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IMPACTOS E TRANSFORMAÇÕES
SOCIAIS
1º Edição
Brasília
2016
Programa Cultura Viva
impactos e transformações sociais
Financiamento
Ministério da Cultura
Administração de recursos
FINATEC
Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-62539-37-4
Apresentação..................................................................................................5
PARTE 1 – O PROJETO..............................................................................11
Capítulo 1 – Introdução................................................................................13
Um breve histórico do Programa Cultura Viva......................................15
As pesquisas do IPEA.............................................................................20
O FIB como indicador de análise...........................................................26
Capítulo 2 – Revisão Bibliográfica..............................................................29
2007........................................................................................................31
2008........................................................................................................33
2009........................................................................................................35
2010........................................................................................................37
2011........................................................................................................39
2012........................................................................................................44
2013........................................................................................................48
2014........................................................................................................54
Análise da revisão bibliográfica.............................................................59
Capítulo 3 – Desenvolvimento do Projeto...................................................63
Metodologia............................................................................................67
Organização dos dados coletados...........................................................70
Resultados obtidos..................................................................................74
Capítulo 4 – Felicidade Interna Bruta (FIB)................................................75
FIB e as pesquisas sobre o bem estar social...........................................75
Relações ideológicas entre o FIB e o Programa Cultura Viva................79
FIB como indicador qualitativo de análise.............................................81
Domínios do FIB....................................................................................90
Bem-estar psicológico.......................................................................91
Saúde.................................................................................................92
Educação...........................................................................................93
Cultura...............................................................................................95
Uso do tempo....................................................................................97
Boa governança.................................................................................98
Vitalidade comunitária....................................................................100
Meio ambiente (diversidade ecológica)..........................................102
Padrão de vida.................................................................................102
Resumo.................................................................................................104
PARTE 2 – ANÁLISE DOS PONTOS DE CULTURA.............................107
Interarte – COEPi (GO)..............................................................................109
Introdução.............................................................................................109
Análise..................................................................................................112
Ponto de Cultura de Caldas Novas – CEJUVI (GO)..................................119
Introdução.............................................................................................119
Análise..................................................................................................121
Ponto de Cultura Caminhos Audiovisuais (DF).........................................129
Introdução.............................................................................................129
Análise..................................................................................................131
Ponto de Cultura Ludocriarte Editora (DF)................................................139
Introdução.............................................................................................139
Análise..................................................................................................142
Ponto de Cultura CENPRO Faces de Cultura (MT)...................................147
Introdução.............................................................................................147
Análise..................................................................................................150
Ponto de Cultura Só Falta Você (MT)........................................................157
Introdução.............................................................................................157
Análise..................................................................................................160
Ponto de Cultura Yokone Kopenoti (MS)..................................................167
Introdução.............................................................................................167
Análise..................................................................................................170
Ponto de Cultura Pájaro Campana (MS)....................................................177
Introdução.............................................................................................177
Análise..................................................................................................180
PARTE 3.....................................................................................................185
Conclusão...................................................................................................187
Os pilares dos Pontos de Cultura..........................................................191
Impactos no FIB...................................................................................194
Bibliografia Consultada..............................................................................201
Índice de Figuras e Fotos
13
Além dos Pontos de Cultura, o Programa Cultura Viva previu
a necessidade da criação das Redes, presenciais e/ou virtuais, com o
objetivo de fomentar a troca de experiências entre os PC. Através da
rede foram organizados espaços de encontros locais e regionais, tais
como os fóruns, reuniões, comissões, grupos de discussão e grupos
de trabalhos, além dos encontros nacionais das TEIAs e dos Fóruns.
Esses encontros têm como objetivos propor estratégias de políticas
públicas culturais, analisar e avaliar o programa, assim como apre-
sentar a diversidade das ações culturais dos PC. Já foram realizadas
cinco TEIAs, a saber: Teia 2006, São Paulo (SP); Teia 2007, Belo
Horizonte (MG); Teia 2008, Brasília (DF); Teia 2010, Fortaleza
(CE); Teia 2014, Natal (RN).
Para termos uma ideia do sucesso da implementação do PCV,
já na primeira edição da TEIA, em 2006, participaram quatrocentos
PC de todo o país e mais de mil pessoas de forma direta. E, de acor-
do com informações da Secretaria da Cidadania e da Diversidade
Cultural (SCDC/MinC), foram cadastrados “desde sua implantação,
em 2005, e até o ano de 2011, o total de 3.670 Pontos de Cultura em
todos os estados da federação” (BRASIL, 2015). O número de even-
tos locais, regionais e mesmo internacionais relacionados ao PCV
cresce a cada ano2.
Dessa forma, o Programa Cultura Viva, através dos Pontos de
Cultura (PC), possibilitou que áreas populacionais com carências di-
versas pudessem usufruir de ações civis que ocuparam o papel do Es-
tado no sentido de garantir seus direitos culturais, ao possibilitar aos
“indivíduos e às coletividades o direito à criação, à fruição, à difusão
de bens culturais, além do direito à memória e à participação nas de -
cisões das políticas culturais” (BARBOSA DA SILVA e ARAÚJO,
2010, p. 11). O objetivo dessa pesquisa foi analisar os impactos e
transformações sociais ocorridas nessas comunidades a partir da im-
plantação do Programa Cultura Viva.
14
Um breve histórico do Programa Cultura Viva
15
institucional ao estabelecer uma parceria, um pacto com o Esta-
do. Aqui há uma sutil distinção: o Ponto de Cultura não pode ser
para as pessoas, e sim das pessoas; um organizador da cultura em
nível local, atuando como ponto de recepção e irradiação de cul-
tura. Como um elo na articulação em rede, o Ponto de Cultura
não é um equipamento cultural do governo, nem um serviço. Seu
foco não está na carência, na ausência de bens e serviços, e sim
na potência, na capacidade de agir de pessoas e grupos. Ponto de
Cultura é cultura em processo, desenvolvida com autonomia e
protagonismo social. (TURINO, 2009, p. 64)
16
histórico de gestão poderia enfatizar tais características e ocorrências
ao longo destes doze anos. Utiliza-se a noção da estrutura de opera-
ção da rede4 criada pelo Programa Cultura Viva para ilustrar o que
podemos compreender como três fases percorridas até os dias de
hoje.
A primeira fase dá conta do esforço de agendamento e imple-
mentação da ação em escala nacional. Observa-se, neste contexto, a
iniciativa do Ministério da Cultura para a criação e o fomento da rede
por meio do estabelecimento de contato com os mais distintos Pontos
de Cultura espalhados pelo país. Tal esforço de fortalecimento desta
rede seria a tônica da diferenciação alcançada pelo Cultura Viva em
termos de mobilização (mais tarde fortalecida). A característica fun-
damental deste contexto está na criação de uma rede centralizada na
figura governamental, pois as organizações participantes e nomeadas
como Pontos de Cultura tinham convênios firmados diretamente com
o governo federal.
Nesta fase, o Estado tinha o papel central. Era dele a missão de
fortalecer a importância de uma rede entre os Pontos de Cultura e a
possibilidade de gerar autonomia e empoderamento entre os agentes.
Existia um esforço do Ministério da Cultura de fomentar discursos
coletivos, além de possibilitar que as organizações percebessem o
quão valoroso seria o processo de trocas entre a própria sociedade ci-
vil.
Podemos ilustrar que tais características foram percebidas en-
tre os anos de 2004 e 20075. Neste período, o “encantamento” com a
descoberta da diversidade cultural brasileira pode ser enfatizado
como um elemento marcante. Tal encantamento pode ser visto como
4 É válido enfatizar que desde sua criação até os dias atuais a noção de gestão
compartilhada e da criação de uma rede de atuação cooperativa entre Estado e sociedade
sempre estiveram presentes. Ainda que as compreensões e características de cada um
destes conceitos possam ter variado ao longo do tempo, a valorização de ações em rede
sempre foram a tônica iniciada pelo MinC/SCDC e também fomentada pelos gestores de
ponto de cultura, também conhecidos como ponteiros.
5 Não há nenhum objetivo de traçar marcos históricos estanques. As indicações de datas são
apenas para estabelecer uma indicação de cronologia com o propósito de facilitar a
compreensão e a percepção de mudanças.
17
uma via de mão dupla: o governo brasileiro aos poucos percebia a di-
mensão de uma ação como esta, e o Cultura Viva aos poucos ganha-
va mais visibilidade política. Ao mesmo tempo, através da rede, os
ponteiros (ou partícipes da ação) conseguiam vislumbrar outras orga-
nizações que passavam pelas mesmas dificuldades ou que poderiam
oferecer ajuda e possibilitar novos resultados.
A segunda fase é percebida quando a rede, antes focada no
governo federal, começa a se transformar, por ocasião do processo
denominado federalização do Programa Cultura Viva. Desde sua cri-
ação em 2004 e durante os primeiros anos de atividades, por mais
que o ambiente de encantamento/empoderamento fosse fortalecido,
inúmeros entraves de gestão foram percebidos. A manutenção de
uma ação governamental deste porte, por meio da capilaridade terri-
torial em todas as regiões e estados do país, não poderia ser gerencia-
da por uma pequena secretaria alocada no Ministério da Cultura. Era
preciso exercitar a chamada “gestão compartilhada” e dividir a res-
ponsabilidade com outros entes federados (estados e municípios).
Este novo cenário trouxe também mudanças na rede e na forma de
operação do programa. Os esforços para a construção de discursos
nacionais comuns entre os Pontos de Cultura seriam agora atravessa-
dos por particularidades locais, por novos atores, por uma maior
complexidade no ambiente.
Da mesma maneira, a tônica da relação entre Estado e grupos
sociais não pode ser caracterizada da mesma forma. O tensionamento
em relação aos problemas, ou a maior organização da rede de Pontos
de Cultura, indicaram posturas mais assertivas em relação ao direcio-
namento estatal. Vozes dissonantes, maiores cobranças, e colocações,
eram percebidas entre os Pontos de Cultura. Houve um processo de
organização dos Pontos em uma Comissão Nacional, com o propósi-
to de representar todo o grupo de ponteiros em questões mais rele-
vantes, cujo objetivo foi o de estabelecer um diálogo mais maduro
sobre direcionamentos e possíveis alterações.
Considera-se que, nesse momento, a rede deu sinais de esfor-
ços para a construção de discursos comuns, de questões a serem de-
18
batidas e tensionadas entre estado e sociedade civil. Os ponteiros, ou
rede de Pontos de Cultura do Brasil, organizaram-se e articularam-se
para ocupar distintos espaços nas discussões de políticas públicas de
cultura no Brasil. As reflexões e ações não ficaram restritas ao uni-
verso dos problemas ou acertos do Cultura Viva. As noções de trans-
versalidade e a defesa por outras políticas foram importantes para o
próprio amadurecimento e revisão dos seus problemas.
Neste contexto, a chamada “federalização” ganha maior fôlego
e a rede passa a viver posturas dicotômicas entre o fortalecimento de
discursos e propostas nacionais, mas de acordo com dinâmicas lo-
cais. Os indicativos deste período foram encontrados de maneira
mais evidente entre os anos de 2007 e 2010, não necessariamente
apenas neste contexto.
A terceira e última fase ilustra o contexto de ampliação de
contornos e demandas vividos pela rede do Cultura Viva. Por mudan-
ças de abordagens e alterações na agenda política do governo, a ges-
tão da ação passa por transformações e estabelece vínculos mais evi-
dentes com outras ações de promoção da diversidade cultural brasi-
leira, tal como o Programa Brasil Plural.
Ao mesmo tempo, a rede ganha cada vez mais contornos des-
centralizados com a criação de “micro redes” em estados e municípi-
os, por conta de novos conveniamentos executados pelos entes da fe-
deração. A sociedade civil não apenas articula-se em redes localiza-
das, mas há também um processo de internacionalização das ativida-
des, pois o modelo do Cultura Viva ganha mais força e atenção em
outros países da América Latina.
Se internamente percebe-se que o programa já não ocupava o
mesmo espaço dentro da agenda política, internacionalmente, os gru-
pos sociais caminhavam para a complexificação ainda maior do ce-
nário. A discussão sobre ser ou não ser uma política de base comuni-
tária, por exemplo, permeou a rede nacional e internacional.
Nesse período percebeu-se distintas posturas entre os partíci-
pes, desde um tom de desilusão por conta de problemas com atrasos
19
de repasses, a judicialização dos PC, o cancelamento de editais já di-
vulgados, até mudanças administrativas realizadas dentro do Ministé-
rio da Cultura. Por outro lado, a mobilização em função do debate in-
ternacional fornece aos grupos sociais novos desafios a serem en-
frentados. A mobilização e os esforços de uma atuação em rede ga-
nham particularidades.
Em suma, é possível remontar o quadro de atuação do Cultura
Viva utilizando diferentes abordagens. As nuances existentes na rede
podem ser uma base para compreendermos processos de interação
entre governo e grupos sociais, próprios deste contexto contemporâ-
neo. O mais interessante no caso do Cultura Viva é refletirmos sobre
como a sociedade civil vai passando por processos de mudanças de
postura, adotando tons mais críticos e em busca de maior defesa das
necessidades dos PC. O governo, por outro lado, enfrenta o desafio
de propor mudanças em sua estrutura ou mesmo garantir a existência
de recursos com o propósito de não criar um grande hiato entre o dis-
curso de defesa dos PC e as reais ações existentes para possibilitar a
operação dos mesmos.
As pesquisas do IPEA
20
timidades; o ineditismo da proposta não esconde diversas dificulda-
des em sua implementação. De acordo com a publicação:
Propõe-se neste livro que as unidades de análise das políticas
culturais devem se relacionar à capacidade de incentivar, multi-
plicar, consolidar e reconhecer circuitos culturais, articulando-
os e coordenando-os em diferentes escalas. Os sujeitos destes
verbos são as instâncias organizacionais6. (BARBOSA DA SIL-
VA e ARAÚJO, 2010, p. 12, ênfase do original)
21
Todavia, a segunda pesquisa realizada pelo IPEA também con-
tou com uma pesquisa de campo em 16 pontos de diversas regiões do
Brasil, cujo processo de imersão obteve uma análise mais qualitativa
das ações dos pontos através da “observação participante, associada
à técnica de entrevista semidirigida” (BARBOSA DA SILVA e ZIVI-
ANI, 2014, p. 12). O texto final é dividido em 5 partes, sendo que a
última parte é intitulada Narrativas de campo, composta por textos
etnográficos de 7 pontos dos 16 visitados.
O que se percebeu é que ambas as pesquisas realizadas pelo
IPEA (nos anos de 2008 e 2010, respectivamente) apontaram que o
Programa possuía vários problemas, principalmente no que refere à
gestão, pois os instrumentos jurídicos e normativos e as políticas de
fomento disponíveis não davam conta adequadamente dessa experi-
ência social. Na análise sobre o resultado da primeira pesquisa, reco-
nhecem que:
O relatório demonstrava que a administração pública tinha muitas
dificuldades. Podemos continuar a falar daqueles problemas no
presente. Há normas formais que lhe dificultam a ação, embora
sejam estas normas importantes em termos da cultura política que
valoriza a segurança jurídica e a lisura nos usos de recursos pú-
blicos. (BARBOSA DA SILVA e ZIVIANI, 2014, p. 13)
22
Essas situações puderam ser melhor identificadas graças à
imersão da pesquisa de campo etnográfica, quando os pesquisadores
puderam identificar esses problemas no discurso dos próprios gesto-
res e participantes das atividades dos Pontos de Cultura visitados.
Mais à frente, esse problema é novamente abordado:
Isto revela a linha tênue que mistura elementos de uma política
inovadora, de reconhecimento, participação e acesso à cultura, e
uma gestão centralizada e não transparente; mecanismos de dois
tipos distintos de política que ainda convivem no programa Cul-
tura Viva e revelam problemas políticos e administrativos concre-
tos. ( BARBOSA DA SILVA e ZIVIANI, 2014, p. 56)
23
A partir do mapeamento dos problemas e dificuldades para a
consolidação da política, constatou-se a necessidade e a oportunidade
para encetar uma atualização dos parâmetros conceituais e do modo
de implementação do programa. O redesenho foi direcionado à supe-
ração das dificuldades e avançar no sentido das mudanças necessári-
as, realizando, para tanto, uma remodelação do programa.
De acordo com o texto do Relatório (BARBOSA DA SILVA e
LABREA, 2014, p. 11), a proposta inicial era a criação de um Grupo
de Trabalho com a participação dos PC através de 5 representantes
da CNPdC, com a intenção de melhoria do desempenho global do
programa.
A orientação era ampliar as ações com consistência e responsabi-
lidade, valores centrais para a sustentabilidade do programa no
médio e longo prazo. Quando fosse o caso, a orientação era rever
as ações para que fossem desenvolvidas com as qualidades exigi-
das pelo governo e pela sociedade civil (BARBOSA DA SILVA e
LABREA, 2014, p. 11).
24
va o fato de que tais pesquisas realizadas pelo IPEA focavam muito
nos problemas do PCV e eram em sua maioria quantitativas (basea-
das em relatórios e estatísticas). Havia pouco espaço para a identifi-
cação dos impactos positivos que essa política pública cultural trouxe
para as comunidades distantes dos principais centros culturais, assim
como para a manutenção e valorização de práticas culturais que não
estivessem sintonia com a indústria cultural 8 ou com a chamada “alta
cultura”9.
Houve também uma tensão política no contexto de mudanças
de gestão (presidencial e ministerial). Como bem expôs a pesquisa-
dora LaBrea,
Se em 2009, quando ocorreu o Seminário Internacional, o MinC
e os pontos eram parceiros e aliados, trabalhando juntos para que
a política fosse bem-sucedida e, nesse contexto, o discurso que
explicitava que os conceitos não davam conta da experiência dos
Pontos não foi alvo de nenhuma comoção para mantê-los inalte-
rados. Ao contrário, a aposta de então era qualificar a política, ga-
nhar escala, ampliar os recursos e estava valendo o discurso que
o “Programa Cultura Viva estava em permanente construção...”
[...]. Em 2011 o clima político era outro e a ideia de redesenho foi
vista com desconfiança pelos ponteiros e o redesenho foi entendi-
do por uns como uma estratégia para acabar com o programa, ou-
tros entendiam que não havia necessidade de redesenho - os con-
ceitos eram adequados e suficientes, não precisava mudar nada, a
necessidade era de retorno ao que era antes. Se até então as análi-
ses do Ipea eram referência e apareciam como argumento - tanto
para gestores, ponteiros e pesquisadores - para qualificar a políti-
ca, a partir de então as credenciais dos pesquisadores, seu alinha-
mento conservador, sua metodologia positivista, sua parcialidade
25
foram objetos de críticas e questionamentos. (LABREA, 2014, p.
244, ênfase do original)
Uma vez definido que essa pesquisa teria uma abordagem qua-
litativa, etnográfica, foi necessário definir quais critérios seriam utili-
zados para analisar o impacto dos Pontos de Cultura em suas comu-
nidades. Como nossa abordagem tem sido interpretativa, optamos
por escolher indicadores que pudessem nos auxiliar na interpretação
dos dados, que auxiliasse na identificação das mudanças na qualida-
de de vida de uma forma geral. Diante dos diversos indicadores de
avaliação da qualidade de vida estudados, foi eleito o conceito de Fe-
licidade Interna Bruta (FIB), que pareceu ser apropriado para nossos
objetivos. A escolha pelo FIB se deu por duas razões básicas.
26
A primeira razão é o fato desse conceito envolver uma visão
de qualidade de vida que vai além do que prega o tradicional Produto
Interno Bruto (PIB). De acordo com o economista Paul Singer 10, o
PIB é
a somatória das transações – compras e vendas – realizadas em
todos os mercados dum país durante o ano. Como a grande maio-
ria dos bens e serviços produzidos se destina à venda, o valor de
todas as transações corresponde ao total de mercadorias produzi-
das, que passa a ser propriedade dos compradores que os conso-
mem quando se trata de serviços e bens perecíveis ou os usam
quando se trata de bens duráveis. De um modo ou outro, as mer-
cadorias produzidas são transacionadas e em seguida passam a
satisfazer necessidades e desejos dos que as adquiriram. Daí a no-
ção de que o PIB mede a riqueza produzida durante o ano, que ao
ser consumida ou usada passa a ser a causa eficiente do bem estar
da população (SINGER, 2015).
27
al, pois outras situações influenciam tanto ou mais na percepção da
felicidade.
Diversos textos de pesquisadores do Butão, país de onde origi-
nou esse conceito, são unânimes em afirmar que não existe uma úni-
ca e oficial definição para o FIB, mas que o mais comumente utiliza-
do é:
Felicidade Interna Bruta mede a qualidade de um país de uma
forma mais holística [do que o PIB], e acredita que o desenvolvi-
mento benéfico da sociedade humana ocorre quando desenvolvi-
mento material e espiritual ocorrem lado a lado para complemen-
tar e reforçar-se mutuamente. (URA, 2012b, p. 7)
28
Capítulo 2 – Revisão Bibliográfica
11 Essa biblioteca digital possui um acervo de mais de 120 mil teses e dissertações de 90
instituições de ensino, a tornando uma das maiores bibliotecas dessa natureza, no mundo,
em número de registros de pesquisas de um só país.
29
• Administração (NOGUEIRA, 2007; SANTOS, 2008; DI-
NIZ, 2009; MEDEIROS, 2013)
• Antropologia (NUNES, 2012)
• Artes, ciências e humanidades (LIMA, L., 2013, MURUGA,
2014)
• Ciência política (ANDRIES, 2010)
• Ciências da informação (SILVA, 2007; NOGUEIRA, 2014)
• Comunicação (REIS, 2008; FÉR, 2009; ROCHA, 2011)
• Desenvolvimento humano e tecnologias (PEDROSO, 2013)
• Educação (VILUTIS, 2009; ALMEIDA, 2011; FONETENE-
LE, 2011; LABREA, 2014)
• Estudos da mídia (CUNHA, 2012)
• Extensão rural e desenvolvimento local (PEREIRA, 2008)
• Gestão cultural (LABREA, 2012)
• Geografia (MARINHO, 2013; DORNELES, 2011)
• História (SILVA, 2009; COSTA, 2011; LIMA, D., 2013)
• Linguística (FREIRE, 2012)
• Medicina (DIBA, 2012)
• Políticas públicas (DOMINGUES, 2008; BEZERRA, 2014)
• Psicologia (BERZINS, 2011)
• Serviço social (ASSIS, 2007; SARTOR, 2011)
• Sociologia (MATTOS, 2010; PAIXÃO, 2013; ALVES, 2009)
Partindo do total das categorias encontradas, percebemos a
existência de subcategorias, sobre as quais as pesquisas desdobram-
se a discutir. Entre tais categorias destacamos a preocupação com a
30
constituição das políticas públicas para as áreas culturais; com a cul-
tura tradicional e popular e as relações imbricadas nessa instância da
sociedade; a gestão compartilhada dentro das instituições culturais; a
gestão descentralizada e a relação entre o Programa Cultura Viva e os
Pontos de Cultura; o interesse na produção e consumo cultural tendo
os PC como produtores de cultura independente; e a construção da
identidade cultural.
2007
31
drogas e com o mundo do crime; despertar a criatividade do pú-
blico; melhora no comportamento dos jovens (maior disciplina) e
em sua relação com seus familiares; valorização pessoal e comu-
nitário; aquisição de novas amizades; maior conhecimento da
cultura local e da cidade em que vive; melhora no rendimento es-
colar. (ASSIS, 2007, p. 203),
32
2008
33
satórias ou se são de fato democráticas; a segunda compara o PCV
com a Lei de Incentivo à Cultura e seus processos de branding.
Domingues assume que sua pesquisa é, de certa forma, uma
“avaliação política” sobre a origem do Cultura Viva, confrontando as
ações do MinC com chamada “'administração da precariedade', de
forma a minimizar os efeitos da exclusão social, sem mudanças no
escopo do que produz os efeitos da exclusão” (p. 199). Por fim, o au-
tor reconhece que:
A simplicidade do conceito do Cultura Viva é inversamente pro-
porcional ao impacto de sua realização. Ao reconfigurar a enge-
nharia de transferência de recursos públicos e colocar a tecnolo-
gia digital a serviço da produção e circulação dos bens culturais
das classes populares e de seu desenvolvimento econômico, o
Programa acena com a possibilidade de construção de novos con-
sensos, a partir da construção de uma rede solidária de atores
com experiências culturais diversas, e com um processo político-
pedagógico de sua inserção na gestão cultural. (DOMINGUES,
2008, p. 200)
34
2009
35
to de Cultura no ano de 2004, e no ano seguinte, convidada pela “Se-
cretaria de Programas e Projetos Culturais – SPPC / MINC, para cri-
ar e coordenar a Ação Griô Nacional, a fim de articular redes educa-
cionais e culturais de transmissão oral em todo o país, por meio de
100 pontos de cultura, escolas e universidades” (p. 23).
A autora reconhece que:
Percebe-se uma forte intenção da Associação Grãos de Luz e
Griô em influenciar as políticas públicas em nível local, regional
e nacional. […] Ao ocupar um lugar na educação formal, os sabe-
res de tradição oral poderiam fortalecer a participação, o respeito
às identidades e às práticas culturais individuais e coletivas de
pessoas que historicamente foram excluídas das políticas cultu-
rais. (SILVA, 2009, p. 83)
36
Entretanto a pesquisadora reconhece que o a “Ação Cultura
Viva contribuiu para impulsionar os projetos dos Pontos de Cultura,
pois foi por meio dessa ação que os pontos encontraram seu público,
ampliaram sua dimensão territorial e alargaram o alcance de suas
ações” (p. 147).
Também nesse ano foi defendida a tese de doutorado de Elder
Alves (2009) em sociologia que, apesar de não focar especificamente
no PCV, aborda sua interferência no âmbito das transformações sofri-
das no campo da produção simbólico-cultural contemporânea da cul-
tura popular sertanejo-nordestina13. Para o autor, os PC atuam como
“selos institucionais de reconhecimento”, ao legitimar práticas ou sa-
beres “tradicionais” que por sua vez eram exploradas por empresas
no que Santos (2008) identificou como branding.
Em sua conclusão o autor identifica que,
diante da intensificação do processo de industrialização do sim-
bólico e da respectiva expansão dos mercados de bens e serviços
culturais no ambiente glogal, emergiu uma nova formação dis-
cursiva que atualizou e potencializou o valor atribuído às catego-
rias de tradição e “autenticidade”. Essa atualização só foram
possíveis, entretanto, a partir da operacionalização de determina-
das políticas culturais públicas (como o Programa Cultura Viva e
o Programa Nacional do Patrimônio Cultural Imaterial), cujos
efeitos práticos corroboraram para para estruturar mercados sim-
bólicos bastante específicos. (ALVES, 2009, p. 368-369)
2010
13 Entre outros exemplos de influência o autor também cita o papel do repertório discursivo
UNESCO, que inclui temas como diversidade, tradição, criatividade, patrimônio
imaterial, entre outros; e O Programa Nacional de Patrimônio Imaterial (PNPI).
37
vistas em profundidade (não estruturadas, exploratórias), seguida de
uma observação participante em uma das oficinas oferecida por um
PC. O objetivo do autor foi o de compreender os processos sociais
existentes nas políticas culturais e “as complexas relações de usos da
cultura que envolvem o Programa Cultura Viva” (p. 23). Para alcan-
çar esse objetivo, realizou um estudo de caso do Pontão de Cultura
Rede Amazônica de Protagonismo Juvenil (PCRAPJ), “buscando
compreender sua atuação, seu modus operandi no que tange a uma
articulação em rede dos elementos constitutivos do PCV” (p. 112).
Em sua conclusão, Mattos entende que, uma vez que a cultura
trabalha com valores, tais valores são preenchidos “por sentidos dos
quais cada um fala e faz, de seus respectivos lugares” (p. 159). E, ao
contrapor os valores propostos e mobilizados pelo PCV com sua pes-
quisa de campo, procura contribuir com uma nova visão:
Talvez a equação valorativa que compõem o programa deva ser
pensada em termos mais complexos, adicionando alguns elemen-
tos a essa cadeia inicial. Para isso é necessário uma separação e
re-união dos conceitos. Os valores que o Programa efetivamente
mobiliza, e o fazem se ampliar e se modificar (segundo sustenta-
mos), são: autonomia e protagonismo, compartilhamento, empo-
deramento, ruptura e transformação. Nesta ordem de aconteci-
mentos. (MATTOS, 2010, p. 159)
38
2011
39
bre as pessoas que assim passaram a ser consideradas. Mais especifi-
camente, como as contadoras de histórias da cidade Carira-CE, fo-
ram afetadas, absorveram, interpretaram e significaram essa experi-
ência.
O termo griô tem origem nos músicos, genealogistas, poetas e co-
municadores sociais, mediadores da transmissão oral, bibliotecas
vivas de todas as histórias, os saberes e fazeres da tradição, sábi-
os da tradição oral que representam nações, famílias e grupos de
um universo cultural fundado na oralidade, onde o livro não tem
papel social prioritário, e guardam a história e as ciências das co-
munidades, das regiões e do país. (O QUE É GRIÔ, 2015)
40
am sentidos as suas expressões culturais. (FONTENELLE, 2011,
p. 172)
41
responsabilidade das secretarias de cultura estaduais e municipais. O
contexto em estudo foi o estado da Bahia. Apesar de basear grande
parte de sua pesquisa em documentos oficiais, o autor também reali-
zou entrevistas com funcionários do MinC, da secretaria de cultura
da Bahia e gestores de PC, além da experiência de ter participado
como gestora de um PC e como avaliadora no Prêmio Cultura Viva.
Seu principal foco foi a discussão sobre o Programa Mais Cultura.
Sua análise conta com muitos dados, organogramas e gráficos
elucidativos. Em sua conclusão a autora identifica diversos proble-
mas que surgiram com a federalização do PCV, desde a falta do
MinC em disponibilizar, de forma organizada, dados e metodologias
de trabalho, que pudessem auxiliar tanto na comunicação entre os
pontos, quanto em seu acompanhamento; como a falta de estrutura
nas esferas estaduais e, principalmente, municipais, para acompanhar
e administrar esse modelo de política pública compartilhada.
Todavia, houve pontos positivos como o fato da Secretaria de
Cultura da Bahia rever a forma de contratos e gestão financeira dos
PC tais como:
dispensa de licitação e não apresentação de contrapartida por par-
te dos Pontos de Cultura; acompanhamento dos projetos por meio
da presença in loco dos representantes territoriais da cultura; dis-
tribuição de DVDs com programas em software livre; entrega de
placa de identificação para os Pontos de Cultura exporem na sede
ou no local de realização do projeto; parceria com outros órgãos
do estado (Secti e Ingá). (ROCHA, 2011, p. 172)
42
pesquisa de campo em PC do estado do Rio de Janeiro. Seu pressu-
posto é a da possibilidade dos PC,
serem o lugar da criação e não da instrumentalização da cultura,
sobretudo sem a exigência do produto em si, mas onde o proces-
so vivido por um coletivo é o mais importante, uma vez que são
ampliadas as perspectivas, a possibilidade de escolha e de hori-
zontes. (SARTOR, 2011, p. 27)
43
alidade existente na sociedade em geral. (DORNELES, 2011, p.
180)
2012
44
descrever o funcionamento das redes do CV a partir do discurso,
do que é dito sobre elas, em um primeiro momento, focando o
discurso institucional que descreve o funcionamento das redes do
Programa e em um segundo momento a partir do discurso que
descreve o que as redes fazem, do que é dito pelos Pontões de
Cultura sobre seus problemas, limites e potências. Os Pontões do
CV construíram uma narrativa sobre o Programa e ela reflete os
lugares sociais e ideológicos de cada sujeito, ela mostra os dife-
rentes níveis de entendimento que circulam na formação discursi-
va que compõem o CV, a disputa pelo sentido. (LABREA, 2012,
p. 4-5, ênfase do original).
45
pos orientados para a comunidade (Wolf, 1955 17 e 195618). (NU-
NES, 2012, p. 65)
46
jar e agir; criatividade; e conscientização da participação política e
cidadã (p. 116). E finaliza:
São agentes que aprenderam a se reconhecer no enquadramento
da câmera, descobriram a autoestima, nos prêmios obtidos em
festivais e mostras locais, e vislumbraram uma possibilidade de
alcançar um status profissional numa carreira ainda em arquitetu-
ramento. (CUNHA, 2012, p. 120).
47
mento (em caminho oposto ao do assistencialismo), considerados
como componentes importantes da Promoção da Saúde.
A pesquisadora reconhece que essa transformação do local e
da comunidade foi possível não só pelo interesse e capacidade de um
grupo de pessoas, mas também pelo acesso a recursos financeiros do
estado, entre os quais o PCV. Conclui dizendo que, no caso estudado,
a forma como é proposta a vivência teatral tem proporcionado mu-
danças positivas em vários aspectos determinantes da saúde da vida
dos jovens relacionados ao trabalho, lazer, sexualidade, relaciona-
mento com familiares e com a comunidade.
2013
48
dos, por exemplo, mas também com associações comunitárias,
institutos de pesquisa, cooperativas de agricultores, por exemplo.
(MEDEIROS, 2013, p. 148)
49
Suas conclusões demonstram que, as instituições que pos-
suíam assessoria jurídica e contábil tiveram menos problemas na
prestação de contas e que, quando existia um formato de prestação de
contas simplificado, “uma estrutura mínima de contabilidade era su-
ficiente para lidar com as demandas de controle” (LIMA, L., 2013, p.
221).
Cleiton Paixão dedica sua tese de doutorado em Ciências Soci-
ais ao estudo das políticas públicas em cultura no Brasil, desde a era
Vargas (1930-1945) até o final do governo Lula (2003-2010). É uma
pesquisa documental/historicista, que identifica rupturas e continui-
dades nessas políticas “até assumir, em décadas mais recentes, parti-
cular centralidade” (PAIXÃO, 2013, p. 1).
De acordo com o pesquisador, o PCV tem origens no conceito
de economia criativa na década de 1990 na Europa. Mas, com um
discurso que vai ao contrário de muitos, procura demonstrar e pro-
blematizar que é durante essa última década, mais especificamente
com a criação do PCV, que “a relação entre economia e cultura se
concretiza de forma mais plena” (p. 1). Sua posição é que,
de maneira minuciosa, a intervenção na área cultural realizada
pelo governo Lula procurou adequar as políticas e programas cul-
turais ao processo de desenvolvimento econômico (PAIXÃO,
2013, p. 13).
50
era “apontar as possibilidades de inserção da área cultural como um
setor produtivo na economia” (p. 135, ênfase do original). Outro ele-
mento importante foram os dados levantados pela pesquisa do IBGE
(2006), nas quais “os serviços e produtos culturais nacionais repre-
sentam em torno de 10,1% da economia brasileira.” (p. 137).
Em relação ao PCV, o autor conclui que, apesar de ter se con-
solidado como política de Estado em 2012,
na realidade ampliou as possibilidades de investimento da inicia-
tiva privada. A lógica exercida pelo programa foi a de promover e
fomentar um Ponto de Cultura até que ele se consolidasse e tives-
se condições de buscar sua sobrevivência sozinho na competitivi-
dade do mercado. (PAIXÃO, 2013, p. 181)
51
do, o trabalho desempenhado pelo gestor/político cumpre uma
função de mediação entre o possível a ser feito e o necessário,
dois mundos bem distantes. (LIMA, D., 2013, p. 193)
Por fim, a tese de Alba Marinho (2013) tem como foco os Pon-
tos de Cultura situados em Olinda, Pernambuco, enquanto espaços de
práticas culturais de interesse turístico. Seu interesse está nas mudan-
ças promovidas nas entidades após o convênio com o PCV, procuran-
do a continuidade de suas ações com vistas à sustentabilidade inde-
pendente das políticas públicas. De acordo com a autora, a rede for-
mada entre os PC se mostra essencial para esse objetivo. Ao mesmo
52
tempo, identifica que uma rede de relacionamento já existia, entre
determinados grupos, mesmo antes de passarem a integrar o PCV,
conforme expõe nos depoimentos de seus informantes (MARINHO,
2013, p. 22-25). Nos depoimentos coletados, a rede é vista tanto de
forma benéfica como negativa.
Após contextualizar os recentes movimentos culturais de Per-
nambuco e rever a implementação do PCV nesse estado, a autora faz
um levantamento do estado dos 15 PC situados na cidade de Olinda,
incluindo endereço, contato, área de atuação e situação à época. Inte-
ressante também é sua análise do processo de internacionalização do
PCV.
Ao retornar à questão do turismo, a autora acredita que “hoje,
talvez mais do que outrora, considera-se o resgate da memória histó-
rica e a vivência dos espaços culturais como um elemento essencial à
inclusão e à conquista da plena cidadania” (p. 134), identificando o
PC da Xambá como um exemplo dessa ação. E finaliza seu texto re-
conhecendo que:
Os Pontos de Cultura de uma forma geral, e particularmente os
de Olinda, representam o reconhecimento e inédito empodera-
mento dos saberes, destacadamente os imateriais, que são trazi-
dos para o centro da agenda das políticas públicas. […] Quanto
ao trade do turismo, são agentes que podem se impor no lugar
por meio das grandes operadoras de viagens e agências de recep-
tivo. Porém a força da horizontalidade que vem do lugar também
podem se associar aos que vêm de fora do lugar, ONGs por ex-
emplo. As experiências relatadas sugerem otimismo visto acenar
à aproximação e cogestão entre os Pontos de Cultura, as organi-
zações não governamentais e o Poder Público, associados a mo-
bilização dos cidadãos, engendrando a possibilidade inovadora de
inibir vícios advindos tanto da cultura quanto do turismo. (MA-
RINHO, 2013, p. 149-150)
53
2014
54
de experiência na gestão de um programa social desse porte. Na
hora de analisar de forma estatística a rede percebemos alguns
pontos com baixa interação mas com eixos que poderiam aportar
novas perspectiva para a rede geral. (MURUGA, 2014, p. 114)
55
tora identifica que os Pontos de Cultura variam seu discurso entre o
alinhamento ao discurso oficial, como forma de se adequar à norma e
ter acesso aos mecanismos de fomento, e a negação ou resistência ao
uso de concepções acadêmicas.
Nesse sentido, destacamos como os sujeitos do campo das cultu-
ras populares operam dois movimentos: por um lado, reivindicam
em seu próprio espaço e lugar discursivo a produção simbólica
do que se afirma por cultura popular, mestre ou Griô; essa reivin-
dicação significa uma disputa pela legitimação de um discurso
entre os “iguais que se pensam diferentes”; por outro lado, reali-
zam uma apropriação e uso do discurso do Estado para ter acesso
ao fomento e à visibilidade de suas práticas culturais. (BEZER-
RA, 2014, p. 157).
56
relações hierárquicas. Ao abordar a não funcionalidade das redes te-
máticas Labrea afirma:
Se a descrição acima descreve e sintetiza as redes do Cultura
Viva, a proposta de gestão compartilhada e transformadora é ain-
da mais sucinta porque ela não ancora em práticas concretas, não
há espaços institucionais, não há clareza do que deveria ser com-
partilhado e essa agenda de encontros e reuniões - que se entende
como participação social -, se esgota em si mesma porque não há
memória institucional publicizada, problematizada, debatida,
conversada, construída junto (p. 316)
57
ca, social e política do conhecimento, da informação e do saber”
(NOGUEIRA, 2014, p. 9). De acordo com o autor,
O estudo através das mediações culturais indica antes de qualquer
coisa as mediações políticas da organização da informação, e as-
sim, por isso mesmo, procura em lugares além dos já consagra-
dos, além dos “acervos”, indícios dos novos dispositivos que me-
deiam as relações socioculturais de hoje com a “informação”: da
cultura dispersa, materializada na criatividade cotidiana da pro-
dução popular e sua mediação com o imaginário das massas, à
sua institucionalização que, “antropologizada”, indica novos e
ambíguos caminhos para o desbloqueio de suas amarras a partir
das políticas públicas de cultura contemporâneas. (p. 68)
58
A questão fundamental refere-se ao reconhecimento dos condici-
onantes contextuais e culturais dos modos de produção do sentido
e de articulação no simbólico a partir da constatação da pluralida-
de de experiências estéticas e dos modos de fazer e usar social-
mente a cultura. (NOGUEIRA, 2014, p. 189)
Sudeste (18)
Nordeste (13)
Centro-Oeste (4)
Sul (1)
59
Dessas trinta e seis pesquisas analisadas, somente vinte e cinco
envolvem algum tipo de trabalho de campo e/ou análise de um ou
mais Pontos de Cultura específicos20. Isso nos deixa um total de doze
trabalhos voltados, principalmente, para uma discussão teórica sobre
o PCV, baseados em pesquisa bibliográfica e documental.
Pesquisa de
campo (25)
Teóricos (11)
20 Ainda assim, muitas das pesquisas que envolvem contato com os PC utilizam
questionários como coleta de dados para suas pesquisas, exemplificando uma das
reclamações recorrentes dos “ponteiros”, que era o fato de estarem sempre tendo que
preencher questionários diversos.
60
Sudeste (8)
Nordeste (13)
Centro-Oeste (2)
Sul (1)
Norte (1)
61
Capítulo 3 – Desenvolvimento do Projeto
63
da equipe. A preparação teórica iniciou-se com a leitura de textos so-
bre o Programa Cultura Viva (TURINO, 2010; BARBOSA DA SIL-
VA e ARAÚJO, 2010; BARBOSA DA SILVA e CALABRE, 2012;
BARBOSA DA SILVA e LABREA, 2014; LABREA, 2014). Após a
leitura inicial sobre o PCV, as bolsistas de mestrado iniciaram uma
busca sistemática em bancos de teses, dissertações, e internet em ge-
ral, à procura de todo texto acadêmico que abordasse direta ou indi-
retamente o PCV. Essa busca gerou mais de cem fontes bibliográfi-
cas, que foram utilizadas na revisão bibliográfica. Em seguida passa-
mos à leitura dos referenciais teóricos que iriam orientar a pesquisa
de campo. Foram lidos textos de Geertz (2004, 2012), Foucault,
(2000), Bourdieu (1983), LaPlantine (1996), Fino (2003; 2008), to-
dos a respeito das características, e problemas que poderiam ser en-
contrados na pesquisa de campo etnográfica ou na análise dos dados
coletados.
No final do mês de maio, o Prof. Mário Brasil viajou para
TEIA no Rio Grande do Norte, onde organizou o Primeiro Encontro
dos Pontos de Cultura e Pesquisadores do Programa Cultura Viva. O
objetivo principal do encontro foi a apresentação oficial desse proje-
to de pesquisa para os demais pesquisadores e para a Comissão Naci-
onal dos Pontos de Cultura, formada por cinco representantes, um de
cada região: Célia de Fátima Pinheiro Moreira (Sudeste), Sergio
Meirelle (Sul), Leila Lopes (Centro Oeste), Maria Fulgência Silva
Bonfim (Nordeste), e Lucimar Weill (Norte). Entre os pesquisadores,
estiveram presentes a prof. Fátima Makiuchi (UnB), Lia Calabre e
Débora Rabello Lima, ambas da Fundação Casa de Rui Barbosa.
Após essa apresentação, aconteceram algumas intervenções e suges-
tões para o projeto, entre as quais, destacamos:
• Que o projeto levasse em conta sua ampliação para todo o
Brasil, e que as pesquisas fossem feitas em interiores distan-
tes e de difícil acesso, pois será essa situação que se encon-
trará em alguns pontos da Região Norte;
• Ênfase na necessidade de um maior preparo dos pesquisado-
res no que se refere à compreensão da dinâmica dos pontos,
64
antes de ir a campo. Citaram exemplo de pesquisas anterio-
res, onde as visitas foram em momentos inoportunos, pois
aconteceram quando os pontos estavam em plena atividade e
os ponteiros não tinham tempo para participar de entrevistas
nem de responder questionários;
• Necessidade da criação de um Grupo de Trabalho permanen-
te para a pesquisa e da necessidade de mais um encontro pre-
sencial, desse GT, antes de ter a pesquisa consolidada;
• Troca de informações com outras pesquisas que estão sendo
realizadas como forma de auxiliar e fortalecer a rede de pes-
quisadores sobre o PCV;
• A necessidade de se fazer um levantamento dos trabalhos es-
critos sobre o Programa Cultura Viva e os Pontos de Cultura.
Ressalte-se que todos esses pontos foram sendo incorporados
ao ao longo da pesquisa, o que pode ser verificado nesse relatório.
Após cerca de três meses de leitura e discussão de textos, no
mês de Agosto, quando chegaram os equipamentos solicitados 21, ini-
ciamos o treinamento da parte técnica, que consistiu na leitura de
textos básicos sobre fotografia, a manipulação dos equipamentos, e
treinamento de software a ser utilizado.
Seguindo o espírito do Programa Cultura Viva, utilizamos so-
mente software livre para a manipulação, edição e criação de conteú-
do, dando preferência a programas que rodem nas principais platafor-
mas disponíveis (Linux, Mac, Windows). Os programas escolhidos
foram: LibreOffice (edição de texto); Audacity (edição de áudio);
Gimp (edição de imagem); Irfanview (edição e renomeamento de
imagens). Juntamente com o treinamento dos softwares, foi criado
um arquivo contendo o processo de padronização do uso desses
softwares, assim como indicações de uso da máquina de fotografia
digital.
21 Uma câmera de fotografia Nikon D5300, um gravador de áudio Zoom H4n, um tripé, dois
computadores laptops, um desktop e uma impressora.
65
Após cerca de um mês de treinamento com os equipamentos,
quando cada uma das bolsistas teve a oportunidade de levar para sua
residência e testá-los das mais diversas formas, passamos para a par-
te prática de entrevistas. Esse teste envolveu uma bolsista para dirigir
a entrevista enquanto duas outras se revezavam na gravação do áu-
dio, vídeos e fotos. Esse pequeno teste se mostrou essencial para dis-
cutirmos sobre os problemas enfrentados durante essa vivência etno-
gráfica, assim como o resultado dos processos de gravação de áudio
e vídeo, antecipando uma situação que elas vivenciariam mais tarde.
Ainda nesse mês de Agosto de 2014, pudemos participar da
Reunião da Comissão Nacional dos Pontos de Cultura com o MinC,
que aconteceu nos dias 25, 26 e 27. Nesse momento, os demais parti-
cipantes do projeto puderam ter o primeiro contato com pessoas que
participavam ativamente do PCV. Acompanhamos as discussões le-
vantadas durante as reuniões e realizamos algumas entrevistas como
forma de pôr em prática o treinamento realizado previamente. Duran-
te tais entrevistas, tentamos focar na forma que os PC dos entrevista-
dos contribuíram para suas comunidades. No decorrer da análise des-
sas entrevistas preparatórias, pudemos corrigir alguns erros de manu-
seio de equipamento e de condução da entrevista, que tentamos evi-
tar em nossa pesquisa de campo.
Após essa primeira fase de preparação, iniciamos a fase de
pesquisa de campo.
Sua preparação não foi tão simples quanto prevíamos, pois a
maior parte dos dados que conseguimos a respeito dos Pontos de
Cultura do Distrito Federal e demais Estados do Centro Oeste, esta-
vam defasados. Dessa forma, muito tempo foi perdido tentando des-
cobrir quais os Pontos que estavam ativos e como contatá-los.
Nessa segunda fase conseguimos contatar e visitar oito Pontos
de Cultura no Distrito Federal. Em relação às viagens interestaduais,
essas foram mais proveitosas, sendo que foram visitados três Pontos
no Mato Grosso do Sul, quatro Pontos no Mato Grosso, e três de
Goiás. Dessa forma, a pesquisa de campo finalizou com a visita a de-
zoito Pontos de Cultura.
66
A terceira fase foi caracterizada pelo estudo mais aprofundado
do FIB, análise dos dados a partir de seus domínios, e escrita desse
texto final.
Metodologia
22 Por exemplo, a distância do centro de Brasília para as quatro cidades de Goiás que a
circunda são: Planaltina (Norte) 55km; Águas Lindas (Oeste) 40 Km; Valparaíso de Goiás
(Sul) 40km; Emater Jardim (Leste) 80km.
67
mos testar não só a construção de uma logística que desse conta de
todas as visitas programadas dentro de um certo espaço de tempo (foi
definido uma semana para cada viagem interestadual), como vivenci-
ar realidades que se mostraram bem diferentes daquelas encontradas
dentro do Distrito Federal.
Inicialmente, dois critérios principais foram eleitos para a es-
colha dos PC a serem pesquisados nesse projeto piloto. O primeiro
critério levava em consideração o tipo da ação desenvolvida nesses
PC, escolhendo ao menos um PC relacionado a um dos Grupos de
Trabalho ativos na Comissão Nacional dos Pontos de Cultura. Outro
critério de escolha seria o tempo de existência do PC, incluindo des-
de aqueles que se conveniaram ao MinC entre os anos de 2004 a
2007 (primeira fase de implantação do programa), a pontos que se
conveniaram durante a fase inicial de federalização do programa
(2008 a 2010), e pontos que tenham sido contemplados a partir de
2011 até o presente.
A metodologia foi baseada na pesquisa de campo etnográfica,
realizada em cada um dos Pontos de Cultura contatados. Para alcan-
çar esse objetivo, nós contamos com seis bolsistas: Duas de mestrado
e quatro de graduação.
Uma vez que conseguíamos contatar algum dos pontos, marcá-
vamos as entrevistas, que eram sempre realizadas por dois pesquisa-
dores. Essa metodologia foi utilizada para que um pesquisador ficas-
se encarregado da parte técnica de gravação de áudio, vídeo e fotos,
enquanto o outro poderia se concentrar mais diretamente na entrevis-
ta em si. Tais visitas foram pensadas para ser realizadas em três eta-
pas:
1. Num primeiro momento os pesquisadores iriam visitar o PC,
e fazer um levantamento de suas ações, intenções e sua es-
trutura física. Nessa etapa, seria realizada uma listagem de
alguns participantes de oficinas e ações contínuas do PC, e
escolha de alguns desses para serem entrevistados;
68
2. Na segunda parte seriam realizadas visitas à escolas e entor-
no do PC, para descobrir se a comunidade local se relaciona-
va com o mesmo e se essa relação trouxe algum benefício à
comunidade;
3. Na terceira parte seriam realizadas entrevistas com alguns
participantes das ações promovidas pelo PC pesquisado, as-
sim como seus familiares, com a intenção de descobrir se a
formalização do PC teve algum impacto sobre seu modo de
vida.
Como instrumentos de coleta de dados, foram realizadas:
1. Pesquisa bibliográfica e revisão do Estado da Arte, levando
em consideração pesquisas sobre Pontos de Cultura;
2. Observação das estruturas físicas, ambientes e contexto no
qual o PC está localizado;
3. Entrevista semiestruturada com gestores dos PC, professores,
palestrantes e oficineiros, participantes e familiares;
4. Gravações de áudio das entrevistas realizadas nos diferentes
espaços, com o intuído de analisar e revisar o discurso dos
entrevistados;
5. Gravações de vídeo, tendo como objetivo registrar as entre-
vistas realizadas e poder analisar, posteriormente, as reações
corporais aos estímulos verbais durante a entrevista;
6. Registros fotográficos, captando aspectos gerais do ambiente
e do contexto dos PC;
7. Diário de campo, documento no qual o pesquisador iria es-
crever suas impressões sobre cada momento da pesquisa de
campo, de forma intencionalmente subjetiva e pessoal.
Para a documentação e análise do processo foi muito impor-
tante o recurso audiovisual. Esses registros, além de ampliarem as
possibilidades analíticas, serviram como importante ferramenta para
ilustrar e complementar aspectos descritos nos textos gerados a partir
69
do trabalho, como o relatório técnico-científico, publicação de arti-
gos, apresentação do trabalho em congresso, e publicação final do re-
latório.
Uma das ações definidas foi que, após cada pesquisa de cam-
po, todo bolsista participante iria, dentro de uma semana, escrever
um diário de campo com sua percepção sobre o PC e sobre as entre-
vistas. Foi orientado que esse diário de campo fosse intencionalmen-
te subjetivo. Por fim, o bolsista responsável pela parte técnica naque-
la visita, também teria que, em uma semana, transferir todos os ar-
quivos de áudio, vídeo e fotos, para pastas individuais no computa-
dor de mesa de uso coletivo da equipe.
Para organizar tais arquivos no computador, foi escrito um tu-
torial com o processo de padronização dos nomes, abaixo exemplifi-
cado:
1. Todo arquivo deve ser nomeado sem espaço e sem pontuação:
Ex: Foto-Aniversario-Joao.JPG
2. O nome dos arquivos devem seguir a seguinte padronização:
Data-Sobrenome-Tipo-Local-numeração
3. A data deverá ser na seguinte ordem: Ano, Mês, Dia. Usar so-
mente dois dígitos para ano, sem espaço entre os números.
Ex: 24 de Julho de 2014 = 140724.
4. O sobrenome será de quem foi responsável pelo arquivo. Por ex-
emplo, quem criou o arquivo, quem tirou a foto ou quem filmou
o vídeo. Exceção será feita à gravação de entrevista. Nesse caso
o sobrenome será de quem está entrevistando e não de quem gra-
vou a entrevista.
70
5. Os tipos de arquivos deverão ser resumidos usando as seguintes
siglas:
a) Fotos = FTO
b) Audio = AUD
c) Vídeo = VDO
d) Entrevista = ENT
e) Resenha = RSN
f) Diário de campo = DdC
g) Transcrição de Entrevista = TRC_ENT
h) Transcrição de Vídeo = TRC_VDO
6. O local também será abreviado. Se o contexto da foto ou grava-
ção não tiver uma sigla já disponível, nova abreviatura será cria-
da e inserida no arquivo de padronização. No caso dos Pontos de
Cultura, iniciarão com a sigla PC, seguida de um traço baixo, e
uma sigla para o nome desse Ponto de Cultura específico. Se já
houver, usar. Senão, criar um. Exemplos:
a) UnB
b) TEIA
c) Ponto de Cultura Circo Boneco e Riso = PC_CBR
d) Coral de 100 Vozes = PC_C100V
7. A numeração utilizará sempre três dígitos, começando com dois
zeros à esquerda:
a) 001, 002, 003
b) 043, 044, 045
c) 123, 124, 125
8. Diário de campo não precisa de numeração de três dígitos.
71
9. Casos omissos foram tratados ao longo da pesquisa. Segue abai-
xo alguns exemplos de nomes de arquivos completos.
a) 140724-Rocha-ENT-Camelo-UnB-001.mp3
b) 140717-Oliveira-FT-Reuniao-UnB-001.jpg
c) 140717-Pederiva-DdC-UnB.odt
Além da transferência dos arquivos, deveria ser realizado o
processo de transcrição das entrevistas, dividido entre os pesquisado-
res presentes na entrevista. Contudo, as entrevistas realizadas não
precisavam ser completamente transcritas. Bastava uma decupagem
simplificada do áudio, criando um quadro simples com três colunas
com as seguintes sugestões:
1. A primeira coluna, à esquerda, mostra somente o início do assun-
to abordado, com o seguinte formato: hora:minuto:segundo. A
coluna do meio deve ser utilizada para informar o assunto que o
entrevistador iniciou, seja através de pergunta ou tema abordado.
A terceira coluna, à direita, para dar uma ideia da resposta, desta-
cando palavras chave.
2. A página do arquivo de decupagem deve ser formatada para a
orientação “paisagem”, de modo que cada coluna teria um tama-
nho maior.
3. Deve-se evitar escrever demais dentro de uma mesmo quadrado.
Se houver texto demais é por uma das seguintes razões:
a) Não está sabendo reduzir as informações para palavras chave
ou;
b) Não está decupando suficientemente.
4. Às vezes um mesmo assunto levantado pelo entrevistador pode
gerar diversas linhas de decupagem, de forma a facilitar o traba-
lho futuro de retornar ao ponto exato que o entrevistado falou so-
bre determinado assunto.
72
5. Uma vez que a entrevista for completamente decupada, quando
for necessário, o pesquisador poderá retornar ao ponto exato que
achar interessante, e transcrever literalmente o que estiver sendo
dito. Todavia, essa transcrição literal só será necessária para fins
de citação literal no seu texto.
Para realizar a decupagem foi sugerido o uso do programa Au-
dacity, para ter maior controle do momento de parar ou, inclusive,
para recortar a entrevistas em diversas partes, gerando arquivos me-
nores, de forma a facilitar o acesso a partes diferentes da entrevista.
No caso de arquivos múltiplos para uma mesma entrevista, uma divi-
são no quadro será criada para indicar o início de um novo arquivo.
Segue exemplo de um quadro de decupagem simplificado:
Arquivo: 141030-Sousa-Entrevista-CongoNya.mp3
Tempo Perguntas Resposta
0:00:07 Que tipos de atividades são Começamos entre 2002 e 2003 com o
desenvolvidas no ponto? reforço escolar, que continua até hoje e
a comunidade precisa. Atividades
esportivas, mas terminamos em 2005...
Vôlei, Karatê, Capoeira. Depois
decidimos investir só na cultura, mais
ainda cultura afro.
0:07:50 Vocês são rastafári em termos de Sim.
religião também?
0:12:27 Essas coisas todas que você fala de Nos congressos, seminários.
sua cultura, que você conhece, você
trabalha essas ideias com as pessoas
que frequentam o ponto?
0:12:36 São crianças que participam, ou não, Tem toda idade. Havia muitos
tem gente de toda idade? universitários que vinham por causa da
atividade musical, mas não
desenvolviam muito outras ações,
agora a realidade é outra.
73
Resultados obtidos
74
Capítulo 4 – Felicidade Interna Bruta (FIB)
75
partir de 2005 o Centro de Estudos Butão (CBS) envolveu nove
pesquisadores no desenvolvimento de indicadores para o FIB. No
cumprimento de sua responsabilidade em desenvolver tais indica-
dores, o CBS realizou extensas consultas em vários níveis, que
vão desde reuniões particulares com funcionários do governo e
funcionários públicos, até grupos focais de discussões com os ci-
dadãos butaneses. (URA et al, 2012, p. 13)
76
Há um excelente texto da área de economia, que inicia com
uma crítica à própria área, para depois discutir como “o interesse
pela felicidade penetrou na disciplina” (FRANCO, 2011, p. 3). Essa
análise utilizou estudos do Banco Mundial que identificavam a dis-
paridade entre crescimento econômico em relação à ampliação da
pobreza e da desigualdade. E a partir de uma reflexão de Amartya
Sen26, o autor reconhece que “as comparações entre países deixam
apenas mais evidente a dificuldade conceitual em se comparar níveis
subjetivos de satisfação” (p. 13).
Sua análise sobre a relação entre o desenvolvimento econômi-
co e percepção de felicidade corrente e futura (em cinco anos) nos
países formadores do BRICS, mostra uma diferença muito grande
entre o Brasil e demais países, o que fez o autor questionar a chama-
da “falta e competitividade” do Brasil causada por suas leis trabalhis-
tas e sistema tributário. Para o autor não se deve olhar o assunto so-
mente sob o viés econômico, devendo-se levar em consideração
se as respectivas populações estão confortáveis em sacrificar
competitividade por segurança no trabalho e rede de proteção, ou
desconfortáveis, a despeito de competitivas, pela ausência desses
“custos da democracia”. Na raiz deste debate está um velho e pe-
rigoso tema, a suposta eficiência dos modelos de crescimento ba-
seados em autoritarismo, ou na mobilização intensiva de recursos
em detrimento de preocupações sociais e humanitárias que po-
dem ser prejudiciais à velocidade do progresso. Será que os indi-
cadores de felicidade podem acrescentar alguma informação a
este debate? (FRANCO, 2011, p. 16)
Para esse autor, a análise dos dados levanta ainda outras ques-
tões, tais como:
O que haveria de singular na experiência brasileira a indicar que
os brasileiros sejam muito mais felizes que os chineses, russos e
indianos, mesmo com o crescimento médio inferior? Os índices
de felicidade estariam a apontar para aspectos positivos do mode-
77
lo de crescimento brasileiro que não se encontram presentes nos
outros países do grupo BRIC? (FRANCO, 2011, p. 17)
78
do de absoluta pobreza e miséria até o atendimento das suas ne-
cessidades de sobrevivência, e desse nível de sobrevivência até
uma vida confortável, e depois de uma vida confortável até um
certo grau de luxo, sua felicidade de fato aumenta. Contudo, após
um certo ponto, mais bens materiais não trazem mais satisfação.
O que importa a esta altura são os chamados “fatores não-materi-
ais”, tais como companheirismo, famílias harmoniosas, relaciona-
mentos amorosos, e uma sensação de se viver uma vida significa-
tiva. (ANDREWS, 2008, p. 1)
79
governo, empresas, cidadania e universidade. (Sugestões para a
implementação do FIB, p.1).
80
Há pontos de cultura que trabalham em prol do desenvolvimento
cultural e social da comunidade, interferindo na educação da lo-
calidade em que está inserido, por meio da parceria com a escola
pública; no posto de saúde, com o trabalho das raizeiras e a fabri-
cação de remédios caseiros; no funcionamento do turismo e do
comércio locais, por meio da venda de produtos artesanais, orga-
nizações de shows e apresentações artísticas que movimentam a
cidade; entre outras. Este é o caso de um dos pontos pesquisados,
que tem como compromisso primeiro o desenvolvimento e a
transformação da realidade do lugar em que está inserido. (CUL-
TURA VIVA, 2011, p. 36)
81
mente, atualizado, em 2010. Esse questionário é bastante extenso 28, e
a metodologia de análise dos dados tem um embasamento estatístico
muito sólido. Jigmi Thinley, 1º Ministro do Butão, explica o motivo
do FIB ter dado certo em seu país:
O real alinhamento do roteiro para desenvolvimento holístico e
sustentável no meu país foi executado metodicamente, sob a clara
luz do FIB, através do reinado do Quarto Rei. Isso foi feito prin-
cipalmente através da formulação de leis e políticas públicas para
esse fim. Acreditando na primazia da deliberação pública, do diá-
logo público e da opinião pública na definição de qualquer meta
nacional. Sua Majestade assegurou-se de que o FIB ganhasse
apoio e a sensação de propriedade pública consensual, não tanto
pela persuasão, mas por causar introspecção (CONFERÊNCIA
INTERNACIONAL SOBRE FIB, 2009, p.2).
82
ce de acerto de 95%, com somente 5% de margem de erro. Trata-
se, portanto, de um processo bem simples (você não precisa ser
um estatístico para executá-lo!), que por sua vez garante a credi-
bilidade para governos, empresas e mundo acadêmico. Usando
essa abordagem de diagnóstico, pode-se corretamente analisar as
reais necessidades de uma comunidade como um todo - e não
simplesmente as demandas colocadas pelos membros mais proe-
minentes ou politicamente mais bem relacionados. A positiva res-
posta das pessoas aos projetos-piloto, quando apresentadas com
os resultados do levantamento feito em suas comunidades, mos-
trou que essa metodologia mobiliza um autodiagnostico correto
que é entusiasticamente recebido pelas pessoas como sendo um
espelho da sua real situação.
83
surar o a noção de progresso (DURÃO, 2012), ou da abordagem ho-
lística do ser humano (TEIXEIRA, 2009). A área de Direito também
tem produzido alguns artigos onde o foco principal é direito à felici-
dade, reconhecendo a existência do FIB mas sem, necessariamente,
utilizá-lo (DIAS, 2012; ZAMONER, 2012; LEAL, 2013; RO-
DRIGO-MARTINEZ; MAMED, 2014; SIMÕES e HORITA, 2014).
Uma das áreas que tem utilizado o FIB como referência é a ad-
ministração, seja em ambientes corporativos, na relação com meio
ambiente, ou políticas públicas.
O texto de Turisco e Kirschner (2011), por exemplo, discorre
sobre a premissa de que uma empresa socialmente responsável deve
construir relações com seus funcionários a partir de valores e ideais
ligados à Responsabilidade Social Corporativa (RSC), um conceito
advindo da sociologia da empresa. A lógica é simples:
Sabe-se que os indivíduos passam a maior parte de suas vidas no
trabalho. Assim, não há como se manter a produtividade de uma
empresa sem pensar na qualidade de vida de seu trabalhador. É
fato que as empresas determinam e influenciam o modo de vida
do homem, exercendo, portanto, importante influência em sua
busca pela felicidade. (TURISCO; KIRSCHNER, 2011, p. 158)
84
na receita, produtividade e lucro das empresas.” (TURISCO; KIRS-
CHNER, 2011, p. 162)
O artigo de Carvalho, Gonçalves e Pardini (2010) aborda con-
ceitos próximos ao de Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) e do
FIB, que são o da Utilidade de Bentham (1979) e ideia do “bem estar
subjetivo” (BES). Ao se referir ao FIB e à pesquisa que informa o
reino do Butão em oitavo lugar entre 178 países, quando o assunto é
a felicidade média de sua população, apesar de ter uma renda per ca-
pita baixa, os autores se questionam: “Seria este resultado surpreen-
dente uma consequência da administração pelo FIB ao invés do
PIB?”
Já o estudo de Bueno et al. (2014) foi mais específico e utili-
zou o FIB como um dos referenciais para o controle da qualidade de
vida no ambiente corporativo em sua pesquisa em uma grande em-
presa paranaense da área de comunicação. Sua conclusão foi que “Os
dados coletados e analisados no presente trabalho remetem à consta-
tação da eficácia do projeto de pesquisa de clima organizacional
como ferramenta para diagnóstico e implantação de melhorias foca-
das em resultado.” (BUENO et al., 2014, p. 9)
Alguns textos da área de meio ambiente também se destacam
no uso do FIB. A pesquisa de Borelli e Torres (2014) faz uma boa re-
visão do que foi escrito sobre o FIB nacional e internacionalmente,
mas concentra-se no tópico sobre o desenvolvimento sustentável.
Sua metodologia utiliza equações estatísticas para análise dos dados.
Em sua análise as autoras questionam a “eficiência do PIB como me-
dida de bem-estar econômico e social” (p. 12). Tal restrição de efici-
ência do uso do PIB foi encontrada nos demais grupos analíticos do
estudo. Por fim, concluem que,
Desse modo, pode-se dizer que a metodologia apresentada pelo
FIB surge com o intuito de complementar os indicadores existen-
tes, acrescentando à análise de bem-estar social variáveis não
consideradas pela economia neoclássica: torna-se necessário
acrescentar a variável ambiental, que, como indicado nos resulta-
85
dos obtidos, demonstra grande representatividade nesse contexto
mais geral de qualidade de vida. (BORELLI; TORRES 2014)
86
se texto não é apresentado nenhum dado, nem resultado da pesquisa.
(ITO et al., 2014).
Curiosamente, na publicação seguinte desse mesmo periódico
(Vol. 10, N. 2), uma pesquisa muito semelhante, mas que parece não
ter nenhuma relação com o texto anterior é publicada. Nessa pesqui-
sa os autores utilizam o questionário disponibilizado pela Happiness
Initiative30, que tem um domínio a mais (experiência de trabalho)
que o criado pelo Centro de Estudos do Butão. O questionário foi
“adaptado para a realidade dos estudantes da Unicamp, incluindo as-
sim perguntas específicas do ambiente universitário que são equiva-
lente a peguntas realizadas em outros tipos de ambientes.” (VALEN-
TIM et al., 2014, p. 4). Esse questionário foi disponibilizado em
meio eletrônico durante os meses de maio e junho de 2014, tendo
sido obtidos 509 respostas dentre os mais variados cursos. O resulta-
do foi analisado tanto a partir de cada categoria de felicidade, cada
domínio ou por área de estudo, chegando à conclusão de que o nível
de felicidade da Unicamp não é muito alto, “e isso é no mínimo curi-
oso, dado que o ambiente fornece liberdades não encontradas em ou-
tros lugares.” (p. 6).
Outro exemplo de utilização específica do FIB para aferição
de uma dada comunidade é o artigo de Sales et al. (2013). A pesquisa
foi realizada na cidade de Lavras-MG, com moradores de todas as re-
giões da cidade, e de forma proporcional, “pessoas de todas as clas-
ses sociais, dos gêneros masculino e feminino, com idade entre 16 e
65 anos, e que possuíssem do mais baixo ao mais alto nível de esco-
laridade.” (SALES et al., 2013, p. 70), num total de 403 questionári-
os. Esse artigo traz uma boa revisão do conceito de indicadores
econômicos e sociais, aborda a criação do FIB, e faz uma clara expli-
cação sobre cada um de seus indicadores. Em seguida explica a me-
todologia de aplicação e análise do questionário adaptado. Por fim,
com os dados em mãos, foi realizada uma análise de variância de
acordo com a região da cidade; sexo, idade e escolaridade.
87
Há de se destacar também a atuação do Grupo de estudos so-
bre Inovação, Desenvolvimento e Sustentabilidade (GIDS) da Uni-
versidade Federal da Paraíba, que tem produzido textos a partir dos
indicadores do FIB, seja relacionando-o com o PIB e o IDH (RIBEI-
RO NETO; GOMES, 2013), comparando-o com o o modelo de aná-
lise da Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) elaborado por Richard
Walton (SANTOS et al., 2013), ou aplicando-a no contexto corpora-
tivo, cunhando a noção de Felicidade Interna Laborial – FIL , que
pode ser ampliada “para as dimensões social, acadêmica, familiar e
pessoal, que receberiam respectivamente as siglas FIS, FIA, FIF e
FIP” (RIBEIRO NETO et al., 2013).
Por fim, há a excelente tese de doutorado em Direito de Saul
Tourinho Leal (2013), defendida na PUC-SP. Seu texto, intitulado
Direito à felicidade: História, Teoria, Positivação e Jurisdição, faz
um levantamento profundo sobre o conceito de felicidade pelos filó-
sofos, de Sócrates a Schopenhauer. Tem um capitulo dedicado so-
mente a Jeremy Benthan e o conceito de utilitarismo, e outro capítulo
dedicado a Stuart Mill. Nos interessa bastante sua análise sobre a
“deturpação da teoria da felicidade no Reino do Butão” realizada no
capítulo quinto. Assim inicia seu capítulo:
A ideia de um direito à felicidade ou de uma teoria da felicidade
não pode abrir portas para exageros, muito menos para demago-
gias ou manipulações. É importante que saibamos situar bem a
questão da felicidade como objetivo do constitucionalismo, sob
pena de desvirtuarmos essa doutrina e criarmos um discurso legi-
timador perigoso. Não podemos dirigir os estudos sobre a teoria
da felicidade de modo a enfraquecer suas premissas em razão da
utilização incriteriosa de seus ensinamentos. (LEAL, 2013, p.
107)
88
a partir da década de 198031, existem diversas críticas ao que cha-
mam de “autoritarismo da felicidade”, e o não reconhecimento dos
direitos das minorias nepalesas, inclusive expulsando-as do país 32:
Segundo a Constituição, com a finalidade de concretizar um dos
pilares da felicidade fixada pelo governo, a cultura do país deve
ser preservada a qualquer custo. Nessa linha, uma lei determina
que os cidadãos obedeçam ao código de vestimenta nacional e, ao
entrarem em prédios públicos, durante o dia, usem as roupas ex-
postas no Código. Também há restrições à liberdade acadêmica
ou a eventos culturais. A legislação proíbe que pessoas não-buta-
nesas casadas com butaneses promovam qualquer religião dife-
rente do budismo. Uma lei aprovada em 1992 proíbe a crítica ao
rei e ao sistema político. O relacionamento entre pessoas do mes-
mo sexo é crime. O Governo restringiu a posse de meios de co-
municação e de licenciamento de jornalistas. Ele monitora a in-
ternet e bloqueia o que considera pornográfico. Há cerca de
30.000 usuários da Internet (0,4% da população) durante o ano33.
(LEAL, 2013, p. 112)
31 BOK, Derek. The politics of happiness: what government can learn from the new research
on well-being. Princeton: Princeton University Press, 2010, p. 3.
32 O principal texto crítico apresentado é: VARENNES, Fernando. Constitutionalising
discrimination in Bhutan: The emasculation of human rights in the Land of the Dragon.
Asia-Pacific Journal on Human Rights and the Law 2: 47-76, 2008.
33 Amnesty International, Bhutan: Forcible E-ile. Al Index - ASA 14/04/94, August 1994.
89
Domínios do FIB
90
BEM-ESTAR PSICOLÓGICO
91
do Ponto de Cultura pode ter contribuído para que as pessoas tives-
sem acesso a situações que os impactassem nesse domínio. Tais as-
pectos podem ser identificados explicitamente, por exemplo, quando
um participante diz que se sente mais confiante de entrar no mercado
de trabalho por causa de um curso que fez no Ponto de Cultura, ou
indiretamente, quando deixa subentendido que seu Bem-Estar Psico-
lógico melhorou depois da instituição do Ponto de Cultura. Outras si-
tuações podem ocorrer quando, ao participar de determinadas pales-
tras ou cursos, a pessoa passe a repensar o que signifique qualidade
de vida, e passe a avaliar de forma diferente questões como a autoes-
tima ou se está satisfeito/insatisfeito com sua vida.
Talvez o aspecto mais desafiador a seja medir “espiritualida-
de”, pois embora ele seja um conceito mundialmente aceito, não
existe consenso em como defini-lo ou medi-lo. Existem algumas ca-
racterísticas comumente concatenadas com o termo, tais como: al-
truísmo, abnegação, compaixão, paz, um senso de propósito e co-
nectividade35.
SAÚDE
92
outros domínios. Da mesma forma, o equilíbrio emocional e a es-
piritualidade também foram incluídas em “bem-estar psicológi-
co”. Como resultado, os indicadores de saúde neste domínio des-
crevem apenas os aspectos físicos e mentais. (URA et al., 2012,
p. 134)
EDUCAÇÃO
93
rios fatores, tais como: participação, competências e apoio educa-
cional, entre outros. Esse domínio inclui no seu escopo a educa-
ção informal (competências nativas, técnicas tradicionais orgâni-
cas de agricultura e pecuária, remédios caseiros, genealogias fa-
miliares, conhecimento sobre a cultura e história locais), e educa-
ção monástica37 (URA, [2008?], p.4).
94
CULTURA
95
pectos culturais requer fomento e melhorias contínuas no sentido
de desenvolver uma resiliência adequada. (URA, 2012, p. 148).
96
ção e sistematização de fontes históricas (produções audiovisuais,
bibliotecas, museus).
USO DO TEMPO
97
não sendo possível determinar padrões de sono para recortes especí-
ficos da sociedade. A atenção dada às horas reservadas ao sono e ao
lazer pessoal e familiar afeta diretamente na regulação das leis traba-
lhistas.
Para a pesquisa, importou saber se as ações do Ponto de Cultu-
ra tiveram alguma influência na forma como a pessoa passou a orga-
nizar seu tempo entre trabalho, lazer e família.
BOA GOVERNANÇA
38 “In an effort to reflect much of the principles mentioned above, four measures were
developed to signify effective and efficient governance. These include fundamental rights,
trust in institutions, performance of the governmental institutions and political
participation. [...] are understood as part of governance and a part of the public services to
be provided by the government. It also includes fundamental rights to vote, freedom of
speech, join a political party, to be free of discrimination and a perceptual indicator on
government performance” (URA et al., 2012, p. 155).
98
Se a felicidade coletiva for uma visão a ser buscada principal-
mente através de verbas governamentais, o nosso sistema fiscal
tem que ser coerente com esse objetivo. Todavia, se as alocações
orçamentárias, a legislação, os impostos e outras medidas de na-
tureza fiscal forem baseadas em um critério convencional, des-
provido de considerações relacionadas ao FIB, essa busca seria
fútil, uma vez que os resultados seriam inconsistentes com o FIB.
Isso torna forte o caso de uma fórmula para o orçamento nacional
e para um processo que seja radicalmente diferente, e dê aos con-
tribuintes incentivos para que busquem o FIB. Tais atividades,
como aquelas que promovam a formação de capital social, tecno-
logia “verde”, integridade familiar, etc., mereceriam portanto
uma consideração especial. (Discurso do Exmo 1º Ministro do
Butão, Sr. Jigmi Thinley, p. 10).
99
Quanto à eficiência governamental em outras áreas, as pessoas
qualificam as áreas de emprego, igualdade, educação, saúde, comba-
te à corrupção, meio ambiente e cultura nos últimos doze meses 39.
Para o interesse da pesquisa, nos concentramos em identificar
como os entrevistados se sentem em relação ao investimento gover-
namental nas áreas de cultura, e se os Pontos de Cultura suprem al-
guma deficiência que poderia/deveria ser do ente público. Esse domí-
nio está diretamente relacionado com a percepção sobre as políticas
públicas e o papel dos PC nessa intermediação.
VITALIDADE COMUNITÁRIA
100
to com a comunidade, o qual trata da socialização e do senso de co-
munidade; relações familiares, sendo que os autores não conceituam
o que vem a constituir um elo familiar; e percepção de segurança,
que contabiliza se os indivíduos foram vítimas de algum crime no
ano que precedeu a pesquisa (URA et al., 2012, p. 161).
O domínio da vitalidade comunitária foca nas forças e nas fra-
quezas dos relacionamentos e das interações nas comunidades.
Ele examina a natureza da confiança, da sensação de pertenci-
mento, a vitalidade dos relacionamentos afetivos, a segurança em
casa e na comunidade, a prática de doação e de voluntariado. Es-
ses indicadores possibilitarão aos formuladores de política públi-
ca rastrear as mudanças nos efeitos adversos para a vitalidade co-
munitária (URA, [2008?], p.5).
101
MEIO AMBIENTE (DIVERSIDADE ECOLÓGICA)
PADRÃO DE VIDA
102
Ao invés disso, trabalha com valores que encorajam as pessoas a al-
cançar a felicidade através de suas realizações, desencorajando uma
abordagem em que se está satisfeito apenas com a maior quantidade
de renda (ou outras conquistas) do que seus pares41.
Coincidindo com esse posicionamento, o relatório Stiglitz-
Sen-Fitoussi (2009, p. 13) afirma que, embora seja informativo ras-
trear o desempenho das economias como um todo, as tendências nos
padrões de vida material dos cidadãos são mais bem acompanhadas
através de medidas de rendimento do agregado familiar e seu consu-
mo. Os bens contabilizados levam em consideração o contexto socio-
cultural, e por isso vão de celulares, rádios e bicicletas a gado e pro-
priedade de terra (URA et al., 2012, p. 171).
O indicador utiliza dados sobre os recursos domésticos seleciona-
dos, como bens duráveis e semiduráveis de uso diário, para des-
crever o bem-estar das famílias. O conceito é baseado em evidên-
cias de que medidas de renda/despesas são medidas incompletas
do bem-estar material das famílias, especialmente nos países em
desenvolvimento, onde esses dados podem ter erros de medição
mais elevados. (URA et al., 2012, p. 170)
41 “For the GNH Index, it would not be sensible to use the poverty line as a threshold
because the threshold should reflect sufficient income. The GNH living standards domain
refers to higher conditions for wellbeing than poverty lines […]. For the GNH indicator
an absolute sufficiency threshold was chosen, since the GNH values encourages people to
achieve happiness through their accomplishments, and discourages a relative approach in
which one is satisfied only if one has relatively more income (or other achievements) than
one’s peers.” (URA et al., 2012, p. 169).
103
existência de um ponto de internet ou biblioteca comunitária, pode
dar acesso a informações que transformem a vida econômica de um
participante do Ponto de Cultura.
Resumo
104
Domínio Referências no discurso
Uso do Tempo Se houve alguma influência na forma como a
pessoa passou a organizar seu tempo entre
trabalho, lazer e família.
Boa Governança Percepção do investimento governamental nas
áreas de cultura, e se os Pontos de Cultura
suprem alguma deficiência que poderia/deveria
ser do ente público.
Vitalidade Comunitária Sentimento de pertencimento, importância e
compartilhamento de um projeto comum que irá
satisfazer as necessidades da comunidade por um
compromisso coletivo; marginalização; falta de
respeito; violência; mudança positiva nas
comunidades.
Meio Ambiente Práticas de reciclagem; preservação da
(diversidade ecológica) biodiversidade; sistemas e ações que possam
diminuir a poluição e o lixo produzido
individualmente.
Padrão de Vida Como os Pontos de Cultura podem auxiliar as
pessoas a aumentar seu nível econômico: acesso
à informação (ponto de internet ou biblioteca
comunitária); cursos profissionalizantes, que os
auxiliem a se inserir no mercado de trabalho, ou
mesmo, através de cursos de atualização,
conseguirem avançar em sua carreira.
105
PARTE 2 – ANÁLISE DOS
PONTOS DE CULTURA
Interarte – COEPi (GO)
Introdução
42 Essa associação possui um site atualizado e muito bem organizado, no qual é possível ter
acesso a diversas informações, como o histórico detalhado, a equipe responsável. oficinas,
projetos, eventos, e prêmios recebidos, entre outros. O endereço é
<<http://www.coepi.org.br/>>.
109
com Patrícia Ferraz43, a COEPi foi fundada em 11 de Outubro de
1996, na cidade de Pirenópolis-GO, por um grupo de pessoas que vi-
eram morar nessa cidade, e estavam preocupadas com a educação
dos seus filhos. Até a aquisição e construção de sua sede, que ocorreu
no ano de 1999, eles atuavam em parceria com as escolas, realizando
palestras e oficinas. Suas principais atividades eram voltadas para a
educação complementar e envolvia temas diversos como reciclagem,
meio ambiente, e artes em geral.
Com a construção das primeiras salas da sede (sala Baru e sala
Ipê), entre 2000 e 2003, funcionou como escola de educação infantil,
fundamentada na pedagogia Waldorf44 juntamente com as atividades
complementares. No ano de 2000, é criada a categoria de Bolsa-
padrinho: contribuição de pessoas físicas, para viabilizar o funciona-
mento da escola. Para a participação de pessoas da comunidade que
não tinham capacidade de pagar uma mensalidade foram dadas bol-
sas de estudo. Essa situação de escola de educação infantil e associa-
ção com atividades complementares perdurou até o fim de 2003,
quando, em uma assembleia, decidiu-se que a COEPi iria atuar so-
mente como educação complementar 45.
Atualmente a sede conta com um espaço de três mil metros
quadrados, onde foram construídas quatro salas (Ipê, Pequi, Baru e
Oca da Terra), e um coreto. Na sala Ipê funciona a secretaria e uma
pequena biblioteca. Na sala Pequi, funciona o estúdio multimídia. A
sala Baru é voltada para as atividades coletivas, como aulas de Yoga,
43 Patrícia Ferraz é bióloga, e mudou-se para Pirenópolis em 2003 para morar no Instituto de
Permacultura e Ecovilas do Cerrado (IPEC - <<http://www.ecocentro.org/>>). Em 2006
passa a atuar na COEPi, exercendo os cargos de Diretora Financeira e Presidente em
diversas diretorias.
44 A Pedagogia Waldorf é baseada na Antroposofia, para quem “o que distingue o homem
dos outros seres da natureza é a sua capacidade de decidir sobre si mesmo e de fazer
escolhas conscientes. O propósito de uma Escola Waldorf é, portanto, formar indivíduos
em condições de zelar por sua liberdade, prontos a responder por suas decisões, de modo
a garantir não apenas o seu bem-estar pessoal, mas sua contribuição ao mundo.”
(FEDERAÇÃO, 2015)
45 A escola passou a funcionar em outro local, com o nome de Escola Pirilampo, e perdurou
até o ano de 2008, mantendo a pedagogia Waldorf.
110
Dança, Capeira, entre outras. Na sala Oca da Terra funciona um mini
museu do Cerrado, com exemplos da fauna e flora da região. Além
das salas ainda há um campo de areia para atividades esportivas, es-
paços para reciclagem e reaproveitamento da água, um forno para ce-
râmica, e um espaço chamado de Núcleo de Agroecologia, com a
proposta de desenvolver tecnologias de conservação e melhoramento
de solo, utilizando técnicas naturais - compostagem, minhocário, cur-
va de nível e adubação verde.
111
Em 2005 a COEPi participou do primeiro edital do Programa
Cultura Viva e, graças à organização financeira, recebeu todos os re-
cursos dentro do prazo de três anos estipulados (2005-2007), encer-
rando esse contrato com o MinC em 2008. Mesmo antes de entrar no
Programa Cultura Viva, a COEPi havia sido reconhecida como Orga-
nização Social Civil de Interesse Público46 (OSCIP) e firmado parce-
rias com diversos entes públicos, entre os quais o Ministério do Meio
Ambiente em 2004, para implementar a Sala Verde; e com o IBA-
MA, também em 2004, para implementar o Centro de Educação Am-
biental.
Seu projeto inicial para o PCV chamava-se Interarte e previa
oito oficinas: sucata, papel, barro, flauta, balé, bijuterias, mosaico e
informática, além de cursos de capacitação para professores da rede
pública. Entretanto, com a chegada dos recursos, conseguiram dupli-
car a oferta de oficinas, e atender uma média de mais de duzentas
pessoas de todas as faixas etárias da comunidade em geral.
Análise
112
doso e Silva49. Os três rapazes fazem parte do Coletivo Jovem Meio
Ambiente (CJMA), uma iniciativa independente, mas que tem uma
forte relação com a COEPi desde sua criação.
Uma das primeiras impressões que temos ao analisar as ações
desse Ponto de Cultura é que ele se destaca em muitos domínios do
FIB, sendo que, somente o domínio da saúde é comentado de forma
secundária, como reflexo de uma política da conservação de ervas
medicinais tradicionais.
Ao questionarmos sobre a diferença entre uma instituição pú-
blica e o fato da COEPi ser uma associação civil, no que diz respeito
à flexibilidade das atividades, Tadeu afirma que,
A COEPi tem uma vida, e com isso ela acolhe as pessoas. Quem
frequenta a COEPi está sempre sorrindo, de bem com a vida. Isso
é não é porque são os diretores que fazem isso. É o próprio espa-
ço que propicia isso. É um espaço que, se qualquer um quiser vir
aqui pegar um limão, pode vir e pegar um limão, e não vai ter
ninguém dizendo “Ei você não pode pegar um limão”.
49 Elismar Cardoso e Silva, tem dezenove anos e iniciou na COEPi há três anos. Diz que
está procurando fortalecer as raízes Afro. Por isso, começou a fazer capoeira Angola,
Teatro, entre outros.
113
Mas há diversos casos bem específicos, que ilustram como
essa associação mudou a vida das pessoas dessa comunidade. Há o
exemplo do Alex que, segundo Patrícia:
Iniciou pulando o muro da COEPI. Ele era hiperativo. Não con-
seguia fazer as oficinas. Ele pulava o muro, jogava bola, ia embo-
ra. Aí conseguimos trazer ele pra dentro. E ele começou a fazer
várias oficinas. Ele tentava sair, mas a gente insistia, que ele ia
continuar. Ele ficou. Ele virou diretor, estimulamos ele a fazer fa-
culdade. Teve uma época que ele tinha parado de estudar. Ele
voltou a estudar, fez Engenharia Ambiental. Agora, ontem, ele
saiu também da diretoria, como eu. (…) E a gente sabe que, só de
ver o próprio Alex e alguns outros que tiveram aqui com a gente,
e como hoje eles se transformaram. Ele veio de uma família alta-
mente fragilizada, emocionalmente. Irmão traficante, isso e aqui-
lo outro, e você vê a pessoa dizer “não, eu vou mudar”.
114
Atualmente há o projeto CRIARTE que, de acordo com o site
da instituição,
oferece ações socioeducativas para crianças e adolescentes, de 5
a 12 anos, que participam de atividades integradas em período
oposto ao da escola. Atualmente os alunos permanecem pela ma-
nhã ou tarde na COEPi, duas vezes por semana (segunda e
quarta-feira), das 8:30 às 11:00h e das 14:00 às 17:00h. (COEPI,
2015)
50 Também conhecida como cateretê, é uma dança da cultura popular brasileira, em que o
ritmo musical é marcado pela batida dos pés e mãos dos dançarinos.
51 “Evento mensal que tem por objetivo apresentar questões socioambientais relevantes de
forma descontraída e interativa, promovendo a troca de saberes entre artistas, cientistas,
mestres de tradição oral, estudantes e comunidade local. Como um atrativo lúdico para o
publico, são realizadas palestras seguidas de apresentações artísticas variadas, incluindo
desde shows musicais, exposições, até apresentações dos próprios alunos das oficinas da
COEPI, colocando arte e meio ambiente lado a lado.” (COEPI, 2015)
52 Para maiores informações, ver o site da Lei Griô Nacional
<<http://www.leigrionacional.org.br/>>.
115
Em relação à Boa Governança, é muito recorrente, no discurso
deles, o empoderamento político das pessoas envolvidas no processo
em geral. Isso está presente desde a criação de oficinas de formação
política, à participação de membros da COEPi nos conselhos munici-
pais:
O governo foi empoderando a sociedade para entrar em conse-
lhos, exigir isso e aquilo, dando mais ferramentas. A gente tam-
bém foi se apropriando desses espaços. A gente chegou, numa
época, em 2009, que a gente estava em onze conselhos do muni-
cípio: educação, saúde, meio ambiente, criança, assistência soci-
al, pelo amor de deus... Botaram a gente pra participar de tudo.
Mas ao mesmo tempo a gente vê que está se doando, está legiti-
mando uma coisa, mas o município também não consegue aten-
der do jeito que devia, fazer o negócio participativo. Então a gen-
te também começa a ver que a gente só está ali, de uma certa ma-
neira, só legitimando. Um processo que está todo errado. Hoje a
gente participa de quatro conselhos que é meio ambiente, do par-
que estadual, educação e o da criança. (Patrícia)
116
resíduos sólidos. As coisas vão interferir em nossas vidas. Então
porquê que a juventude não está envolvida, na prática, com o que
vai ser decidido? Tanto na condição de aprender, localmente,
quanto de intervir, politicamente.
117
O próprio CJMA é um resultado direto das ações da COEPi no
que se refere ao Meio Ambiente:
A cidade agora está num novo momento, que está se readaptando
para o plano de resíduos sólidos. Inclusive vai ter um novo gal-
pão, vai retomar o aterro sanitário, porque hoje não existe um tra-
balho de reciclagem na cidade. O Coletivo Jovem Meio Ambien-
te de Pirenópolis, é um espaço da juventude que se preocupa com
a questão ambiental. E a COEPi vem apoiando esse movimento
desde o começo, tanto em âmbito estadual como nacional. Ela
serviu como CNPJ, ajudou com alguns editais, para ajudar o mo-
vimento se articular no ponto de vista da formação. A gente con-
seguiu reunir no ano retrasado, aqui em Pirenópolis, mais de cem
jovens, de coletivos do país inteiro, aqui na cidade, pois Pirenó-
polis sempre foi uma referência pro movimento nacional. (Tadeu)
118
Ponto de Cultura de Caldas Novas –
CEJUVI (GO)
Introdução
119
mento que a Irmã Elisa Ferreira (freira dominicana) iniciou com o
Rotary Internacional, quando se dispuseram a apoiar uma escola em
Goiânia onde a gestora já atuava. Entretanto, quando o pedido foi
aprovado pelo Rotary, a escola em Goiânia tinha sido fechada e a
proposta foi readequada para aplicação na cidade de Caldas Novas.
Foi estipulado uma assistência de R$ 39.000 para ser utilizada em
dois anos, com foco na implementação da cozinha, compra de instru-
mentos musicais e estrutura de escritório. Finalizado o prazo de
apoio do Rotary, o Comitê de Ação pela Cidadania 54 (CACI) viabili-
zou, em 2012, o ingresso do projeto na estrutura dos Pontos de Cul-
tura. Com o suporte adquirido junto ao PCV, completaram a compra
de instrumentos e ampliaram o corpo pedagógico para expansão de
horários e aplicação de novos cursos como capoeira, moda, informá-
tica e teatro55.
O objetivo principal desse Ponto de Cultura é trabalhar na pre-
venção à criminalidade, incentivando que crianças e adolescentes da
comunidade do bairro de Santa Efigênia possam realizar atividades
que as mantenham integradas, distanciando-as dos pontos de venda e
consumo de drogas.
Aqui nós trabalhamos com o teatro, a dança, música, informática.
Nós acreditamos que os adolescente, os jovens que acreditam, se
apaixonam pela arte em si, ele não vai se apaixonar pela droga,
pelo crime, por nada... (Irmã Elisa)
120
Portanto, a proposta deste Ponto de Cultura é propiciar um am-
biente de convivência com oficinas de diversos ofícios cuja orienta-
ção básica é estimular a autoestima dos participantes, impactando di-
retamente na identidade sociocultural da comunidade do Santa Efigê-
nia e bairros adjacentes, como explica a coordenadora:
Eu que estou aqui há 10 anos digo que esse bairro é outro. Todo
mundo fala que é a partir daqui, do nosso projeto, que as mudan-
ças começaram. (Irmã Elisa)
Análise
121
discurso dos entrevistados relacionados aos domínios do Meio Ambi-
ente, Padrão de Vida, Saúde e Boa Governança.
Com a inexistência de cinema, salas de teatro e espaço para
apresentações artísticas – excetuando-se os locais voltados quase que
exclusivamente para a música sertaneja, o CEJUVI tem sido respon-
sável por movimentar atividades culturais na cidade e região. Dessa
forma, o primeiro indicador direto observado, em termo de relevân-
cia das ações desse PC, é o impacto nas ações culturais locais:
Aqui não tem ainda uma consciência, por ser uma cidade turística
as pessoas chegam perguntando onde tem Teatro, onde tem Cine-
ma. Não tem. Então tem grupos isolados como o nosso aqui. Cal-
das Novas não tem essa consciência cultural. Portanto, esse pro-
jeto nosso prepara os meninos e os clubes poderiam aproveitar
isso e provocar mais apresentações culturais. A gente percebe
uma mudança de visão. Antes não tinha nada. Teve um incrível
desenvolvimento que aconteceu nos jovens, adolescentes, as des-
cobertas dos dons. Esse menino de 10 anos [Redelin], se não ti-
vesse o projeto, ele nunca teria descoberto esse dom. O projeto
ajuda na descoberta e desenvolvimento dos dons que eles têm.
Essa alegria que vem assim nascendo, porque a música traz ale-
gria. O pessoal fica mais esperançoso e trabalha com mais ânimo.
A credibilidade que nós temos aqui em Caldas, todo mundo ad-
mira, todo mundo fala. (Irmã Elisa Ferreira)
122
Na sequência das falas sobre o impacto cultural, em especial
na área musical, surge um indicador indireto associado ao desenvol-
vimento das estratégias de educação cultural continuada que surge
em consequência às estratégias adotadas para arregimentação e disse-
minação das linguagens ensinadas nas oficinas (teatro, música, moda
e capoeira). Por isso, o indicador consequente é o da Educação:
A gente restaurou um rapaz aqui que participou de uma quadri-
lha, que roubou quase todos os instrumentos do projeto. Ele virou
um cidadão de bem e nesses seis anos ele virou um rapaz, foi tra-
balhar na cidade, virou chefe no setor dele, e foi transferido para
Anápolis. O projeto, além dessa transformação, de satisfação na
vida dos alunos, onde os alunos puderam se realizar fazendo suas
expressões artísticas, tem também essa questão da restauração da
personalidade. Como aconteceu com esse rapaz e teve outros
também. A gente vê que a gente contribui com a formação do ser
humano no que diz ao caráter. Isso também é interessante. (Pro-
fessor Adeilton)
123
rizado. Porque ele vê “eu sou alguém, eu consigo fazer”. E com a
autoestima elevada, a aprendizagem também vai ficar elevada,
porque ele começa a confiar nele mesmo. Ele começa a acreditar
na aprendizagem dele. Ele se desperta, ele amadurece. Ele se en-
contra, eles ficam acreditando neles mesmos. Tem aluno aqui que
era muito inquieto. Começa a fazer, vem o despertar, começa a
acreditar nele. Lá eles veem outro estilo de vida. “Aqui eu posso
escrever uma nova história”, e por isso eles contribuem mais em
casa, na escola, no bairro que vive, na cidade. (Professora Elisân-
gela, Coordenadora Pedagógica da EMERF)
124
Desde quando eu entrei aqui eu mudei muito com a minha famí-
lia, amigos e parentes. Aqui é muito legal, mudei muito, minha
vó acha que eu mudei, eu também acho. (Isadora - participante)
125
Tenho 10 anos e estou aqui no projeto desde os 5 anos e sei tocar
8 tipos de instrumentos. Bateria, violão, guitarra, percussão, ca-
vaquinho, e estou aprendendo trompete… (João Luiz)
126
tem, quem vai é o Presidente do CACI pois é eles que adminis-
tram. Nós não tomamos nenhum contato. (Irmã Elisa)
127
Ponto de Cultura Caminhos Audiovisuais
(DF)
Fonte: http://caminhosaudiovisuais.blogspot.com.br
Introdução
129
Claudio Santoro57, em Brasília, Distrito Federal. O projeto foi apro-
vado pela Secretaria de Cultura em 2011 mas, com o atraso de dois
anos para liberação de recursos, sua finalização não aconteceu em
2013/2014, e está previsto somente para 2016.
Esse Ponto de Cultura não tem instalações próprias e depende
de parcerias para seu funcionamento. Em 2012 iniciou seus primeiros
cursos nas dependências da Faculdade Dulcina de Moraes, localizada
no Setor de Diversões Sul (conhecido como Conic), e em 2014 pas-
sou a utilizar uma sala cedida dentro da Administração Regional da
Estrutural como endereço. O Ponto ocupa uma sala ampla, com seis
computadores enfileirados em duas filas de três, e outros materiais
para produção audiovisual. Além disso, eles possuem armários e um
sofá.
Oferece somente cursos presenciais que ocorrem de segunda a
sexta-feira, e atendem, em sua maioria, jovens entre de 16 e 28 anos.
As turmas são limitadas a até cinco alunos por turno (matutino e ves-
pertino) por conta da quantidade de equipamento. A duração dos cur-
sos varia, desde cursos de produção musical (com opções de 45 a
180 horas), ao curso de áudio, com carga horária de 100 horas distri-
buídas em cerca de 25 dias.
A escolha dos oficineiros é sempre feita por edital. Já a partici-
pação nos cursos depende de uma conversa com o coordenador, que
avalia o interesse da pessoa. Tal medida mostrou-se necessária para
evitar a grande evasão e rotatividade dos alunos, que acontece por di-
versos motivos como, por exemplo, dinheiro para o transporte ou
problemas familiares. O Ponto sempre procurou dar preferência a
pessoas de diferentes cidades satélites e possui alunos do Riacho
Fundo, Santa Maria, Estrutural, Ceilândia e Varjão.
Um dos principais problemas que tive no primeiro ano foi passa-
gem de ônibus dos alunos. O que a gente faz aqui não é reconhe-
cido pela secretaria de educação, então os meninos não podem ter
<<http://caminhosaudiovisuais.blogspot.com.br/>>.
57 Ver em <<http://www.claudiosantoro.art.br/accs/br/accs.html>>.
130
aquele passe livre para pegar ônibus. Muitos alunos não conse-
guem vir porque não tem dinheiro para pegar ônibus. O Fernando
mesmo, era o professor do colégio dele que pagava a passagem
pra ele vir todo dia. Às vezes os alunos faltam por falta de passa-
gem mesmo. Foi uma das maiores reclamações no primeiro ano,
desse ano também, foi a maior reclamação. Aqui em Brasília o
cara tem que pegar dois, três ônibus para chegar em um lugar. E
não é integrado. Então o cara tem que gastar dinheiro, mas não
tem dinheiro pra isso. É complicado. Pra mim essa foi a maior di-
ficuldade para os alunos. […] O menino do ano passado, do Var-
jão, eu praticamente pagava a passagem dele sempre, para ele
não perder. É complicado. (Raffaelo, idealizador).
Análise
131
Foto 05 – Oficineiro WT e alunos de um dos cursos do Ponto. Ao fundo, a
bolsista Marta Pederiva entrevista Rafaello Santoro.
132
aula, mas o que eu aprendi, eu posso passar adiante lá, entendeu?
(Heitor, participante)
133
mação de redes globais de comunicação, acelerou a difusão intercul-
tural de músicas criando um fenômeno que é ao mesmo tempo local,
ao utilizar temáticas e sonoridades comuns a sua região geográfica; e
é global, ao se basear em práticas musicais que estão disseminadas
em quase todo o planeta, e nas quais indivíduos de locais distantes
como Brasil e Indonésia58 se reconhecem. E essa é a principal área
de atuação de Raffaelo Santoro, também conhecido como DJ Rafa.
E, claro, nossa metodologia é o hip-hop. A cidadania e o hip-hop.
Então a gente se concentra em clipes de rap, hip-hop, de break. A
gente faz, tá sempre nesse segmento, que é o meu segmento. […]
Os dez grupos escolhidos para fazer o CD que a gente tá fazendo
esse ano são do próprio Ponto e da Comunidade, tanto da Estru-
tural quanto de Brasília. E o DVD de videoclipes que a gente fez
no ano passado foi feito com intercambio com outros pontos, de
Porto Velho e Rondônia. E gravei dois clipes de dois grupos de
lá, do movimento MHF, Movimento Hip-Hop da Floresta. A gen-
te fez esse intercambio para ajudar aqui e lá, foi muito interessan-
te. (Raffaelo, idealizador).
134
me ensinar. Tanto ele quanto o Raffa, e as outras pessoas que pas-
saram por aqui, conseguiram me dar esse ensinamento de pesso-
as, de pessoas que estão a mais tempo e ensinam, além do profis-
sional, o psicológico também. Ensina como a gente deve se com-
portar, pra onde a gente deve caminhar para que os nossos proje-
tos realmente consigam dar certo (Heitor, participante).
135
você pudesse dentro de um edital fazer isso (Raffaelo, idealiza-
dor).
136
pes, quem sabe até filmes. Desde pequeno foi meu sonho. Trou-
xe a perspectiva de um futuro melhor, através das coisas que eu
gosto de fazer, mexer com audiovisual, editar vídeo, essas coisas.
(Lucas, participante).
137
Ponto de Cultura Ludocriarte Editora (DF)
Introdução
139
A Associação Ludocriarte surgiu da experiência do italiano Pa-
olo Chirolla em trabalhos sociais pelos interiores de Goiás, experiên-
cia que o incentivou a realizar, em 2005, a construção de uma brin-
quedoteca comunitária na cidade-satélite de São Sebastião no Distri-
to Federal e mais tarde a Ludocriarte Editora. O objetivo da associa-
ção é o de trabalhar as diversas expressões das crianças através de
atividades lúdicas realizadas em conjunto, incentivando a construção
subjetiva que abrange desde a percepção do aspecto comportamental
da ética, até a promoção da convivência coletiva, sem deixar de cen-
tralizar a expressividade dos meninos e meninas.
A partir de 2012 inciaram as atividades da Editora Ludocriarte,
e até o ano de 2015 foram publicados dois livros de histórias clássi-
cas infantis recontadas pelas próprias crianças, intitulados “Era outra
vez...”. Com a publicação desses livros, a instituição teve um alcance
maior que o meramente institucional, e a comunidade local foi devi-
damente representada no processo autoral das histórias publicadas.
Com certa frequência, eventos são realizados para a comunidade com
o intuito de divulgar os trabalhos feitos pelas crianças e interagir com
a comunidade local. Essas iniciativas são idealizadas com a proposta
de envolver a comunidade não participante a conhecer e interagir
com as ações realizadas no ponto.
A região na qual o PC atua se caracteriza pela carência em ati-
vidades de incentivo à promoção cultural e ao lazer da comunidade.
São contemplados pela associação cerca de 500 jovens moradores da
localidade que estão entre 6 e 17 anos. Esses jovens são distribuídos
entre mais duas iniciativas que fazem parte da rede Ludocriarte: o
Conexão Jovem e o Criarte. As atividades são realizadas de segunda
a sexta no turno da manhã ou da tarde dependendo do horário esco-
lar.
A sede da associação se localiza em uma casa num bairro resi-
dencial e se destaca pela sua fachada colorida. Seu interior é todo
adaptado para as atividades desenvolvidas e decorada de forma a in-
dicar que naquele ambiente existem crianças em plena atividade ar-
tística. O espaço contém vários cômodos, sendo um deles o escritório
140
onde são realizadas as atividades burocráticas do espaço, uma cozi-
nha onde encontramos várias senhoras preparando o lanche da tarde,
e um amplo espaço atrás da casa onde as crianças lancham, fazem
atividades de reforço escolar e brincam. O interior da casa possui
uma área física muito restrita apesar dos vários cômodos. Atividades
que exigem maior movimentação são realizadas na parte da frente da
casa, toda equipada de brinquedos, casinhas, mangueiras, materiais
lúdicos e artísticos.
Com o espaço físico limitado, muitas propostas idealizadas
para o Ponto de Cultura e para a associação ficam sem se concretizar
como, por exemplo, a abertura de atividades para todos os interessa-
dos da comunidade, sem restringir a quantidade de público contem-
plado. Essa limitação faz com que os coordenadores encontrem difi-
culdades em manter qualquer tipo de espaço comunitário na associa-
ção.
141
O espaço se mantém graças a uma série de parcerias e convê-
nios feitas ao longo dos anos. O surgimento da associação foi possí-
vel graças a um incentivo da embaixada italiana por alguns anos e al-
gumas iniciativas da própria associação em arrecadar fundos, além
de alguns prêmios que, financeiramente, foi um fomento importante
para dar continuidade ao projeto e suas atividades. A parceria mais
recente é um convênio com a Secretaria Adjunta de Desenvolvimen-
to Social de Brasília (Sedest), a partir do qual foi possível ampliar a
iniciativa e manter os profissionais da associação. Esse convênio en-
volve o Centro de Referência de Assistência Social da Secretaria do
Trabalho (CRAS) de São Sebastião, onde os jovens atendidos podem
ser encaminhados para participar das atividades.
Análise
142
[…] Eles têm uma grande ausência dos pais, uma sociedade vio-
lenta. Aqui eles têm uma relação que não constroem em outro lu-
gar. [...] a gente tem retorno de professores das escolas que a gen-
te conhece, dos próprios pais, dos meninos que cresceram, sabe?
É fantástico, quer dizer, você percebe que é um trabalho que não
tem preço. É tudo a longo prazo, você não vê logo, não tem aque-
la coisa bonitinha, ah pronto o resultado tá aqui. Mas você sabe
que essas pessoas vão levar de, qualquer forma, vão levar uma
semente. São multiplicadores. (Paolo, coordenador)
143
A gente vê muito mais claro com as crianças e com os adolescen-
tes que a gente trabalha. Tem crianças que antes só resolvia as
coisas com os colegas no tapa. Mas com o passar do tempo já
consegue sentar, conversar, expressar o que está sentindo. Você
vê os mais velhos cuidando dos mais novos. Resolvendo brigas,
ajudando em tarefas do ponto. Com menos frequência a gente
percebe essas mudanças de comportamento nos pais. Por exem-
plo, pais que antes só brigavam com os meninos, já começam a
levar o menino para passear, vai tomar um sorvete, conversar,
sentar para brincar. E isso é espetacular, é uma mudança genial,
por que é no núcleo familiar. Sobre a comunidade, a gente perce-
be que uma pequena ação que fazemos acaba reverberando em
outras pessoas que não participam do programa. Como uma mãe
que conversa com outra sobre as coisas que ela e o filho vivenci-
am aqui. (Arthur, psicólogo)
Outro exemplo é nos dado pela mãe de uma das crianças, so-
bre como o projeto tem contribuído para melhorar sua autoestima e
suas relações interpessoais.
Minha filha, ela é muito assim, nervosa, nervosa demais. Ela tem
tanto medo de agulha que chegou a desmaiar. Então, eu coloquei
ela pra ficar no meio do povo conversar com o pessoal, com os
professores. Pra mim foi ótimo. Ela era muito tímida, retraída.
Esse projeto é maravilhoso! Pra mim foi a melhor coisa que po-
deria acontecido. Ela mudou muito. (Célia, mãe de uma das parti-
cipantes)
144
minha mãe”. Um deles reconhece que, muitos dos adolescentes, se
não estivessem “ocupados” no ponto, provavelmente estariam na
“rua, fazendo coisa errada”.
O impacto sobre a cultura também surge nas entrevistas, quan-
do comentam a organização de apresentações artísticas. Sobre o
evento que estava acontecendo no sábado à noite, os adolescentes es-
tavam muito animados, tanto por ter uma “diversão segura”, quanto
por poderem assistir seus colegas se apresentando. A organização de
apresentações artísticas acaba por se tornar algo importante, mostran-
do como o Ponto de Cultura vem suprir essa deficiência à atuação
deficitária do estado nas áreas da cultura (indicador relacionado à
Boa Governança).
Quero dizer que é muito importante os Pontos de Cultura e os
projetos associados aos Pontos de Cultura para de fato a gente
conseguir trazer os espetáculos, arte, educação, para as cidades
satélites de Brasília. Nós temos um distanciamento muito grande,
tanto dos aparelhos do Estado que promovem cultura, lazer e
educação, quanto a gente tem, de fato, dos artistas. Eles estão em
outras cidades, os que são reconhecidos, e a gente tem uma gama
de artistas e de meninos com muito potenciais. E através de asso-
ciações como a Ludocriarte a gente consegue, de fato, aperfeiçoar
esses talentos. (Cláudia, pedagoga do projeto)
145
Esse Fórum contribuiu para fortalecer os laços entre as diver-
sas entidades locais, assim como empoderar o viés político através de
uma maior participação em editais governamentais e firmar parcerias
com instituições como o Sedest e o CRAS. Essa prática de criar uma
rede entre diferentes instituições é amplamente estimulada pelo PCV,
e percebe-se que funciona de forma bastante específica nessa locali-
dade.
O domínio da Educação está presente não somente através dos
diversos cursos oferecidos, como numa das ações mais interessantes
desenvolvidas que foi a publicação de dois livros com histórias in-
fantis, um com recriação de histórias tradicionais, outro com históri-
as inéditas.
O viés que a gente segue, no Ponto de Cultura, a gente trabalha
muito a questão das histórias, leitura e criação de histórias. Pelos
pequenos, até quatorze anos, de seis a quatorze. Outras oficinas
que são constantes são toda a parte lúdica. Então assim, brinca-
deiras tradicionais, cantigas de roda, musicalização e brincadeira.
[…] O Michael tem doze, treze anos. Ele entrou com quatro anos,
quando a gente ainda pegava essa faixa etária. Agora ele não está
nem mais no grupo. Ele é, digamos assim, o boss. Ele entra quan-
do quer, sai quando quer. Mas ele usa aqui realmente como um
ponto. Tem o Lucas que conta umas histórias incríveis, e está
aqui com a gente desde pequeno. (Paolo, coordenador)
146
Ponto de Cultura CENPRO Faces de
Cultura (MT)
Fonte: http://cenprofaces.blogspot.com.br/
Introdução
147
tes chamado Primavera do Leste. Surgiu a partir de uma parceria en-
tre a Companhia de Teatro Faces 60, a ONG Cenpro61 e a Prefeitura
Municipal de Primavera do Leste. Atualmente conta com cerca de 10
Instrutores de Teatro atendendo quase 500 alunos inscritos. As ativi-
dades acontecem de forma descentralizada em diversas escolas da ci-
dade, entre as quais a Escola Novo Horizonte, CRAS São José,
CRAS Mabília Furtado - Primavera III, Escola 13 de Maio, Escola
Sebastião Patrício, Escola Mauro Weis, e Espaço Prima Jovem.
Idealizado pelo diretor e ator Wanderson Lana, o grupo Teatro
Faces começou a tomar forma em 2005 a partir da necessidade de
fortalecer o fazer teatral no interior do país, tornando-o mais atrativo
e rentável para os jovens já inseridos no universo do teatro. Os parti-
cipantes do projeto são estudantes do ensino médio que desenvolvem
as atividades teatrais paralelamente às atividades escolares. Mesmo
após concluir o ensino médio, a companhia proporciona um incenti-
vo financeiro para aqueles jovens que pretendem se desenvolver
como atores, que têm interesse em se profissionalizar nas artes cêni-
cas.
A sede do Ponto de cultura fica em um prédio cedido pela pre-
feitura, localizado em um bairro com aspecto de classe média. O lo-
cal tem um espaço amplo em seu interior, propício para desenvolver
atividades que requerem bastante movimentação.
O ambiente é dividido em vários espaços, sendo um deles uma
pequena biblioteca comunitária, com livros que vão desde literatura
brasileira aos livros de artes cênicas. É uma biblioteca construída
para que se incentive o estudo e a leitura dos jovens. Além da biblio-
teca, existe um laboratório de audiovisual com equipamentos moder-
nos e uma boa estrutura para a construção e edição de filmes de
curta-metragem. Esse grupo já tem vários filmes gravados e disponi-
bilizados na internet, dentre eles “O astronauta e a bailarina” 62, gra-
60 http://teatrofaces.com.br
61 Centro de Ensino Profissionalizante.
62 https://www.youtube.com/watch?v=Ur49oXHsNx8
148
vado na própria comunidade e com um enredo inspirado em um
acontecimento que chocou a comunidade local.
Além de aulas de teatro e das produções audiovisuais, a com-
panhia também se dedica à produção teatral. Os jovens que partici-
pam das atividades têm a oportunidade de conhecer todas as etapas
da produção de uma peça, podendo se envolver com atividades que
não se restringem apenas a atuação em si, como aquelas que englo-
bam o desenvolvimento do produto final. A proposta é inserir o jo-
vem que se interesse pelas artes cênicas, ou produção cênica, mas
que não se reconhece como ator. Além de todas essas produções, o
Teatro Faces profissionaliza, envia atores para o mercado de traba-
lho, participa de vários festivais pelo Brasil e acumula uma série de
premiações conquistadas, o que lhes proporcionou ser uma referência
teatral no Estado. A recente conquista do grupo foi trazer para o Esta-
do o primeiro curso de artes cênicas ofertada pela Universidade de
Brasília-UnB, ministrada a distância.
Além dos espaços citados, existe uma espécie de escritório
onde são realizadas as atividades burocráticas do ponto, realizadas
pelos organizadores que estão na gestão há mais tempo sendo, even-
tualmente, auxiliado pelos jovens que recebem o incentivo financeiro
do projeto.
Inicialmente, o ponto procurou a aliança com uma entidade
não governamental chamada CENPRO. Essa entidade tinha um tra-
balho em comum com o ideal do ponto de profissionalizar e lançar
jovens para o mercado de trabalho, nesse caso, jovens atores. Essa
parceria possibilitou ao projeto seu reconhecimento como uma enti-
dade não governamental e a retirada de seu titulo de OSCIP (Organi-
zação da Sociedade Civil de Interesse Público), que impulsionou o
projeto a participar dos editais dos pontos de cultura e demais pro-
gramas governamentais.
149
Análise
150
onal diferente. Junto com o legado cultural, as atividades traz
uma construção pessoal muito significativa. Não conheciam mui-
to de teatro e a partir do Ponto de cultura o interesse pelas artes
cênicas surgiu.
151
inseridos no ponto, a respeito do teatro e suas atividades adjacentes,
era praticamente inexistente. Muitos comentaram que não havia in-
vestimento do governo local nas questões relativas às artes em geral.
Na fala do coordenador do ponto, nota-se que seu objetivo foi o de
estabelecer no interior um polo de artes cênicas que oferecesse tanto
a formação necessária para a área, quanto trabalhasse a formação de
plateia. Ele chama a atenção para as oportunidades abertas aos alu-
nos:
A gente convida os alunos a participarem de todo o processo de
construção de um espetáculo. Às vezes um aluno não quer ser
ator mas quer participar do projeto, ele pode fazer algo que faça
parte da construção do espetáculo.
152
que lhes ocupasse o tempo de forma mais proveitosa. A presença do
Ponto de Cultura na comunidade permitiu que muitos jovens conhe-
cessem novas profissões e propostas culturais. Muitos relataram que,
após o turno escolar, permaneciam em casa assistindo televisão ou na
rua. O jovem A disse que:
Ficava muito em casa, brincava na rua bastante, até o ingresso no
projeto, que trouxe uma perspectiva profissional também, para
além do cultural.
A jovem D disse:
A influência das drogas está em todo lugar, em todo momento.
Mas só é influenciado quem se deixa ser influenciado. E com o
entendimento do teatro na nossa vida faz com que a gente não te-
nha tempo para pensar nisso. Por exemplo, a gente está montando
um espetáculo, então a gente tem que ler sobre aquele espetáculo,
tem que estudar sobre aquele espetáculo, tem que aprofundar
tudo que for possível sobre aquilo. Então, na minha opinião, a
gente não tem tempo de pensar nessas bobagens.
153
O coordenador do Ponto de Cultura, por sua vez, complemen-
tou essas informações ao dizer que:
Caso os alunos queiram continuar no teatro, o projeto oferece
uma bolsa de estudos, pois a maioria deles tem um perfil sócio
econômico baixo. Assim fica fácil conciliar os estudos e as ativi-
dades do ponto.
154
eles de continuar fazendo teatro, fazendo aquilo que eles gostam
e trabalhar com isso.
155
promover um retorno profissional e financeiro para os jovens que ha-
viam ingressado na carreira artística. Nesse momento houve uma
aproximação do ponto com a prefeitura, quando foi possível consoli-
dar uma parceria que facilitou a contratação de vários profissionais
para propagar o teatro para a comunidade. Esse passo foi tão signifi-
cativo que esse convênio se perpetuou ao longo de vários governos e
atualmente essa parceria proporciona aos jovens do projeto a pers-
pectiva e a autoestima profissional que, sozinho, o ponto não conse-
guiria prover. Hoje o grupo atende mais de 1% da população de Pri-
mavera do Leste.
Um dos resultados desse projeto e das iniciativas promovidas
pelo grupo Faces é o fato de seu idealizador e diretor, Wanderson
Lana, ter sido nomeado em 2015 o primeiro secretário de cultura do
município de Primavera do Leste.
156
Ponto de Cultura Só Falta Você (MT)
Introdução
157
A história desse ponto está intimamente relacionada com a his-
tória de Iolita Ferreira Santos, ou somente “Dona Iolita”, e sua pai-
xão pelas danças tradicionais nordestinas. Natural de Maranhão,
Dona Iolita sempre esteve envolvida com diversas atividades cultu-
rais mas, ao se mudar do Maranhão para morar em Campo Verde em
1999, disse que encontrou “uma cidade jovem, ainda em desenvolvi-
mento e uma população muito carente de lazer e cultura”. Essa situa-
ção chamou sua atenção e ela decidiu trazer a experiência de sua ter-
ra natal para intervir culturalmente na cidade, como descreve em seu
blog63:
O Grupo Cultural Folclórico Matutada, teve sua primeira forma-
ção em junho de 1992 na cidade de Imperatriz Estado do Mara-
nhão, onde atuou com brilhantismo desenvolvendo atividades
culturais até o ano de 1999 quando então sua idealizadora e fun-
dadora Iolita Ferreira Santos mudou-se para Campo Verde-MT,
dando início novas atividades em junho de 2001. Em dezembro
de 2009, através do Projeto Só Falta Você de autoria de Iolita, ob-
teve o reconhecimento do Governo Federal tornando-se um dos
40 pontos de Cultura do Estado de Mato Grosso. (SANTOS,
2012)
63 Esse blog tem algumas poucas postagens e parece ter sido descontinuado a partir de 2012.
Disponível em: <<http://iolitafs.blogspot.com.br/>>, acessado em 10 Jan 2016. Além
desse blog, há disponível um vídeo na plataforma YouTube sobre as atividades do Grupo
Folclórico Matutada e do Ponto de Cultura Só Falta Você no seguinte endereço:
<<https://www.youtube.com/watch?v=1qe1Z95mxZo>>.
158
no siriri e na matutada. Todas as atividades foram realizadas por ofi-
cineiros contratados com uma verba do governo municipal.
O público, de início, era composto por crianças e jovens em
idade escolar. Mas, com o tempo, ao perceber que os interesses do
ponto de cultura atingia toda a população e as oficinas propostas ti-
nham uma demanda muito grande, as atividades passaram a não ter
critérios de idade. Inicialmente, quando a dança era o foco principal,
os ensaios aconteciam sempre em horário contrário ao escolar. Com
o crescimento do público, as oficinas passaram a acontecer em horá-
rios e dias diversificados, divulgados pelos meios de comunicação da
comunidade.
No começo, as atividades de dança eram feitos na rua ou em
lugares cedidos para acontecerem os ensaios. Com o tempo, e a am-
pliação do projeto, Dona Iolita alugou, com recursos pessoais, um es-
paço maior, onde aconteciam os ensaios e as oficinas promovidas
pelo Ponto de Cultura. Atualmente, sem sede própria, o Ponto de
Cultura está utilizando a residência da própria Iolita, um espaço limi-
tado, com três cômodos, sendo dois deles usados para guardar os ma-
teriais das oficinas e o figurino das danças. Houve uma tentativa de
usar os fundos da casa para fazer ensaios de danças, porém, o espaço
não se mostrou suficientemente adequado para tanto.
A conquista de um espaço físico é a maior dificuldade atual
enfrentada por esse Ponto de Cultura. A casa usada anteriormente
hoje é fonte de renda para a família de Dona Iolita e a casa atual não
dispõe de nenhuma estrutura física para as atividades. Sua reclama-
ção é que a prefeitura local sequer disponibiliza um espaço para es-
sas atividades acontecerem. Iolita diz que o apoio do Estado é míni-
mo e o ponto de cultura só conta com alguns patrocínios de empresas
locais, da mobilização da comunidade local e de ajudas bem pontuais
da prefeitura do município. A ajuda mais substancial vinha da verba
do programa Cultura Viva. Esse Ponto de Cultura, por isso, corre ris-
co de ter suas atividades cessadas, já que o convênio terminou no fi-
nal de 2014 e sem essa verba o projeto não consegue manter-se.
159
Foto 10 – Parte do figurino utilizado para as danças do PC Só Falta Você,
guardados na sala da casa de Iolita.
Análise
160
Nas falas dos entrevistados foi possível identificar alguns do-
mínios do FIB, que apareceram em diferentes momentos das entre-
vistas e se entrelaçam muitas vezes nas falas dos participantes. No
que se refere ao Bem-Estar Psicológico, nota-se que as atividades do
ponto de cultura serviram como meio de resgate da autoestima e de
intervenção em conflitos familiares, apontando possíveis soluções,
proporcionando orgulho e alegria não apenas às crianças e jovens,
mas também às suas famílias. Segundo o relato de Iolita, “a gente
atendeu a pessoas com deficiência, usuários de drogas, que resgata-
ram sua autoestima depois que participaram do ponto de cultura.”
O Ponto de Cultura está situado em uma região de periferia,
circundado por uma vizinhança bastante carente de recursos. Muitos
jovens envolvem-se com farras, bebedeiras e drogas. De acordo com
os participantes das entrevistas, há sempre o perigo constante da cri-
minalidade e da violência presentes na cidade, como diz Emerson,
um dos participante das oficinas do Ponto de Cultura,
Pra mim foi um aprendizado muito grande. Eu podia tá em vários
outros caminhos. Depois que eu perdi minha mãe eu não teria
essa maturidade. Foi bom pra mim e pra muitos, que cresceram.
Mas assim depois que eu entrei eu mudei muito. Antes eu era
muito desleixado, bagunceiro. Eu era um cara muito nervoso, de-
pois fiquei mais calmo aprendi a respeitar. (Emerson, participan-
te)
161
Eu era muito tímida, eu não gostava de conversar com ninguém.
Aí a professora foi incentivando a gente a falar e assim fui desen-
volvendo. (Aline, participante)
162
ou 9 anos. Ele ficava em casa, aqui em casa. Ele resgatou a auto-
estima. Aprendeu bastante coisa. (Joana)
Era uma coisa diferente, uma coisa legal. Você não conhecia nin-
guém, tinha que dar seu máximo. Eu aprendi muita coisa né? Eu
passava muito tempo lá. Eu participava bastante. Era legal. A
gente saía, se divertia sempre, nóis fez bastante festa. (Vitor, par-
ticipante)
163
juninas e esperavam com muita empolgação. (Iolita, coodenado-
ra)
164
Programa Cultura Viva e da falta de incentivo municipal para as ati-
vidades culturais propostas por ela.
Eu coloquei todas as ações que eu queria desenvolver, pra atrair o
maior numero de crianças e daí foi selecionar, me perguntei e
agora? Aí fui pra Cuiabá. Nem tudo saiu do jeito que a gente ima-
ginou. Enfrentamos muitas dificuldades com o recurso. Para
manter as atividades, não pode usar o recurso. Se der continuida-
de, já existe uma conversa com os pontos de cultura que, se for
pra dar continuidade da mesma forma do primeiro convênio, nós
não queremos mais. Quando a gente era livre, a gente fazia tudo
que vinha nas ideias. Agora não, a gente fica amarrada e isso des-
motiva, entristece.
165
ram esperançosos de que algum dia as atividades pudessem nova-
mente acontecer a fim de que seus filhos pudessem novamente parti-
cipar desse espaço. Durante as entrevistas, Iolita chegou a refletir: “E
se retornar agora e voltar a ativar?”. Rapidamente uma das mães res-
pondeu: “Opa, já estamos dentro!”.
166
Ponto de Cultura Yokone Kopenoti (MS)
Introdução
167
O “Loteamento Social Marçal de Souza” foi a primeira Aldeia
Urbana do país. Fundada em 1995, localiza-se entre os Bairros
Tiradentes e Flamboyant, na cidade de Campo Grande – MS. Ali,
moram aproximadamente 500 pessoas, todas da etnia Terena. Há
na Aldeia, o Memorial da Cultura Indígena, local onde é possível
conhecer um pouco mais da cultura desse povo, além de ser um
centro de comercialização dos produtos típicos dessa etnia, como
a cerâmica e adornos confeccionados de materiais naturais, como
sementes. Na Aldeia Urbana Marçal de Souza, são também reali-
zadas festas tradicionais, em que há apresentação de danças como
o Bate-Paus. (GRUPO…, 2007)
168
geral, Lísio Lili – agente cultural, e Sidney de Albuquerque – moni-
tor do ponto de cultura, chegaram a conclusão que o início das ações
que iriam desembocar no Ponto de Cultura, foi a organização do 1º
Beleza Indígena do Pantanal, um concurso de mulheres indígenas,
em trajes e pinturas típicas de cada etnia, que ocorreu no dia 25 de
Abril de 2009. De acordo com Lísio:
Silvana liderou a Primeira Beleza Indígena do Pantanal. Era para
trazer as parentes para desfilar a formozura delas, a beleza indí-
gena, das pinturas. Foi uma realização de nossa militância. A in-
tenção era fortalecer a cultura indígena através da beleza da mu-
lher indígena, que é natural. Aquilo não era um desfile dos bran-
cos, não era de biquíni. Era a roupa tradicional de seu povo.
169
Entre as atividades realizadas pelo PC estão: oficinas de arte-
sanato, dança, cursos de idiomas indígenas, canto, fotografia, infor-
mática básica, produção audiovisual, contação de histórias, cinema
nas aldeias. Além dessas ações mais práticas, também realizaram pa-
lestras e debates com os diversos temas: economia solidária, sensibi-
lização, conscientização ambiental, saúde e alimentação indígena, in-
clusão digital e novas tecnologias da comunicação e difusão da cultu-
ra indígena.
Análise
170
Iunakanu[?] é uma figura épica terena. É o grande personagem
que orienta o mundo indígena. Quando ele olha para o céu e vê
aquela estrela uver[?], ele chega e diz para todo mundo: nós pre-
cisamos acertar tudo. Vamos fazer um inventário do que aconte-
ceu, vamos acertar as diferenças, e vamos adentrar para um novo
ano. Assim que é regido o calendário terena. Mas os modelos que
a gente chama de hegemônico, impositivo, que não respeita a
nossa cultura, abandonou. E nós estamos tentando reimplantar
esse personagem.
171
pela degustação e cantando. Mesmo que fosse uma oficina tecno-
lógica, de informática básica, nós não deixamos de lado a nossa
cultura tradicional. (Silvana)
172
do a participar de Conselhos de Cultura, Associações, dando uma vi-
são muito mais política sobre suas ações:
Ainda que todo o nosso espaço é político… a gente deparou com
preconceito muito grande com a nova equipe que entrou naquela
época. Tinha uma pessoa ali que nos perseguiu muito. Era essa
pessoa que não deixava o negócio ir pra frente. Uma pessoa mili-
tante do [partido político X], que conhece as causas indígenas,
que conhecia o nosso trabalho, mas ela não deixou, o tempo que
ela ficou lá, ela não deixou. (Lísio)
173
pamentos, mantém suas feiras culturais, produzem os eventos in-
dígenas, etc.
Por fim, percebe-se que todas suas ações e objetivos têm a in-
tenção de impactar diretamente na Vitalidade Comunitária indígena,
ao fortalecer o “sentimento de pertencimento, importância e compar-
tilhamento de um projeto comum que irá satisfazer as necessidades
da comunidade por um compromisso coletivo”. Um exemplo disso
174
são as atividades itinerantes nas diversas comunidades indígenas lo-
cais ou próximas: Aldeia Urbana Marçal de Souza, Armazém Cultu-
ral, Aldeia Urbana Darcy Ribeiro, Aldeia Urbana Tarsila do Amaral e
Aldeia Urbana Água Bonita.
Eu penso que deve ter como prioridade reimplantar dentro das
terras indígenas o espaço institucional indígena. Esse é o nosso
foco principal. A gente quer empoderar as pessoas. (Silvana)
175
Ponto de Cultura Pájaro Campana (MS)
Introdução
177
O início de suas atividades remonta ao ano de 2004 quando,
ainda sem nenhuma ajuda governamental, foi formada a Associação
Cultural Amambaiense. De acordo com seu idealizador e presidente,
José Almada Ajala, tudo começou por causa da harpa paraguaia,
como relatam em seu site64:
No ano 2001 visitamos o luthier paraguaio “Vera”, residente em
Pedro Juan Caballero, com o objetivo de encomendar a ele um
jogo de cordas para um baixo acústico de arco que havíamos
comprado de um ex-integrante do conjunto Ponta Porã. Ele então
informou-nos que há mais de cinco anos não fabricava nenhuma
harpa paraguaia, visto que a nova geração de músicos dessa re-
gião fronteiriça do Paraguai com o Brasil está adotando o teclado
eletrônico ao invés da harpa. (ASSOCIAÇÃO CULTURAL
AMAMBAIENSE)
178
violoncelo, piano e viola caipira. Participaram do edital estadual de
pontos de cultura em 2010, e a partir de 2011 passaram a integrar a
Rede Estadual de Pontos de Cultura de Mato Grosso do Sul. Para
participar do edital, a única diferença do que já estavam fazendo na
Associação Cultural Amambaiense, foi a oferta de aulas de cerâmica
e desenho.
Um dos objetivos desse ponto é de preservar e fortalecer o re-
pertório folclórico regional com músicas de raízes caipiras e de in-
fluência paraguaia. Suas oficinas são destinadas a crianças, jovens e
adultos de ambos os sexos, sendo que a idade mínima para entrar nas
classes de música é dez anos, e em cerâmica artística, sete anos.
fonte: http://www.redemspontoaponto.com.br/ponto/ponto-de-cultura-
pajaro-campana/4/
179
O ponto funciona em um galpão emprestado pela irmã do co-
ordenador, onde ocorrem todas as aulas de instrumentos. As aulas de
cerâmica acontecem em um espaço que fica ao lado. No futuro, pre-
tendem construir um pequeno estúdio de gravação nesse mesmo es-
paço da sala das aulas. Não possuem nenhum espaço comunitário.
Atendem uma média de cem pessoas nas oficinas que são sempre
gratuitas.
Análise
180
Guilherme, de treze anos; Débora, de onze anos; e Virgílio de trinta e
um anos.
A análise da entrevista mostrou que as ações desse ponto im-
pactam, principalmente, o domínio da Cultura, com reflexos na Vita-
lidade Comunitária. O domínio da Cultura está presente através de
todos os indicadores resumidos na página 104, tal como demonstra-
mos.
O primeiro indicador – cursos diversos (tradições culturais ou
identidade cultural) – está presente na própria criação do projeto Pa-
jaro Campana e sua preocupação com o não desaparecimento da har-
pa paraguaia, um instrumento tradicional e muito associado à identi-
dade cultural local. Houve, inclusive, cursos de dança folclórica sul
mato-grossense, cujo objetivo era “despertar o interesse pelas tradi-
ções regionais” e,
vivenciar as formas de expressão da dança folclórica regional,
considerando as suas origens, de modo que o aluno compreenda
melhor as características folclóricas de sua região. (AMABAI)
181
valor bem acessível. Era dez, quinze reais. O restante quem co-
briu foi a Feira das Flores. (José Almada, coordenador)
182
músicas executadas por um dos grupos que também tocou no mesmo
evento:
Você vai tocar num festival de folclore, você tem que ter um cri-
tério no seu repertório. Você não vai lá por uma coisa porque está
na mídia, faz sucesso. Não é isso. Nós já chegamos ao extremo,
uma situação radical, que na hora não ocorreu outra possibilida-
de, de a gente não tocar num evento porque tocou uma coisa lá
que a gente não concorda.[…] Uma coisa que a gente considera
nociva à questão cultural. O evento se chamava Noite Cultural
Amambaiense. A banda militar ia tocar três músicas. As duas pri-
meiras eram excelentes. Mas, quando anunciaram a terceira, aí
chamamos o povo e dissemos, se for tocar isso aí, nessa proposta
da noite cultural amambaiense, nós estamos fora. […] Se for as-
sim, então, muda o nome. O tempo todo a gente bate nessa te-
cla… Não dá. Não tem como você ser duas coisas.
183
al. Esse projeto foi baseado na cooperação para se manter como Pon-
to de Cultura. Como não há um profissional remunerado trabalhando
continuamente, há pessoas doando seu tempo e seu trabalho, desem-
penhando um papel importante para a comunidade dentro e fora do
ponto.
Em relação ao Padrão de Vida, percebe-se que o objetivo do
ponto não é o de oferecer cursos profissionalizantes que os auxiliem
a entrar no mercado de trabalho. Ainda assim, há o relato de alguns
jovens que, ao se destacar por suas habilidades técnicas, se tornaram
monitores nas oficinas de instrumentos. Outros, seguiram carreira
musical.
Nossa, tem uma moçada que saiu aqui tocando muito e tá por aí
nesse mundão por aí. Cuiabá tem um harpista, um garoto que co-
meçou aqui, o cara é extraordinário na harpa.
184
PARTE 3
Conclusão
187
quando a contrapartida financeira deixa de ser das entidades e é
assumida pelos governos estaduais ou municipais; além de tornar
a seleção e acompanhamento mais próximos da realidade local.
(TURINO, 2010, p. 167)
188
devia ao fato da dificuldade de comunicação das instâncias estaduais
e municipais com o MinC.
Essa falta de informações sobre os Pontos de Cultura existen-
tes refletiu-se diretamente na fase de preparação dessa pesquisa, pois
a maior parte dos dados que conseguimos a respeito dos Pontos de
Cultura do Distrito Federal e demais Estados do Centro Oeste, esta-
vam defasados. Dessa forma, muito tempo foi perdido tentando des-
cobrir quais os Pontos estavam ativos e como contatá-los. Através do
MinC não foi possível conseguir uma lista atualizada nem dos Pontos
de Cultura ativos, nem dos Pontos de Cultura que participaram de
editais antigos e que não estão mais conveniados.
O passo seguinte foi contatar as Secretarias de Cultura de cada
Estado. Ainda assim, a resposta sempre demorava muito e, quando
recebíamos uma resposta com a lista dos PC conveniados, grande
parte os endereços, telefones e e-mails de contato estavam
desatualizados. Os próprios órgãos estaduais pareciam não saber, ou
não ter um rígido controle de quem estava recebendo os valores
relativos ao PCV. Mas esse não foi um caso isolado em nossa
pesquisa, e percebemos vários relatos na revisão bibliográfica de
situações semelhantes.
Além de pulverizar o controle sobre informações essenciais re-
lacionadas aos novos pontos de cultura conveniados, a federalização
do PCV causou uma politização dos editais. Alguns dos pontos visi-
tados relataram que alguns editais estaduais não seguiam os critérios
básicos do PCV ou que, quando eram selecionados, sofriam perse-
guição dentro do próprio órgão de cultura local.
A gente lá dentro, participando da história da Comissão Nacional
e que o fato de ter federalizado foi uma coisa que complicou de-
mais. Porque, pegar o dinheiro e dar para o Estado, quando veio o
primeiro edital de ponto de Cultura do Estado, aqui, pelo menos,
em Goiás, eles beneficiaram a Academia Goiana de Letras, isso e
aquilo, e tinha gente que falava “olha, eu nunca fiz projeto social,
mas com esse recurso eu vou fazer”. Nós conseguimos impugnar
o edital. Tá tudo errado, eles não atenderam os critérios. […] É
189
complexa essa história de achar que o Estado também tem que
bancar. Aqui, pelo menos no Estado de Goiás, a gente nunca teve
apoio, nem do Estado, nem do Município. (PC Coepi)
190
Os pilares dos Pontos de Cultura
191
interessante é o da Economia Solidária, que discute temas como
autogestão e sustentabilidade (ambiental, social e econômica). Dessa
forma, um PC pode organizar atividades (oficinas, vendas,
apresentações) tendo como base a lógica da economia solidária, com
o objetivo de gerar renda de forma sustentável e duradoura para uma
determinada comunidade periférica, tais como artesanato com
palhas, renda de bilro, cerâmica ou agricultura familiar. Esse ato de
puxar para si a tarefa de fazer o que precisa ser feito, sem esperar que
o poder público faça, é a base do Protagonismo.
Quando um grupo de pessoas percebe que pode se organizar e
apoiar ações para alcançar um objetivo comum, com liberdade de es-
colhas e sem intervenção estatal, isso resulta na compreensão de seu
papel nas relações de poder que atuam no controle de seu futuro.
Quando essa consciência é exercida com autonomia, o objetivo mai-
or foi alcançado, o Empoderamento. Nesse contexto dos PC, o em-
poderamento não foi algo dado ou permitido pelo poder público, mas
uma conquista através da conscientização da capacidade de transfor-
mação advinda da coletividade. Um auto-empoderamento.
Em texto recente (BRASIL, 2013, p. 7), o Ministério da Cultu-
ra elenca os objetivos específicos do Programa Cultura Viva:
• Ampliar o acesso da população brasileira às condições de
exercício dos direitos culturais;
• Garantir o pleno exercício dos direitos culturais aos cidadãos
brasileiros, dispondo-lhes os meios e insumos necessários
para produzir, registrar, gerir e difundir iniciativas culturais;
• Estimular o protagonismo social na elaboração e na gestão
das políticas públicas da cultura;
• Promover uma gestão pública compartilhada e participativa,
amparada em mecanismos democráticos de diálogo com a
sociedade civil;
• Consolidar os princípios da participação social nas políticas
culturais;
192
• Promover o direito à cultura como elemento essencial para o
exercício da cidadania, a diversidade cultural em suas múlti-
plas expressões simbólicas, e a atividade econômica no cam-
po cultural;
• Estimular iniciativas culturais já existentes, por meio de
apoio e fomento da União, Estados, Distrito Federal e Muni-
cípios;
• Promover o acesso aos meios de fruição, produção e difusão
cultural;
• Potencializar iniciativas culturais, visando à construção de
novos valores de cooperação e solidariedade, promovendo a
cultura de Paz e a defesa dos Direitos Humanos;
• Estimular a exploração, o uso e a apropriação dos códigos,
linguagens artísticas e espaços públicos e privados disponibi-
lizados para a ação cultural.
Percebe-se que, de forma geral, tais objetivos podem ser resu-
midos em quatro pilares: 1) A promoção de iniciativas culturais; 2) O
acesso às produções culturais existentes; 3) A valorização da cultura
local através do empoderamento e legitimação dos atores locais; 4) A
gestão compartilhada. Portanto, para as comunidades agraciadas pe-
los PC, a apresentação de quadros com indicativos de valores aloca-
dos ou quantidade de pontos agraciados, não era suficiente para ava-
liar se o PCV teria alcançado ou não seus objetivos. Por isso, a Co-
missão Nacional dos Pontos de Cultura demandou uma pesquisa com
abordagem qualitativa, individualizada, para que fosse estudado, em
maior profundidade, como os Pontos de Cultura atuaram na transfor-
mação da realidade sociocultural das comunidades.
193
Impactos no FIB
66 Seja em termos midiáticos ou, mais precisamente, ligados a classes sociais mais baixas ou
sociedades tradicionais.
194
região pois, mesmo quando são PC voltados para cursos de audiovi-
sual e cinema, suas produções sempre valorizam a cultura local (peri-
férica, em termos de bairros ou cidades). Essa valorização das práti-
cas tradicionais ou não hegemônicas, aumentam muito a autoestima
de toda a comunidade, que passam a entender que suas práticas cul-
turais têm tanto valor simbólico e/ou artístico quanto as que são con-
sideradas “alta cultura”.
De forma semelhante é o impacto na Vitalidade Comunitária
pois, elevar a autoestima das pessoas de uma certa comunidade res-
taura o sentimento de pertencimento, importância e compartilhamen-
to de um projeto comum que irá satisfazer as necessidades da comu-
nidade por um compromisso coletivo. Isso se reflete, por exemplo,
no caso do Bairro Santa Efigênia na cidade de Caldas Novas – GO,
que antes da instalação do PC CEJUVI, era muito mal apreciado pe-
las pessoas da cidade e, inclusive, pelos próprios moradores do bair-
ro. Mas, algum tempo depois que esse PC se estabeleceu lá, os jo-
vens passaram a ter orgulho de morar em um bairro que é apoiado
por um projeto como esse. Uma mudança positiva na comunidade.
Também podemos destacar a sensação de uma necessidade de
retribuição, refletida na solidariedade que as pessoas desenvolvem ao
serem acolhidos. É o que muitos relatam sobre a ideia de que o Ponto
de Cultura acaba gerando multiplicadores, que levam esse ideal de
bem-estar coletivo para seu cotidiano.
As atividades relacionadas ao Uso do tempo também impac-
tam diretamente nessa vitalidade comunitária. A oferta de cursos que
sejam do interesse das pessoas da comunidade, gratuitos ou com bai-
xo custo de investimento, faz com que muitos jovens e crianças pre-
firam participar dessas atividades do que ficar “sem fazer nada”.
Quando perguntados sobre a importância dos projetos desenvolvidos
nos pontos que atendem crianças e adolescentes, a resposta mais co-
mum, tanto dos participantes, quanto das pessoas da comunidade em
geral, é que “tira as crianças da rua”. Percebeu-se que as possibilida-
des ofertadas pelos PC, redefiniram a maneira de crianças e adoles-
centes organizarem o seu tempo entre escola, lazer e família.
195
O domínio da Educação também se encontra presente em
alguns pontos, através das “aulas de reforço escolar”. Essa é uma
atividade muito importante para o benefício de famílias pobres, que
fazem uso dessa oportunidade com o intuito de “elevar o nível de
escolaridade” de seus filhos, e propiciar uma transformação nas
possibilidades de emprego e renda da próxima geração dessa família.
Assim como os domínios anteriores, essas ações também refletem
positivamente na autoestima (crença de que é capaz de alcançar seus
objetivos) e no uso do tempo.
Contudo, existem dois outros indicadores desse domínio que
promovem um impacto mais profundo e por isso mesmo, menos
imediato. Um deles aborda a “alfabetização, manutenção ou
valorização de línguas indígenas, alóctones ou oficial”, tal como
encontramos no PC Yokoni Kopenoti; e o outro é baseado na
“reflexão sobre valores éticos e morais”, tal como presentes nos PC
COEPI e Kongo Nya. Essas ações promovem um questionamento
sobre o que significa ser indígena ou negro, por exemplo, numa
sociedade dominada pelos características e valores dos “brancos”.
Em termos educacionais, a discussão filosófica que aborda os
problemas morais, éticos e identitários a respeito de aspectos
culturais como o uso de determinada língua, a forma de se vestir, ou
os elementos simbólicos e religiosos, podem ter resultados mais
duradouros e impactantes, pois possibilitam uma ruptura
epistemológica. É uma forma de oferecer ferramentas para se
questionar a realidade que se vive, sem ser um mero seguidor de
ideias alheias. Capacitar a reflexão é empoderar. E esse é um
conceito essencial ao Programa Cultura Viva.
196
Cultura Uso do Bem-estar Vitalidade Educação Boa Meio Saúde
tempo psicológico comunitária Padrão de governança ambiente
vida
Athos Bulcão X X
Kongo Nya X X X X X X
Ludocriarte X X X X X X X
Caminhos Audiovisuais X X X X X X
Garatuja X X
Encubadora de Palhaços X X X
Artes da Tribo X X
Canto a Canto X X X
ESTEC X X X X
Ciranda X X X X X
Coletivo Maloca X X X X X
Só Falta Você X X X X X
CENPRO – Faces da Cultura X X X X X
CEJUVI X X X X X
Yokoni Kopenoti X X X X X X X
Nelito Camera X X X X
Pajaro Campana X X
COEPI X X X X X X X X
Tabela 1 – Relação dos domínios do FIB impactados pelas atividades realizadas pelos Pontos de Cultura pesquisados.
O domínio do Padrão de vida aparece em muitos pontos, mas
não em todos. A oferta de cursos com intenções profissionalizantes
aparece, de forma intencional, em pontos como o Caminhos Audiovi-
suais, CENPRO – Faces da Cultura, e Ciranda. Por outro lado, o
mero fato de ofertar cursos diversos, também amplia as possibilida-
des de atuação profissional de pessoas que antes não as vislumbra-
vam. Cursos de informática, por exemplo, têm um impacto imediato
sobre as chances de conseguir um emprego. Mas há relatos de pesso-
as que fizeram cursos de teatro, dança, música, entre outros, que ini-
ciaram como um lazer, ou uma oportunidade de realizar um “sonho
de infância”, e que acabaram por atuar profissionalmente nessa área.
O PC Pájaro Campana tem o exemplo de um garoto que se tor-
nou um harpista profissional, mesmo não sendo essa a intenção inici-
al desse projeto. Muitos jovens e crianças que iniciaram no projeto
Ciranda, hoje atuam em orquestras profissionais ou ingressaram em
cursos superiores de música. Outra situação muito comum, relatada
pelos coordenadores dos PC, são ex-alunos que se destacam e que
passam a atuar como estagiários no próprio ponto, já adquirindo uma
experiência profissional e um pequeno, mas importante, ganho finan-
ceiro.
Uma situação que nos chamou a atenção dentro desse domí-
nio, foi uma atividade desenvolvida no PC Ludocriarte, uma oficina
chamada “Mundo do trabalho”, voltada para discussões sobre como
fazer entrevistas e se comportar na atuação profissional. Essa ativida-
de, juntamente com oficinas de caráter mais técnico (informática e
cinema), tem contribuído muito para auxiliar esses jovens a se inserir
no mercado de trabalho, ou mesmo avançar em suas carreiras.
Nessa pesquisa, o domínio da Boa governança foi mais iden-
tificado nas entrevistas com os coordenadores e professores dos PC.
Para muitos desses entrevistados, houve uma aumento na sua percep-
ção em relação aos investimentos que o governo precisa fazer em
áreas como a cultura e a educação em geral. Os coordenadores dos
PC vivenciam cotidianamente o que significa essa falta de investi-
mento. Nas cidades menores (menos de cinquenta mil habitantes)
198
como Primavera do Leste, Ivinhema, Amambai, Campo Verde e Pire-
nópolis, havia um discurso recorrente de que as atividades oferecidas
das pelos PC, em muitos casos, eram as únicas opções culturais na-
queles municípios. Foram os PC que passaram a organizar festas,
apresentações musicais, e teatrais. Há, inclusive, o caso do PC Pajaro
Campana que se mobilizou para resgatar o Toro Candil 67, uma brin-
cadeira popular que há tempos não mais se praticava. Ou o exemplo
do Ponto de Cultura Só Falta Você, que fomentava as festas, quadri-
lhas e danças folclóricas na recém fundada, e sem nenhuma tradição
própria, cidade de Campo Verde – MT.
Dessa forma, há, entre tais coordenadores, a clara percepção
de que eles estão atuando e suprindo uma lacuna que deveria ser de
competência do ente público. E fazem isso com um orçamento muito
inferior do que o próprio Estado gastaria para oferecer as mesmas
atividades. Por isso, um dos clichês do discurso dos pontos de cultura
é dizer que “a gente transforma um real em dez”.
Dos dezoito PC visitados, o domínio do Meio ambiente só
surge em três pontos, sendo que desses, somente um, o COEPI, pro-
movia ações efetivas para o meio ambiente. Essas ações rendeu, in-
clusive, parcerias com o Ministério do Meio Ambiente, com o IBA-
MA, e com a WWF-Brasil 68. Os outros PC não tinham nenhuma
ação específica que pudessem ser relacionadas diretamente com os
indicadores do meio ambiente.
199
O domínio da Saúde também só pôde ser relacionado direta-
mente com o acompanhamento psicológico dos participantes e da fa-
mília promovidas pelo PC Ludocriarte. De forma secundária, como
ideias a serem implantadas mas ainda não efetivadas, puderam ser
identificadas em outros três dos pontos pesquisados (CEJUVI, COE-
PI, Yokoni Kopenoti). Mesmo na pesquisa bibliográfica, somente a
dissertação de Denise Diba (2012), descrita na página 47, analisa
como a promoção da saúde pode ser alcançada através das atividades
de um grupo teatral. De forma análoga, um olhar mais minucioso
também poderia relacionar, de forma indireta, algumas das atividades
desenvolvidas nos pontos com a promoção da saúde. Todavia, como
nosso aporte metodológico estava condicionado aos impactos diretos
das ações dos PC nos indicadores do FIB, essa relação indireta não
foi objeto da nossa análise.
Como esse estudo procurou demonstrar, a felicidade não está
relacionada com o acúmulo de bens. Os indicadores do FIB foram
desenvolvidos com a intenção de analisar como a felicidade se
apresenta nos mais diferentes aspectos. E o bem-estar social é um
dos indicadores que mais afeta o nível de felicidade de uma
comunidade. Por isso, espera-se que o Estado desenvolva ou
identifique estudos analíticos que possam estimar o impacto de
potenciais políticas públicas na felicidade/bem-estar da sociedade.
Essa pesquisa pode ser entendida como um desses estudos, ao
demonstrar como pequenas ações podem afetar a qualidade de vida
de uma comunidade.
200
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219
Esta publicação apresenta os resultados do projeto
de pesquisa intitulado Programa Cultura Viva:
Impactos e transformações sociais, que integra um
conjunto de estudos desenvolvidos no âmbito do
Observatório de Políticas Públicas Culturais (OPCULT)
da Universidade de Brasília. Este relatório está dividido
em três partes. A primeira parte conta com quatro
capítulos que abordam análise geral do objeto de
pesquisa. A segunda parte é composta pela análise
individual de oito Pontos de Cultura dentre os dezoito
visitados. Por fim, a terceira parte apresenta uma breve
conclusão sobre o estudo, além de possibilidades para
futuros desdobramentos. Para a análise dos dados foi
escolhido o indicador de Felicidade Interna Bruta (FIB)
para auxiliar na identificação do impacto que as
ações dos Pontos de Cultura teriam em suas
comunidades.
www.opcult.unb.br