade de ver criticamente e também com emoção? Só
há uma forma: educando o olhar. E para educá-lo,
precisamos, inicialmente, pensar sobre algumas questões, a
saber:
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capacidade de ver estética e eticamente as imagens que nos
circundam? Cultivando a arte de ver.
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emoção ou prazer que resulta do contato com o belo, nossos
sentidos se renovam e se apuram num processo infindável
de aprofundamento e recriação. A cada momento de arte,
nos tornamos mais aptos à captação da beleza do mundo e
de seus significados.
A arte se opõe ao mergulho no individualismo egoísta.
Trabalha o incrível paradoxo de, tendo suas raízes na
subjetividade e na interioridade, só se realizar em comunicação
com o outro e com o mundo. Exige eco e comunicação, exige
diálogo e controvérsia. Assim, mantém livres nossos canais de
comunicação com o outro, ao mesmo tempo em que aprimora
a consciência que temos de nós mesmos. É fonte inesgotável
de interpretação e sentido. Por mais que nos detenhamos em
sua observação, decifração e entendimento, mais nos
confrontaremos com novas aparências e significações. E
mesmo mantendo laços estreitos com seu tempo e seu espaço,
a arte atravessa a história e se apresenta virgem a novas
interpretações.(Costa, 1999)
Segundo De Masi[3] (2000), um dos momentos que
assinalaram a passagem da nossa condição de animal a
homem foi aquele em que, no nosso processo evolutivo,
pudemos conceituar o belo. Desde os primeiros desenhos
nas cavernas, o homem utilizou a capacidade estética para
registrar as suas impressões do mundo, diferenciando-se dos
outros animais, conquistando a sua condição humana e a
felicidade. Isto porque, segundo o autor, “entre todas as
formas de expressão humana, a estética é aquela que, mais
do que qualquer outra, é responsável pela nossa felicidade”.
(De Masi, 2000)
Associando as idéias de Costa (1999) e de De Masi (2000),
entendemos que a arte nos humaniza e, ao mesmo tempo,
nos proporciona uma sensibilidade tão intensa que pode
despertar nossas emoções mais selvagens, criando
um feedback para múltiplas renovações do homem.
Educando o nosso olhar através da arte, estaremos sempre
ratificando a nossa condição humana.
Nosso olhar, entretanto, não é apenas estimulado por
imagens que produzem prazer estético ou só prazer estético.
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Conforme já foi observado neste texto, vivemos um tempo de
saturação de imagens.
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apresenta de construtivo. Nesse sentido, o que primeiro
precisamos fazer é procurar conhecer tudo o que nos cerca,
desvendar seus mistérios, penetrar em suas fortalezas,
derrubar seus muros.
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1. 3. Como Promover e Praticar a Educação do Olhar e do
Pensar na Escola?
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abstrato, do imediato para o contexto, do vivencial para o
intelectual, integrando o sensorial, o emocional e o racional. O
emocional é um componente fundamental da compreensão e
do ensino. (Morin, 1999)
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ações cotidianas na escola. Precisamos mudar os ângulos do
nosso olhar em relação aos nossos colegas, aos nossos
alunos e ao nosso trabalho. Focalizar as fóveas não apenas
nos anjos ou apenas nos demônios, mas atentar para o que
fica relegado a uma visão periférica.
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do pintor. São as idéias dançantes na cabeça que fazem as
tintas dançarem sobre a tela...
Minha filha me fez uma pergunta: “O que é pensar?”. Disse-me
que esta era a pergunta que o professor de Filosofia havia
proposto à classe. Pelo que lhe dou os parabéns. Primeiro, por
ter ido diretamente à questão essencial. Segundo, por ter tido
sabedoria de fazer a pergunta, sem dar a resposta. Porque se
tivesse dado a resposta, teria com ela cortado as asas do
pensamento. O pensamento é como a águia que só pode alçar
vôo nos espaços vazios do desconhecido. Pensar é voar sobre
o que não se sabe. Não existe nada mais fatal para o
pensamento do que o ensino das respostas certas. Para isso
existem as escolas: não para ensinar as respostas, mas para
ensinar as perguntas. As respostas nos permitem andar sobre
a terra firme. Mas somente as perguntas permitem entrar pelo
mar do desconhecido.
E, no entanto, não podemos viver sem respostas. As asas,
para o impulso inicial do vôo, dependem de pés apoiados na
terra firme. Os pássaros, antes de saberem voar, têm que
aprender a caminhar sobre a terra firme.
Terra firme: as milhares de perguntas para as quais as
gerações passadas já descobriram as respostas. O primeiro
momento da educação é a transmissão deste saber. Nas
palavras de Roland Barthes: “Há um momento em que se
ensina o que se sabe...”. E o mais curioso é que este
aprendizado é justamente para nos poupar da necessidade de
pensar.”(...) Aperto a tecla moqueca. A receita aparecerá no
meu vídeo cerebral: panela de barro, azeite, peixe, tomate,
cebola, coentro, cheiro verde, urucum, sal, pimenta, seguidos
de uma série de instruções sobre o que fazer. Não é coisa que
eu tenha inventado. Foi-me ensinado. Não precisei pensar.
Gostei. Foi para a memória. Esta é a regra fundamental desse
computador que vive no corpo humano: só vai para a memória
aquilo que é objeto do desejo. A tarefa primordial do professor:
seduzir o aluno para que ele deseje e, desejando, aprenda. E o
saber fica memorizado de cor – etimologicamente, no coração
– à espera de que o teclado desejo de novo o chame do seu
lugar de esquecimento.
Memória: um saber que o passado sedimentou. Indispensável
para se repetir as receitas que os mortos nos legaram. E elas
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são boas. Tão boas que nos fazem esquecer que é preciso
voar. Permitem que andemos pelas trilhas batidas. Mas nada
têm a dizer sobre mares desconhecidos. Muitas pessoas, de
tanto repetir as receitas, metamorfosearam-se de águias em
tartarugas. E não são poucas as tartarugas que possuem
diplomas universitários. Aqui se encontra o perigo das escolas:
de tanto ensinar o que o passado legou – e ensinar bem –
fazem os alunos se esquecer de que o seu destino não é o
passado critalizado em saber, mas um futuro que se abre como
vazio, um não saber que somente pode ser explorado com as
asas do pensamento. Compreende-se, então, que Barthes
tenha dito que, seguindo-se ao tempo em que se ensina o que
se sabe, deve chegar o tempo quando se ensina o que não se
sabe. (Alves, R., 2000: 77)
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Isto nos leva a afirmar que não é a quantidade de
informações “memorizadas” que determina a constituição do
conhecimento, mas a forma como lidamos com estas
informações – sendo águias ou tartarugas – como sugere
Rubem Alves.
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Assim, o professor precisa ter:
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Por que a humanidade teme tanto a espontaneidade, se a
atitude espontânea conduz tão rapidamente ao crescimento
responsável?
Por que nos falta confiança no futuro, se forças sociais
intensas e construtivas podem ser liberadas no indivíduo
através da aceitação de alguns poucos princípios básicos?
(Carl R. Rogers)
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Ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica.
(Freire,1999: 8/9)
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Afirmava, também, que os indivíduos, as organizações e até
as nações podem ficar sobrecarregadas de mudanças
demasiado cedo, levando à desorientação e a um colapso
em sua capacidade de tomar decisões de adaptação
inteligentes. Podiam, em suma, sofrer do choque do futuro.
(Toffler, 1990: 19)
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professores e comunidade escolar em geral. (Soares, K.,
1999: 6)
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A globalização é um processo que age sobre o homem. As
suas conseqüências sociais e econômicas estão
transformando o modo de vida da humanidade. Valores
éticos e morais, conceitos políticos e sociais, o uso da ciência
e das artes, enfim, a cultura criada pela humanidade em
milênios está sendo modificada, substituída e, de alguma
forma, afetada radicalmente. (Chiaveneto, 1998)
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A última frase desse artigo é particularmente esclarecedora
quanto à importância de conhecermos a teoria das
inteligências múltiplas e de as aplicarmos nas relações
educativas desenvolvidas na escola.
Continuando nossa reflexão, não poderíamos deixar de
recorrer a Morin (2000), para dizer, com suas palavras, como
deve ser visto o homem, ou seja:
(Morin, 2000)
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Por que foi que cegamos, Não sei, talvez um dia se chegue a
conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz,
Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, Cegos
que vêem, Cegos que, vendo, não vêem.
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O tempo tem uma boca imensa. Com sua boca do tamanho
da eternidade ele vai devorando tudo, sem piedade. O tempo
não tem pena. Mastiga rios, árvores, crepúsculos. Tritura os
dias, as noites, o sol, a lua, as estrelas. Ele é o dono de tudo.
Pacientemente, ele engole todas as coisas, degustando
nuvens, chuvas, terras, lavouras. Ele consome as histórias e
saboreia os amores. Nada fica para depois do tempo. As
madrugadas, os sonhos, as decisões duram pouco na boca
do tempo. Sua garganta traga as estações, os milênios, o
ocidente, o oriente, tudo sem retorno.
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Seus gestos e sua postura em sala de aula dizem muito e
podem ajudá-lo a lecionar — ou arruinar a exposição de
um assunto. Veja como atuar corretamente.
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Ah, as maravilhas da comunicação sem palavras. Certamente você
conhece colegas que usam diversos truques para chamar a atenção
dos alunos. Alguns dão um tapinha na mesa. Outros acendem e
apagam as luzes da sala rapidamente. Outros fazem aquele "hum-
hum" com a garganta. Existem os que mudam completamente o
ambiente de uma sala de aula apenas com um olhar.
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E há ainda aqueles que caminham entre as fileiras de alunos
como um militar em revista à tropa.
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-> Crie âncoras visuais para seus
alunos. Desde o primeiro dia de aula, defina determinado canto
para assuntos leves e piadas, outro canto para falar sobre a
matéria, um canto para interação direta com os alunos. Você não
precisa dizer nada para eles, apenas se movimentar para aquele
ponto da sala de aula toda vez que desejar tomar uma ação
específica. Assim, sempre que os alunos o virem caminhando
para a posição descontraída já começarão a relaxar, e sempre
que você for para o local da interação já começarão a imaginar
algumas questões. Caso você tenha pouco espaço disponível em
sua sala de aula, pode substituir esses "cantos" por gestos, como
abrir os braços de certa maneira seguido de um "Bom.
Perguntas?". Com o passar do tempo, você não precisará falar
mais nada, basta o gesto.
Eis aqui algumas posturas que devem ser evitadas durante suas
aulas:
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Como os outros o vêem
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O cuidado com acessórios exagerados inclui também o que
não é visto, mas ouvido e sentido. Perfumes muito ativos
devem ser barrados, assim como sapatos que rangem ou cujo
salto faça "toc-toc-toc" a cada passo que você dá. E outra
vantagem inerente a sapatos silenciosos: os alunos não
escutarão você chegando na sala.
Separe tempo para exercícios físicos no mínimo três vezes por
semana. Além de aumentar sua capacidade pulmonar e
cardíaca, fazendo com que você se expresse melhor em sala
de aula, os exercícios aumentam sua disposição. Há poucas
coisas piores do que assistir uma aula de um professor com
cara de ontem.
Cuidado com seu estilo. Assim que os alunos o virem pela
primeira vez, vão formar um conceito de você para o resto do
ano. Então, escolha suas roupas conforme a mensagem que
deseja passar. Jeans e camiseta são a marca de uma aula
descontraída, com muita participação dos alunos. Um tailler
elegante representa o sucesso que aquela educadora
alcançou, mas também que pode-se esperar uma aula um
pouco mais rígida. Professores homens, nessa área, têm mais
sorte. Para mudar de um visual totalmente catedrático e de
imposição para alguém próximo aos alunos, basta tirar o paletó
e dobrar as mangas da camisa.
É recomendável expor o seu rosto, não escondê-lo atrás de
óculos escuros, barba, cabelos. Você não tem nada a
esconder.
Respiração curta, que quase não oferece fôlego para frases mais
longas. Músculos do pescoço retesados, ombros encolhidos.
Gestos curtos, rápidos, feitos à altura da cintura. Sem dúvida,
estamos diante de um professor com estress que, como se vê,
prejudica a aula mais do que se percebe. Nessa situação, tentar
um sorriso, dar a aula na mesma entonação de sempre, não
adianta. Os alunos percebem que algo não está bem com o
professor através daqueles sinais que ele não controla. Algumas
dicas para impedir que o stress estrague suas aulas.
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Levante quinze minutos mais cedo para que sua manhã seja
menos apressada.
Evite marcar compromissos demais para um dia. Seja realista.
Você não vai conseguir dar quatro aulas, levar a turma ao
museu, corrigir as provas e ir ao dentista no mesmo dia.
Aprenda a dizer não a projetos e atividades da comunidade se
você não tem tempo disponível.
Tenha certeza de conseguir uma boa noite de sono.
Relaxe nos fins de semana.
Foque no que está acontecendo hoje em vez de se preocupar
apenas com o amanhã.
Estabeleça uma distância emocional do seu trabalho. Ensinar é
uma profissão em que o trabalho nunca acaba, e pode
facilmente ocupar todos os momentos disponíveis da sua
vida. Dê-se permissão para trabalhar um razoável número de
horas por dia e tenha tempo para você, sua família e amigos.
Passe confiança
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A pessoa autoconfiante apresenta uma postura ereta, calma e
aberta, com as mãos pendendo ao lado do corpo, ou no colo.
Pode cruzar os braços e as pernas, mas sempre de maneira
relaxada.
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Quando estiver sentado, procure não ficar com os ombros
caídos. O encosto reto da cadeira ajuda a manter a coluna
ereta, evitando dores nas costas.
Nunca suba escadas com a coluna inclinada para a frente.
Suba com a coluna ereta e o pé completamente apoiado no
chão.
Para erguer qualquer objeto do chão, o correto é flexionar os
joelhos e manter a coluna ereta; o peso deve ficar o mais
próximo possível do tronco.
Não durma de bruço. Prefira dormir de lado ou de barriga para
cima.
Não carregue, em nenhuma hipótese, peso na cabeça. O ideal
é dividir o peso proporcionalmente para os dois lados do corpo.
Preste bastante atenção às condições do piso antes de carregar
qualquer peso, para evitar tropeções, escorregões e torções.
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NETO, Brasílio Andrade. A aula que você dá enão vê. Profissão
Mestre. Curitiba, n.40, p.14-17.
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grupos de convivência humana, do clima sócio-cultural da
sociedade.
A educação intencional refere-se a influências em que há
intenções e objetivos definidos conscientemente, como é o caso
da educação escolar e extra-escolar. Há uma intencionalidade,
uma consciência por parte do educador quanto aos objetivos e
tarefas que deve cumprir, seja ele o pai, o professor, ou os
adultos em geral — estes, muitas vezes, invisíveis atrás de um
canal de televisão, do rádio, do cartaz de propaganda, do
computador etc. Há métodos, técnicas, lugares e condições
específicas prévias criadas deliberadamente para suscitar idéias,
conhecimentos, valores, atitudes, comportamentos. São muitas
as formas de educação intencional e, conforme o objetivo
pretendido, variam os meios. Podemos falar da educação não-
formal quando se trata de atividade educativa estruturada fora do
sistema escolar convencional (como é o caso de movimentos
sociais organizados, dos meios de comunicação de massa etc.) e
da educação formal que se realiza nas escolas ou outras
agências de instrução e educação (igrejas, sindicatos, partidos,
empresas) implicando ações de ensino com objetivos
pedagógicos explícitos, sistematização, procedimentos didáticos.
Cumpre acentuar, no entanto, que a educação propriamente
escolar se destaca entre as demais formas de educação
intencional por ser suporte e requisito delas.
Com efeito, é a escolarização básica que possibilita aos
indivíduos aproveitar e interpretar, consciente e criticamente,
outras influências educativas. É impossível, na sociedade atual,
com o progresso dos conhecimentos científicos e técnicos, e com
o peso cada vez maior de outras influências educativas
(mormente os meios de comunicação de massa), a participação
efetiva dos indivíduos e grupos nas decisões que permeiam a
sociedade sem a educação intencional e sistematizada provida
pela educação escolar.
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Vejamos mais de perto como se estabelecem os vínculos entre
sociedade e educação.
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Fizemos essas considerações para mostrar que a prática
educativa, a vida cotidiana, as relações professor-alunos, os
objetivos da educação, o trabalho docente, nossa percepção do
aluno estão carregados de significados sociais que se constituem
na dinâmica das relações entre classes, entre raças, entre grupos
religiosos, entre homens e mulheres, jovens e adultos. São os
seres humanos que, na diversidade das relações recíprocas que
travam em vários contextos, dão significado às coisas, às
pessoas, às idéias; é socialmente que se formam idéias,
opiniões, ideologias. Este fato é fundamental para compreender
como cada sociedade se produz e se desenvolve, como se
organiza e como encaminha a prática educativa através dos seus
conflitos e suas contradições. Para quem lida com a educação
tendo em vista a formação humana dos indivíduos vivendo em
contextos sociais determinados, é imprescindível que desenvolva
a capacidade de descobrir as relações sociais reais implicadas
em cada acontecimento, em cada situação real da sua vida e da
sua profissão, em cada matéria que ensina como também nos
discursos, nos meios de comunicação de massa, nas relações
cotidianas na família e no trabalho.
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propiciados pelo ensino se tornam princípios reguladores da ação
humana, em convicções e atitudes reais frente à realidade. Há,
pois, uma unidade entre educação e instrução, embora sejam
processos diferentes; pode-se instruir sem educar, e educar sem
instruir; conhecer os conteúdos de uma matéria, conhecer os
princípios morais e normas de conduta não leva necessariamente
a praticá-los, isto é, a transformá-los em convicções e atitudes
efetivas frente aos problemas e desafios da realidade. Ou seja, o
objetivo educativo não é um resultado natural e colateral do
ensino, devendo-se supor por parte do educador um propósito
intencional e explícito de orientar a instrução e o ensino para
objetivos educativos. Cumpre acentuar, entretanto, que o ensino
é o principal meio e fator da educação — ainda que não o único
— e, por isso, destaca-se como campo principal da instrução e
educação. Neste sentido, quando mencionamos o
termo educação escolar, referimos-nos a ensino.
Conforme estudaremos adiante, a educação é o objeto de estudo
da Pedagogia, colocando a ação educativa como objeto de
reflexão, visando descrever e explicar sua natureza, seus
determinantes, seus processos e modos de atuar. O processo
pedagógico orienta a educação para as suas finalidades
específicas, determinadas socialmente, mediante a teoria e a
metodologia da educação e instrução. O trabalho docente — isto
é, a efetivação da tarefa de ensinar — é uma modalidade de
trabalho pedagógico e dele se ocupa a Didática.
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O processo educativo que se desenvolve na escola pela
instrução e ensino consiste na assimilação de conhecimentos e
experiências acumulados pelas gerações anteriores no decurso
do desenvolvimento histórico-social. Entretanto, o processo
educativo está condicionado pelas relações sociais em cujo
interior se desenvolve; e as condições sociais, políticas e
econômicas aí existentes influenciam decisivamente o processo
de ensino e aprendizagem. As finalidades educativas
subordinam-se, pois, as escolhas feitas frente a interesses de
classe determinados pela forma de organização das relações
sociais. Por isso, a prática educativa requer uma direção de
sentido para a formação humana dos indivíduos e processos que
assegurem a atividade prática que lhes corresponde. Em outras
palavras, para tornar efetivo o processo educativo, é preciso dar-
lhe uma orientação sobre as finalidades e meios da sua
realização, conforme opções que se façam quanto ao tipo de
homem que se deseja formar e ao tipo de sociedade a que se
aspira. Esta tarefa pertence à Pedagogia como teoria e prática do
processo educativo.
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Podemos, agora, explicitar as relações entre educação escolar,
Pedagogia e ensino: a educação escolar, manifestação peculiar
do processo educativo global; a Pedagogia como determinação
do rumo desse processo em suas finalidades e meios de ação; o
ensino como campo específico da instrução e educação escolar.
Podemos dizer que o processo de ensino-aprendizagem é,
fundamentalmente, um trabalho pedagógico no qual se conjugam
fatores externos e internos. De um lado, atuam na formulação
humana como direção consciente e planejada, através
objetivos/conteúdos/métodos e formas de organização propostos
pela escola e pelos professores; de outro, essa influência externa
depende de fatores internos, tais como as condições físicas,
psíquicas e sócio-culturais dos alunos.
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A Didática é o principal ramo de estudos da Pedagogia. Ela
investiga os fundamentos, condições e modos de realização da
instrução e do ensino. A ela cabe converter objetivos sócio-
políticos e pedagógicos em objetivos de ensino, selecionar
conteúdos e métodos em função desses objetivos, estabelecer os
vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo em vista o
desenvolvimento das capacidades mentais dos alunos. A Didática
está intimamente ligada à Teoria da Educação e à Teoria da
Organização Escolar e, de modo muito especial, vincula-se à
Teoria do Conhecimento e à Psicologia da Educação.
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científica e técnica do professor para dirigir competentemente o
processo de ensino.
59
da intervenção pedagógica. Este papel de síntese entre a teoria
pedagógica e a prática educativa real assegura a interpenetração
e interdependência entre fins e meios da educação escolar e,
nessas condições, a Didática pode constituir-se em teoria do
ensino. O processo didático efetiva a mediação escolar de
objetivos, conteúdos e métodos das matérias de ensino. Em
função disso, a Didática descreve e explica os nexos, relações e
ligações entre o ensino e a aprendizagem; investiga os fatores
co-determinantes desses processos; indica princípios, condições
e meios de direção do ensino, tendo em vista a aprendizagem,
que são comuns ao ensino das diferentes disciplinas de
conteúdos específicos. Para isso recorre às contribuições das
ciências auxiliares da Educação e das próprias metodologias
específicas. É, pois uma matéria de estudo que integra e articula
conhecimentos teóricos e práticos obtidos nas disciplinas de
formação acadêmica, formação pedagógica e formação técnico-
prática, provendo o que é comum, básico e indispensável para o
ensino de todas as demais disciplinas de conteúdo.
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Isto é, informalmente ensina, em sua prática escolar, que a
educação é um produto, pois é esta a forma como a encara em
seu exercício profissional. É preciso, portanto, que haja coerência
e que a própria superioridade da educação como processo, e
tudo o mais que se ensina na escola, não seja fornecida como
um produto pronto, mas que o aluno seja a ela conduzido
mediante o próprio processo educacional, na prática cotidiana da
sala de aula.
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estado de espírito, pois "o dinheiro não traz a felicidade"; e assim
por diante.
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Piaget, no século XX, diria que a reflexão é uma discussão que
se tem consigo mesmo, "uma conduta social de discussão
interiorizada", ao passo que a "discussão socializada é apenas
uma reflexão exteriorizilda".
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Educação Autoritária X Educação
Democrática
Há que distinguir entre autoridade e autoritarismo. A primeira não
deixa de ser fundamental no processo educacional, pois é sobre
a autoridade do mestre — fundada em sua experiência, em seu
conhecimento e em sua competência — que o mesmo repousa.
Já o segundo trata-se de uma excrescência, de uma usurpação
arbitrária do poder, que pretende fundar o processo educativo na
imposição pura e simples de um ponto de vista, mais do que de
uma "verdade" científica, de um estereótipo comportamental mais
do que de uma orientação aberta e pluralista.
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verdadeiros educadores. De que maneira? Não há melhor
método que o exercício permanente da democracia. Trata-se,
aqui também, de um processo que vai se construindo aos
poucos, na exata medida em que vai sendo vivenciado pela
população escolar.
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Educação Reprodutivista X Educação Crítica
Reprodução, crítica e criação são processos inerentes ao
desenvolvimento pessoal e social e, portanto, sempre presentes,
em maior ou menor grau, na atividade educacional. Trata-se,
certamente, de uma atitude antieducativa aquela que se limita a
reproduzir o passado, mas esta reprodução não deixa de ser a
base da crítica e da criação.
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O PROBLEMA
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decifradas pelos alunos das últimas fileiras. Outro exemplo: o
álbum seriado é empregado por alguns professores como um
roteiro de aula e não como uma série de estímulos para o
pensamento dos alunos. Outros projetam filmes, como substituto
da aula, sem justificar seu papel na estratégia didática.
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Ensinar, entretanto, não é somente transmitir, não é somente
transferir conhecimentos de uma cabeça a outra, não é somente
comunicar. Ensinar é fazer pensar, é estimular para a
identificação e resolução de problemas; é ajudar criar novos
hábitos de pensamento e de ação.
Isto não significa que a exposição não deva ter estrutura alguma,
ou que seja melhor o professor ser um mal comunicador.
Significa, sim, que a estrutura da exposição deve conduzir
à problematização e ao raciocínio e não à absorção passiva
das idéias e informações do professor. Significa ainda que o
professor deve ser um comunicador dialogal e não um
transmissor unilateral de informação. Ser um comunicador, por
outro lado, não é agir como um "showman" e menos ainda como
um persuasivo doutrinador. Significa desenvolver "empatia":
colocar-se no lugar do aluno e, com ele, problematizar o mundo
para que, ao mesmo tempo que aprende novos conteúdos,
desenvolva seu máximo tesouro: sua habilidade de pensar.
PONTOS-CHAVE
TEORIZAÇÃO
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No ato de comunicar, a pessoa que inicia o processo o faz com
uma certa intenção ou objetivo escolhido (consciente ou
inconsciente) entre todos os objetivos possíveis de seu repertório.
Apela em seguida para o seu repertório de idéias e experiências
e escolhe aquelas que lhe servem para sua intenção ou objetivo.
Agora apela para o seu repertório de signos ou códigos, para
com eles representar suas idéias. Finalmente escolhe no
repertório de meios o melhor veículo para transmitir os signos, e
o melhor tratamento dos signos para fazer uma mensagem
adequada e efetiva.
UM MODO DE COMUNICAÇÃO
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vida e não consiste apenas na emissão e recepção de
mensagens deliberadas. Assim, por exemplo, ao mesmo tempo
que o professor está comunicando, ele está recebendo e
processando toda classe de sensações internas e externas,
acontecendo a mesma coisa com os alunos.
A seguir apresentam-se algumas considerações sobre os
diversos processos que intervêm na comunicação interpessoal.
a) As funções da comunicação
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b) Os meios de comunicação
c) O repertório de signos
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Vemos logo que a tarefa de comunicar é mais fácil e efetiva
quando o professor conhece bem os seus alunos, pois isto
significa que conhece seus repertórios de objetivos, idéias e
experiências, signos e meios.
A tarefa do professor não consiste apenas em conhecer os
repertórios dos alunos, mas principalmente em ajuda-los a
modificar e aumentar seus repertórios. Este crescimento,
entretanto, não é somente quantitativo, mas consiste em uma
modificação da estrutura sistêmica dos repertórios.
Vejamos, por exemplo, como está organizado o sistema de
signos de um professor:
d) Os processos de recepção
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Pensemos agora no receptor. Quando a mensagem chega aos
órgãos sensoriais do receptor, o primeiro processo que tem lugar
é o da percepção. A percepção tem uma base puramente física,
mas também sofre influência pela dinâmica psicológica do
receptor. Assim, por exemplo, se, por um lado, a mensagem
verbal do professor é percebida melhor se vem falada em voz alta
e clara, com boa articulação e modulação (base física), por outro
lado é melhor percebida se o aluno estiver interessado no
assunto e não tem uma atitude negativa contra o professor (base
psicológica). A equação pessoal faz com que a percepção
seja seletiva: não percebemos todos os estímulos que atingem
nossos órgãos porque possuímos uma espécie de filtro
perceptual que deixa passar certos estímulos e deixa outros para
fora. Vemos melhor aquilo que desejamos ver.
Após a percepção dos signos, o segundo processo é
a decodificação. Subconscientemente, o receptor compara os
signos percebidos com o seu repertório e decifra a equivalência.
Se os signos percebidos não existem no repertorio, o receptor
apela ao contexto da mensagem para indagar qual poderia ser o
referente desse signo faltante.
O terceiro processo é o da interpretação. A mensagem em sua
totalidade é referida ao assunto sobre o qual se está
comunicando; é conferida com os demais repertórios do receptor,
é comparada a seu conhecimento dos repertórios da fonte, e à
situação em que a mensagem é recebida. Dessa forma, a
interpretação, ou atribuição de significado para uma mensagem é
algo totalmente pessoal e exclusivo de cada aluno. O
significado real da mensagem será diferente para cada receptor,
pois cada um deles tem um marco de referência próprio e
pessoal para sua interpretação.
O quarto processo é a reação ou resposta. O processo de
interpretação da mensagem recebida produz no receptor um
desequilíbrio de seus sistemas ou repertórios, desequilíbrio ou
tensão que é tanto mais sério quando afeta a imagem ou idéia
que o receptor tem de si mesmo. O receptor reage frente a este
desequilíbrio ou tensão criado na sua mente, e a reação pode
tomar variadas formas, algumas das quais são as seguintes:
83
- aceita-a e incorpora-a ao seu repertório de idéias e
experiências, modificando-a na passagem pelo seu repertório de
intenções, e objetivos;
- outras reações.
e) A estrutura do conteúdo
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f) O tratamento da mensagem
g) Conclusão
85
Em resumo, a comunicação é um processo de inter-relação entre
pessoas, que se caracteriza por empregar signos ou códigos para
formular mensagens e transmiti-Ias por diversos meios, visando a
influir sobre os repertórios mentais de outras pessoas. A situação
ou contexto em que tem lugar a comunicação é importante.
APLlCAÇÕES
1) A fonte: o professor
86
- Procurar o aumento e enriquecimento dos repertórios do aluno.
3) Os meios
Recomenda-se:
4) O receptor
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- Conseguir que associem a imagem do professor com um
sentimento de suspense e de expectativa: "O professor que traz
algo novo".
89
"situações de aprendizagem" nada acrescenta à visão clássica do
ofício de professor. Essa insistênda pode até mesmo parecer
pedante, como se insistíssemos em dizer que um médico
"concebe e dirige situações terapêuticas" mais do que
simplesmente reconhecer que trata seus pacientes, assim como
o mestre instrui seus alunos. Com exceção daqueles que estão
familiarizados com as pedagogias ativas e com os trabalhos em
didática das disciplinas, os professores de hoje não se concebem
espontaneamente como "conceptores-dirigentes de situações de
aprendizagem".
Trata-se de uma simples questão de vocabulário, ou eles têm
razões para resistir a uma maneira de ver que só pode complicar
sua vida? Tomemos o exemplo do ensino universitário de
primeiro ciclo[1], tal como ainda dispensado na maioria dos
países. A aula é dada em um anfiteatro, diante de centenas de
rostos anônimos. Compreenda e aprenda quem puder! O
professor poderia por um instante alimentar a ilusão de que cria,
desse modo, para cada um, uma situação de aprendizagem,
definida pela escuta da palestra magistral e pelo trabalho de
tomada de notas, de compreensão e de reflexão que ela
supostamente suscita. Se ele refletir, verá que a padronização
aparente da situação é uma ficção e que existem tantas situações
diferentes quantos alunos. Cada um vivencia a aula em função de
seu humor e de sua disponibilidade, do que ouve e compreende,
conforme seus recursos intelectuais, sua capacidade de
concentração, o que o interessa, faz sentido para ele, relaciona-
se com outros saberes ou com realidades que lhe são familiares
ou que consegue imaginar. Nesse estágio da reflexão, o
professor terá a sabedoria de suspendê-la, sob pena de avaliar
que, na verdade, não sabe grande coisa a respeito das situações
de aprendizagem que cria... Ver-se como conceptor e dirigente
de situações de aprendizagem não deixa de ter riscos: isso pode
levar ao questionamento de sua pertinência e eficácia.
O sistema educativo construiu-se de cima para baixo. É por isso
que as mesmas constatações valem, até um certo ponto, para o
ensino médio e, em menor medida, para o ensino fundamental.
Quando os alunos são crianças ou adolescentes, eles são menos
numerosos e o ensino é mais interativo; há mais possibilidades
de exercícios e experiências feitas por eles (e não diante deles).
Entretanto, enquanto praticarem uma pedagogia magistral e
pouco diferenciada, os professores não dominarão
90
verdadeiramente as situações de aprendizagem nas quais
colocamcada um de seus alunos. No máximo, podem velar,
usando meios disciplinares clássicos, para que todos os alunos
escutem com atenção e envolvam-se ativamente, pelo menos em
aparência, nas tarefas atribuídas. A reflexão sobre as situações
didáticas começa com a questão de Saint-Onge (1996): "Eu,
ensino, mas eles aprendem?".
Desde Bourdieu (1966), sabe-se que só aprendem
verdadeiramente, por meio dessa pedagogia, os "herdeiros",
aqueles que dispõem dos meios culturais para tirar proveito de
uma formação que se dirige formalmente a todos, na ilusão da
eqüidade, identificada nesse caso pela igualdade de tratamento.
Isso parece evidente hoje em dia. No entanto, foi necessário um
século de escolaridade obrigatória para se começar a questionar
esse modelo, opondo-lhe um modelo mais centrado nos
aprendizes, suas representações, sua atividade, as situações
concretas nas quais são mergulhados e seus efeitos didáticos.
Sem dúvida, essa evolução — inacabada e frágil — tem vínculos
com a abertura dos estudos longos a novos públicos, o que
obriga a se preocupar com aqueles para os quais assistir a uma
aula magistral e fazer exercícios não é suficiente para aprender.
Há laços estreitos entre a pedagogia diferenciada e a reflexão
sobre as situações de aprendizagem (Meirieu, 1989; 1990).
Na perspectiva de uma escola mais eficaz para todos, organizar e
dirigir situações de aprendizagem deixou de ser uma maneira ao
mesmo tempo banal e complicada de designar o que fazem
espontaneamente todos os professores. Essa linguagem acentua
a vontade de conceber situações didáticas ótimas, inclusive e
principalmente para os alunos que não aprendem ouvindo lições.
As situações assim concebidas distanciam-se dos exercícios
clássicos, que apenas exigem a operacionalização de um
procedimento conhecido. Permanecem úteis, mas não são mais o
início e o fim do trabalho em aula, como tampouco a aula
magistral, limitada a funções precisas (Étienne e Lerouge, 1997,
p. 64). Organizar e dirigir situações de aprendizagem é manter
um espaço justo para tais procedimentos. É, sobretudo,
despender energia e tempo e dispor das competências
profissionais necessárias para imaginar e criar outros tipos de
situações de aprendizagem, que as didáticas contemporâneas
encaram como situações amplas, abertas, carregadas de
91
sentido e de regulação, as quais requerem um método de
pesquisa, de identificação e de resolução de problemas.
Essa competência global mobiliza várias competências mais
específicas:
93
que se aprenda, estruturar o texto do saber e depois "lê-lo" de
modo inteligível e vivaz, ainda que isso já requeira talentos
didáticos. A competência requerida hoje em dia é o domínio dos
conteúdos com suficiente fluência e distância para construí-
Ios em situações abertas e tarefas complexas, aproveitando
ocasiões, partindo dos interesses dos alunos, explorando os
acontecimentos, em suma, favorecendo a apropriação ativa e a
transferência dos saberes, sem passar necessariamente por sua
exposição metódica, na ordem prescrita por um sumário.
Essa facilidade na administração das situações e dos conteúdos
exige um domínio pessoal não apenas dos saberes, mas também
daquilo que Develay (1992) chama de matriz disciplinar, ou seja,
os conceitos, as questões e os paradigmas que estruturam os
saberes no seio de uma disciplina. Sem esse domínio, a unidade
dos saberes está perdida, os detalhes são superestimados e a
capacidade de reconstruir um planejamento didático a partir dos
alunos e dos acontecimentos encontra-se enfraquecida.
Por isso, a importância de saber identificar noções-
núcleo (Meirieu, 1989, 1990) ou competências-chave (Perrenoud,
1998a) em torno das quais organizar as aprendizagens e em
função das quais orientar o trabalho em aula e estabelecer
prioridades. Não é razoável pedir a cada professor que faça
sozinho, para sua turma, uma leitura dos programas com vistas a
extrair núcleos. Entretanto, mesmo que a instituição proponha
uma reescritura dos programas nesse sentido, eles correm o
risco de permanecer letra morta para os professores que não
estão prontos para consentirem um importante trabalho de
vaivém entre os conteúdos, os objetivos e as situações. É esse
preço que pagarão para navegar na cadeia da transposição
didática "como peixes na água"!
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satisfazem provisoriamente. Por causa disso, muitas vezes, o
ensino choca-se de frente com as concepções dos aprendizes.
Nenhum professor experiente ignora este fato: os alunos pensam
que sabem uma parte daquilo que se deseja ensinar-lhes. Uma
boa pedagogia tradicional usa, às vezes, esses fragmentos de
conhecimento como pontos de apoio, mas o professor transmite,
pelo menos implicitamente, a seguinte mensagem: "Esqueçam o
que vocês sabem, desconfiem do senso comum e do que lhes
contaram e escutem-me, pois vou dizer-lhes como as coisas
acontecem realmente".
95
obstáculos, das incertezas, dos atalhos, dos momentos de pânico
intelectual ou de vazio. Para o professor, um número, uma
subtração, uma fração são saberes adquiridos e banalizados,
assim como o imperfeito, a noção de verbo, de concordância ou
de subordinada ou, então, a noção de célula, de tensão elétrica
ou de dilatação. O professor que trabalha a partir das
representações dos alunos tenta reencontrar a memória do
tempo em que ainda não sabia, colocar-se no lugar dos
aprendizes, lembrar-se de que, se não compreendem, não é por
falta de vontade, mas porque o que é evidente para o especialista
parece opaco e arbitrário para os aprendizes. De nada adianta
explicar cem vezes a técnica de desconto a um aluno que não
compreende o princípio da numeração em diferentes bases. Para
aceitar que um aluno não compreende o princípio de Arquimedes,
deve-se avaliar sua extrema abstração, a dificuldade de
conceituar a resistência da água ou de se desfazer da idéia
intuitiva de que um corpo flutua "porque faz esforços para não
afundar", como um ser vivo.
Para imaginar o conhecimento já construído na mente do aluno, e
que obstaculiza o ensino, não basta que os professores tenham a
memória de suas próprias aprendizagens. Uma cultura mais
extensa em história e em filosofia das ciências poderia ajudá-los,
por exemplo, a compreenderem por que a humanidade levou
séculos para abandonar a idéia de que o Sol girava em torno da
Terra, ou para aceitar que uma mesa seja um sólido
essencialmente vazio, considerando-se a estrutura atômica da
matéria. A maior parte dos conhecimentos científicos contraria a
intuição. As representações e as concepções que lhes são
opostas não são apenas aquelas das crianças, mas das
sociedades do passado e de uma parte dos adultos
contemporâneos. É igualmente útil que os professores tenham
algumas noções de psicologia genética. Enfim, é importante que
se confrontem com os limites de seus próprios conhecimentos e
que (re)descubram que as noções de número imaginário, de
quanta, de buraco negro, de supercondutor, de DNA, de inflação
ou de metacognição colocam-no em dificuldades, da mesma
forma que seus alunos, diante das noções mais elementares.
96
professor é, então, essencialmente didática. Ajuda-o a
fundamentar-se nas representações prévias dos alunos, sem se
fechar nelas, a encontrar um ponto de entrada em seu sistema
cognitivo, uma maneira de desestabilizá-los apenas o
suficiente para levá-los a restabelecerem o equilíbrio,
incorporando novos elementos às representações existentes,
reorganizando-as se necessário.
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torna-se, então, o objetivo do momento, um objetivo-
obstáculo, conforme a expressão de Martinand (1986) retomada
por Meirieu, Astolfi e muitos outros.
Deparar-se com o obstáculo é, em um primeiro momento,
enfrentar o vazio, a ausência de qualquer solução, até mesmo de
qualquer pista ou método, sendo levado à impressão de que
jamais se conseguirá alcançar soluções. Se ocorre a devolução
do problema, ou seja, se os alunos apropriam-se dele, sua mente
põe-se em movimento, constrói hipóteses, procede a
explorações, propõe tentativas "para ver". Em um trabalho
coletivo, inicia-se a discussão, o choque das representações
obriga cada um a precisar seu pensamento e a levar em conta o
dos outros.
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contrato pedagógico e didático, regras de funcionamento
e instituições internas à classe.
As noções de dispositivo e de seqüência didáticos chamam a
atenção para o fato de que uma situação de aprendizagem não
ocorre ao acaso e é engendrada por um dispositivo que coloca os
alunos diante de uma tarefa a ser realizada, um projeto a fazer,
um problema a resolver. Não há dispositivo geral; tudo depende
da disciplina, dos conteúdos específicos, do nível dos alunos, das
opções do professor. Um procedimento de projeto leva a certos
dispositivos. O trabalho por meio de situações-problema leva a
outros, os procedimentos de pesquisa, a outros ainda. Nesses
casos, há um certo número de parâmetros que devem ser
dominados para que as aprendizagens almejadas se realizem.
Dispositivos e seqüências didáticas buscam, para fazer com que
se aprenda, mobilizar os alunos seja paracompreenderem, seja
para terem êxito, se possível os dois (Piaget, 1974). Sua
concepção e sua implantação levam ao confronto de um dos
dilemas de toda pedagogia ativa: ou investir em projetos que
envolvam e apaixonem os alunos, com o risco de que
professores e alunos tornem-se prisioneiros de uma lógica de
produção e de êxito, ou implantar dispositivos e seqüências mais
abertamente centralizados em aprendizagens, reencontrando os
impasses das pedagogias da lição e do exercício (Perrenoud,
1998n).
Todo dispositivo repousa sobre hipóteses relativas à
aprendizagem e à relação com o saber, o projeto, a ação, a
cooperação, o erro, a incerteza, o êxito e o fracasso, o obstáculo,
o tempo. Se construímos dispositivos partindo do princípio de que
todos querem aprender e aceitam pagar um preço por isso,
marginalizamos os alunos para os quais o acesso ao saber não
pode ser tão direto. Procedimentos de projeto podem, ao
contrário, tornar-se fins em si mesmos e afastar-se do programa.
A competência profissional consiste na busca de um amplo
repertório de dispositivos e de seqüências na sua adaptação ou
construção, bem como na identificação, com tanta perspicácia
quanto possível, que eles mobilizam e ensinam.
Como tomar o conhecimento apaixonante por si mesmo? Essa
não é somente uma questão de competência, mas de identidade
e de projeto pessoal do professor. Infelizmente, nem todos os
professores apaixonados dão-se o direito de partilhar sua paixão,
nem todos os professores curiosos conseguem tornar seu amor
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pelo conhecimento inteligível e contagioso. A competência aqui
visada passa pela arte de comunicar-se, seduzir, encorajar,
mobilizar, envolvendo-se como pessoa.
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Bibliografia/Links Recomendados
YUNES, Márcio Jabur e AGOSTINI, João Carlos. Técnica ou
poética, eis a questão! São Paulo: Moderna, 1998.
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