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e do Adolescente Fernandes
Figueira (IFF/Fiocruz). Rio de
centros de convivência no acompanhamento do Janeiro-RJ, Brasil (martha@iff.
fiocruz.br).
envelhecimento humano. A partir de revisão
bibliográfica, exploramos história, experiências e 2
Universidade Aberta da
Terceira Idade, Universidade do
possibilidades dos centros de convivência. Percebemos Estdo do Rio de Janeiro. Rio de
Janeiro-RJ, Brasil (unativeras@
“senicultura” como cultivo, mas também controle gmail.com).
DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312017000100002
20 Introdução
O envelhecimento populacional é fenômeno mundial. Contamos com 600
| Maria Martha Duque de Moura, Renato Peixoto Veras |
milhões de idosos no mundo – três vezes mais do que há 50 anos, três vezes
menos do que teremos em 2050 (MANDELBAUM, 2013). O crescimento
do número de idosos, aliado à diminuição do número de filhos, resulta na
atual transição demográfica. No Brasil, o ritmo desta transição é acelerado
(CAMARANO, 2006). Ademais, a população considerada idosa está também
envelhecendo, aumentando a proporção daqueles com mais de 80 anos
(WICHMANN et al., 2013).
Diante deste quadro, a Organização Mundial da Saúde divulgou em 2002
sua proposta de envelhecimento ativo, atenta à manutenção da saúde, com foco
na autonomia e independência funcional do idoso (OMS, 2005). O crescente
custo dos cuidados em saúde, determinado pela introdução de novas tecnologias,
mas também pelo aumento da prevalência de doenças crônicas e de sua duração,
suscita hoje discussão e exige reorganização do cuidado do idoso.
Nos países da Europa Ocidental e América do Norte, as pirâmides etárias
são geralmente altas e estreitas, devido à baixa taxa de natalidade e à esperança
de vida elevada. Ao longo do tempo, esses países desenvolveram estratégias para
cuidar dos idosos. No Brasil, esta preocupação é crescente e a rede de cuidados
de idosos está em desenvolvimento.
A dificuldade de acesso aos serviços de saúde faz com que muitos idosos só
recebam os primeiros cuidados em estágios avançados de adoecimento. Assim,
missão importante dos centros de convivência é melhorar a saúde e a qualidade de
vida dos idosos, proporcionando-lhes atividades que contribuam para que sejam
menos afetados por doenças crônicas, prevenindo incapacidade e recuperando
autonomia com programas de reabilitação (VERAS; CAMARGO JR., 1995;
VERAS, 2012a).
O objetivo deste artigo é explorar, no campo da Saúde Coletiva, possibilidades
de promoção da saúde em centros de convivência para idosos. São destacados
aspectos de promoção e psicossociais do envelhecimento, enfatizando a
informação e vínculos. A partir do ciclo vital humano, é traçado paralelo entre
o cuidado da criança e do idoso, isto é, entre a puericultura e a senicultura.
Apontam-se questões de funcionamento e integração dos centros de convivência
com a rede de proteção e cuidados.
Discussão
Neste artigo, empregamos o termo idoso, do francês personne âgée, que nos parece
ser mais respeitoso, comparado a “velho” (associado à aposentadoria, dependência
e incapacidade) ou “terceira idade” (troisième age), que designa principalmente
aposentados dinâmicos, representando novo mercado no turismo, produtos de
beleza e saúde (PEIXOTO, 2000a). Idoso refere-se ao grupo de pessoas com
mais de 60 anos. São jovens velhos (60 a 70 anos), velhos (80 a 90 anos) e muito
velhos (acima de 90 anos) com autonomia e independência bem variadas.
Propomos o termo senicultura, aludindo àquele usado para o “cultivo” da
infância (puericultura), para nos referirmos às ações de promoção de saúde e
prevenção de doenças, recorrentes no cuidado de idosos.
Neste artigo exploraremos o centro de convivência de idosos, equipamento
coletivo que promove sua socialização através de atividades de lazer, educacionais
e de promoção de saúde.
Os centros de convivência
As experiências internacionais de acompanhamento do envelhecimento são
singulares, culturalmente determinadas, impossíveis de reproduzir. Entretanto,
ao observá-las, percebemos que podem se apresentar como possibilidades, fontes
de inspiração (CACHIONI, 1999; MOLINA, 2011; WICK, 2012; VERAS,
2012b; PEIXOTO, C 2000).
Países como Inglaterra e França construíram políticas e estratégias para lidar
com o envelhecimento da população. Cachioni (1999), ao discutir a origem
das universidades da terceira idade, apresenta alguns exemplos. Na França, o
modelo precursor existia desde os anos 1960, oferecendo atividades culturais e de
incentivo à sociabilidade. Nessa época, não havia preocupação com programas
dirigidos à educação permanente, para a saúde ou assistência jurídica; havia
apenas a promoção de atividades ocupacionais e lúdicas.
Na Itália, agentes gerontológicos são formados para atuar em programas de
atualização cultural, visando a prevenção de doenças, instrumentalização do
idoso e discussão do envelhecimento. Na China, centros de recreação oferecem
O caso do Brasil
Segundo histórico de Cachioni (1999), no Brasil, com o gradativo aumento da
população idosa, surgiram alguns programas educacionais voltados principalmente
ao lazer. A primeira experiência brasileira de educação para adultos maduros e
idosos foi implementada pelo Serviço Social do Comércio (SESC). Os Grupos de
Convivência surgiram na década de 1960, com programação elaborada com base
em programas de lazer. Eram assistencialistas, pois não ofereciam instrumentos
necessários para os sujeitos recuperarem a autonomia desejada. A partir da
década de 1980, as universidades começaram a abrir espaço educacional para
a população idosa e para profissionais interessados no estudo das questões do
envelhecimento, predominando a oferta de programas de ensino, saúde e lazer
(CACHIONI, 1999).
O centro de convivências de idosos refere-se a diferentes espaços que promovem
atividades regulares para idosos, do futebol semanal na beira de rio até o centro
com 65 oficinas dentro de uma universidade. Grupos de convivência ligados
ao Programa de Saúde da Família, lar de idosos e centros de convivência estão
vinculados à prefeitura do Rio de Janeiro. Nem sempre os profissionais que ali
coordenam atividades têm proposta integrada à rede de cuidados.
maneira como culturalmente lidamos com essa fase da vida foram discutidos
em trabalho anterior (MOURA, 2001). Ressaltamos a discussão sobre
cuidados paliativos, a qualidade no final da vida (HENNENZEL, 1995;
HENNENZEL; LELOUP, 1997; HENNENZEL, 2000). Seria possível
preparar um guia prático, mas também sensível, apresentando algumas ideias
sobre a morte? (Para onde iremos?).
A Psicologia, a partir da discussão sobre vínculos, contribui nessa tarefa.
Desapegar da cor dos cabelos, da visão e da audição perfeitas, desapegar da
potência, da memória; deixar partir, aceitar o “exoesqueleto” (próteses, aparelhos
para audição, óculos, implantes...), criar soluções, transformar e aprimorar. O
acolhimento dos medos no grupo é oportuno; entretanto, é tarefa do idoso
desapegar-se, viver perdas, dizer adeus. A solidão humana é fato e mesmo
necessária. O centro de convivência pode contribuir para a reflexão sobre o sentido
da vida, de cada vida, ao cultivar histórias individuais em relatos enriquecidos por
fotos, cenas de filmes, músicas, receitas de comida, compartilhando refeições etc.
A trajetória humana ao longo do ciclo vital é construída culturalmente e
experimentada de forma singular. Cada fase determina e prediz as possibilidades
no momento posterior: envelhecemos como vivemos. Flexibilidade e resiliência
(capacidade de fazer face aos acontecimentos) variam de pessoa para pessoa. A
experiência de velhice é heterogênea e multidimensional – um convite, portanto,
à singularidade também no plano de cuidados.
Ao lidar com os pequenos eventos ou microestressores da vida cotidiana,
contamos com recursos pessoais aos quais se agregam recursos sociais. A
importância da solidariedade e da troca de experiências é relevante para o
idoso e seu entorno. A qualidade ou a funcionalidade do suporte social é mais
importante para a adaptação do idoso do que a quantidade de membros da rede
e a frequência dos contatos (NERI; FORTES-BURGOS, 2011). E a relação
entre suporte social e autocuidado reforça essa visão (HUBBARD et al., 1984;
ICHIDA et al., 2013).
Vínculos, desejos e anseios são motores dessa vida. Atenção aos projetos e
fomento de novas habilidades que enriquecem o ciclo da vida.
Contudo, na maior parte das vezes não estamos preparados para dizer adeus:
do desapego maior dessa vida, a morte, à infinidade de perdas que constituem
o próprio viver. As dimensões do cuidado com o outro, os modos de o agente
Considerações finais
O lugar do cuidado
O grupo de idosos está crescendo e envelhecendo, os baby-boomers estão chegando
à terceira idade. Cada vez se vive mais e cresce também toda a tecnologia de cuidado
Referências
AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR. Plano de cuidado para idosos na
saúde suplementar. Rio de Janeiro: ANS, 2010. 62 p.
ARANTES, C. A morte é um dia que vale a pena viver. Disponível em: <www.youtube.com/
watch?v=ep354ZXKBEs&feature=youtu.be>. Acesso em: 15 jul. 2014.
ASSIS, M.; HARTZ, Z. M. A.; VALLA, V. V. Programas de promoção da saúde do idoso:
uma revisão da literatura no período de 1990 a 2002. Ciência e Saúde Coletiva. Rio de
Janeiro, v. 9, n. 3, p. 557-581, 2004.
BALTES, P.; MAYER, K. (ed.). The Berlin aging study: aging from 70-100. Londres:
Cambridge Press, 1999. 255 p.
Nota
1
M.M.D. de Moura foi responsável pela revisão bibliográfica, concepção e redação do artigo, a partir
de monografia de conclusão do curso de Especialização em Geriatria e Gerontologia UnATI/UERJ-
2014. R. P. Veras orientou o estudo que gerou o artigo e realizou a revisão crítica deste texto.