Professional Documents
Culture Documents
CASTRO, Ivo. Do Latim ao Português Antigo. In: Curso de história da língua portuguesa.
Lisboa: Universidade Aberta, 1991. P. 67 – 90
3.1 Introdução
“Só a partir do édito de Caracalla (212 d.C.), se tornavam romani todos os habitantes
do Império que falavam latim.” (p. 68);
“E daí deriva a designação coletiva de Romania (como outras do tipo Hispania,
Gallia, Britannia, ...), para representar o Império na sua totalidade, por oposição à
cidade de Roma, e também a outros territórios.” (p. 68);
“Desmembrado o imperium romanum após as invasões germânicas, romanus e
Romania perderam o seu significado político, mantendo-se, porém, com um
significado civilizacional e linguístico.” (p. 69);
“Ao lado de romanus, existia o adjetivo romanicus, que era um seu equivalente
popular [...] Enquanto o primeiro se referia apenas ao cidadão de Roma, o segundo
passou a aludir ao habitante dessa nova entidade, herdeira de Roma, que era a
Românica (romanicus = <<semelhante a romano>>).” (p. 69);
“Enquanto <<falar latim>> era designado como latine ou romani loqui no latim
clássico, no fim do Império e no período seguinte apareceu a expressão romanice
parabolare ou fabulare, <<falar à moda de Roma, nem exactamente em latim nem
em língua de bárbaros>>” (p. 69);
“România é um nome vivo ainda hoje, no sentido de comunidade de línguas
derivadas do latim.” (p. 69);
“Como as áreas do mundo ocupadas por estas línguas não coincidem mais com a área
do Império Romano de Ocidente, costuma chamar-se România Nova às regiões que
foram colonizadas por europeus a partir do século XVI e onde o português, o
castelhano ou o francês continuam a ser falados” (p. 69-70);
“Do mesmo modo, chama-se România Submersa ao conjunto de regiões da Europa
que, tendo sido romanizadas, não albergam hoje uma língua românica” (p. 70);
“... podemos dividir a România actual em seis áreas principais, segundo grau de
afinidades linguísticas e geográficas” (p. 70);
a) “Área ibero-românica: Inclui todas as línguas e dialetos peninsulares, excepto
o basco...” (p. 70);
b) “Área galo-românica: O galo-romance inclui principalmente as variedades de
<<romanz>> faladas na antiga Gália” (p. 72);
c) “Área reto-românica: as características geográficas das regiões ocupadas por
este terceiro grupo de línguas românicas foram decisivas para a sua grande
diversificação...” (p. 73);
3
Línguas perdidas:
“Das variedades, dialectos e línguas, conhecidas ou completamente ignoradas, que se
criaram a partir do latim, vale a pena destacar dois casos, o dálmata, e outro que diz
respeito à situação linguística da Península Ibérica, o moçárabe. Ambos foram
submergidos pelas línguas dominantes nos seus antigos territórios.”. (p. 77)
4
“Latim arcaico: O conhecimento desta primeira fase é nos dado pelos testemunhos
escritos nos restos arqueológicos da época pré-literária e pela documentação posterior
– também geralmente epigráfica – das outras línguas itálicas (sobretudo do úmbrio, do
osco e do sabino)...” (p. 83);
“As características principais do latim arcaico, que o distinguem do estado linguístico
(itálico) anterior, são:
a. Rotacismo. Trata-se da sistemática substituição de /-s-/ intervocálico por /-r-/.
[...] HONOS, HONORIS [...] o seu resultado transparece na evolução de todas
as línguas românicas” (p. 83);
b. “Monotongação. [...] a monotongação dos ditongos /ei/ para /i/, /ou/ e /oi/
para /u/, manifesta os seus resultados em todas as línguas românicas...”
(p. 83);
c. “Simplificação do sistema de casos. [...] Seguindo uma tendência geral das
línguas indo-europeias, o latim arcaico simplificou o sistema de casos: o
Locativo e o Instrumental fundiram-se com o Ablativo, que era geralmente
usado com preposições. O Vocativo tinha quase sempre a forma do
Nominativo [...] O mesmo se sucedeu, no plural, com o Dativo e o Ablativo,
cujas formas eram sempre iguais.” (p. 84);
“Latim tardio: Devemos entender o latim desta última fase [...] como uma
<<segunda língua>> para os utentes.” (p. 86);
[...] A distância entre a língua falada e o latim aprendido nas gramáticas provoca na
escrita (em latim) o aparecimento de números erros, que amiúde reflectem as
7
tendências diferenciadoras da língua falada pela pessoa que escreve [...] Este período
da língua literária latina está profundamente marcado pela presença do cristianismo e
pelo papel da Igreja como órgão de capitalização e difusão das actividades
intelectuais.” (p. 87);
“Latim vulgar. [...] O termo <<latim vulgar>> (que concorre com outras
denominações, como <<romance inicial>>, <<romance comum>>, <<latim pré-
romance>>, <<proto-romance>>) designa geralmente o latim falado nos últimos
séculos do Império. Ou seja, a contrapartida falada do latim literário na época
imperial.” (p. 87);
“Convém especificar esta acepção, com a ajuda de B. E. Vidos: <<A denominação
de latim falado costuma evitar-se, porque não se possui nenhum documento que
reflicta com todas as suas características esse latim popular>>. O conhecimento que
temos dessa língua falada é-nos dado apenas pela presença nalguns documentos de
fenómenos linguísticos que se afastam da norma latina, reflectindo particularidades
do seu uso” (p. 87);
“[...] o latim falado e o escrito diferiam pela própria natureza da sua produção, mas,
apesar da rigidez normativa da tradição escrita latina, esta registrou constantemente –
com maior ou menos intensidade, segundo o género e a cultura do autor – a
influência da língua falada, influência < in crescemdo> de que é testemunha a
presença dos numerosos vulgarismos que aparecem nos textos tardios.” (p. 88);
“[...] pode-se definir-se o latim vulgar como <<a língua falada pelas camadas pouco
influenciadas ou não influenciadas pelo ensino escolar e pelos modelos literários>>”
(p. 88);
“Deve-se entender o latim vulgar como um conjunto de factos complexos e instáveis,
ou seja, um diassistema. O latim vulgar evoluiu no tempo, sendo claramente
diferente o que se falava no século I d.C. do falado no séc. V.” (p. 89);
“No latim vulgar existiam variações regionais e, dentro destas, é preciso ter em conta
a época em que se produziram. Aliás, com certeza, o latim vulgar comportava uma
série de diferentes estilos e níveis de linguagem.” (p. 89-90).
8