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ESCUTA!

A Paisagem
Sonora
d a C i dad e
Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro
LUIZ PAULO FERNANDEZ CONDE

Secretário Municipal de Meio Ambiente


MAURÍCIO LOBO

Subsecretária Municipal de Meio Ambiente


PATRÍCIA RIBEIRO DE CARVALHO

Assessora de Comunicação Social


ANA PAULA SILVEIRA

Coordenadora de Planejamento e Educação Ambiental


MAGDA VALVERDE

Gerente de Educação Ambiental


ESTELA NEVES / ANA AMÉLIA MURALHA

Seminários de Música Pró-Arte

Presidente:
ELZA USURPATOR SCHACHTER

Diretor Executivo:
JOSÉ A. RODRIGUES NETO

Diretora Artística:
REJANE FRANÇA

Secretário para o convênio:


LUCAS LEANDRO

ESCUTA! Um Abraço Sonoro na Cidade

Comissão Curadora:
TATO TABORDA, RODOLFO CAESAR, CHICO MELLO, TIM RESCALA,
RODRIGO C. VELLOSO, CAROLE GUBERNIKOF E CECÍLIA CONDE.

ESTE TRABALHO FOI ELABORADO PELOS SEMINÁRIOS DE MÚSICA


PRÓ-ARTE EM CONVÊNIO COM A SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO
AMBIENTE - SMAC, SOB A SUPERVISÃO DA GERÊNCIA DE EDUCAÇÃO
AMBIENTAL DA COORDENADORIA DE PLANEJAMENTO E EDUCAÇÃO
AMBIENTAL DA SMAC.
ESCUTA!

A Paisagem
Sonora
da Cidade
TRADUÇÕES
Janete EI Haouli, Marisa Fonterrada, Regina Porto e Tato Taborda

PESQUISA E PLANO DE CONTEÚDOS


Janete EI Haouli, Marisa Fonterrada e Tato Taborda

TEXTOS
Janete EI Haouli, Marisa Fonterrada, Tato Taborda, Estela Neves, Elizabeth
Sant'Anna e Natalia L.F. Couto

COLABORADORES
Chico Mello, Rodolfo Caesar e Cecília Conde

EDITORAÇÃO, PESQUISA MUSICAL (MPB) E TEXTO FINAL


Regina Porto

PRODUÇÃO
Lísia Fernandez

SUPERVISÃO TÉCNICA
Estela Neves Elizabeth Sant'Anna

REVISÃO
Ana Paula Silveira

PROGRAMAÇÃO VISUAL
Tatiana Podlubny

Equipe Técnica de Apoio: Ana Aniélia Caruso Muralha, Luiz Carlos Motta,
Magda Valverde e Natalia L. F. Couto .

COORDENAÇÃO GERAL
Tato Taborda

Esta cartilha é uma adaptação dos conceitos básicos de Ecologia Acústica


desenvolvidos pelo músico, professor, compositor e pesquisador canadense R.
Murray Schafer (1933) em seus livros The Book of Noise (" O Livro do Ruído"),
The Thinking Ear ("O Ouvido Pensante"), A Sound Education (" Educação
Sonora"), Voices of Tirany rVozes da Tirania") e The Tuning of the World ("A
Afinação do Mundo").
PREFÁCIO

É com grande satisfação que a Prefeitura do Rio de Janeiro, através de sua


Secretaria do Meio Ambiente, apresenta a cartilha Escuta! A Paisagem Sonora
da Cidade, publicação educativa destinada a professores da rede escolar
pública municipal, mas que indiretamente pretende atingir todo cidadão carioca.

A SMAC tem, entre suas atribuições, o controle da poluição sonora relativa a


fontes fixas, desenvolvendo atividades de fiscalização, vistoria, medições e
aplicação de sanções administrativas. Atualmente, esta forma de poluição
responde pela maior demanda de vistorias e reclamações recebidas, atingindo
cerca de 60% do total.

Acompanhando o rápido crescimento deste índice, constatou-se então a


necessidade de um tratamento educativo nesta área, a fim de se iniciar o
desenvolvimento de um processo de reflexão, por parte de nossa popu-lação,
sobre a questão da percepção sonora, seus efeitos e interações com o
ambiente urbano.

A intensa urbanização da cidade acarretou um excesso de ruídos que


acabaram por encobrir sons mais agradáveis, tais corno o canto dos
assarinhos, das cigarras, o som das folhas ao vento e a água dos chafarizes,
que merecem ser resgatados através de ações individuais e coletivas.

Uma parceria entre nossa Secretaria e a Pró-Arte propiciou, em novembro de


1998, a realização do projeto ESCUTA! Um Abraço Sonoro na Cidade quando
diversos especialistas reuniram-se em um evento sobre o tema, discutindo a
situação de nossa cidade e como melhorar sua qualidade sonora. O resultado
desses debates está nesta cartilha, que conta ainda com uma abordagem
explicativa de som, ruído e suas medições, acrescida de dicas e informações
de como melhorar a qualidade-sonora nas salas de aula, nas casas, entre
vizinhos e na cidade em geral.

Mais do que uma atuação fiscalizatória, a Secretaria de Meio Ambiente


pre-tende assim contribuir para a criação de uma "cultura sonora",
despertan-do no cidadão o conhecimento da profunda influência que o
ambiente sonoro tem sobre sua qualidade de vida.
MAURÍCIO LOBO
Secretário Municipal de Meio Ambiente
"DIZEM QUE OS ANIMAIS E AVES BRASILEIRAS SÃO MENOS
CANOROS, MAIS 'BARULHENTOS' QUE OS DE PAÍSES DE
REGIÕES MENOS TROPICAIS/EQUATORIAIS. LÁ CANTA-SE
MAIS, ENQUANTO AQUI SE GRITA. CLARO! COMO SE FAZER
OUVIR EM UMA FLORESTA AMAZÔNICA SENÃO
ESCANCARANDO A VOZ E INSISTINDO ITERATIVAMENTE? O
RIO NÃO É AMAZÔNICO, MAS TEM UMA CONCENTRAÇÃO
SONORA QUASE TÃO RICA, ESPECIALMENTE POR CAUSA DE
SUA CONDIÇÃO TÃO DISPARATADA DE LUGAR
MEIO-CIDADE, MEIO-MATO."

Em novembro de 1998, um grupo de compositores ligados aos Seminários de


Música Pró-Arte organizou no Rio de Janeiro o festival ESCUTA! Um abraço
sonoro na cidade, uma parceria com a Rio Arte e a Secretaria Municipal de
Meio Ambiente. Durante dez dias, o evento promoveu concertos, instalações
sonoras, mesas-redondas e diversas atividades pedagógicas relacionadas à
melhoria da qualidade sonora do Rio de Janeiro. Entre os resultados desse
encontro, inclui-se esta cartilha, dirigida ao cidadão preocupado com uma das
maiores fontes de conflitos da vida moderna: a poluição sonora.

INTRODUÇÃO

As informações que você vai encontrar aqui reúnem a experiência de diver-sos


músicos, pesquisadores, técnicos e educadores presentes ao evento. Nelas,
são apresentadas alternativas que o cidadão tem a seu alcance para minimizar
os efeitos do ruído indesejado sobre a saúde; obter amparo legal quando se
sentir prejudicado pelo ruído indiscriminado ou excessivo; aperfeiçoar a
capacidade auditiva e a sensibilidade aos sons do ambiente; e ser capaz de
atos de escolha individuais ou coletivos que contribuam para a melhoria da
qualidade sonora ambienta!

O som em excesso - ou indevido - traz conseqüências severas para a nossa


qualidade de vida. Sua falta de controle, além de afetar a saúde, contamina as
relações sociais. No Rio de Janeiro, nada menos que 66% das reclamações
recebidas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente em 2000 foram
relacionadas a agressões sonoras. Esse percentual, em uma cidade com
tantos outros focos potenciais de conflito ambiental, mostra a dimensão que a
questão do som assume para os seus habitantes.

Como poucos conhecem os direitos amparados por lei, muitos acabam


contribuindo para o aumento do ruído e da degradação ambiental. Às vezes, o
mesmo cidadão que registra uma queixa contra agressão sonora não se dá
conta de sua própria responsabilidade, em outros momentos, na formação do
lixo sonoro.

Na década de 70, o músico e educador canadense R.Murray Schafer,


preocupado com os efeitos desastrosos da poluição sonora sobre a população,
desenvolveu um projeto intitulado "Paisagem Sonora Mundial", junto ao
Departamento de Comunicações da Universidade de Simon Fraser, na
Columbia Britânica. Esse foi o primeiro estudo sistemático sobre o ruído em
ambientes rurais e urbanos. Seu objetivo era chamar a atenção da sociedade
para o tema.

Ao mesmo tempo, apontava medidas práticas para controlar o excesso de


ruído a partir da melhoria da percepção auditiva das pessoas. Com esse
trabalho, Schafer e sua equipe demonstraram ser possível motivar as
comunidades a ter um papel ativo na criação de suas próprias paisagens
sonoras - ou ambientes acústicos. Há quase trinta anos, Schafer vem sendo o
incansável defensor de uma Ecologia Sonora, conceito bastante conhecido nos
países do hemisfério Norte, mas ainda pouco no Terceiro Mundo. Schafer, que
tem visitado o Brasil com freqüência, nos autorizou a utilizar trechos de suas
publicações adaptados às necessidades brasileiras ou mesmo textualmente
reproduzidos.

“Para que possa ser verdadeiramente eficaz, a reprogramação da paisagem


sonora deve começar de dentro, como uma exigência dos cidadãos sensíveis.
É um processo educacional que parte de um individuo ou de pequenos grupos,
e rapidamente se propaga, como círculos em um lago, até atingir toda a
cidadania e finalmente os governantes. Só então, podemos esperar que a
paisagem sonora mundial se regenere em elegância, beleza e identidade
local”.
Murray Schafer

“Meu barracão lá no morro do Salgueiro/


Tinha o cantar alegre de um viveiro...”

(Silvio Caldas – Orestes Barbosa, Chão de estrelas)


A AMPLIAÇÃO DA CAPACIDADE DE PERCEBER O AMBIENTE
SONORO, A AÇÃO EM FAVOR DA RESTAURAÇÃO DO
EQUILÍBRIO DESSE AMBIENTE, A UNIÃO DOS INDIVIDUOS DE
UMA DETERMINADA COMUNIDADE NA SOLUÇÃO DA QUESTÃO
DA POLUIÇÃO SONORA OU NA DIMINUIÇÃO DOS IMPACTOS
SONOROS AMBIENTAIS SÃO TODOS TEMAS REFERENTES À
ECOLOGIA ACÚSTICA. ESSE TRABALHO, DESENVOLVIDO COM
VISTA AO RESTABELECIMENTO DO EQUILÍBRIO ENTRE
HOMEM & AMBIENTE, VISA A CONSTRUÇÃO DE UMA
PAISAGEM SONORA SAUDÁVEL, CRIATIVA E SUGESTIVA.

Paisagem no tempo

Tente escutar o retrato sonoro de sua cidade. É um concerto sonoro fascinante


ou exasperador? Um ouvinte atento irá perceber quais são os instrumentos
dominantes nessa "orquestra": buzinas, sirenes, motocicletas, caminhões,
britadeiras, serras elétricas, máquinas pesadas, aviões. Todos esses roncos
soam mais forte que a voz humana. Juntos, no espaço de um século,
cresceram a ponto de espalhar uma epidemia de Poluição Sonora mundo
afora.

Os desequilíbrios sonoros da paisagem ocorrem muito mais na cidade grande


do que no campo. Na cidade, os sons são tantos e tão fortes, que se
sobrepõem uns aos outros. Essa massa sonora constante e indiferenciada
pode minar nossa energia e capacidade de ação. Já a paisagem de locais
afastados do burburinho urbano, nos campos, nas florestas, apresenta sons
bem melhor definidos.

Outra característica sonora de ambientes não-poluídos é sua permanente


mutação. Os sons diferenciam-se de acordo com o tempo e as estações - há
sons noturnos e diurnos, sons sazonais. Na vida urbana, a paisagem sonora
também sofre alterações, embora menos marcantes em relação à estação do
ano. Modifica-se mais a partir das mudanças tecnológicas de consumo, como,
por exemplo, pela utilização em massa de novas máquinas e utensílios.

O som reflete aquilo que somos

“A cidade não para/ A cidade só cresce/


o de cima sobe/ e o de baixo desce”

(Chico Science, A cidade)

Paisagem diferente

Como ocorre com qualquer cidadão do mundo, o ouvido do carioca também


mudou com o tempo. Em meados do século 19, o Rio de Janeiro tinha cerca de
250 mil habitantes, a metade deles, escravos. Os limites da cidade eram a
oeste, o campo de Santana e, ao Sul, o Largo do Machado. Nessa área se
desenrolava a vida da cidade. Nessa época, a Câmara Municipal estabelece a
"mão e contramão"numa tentativa de organizar o trânsito "caótico"...

O Rio era uma cidade de calçamento precário e estradas de terra. A


sonoridade urbana provinha de cascos de cavalos, estalos de chicotes,
guinchos de carros de boi, carroças de água. E os cronistas da época falavam
em "gigantescos engarrafamentos"... Com a abolição da escravatura, o Rio
entra na vida mundana. Bandas de música, cantores, repiques de sinos, festas
dos negros, bordéis de luxo, estrondos e silvos dominavam dia e noite a mais
importante "barulhópolis do mundo". Mas, rapidamente, os sons se
modificariam ou seriam reciclados.

“Ah! Barracão/ tua voz eu escuto/


Não esqueço um minuto/
O que sei que tu és...”

(Luis Antonio - Odemar Magalhães, Barracão)

No começo do século, a máquina já faz parte da paisagem sonora carioca. Diz


João Antonio: "Em 1921, já não eram novidade nenhuma os trens da Central
do Brasil. O vozerio dos vendedores maltrapilhos fazem uma zoada durante a
viagem toda e os trens, lerdos e chacoalhando a sessenta quilômetros por
hora, mostram lá fora, pelas janelas de vidro quebrado, o Rio Zona Norte ... de
um lado e outro dos trilhos dos trens da Central, o casario imundo, encardido,
descascado, e as favelas Salgueiro, Mangueira, Candelária, juntas, trepam nos
morros ..."

Não há paisagem sonora constante

“Da Central passando na Mangueira/


Dando uma volta na Pavuna/
E chegando em Madureira/
É lá que o samba rola de primeira...”

(Jorge Ben Jor, W/Brasil)

Ecologia Acústica

Ecologia é um vocábulo de origem grega - "óikos" (casa, ambiente) e "logo"


(estudo) - que estuda a relação entre os organismos vivos e seu ambiente. Os
estudos ambientais fazem parte de um modo peculiar de ver o mundo. As
relações e interações entre os elementos e seu habitat requerem condições
necessárias à vida. Em certo sentido, a Ecologia opõe-se à outra visão de
mundo, preponderante no mundo moderno, firmada na idéia de evolução,
desenvolvimento e progresso.
“A ciência não avança/
A ciência alcança/
A ciência em si...”

(Gilberto Gil, Arnaldo Antunes, A ciência em si)

A visão ecológica percebe o ser humano não mais como centro, mas como
parte da natureza. Com isso, resgata uma noção da vida comum às culturas
tradicionais e às da Antigüidade. Na Conferência Internacional Eco-92, sediada
no Rio de Janeiro, representantes de mais de 170 países reiteraram essa
posição, sendo signatários de um documento que reconhece a importância da
educação na "construção de um mundo socialmente justo e ecologicamente
equilibrado".

Ecologia Acústica é, por extensão, o estudo da relação entre os organismos


vivos e seu ambiente sonoro. Do mesmo modo que os desequilíbrios
ambientais se intensificaram a partir da idéia de desenvolvimento e progresso,
o desequilíbrio do ambiente sonoro começou a se fazer sentir à época da
Revolução Industrial, com o advento das máquinas.

PLANEJAMENTO ACÚSTICO - UMA NOVA


INTERDISCIPLINA QUE BUSCA PRINCÍPIOS PARA A
MELHORIA DA QUALIDADE ESTÉTICA DO AMBIENTE
ACÚSTICO OU PAISAGEM SONORA. INCLUEM-SE AÍ A
ELIMINAÇÃO OU RESTRIÇÃO DE CERTOS SONS
(ABATIMENTO DO RUÍDO), A AVALIAÇÃO DE SONS
NOVOS ANTES DE SEREM INTEGRADOS AO AMBIENTE,
A PRESERVAÇÃO DE SONS (MARCAS SONORAS) E,
SOBRETUDO, A INCLUSÃO IMAGINATIVA DE SONS QUE
CRIEM AMBIENTES ACÚSTICOS SUGESTIVOS. O
PLANEJAMENTO ACÚSTICO PODE INCLUIR A
COMPOSIÇÃO DE AMBIENTES-MODELO. A ESSE
RESPEITO, APROXIMA-SE DA OBRA MUSICAL
CONTEMPORÂNEA.

Qualidade sonora e meio ambiente

Meio ambiente não é apenas sinônimo de natureza. Diz respeito a tudo o que
se relacione com a vida, manutenção e reprodução de um ser ou de um grupo
de seres. Para uma compreensão mais abrangente de todas suas implicações,
hoje, é preciso incluir, no conceito de meio ambiente, não só os elementos
físicos e naturais, como também os históricos e sociais, os culturais, os
tecnológicos. E evidentemente, também, seus aspectos políticos.
Problemas ambientais envolvem, freqüentemente, interesses econômicos. Os
conflitos ambientais se estabelecem, em última análise, entre os que defendem
os interesses coletivos e aqueles que têm interesses particulares diferentes e
querem fazê-Ios valer. Defender a riqueza representada por um ambiente de
boa qualidade é tarefa de todos - Estado e sociedade. A sociedade define seus
padrões e seus limites de tolerância e, por intermédio de seus representantes,
estabelece e aprimora as regras do jogo, a legislação. Mas para isto é preciso
que o desejo de todos seja expresso na formulação e no processo decisório
das políticas públicas.

“O povo sabe o que quer/


Mas o povo também quer o que não sabe...”

(Giberto Gil, Rep)

O meio ambiente é considerado um bem de interesse difuso. lnteresse difuso é


o que une pessoas não muito bem identificadas. Por exemplo, os usuários da
água de um rio, os consumidores de uma mesma marca de leite em caixinha,
os receptores de uma mesma rádio. Há instrumentos legais especiais para a
proteção dos bens de interesse difuso, que garantem a punição dos
responsáveis pelo dano e a sua reparação.

CONSCIENTIZE-SE

A paisagem sonora de um lugar é parte integrante do meio ambiente, e suas


características são importantes para a determinação da qualidade ambienta!.
As interações entre os produtores de sons e aqueles que os recebem podem
tomar a forma de conflito quando a produção sonora transforma-se em
atividade poluidora.

“Pois em toda Via Láctea/ Não existe um só planeta/ Igual a esse aqui/
... Baticum, ziriguidum, dois mil e um/Só tem aqui...”

(Lenine, O dia em que faremos contato)


O SOM É O AGENTE PRINCIPAL DE TODO O MATERIAL AQUI
REUNIDO. NESTE CAPÍTULO, VAMOS CONHECER UM POUCO
MAIS SOBRESUA NATUREZA FÍSICA. ENTENDER COMO ESSA
ENTIDADE OPERA EM NOSSO MUNDO E EM NOSSA VIDA
GARANTE UMA MAIOR QUALIDADE DE ESCUTA.

O que é som?

Som é o resultado audível de uma vibração. Nós vivemos em um mundo de


vibrações. Essas vibrações transmitem-se pelo ar por meio de ondas, como as
ondas do mar. Estamos permanentemente imersos em um oceano de sons,
que nos atingem por todas as direções. Mesmo o menor movimento provoca
vibrações, e todas se propagam.

Quando alguém bate um lápis em uma mesa, está transferindo ondas em


movimento para as moléculas do móvel. Esse movimento empurra as
moléculas de ar vizinhas que, por sua vez, empurrarão outras moléculas. O
movimento vibratório do ar atinge o ouvido e faz com que o tímpano (uma
espécie de tambor) também vibre. E, então, alguém ouve a batida do lápis
sobre a mesa. Logo, sempre que um som é ouvido, algo está vibrando.

“A vida vem em ondas como o mar/ num indo e vindo infinito...”

(Lulu Santos – Nelson Motta, Como uma onda no mar)


PARAMETROS DO SOM

Som e ruído são grandezas físicas mensuráveis. Suas características podem


ser captadas por meio de cinco medidas de observação ou parâmetros
fundamentais:

1. ALTURA, que é resultado do número de vibrações por segundo,


medida em Hertz (Hz)
2. DURAÇÃO, que é o tempo durante o qual o som é percebido
3. TIMBRE, que é o resultado da combinação e do peso específico de
cada um dos parciais harmônicos desse som e varia de acordo com o
material e formato do objeto em vibração (é o timbre que confere
característica e personalidade ao som, o que permite que a fonte
sonora seja identificada mesmo sem ser vista)
4. INTENSIDADE, que traduz a pressão sonora produzida por esse
som, medida em Decibéis (Db)
5. ESPAÇO, que traduz a posição espacial desse som, também
registrada pela nossa audição e não explicada por nenhum dos
parâmetros anteriores.

A freqüência permite definir a altura do som - do grave ao agudo - e sua


unidade de medida é o Hertz (Hz) 1 Hz = uma vibração (ou oscilação completa
do corpo vibratório) por segundo.
O som é normalmente audível quando emitido entre 20 e 20.000 Hz. As
vibrações inferiores a esse limite chamam-se infra-sons e as superiores
chamam-se ultra-sons. A escala de audibilidade varia de indivíduo para
indivíduo, e existem muitas diferenças entre as várias espécies animais.
Morcegos, golfinhos e cachorros, por exemplo, captam freqüências muito
superiores àquelas percebidas pelos seres humanos. Já as freqüências muito
lentas, abaixo de 20 Hz (ou 20 vibrações por segundo), não são percebidas
por, nós como alturas, mas como pulsos, ou seja, batidas periódicas.

“Eu conheço esse bumbo/


Esse bumboé da Mangueira/
... Batendo no compasso do meu coração/
Bum, bum, bum...”

(Jorge Bem Jor, Bumbo da Mangueira)


O que é decibel?

O decibel é uma unidade de medida da intensidade do som. Ele é usado para


expressar a relação existente entre o som mais fraco que podemos ouvir e os
outros sons do ambiente. O ouvido humano é capaz de perceber pressões
sonoras (intensidades) desde cerca de O dB (limiar da audição) até algo acima
de 130 dB (limiar da dor). A pressão sonora (p) é o valor médio eficaz das
flutuações da pressão atmosférica causadas pela passagem das ondas
sonoras.

Quando a energia acústica é multiplicada por dez, a sensação sonora não é


aumentada senão em uma unidade chamada bel. Na prática, utiliza-se a
décima parte dessa grandeza: o decibel (dB). A noção de decibel, ainda que se
leve em conta a totalidade do sinal sonoro, é insuficiente para constatar a
sensação sonora efetivamente percebida pelo ouvido humano. Como a audição
registra com mais facilidade as freqüências médias e agudas, o nível sonoro
expresso em dB é corrigido por aparelhos de medição de ruído. Esse sistema
de correção chama-se ''filtro de ponderação", "curva de ponderação" ou "escala
de compensação". Existem diversos sistemas, mas o mais comumente utilizado
é a Escala de Compensação A - de nível sonoro expresso em dB(A) - e que
representa a sensação de ruído efetivamente percebida pelo ouvido.

“Ouvido ouve o que deseja/ e o que não”

(Arnaldo Antunes, Tato)

EXEMPLOS EM ESCALA GRADATIVA DE MEDIÇÃO POR DECIBÉIS

NÍVEIS SONOROS COMPARATIVOS

Decolagem de avião a jato (a 33 metros):


Britadeira ou perfuratriz: 130 dB(A)
Show de rock (alto-falantes próximos): 120 dB(A)
Motosserra: 110 dB(A)
Metrô (dentro do vagão): 100 dB(A)
Aspirador de pó: 95 dB(A)
Canto (forte): 80 dB(A)
Carro em movimento (a 5 m): 75 dB(A)
Conversa normal 70 dB(A)
Escritório de tamanho médio: 60 dB(A)
Casa (silenciosa): 50 dB(A)
Sussurro leve: 40 dB(A)
Farfalhar de folhas: 30 dB(A)
Limite da audição: 20 dB(A)
O dB(A)
A exposição contínua a níveis de intensidade superiores a 85 dB pode provocar
danos auditivos, que podem progredir, de acordo com a intensidade e duração
dos sons emitidos, até a surdez total e irreversível.

Para que serve a escuta?

Todo esse fantástico sistema de captura e processamento de informações - o


aparelho auditivo -, em conjunto com o sistema nervoso central, constitui um
sentido de grande importância para a comunicação e para a percepção do
meio ambiente. Por meio da audição, o organismo monitora permanentemente
o meio ao seu redor. Além de essencial para sua defesa, a escuta é um meio
de comunicação entre os seres - sejam de mesma espécie ou de espécies
diferentes.

“Escuta o mato crescendo em paz/


Escuta o mato crescendo/ Escuta o mato/ Escuta...”

(Tom Jobim, Borzeguim)

O que é ruído?

Ruído é um termo que, genericamente, indica um som sentido como


desagradáveis eventos acústicos muito fortes ou distúrbios presentes em um
sistema de comunicação. Por isso, a percepção do ruído depende
fundamentalmente do contexto e dos condicionamentos estéticos, estilísticos,
culturais e subjetivos de quem ouve.

SOM ERRADO NO LUGAR ERRADO - RUÍDO É


QUALQUER SOM INDESEJADO. RUÍDO É O SOM ERRADO
NO LUGAR ERRADO. SENDO ASSIM, É UM TERMO
RELATIVO. O MESMO SOM, OUVIDO SOB
CIRCUNSTÂNCIAS DIVERSAS, PODE SER DESEJADO OU
NÃO, PODE SER SINAL OU RUÍDO. UM BOM MECÂNICO
SABE, PELO SOM, QUANDO UMA MÁQUINA FUNCIONA
BEM. ELE "AFINA" A MÁQUINA DO MESMO MODO COMO
UM MÚSICO AFINA O VIOLINO. PARA O MECÂNICO, O
SOM DE UMA MOTOCICLETA FUNCIONA COMO SINAL.
MAS O MESMO SOM, OUVIDO POR ALGUÉM DURANTE O
SONO OU EM MOMENTO DE CONCENTRAÇÃO, TORNA-
SE RUÍDO. UM MÚSICO ESTUDANDO SEU INSTRUMENTO
PODE SOAR RUÍDO PARA ALGUÉM QUE SE SENTIR
INCOMODADO POR ELE.
“Motocilcetas querendo atenção ás três da manhã/
É só música urbana...”

(Renato Russo, Música Urbana 2)

Ruído não se discute

Se para a Física, o ruído é apenas um som constituído por grande número de


vibrações acústicas com relações de amplitude e fase distribuídas ao acaso
(em outras palavras, um som de composição interna complexa), para a música
atual, ruído também é uma forma de expressão.

É importante reconhecê-Io, portanto, como fenômeno complexo e sujeito a


distintos níveis de escuta. Ter clareza sobre esse aspecto evitará pré-
julgamentos definitivos ou preconceitos equivocados (é quando alguém
pergunta: "isso é música?").

“Minha alma canta/ Vejo o Rio de Janeiro...”

(Tom Jobim, Samba do avião)

Ruído de fundo

Quem já teve a oportunidade de apreciar o Rio de Janeiro de uma vista


panorâmica, pôde perceber que a cidade compõe mais que uma bela
paisagem: ela produz uma sonoridade peculiar de grande centro urbano. Trata-
se de um zumbido grave e constante, que varia lentamente ao longo do dia,
aumentando nos horários de maior atividade e diminuindo à noite. Esse é um
exemplo de ruído de fundo. A soma de todos os sons emitidos em um
determinado ambiente forma essa "massa sonora". Os sons mais imediatos e
reconhecíveis tomam o primeiro plano, sobre um fundo distante e difuso.
Nesse, os sons se misturam e perdem suas características individuais. Ruído
de fundo é, portanto, esse resíduo sonoro "nebuloso" por trás dos sons
identificáveis. Ele varia em composição e intensidade conforme a hora e as
características do local.

Ruídos na paisagem

A partir da Era Industrial que irrompe na Inglaterra no século 18,


estabelecendo-se pela Europa no século seguinte -, a paisagem sonora sofreu
uma transformação radical. Os sons mecânicos, de intensidades até então
inéditas para a humanidade, logo tomariam a paisagem. Com o tempo, o ruído
ambiental ganhou proporções crescentes e incorporou-se à vida social. Cada
ruído assimilado exerce nova e inevitável influência sobre os homens e sobre a
música que esses mesmos homens fazem. É preciso ter isso em mente para
uma apreciação mais justa e respeitosa das diferenças culturais e
comportamentais. A música, como toda a cultura, é dinâmica. Ela se adequa a
diferentes sociedades e épocas, e se transforma conforme os critérios de valor
conferidos ao som e ao ruído.

“Ê, Ê, Ê, tumbalelê/ é o jongo do cateretê/ é o samba/ é o mambo/


É o tangolomango/ é o bate estaca/ é o jungle/ é o tecno/ é o etno...”

(Adriana Calcanhoto – Waly Salomão, Pista de dança)

Ruído como música

O conceito de ruído pode reportar-se a um som percebido como interferência


ou a um som indesejado. Mas não apenas a isso. O ruído também pode ser
considerado uma matéria-prima valiosa, sendo intencionalmente utilizado na
composição moderna como fonte musical. No início do século 20, o repertório
de sons utilizados na música de concerto foi radicalmente ampliado. Foi
quando a música passou a assimilar os sons até então catalogados como
ruído, a começar por aqueles executados em instrumentos de percussão. Outro
forte estímulo a muitos compositores deste século no uso do ruído foi o
desenvolvimento da máquina, símbolo do progresso tecnológico. Luigi Russolo
(1885-1947), pintor e músico futurista italiano, seria o primeiro artista a
empregar ruídos industriais do dia-a-dia na criação de uma música realmente
inovadora e revolucionária. Isso em 1913! Russolo inventou vários
instrumentos que reproduziam os sons da indústria, da tecnologia e da vida
urbana. Agrupou-os em uma orquestra –

Que batizou de Intona Rumori ("entoa ruídos") - e causou furor ao compor


peças musicais como O Despertar de Uma Capital e Encontro de Automóveis e
Aeroplanos, apresentadas ao público italiano em 1914.
A ARTE DO RUÍDO,
MANIFESTO DE 1913 DE LUIGI RUSSOLO

"HOJE O RUÍDO REINA SUPREMO SOBRE A


SENSIBILIDADE HUMANA. VAMOS CAMINHAR JUNTOS
POR UMA GRANDE CAPITAL MODERNA, COM O OUVIDO
MAIS AGUÇADO QUE O OLHO, E DIVERSIFICAR OS
PRAZERES DOS SENTIDOS DISTINGUINDO OS GLUGLUS
DE ÁGUA, O AR E O GÁS DE TUBOS METÁLICOS, OS
RONCOS E ESTERTORES DE MOTORES ARFANDO COM
CLARA CHAMA ANIMAL, O SOBE-E-DESCE DOS PISTÕES,
A ESTRIDÊNCIA DE SERRAS MECÂNICAS, O SACOLEJO
FORTE DE BONDES SOBRE OS TRILHOS, O ESTALO DOS
CHICOTES, O TREMULAR DAS BANDEIRAS. NÓS VAMOS
NOS DIVERTIR IMAGINANDO UMA ORQUESTRAÇÃO DE
PORTAS GIRATÓRIAS DE LOJAS DE DEPARTAMENTO,
TUMULTO DE MULTIDÕES, OS DIFERENTES RUGIDOS
DAS ESTAÇÕES DE TREM, FUNDIÇÕES DE FERRO,
FÁBRICAS TÊXTEIS, GRÁFICAS, USINAS ELÉTRICAS E
METRÔS. E NÃO DEVEMOS NOS ESQUECER DOS
NOVÍSSIMOS RUÍDOS DA GUERRA MODERNA."

Escutando o ruído

É importante reconhecer, portanto, o ruído como fenômeno complexo e sujeito


a distintos níveis de escuta. Isto posto, o presente trabalho irá de agora em
diante enfatizar o estudo do ruído sob uma perspectiva ecológica, isto é, nas
relações do ser humano com os sons de seu habitat. Mais precisamente,
quando o ruído torna-se elemento acústico interferente e indesejado, um
agente de distúrbios físicos e psicológicos.

“Que seja ruído/ Quase imperceptível...”

(Paulo Miklos, Ninguém se cansa de ouvir o som da própria voz)

O que é silêncio?

Nos anos 50, o compositor americano John Cage, obcecado pela idéia de
experimentar o "silêncio absoluto", submeteu-se a uma câmara anecóica, nome
dado a um recinto de total isolamento sonoro utilizado para testes acústicos.
Quando julgou finalmente estar experimentando o silêncio,total, Cage se deu
conta de dois sons que persistiam em meio ao isolamento acústico. Um deles,
grave e pulsante, era o som de seu próprio coração bombeando sangue para
as veias e artérias. O outro, um zumbido agudo e constante, era resultado da
soma dos impulsos elétricos emitidos por seu cérebro. Com isso, Cage
constatou que o silêncio absoluto, como categoria física, simplesmente não
existe. Mas se o silêncio não significa ausência total de som, O que é então
silêncio? Não sendo ausência, o silêncio é, de alguma forma, presença sonora.

"Dois Irmãos, quando vai alta a madrugada


E a teus pés vão-se encostar os instrumentos
Aprendi a respeitar tua prumada
E desconfiar do teu silêncio

Penso ouvir a pulsação atravessada


Do que foi e o que será noutra existência
É assim como se a rocha dilatada
Fosse uma concentração de tempos

É assim como se o ritmo do nada


Fosse, sim, todos os ritmos por dentro
Ou, então, como uma música parada
Sobre uma montanha em movimento"

(Chico Buarque, Morro Dois Irmãos)

Isto é: silêncio soa

Silêncio, mais do que uma propriedade física, é um estado da percepção, uma


sensação psico-acústica de quietude, acionada por fatores externos e internos.
O baixo nível de intensidade dos sons muito próximos ao limiar da audição
pode sugerir esse estado de silêncio. O mesmo ocorre com sons contínuos ou
repetitivos, como no caso de mantras ou de músicas que provocam o transe.
Ou, ainda, o silêncio pode ter origem em uma reação paradoxal da escuta
diante do excesso de informações sonoras. Em outras palavras, a
incapacidade de extrair sentido de uma grande quantidade de informações
concentradas no tempo acaba provocando o mesmo desligamento da
consciência que a repetição ou a baixa intensidade provocam.

O som transforma-se em silêncio quando, por algum desses fatores, deixa de


ser percebido como informação e é transportado do plano da consciência para
um fundo inconsciente. Nesse caso, o som emerge e submerge na percepção,
como uma pedra que a superfície do mar oculta ou revela de acordo com os
fluxos da maré.

Esse fenômeno pode ser observado em sons ambientais contínuos, como o do


ar condicionado, por exemplo. No momento em que é ligado, o aparelho é
percebido como som, pela súbita alteração que causa na paisagem sonora.
Mas em pouco tempo, na inexistência de inflexões ou mudanças de seu padrão
sonoro, transforma-se em silêncio, e passa a ser ignorado pela percepção
consciente. No momento em que produzir qualquer variação de padrão, como a
causada pelo religar do compressor, volta a ser percebido como som. O
mesmo acontece com o o cricri de um grilo, que pode passar um longo tempo
sem ser notado... até o momento em que o bichinho se calar.

"Escuta o vento cantando no arvoredo/


Passarim, passarão no passaredo..."

(Tom Jobim, Borzeguim)

Silêncio é...

Murray Schafer, o investigador sonoro canadense a que nos referimos, também


tem se ocupado do valor simbólico e estritamente pessoal do silêncio. Em um
de seus exercícios, Schafer pergunta qual o significado individual que cada um
daria para o silêncio. Abaixo, as respostas apontadas em seu livro “A Sound
Education”.

Eis alguns exemplos dados por crianças: .


Silêncio é manter a boca fechada.
Silêncio é pensar.
Silêncio é sonhar acordado.
Silêncio é dormir.
Silêncio é não falar quando o professor sai e todos falam.
Silêncio é escuridão.
Silêncio é ficar preso.
Silêncio é estar interessado em um assunto.
Silêncio é fazer o seu trabalho.
Silêncio é guardar um segredo.
Silêncio é assistir a um filme mudo.
Silêncio é ficar com medo.

E alguns exemplos dados por adultos:


Silêncio é apenas um estado da mente.
O silêncio é impossível.
Silêncio é estar inconsciente ou morto.
Silêncio é tranqüilidade.
O silêncio é entediante.
Silêncio é o que você ouve depois de três horas de um concerto de rock.
Silêncio é isolamento, um terrível isolamento.
Silêncio é vazio.
O silêncio é mais notado nas épocas de medo intenso.

De onde Schafer conclui: “As atitudes dos adultos parecem ser mais negativas
que as das crianças. Estas respostas foram todas dadas por norte-americanos.
Fico me perguntando se outras culturas não poderiam notar mais valores
positivos no silêncio"
Silêncio é apenas outra forma de ar limpo.

"DA MESMA FORMA COMO SERES HUMANOS


NECESSITAM DO SONO PARA REABASTECER E RENOVAR
ENERGIAS VITAIS, TAMBÉM SÃO NECESSÁRIOS PERÍODOS
DE SILÊNCIO PARA SUA RECOMPOSIÇÃO MENTAL E
ESPIRITUAL. HOUVE TEMPOS EM QUE O SILÊNCIO ERA UM
ARTIGO PRECIOSO NUM CÓDIGO ORAL DE DIREITOS
HUMANOS. EXISTIAM ÁREAS DE SILÊNCIO PARA FACILITAR A
RESTAURAÇÃO DO METABOLISMO ESPIRITUAL. HAVIA
MOMENTOS DE SILÊNCIO TAMBÉM. DOMINGO ERA O DIA
MAIS SILENCIOSO. A IMPORTÂNCIA DESSAS ÁREAS
SILENCIOSAS EM MUITO TRANSCENDE O PROPÓSITO
PARTICULAR PARA O QUAL FORAM CRIADAS. SÓ NOS
DAMOS CONTA DISSO AGORA QUE AS DESTRUÍMOS.
ISOLAMENTO ACÚSTICO É ALGO QUE JÁ NÃO MAIS EXISTE.
PAREDES E JANELAS HÁ MUITO DEIXARAM DE SER
ISOLANTES CONTRA A CACOFONIA EXTERNA. "

MURRAY SCHAFER

"Não te vejo, não te escuto/ O meu samba esta de luto/


Eu peço/ o silêncio de um minuto..."

(Noel Rosa, Silêncio de um minuto)

Silêncio de ouro

Muitas filosofias e religiões no mundo recomendam períodos de silêncio e


contemplação para contrastar com a agitação e a confusão da vida diária. Esse
é um modo de se obter "clariaudiência". Toda prática consciente de escuta e
audição leva à contemplação e ao respeito pelo silêncio. Ao longo do caminho,
o ouvinte descobrirá muito o que ouvir.

EDWARD GEORGE HONEY, UM JORNALISTA AUSTRALIANO, FOI


QUEM PRIMEIRO SUGERIU CELEBRAR O FIM DA PRIMEIRA
GUERRA MUNDIAL COM UMA SOLENE CERIMÔNIA DO SILÊNCIO,
ATÉ HOJE OBSERVADA TODO DIA 11 DE NOVEMBRO, ÀS 11 H,
EM DIFERENTES PAÍSES BRITÂNICOS.
NA VÉSPERA DO YOM KIPPUR, O DIA DO PERDÃO, TODA A
POPULAÇÃO DE ISRAEL MANTÉM SILÊNCIO. NO DIA 4 DE MAIO,
A GUERRA É LEMBRADA EM UTRECHT, HOLANDA, COM UMA
PROCISSÃO MUDA, SEGUIDA DE DOIS MINUTOS DE ABSOLUTO
SILÊNCIO, MARCADOS PELO RELÓGIO DA CATEDRAL.

OUTROS EVENTOS IGUALMENTE MARCANTES RESULTARAM DE


CATÁSTROFES, COMO EXCESSOS DE PODER, MASSACRES OU
TERRE-MOTOS. OBSERVADORES FICA-RAM CHOCADOS PELO
PODER INCRIVEL DE UM SÚBITO E ABSOLUTO SILÊNCIO.

O SILÊNCIO TAMBÉM É ENCARADO EM NOSSA SOCIEDADE


COMO UMA FORMA DE HOMENAGEAR PESSOAS IMPORTANTES
E QUERIDAS, QUANDO CELEBRA-SE A SUA AUSÊNCIA COM UM
MINUTO DE SILÊNCIO.

NA BUSCA POR UM AMBIENTE MAIS TRANQÜILO, A SOCIEDADE


PODERIA ENCONTRAR OUTRAS OCASIÕES PARA OBSERVAR
SILÊNCIO EM CONJUNTO. ORGANIZADORES DO DIA
INTERNACIONAL DA PERCEPÇÃO DO RUIDO SUGERIRAM QUE
NOS MANTIVÉSSEMOS EM SILÊNCIO DAS 14H15 ÀS 14H16, NA
ÚLTIMA QUARTA-FEIRA DE ABRIL DE CADA ANO, ONDE QUER
QUE ESTIVÉSSEMOS. É UM BOM COMEÇO.

Embora o silêncio seja hoje com freqüência associado à melancolia ou à


monotonia, ele é um bem precioso e vital a ser reconquistado pelos indivíduos
que habitam grandes centros urbanos. Os antigos já sabiam o que os músicos
hoje repetem: o silêncio é fonte restauradora para os ouvidos e o espírito.

"Hoje eu quero apenas/ uma pausa de mil compassos..."

(Paulinho da Viola, Para ver as meninas)


“Rio 40 graus/ Cidade maravilha/ Purgatório da beleza e do caos...”

(Fernanda Abreu – Fausto Fawcett, Rio 40 graus)

A relação som-ruído-saúde nas grandes metrópoles tem preocupado


autoridades em todo o mundo. Além do mal-estar, é comprovado que a
exposição ao ruído indesejável pode afetar a saúde física e mental do indivíduo
e das comunidades a curto, médio e longo prazos.

Como o ruído prejudica nossa audição

O som estimula minúsculos sensores - espécie de pequenos filamentos - em


nosso ouvido interno. Para compreender o fenômeno, vamos tomar como
exemplo o vento soprando em uma árvore. Nos intervalos entre as rajadas, as
árvores voltam à posição ereta inicial. Mas se o vento soprar forte demais ou
por muito tempo, as árvores podem ficar permanentemente curvadas ou se
quebrar. Da mesma forma, os filamentos do ouvido podem ser danificados por
ruído demasiado ou por exposição demasiada ao ruído.

Freqüentemente, os danos ocorrem ao longo de um grande período de tempo,


só sendo notados quando já é tarde demais. Se nada for feito, os sensores
danificados pouco a pouco perdem a capacidade de transmitir estímulos ao
cérebro. De início, perde-se a capacidade de registrar os sons mais delicados.
Havendo evolução, chega-se à surdez total.
Os primeiros sons a serem afetados pela perda de audição são os agudos,
como algumas consoantes da fala, as vozes de crianças e mulheres. Caso
você sinta alguma dificuldade em perceber esses sons, não pense duas vezes:
consulte um especialista e passe a prestar maior atenção aos sons a que você
está habitualmente exposto. Com certeza, lá se encontra o foco de seus
problemas.
“Pra gritaria de torcida da galerea funk/
Marcação inovação/
Pra gritaria de torcida da galera samba/
Marcação inovação/
Pra gritaria de torcida da galera tiroteio...”

(Fernanda Abreu – Fausto Fawcett, Rio 40 Graus)

SURDEZ PRECOCE - A SURDEZ PELA EXPOSIÇÃO AO


RUÍDO NO TRABALHO JÁ ERA CONHECIDA DESDE A
REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. MAS A PERDA AUDITIVA
RESULTANTE DE ATIVIDADES DE LAZER VEM, HOJE EM
DIA, CHAMANDO MAIOR ATENÇÃO. TESTES
AUDIOMÉTRICOS REALIZADOS EM VÁRIOS PAÍSES TÊM
DEMONSTRADO EXTENSA PERDA AUDITIVA POR
EXPOSIÇÃO À MÚSICA EM ALTO VOLUME. OS PRINCIPAIS
RESPONSÁVEIS SÃO OS SHOWS DE ROCK E A AUDIÇÃO
POR WALKMAN.

“cariocas nascem bambas/ cariocas nascem craques/


Cariocas tem sotaque/ cariocas são alegres...”

(Adriana Calcanhoto, Cariocas)

O povo brasileiro é descontraído e... ruidoso por natureza. No Rio,


especialmente no verão, os níveis de ruído aumentam muito. Falas e gritos de
rua, pregões de ambulantes, bailes e ensaios de escolas de samba somam-se
aos sons já turbulentos da cidade. A música está em todos os lugares -lojas,
supermercados, automóveis, residências - e, não raro, no último volume. Para
escapar ao ambiente insalubre, muitos recorrem aos walkman, mas às vezes
em intensidade tão exagerada a ponto de poderem ser ouvidos por outra
pessoa! São hábitos perigosos: grande parte da população desconhece o risco
a que se expõe ao se sujeitar a práticas como essas. Não jogue fora seu
walkman, mas aprenda a usá-lo com segurança.
O ouvido é a lei

A ameaça à audição também pode estar dentro sua própria casa ou seu local
de trabalho. Aparelhos eletrodomésticos e máquinas elétricas, como serras,
compressores e britadeiras, podem causar sérios danos a seus usuários,
sobretudo se esses permanecem próximos à fonte sonora. A lei brasileira
determina a obrigatoriedade de se especificar na embalagem os níveis de ruído
em decibéis produzidos por máquinas ou aparelhos. Caso a legislação fosse de
conhecimento público e cumprida a rigor, a população seria prevenida contra a
exposição abusiva ao ruído, estimulada ao uso de protetores auditivos ou, pelo
menos, instruída a distanciar-se da fonte sonora.

...HÃ?
A EXPOSIÇÃO A SONS ACIMA DE 85 DECIBÉIS PODE RESULTAR NA
MUDANÇA TEMPORÁRIA DE LIMIAR. NESSE CASO, TODOS OS OUTROS
SONS PARECEM MAIS DÉBEIS DO QUE O USUAL. A AUDIÇÃO NORMAL
RETOMA APÓS ALGUMAS HORAS OU DIAS. EM CASO DE EXPOSIÇÃO
CONTÍNUA, PODE OCORRER DANO COCLEAR IRREVERSÍVEL,
RESULTANDO EM PERDA DE AUDIÇÃO PERMANENTE.

Muitas pesquisas foram desenvolvidas no mundo sobre doenças provocadas


por exposição ao ruído. Por meio delas, sabemos que a perda auditiva aflige
aproximadamente 28 milhões de pessoas nos Estados Unidos. Para cerca de
10 milhões, a perda auditiva foi atribuída parcialmente a danos por exposição a
ruídos em alto volume. Na Europa, quase 25% de toda população sofre hoje
níveis de ruído de aproximadamente 20 decibéis acima dos limites
recomendados pela Organização Mundial de Saúde.

DIAGNÓSTICO
SAÚDE É UM ESTADO DE COMPLETO BEM-ESTAR FÍSICO, MENTAL E
SOCIAL, E NÃO MERAMENTE AUSÊNCIA DE DOENÇA OU ENFERMIDADE.
(ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE).

Ruído faz mal à saúde...

Som é vibração. Afeta a matéria, criando formas e movimentos que exercem


influência sobre a saúde, o humor, a consciência e o comportamento.
Numerosos estudos comprovam essa interação entre som e matéria. Ele altera
batimentos cardíacos, ritmo respiratório, temperatura corporal e os estados de
dor. Essa influência é causada não apenas pela intensidade, mas também
pelas freqüências, timbre e organização. Assim como a música de diferentes
estilos e épocas, os estímulos sonoros das mais diversas procedências e
espectros exercem influência sobre nós, em termos físicos e psicológicos.

BEBÊ A BORDO
BRINQUEDOS BARULHENTOS COM FREQÜÊNCIA ATINGEM NIVEIS
SUPERI-ORES A 100 DECIBÉIS, TAXA CONSIDERADA PERIGOSA À
SAÚDE. ENTRE OS MAIS PERIGOSOS, FIGURAM OS BRINQUEDOS PARA
BEBÊS QUE A CRIANÇA PODE LEVAR PRÓXIMO AO OUVIDO COM
GRAVES RISCOS DE DANOS À AUDIÇÃO. MENOS ALARMANTES SÃO OS
BRINQUEDOS MÓVEIS, POIS O EFEITO DA INTENSIDADE DIMINUI
QUANDO A FONTE PRODUTORA DE SONS ESTÁ MAIS AFASTADA.

Murray Schafer aponta como é comum se acreditar que apenas os sons fortes
causam mal e podem levar à perda auditiva. Algumas vezes, porém, o vilão
causador de perturbações não é um som de grande intensidade. Um caso
exemplar é o de uma torneira gotejando que não te deixa dormir. Outro é o da
música-ambiente. Embora muitos apreciem ou se mostrem indiferentes a esse
tipo de ambientação sonora, outros podem se sentir profundamente
perturbados em um recinto "decorado" com música de fundo. Algumas pessoas
também podem irritar-se com coisas aparentemente insignificantes - como o
timbre de voz de alguém, o latido de algum cachorro ou o zunido do
computador.

... faz mal ao espírito

Embora as fontes sonoras citadas não estejam entre as causadoras de surdez


ou outros danos físicos, podem afetar o espírito, provocando estresse e
alterações de humor. Sons de baixa intensidade podem causar elevação da
pressão sangüínea, tensão nervosa, insônia, distúrbios de humor e decréscimo
na habilidade de aprender. Pessoas perturbadas por ruído enquanto dormem,
mesmo sem se dar conta da perturbação, no dia seguinte apresentam
mudanças de humor e menor rendimento. Alguns estudos apontam o ruído
como causa de desarranjos gastrointestinais e de aumento da agressividade.

...E pode matar!!

O ruído pode ser utilizado deliberadamente para matar ou debilitar. Pestólogos


têm utilizado ultra-sons de alta intensidade (acima do limiar da audição
humana), para combater infestações de ratos. Esse tipo de som pode incendiar
um chumaço de algodão ou provocar sérias queimaduras de pele.

BUUM!
RUÍDOS MUITO INTENSOS, MESMO QUE CURTOS, PODEM CAUSAR
PERDA IMEDIATA DA CAPACIDADE AUDITIVA. A LIBERAÇÃO SÚBITA DA
PRESSÃO SONORA, EM SONS COMO MARTELADAS, TIROS E
EXPLOSÕES PODEM CAUSAR ESSE TIPO DE DANO.

“O que eu quero/ é sossego...”

(Tim Maia, Sossego)

Música restauradora

O som guarda seus próprios mistérios. Muito tempo ainda será necessário para
que se compreenda a total extensão de seus efeitos, positivos ou negativos,
sobre o ser humano (e mesmo sobre os animais). Na América do Norte e na
Europa, é grande o número de hospitais que utilizam a música ou os sons em
tratamento de idosos, de portadores de Mal de Alzheimer ou de deficiências
neurológicas. A música é também utilizada nos estados pré e pós-cirúrgicos,
como agente controlador da dor, capaz de favorecer estados de relaxamento e
calma.

Atualmente, sabe-se que o ouvido é o primeiro órgão a se desenvolver, e que o


feto pode ouvir a partir do quarto mês de gestação. Experimentos comprovam
que ao ouvir o som gravado da voz da mãe num ambiente artificial,
especialmente preparado para reproduzir o meio sonoro pré-natal, as crianças
imediatamente a reconhecem entre muitas outras gravações similares de
outras mulheres. Estes achados têm sido utilizados em musicoterapia com
resultados surpreendentes, demonstrando a importância do som na vida das
pessoas.

Imagina-se que tais práticas sejam conseqüência de nossa moderna


tecnologia. Mas as propriedades curativas do som e da música já eram
conhecidas nas culturas da Antigüidade e ainda hoje são experimentadas nas
sociedades tribais.

“Não conseguimos acompanhar o motor da história/


mas somos batizados pelo batuque...”

(Nação Zumbi, Enquanto o mundo explode)


“Gostosa/ Queridinha/ Tapioca/
O pregão abre o dia/
Hoje tem baile funk/
Tem samba no Flamengo...”

(Chico Buarque, Carioca)

Mais da metade do total de reclamações recebidas pela Secretaria Municipal


de Meio Ambiente do Rio de Janeiro diz respeito a distúrbios provocados pelo
som. Ao contrário do que se poderia pensar, o maior alvo das reclamações não
são as grandes corporações ou o poder público. Mas o próprio cidadão
descuidado com os ruídos que produz e que contribui, involuntariamente, para
poluir o ar com sons que não interessam a ninguém (e, muitas vezes, nem a
ele próprio). Este capítulo vai propor algumas sugestões para melhorar a
qualidade sonora da sua vida. São iniciativas que só dependem de você, mas
que têm um efeito imediato no bem-estar de todos.

Sugestões para melhorar a qualidade sonora

Em casa
 Os sons são polissêmicos, ou seja, possuem significados diferentes para
pessoas diferentes. Por isso, é difícil avaliar em termos gerais o quanto
um som pode ser incômodo. Muitas vezes um som agradável para
alguns pode ser um verdadeiro inferno para outros. O compositor Pierre
Henry, por exemplo, procurou por quase dois meses nos arredores de
Paris uma porta que rangesse bastante, para usá-Ia como matéria-prima
de sua composição Variações Para Uma Porta e um Suspiro. No
entanto, se você não é um compositor de vanguarda e uma porta
rangendo o leva à loucura, passe um pouco de óleo nas dobradiças e
pare de sofrer!!

 Procure abaixar o som de sua televisão em alguns pontos. Muitas vezes


vamos nos acostumando com determinadas intensidades sonoras, sem
perceber que, com isso, comprometemos os nossos limiares de audição.
A longo prazo, perderemos o prazer e até mesmo a capacidade de
perceber sons mais delicados.

 Evite escutar música com volume muito alto. Se isso não for possível,
evite, pelo menos, fazê-Io depois das dez da noite.

 Evite reforçar as baixas freqüências (os sons graves) no seu aparelho de


som. Os sons graves viajam para muito mais longe que os agudos.

 Se você tem um cachorro, não deixe que ele fique muito tempo sozinho,
especialmente à noite. Cães não latem para atrapalhar o sono de
ninguém, mas por fome, medo, solidão, para demarcar território ou só
para bater um papinho com os colegas.

 Cuidado com os walkmen. Além de proporcionarem uma pressão sonora


concentrada, muito superior à que recebemos pela propagação do som
no ar, eles acabam nos isolando de nossas paisagens sonoras e do
mundo a nossa volta.

 Não se esqueça de que os ouvidos não têm pálpebras, captam


indiscriminadamente tudo o que soa. Pense que cada som desagradável
que você produzir estará, automaticamente, somando-se a milhões de
outros.

Na rua:
 Fiscalize junto à sua associação de moradores a poda excessiva das
árvores de sua rua. As folhas e galhos criam obstáculos à propagação
do som, funcionando como barreira vegetal contra os ruídos da rua e
deixando sua casa mais silenciosa.

 Evite freqüentar restaurantes com música-ambiente muito forte. Está


provado que música tocada em volume muito alto acaba por entrar em
choque com os ritmos internos do nosso organismo, especialmente
durante a digestão.

Na escola
 Experimente fazer de vez em quando uma aula "muda". Nesse dia,
combine com seus alunos que nenhum som pode ser emitido, nem por
você nem por eles. Tudo deve ser transmitido por meio de mímicas ou
sinais combinados ou improvisados. Além de divertida, essa experiência
pode ser um verdadeiro presente para os ouvidos, que vão estar muito
mais apurados quando a aula terminar.

 Proteste contra o uso de sirenes e sistemas de alto-falantes em


ambiente escolar.

No trânsito
 Tenha consciência de que você faz parte de uma grande cadeia sonora,
de ações e reações. Interferir nessa cadeia está a seu alcance. Para o
melhor ou para o pior! Por isso, evite usar o som como arma, buzinando
sem necessidade, cantando pneus ou andando com o escapamento
aberto.

 Anote o número do telefone para reclamações da empresa de ônibus


que você utiliza e reclame se constatar que o motor, as portas
automáticas, os freios, etc... soam de modo desnecessariamente alto.

Na sua vida
Por que não começar a transformar a paisagem sonora partindo dos nossos
sons pessoais? Procure prestar mais atenção à música de sua fala...
Murray Schafer, no seu livro "Educação Sonora" , dá algumas sugestões de
como melhorar a qualidade sonora a partir de nós mesmos:

 ELIMINE UM SOM DESAGRADÁVEL DA SUA VIDA, UM


QUE OUTRAS PESSOAS LHE DIZEM QUE NÃO
GOSTAM. PODE SER UM MODO DE LEVANTAR A VOZ,
LAMENTAR-SE, ASSOAR O NARIZ OSTENSIVAMENTE.
VOCÊ PODERIA ELIMINÁ-LO? TENTE

 ACRESCENTE UM SOM AGRADÁVEL EM VOCÊ MESMO.


UM QUE POSSA CARREGAR CONSIGO E QUE TRAGA
PRAZER PARA AS PESSOAS AO SEU REDOR.

 ENCONTRE UM SOM PARA ACRESCENTAR AO


AMBIENTE DE SUA CASA. PODE SER UM JOGO DE
SINOS DA FELICIDADE, CRISTAIS QUE SOAM COM O
VENTO, UMA CAMPAINHA QUE SEJA ÚNICA E
AGRADÁVEL. DEIXE QUE AS VIBRAÇÕES DESSES
SONS PREENCHAM O ESPAÇO QUE OCUPAM,
TORNANDO-OS ESPECIAIS PRA AQUELES LUGARES.

“Sangue bom nas veias desse Rio brasileiro/


Ampliando seu batuque para o mundo inteiro...”

(Fernanda Abreu, Raio X)


"Eu também quero/
Graves, médios e agudos..."

(Jorge Ben Jor, W/Brasil)

O ouvido é o instrumento mais valioso de que dispomos para detectar o que


precisa ser transformado à nossa volta. Neste capí-tulo, você vai tomar contato
com exercícios destinados a ampliar e aprofundar uma escuta ativa. Eles
fazem parte do livro "Educação Sonora", de Murray Schafer. O próprio título do
livro (no original, "A Sound Education") é sugestivo. Trata-se de um trocadilho,
pois "sound" pode ser também traduzido como "saudável". Uma edu-cação
para os sons, portanto, é uma educação para a saúde.

 Escreva todos os sons que está ouvindo. Se estiver em grupo, leia todas
as listas em voz alta. Preste atenção às diferenças. Cada pessoa terá uma lista
diferente - ouvir é muito pessoal. E todas as respostas estarão corre-tas. Repita
em ambientes diferentes.

 Organize as listas conforme a fonte sonora - sons da natureza, sons


humanos ou sons da tecnologia. Que categoria de sons predomina em sua
lista? Indique cada som que você mesmo produziu. Alguns sons foram ouvidos
incessantemente durante o período de audição. Outros talvez te-nham sido
repetidos. Outros, ainda, foram ouvidos apenas uma vez. Indique quais sons
eram constantes, repetidos ou únicos. .

 Alguns sons passam por você. Outros permanecem estacionários,


enquanto você passa por eles. E alguns movem-se junto com você.
SONS ESTACIONÁRIOS SONS QUE SE MOVEM SONS QUE VOCÊ MOVE

SINOS DE IGREJA TRÁFEGO SUA VOZ


APITO DE FÁBRICA AVIÃO SEUS PASSOS
AR CONDICIONADO PÁSSAROS ROUPAS E JÓIAS, SEU CARRO

Os sons se modificam quando se movem. De olhos fechados, escute alguém


falando enquanto anda pela sala. Aponte para a direção do som. Note as
diferenças na qualidade da voz de quem fala. A pessoa está de frente ou de
costas? Parado num canto ou passando por uma porta? É pos-sível notar a voz
abafada quando ela passa perto de uma cortina? Todas essas nuanças podem
ser ouvidas. E com alguns minutos de escuta paciente, um grupo pode
conseguir ouvir "sombras acústicas". Há mudanças muito sutis quando se
passa por trás de uma cadeira ou de uma carteira. O grupo se surpreenderá ao
perceber como pode começar a "ver" com os ouvidos; exatamente como um
cego faz.

 Passe pela experiência de ouvir sons contrastantes em uma rua


movi-mentada e num ambiente aberto. À medida que as pessoas se instalavam
em cidades, foram desenvolvendo preferência pelos sons mais próximos. Isso
fica evidente na indústria de gravação e radiodifusão. Estamos per-dendo a
habilidade para ouvir à distância.

 Em uma esquina movimentada, dirija sua atenção para apenas uma


ca-tegoria de som - buzinas de carro, por exemplo. Conte-as. Este é um ótimo
exercício para se fazer com crianças, pois elas adoram contar coisas. Note de
quantos modos diferentes os motoristas tocam buzinas, algumas vezes, quase
como se fosse uma conversa.

 Você pode ouvir outros sons da mesma maneira - o número de freadas


de carro, ou latidos de cachorro, ou motocicletas. Focalizando um som
específico, vamos nos familiarizando com toda a paisagem sonora.

 Descubra um som contínuo (um ruído elétrico ou o zumbido de um


ven-tilador) e entoe o som com a boca fechada. Dê uma volta pelo quarteirão e
retorne ao local do som original. Você mantém a altura correta? Se andou
rapidamente, é provável que o som tenha subido (ficado mais agudo). Se
andou devagar, provavelmente ele baixou em um semitom.

 Crie um "Diário de Sons" enquanto faz estes exercícios. Anote os sons


diferentes que ouviu, sua reação, os pensamentos que teve acerca do
ambi-ente acústico e tudo o que considerar significativo.

 Abaixo, algumas questões rápidas, para serem anotadas em seu diário:


- Qual foi o primeiro som que ouviu ao acordar?
- Qual foi o último som que ouviu antes de dormir?
- Qual foi o som mais forte que ouviu hoje?
- Qual foi o som mais bonito?
- E qual foi a experiência sonora mais importante que você teve em sua vida?
Descreva-a em um ou dois parágrafos

 Este é um exercício muito difícil: declare moratória à fala por algumas


horas.

 É possível reconhecer uma pessoa pelos sons que eia faz) Você é
capaz de identificar seus amigos a partir do ritmo dos seus passos, dos sons
de seus sapatos ou de suas roupas? Essa pessoa está usando jóias ou
carrega objetos cujos sons o acompanham?

 Ouvir nos mostra lugares que não se podem ver. Os ouvidos vêem por
trás das paredes ou atrás das esquinas. Quando alguma coisa está escondida,
o som revela onde está e seu significado. Faça uma lista de sons que provêm
de lugares escondidos, sons provocados por coisas que você nunca viu.

 Alguns dos sons de que você se lembrou no último exercício podem ter
vindo de seu próprio corpo. Fique em silêncio, de olhos fechados, e ouça seus
sons internos.

 Você já teve algum sonho acústico? Você já sonhou com música?


Muitos dos sonhos relatados na Bíblia são acústicos, pois Deus era
freqüentemente ouvido, mas não visto.

 Em grupo, fique de pé e sente-se novamente, sem produzir nenhum


som. Se algum som for acidentalmente produzido (o roçar nas próprias roupas,
o estalo do assoalho ou de alguma junta), a pessoa que o produziu deve parar
e tentar não fazê-Io novamente. É provável que "vencerá" quem con-seguir se
mover mais lentamente.

 Leve sua cadeira para fora da sala e traga-a novamente sem produzir
ne-nhum som. A execução deste exercício pode levar 15 minutos ou mais. Ele
é especialmente recomendado para pessoas que não têm o hábito de seguir
regras e com dificuldade de concentração.

 A paisagem sonora está constantemente mudando. Antigos sons


desa-parecem a todo momento. Não existem museus de sons. De quantos
sons você pode se lembrar de quando era mais jovem e que não são mais
ouvi-dos hoje em dia?
SONS RECORDADOS POR ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS
AMERICANOS ENTRE 1970 E 1980:

VELHAS CAIXAS REGISTRADORAS COM SINOS - LAVAR ROUPAS EM


TÁBUAS - MANTEIGA SENDO BATIDA - BOMBA D'ÁGUA MANUAL -
NAVALHA SENDO AFIADA - CANETA TIN-TEIRO SENDO ENCHIDA - SINO
DE RETORNO EM UMA MÁQUINA DE ESCREVER - UM ROSÁRIO
BATENDO, NO HÁBITO DAS FREIRAS - FALAR LATIM NAS IGREJAS -
CORTADOR DE GRAMA MANUAL - O CHIADO DE VELHOS DISCOS DE
ACETATO - O SOM DE PESOS SENDO COLOCADOS NAS BALANÇAS -
MOINHO DE CAFÉ MANUAL - O TILlNTAR DE LITROS DE LEITE (DE
VIDRO) - MÁQUINA DE COSTURA COM CORREIA - FACÃO DE CORTAR
GRAMA - CADEIRA DE BALANÇO DE MADEIRA NO ASSOALHO DE
MADEIRA - PREGÕES DE RUA - ROCA DE FIAR - SINETA DE BICICLETA -
EXPLOSÃO DE VELHAS CÂMARAS FOTOGRÁFICAS - CASCOS DE
CAVALO EM PARALELEPIPEDO - MANIVELA DE IGNIÇÃO DOS CAR-ROS
ANTIGOS - LOCOMOTIVA A VAPOR - TIC-TAC DE RELÓGIO DE PULSO.
BATEDOR DE OVOS MANUAL - TELEFONE DE MANIVELA

 Quantos desses sons você pode ainda encontrar no Rio de


Janeiro ou em outra cidade brasileira? De quais outros você se lembra?
Alguns dos sons considerados obsoletos pelos americanos ainda fazem
parte de seu ambiente? Quais?

 Novos sons estão constantemente invadindo a paisagem sonora. Liste


todos os novos sons que entraram na paisagem sonora nos últimos dois ou
três anos. Isso foi em 1983 e esses sons já são recorrentes. Quais seriam os
novos sons?

NOVOS SONS LlSTADOS PELOS MESMOS ESTUDANTES AMERICANOS:


BIP DE VIDEOGAMES - VOZES ELÉTRICAS NOS CARROS ("NÃO SE
ESQUEÇA DO CINTO DE SEGURANÇA") - BIP DE PAGERS USADOS
PELAS PESSOAS - PROCESSADOR DE ALIMENTO - RELÓGIOS
SILENCIOSOS COM ALARME ELÉTRICO - TELEFONES DIGITAIS - CAIXA
REGISTRADORA ELÉTRICA - BIP DE FORNO MICROONDAS - CORTADOR
DE GRAMA ELÉTRICO - CLlQUE DE TECLADO DE COMPUTADOR - BIP DO
COMPUTADOR

"Só privilegiados tem ouvido igual ao seu..."

(Tom Jobim - Newton Mendonça, Desafinado)


“E a turma tem/
Que deitar/
E rolar no som...

( Gilberto Gil, Sala do som)

Até agora, você tomou contato com o som e suas propriedades, com o
conceito de paisagem sonora e de poluição. Aprendeu tam-bém a se
defender do ruído invasivo e tem à sua disposição uma série de exercicios
destinados a aumentar sua sensibilidade auditiva e sua capacidade de
escuta. Agora, chegou o momento de tornar-se um membro da
comunidade de compositores da paisagem sonora.

"O MUNDO É UMA VASTA COMPOSIÇÃO MACROCÓSMICA E OS


MÚSICOS SÃO QUALQUER UM OU QUALQUER COISA QUE SOE. "

MURRAY SCHAFER

O objetivo dos exercícios e textos expostos nesta cartilha é o de nos fazer


pensar em um planejamento acústico. Pessoas que se ocupam de
planejamento e design propõem-se a estimular o nosso senso estético. O
paisagista organiza a vegetação em parques e jardins. O arquiteto organiza a
praça da cidade ou um edifício público. O decorador de interiores organiza um
ambiente doméstico ou profissional. Assim,'se quisermos atuar positivamente
no mundo sonoro que nos cerca, temos de assumir o papel de co-autores da
paisagem sonora.

Como profissionais dedicados à organização dos sons, os músicos-


compositores - em colaboração com outras disciplinas - como a arquitetura, a
sociologia, a fonoaudiologia e a antropologia - têm sido importantes na
formulação de conceitos sobre o ambientalismo sonoro. Mas a paisagem
sonora não é propriedade privada. Não basta que seja organizada somente por
especialistas. Todos somos produtores de sons. A responsabilidade sobre a
melhoria dessa orquestração cabe, portanto, a todos nós. E se assume em
etapas muito simples. Primeiro, aprender a ouvir. Depois, a pensar os sons. E,
finalmente, a organizá-Ios em padrões mais satisfatórios.

O que pode ser ruído para certos ouvidos pode ser música para outros

“Quero morrer/ numa batucada de bamba...”

(Ataufo Alves - Paulo Gesta, Na cadencia do samba)

Três dos músicos envolvidos na organização do festival ESCUTA! - Cecília


Conde, Chico Mello e Rodolfo Caesar - fizeram relatos individuais sobre a
paisagem acústica do Rio de Janeiro como se fossem guias de uma visita
sonora à cidade. O filtro empregado por cada um para a percepção do meio
ambiente foram seus próprios ouvidos de músicos. É possível notar que,
embora descrevam um mesmo tema - os sons da cidade - cada um apresenta
um retrato sonoro diferente. Escuta e sensibilidade são fatores muito pessoais.

Lugar meio-cidade, meio-mato

"Dizem que os animais e aves brasileiras são menos canoros, mais


'baru-lhentos' que os de países de regiões menos tropicais/equatoriais, Lá
'canta-se mais, enquanto aqui se grita. Claro! Como se fazer ouvir em uma
floresta amazônica senão escancarando a voz e insistindo iterativamente? O
Rio não é amazônico, mas tem uma concentração sonora quase tão rica,
espe-cialmente por causa de sua condição tão disparatada de lugar meio-
cidade, meio-mato”...”O espectro de sons do Rio é muito amplo, se incluirmos o
ruído em suas múltiplas encarnações. É amplo e âmbito das intensidades: sons
estrondosíssimos, como um aeroporto quase no centro da cidade, convivem
com os pios distantes e por isso fracamente perceptíveis dos gaviões na torre
da Mesbla, dos micos onipresentes silvando pequeninos intervalos
ascendentes. Por entre os estrepitosos bandos de periquitos e maritacas na
Floresta da Tijuca, arapongas malham o ferro e os tucanos parecem rachar
madeira, mezzo-forte, nos intervalos entre a passagem de carros pelas
estradas. No verão, as cigarras tomam passe: no início, as soprano e, depois,
as contralto. Talvez porque elas vão crescendo nesse período e mudam de
voz. Pelo fim da tarde, surgem os morcegos, misturam silvos glissandi e
pulsantes stacatti agudíssimos... Contra esse panorama, o plim-plim, a música
da novela, o tchan da época, a pamonha, o cachorro mal-educado, e tiro
irrompem em toda sua ubiqüidade. Porteiros de prédios adoram colocar seus
passarinhos engaiolados ao sol. Daí uma profusão de curiós e canários
pendurados em árvores pelas ruas. Alguns cantam bem, concorrendo com os
líricos europeus. Deve ser porque tiveram uma educação mais erudita, em
ambiente urbano, estimulados por seus donos a imitarem seus assobios. Neste
momento, pela janela, entra o pagode do CD de algum vizinho, estranho animal
que disputa, aos berros e iterativamente, um lugar da disputada parada de
sucessos.”
Rodolfo Caesar

Silêncio é espaço interior

”No Rio, quando chega o calor, tudo se torna barulhento. As pessoas falam
mais alto, seja nos bares ou no trânsito. Os ônibus parecem leões que rugem
desesperados pela cidade. Os vizinhos gritam para se fazerem percebidos
mais facilmente. As cigarras são um ótimo despertador para quem não tem
anestésico acústico (ar condicionado). O hábito de falar alto é culturalmente
condicionado. Em geral, no Rio, fala-se mais alto do que o necessário. Falar
baixo costuma ser tomado por timidez ou insegurança. Falar alto é símbolo de
poder. Como se criar silêncio e calma, no verão? O cultivo d o silêncio vai no
sentido oposto ao que a indústria do entretenimento incentiva:
Barulho=Impacto=Emoção=Verdade. Ficar em silêncio soa ameaçador,
provoca ansiedade, é interpretado como tédio. Mas sem esse ‘tédio’, os
inúmeros sons à nossa volta são ignorados. O silêncio cria espaço interior.
Quem fala muito escuta pouco. Na escola, as festas infantis costumam induzir
as crianças, com animadores munidos de microfones, a um estado de super-
excitação. Não é à toa que haja grande número de crianças chamadas
hiperativas, com comportamento excedente à sua alegria natural. As escolas
não avaliam seu grau de irresponsabilidade em relação à educação Psico-
sonora.”
Chico Mello

"As gaivotas na praia, na Barra e na Lagoa são uma marca sonora do Rio de
Janeiro. Os remos na água e as lanchas que atravessam a baía também. Na
orla, há o som de bicicletas e patins. O Rio tem uma paisagem sonora
com-plexa graças à sua geografia especial, feita de montanhas, mar e lago. Os
sons naturais mesclam-se aos urbanos de modo amalgamado, é impossível
separá-Ias. Há sons pitorescos, outros graciosos, somados ao barulho
ensurdecedor dos aviões (a proximidade do mar aumenta a sonoridade dos
jatos). --- O Rio é sempre muito ruidoso. Tem bailes funk, escolas de samba,
batucadas nos subúrbios... Vila Isabel, por exemplo, ou Tijuca, com muito
chorinho, samba e rapo O povo carioca é barulhento, alegre, fala muito, canta.
E os vendedores ambulantes! Pamonha! Em Copacabana, há um amolador de
faca que faz um assobio para cima e para baixo. E há ainda os vassoureiros,
geralmente nordestinos, que vendem coisas típicas cantando ou gritando
pregões. --- O Réveillon é lindo, único. As praias se enchem de ata baques,
com toques de macumba. Cantam-se Pontos de Candomblé e os tambores
ressoam durante a noite toda. É uma grande oferenda a lemanjá, uma bela
celebração. E os sinos? No Rio, há muitos (só na Rua 10 de março há 23 !).
Llorenç Barber, um compositor espanhol, veio ao Rio especialmente para
compor para esses sinos - o público tinha de caminhar pelo circuito para ouvir
os sons - com apitos de navios e fogos de artifício. A proposta de Barber é
interferir no som urbano. Um verdadeiro compositor da paisagem sonora."

Cecília Conde

”Megacidade/
Conta teus meninos/
Canta com teus sinos...”
(Caetano Veloso, Aboio)

O paisagismo acústico merece nossa atenção. Um ambiente sonoro poluído


pode tornar-se um ambiente sonoramente agradável, saudável e equilibrado.
Nosso trabalho educativo pode influenciar neste sentido. Para se pacificar a
convivência numa metrópole caótica e diversificada como o Rio de Janeiro, é
preciso que cada cidadão aprimore sua própria escuta.

Escutar verdadeiramente é um ato


de sensibilidade e também de tolerância.
“Eu vou chamar o síndico...”

(Jorge Bem Jor, Chama o sìndico)

Neste último capítulo, você vai encontrar um resumo dos dispositivos legais
que protegem o cidadão de agressões sonoras e os mecanismos ao seu
alcance para fazer valer esses direitos.

Principais fontes de ruído

Nos grandes centros urbanos, a principal fonte de ruído é o tráfego de veículos.


Este tipo de poluição, proveniente de fontes móveis, é de difícil controle,
estando vinculado à questão da adequação de motores dos veículos,
particularmente aqueles movidos a diesel (caso dos ônibus).

Nos países de clima tropical, como o Brasil, o sistema construtivo das


residências atua como agravante. Os materiais utilizados, tanto na construção
como na decoração interna das residências, são altamente propagadores de
ondas sonoras. Contribuem para isto os revestimentos em material frio,
cerâmica, esquadrias metálicas com vidros de pouca espessura, mobiliário
escasso e janelas sempre abertas. Nos países de clima frio, os revestimentos
têm características de absorção de ruídos, como tapetes, cortinas, mobiliário
pesado.

Outra fonte de poluição sonora bastante significativa é o comércio,


principalmente casas de diversão, bares e lojas de vendas de discos. Os cultos
religiosos, os clubes e as agremiações carnavalescas são também fontes de
ruído freqüentemente denunciadas, assim como os equipamentos de exaustão
de estabelecimentos comerciais, ou máquinas industriais.

Legislação Municipal em vigor

Os procedimentos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente para a


fiscalização da poluição sonora são pautados no Regulamento Nº 15 das
Posturas Municipais, aprovado pelo Decreto Nº 1601/78 e alterado pelo
Decreto Nº 5412/85. Este Decreto estabelece níveis máximos de ruídos para
os períodos diurno e noturno, que variam de acordo com o uso permitido para o
local (residencial, comercial, etc.), conforme tabela abaixo. Além disso,
independente de medição, são proibidos, entre outros, os ruídos produzidos
por: pregões, anúncios ou propaganda, de viva voz ou por instrumentos; e
animais que provoquem a intranqüilidade da vizinhança.

Cabe ressaltar que esta é a legislação atualmente em vigor no Município.


Entretanto, é necessário acompanhar as mudanças que vêm ocorrendo ao
longo dos últimos anos na ocupação e uso do solo da cidade do Rio de
Janeiro. Assim sendo, a fim de adaptar nossa legislação a esta realidade,
encontra-se na Câmara Municipal de Vereadores um novo Decreto elaborado
pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente em conjunto com o CONSEMAC
(Conselho Municipal de Meio Ambiente).
NÍVEIS DE RUÍDOS MÁXIMOS PERMITIDOS

Zona
Uso Permitido
Código
Zona Residencial-1 Período
Zona Residencial-2 Exclusivamente residencial - unifamiliar Diurno Período
Zona Residencial-3 Multifamiliar e ensino até 1º grau ZR-1 Noturno
Multifamiliar, comércio e serviços em edificação de uso ZR-2 55
Zona Residencial-4 exclusivo ZR-3 55 50
Zona Residencial-5 Multifamiliar, comércio e serviços 60 50
Zona Residencial-6 Multifamiliar, comércio, serviço e pequena indústria ZR-4 55
Área Central-1 Residencial e agrícola ZR-5 60
Área Central-2 Serviços, comércio diversificado e multifamiliar ZR-6 60 55
Zona Turística-1 Serviços e comércio diversificado AC-1 55 55
Zona Turística-2 Multifamiliar e comércio ligado a atividades turísticas AC-2 70 50
Zona Portuária Multifamiliar e comércio ligado a atividades turísticas ZT-1 70 60
Zona Industrial-1 Comércio atacadista ZT-2 65 60
Atividades industriais compatíveis com atividade ZP 65 60
Zona Industrial-2 residencial ZI-1 70 60
Atividades industriais com características nocivas, 70 60
Zona de Ind. e perigosas e incômodas ZI-2 60
Com. Indústria, comércio e multifamiliar 70
ZIC 60
Zonas Especiais 70
Características especias de zoneamento 60
Centro Bairro para cada ZE Zes
Centro Bairro Comercial 55
Centro Bairro Comercial De ZR-1 50
Centro Bairro Comercial De ZR-2 60
Centro Bairro Comercial De ZR-3 65 55
Centro Bairro Comercial De ZR-4 65 55
Centro Bairro Comercial De ZR-5 65 60
Centro Bairro Comercial De ZR-6 65 60
Centro Bairro Comercial De ZT 60 60
Comercial De ZT-1 65 55
De ZT-2 70 60
70 60
60
Como é feita a medição

Caso a reclamação faça parte dos ruídos vistoriados pela Secretaria Municipal
de Meio Ambiente / SMAC (veja quadro a seguir), um técnico comparecerá ao
local utilizando um equipamento para medição dos níveis de pressão sonora
denominado decibelímetro.

DECIBELÍMETROS UTILIZADOS PELA SMAC


BRÜEL & KJAER, MODELO 2232
LARSON DAVIS, MODELO 2800 E MODELO 814

A medição deve ser feita, no mínimo, a 1,50 m da divisa do lote onde está
ocorrendo o ruído, podendo também ser realizada no local onde é sentido o
incômodo.

Procedimentos da SMAC
quanto à fiscalização sonora

Para descentralizar a atuação da SMAC e no intuito de agilizar o atendimento


às denúncias, foram criados os Escritórios Técnicos Regionais - ETRs -para
atender às cinco Áreas de Planejamento da cidade.
ÁREAS DE PLANEJAMENTO

ÁREA DE PLANEJAMENTO (AP) REGIÃO ADMINISTRATIVA (RA)

AP-1 I RA - Portuária
II RA - Centro
III RA - Rio Comprido
VII RA - São Cristóvão
XXI RA - Ilha de Paquetá
XXIII RA - Sarta Teresa

AP-2 IV RA - Botafogo
V RA - Copacabana
VI RA - Lagoa
VIII RA - Tijuca
IX RA - Vila Isabel
XXVII RA - Rocinha

AP-3 X RA - Ramos XI RA - Penha


XII RA - Inhaúma
XIII RA - Méier
XIV RA - Irajá
XV RA - Madureira
XX RA - Ilha do Governador
XXII RA - Anchieta
XXV RA - Pavuna
XXVIII RA - Jacarezinho
XXIX RA - Complexo do Morro do
Alemão
XXX RA - Complexo da Maré

AP-4 XVI RA - Jacarepaguá


XXIV RA - Barra da Tijuca

AP-5 XVII RA - Bangu


XXIII RA - Campo Grande
XIX RA - Santa Cruz
XXVI RA - Guaratiba
A atividade de fiscalização de poluição sonora nos ETRs se dá mediante a
seguinte ordem de procedimentos:

1 - recebimento de denúncia;
2 - vistorias de constatação;
3 - intimação ao infrator;
4 - multas progressivas;
5 - edital de Interdição da fonte sonora;
6 - vistoria de constatação de descumprimento do Edital;
7 - envios de ofícios à 1º Central de Inquéritos do Ministério Público, ao
Comando Geral da Polícia Militar, à Inspetoria Regional de Licenciamento e
Fiscalização, para cassação do Alvará;
8 - envio do Processo à Secretaria Municipal de Governo;
9 - envio do Processo à Procuradoria Geral do Município para impetrar Ação
Civil Pública.

A SMAC vistoria

• bares e restaurantes com música


• escolas e agremiações de samba
• templos de qualquer culto religioso
• sinaleiras de advertência
• clubes, oficinas e academias
• casas de espetáculo
• criadouros comerciais de animais
• obras e indústrias
• ruídos de equipamentos mecânicos (torres de refrigeração, sistemas de
exaustão mecânica e casas de máquinas)

A SMAC não vistoria

• carros de som itinerantes


• vendedores ambulantes
• reuniões e aglomerações de pessoas em logradouro público
• escolas em atividades curriculares e complementares
• reclamações internas de condomínios
• animais
• ruídos de trânsito
Como e onde reclamar?

Disque-Silêncio
503-2795

Telefone para a CENTRAL DE RECLAMAÇÕES DE POLUIÇÃO SONORA da


SMAC, que funciona 24 horas por dia, indicando o endereço do local onde
ocorre o problema, bem como os dias e horários de maior freqüência. As
reclamações são registradas e encaminhadas posteriormente aos ETRs. Sua
identidade será preservada.

ATENÇÃO!!

• Se você exerce atividade que emite ruídos que estão fora dos limites
permitidos, evite as penalidades, obedecendo a legislação e/ou fazendo um
tratamento acústico em seu estabelecimento.

• Se você está se sentindo prejudicado por outros que causam a emissão


excessiva de
ruídos, denuncie à SMAC e colabore para seu bem-estar e de sua coletividade.

• Você tem direito a um ambiente tranqüilo e a SMAC agradece a sua


colaboração.

“Hoje/
Eu quero paz de criança dormindo...”

(Dolores Duran, A noite do meu bem)


Literatura

Barry Truax, Acoustic Communication. Norwood: Ablex Pub. Corp., 1984

Barry Truax, Handbook for Acoustic Ecology. Cambridge Street Publishing,


1998.

Brasil, Secretaria de Educação Fundamental, Parâmetros Curriculares


Nacionais. Terceiro e Quarto Ciclos do Ensino Fundamental. Temas
Transversais. Meio Ambiente. Brasília: MEC/SEF, 1998.

K.D. Kryter, The Effects of Noise on Man. Orlando: Academic Press, 1985.

R. Murray Schafer, O Ouvido Pensante. Trad.: Marisa Fonterrada et alli. São


Paulo: Edunesp, 1991/96.

R. Murray Schafer, A Sound Education. Indian River, Ontario: Arcana Editions,


1992.

R. Murray Schafer, A Book of Noise. Indian River: Arcana Editions, 1998.

R. Murray Schafer, Voices of Tirany, Temples of Silence. Indian River: Arcana


Editions, 1993.

R. Murray Schafer, The Tuning of the World. Indian River: Arcana Editions,
1977. Trad.: Marisa Fonterrada. EdUnesp. Lançamento previsto para 1999.

T.H. Fay, Noise and Health. New York: New York Academy of Medicine, 1991.

W. A. Mathieu, The Listening Book. Vancouver: Shambala Press, 1994.


Literatura de consulta sobre a paisagem sonora do Rio no século XIX

João Antônio, Malhação do Judas Carioca. Rio de Janeiro: Civilização


Brasileira, 1976.

Edinha Diniz, Chiquinha Gonzaga, Uma História de Vida. 10 de Janeiro: Rosa


dos Tempos, 1991.

Literatura de consulta sobre Legislação Ambiental

André Tostes, Sistema de Legislação Ambiental Petrópolis, RJ: Vozes: Rio de


Janeiro, CECIP, 1994

André Tostes e Estela Neves, Meio Ambiente: A Lei em suas Mãos Petrópolis,
RJ, Vozes e CECIP, 1992

Machado, Paulo Affonso Leme Direito Ambiental Brasileiro, São Paulo:


Malheiros Editores, 1996

Endereços Eletrônicos

League for the Hard of Hearing. Web site: http://www.lhh.org/noise/

Noise Polution Clearinghouse . Web site: http://www.nonoise.org/

Right to Quiet Society. Web site: http://www.quiet.org

Fórum Mundial de Ecologia Acústica (WFAE).


Web site: http://.interact.oregon.edu/Medialit/WFAEHomePage

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