You are on page 1of 8

3583

A poluição do ar em ambientes internos

REVISÃO REVIEW
e a síndrome dos edifícios doentes

Air pollution in internal environments and sick building syndrome

Waldir Nagel Schirmer 1


Lucas Bischof Pian 1
Mariani Sílvia Ester Szymanski 1
Mayara Ananda Gauer 1

Abstract Indoor Air Quality (IAQ) emerged as a Resumo A Qualidade do Ar Interno (QAI) sur­
science from the 1970s onwards with the energy giu como ciência a partir da década de 70 com a
crisis and the subsequent construction of sealed crise energética e a consequente construção dos
buildings (without natural ventilation). This edifícios selados (desprovidos de ventilação natu­
mainly occurred in developed countries and it ral), principalmente nos países desenvolvidos, e se
soon came to public attention that lower levels of destacou após a descoberta de que a diminuição
air exchange in these environments was the main das taxas de troca de ar nesses ambientes era a
culprit for the increase in concentration of in­ grande responsável pelo aumento da concentra­
door air pollutants. It is common knowledge that ção de poluentes no ar interno. Admite-se que a
ventilation is one of the principal factors that ventilação seja um dos principais fatores que in­
interfere with air quality in indoor environments terferem na qualidade do ar interno e que os pró­
and that the occupants contribute to the pollu­ prios ocupantes dos edifícios contribuem substan­
tion of these environments with their activities. cialmente com a poluição destes ambientes atra­
Furthermore, poor indoor air quality is associat­ vés de suas atividades. Sabe-se ainda que a má
ed with some diseases (cough, rhinitis, allergy, qualidade do ar interno está associada a doenças
etc.) and with Sick Building Syndrome (SBS). (como tosse, rinite, alergia, etc.) e à Síndrome dos
For sampling of the indoor contaminants there Edifícios Doentes (SED). Para amostragem de subs­
are several methodologies, available including tâncias gasosas no ar de ambientes internos dis­
passive monitoring systems, active and automat­ põe-se de diversas metodologias, sendo as princi­
ic systems. To ensure a healthy indoor environ­ pais: sistemas passivos de monitoramento, siste­
ment, the application of specific legislation needs mas ativos e automáticos. Para a efetiva promo­
to be reconciled with research and fostering aware­ ção de um ambiente saudável, deve-se conciliar a
ness among the occupants of such buildings. This aplicação de legislações específicas com pesquisas
survey seeks to identify the different contaminants e conscientização dos ocupantes dos edifícios. Essa
found in internal environments, their effects on revisão objetiva relacionar os diferentes conta­
human health and the methodologies available minantes encontrados em ambientes internos,
1
Departamento de
Engenharia Ambiental, for sampling them. seus efeitos à saúde humana e suas metodologias
Universidade Estadual do Key words Air pollution, Indoor air quality, Sick de amostragem.
Centro-oeste. Rodovia PR
building syndrome Palavras-chave Poluição do ar, Qualidade do ar
153 Km 07, Bairro
Riozinho. 84500-000 Irati interno, Síndrome dos edifícios doentes
PR. wanasch@yahoo.com.br
3584
Schirmer WN et al.

Introdução do ar interno ganhou projeção na mídia brasilei­


ra, principalmente depois que o Governo Fede­
Entende-se por ar interno aquele de áreas não ral, em 1996, proibiu o fumo em lugares fecha­
industriais, como habitações, escritórios, escolas dos de uso coletivo, tendo por base estudos rea­
e hospitais1. O estudo de sua qualidade é impor­ lizados por agências internacionais10. Mas res­
tante para garantir saúde aos ocupantes dos di­ saltam o fato de que essa preocupação pode le­
ferentes edifícios, bem como o ótimo desempe­ var a crer que a fumaça do tabaco é a grande e
nho de suas atividades2. única culpada pela má qualidade do ar interno.
A preocupação com a Qualidade do Ar Inter- Segundo Jones11, admite-se que a ventilação
no (QAI) surgiu principalmente com a tendência seja um dos principais fatores que interferem na
em se construir edifícios selados por motivos es­ qualidade do ar interno. Sendo uma das princi­
téticos, controle de ruído e mesmo climatização, pais ferramentas no controle da qualidade do ar
o que acabou provocando um aumento nos ca­ desse ambientes, a ventilação é definida como a
sos de problemas relacionados à qualidade do ar combinação de processos que resultam não só
de tais ambientes3. no fornecimento de ar externo, mas também na
O interesse por estudos sobre a QAI surgiu retirada do ar viciado, carregado de poluentes,
após a descoberta de que a diminuição das taxas de dentro do edifício. Basicamente os processos
de troca de ar nesses ambientes era a grande res­ que envolvem a ventilação são: a entrada do ar
ponsável pelo aumento da concentração de po­ externo, condicionamento e mistura do ar por
luentes biológicos e não biológicos no ar interno. todo o edifício e exaustão9.
Essa preocupação se justifica uma vez que gran­ Sabe-se ainda que sistemas de ventilação,
de parte das pessoas (em torno de 80-90%) pas­ quando mal operados e sem manutenção ade­
sa a maior parte do seu tempo dentro destes edi­ quada, tornam-se fontes potenciais de poluen­
fícios e, consequentemente, exposta aos poluen­ tes, principalmente de materiais particulados e
tes destes ambientes4-6. microrganismos (decorrentes do acúmulo de
Estudos da Agência de Proteção Ambiental umidade nesses sistemas).
dos Estados Unidos (EPA) indicam que os níveis Sendo assim, para se ter um edifício saudável
de concentração de poluentes podem ser de duas deve-se ter uma boa qualidade do ar interior, atra­
a cinco vezes maiores em ambientes internos do vés do uso de adequadas taxas de ventilação, de
que nos externos, mesmo em cidades altamente sistemas de automação predial e, principalmen­
industrializadas. Esse fato, juntamente com o te, de um monitoramento contínuo dessas ins­
tempo de permanência em ambientes internos, talações9.
faz com que os riscos à saúde humana sejam A síndrome dos edifícios doentes (SED) pode
muito maiores nesses locais7. ser definida, de acordo com a Organização Mun­
De acordo com os padrões da Organização dial de Saúde (OMS), como uma situação na qual
Mundial de Saúde (OMS), mais da metade dos os ocupantes ou usuários de um prédio específico
locais fechados como empresas, escolas, cinemas, apresentam sintomas sem origem determinada e
residências e até hospitais tem ar de má qualida­ sem a possibilidade de constatação de uma deter­
de. Essa baixa qualidade é causada, principal­ minada etiologia, sendo, portanto, desconhecida12.
mente, pela má higienização dos aparelhos de ar Para que um edifício seja considerado doente, é
condicionado e pela falta de controle periódico necessário que pelo menos 20% de seus ocupantes
sobre as possíveis fontes de contaminação8. apresentem sintomas como: irritação das muco­
Conforme Carmo e Prado9, vários poluentes sas, efeitos neurotóxicos, sintomas respiratórios e
como monóxido e dióxido de carbono, amônia, cutâneos e alterações dos sentidos, por no míni­
óxido de enxofre e nitrogênio, são produzidos mo duas semanas, sendo que estes desaparecem
dentro do edifício por materiais de construção, quando o indivíduo se afasta do edifício2.
materiais de limpeza, mofo, atividades domésti­ Admite-se que os principais fatores relacio­
cas (cozinhar, lavar e secar roupas), entre ou­ nados à SED são: aerodispersoides (poeira, fi­
tros. Os próprios ocupantes dos edifícios contri­ bras); bioaerossois (fungos, bactérias, vírus);
buem substancialmente com a poluição de am­ contaminantes químicos como COV (Compos­
bientes internos, tanto pela respiração e transpi­ tos Orgânicos Voláteis) e formaldeído; contami­
ração, como pelo transporte de microorganis­ nantes gerados pelo metabolismo humano; ven­
mos potencialmente causadores de doenças. Isso tilação inadequada, entre outros13.
sem falar no cigarro, um dos principais vilões de Assim, dada a importância da QAI, esta
qualquer ambiente6. Brickus e Aquino Neto6, sa­ revisão objetiva relacionar os diferentes conta­
lientam ainda que a importância da qualidade minantes encontrados em ambientes internos (de
3585

Ciência & Saúde Coletiva, 16(8):3583-3590, 2011


diferentes origens, biológica e não-biológica), seus potente cancerígeno que se encontra em concen­
efeitos à saúde humana e suas respectivas meto­ trações de 20 a 100 vezes maiores para fumantes
dologias de amostragem. passivos do que para fumantes ativos11.
Os principais COV encontrados em ambien­
tes internos são: benzeno, tolueno, etilbenzeno,
Principais poluentes xileno, formaldeído, acetaldeído12,14. Os níveis de
relacionados à qualidade do ar interno COV são maiores internamente, pois, apesar da
entrada de COV a partir do ar externo também
É fato que o ar externo pode ser a principal fonte ser significativa, as fontes internas são mais im­
de poluentes (nesse caso, físicos, químicos e bio­ portantes, principalmente em edifícios novos
lógicos) para o ambiente interno. Apesar disso onde os materiais de construção apresentam ta­
se evidenciar principalmente em locais de intensa xas mais altas de emissão, que vão diminuindo
circulação de veículos e em zonas industriais, as com o tempo. O formaldeído é o COV mais en­
fontes de tais contaminantes podem ser as mais contrado em ambientes internos, chegando a ser
diversas, como a própria atividade humana (mi­ considerado por certos autores como um dos
crorganismos, CO2, etc.) e até mesmo estruturas mais importantes15. Também vale ressaltar que
de alvenaria (caso do radônio). os COV estão diretamente relacionados aos sin­
Dentre os principais poluentes do ar interno, tomas da SED, detalhada a seguir1.
destacam-se tanto contaminantes de origem não­ Quanto aos contaminantes de origem bioló­
biológica [como o monóxido e o dióxido de car- gica, os principais são bactérias, fungos, grãos de
bono, o óxido e dióxido de nitrogênio, dióxido pólen, ácaros e esporos. Sua importância no ar
de enxofre, ozônio, materiais particulados, fu­ interno está no fato de serem responsáveis por
maça de cigarro (environmental tobacco smoke) e causar inúmeras doenças infecciosas e alérgicas,
os compostos orgânicos voláteis] quanto bioló­ provocadas por toxinas produzidas pelos micro­
gica (bactérias, fungos, etc.). organismos que crescem nos sistemas de venti­
O termo material particulado (ou simples­ lação. A principal forma de combater os proble­
mente MP) designa uma mistura física e química mas relacionados é evitando (ou pelo menos
de diversos compostos presentes em suspensão controlando) o crescimento destes a um nível
no ar, tanto sólidos como líquidos (gotículas, mínimo. Pode-se alcançar esse objetivo através
aerossol, névoa, fumaça, etc.). Atividades como de medidas como: remoção de fontes de água
varrer, tirar pó e cozinhar contribuem para a que permitam o crescimento dos fungos; manu­
suspensão das partículas. Os particulados pro­ tenção da umidade relativa do ar menor que 60%;
duzidos em ambientes internos são, em geral, remoção de materiais orgânicos porosos clara­
menores que os externos, e contêm uma quanti­ mente infectados, como tapetes embolorados;
dade maior de compostos orgânicos devido às umidificadores portáteis de ar devem ser evita­
características das suas fontes (fogão, cigarro) e dos em escritórios porque raramente são manti­
da natureza das atividades realizadas dentro do dos em condições próprias de uso e acabam se
prédio. Essas características fazem dos particu­ tornando fontes em potencial; uso de filtros efi­
lados internos potencialmente mais perigosos9. cientes no sistema de tomada de ar externo e
Além disso, é o tamanho do particulado que vai manutenção constante destes9.
determinar seu destino, podendo este se deposi­
tar em superfícies, ficar suspenso no ar, ser reti­
rado pelo sistema de ventilação, ou ainda ser ina­ Doenças associadas à qualidade
lado pelos ocupantes, acumulando-se nas vias do ar interno
aéreas superiores ou mesmo nos alvéolos6.
A fumaça do cigarro é um aerossol formado Doenças causadas
pela mistura de diversas substâncias distribuí­ por contaminantes biológicos
das em particulados, vapores e gases. É conside­
rada como o principal poluente de ambientes Alguns microrganismos ocasionam reações
internos, principalmente pela quantidade de pes­ alérgicas, cujos sintomas incluem espirros, olhos
soas expostas. A fumaça de cigarro afeta tam­ lacrimejantes, tosse, deficiência respiratória, le­
bém não fumantes que convivem com fumantes, targia, febre e problemas digestivos, além de se-
os chamados fumantes passivos. Em alguns ca­ rem causadores de pneumonia, rinite e asma15.
sos, os níveis de exposição a certos compostos De modo geral, as principais doenças associadas
são maiores em não fumantes do que em fu- a poluentes biológicos são o Mal dos Legioná­
mantes, como a N-nitrosodimetilamina, um rios (ou legionelose, pois tem como agente a bac-
3586
Schirmer WN et al.

téria gram-negativa do gênero Legionella); a fe­ Material particulado


bre do umidificador (doença que se desenvolve a Conforme Jones11, a inalação de material par­
partir de exposições a toxinas de microorganis­ ticulado causa irritação nas vias respiratórias, le­
mos, especialmente daqueles que crescem nos sis­ vando à constrição das mesmas. Outro grave pro­
temas de ventilação dos edifícios); asma brôn­ blema é que estas partículas absorvem muitos gases
quica (espasmos associados à inalação de aeros­ prejudiciais, removendo-os do ar. Quando estas
sol biológico); pneumonite alérgica ou alveolite partículas são inaladas, os gases são juntamente
extrínseca; pneumonia (infecção pulmonar as­ aspirados, atingindo os pulmões19.
sociada a bactérias como Streptococcus pneumo­
niae, Mycoplasma pneumoniae, Staphylococcus Fumaça de cigarro
aureus, Legionella e Haemophilus influenzae, ví­ Os principais sintomas da exposição à fuma­
rus e alguns tipos de fungos)16,17. ça do cigarro em indivíduos adultos são rinite,
faringite, tosse, dor de cabeça, irritação dos olhos
Doenças causadas e constrição dos brônquios. Crianças podem de­
por contaminantes não biológicos senvolver asma, infecções respiratórias, bronqui­
te e pneumonia18. Evidências mostram que essa
Dióxido de carbono fumaça tem potencial carcinogênico11, sendo a
O dióxido de carbono não apresenta grandes nicotina a responsável por elevar esse potencial20.
problemas de toxicidade aos seres humanos. En­
tretanto, à medida que aumentam os níveis de Compostos orgânicos voláteis
concentração no ambiente, “a pessoa sente como Segundo Schirmer21, a maioria dos COV são
se não houvesse ar suficiente”. De acordo com a narcóticos e depressores do sistema nervoso cen­
Associação de Saúde do Canadá, exposições con­ tral. São também causadores de irritações nos
tínuas podem conduzir à desmineralização dos olhos, nas vias respiratórias e na pele. Exposi­
ossos9. ções a alguns COV, em concentrações muito ele­
vadas, podem alterar as funções neurocompor­
Monóxido de carbono tamentais e também levar ao desenvolvimento
A afinidade do monóxido de carbono (CO) de câncer. Os COV podem ainda interagir uns
pela hemoglobina leva à formação de carboxihe­ com os outros, potencializando os efeitos adver­
moglobina, substituindo o oxigênio e ocasionan­ sos causados à saúde (sinergia)9.
do numa diminuição de seus níveis no sangue.
Sendo assim, seus efeitos mais tóxicos são ob­
servados em órgãos como cérebro e coração, que Amostragem de contaminantes
demandam mais oxigênio. em ambientes internos

Dióxido de nitrogênio Apenas na década de 80 é que foram estipuladas


É um agente oxidante que compromete a fun­ as primeiras normas pela Organização Mundial
ção pulmonar, podendo causar infecções respi­ da Saúde relacionadas à qualidade do ar interno.
ratórias e, em casos mais graves, enfisema pul­ Já no Brasil, a qualidade de ar de interiores foi
monar15. regulamentada inicialmente pela Resolução 176
de 24 de outubro de 2000 da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA)22 e, posteriormen­
Óxido de nitrogênio te, pela Resolução 09 de 16 de janeiro de 200323, a
Pode interferir no transporte de oxigênio para qual publicou Orientação Técnica sobre Padrões
os tecidos produzindo efeitos parecidos como os Referenciais da Qualidade do Ar de Interiores em
do CO; pode provocar ainda edema pulmonar ambientes climatizados artificialmente de uso
quando em elevadas concentrações9. público e coletivo.
A Resolução 9, de 16 de janeiro de 2003 da
Dióxido de enxofre ANVISA, normatiza as metodologias que devem
Age principalmente como irritante, afetando ser empregadas quando da determinação de CO2,
a mucosa do olhos, nariz, garganta e trato respi­ temperatura, umidade relativa do ar, bioaeros­
ratório. Sua inalação em doses elevadas causa sois e aerodispersoides, em ambientes não in­
danos ao sistema respiratório inferior; em casos dustriais. No entanto, como existem outros com­
de exposições crônicas, pode levar à diminuição postos que exercem influência na qualidade do
da função pulmonar9,18. ar interno, o Ministério do Trabalho instituiu a
3587

Ciência & Saúde Coletiva, 16(8):3583-3590, 2011


NR – 15 quando se tratar da análise em ambien­ uma avaliação da qualidade do ar em ambientes
tes industriais. Além destas, a título de compara­ internos, os amostradores devem ser posiciona­
ção, já que não apresentam valor legal no Brasil, dos a uma altura média de 1,5 metros, próximo à
podem-se utilizar padrões de referência interna­ zona de respiração dos indivíduos expostos29.
cionais, como a NIOSH e ASHRAE24, que tam­ De acordo com Cruz e Campos30, para se
bém trazem valores máximos de exposição para realizar a coleta de poluentes gasosos, utiliza-se
compostos tóxicos (para jornadas de trabalho como meio coletor (ou fixador) sólidos com ele­
de 48 horas semanais). vada capacidade de adsorção de poluentes gaso­
Ao se realizar a avaliação da QAI, existem al- sos. Nesse caso, admite-se que o adsorvente ade­
guns parâmetros básicos que merecem especial quado é aquele capaz de amostrar grandes volu­
atenção, entre eles: material particulado (inclu­ mes de ar poluído, sem causar interferências no
indo material finamente particulado, PM10 ou resultado da amostragem. Além destas proprie­
PM2,5), óxidos de enxofre e nitrogênio, poeira, dades, deve optar por adsorventes não higros­
ozônio, COV e ácidos aerossois25 . cópicos e resistentes a altas temperaturas.
No entanto, antes de se efetuar a tomada de A amostragem pode ainda se dar por absor­
amostras, deve-se atentar a alguns fatores relaci­ ção. Nesse caso, a escolha do meio absorvente
onados à escolha do método de amostragem, para tomada de amostras deve ser condiciona­
entre eles confiança, exatidão, facilidade de ope­ da, principalmente, pela afinidade entre o absor­
ração e custo25. vente e os compostos a serem amostrados29.

Tipos de amostradores Sistemas ativos de monitoramento

Para a amostragem de substâncias gasosas Diferentemente dos sistemas passivos de


no ar de ambientes internos dispõe-se de diver­ amostragem, Andrés et al.26 definem sistemas
sas metodologias, entre as quais pode-se desta­ ativos como aqueles que, mediante a utilização
car como mais importantes26: de uma bomba de aspiração, forçam a passagem
. Sistemas passivos de monitoramento de ar através de um meio de coleta, seja ele quí­
. Sistemas ativos de monitoramento mico ou físico.
. Sistemas automáticos de monitoramento Devido à utilização de uma bomba de aspira­
ção, verifica-se que o volume de ar amostrado é
Sistemas passivos de monitoramento maior, em comparação com sistemas passivos.
Sendo assim, pode-se admitir que a confiabili­
Em amostradores passivos, a coleta de espé­ dade do dispositivo ativo é maior, uma vez que
cies gasosas presentes na atmosfera é baseada na se conhece o volume amostrado e, consequente­
capacidade de difusão molecular das mesmas e mente, a concentração do meio26.
sua reação com os meios absorventes (ou ad­
sorventes) do amostrador27. Analisadores automáticos (sensores)
Quando se faz referência às vantagens do uso
de amostradores passivos, Andrés et al.26 desta­ Segundo Andrés et al.26, os dispositivos au­
cam que uma das principais reside no fato de tomáticos, ou sensores, baseiam-se em alguma
que este tipo de amostrador apresenta, inicial­ propriedade do contaminante, seja ela física ou
mente, custo muito baixo; além disto, são siste­ química, que pode ser, por meio de métodos óp­
mas simples, desde a tomada de amostras até tico-eletrônicos, detectada e quantificada conti­
sua análise em laboratório, sendo dispensável a nuamente. Gioda e Aquino Neto24 afirmam que
utilização de pessoal altamente qualificado. Amos­ esta propriedade característica do contaminante
tradores passivos são projetados para mensu­ é responsável pela produção de sinais em uma
rar, na maioria dos casos, concentrações em ní­ câmara de reação, tais como, mudança de cor,
veis de ppm, por um período médio de 8 horas, emissão de luz fluorescente, mudança do poten­
em ambientes ocupacionais. Porém, este nível de cial elétrico na superfície, fluxo de elétrons, pro­
detecção pode ser menor que 1 ppb, quando apli­ dução de aquecimento, ou mudança na frequên­
cado na determinação de compostos específicos cia de oscilação de um cristal. Estes estímulos são
em ambientes internos28,29. então percebidos por uma fotocélula, a qual pro­
Para a amostragem da exposição individual a duz um sinal eletrônico proporcional à concen­
compostos tóxicos, os dispositivos passivos são tração do contaminante.
geralmente fixados na roupa, próximos ao rosto Sensores químicos fornecem a concentração
do operador. No entanto, quando se deseja obter de uma espécie ou classe especifica de analitos em
3588
Schirmer WN et al.

uma amostra, desconsiderando as demais espé­ centração de CO2 consiste na leitura direta, me­
cies presentes na amostra analisada24. diante utilização de sensor infravermelho não
dispersivo, ou célula eletroquímica, devidamente
Amostragem de poluentes de ar interno calibrado. Deve-se observar, durante a escolha
do sensor, que sua faixa de sensibilidade seja de 0
Bioaerossois a 5.000 ppm. Além disso, sugere-se que as medi­
No Brasil utiliza-se como metodologia para ções sejam realizadas nos períodos em que o
determinação deste marcador epidemiológico, a ambiente se encontra com maior utilização, a uma
Resolução ANVISA nº 9 de 16 de janeiro de 03, que distância de 1,5 metros do chão. O número de
estabelece a Norma Técnica 001 (NT 001), a qual amostras é aquele definido pela Tabela 123.
normatiza os critérios, método de amostragem e De acordo com Basto16, devido à produção
análise de bioaerossol em ambientes interiores. de CO2 em ambientes internos ser, em sua quase
Segundo a NT 001, para a coleta de amostras, totalidade, devido à atividade metabólica dos
utiliza-se um impactador linear de 1, 2 ou 6 está­ ocupantes, pode-se afirmar que em sua amos­
gios. A norma estabelece que o ar deve ser coleta­ tragem serão determinados os níveis residuais
do a uma vazão de 28,3 L.min-¹, durante um perí­ deste poluente e, indiretamente, pode-se verificar
odo de 5 a 15 minutos. Após aspirado, o ar passa as condições de renovação de ar externo.
através de um meio filtrante, sendo forçado a de­
positar-se em uma placa de petri, onde está con­ Aerodispersoides
tido o meio de cultura. A legislação estabelece que, A amostragem de aerodispersoides no Brasil
para coleta de fungos, deve-se, preferencialmente, também é normatizada pela Resolução ANVISA
utilizar o Agar Extrato de Malte, Agar Sabourad nº 9 (Norma Técnica 004).
ou o Agar Batata como meio de cultura16. O processo de amostragem consiste na utili­
Para determinação do número de amostras zação de uma bomba de aspiração que coleta o
a serem efetuadas, deve-se observar a área cons­ ar, a uma vazão recomendada de 2 L.min-1, for­
truída do edifício (ver Tabela 1). Além disto, in- çando sua passagem por uma unidade filtrante,
dica-se que as amostras sejam coletadas a 1,5 de 37 mm de diâmetro, com porosidade de 5 µm
metros de distância do chão17. e constituída por uma mistura de ésteres de celu­
Segundo a Resolução no 9, o tempo mínimo lose. A amostragem deve ser realizada por um
de incubação para fungos é de 7 dias, à tempera­ tempo determinado em função do volume de ar
tura de 25°C, enquanto que para bactérias é de a ser amostrado, o qual pode variar de 50 a 400
no mínimo 2 dias, à temperatura de 37ºC23. L 16,23. Segundo o mesmo autor, por meio da
amostragem de aerodispersoides, pode-se veri­
Dióxido de carbono (CO2) ficar tanto a eficiência da filtragem nos sistemas
No Brasil, a Resolução ANVISA nº 9 apre­ de ventilação quanto à presença de sujeira nos
senta a Norma Técnica 002 (NT 002), que esta­ dutos de ventilação.
belece a metodologia de amostragem e análise de Para determinação da massa de aerodisper­
CO2 em ambientes interiores. De acordo com a soides, é realizada a pesagem dos filtros, em ba­
legislação, o processo para determinação da con- lança de precisão, durante a preparação dos mes­
mos e após a amostragem16. A concentração de
aerodispersoides é então determinada proceden­
do-se ao cálculo do quociente entre diferença das
Tabela 1. Determinação do número de amostras em massas e o volume de ar amostrado19.
função da área construída do edifício.
Área construída Número mínimo de Compostos orgânicos voláteis
(m2) amostras a serem coletadas Comparando-se as técnicas de amostragem
Até 1.000 1 de COV, verifica-se que a que mais se destaca, em
1.000 a 2.000 3 termos de praticidade, simplicidade e custo de
2.000 a 3.000 5 operação é a amostragem passiva em tubos com
3.000 a 5.000 8 sólidos absorventes. Por estes motivos, tende a
5.000 a 10.000 12 ser mais largamente utilizada que as demais téc­
10.000 a 15.000 15 nicas, entre elas, a amostragem ativa31.
15.000 a 20.000 18 Ao se realizar a tomada de amostras, torna-se
20.000 a 30.000 21 necessário a determinação da taxa de amostra-
Acima de 30.000 25 gem, a qual, teoricamente, varia somente em fun-
Fonte: Brasil23. ção da geometria do captor e do coeficiente de
3589

Ciência & Saúde Coletiva, 16(8):3583-3590, 2011


difusão do poluente no ar a ser amostrado. No vando em âmbito internacional, a expectativa é
entanto, verifica-se que, na prática, algumas con­ de que, também no Brasil, ocorra um aumento
dições ambientais, entre elas temperatura ambi­ no controle da qualidade do ar de ambientes in­
ente, pressão, umidade relativa e natureza do ternos, bem como a adoção de medidas mais
material absorvente, podem tornar variável esta rigorosas específicas para fontes de diferentes
taxa. Sendo assim, devido a estas interferências, naturezas e a inclusão de um programa de medi­
torna-se importante, além da determinação da da e controle/abatimento desses contaminantes.
taxa de amostragem local, a utilização simultânea Entretanto, admite-se que dentre os fatores li­
de outro método de amostragem, por exemplo, mitantes ao desenvolvimento da QAI no Brasil,
amostragem ativa (validação da amostragem pode-se destacar a falta de legislação específica que
passiva), o que pode vir a constituir uma dificul­ estabeleça padrões e metodologias de amostragem
dade ao emprego da amostragem passiva31-34. para compostos orgânicos (como por exemplo
COV, BTEX e HPA) em ambientes internos não
industriais e a falta de incentivo à pesquisas na área.
Conclusões O maior controle e rigor na manutenção dos
sistemas de ventilação e de outros fatores interve­
Apesar da crescente preocupação em relação à nientes na QAI diminuiria os riscos de contami­
QAI, em nível de Brasil, são poucos os estudos nação do ar o que, por conseguinte, diminuiria os
realizados em torno do tema. A maior parte das gastos com saúde dos ocupantes e as taxas de
pesquisas, em Engenharia Ambiental, ainda absenteísmo. Sendo assim, para a efetiva promo­
apoia-se sobre tratamento de resíduos sólidos e ção de um ambiente interno saudável, deve-se
líquidos bem como águas de abastecimento. En­ conciliar a aplicação da legislação com pesquisas
tretanto, similarmente ao que já vem se obser­ e conscientização dos ocupantes dos edifícios.

Colaboradores Referências

MA Gauer, LB Pian e MSE Szymanski participa­ 1. Wang S, Ang HM, Tade MO. Volatile organic com­
ram da pesquisa bibliográfica e da redação do pounds in indoor environment and photocatalytic
oxidation: State of the art. Environ Int 2007; 33(5):
artigo, e WN Schirmer orientou os acadêmicos 694-705.
(os demais autores) na elaboração do artigo, re­ 2. Gioda A, Aquino Neto FR. Considerações sobre
visão do trabalho durante e após seu término e estudos de ambientes industriais e não-industriais
formatação para as normas da revista Ciência & no Brasil: uma abordagem comparativa. Cad Saude
Saúde Coletiva. Publica 2003; 19(5):1389-1397.
3. Gioda A. Poluição Atmosférica e de Interiores: Influên­
cia Mútua e Seus Reflexos na Saúde [tese]. Rio de
Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro;
2003.
4. Lee H, Awbi HB. Effect of internal partitioning on
indoor air quality of rooms with mixing ventilation
- basic study. Build Environ 2004; 39(2):27-41.
5. Turiel I, Hollowell CD, Miksch R, Rudy JV, Young
RA, Coye MJ. The effects of reduced ventilation on
indoor air quality in an office building. Atmos En­
viron 1983; 17(1):51-64.
6. Brickus LSR, Aquino Neto FR. A qualidade do ar de
interiores e a química. Quím Nova 1999; 22(1):56-74.
3590
Schirmer WN et al.

7. American lung association. Indoor Air Quality and its 23. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de
Effects on Health. Asthma magazine 2000; 5(5):22-23. Vigilância Sanitária (ANVISA). Resolução n. 9 de
8. World Health Organization (WHO). Indoor air qua­ 16 de janeiro de 2003. Brasília: ANVISA; 2003.
lity: biological contaminants. Rautavara; 1998. 24. Gioda A, Aquino Neto FR. Uso de sensores para
9. Carmo AT, Prado, RTA. Qualidade do ar interno. caracterização da qualidade do ar de interiores.
São Paulo: Escola Politécnica da Universidade de Rev Brasindoor 2000; 4(5):4-15.
São Paulo; 1999. 25. World Bank Group (WBG). Monitoring Environ­
10. Brasil. Palácio do Planalto. Lei no 9.294, de 15 de mental Quality. Pollution Prevention and Abatement
julho de 1996: Dispõe sobre as restrições ao uso e à Handbook. 1998; 7p.
propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoó­ 26. Andrés DA, Ferrero EJ, Mackler CE. Importancia
licas, medicamentos, terapias e defensivos agríco­ de la combinación de equipos activos y pasivos de
las, nos termos do § 4° do art. 220 da Constituição monitoreo em sistemas de vigilancia de la contami­
Federal. [acessado 2008 nov 13]. Disponível em: nación atmosférica urbana. Rev Tecnoticias 1999;
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9294.htm 2(julio):15-19.
11. Jones AP. Indoor air quality and health. Atmos 27. Companhia de tecnologia de saneamento ambien­
Environ 1999; 33(28):4535-4564. tal (CETESB). Monitor passivo de dióxido de enxofre:
12. World Health Organization (WHO). Indoor Air construção e testes de validação. São Paulo: Secreta­
Quality: Organic Pollutants. EURO Reports and Stud­ ria do Meio Ambiente; 1998.
ies n. 111. Copenhagen; 1989. 28. Yamamoto N, Matsubasa T, Kumagai N, Mori S,
13. Hoppe LF. Qualidade dos ambientes interiores e o Suzuki K. A diffuse badge sampler for volatile or­
papel da saúde ocupacional. In: Anais do I Encon­ ganic compounds in ambienta ir and determina­
tro paulista de meio ambiente e controle da qualidade tion using a thermal desorpition-CG-MS system.
do ar de interiores; 1999; São Paulo. São Paulo: Socie­ Anal Chem 2002; (74):484-87.
dade Brasileira de Meio Ambiente e Controle de 29. Piceli PC. Quantificação de Benzeno, Tolueno, Etil­
Qualidade do Ar de Interiores; 1999. p. 43-51. benzeno, Xilenos no Ar de Ambientes Climatizados
14. Wolkoff P, Nielsen GD. Organic compounds in in­ [dissertação]. Florianópolis: Universidade Federal
door air – Their relevance for perceived indoor air de Santa Catarina; 2005.
quality? Atmos Environ 2001; 35(26):4407-4417. 30. Cruz LOS, Campos VP. Amostragem passiva de
15. United States Environmental Protection Agency poluentes atmosféricos. Aplicação ao SO 2. Quím
(USEPA). The Inside Story: A Guide to Indoor Air Nova 2002; 25(3):406-11.
Quality; 1995. Report N°: EPA-402-K-93-007. 31. Albuquerque EL, Tomaz E. Validação da amostra­
16. Basto JE. Requisitos para Garantia da Qualidade do gem passiva de BTEX na atmosfera de São Paulo,
Ar em Ambientes Climatizados Enfoque em Ambien­ Brasil. In: Anais do 30o Congresso Interamericano de
tes Hospitalares [monografia]. Florianópolis: Uni­ Engenharia Sanitária e Ambiental; 2006; Punta del
versidade Federal de Santa Catarina; 2005. Este. 1 CD-Rom.
17. Lenzi FS, Moreira IM, Tavares DF. Qualidade do Ar 32. Brown RH, Wright MD, Plant NT. The use of diffu­
em Diferentes Ambientes do Hospital Regional de São sive sampling for monitoring of benzene, toluene
José [trabalho de conclusão da disciplina – gradua­ and xylene in ambient air. Pure Appl Chem 1999;
ção em Engenharia Sanitária e Ambiental]. Floria­ 71(10):1993-2008.
nópolis: Universidade Federal de Santa Catarina; 33. Gheleri LC. Amostragem Passiva de Benzeno na At­
2007. mosfera [dissertação]. Campinas: Universidade
18. United States Environmental Protection Agency Estadual de Campinas; 2003.
(USEPA). Indoor Air Pollution – An Introduction for 34. Health and Safety Executive (HSE). Occupational
Health Professionals; 1994. Report N°: EPA-402-R­ Medicine and Hygiene Laboratory. Methods for the
94-007. Determination of Hazardous Substances, MDHS 80:
19. Moraes AP. Qualidade do Ar Interno com Ênfase na Volatile Organic Compounds in air - Laboratory
Concentração de Aerodispersoides nos Edifícios [dis­ methods using diffusive solid sorbent tubes, ther­
sertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo; mal desorption and gas chromatography; 1995.
2006.
20. Eatough D J, Benner CL, Bayona J M, Caka FM,
Mooney RL, Lamb JD, Lee ML, Lewis EA, Hansen
LD, Eatough NL. Proceedings of the 4th International
Conference on Indoor Air Quality and Climate; 1987;
Berlin, Germany.
21. Schirmer WN. Amostragem, análise e proposta de
tratamento de compostos orgânicos voláteis (COV) e
odorantes em estação de despejos industriais de refina­
ria de petróleo [dissertação]. Florianópolis: Univer­
sidade Federal de Santa Catarina; 2004.
22. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Artigo apresentado em 07/04/2008
Vigilância Sanitária (ANVISA). Resolução n. 176 de Aprovado em 13/11/2008
24 de outubro de 2000. Brasília, DF; 2000. Versão final apresentada em 22/11/2008

You might also like