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AULA
A árvore genealógica
dos seres vivos
objetivo

• Apresentar os principais conceitos utilizados na


descrição da árvore genealógica dos seres vivos.
Grandes Temas em Biologia | A árvore genealógica dos seres vivos

A ÁRVORE GENEALÓGICA DOS SERES VIVOS

O presente é a chave do passado.

J. Hutton

Evolução é um metafenômeno. Compreende padrões e processos


em diferentes níveis de complexidade. Por isso, falamos de evolução
molecular, seleção de espécies, variação em populações mendelianas,
irradiação adaptativa de grupos taxonômicos etc. De uma forma geral,
ela pode ser encarada como o aparecimento de alternativas novas
(novidades evolutivas) para a solução de velhos problemas impostos
pelo ambiente. Não há uma finalidade embutida, como muitos leigos e
até mesmo vários pesquisadores pensavam (ou ainda pensam). Ninguém
pode apontar o que vai acontecer com uma determinada espécie daqui a
milhões de anos, mesmo com todas as tendências analisadas. O estudo
evolutivo é retrospectivo. O naturalista tenta, através de evidências
atuais, reconstituir fatos históricos e explicá-los da mesma forma
que um investigador policial tenta reconstituir um crime. A primeira
etapa do estudo evolutivo é recuperar o que aconteceu em termos de
evolução, ou seja, as relações entre os organismos. Isso corresponde
ao padrão (estrutura) genealógico de descendência com modificação.
Depois, tentamos explicar como essa estrutura surgiu, ou seja, o processo
evolutivo.
Podemos traçar uma relação entre a estrutura de uma árvore
FILOGENÉTICA qualquer e a história das espécies ao longo do tempo geológico através

Palavra formada a da metáfora da árvore genealógica. A árvore genealógica corresponde


partir do grego, phyle ao produto (estrutura) do processo de descendência com modificação
= tribo, raça; e
genesis = origem. entre grupos de organismos. Mostra a genealogia entre espécies, sendo,
portanto, chamada de ÁRVORE FILOGENÉTICA. Cada ramo dessa árvore
corresponde a uma espécie, tendo sua própria história e tendência ao
longo do tempo geológico. Mudanças são introduzidas através de mutação
e recombinação gênica em indivíduos, e essas novidades são selecionadas
nas diferentes populações que compõem as espécies sexuadas. Devido ao
fluxo gênico (troca de fatores genéticos intra e interpopulacionais por
migração e intercruzamento), as novidades vantajosas são seletivamente
espalhadas e fixadas nas populações. Algumas novidades podem ser fixadas
em todas as populações, passando a ser características diagnósticas daquela

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espécie. Sendo assim, um táxon superior (por exemplo, Angiospermae;

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Muscidae, Culex) nada mais é do que uma coleção de espécies originadas

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de uma espécie ancestral comum. Cabe ressaltar que espécies dão origem
a outras espécies e a táxons superiores, mas nenhum táxon superior dá
origem a uma espécie ou a outro táxon superior. Quando falamos que os
peixes sarcopterígios deram origem aos tetrápodes, a história evolutiva
foi contada de forma simplificada. Na verdade, o que queremos dizer é
que uma espécie de peixe sarcopterígio passou a apresentar novidades
evolutivas que justificariam sua inclusão em um subgrupo dentro do
grupo. No caso, deixou de ser peixe e passou a apresentar aspectos
basais (por exemplo, membros com dedos nas extremidades, estribo no
ouvido médio, vértebra sacral) de um novo grupo de vertebrados, dentro
de Sarcopterygii, chamado Tetrapoda.
E o que dizer das espécies? Podemos conceituar uma espécie
como a menor amostra de organismos autoperpetuantes, diagnosticada
por um conjunto exclusivo (único) de caracteres. Sabemos hoje que a
compatibilidade reprodutiva, utilizada no passado como critério mais
relevante no reconhecimento de uma espécie, é um importante fator de
coesão para os seus membros, mas não deve ser invocada como suficiente
para separarmos duas espécies. Algumas espécies podem formar híbridos,
até mesmo apresentar descendentes férteis, e mesmo assim manter sua
individualidade. Alem disso, o que dizer daquelas espécies que não
apresentam reprodução sexuada? Como testar a hipótese de que duas
espécies que não vivem no mesmo horizonte de tempo poderiam cruzar
e produzir descendentes férteis?
Uma constatação interessante em relação às espécies é que
O isolamento
estas se comportam como indivíduos ao longo de sua história: nascem geográfico é
considerado o
(por algum tipo de especiação), “crescem” (devido a flutuações de diversos principal mecanismo
para a formação
atributos em nível populacional, por várias gerações) e morrem (quando
de novas espécies
dão origem a outras espécies ou quando se extinguem inteiramente, sem a partir de uma
espécie ancestral; esse
deixar descendentes). tipo de especiação
é denominado
As espécies sexuadas correspondem a linhagens evolutivas, ou alopátrico. Mas
seja, a um conjunto de populações que evoluem como um todo ao longo outros tipos
de especiação
do tempo. As folhas da árvore genealógica representariam as espécies (simpátrica,
parapátrica etc.)
que estão no horizonte de tempo atual. As ramificações (cladogêneses) foram propostos
correspondem a rompimentos de linhagens evolutivas em decorrência e investigados na
natureza.
de dispersão ou vicariância (aparecimento de espécies filhas isoladas

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geograficamente pela fragmentação da área de distribuição da espécie


ancestral). Normalmente, cladogênese está associada com o aparecimento
de novas espécies (especiação).

PROCESSOS EVOLUTIVOS

Dizemos que uma espécie está em processo de anagênese quando


A correspondência
estrutural, a posição todos os seus demes (populações com potencial interação reprodutiva)
topográfica e o
desenvolvimento seguem como um todo ao longo do tempo geológico. É o nome dado
embrionário permitem- para o “crescimento” da espécie. Nessa etapa, mutação, seleção natural,
nos reconhecer estruturas
morfológicas homólogas. recombinação gênica e deriva genética predominam como processos
As HOMOLOGIAS
são as ferramentas evolutivos em nível populacional.
que possibilitam a
A “seiva” da árvore filogenética corresponderia a atributos passados
reconstrução das relações
de parentesco entre as com ou sem modificação de espécie ancestral para espécie descendente.
espécies.
No caso, comparando- Os sistematas (biólogos voltados para a reconstrução das relações
se a mão da toupeira,
do morcego e do
evolutivas entre grupos taxonômicos) utilizam as similaridades entre os
dugongo, verificamos seres vivos como evidências de relação de parentesco entre eles. Essas
critérios básicos para
o reconhecimento de similaridades podem ser de diferentes tipos (morfológicas, bioquímicas,
estruturas morfológicas
homólogas: composição, etológicas, fisiológicas, biomoleculares etc.). Mas nem todas as similaridades
posição em relação ao se prestam a esse tipo de trabalho. Algumas são indicadoras de ancestralidade
corpo e desenvolvimento
embrionário. comum, outras não. As similaridades que indicam parentesco são chamadas
HOMOLOGIAS. Aquelas que surgiram independentemente de um ancestral
comum, seja por aquisição ou perda, são chamadas homoplasias e
tendem a mascarar relações de parentesco. Por exemplo, observando
a estrutura, a posição e o desenvolvimento embrionário da pata de um
cavalo e a da pata de um elefante, chegaríamos à conclusão de que são
estruturas homólogas. Comparando a asa de um inseto com a de um
morcego concluiríamos que são estruturas homoplásticas (ou seja, não-
homólogas).
Um aumento de complexidade estrutural, em geral, é verificado
entre os grupos de espécies (táxons) ao longo do tempo geológico, mas
simplificações adaptativas podem ocorrer também (por exemplo, espécies
adaptadas ao modo de vida parasitário podem apresentar redução ou
perda de estruturas do trato digestivo).

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EVOLUÇÃO DOS GRUPOS TAXONÔMICOS

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Por vezes, caímos no erro de dizer que um grupo taxonômico (ou
espécie) é mais evoluído do que outro. Essa afirmação não faz sentido.
Cada espécie apresenta um mosaico de atributos herdados e mantidos
de formas ancestrais remotas (caracteres primitivos) e novidades
evolutivas (caracteres derivados) herdadas de ancestral imediato. Ao
compararmos uma espécie com outra, podemos notar que um atributo
pode ser mais avançado (derivado) em uma espécie do que em outra,
por mais complexo ou primitivo o grupo ao qual elas pertencem. Por
exemplo, a presença de pêlos é uma condição compartilhada pelo homem
com outros mamíferos. A presença de garras é um aspecto comum à
grande maioria dos mamíferos, mas a presença de unhas está restrita
a um grupo menor dentro deste, ou seja, o dos primatas. A presença
de unhas, nesse nível de generalidade, é uma condição derivada, já que
surgiu como uma modificação da condição precedente, ou seja, garra.
Entre os primatas, o raciocínio lógico é uma condição derivada e
exclusiva do Homo sapiens. Alguém poderia advogar supremacia do
Homo sapiens (“mais evoluído”) em relação a outros animais dando
ênfase a esse atributo. Mas a capacidade de ecolocação (percepção de
objetos usando vibrações sonoras de alta freqüência) dos morcegos é
outra condição derivada que os faz “mais derivados” que nós (Homo
sapiens), já que nós apresentamos a condição primitiva (ausência de
ecolocação). Então, alguém poderia eleger esse atributo e dizer que os
morcegos são “mais evoluídos” que o Homo sapiens. Concluindo, se
todos os organismos (simples ou complexos) são constituídos de um
mosaico de caracteres primitivos e derivados de um processo evolutivo,
não faz sentido dizermos que este ou aquele organismo como um todo é
mais evoluído. Isso se aplicaria somente aos casos em que um organismo
não alcança o mesmo horizonte de tempo em que o outro viveu.
Ex.: Psittacosaurus (Cretáceo Inferior), “menos evoluído”, e Triceratops
(Cretáceo Superior), “mais evoluído”.

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A “anatomia” da árvore genealógica foi inicialmente estudada


pelo naturalista alemão ERNST HAECKEL, que utilizou, principalmente,
informações da embriologia e morfologia de grupos taxonômicos
recentes para desvendar relações evolutivas. Ele introduziu os conceitos
de grupos taxonômicos monofiléticos e polifiléticos. Considerava que a
maior parte das linhagens de seres vivos surgiu de um tronco ancestral
comum (grupos monofiléticos), enquanto outros, mais primitivos, teriam
ERNST HAECKEL surgido por geração espontânea – idéia comum entre os pesquisadores
(1834-1919)
de sua época, derrubada posteriormente pelo famoso microbiologista
Foi um dos grandes
seguidores de Darwin. francês Louis Pasteur (1822-1895) – e independentemente na base
Era defensor de uma
da árvore genealógica (grupos polifiléticos). Atualmente, grupo
postura extremamente
materialista em monofilético é sinônimo de táxon natural, ou seja, aquele formado por
relação à vida.
uma espécie ancestral e todos os seus descendentes. É decorrente da
evolução e reconhecido por homologias. Grupo polifilético é um tipo
de grupo artificial, produzido em função de atributos não-homólogos
(homoplasias) compartilhados pelos táxons. Só existe em função do erro
do taxonomista ao agrupar organismos. Por exemplo, imaginemos que
um cientista tenha proposto um táxon denominado Alifera para incluir
insetos alados e morcegos. Imaginemos também que ele justificou o
grupo pela presença de asas em morcegos e insetos alados. Analisando
criticamente essas estruturas que atendem à função de vôo, constatamos
que surgiram independentemente nesses grupos e não satisfazem critérios
básicos de reconhecimento de estruturas homólogas.

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ATIVIDADES

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1. Diferencie cladogênese de anagênese.

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2. O que você entende por homologia?

3. Qual a relação entre vicariância e especiação alopátrica?

4. O que você entende por espécie?

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