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Linhas Críticas
REVISTA DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO - UnB
Linhas Críticas
Revista da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília
Critical Lines
Journal of the Faculty of Education, University of Brasília
Linhas Críticas
REVISTA DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO - UnB
50
Linhas Críticas é uma publicação da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília e de seu programa de pós-
graduação. Publica artigos inéditos de autores e autoras brasileiros e estrangeiros que apresentem consistência, rigor
e originalidade na abordagem do tema. Aceita trabalhos teóricos e empíricos de diferentes áreas e linhas de pesquisa
em educação, assim como artigos científicos sobre questões atuais em educação.
Universidade de Brasília
Faculdade de Educação
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Linhas Críticas
Revista da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília
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Sumário
7 Editorial
Maria Clarisse Vieira
Ormezinda Maria Ribeiro
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 7-8, fev. 2017 a mai. 2017. 7
debate educacional na primeira metade de 1930” Adriana Duarte Leon analisa como
essa publicação semanal católica atuou de forma prioritária na defesa do ensino religioso
facultativo nas escolas públicas do Rio Grande do Sul, efetivando-se como uma estratégia
de ação estabelecida pela Igreja com o objetivo de ampliar sua intervenção social.
Na sequência, o artigo “Espelho de príncipe: reflexões a partir do manual de Dhuoda”
de Terezinha Oliveira e Ana Paula dos Santos Viana tece reflexões ao sentido de
autoridade e liderança, circunscritas no contexto histórico em que ocorrem as
formulações contidas nessemanual (século IX), cuja finalidade era apresentar uma
proposta de formação moral, política e religiosa para os jovens desse período.
No artigo “Participação e conflitos na gestão de escola transformada em Comunidades
de Aprendizagem”, Edneia Virgínia Pinheiro e Celso Luiz Aparecido Contiapresentam
os resultados de pesquisa realizada em uma escola pública, com o objetivo de
compreender as mudanças no seu processo de gestão, no que se refere à participação
e aos conflitos, em função da sua transformação em Comunidades de Aprendizagem.
No artigo “Caminhos e descaminhos do retorno à escola: o Programa Ação Integrada
Adultos”, Márcia Regina da Silva e Isabel Bilhãotematizam a Educação de Jovens e
Adultos, com os objetivos de apresentar as peculiaridades de um programa municipal
desenvolvido na cidade de Esteio/RS, identificar as características da escola e da
turma e refletir sobre as histórias de vida e perspectivas dos sujeitos de pesquisa.
Comos objetivos de investigar o nível de compreensão da operação de divisão pelos
alunos do 4º ano do ensino fundamental e de realizar intervenção com jogos de regras
e desafios específicos para o desenvolvimento da operação de divisão, o artigo de
Sonia Bessa “Operação de divisão: possibilidades de intervenção com jogos” descreve
uma intervenção pedagógica,cujo método clínico utilizadocom 13 alunos demonstrou
eficácia na construção da operação de divisão aritmética pelos estudantes.
Por fim, o artigo “Política de educação profissional no Vietnã: ofertas formativas
sob a vigência da integração internacional”, de Nguyen Thuong Lang apresenta as
mudanças ocorridas no paradigma da política de educação profissional do Vietnã
durante o processo de mudança de uma economia altamente centralizada para uma
economia de mercado orientada para o socialismo em meio a uma proativa integração
internacional, demonstrando que as políticas de educação profissional do Vietnã
têm claro objetivo de atender ao plano do Estado e às necessidades do mercado de
trabalho daquele país.
Desejamos a todos uma boa e profícua leitura!
8 Editorial
A ambivalência da técnica e da tecnologia na
profissionalização do ensino médio
Resumo
A proposta do artigo consiste em situar o papel da técnica e da tecnologia dentro
da chamada “era tecnológica”, discutindo as facetas atribuídas a essas categorias.
A apropriação desses conceitos permite uma abordagem mais consistente da
profissionalização do ensino médio, que ocorre de forma cada vez mais precoce.
Encerramos esta comunicação com a discussão sobre a dualidade educativa que
a profissionalização do ensino médio encobre e que tem se consolidado nas
esferas profissional e propedêutica, pública e privada.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 9-27, fev. 2017 a mai. 2017. 9
La ambivalencia de la técnica y la tecnología en el
debate de la escuela secundaria
Resumen
El propósito de este artículo es definir el papel de la técnica y tecnología dentro de
la llamada "era tecnológica", discutiendo las facetas asignadas a estas categorías,
valorándolos para el logro de la emancipación humana. La apropiación de estos
conceptos permite un enfoque más coherente a la profesionalización de la escuela
secundaria, que se hace cada vez más temprano. Se examina cómo, a partir de
este punto de la revolución técnica-científica, la ciencia se ha transformado en
una mercancía, el que se ajusta mejor a las inmediatas necesidades del capital,
desarrollada por la demanda capitalista como cualquier otro elemento con fines
comerciales. Cerramos esta comunicación con la discusión de la dualidad educativa
que la profesionalización temprana de la escuela secundaria esconde y que se ha
consolidado en el ámbito profesional y propedéutico, público y privado.
Abstract
The purpose of the article is to define the role of technique and technology within the
call "technological age", discussing the facets assigned to these categories, valuing
them for the achievement of human emancipation. The appropriation of these
concepts allows for a more consistent approach to high school professionalisation,
which occurs increasingly early way. It examines how, from this landmark scientific-
technical revolution, science has been transformed into a commodity, making it less
possible and more adjusted to the immediate capital needs, driven by capitalist
demand as any other commercial purpose item. We conclude the communication with
the discussion of covert functions contention that high school professionalisation
covers, a fact that has consolidated the educational duality in professional spheres
and workup, public and private.
Résumé
L'objectif de l'article est définir le rôle des techniques et de la technologie au
sein de l'appel "ère technologique", en discutant les facettes assignées à
ces catégories. L'appropriation de ces concepts permet une approche plus cohérente à
la professionnalisation de l'école secondaire, qui se produit à une forme de
temps auparavant. Nous fermons cette communication avec la discussion de la
dualité éducative que la professionnalisation des couvertures du secondaire et qui a
été consolidée dans les sphères professionnelles et propédeutique, publics et privés.
Introdução
A presente comunicação pretende alargar a compreensão dos conceitos de
técnica e de tecnologia como fatores de propulsão para a emancipação humana.
Nesse debate, empreendemos a discussão das facetas redentora e malévola,
para, a partir desse ponto, entender que precisar essas categorias é indispensável
para a compreensão das determinações responsáveis pela subordinação cultural
e econômica dos países que estão situados na periferia do capital. Em particular,
procura-se, com este artigo, apresentar uma crítica ao conceito de “era tecnológica”
revestido do arcabouço ideológico burguês interessado em obscurecer a realidade.
Deste problema, discute-se como as definições equivocadas de técnica e tecnologia
influenciam o currículo da Educação Profissional (EP) que hoje recebe orientação
oficial de voltar-se à integração com o Ensino Médio (EM), acompanhada de um
apelo ideológico-econômico para a profissionalização do ensino.
Para dar conta desses objetivos, a comunicação priorizou um estudo de caráter
teórico, bibliográfico e documental. Partiu-se do contexto histórico que impõe
fortes transformações na base do capitalismo, ocorridas, principalmente, a partir da
década de 1970 que demanda, por seu turno, uma comemorada revolução técnico-
científica. A investigação se valeu do arcabouço teórico-metodológico proposto por
autores notadamente marxistas, optando pelo diálogo, em primeiro plano, com as
interpretações de Vieira Pinto (2008), Braverman (1980), entre outros autores.
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A educação no contexto da chamada era tecnológica:
pontuando o debate
O primado da técnica não deve ser endeusado nem repudiado, mas analisado
criticamente sobre bases filosóficas consistentes, de modo a situar seu papel no
desenvolvimento histórico da humanidade. O filósofo Álvaro Vieira Pinto (2008)
enfatiza que a filosofia da técnica precisa estar baseada no entendimento da
relação homem e natureza, contextualizada no modo de produção da sociedade,
fundamentada na perspectiva do materialismo dialético.
A partir da categorização da técnica e da tecnologia, prossegue Vieira Pinto, produziu-
se intencionalmente e/ou ingenuamente uma conexão de fatores que servem de base
de sustentação a um apanhado de concepções teóricas ludibriantes que encobrem
o cenário de profunda barbárie social. Tais misticismos conceituais pretendem, ao
fim e ao cabo, encobrir as precípuas consequências da crise capitalista, além de
comporem e difundirem o arcabouço ideológico responsável por inserir o cotidiano
do trabalhador nesse emaranhado apologético de deturpação dessas duas categorias.
Braverman (1980) considera que gerenciar o processo produtivo proporciona
estrutura formal, mas tal processo jamais estaria completo sem seu conteúdo, que é
uma questão de técnica. Assinala que a técnica parte da especialidade, do ofício, para
depois assumir um caráter cada vez mais científico à medida que “o conhecimento
das leis naturais aumenta e destitui o conhecimento fragmentado e as tradições fixas
do ofício” (Braverman, 1980, p. 137).
Voltando a Vieira Pinto (2008), esclarecemos que o temor de submeter o homem
à técnica constitui verdadeiro engano, visto que ambos estão determinados por
uma relação recíproca. Conquanto, o receio de sujeitar a vida humana à técnica não
se determina nela em si, mas no regime social estabelecido, que revela uma visão
simplista e reduzida desta categoria. No entendimento de Sousa Júnior, é fundamental
compreender inicialmente que
[...] não parece razoável supervalorizar o potencial emancipador da tecnologia da indústria
moderna pelo simples fato de que representa nível de qualificação superior às formas
de trabalho pré-modernas. Esse entendimento mesmo, via de regra, tende a apagar a
contradição própria de todo avanço tecnológico e científico no mundo das mercadorias
que é justamente a dimensão imanente da desqualificação e da degradação do trabalho.
(Sousa Júnior, 2010, p. 93)
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Se, em termos filosóficos, como entende Viera Pinto (2008, 175-8), “[...] o ato [técnica]
realiza, enquanto mediação, o fim intencional do agente, é a mediação na obtenção
de uma finalidade humana consciente”, a técnica só pode ser avaliada e classificada
em boa ou ruim quando correlacionada às suas finalidades. Para o autor, só é possível
estudar a técnica se posicioná-la em seu logos: a tecnologia. Portanto, o emprego
que se faz da tecnologia é onde se deve “procurar o cerne da questão, sobretudo, na
aplicação das possibilidades que o maquinário coloca a serviço do capital: garantir
o acúmulo do lucro para uma privilegiada parcela da população mundial” (Santos,
2013, p. 70).
Constitui-se grande equívoco justificar o problema da pobreza no desnivelamento
da tecnologia entre países, pois o conjunto de mazelas sociais experimentadas pela
humanidade é justificado, em essência, pela estrutura que a rege. O princípio da
desigualdade caminha lado a lado com os pressupostos do modelo opressor do capital,
não da tecnologia, elemento fundamental para a emancipação humana.
Com base nos estudos de Rüdiger (2005) sobre o legado de Vieira Pinto, pode-se ler
que, de um lado, os tecnocratas futuristas celebram a técnica e a tecnologia com o
intuito de impedir sua apropriação autônoma ou obstaculizar seu desenvolvimento por
parte dos países de capitalismo periférico. De outro lado, os humanistas retrógrados
reprovam essas duas categorias pelas mesmas razões, embora de modo inverso,
pois elogiam os estágios mais atrasados de vida social, o que certifica o caráter
apocalíptico do desenvolvimento tecnológico. A tecnologia, no cenário da chamada
“era tecnológica”, sofre dois ataques frontais: por um lado é percebida como demoníaca
e, por outro, como salvadora de todos os males da humanidade, principalmente para
os países que orbitam na periferia do capitalismo. Ambas as posições se equivocam
exatamente por não levarem em conta a relação produtiva que o ser social mantém
com a natureza e com a sociedade. Como delineia Romero:
No capitalismo, a técnica não é apenas um instrumento do processo de trabalho,
como ocorria nas formações sociais pré-capitalistas, mas um instrumento do processo
de valorização, implicando e determinando uma relação específica de domínio e de
exploração do trabalhador. (Romero, 2005, p. 124)
Mas por que então tanta fantasia nas análises da técnica e da tecnologia? Com base
nas investigações de Vieira Pinto (2008), ousamos indicar que o caráter mistificador
implantado em torno dessas duas categorias é de grande valia para justificar as
políticas educacionais que elegem o ensino profissionalizante como principal
alternativa aos filhos dos trabalhadores. Desconstruir a idolatria vinculada à suposta
“era tecnológica” permite desmontar o arcabouço ideológico que a reveste, de modo
a denunciar as refinadas táticas de controle daqueles que o filósofo brasileiro nomeou
de “grandes conglomerados capitalistas”.
Quartiero, Lunardi e Bianchetti (2010, p. 286) examinam como esses dois conceitos
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Revolução técnico-científica e profissionalização do Ensino
Médio: aspectos críticos e relação com o contexto atual
O que esse autor aponta é que uma leitura mais atenta dos documentos oficiais – aqui,
em especial, o Conselho Nacional de Educação (CNE) de 2002 – põe à vista que, para
o MEC, conforme se indicou acima nas reflexões de Quartiero, Lunardi e Bianchetti
(2010), o desenvolvimento da ciência e da tecnologia protagoniza transformações
autônomas e, ao passo que supõe haver neutralidade nessa esfera, despreza as
experiências sociais ou, em relação à produção, para além das vontades e conflitos
humanos, novos problemas e desafios. Destarte, os cursos aligeirados, rasteiros e
conciliados à lógica mercadológica sequer mereciam levar o estandarte dos chamados
cursos técnicos, tamanha é a deturpação de tal categoria – já na nomenclatura.
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O debate da educação profissional – travado por integrantes de várias linhas
de pensamento – sempre foi um ponto tenso de incongruência na educação,
representando, em última análise, as determinações da postura do Estado quanto
ao reforço do dualismo educacional, num caminho marcado por inúmeras tensões
e polarizações. Por meio da discussão da proposta direcionada aos jovens de
continuidade dos estudos e, ao mesmo tempo, de preparação para o chamado
mundo do trabalho, o ensino médio carrega essa oscilação histórica entre ser
profissionalizante, para uma classe, e preparatório para o ensino superior, para outra.
O EM público, sobretudo o noturno, ao longo da história, esteve voltado ao
mercado de trabalho capitalista. Este ideário, segundo aborda Ramos (2010), vigorou
plenamente durante o projeto nacional-desenvolvimentista, com a possibilidade ampla
de emprego, cuja finalidade mister da educação passou a ser a preparação para o
mercado de trabalho, tanto no ensino médio como no ensino superior. Tal projeto
exibiu sua fragilidade a partir da “crise dos empregos e mediante um novo padrão de
sociabilidade capitalista, caracterizado pela desregulamentação da economia e pela
flexibilização das relações e dos direitos sociais” (Ramos, 2010, p. 47).
Num cenário de instabilidade empregatícia, canalizar a tônica da educação à
preparação para o mercado de trabalho capitalista não fazia muito sentido, o que
justificou a mudança do discurso oficial, a partir da LDB nº 9.394/96, para a orientação
do desenvolvimento de competências “genéricas e flexíveis, de modo que as pessoas
pudessem se adaptar facilmente às incertezas do mundo contemporâneo” (Ramos,
2010, p. 47).
Ao se articular esse contexto com a problemática do Ensino Médio Integrado (EMI),
que se espalha atualmente por todo o Brasil – impulsionado especialmente devido
aos Decretos nº 5.154/04 e nº 6.302/07 – ressaltamos que a função propedêutica da
educação profissional não se efetivou ao longo dos anos e, na contramão, instaurou-
se uma espécie de apartheid educacional entre os filhos das classes intermediárias
e dominantes e os filhos dos trabalhadores, afastando ambas as classes – mas de
forma muito mais severa a menos favorecida – de uma formação ampla, baseada
na consciência político-social e na compreensão da estrutura do sistema produtivo.
Em 2004, foi aprovado o Decreto no. 5.154. Esse instrumento legal, apesar de manter
as ofertas dos chamados cursos técnicos nas formas concomitantes e subsequentes
trazidas pelo Decreto nº 2.208/97, retoma a possibilidade de integrar o nível médio
à modalidade profissionalizante. No entanto, vale a pena conferir a seguinte crítica:
[...] O Decreto n° 5.145/04 não revoga o também Decreto n° 2.208/97. Após este
dispositivo legal, fica aberta, decerto, a possibilidade da integração, no entanto o
aligeiramento, a fragmentação, entre outras questões severamente criticadas no primeiro
Decreto, permanecem no dispositivo que o sucede. Ademais, a nova legislação não
impediu a desintegração. O que temos na atualidade é uma espécie de pode tudo:
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A respeito da centralidade empresarial de tal proposta, Freitas (2011, p. 4) relembra
que a aprendizagem nesse enredo encontra-se mensurada por testes padronizados,
que reforçam os processos de gerenciamento da força de trabalho na escola, como
bônus, punições, perda de recursos e controle dos processos escolares, ancorados
“nas mesmas concepções oriundas da psicologia behaviorista, da econometria,
das ciências da informação e de sistemas, elevadas à condição de pilares da
educação contemporânea”. Essa cultura de auditoria está associada a uma gama
de nomenclaturas oriundas das grandes corporações, conforme exemplifica Freitas
(2011, p. 4): “qualidade assegurada”, “transparência”, “mérito”, “melhores práticas”,
entre outras.
A despeito de um conceito mais abrangente de educação, os reformadores
educacionais reduzem o entendimento de boa escola àquela em que os alunos
atingem boas notas em português e matemática, rebaixando as outras disciplinas
e ciências a um nível secundário enquanto elevam as habilidades cognitivas – um
dos muitos aspectos humanos – ao ápice do desenvolvimento. Ainda mais grave,
segundo o alerta de Freitas (2011, p. 5), é a admissão de boas notas ao conceito
de boa educação. Boa parte dos países desenvolvidos tem dedicado esforços para
competir qual é o melhor em português, matemática e ciências – comandada pela
Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento – The Organisation
for Economic Co-operation and Development (OCDE), e submetem este critério aos
menos desenvolvidos.
Freitas (2011) advoga não ser democrático colocar a educação unicamente a serviço
dos empresários, já que há mais agentes na sociedade. Nosso autor evoca o amplo
debate em torno do projeto educativo destinado à juventude, lembrando que este
não pode estar circunscrito à limitada objetividade dos testes:
A educação brasileira sofre e sofrerá nos próximos anos o assédio dos reformadores
empresariais. Para eles, a educação é um subsistema do aparato produtivo e nisso
se resume. Para os educadores profissionais, porém, formar para o trabalho é apenas
parte das tarefas educacionais. E aí está uma divergência central. Para os reformadores
empresariais, os objetivos da educação se resumem em uma “matriz de referência” para
se elaborar um teste que mede habilidades ou competências básicas. Um país que não
sabe o que pretende com sua juventude e que tudo que pode oferecer a ela como projeto
de vida é passar no ENEM, não pode ir muito longe. (Freitas, 2011, p. 6)
Registramos, com Santos, Jimenez e Mendes Segundo (2011) que o contexto acima
descrito vem, ao longo do tempo, mantendo sua vinculação ideológica com o projeto
da classe dominante. Tomando as palavras de Vieira Pinto (2008, p. 41), arriscamos
dizer “com valor de lei sociológica, que os serviçais em todos os tempos pensam
analogamente”. Aqui, é interessante refletir com Braverman (1980) que a educação
se deteriora enquanto sua duração aumenta. Esse cenário favorece a possibilidade
de que os empregadores utilizem o diploma como uma peneira para escolher os
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Na medida em que acenam para o trabalhador com o aumento de uma suposta
empregabilidade, as políticas governistas, independentemente de sua origem partidária
e mesmo das diferenças entre si, coadunam-se com os interesses neoliberais que, por
sua vez, resguardam as prerrogativas empresariais. Isso se evidencia nos artifícios
utilizados para camuflar o desejo empresarial de atar a educação às demandas do
capital.
O ajuste de um currículo ao gosto do mercado traz na ponta da língua um refinado
rol de expressões indicando que o ‘novo’ empregado, tendo o verniz de adaptar a
uma fantasiosa “era tecnológica”, terá know-how para enfrentar o corrente quadro
de crise-oportunidade gerado dentro do capitalismo. Especificamente no caso da
provinciana elite brasileira, pretende-se “impor uma visão ideológica do ideal de novo
empregado-cidadão em que o trabalhador é obrigado a se transmutar para sobreviver
– via de regra, de forma precária – no contexto da crise hodierna” (Santos; Jimenez;
Mendes Segundo, 2011, p. 33).
Considerações finais
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além de estruturarem o arcabouço ideológico responsável por subsumir o cotidiano
do trabalhador frente ao emaranhado ideológico que exulta e justifica a deturpação
dessas duas categorias.
Desta forma, a tecnologia deveria ser considerada patrimônio da humanidade. Tal
categoria sozinha não guarda o cerne da transformação da sociedade, embora seja uma
das condições para a evolução humana, para a emancipação plena da humanidade.
Logo, as máquinas construídas pelo trabalho humano não têm o poder de promover a
atual precarização social agudizada pela era do capital. As máquinas não guardam uma
carga moral. Não são boas ou más por si sós. A natureza do problema encontra-se no
emprego que se faz da tecnologia e, principalmente, na aplicação das possibilidades
que o maquinário coloca a serviço do capital: garantir o acúmulo do lucro para uma
privilegiada parcela da população mundial.
Observa-se uma ampla utilização das categorias técnica e tecnologia nos documentos
oficiais, sobretudo aqueles voltados à EP e ao EM, que, por seu turno, definem e
estabelecem as políticas curriculares para o sistema educacional brasileiro. O discurso
das políticas públicas estatais entende o desenvolvimento dessas duas categorias de
maneira autônoma. Esse equívoco, como demostrado na exposição, é operado pelo
fato de que os elaboradores de tais documentos acabam por desprezar as experiências
sociais e, sobretudo, relegam a segundo plano a centralidade do trabalho para o
desenvolvimento da vida humana, o que os leva a supor a existência de neutralidade
na técnica e na tecnologia em relação às contradições sociais.
Para essa ‘ o caráter mistificador implantado em torno desses conceitos torna-se,
desse modo, uma peça fundamental para justificar as políticas educacionais que
estimam a EP como a principal alternativa aos filhos dos trabalhadores. O caminho
percorrido procurou desconstruir a idolatria vinculada à suposta “era tecnológica”, bem
como o arcabouço ideológico que a reveste, evidenciando, outrossim, as refinadas
táticas de controle dos grandes conglomerados capitalistas.
A mistificação da técnica e, em especial, da tecnologia, bastante difundida
na consciência das pessoas, permeia o debate na sociedade a respeito da
profissionalização da educação como proposta viável para o emblemático contexto
educacional brasileiro. Discursos empresariais, governamentais e até de determinados
intelectuais prometem a chamada empregabilidade a partir da formação técnica.
Entretanto, não é dito que dedicar determinada condição de escolaridade profissional
não é garantia de condições de disputar um emprego, minimamente estável, num
mercado de trabalho cada vez mais volátil em vista dos avanços tecnológicos e
condições econômico-estruturais da atualidade.
Essas palavras finais não esgotam a discussão, mas, em larga medida, procuram
desmistificar o discurso operado pelas classes dirigentes, bem como desvelar os
intentos dos reformadores empresariais e o discurso da profissionalização, sinalizando
que o destino reservado aos jovens trabalhadores-estudantes não é outro, senão o
Referências
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 9-27, fev. 2017 a mai. 2017. 25
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2003.
José Deribaldo Gomes dos Santos é Doutor em Educação Brasileira pela Universidade
Federal do Ceará (UFC). Concluiu, em 2015, estágio pós-doutoral em Estética na
Universidad Complutense de Madrid (UCM). É Professor Adjunto da Faculdade de
Educação, Ciências e Letras do Sertão Central (FECLESC-UECE), atuando no Programa
de Pós-Graduação em Educação (PPGE/UECE) e no Mestrado Acadêmico Intercampi
em Educação e Ensino (MAIE/UECE). É pesquisador do Instituto de Estudos e Pesquisas
do Movimento Operário (IMO-UECE) e do Laboratório de Pesquisas sobre Políticas
Sociais do Sertão Central (Lapps-UECE). Desenvolve pesquisas nas áreas de Trabalho e
Educação e Estética Marxista. Atua, principalmente, no exame da Educação Profissional
e na Formação de Professores. Lidera o Grupo de Pesquisa Trabalho, Educação, Estética
e Sociedade (GPTREES). Email:deribaldo.santos@uece.br
Ellen Cristine dos Santos Ribeiro é Mestra em Educação pelo Programa de Pós-
Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Estadual do Ceará (UECE).
Especialista em Coordenação Pedagógica e Gestão Escolar (FA7). Pedagoga (UFC).
Professora efetiva da Prefeitura Municipal de Fortaleza. Pesquisadora-colaboradora
do Instituto de Estudos e Pesquisas do Movimento Operário (IMO) da Universidade
Estadual do Ceará. Membro do grupo de pesquisa Trabalho, educação, estética e
sociedade (GPTREES). Email:ellencristineribeiro@hotmail.com
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 9-27, fev. 2017 a mai. 2017. 27
Professor tutor: papéis, funções e desafios
Dirceu da Silva
Universidade Estadual de Campinas
Resumo
O texto apresenta os resultados de uma investigação sobre o papel e a prática de
professores tutores de diferentes regiões do país que trabalham com a formação
de professores a distância. Um questionário foi aplicado a 386 professores
tutores para avaliar os diferentes papéis que ocupam e a intensidade com que
se percebem neles, bem como as funções desenvolvidas por esses sujeitos. Os
dados foram submetidos a análises descritivas e cruzamentos. Os resultados
evidenciam que o tutor carece de identidade profissional e que, apesar da
variedade de papéis ocupados simultaneamente, exerce com maior intensidade
o papel de motivador. Suas funções revelam transitoriedade entre uma prática
pedagógica e uma prática administrativa.
Abstract
This paper shows the results of an investigation about the role and practice of
tutoring teachers from different regions of Brazil that work with distance teachers
training. A questionnaire was administered to 386 tutors to assess the different
roles they play and the intensity with which they notice them as well as the functions
developed by these subjects. The data were subjected to descriptive analysis and
intersections. The results show that the tutor needs professional identity and, despite
the variety of roles simultaneously played by tutors, the one they play more intensely
is the motivating one. Their functions show transience from pedagogical practices
concerning collaboration in the teaching and learning process and administrative
practices of support.
Resumen
El artículo presenta los resultados de una investigación sobre el papel y la práctica
de tutores de diferentes regiones de Brasil que trabajan con la formación del
profesorado en la educación a distancia. Se aplicó un cuestionario a 386 profesores
tutores con el objetivo de evaluar los diferentes roles que ocupan y la intensidad
con la que se perciben en ellos, además de buscar observar las funciones realizadas
por estos profesionales. Se realizó el cruce de todos los datos que fueron sometidos
a análisis descriptivos. Los resultados muestran que el profesor tutor carece de
identidad profesional y que, a pesar de la variedad de papeles que ocupan a la vez,
lo que ejecuta con mayor intensidad es el papel de motivador. Sus funciones revelan
una transitoriedad entre una práctica pedagógica, de colaboración con el proceso
de enseñanza y aprendizaje, y una práctica administrativa, de apoyo.
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Enseignant tuteur: rôles, fonctions et défis
Résumé
Cet article montre les résultats d'une enquête sur le rôle et la fonction des enseignants
tuteurs dans différentes régions du Brésil qui travaillent pourla formation des
enseignants a distance . Un questionnaire a été administré à 386 tuteurs pour
évaluer les différents rôles qu'ils jouent et l'intensité avec laquelle ils les notent
ainsi que les fonctions développées par leur sujets. Les données ont été soumises
à une analyse descriptive et comparative. Les résultats montrent que le tuteur a
besoin d’un titre & cadre professionnel et, malgré les differents rôles qu’ils jouent
déja , car celui du tutorat est plus motivant. Leurs fonctions montrent une grande
différence avec les pratiques pédagogiques usitées concernant l'enseignement et
d'apprentissage de soutien.
Introdução
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Sobre a complexidade do papel e função do professor tutor:
em busca de identidade
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corre-se o risco do professor tutor perder flexibilidade e autonomia para realizar
intervenções qualitativas, o que significaria um retrocesso epistemológico na forma
de conduzir um processo formativo a distância.
Muitos são os autores que discutem o papel do tutor, assim como a melhor
nomenclatura. Lapa e Pretto (2010) argumentam que o tutor é um professor na medida
em que desempenha esse papel no ambiente virtual. Moore e Kearsley (2008) afirmam
que se trata de um instrutor que está ligado a funções de ensino, acompanhamento e
apoio ao aluno. Palloff e Pratt (2002) apontam que o seu papel é o de um facilitador.
Alonso e Alegretti (2003) sinalizam que se trata de um professor que assume a posição
de formador, orientador e provocador para potencializar a aprendizagem dos alunos.
Emerenciano et al. (2001) também evidenciam que trabalhar como tutor significa ser
professor e educador. Por sua vez, Silva et al. (2009) defendem que o papel do tutor
é mais importante do que o papel de facilitador ou de transmissor, pois seu trabalho
se dá em um contexto dinâmico e complexo, que exige criatividade.
Almeida (2003) e Maggio (2001) aproximam-se em suas definições. A primeira
denomina o tutor como docente formador, que tem ao mesmo tempo os papéis de
mediador, moderador, observador e articulador, cuja principal função é orientar a
aprendizagem do aluno. Na mesma direção, a segunda autora afirma ser professor
tutor a melhor nomenclatura, devido à função de docente que exerce esse sujeito
em ambiente virtual, uma vez que o que se espera é que ele acompanhe o processo
de aprendizagem e oriente os alunos. Acreditamos ser esta a melhor nomenclatura,
pois esse profissional assume uma tarefa educativa e pode colaborar decisivamente
para a formação professores. Esta posição também é defendida por Belloni (2009),
para quem o tutor possui, inegavelmente, uma função pedagógica na medida em que
tem que dar conta da difícil tarefa de levar o aluno a aprender. Ainda que não seja
dele a responsabilidade de produzir materiais didáticos, é do professor tutor que se
espera, na maioria das vezes, a realização da tarefa de mediação.
É recorrente na literatura e em documentos oficias que uma das principais funções do
tutor é realizar a mediação. Pimenta e Anastasiou (2010) discutem a mediação reflexiva
e defendem que se trata de uma tarefa complexa, de um trabalho de investigação que
consiste em levar o aluno à atividade ativa de construir conhecimentos significativos.
Neste mesmo sentido, Mauri e Onrubia (2010) esclarecem que a atividade tutorial é
concebida como mediação da atividade do aluno. Masetto (2009) aponta importantes
características da mediação pedagógica, dentre elas: o diálogo permanente; a troca
de experiências; a cooperação para que o aluno domine as novas tecnologias em
suas aprendizagens; a proposição de situações-problema, perguntas orientadoras
e desafios. O autor descreve a mediação como o comportamento do professor de
incentivador e motivador da aprendizagem, com a disposição de ser ponte entre
o aluno e o conhecimento (Masetto, 2009). Importante ressaltar que a mediação
pedagógica não se dá somente entre professor e aluno. Trata-se também de criar
Em que pese a discussão sobre o seu papel, é consenso na literatura que a atuação
do professor tutor é relevante para o sucesso da formação de professores e para a
baixa taxa de evasão. Encontramos esta argumentação em Gatii (2003), Preti (2003),
Palloff e Pratt (2004), Berrocoso e Garrido Arroyo (2005), Chaney et al. (2007), Moore
e Kearsley (2008), Prado e Almeida (2003) e Garcia e Silva (2013). É o professor
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tutor que, na maioria das vezes, dialoga com os alunos, orienta leituras e auxilia na
superação de dúvidas. Ele é a figura-chave no processo motivacional e afetivo (Gatti,
2003).
Para Moulin et al. (2004), o tutor deve orientar a elaboração do plano de estudos,
acompanhar a aprendizagem, e, à luz dos resultados da avaliação, intervir. Para
as autoras, a função do tutor está dividida em três vertentes: (1) Função de
Aconselhamento: preocupação com a motivação e incentivo constante ao aluno
durante todo o curso; formação de valores, hábitos e atitudes, em especial, voltadas
à autoafirmação e à valorização do bem estar da humanidade. (2) Função de Orientação
da Aprendizagem - voltada para a formação do saber (conhecimentos) e do “saber-
fazer” (habilidades e capacidades específicas). Inclui indicar fontes de informação e
propor atividades criativas e desafiadoras. (3) Função de Avaliação - relevante para o
sucesso da aprendizagem, pois pode interferir positiva ou negativamente na formação
do aluno. Para Gaytan e McEwen (2007), os professores tutores precisam avaliar as
tarefas dos alunos não como uma prestação de contas, mas como uma forma de
contribuir para a sua aprendizagem.
Para Silva et al. (2009), o professor tutor deve conhecer o projeto político pedagógico
do curso e o conteúdo das disciplinas. Argumentam que o trabalho deste profissional
envolve quatro dimensões: conhecimento, aprendizagem, motivação/presença e
disponibilidade. Estimular as relações humanas, construir um ambiente favorável
para a aprendizagem, orientar o aluno e oferecer feedback são tarefas importantes do
professor tutor. A motivação e o feedback exigem ser analisados com maior cuidado.
Gaytan e McEwen (2007) apontam que o feedback é fundamental e deve ser
apropriado e significativo. Para os autores, o professor tutor precisa interagir com
os alunos e utilizar diferentes estratégias e ferramentas, fornecendo um feedback
detalhado e imediato. Na mesma direção, Chaney et al. (2007) sinalizam que um dos
indicadores de qualidade da EaD é o rápido feedback fornecido pelo tutor. Palloff
e Pratt (2004) consideram que o feedback deve conter uma mensagem substancial,
clara, precisa, que responda às questões levantadas pelos alunos, que apresente
reflexões e que contribua para o aprofundamento do tema. Para Maggio (2001), o
feedback significa fazer intervenções coerentes e aproveitar as oportunidades para
aprofundar o debate, evitando uma construção errônea por parte do aluno. Moore
e Kearsley (2008) também apontam a relevância dos alunos receberem feedback
sobre as tarefas com informações a respeito dos seus progressos, pontes fortes e
fracos e ressaltam a importância da percepção que deve possuir o professor tutor
em relação ao envio de feedback individual ou para toda a turma. No entanto, Palloff
e Pratt (2004) pondera que intervir em demasia nos fóruns pode ser prejudicial ao
bom andamento das discussões e que é preciso saber equilibrar a quantidade e a
frequência de feedbacks.
A motivação está intrinsecamente relacionada com o feedback. Os alunos, ao
receberem mensagens do professor tutor, sentem sua presença e afastam o
sentimento de abandono e o desejo de desistir do curso. Por esta razão, Palloff
Muitas são as tarefas postas ao professor tutor. O Quadro 2, criado a partir da revisão
da literatura da área, reúne as diferentes categorias que envolve o seu trabalho.
2 Lévy (2005, p. 27) define comunidade virtual como “um grupo de pessoas se correspondendo mutuamente por
meio de computadores interconectados”.
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O que consideramos essencial ao se pensar a tarefa do professor tutor é a sua
íntima relação com a aprendizagem do aluno. Para tanto, é preciso compreender o
contradiscurso técnico, que insere o trabalho deste profissional não apenas no âmbito
tecnológico, mas, decididamente, no campo educacional (Leal, 2004). A mudança de
modalidade e, portanto, de ambiente, não altera a finalidade do ato educativo que é
gerar aprendizagens. Deste modo, é evidente que profissionais voltados à formação de
professores na EaD precisam ter conhecimentos sólidos sobre o trabalho de mediação
pedagógica, o processo de construção de conhecimento em ambiente virtual, sobre as
TIC, bem como as dimensões que envolvem a relação pedagógica, tanto do ponto de
vista dos alunos quanto do professor e do trabalho pedagógico. Este último aspecto
implica, de acordo com Cordeiro (2011), atentar para cinco dimensões dessa relação
que podem interferir na aprendizagem dos alunos: cognitiva, espacial, temporal,
linguística e pessoal. Certamente, a relação pedagógica ocupa espaço importante
no processo de formação de professores e precisa ser examinada por aqueles que
se dedicam a exercer a docência, seja ela em ambiente presencial ou virtual.
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Tabela 3 – Nível de escolaridade
Nível Valor absoluto
*graduação 23
especialização 196
mestrado 141
doutorado 26
Total 386
Fonte: Dados da pesquisa. Elaboração dos autores.
Esta parte discute os dados referentes aos papéis ocupados por professores
tutores no processo formativo de professores a distância. Aos respondentes, foi
oferecido um quadro (figura 1) que apresentava diferentes papéis com uma breve
descrição sobre cada um deles e solicitado que manifestassem a intensidade com
que se viam neles.
A análise das respostas dos sujeitos revelou que a maioria se percebe, principalmente,
no papel de motivador, pois 62,17% afirmaram que sempre se vê neste papel, cuidando
da motivação dos estudantes ao longo de todo o curso e da humanização do ambiente
virtual. Em segundo lugar, surge como mais frequente o papel de facilitador, uma
vez que 55,95% apontaram que sempre desenvolvem funções relacionadas com
orientações precisas, com o auxílio, acompanhamento do aluno e direcionamentos
para ajudá-lo a se localizar no ambiente e a resolver tarefas.
O papel de professor surge apenas em terceiro lugar. Do total de participantes (386),
38,86% afirmaram sempre se perceber neste papel, o qual está relacionado com a
prática docente, com criação de atividades desafiadoras e materiais didáticos, com
a problematização de conteúdos e com a avaliação do processo de aprendizagem.
Em quarto lugar, aparece o papel de administrador, em que 28,23% relataram sempre
ocupar este papel, cuidando de questões administrativas, da produção de relatórios,
de recebimento de tarefas, da frequência dos alunos e do gerenciamento do ambiente
virtual.
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Em quinto lugar, está o papel em que menos os sujeitos se percebem: suporte técnico.
Apenas 15,80% afirmam sempre ocupar este papel, colaborando com o uso de
ferramentas tecnológicas e com a busca de soluções para problemas técnicos.
Essa variedade de papéis ocupados pelos sujeitos corrobora o que aponta Belloni
(2009), quando afirma que uma das questões centrais e, talvez, a mais polêmica na
EaD seja o papel assumido pelo professor na EaD. Os professores tutores participantes
desta pesquisa, de fato ocupam, ao mesmo tempo, diferentes papéis. Mas, ser o
motivador o papel que eles se vêem com maior intensidade indica que a grande
preocupação desses sujeitos está em estimular as relações humanas e o bom estado
de ânimo dos alunos ao longo do curso. Isto pode ocorrer pela pressão das instituições
para conseguir manter um grande número de alunos e também pela compreensão dos
próprios sujeitos de que é necessário criar um ambiente agradável e acolhedor para
que os alunos sintam-se entusiasmados em aprender. Sabemos que na modalidade
a distância o número de desistentes é grande (INEP, 2016) e motivar o aluno ao
longo de todo o curso é altamente necessário para a permanência, engajamento e
desenvolvimento do estudante.
O cruzamento entre escolaridade e papel nos permitiu perceber que os sujeitos que
se percebem com maior intensidade no papel de motivador são aqueles que possuem,
como grau máximo, a graduação e a especialização. No entanto, é interessante
observar que os sujeitos que possuem doutorado também evidenciaram o papel
de motivador como o mais frequente e, em seguida, o de professor ao lado do de
facilitador. Somente os que possuem como grau máximo o mestrado escolheram o
papel de facilitador em primeiro lugar ficando, com pouca diferença estatística, o de
motivador em segundo. Estas constatações evidenciam que, de maneira geral, para os
professores tutores participantes desta pesquisa, o papel de motivador surge como
mais forte que o de professor no desenvolvimento de suas práticas.
Para Gatti (2003), o tutor possui a importante tarefa de motivar os alunos e de
colaborar na construção de laços de afetividade. Um ambiente acolhedor e uma equipe
atenciosa e disponível, certamente, colaboram para o entusiasmo dos alunos. Contudo,
não podemos nos esquecer de que o rápido e significativo feedback é essencial para
manter o aluno no curso e colaborar qualitativamente com sua formação. Quando
suas dúvidas e anseios não são satisfatoriamente esclarecidos e quando a resposta
é morosa, cresce largamente a possibilidade de desânimo e/ou abandono do curso.
Decorremos disso que o papel de motivação sozinho não consegue dar conta da difícil
tarefa de motivar o aluno e de mantê-lo comprometido com o curso e com a sua
aprendizagem. É preciso que o imprescindível papel de professor, que esta pesquisa
revela aparecer apenas em terceiro lugar, esteja fortemente presente, como condição
para garantir a aprendizagem significativa dos alunos, sua motivação e envolvimento
com o curso. Para tanto, as instituições possuem papel fundamental na organização
do projeto do curso, na gestão e no processo de recrutamento e formação contínua
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ser muito difícil responder os e-mails aos alunos de forma rápida e estar sempre
disponível para se comunicar com eles, grande parte (83,93%) tem certeza que os
alunos sempre sentem sua presença no ambiente virtual. Estar disponível para os
alunos é relevante para o bom andamento de um curso online. Os alunos precisam
sentir que seu professor tutor está “por perto”, disponível para orientar, auxiliar nas
dúvidas e discutir conteúdos. Acreditamos que o fato de 87% da amostra informar
ter outro emprego, além do de professor tutor, colabora para a dificuldade desses
sujeitos em criar “a sensação da presença síncrona” (Kenski, 2008, p.67) no ambiente
virtual de aprendizagem.
A análise das respostas pertencentes à função de Avaliação confirmou o disposto na
literatura. Gaytan e McEwen (2007) ressaltam a grande importância da avaliação para
a garantia e sucesso da aprendizagem e sua complexidade de realização no campo
relativamente novo da EaD. Boa parte dos sujeitos participantes da pesquisa informou
que verifica constantemente o acesso dos alunos no ambiente virtual (89,11%) e que
sempre solicita aos estudantes avaliação sobre o andamento do curso e sugestões
para melhorá-lo (77,20%). Estes dados demonstram preocupação com a frequência
do aluno e também com o andamento do curso, de maneira geral. No entanto, aos
serem indagados sobre a avaliação das tarefas dos alunos, 31,34% afirmaram não
permitir que o aluno refaça uma atividade, oferecendo uma nova nota e 14,76%
foram indiferentes a essa questão.
Sobre essa constatação, dois aspectos devem ser considerados. O primeiro, diz
respeito à instituição que pode organizar o curso e a gestão de forma tradicional,
despreocupada com o tempo de aprendizagem do aluno e com uma concepção de
avaliação reduzida e centrada na classificação, o que dificulta ou mesmo impede
que o professor tutor desenvolva uma avaliação formativa, contínua, centrada no
aluno, com provocações e considerações que, devolvidas em forma de feedback,
permitiria aos alunos reelaborar seus conhecimentos e refletir sobre suas concepções,
crenças e práticas. O segundo aspecto se refere à própria concepção de avaliação
pelo professor tutor. Se ele acredita ser tratar de um ato de verificar o que está certo
e errado e atribuir uma nota final à tarefa do aluno, não terá a preocupação de realizar
intervenções significativas, de ajudar a superar dificuldades, contribuindo, desta
forma, para a manutenção de uma cultura avaliativa classificatória. Ainda, sua prática
poderá servir como (mau) modelo para as ações avaliativas dos futuros professores
(Gaytan; McEwen, 2007).
Contudo, ainda que existam concepções equivocadas, parte significativa dos
participantes evidencia compreender o sentido da avaliação formativa. Sabemos
que concepções e práticas possuem relação direta e, por esta razão, ressaltamos a
importância da formação continuada desses profissionais, como possibilidade para
ampliar e aprofundar seus saberes, com vistas a promover práticas emancipatórias
de avaliação, comprometidas com o sucesso da aprendizagem dos alunos.
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texto e criação de planilhas, além do ambiente virtual, para realizar seu trabalho.
Assim, podemos deduzir que algumas funções e usos de tecnologias podem variar
de instituição para instituição, demandando um número maior ou menor de tarefas
e conhecimentos.
Considerações finais
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Resumo
Tensões sobre currículo são constantemente reiteradas, não havendo um
deslocamento do passado que ressurge anacronicamente nas políticas. Os
sentidos são gerados através da circularidade dos contextos e da busca pela
hegemonia. A condição de abertura da significação é o que constitui o social e
nos permite pensar na hibridização de políticas curriculares recentes, as quais
têm mobilizado um status de autoridade inexorável com relação à padronização.
Nesse contexto, trouxemos à baila sentidos que têm se tornados hegemônicos
no cenário político, como a exigência de competências e habilidades a priori para
a formação de professores e de alunos.
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Necesitamos de una Base Nacional Común
Curricular?
Resumen
El estrés en los planes de currículo se repite constantemente, si no hay un cambio
en el pasado que resurge de manera anacrónica en las políticas. Los significados son
generados a través de la circularidad de los contextos y la búsqueda de la hegemonía.
La condición de apertura del significado es lo que constituye lo social y nos permite
pensar acerca de la hibridación de las políticas curriculares recientes, las cuales han
movilizado un estatus de autoridad inexorable con relación a la estandarización. En
este contexto, hemos traído a discusión significados que se han vuelto hegemónico
en la arena política, como la exigencia de habilidades y capacidades a priori para la
formación de profesores y estudiantes.
Abastract
Tensions about curriculum are constantly reiterated, with no displacement of the
past resurfacing anachronistically in politics. The meanings are generated through
the circularity of contexts and the search for hegemony. The condition of openness of
meaning is what constitutes the social and allows us to think of the hybridization of
recent curricular policies, which have mobilized a status of inexorable authority with
regard to standardization. In this context, we have brought to the table meanings
that have become hegemonic on the political scene, such as the requirement of a
priori competences and skills for the training of both teachers and students.
Resumé
Les tensions sur les programmes d'enseignement se répètent constamment, n'ayant
pas une rupture du passé qui resurgisse anachroniquement. Les sens sont générés
par conventions à travers la circularité des contextes et la recherche de l’hégémonie.
La condition d'ouverture du sens est ce qui constitue le social et nous permet de
penser à l'hybridation récente des politiques curriculaires lesquelles ont généré un
statut d'autorité incontestable en matière de standardisation. Nous avons abordé
des sens qui sont devenus hégémoniques l'arène politique, comme la demande
de compétences et de capacités a priori pour la formation des enseignants et des
étudiants.
Introdução
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ferramenta que vai ajudar a orientar a construção do currículo das mais de 190 mil escolas
de Educação Básica do país, espalhadas de Norte a Sul, públicas ou particulares. Com
a BNC, ficará claro para todo mundo quais são os elementos fundamentais que preci
sam ser ensinados nas Áreas de Conhecimento: na Matemática, nas Linguagens e nas
Ciências da Natureza e Humanas.
3 Ibidem.
Pesquisadores como Alves (2014), Lopes (2015), Macedo (2014, 2015), Marchelli
(2014), Süssekind (2014), dentre outros, salientam que não se trata de uma discussão
nova no país, mas tem sido impulsionada a partir da publicação do PNE (2014-
2024), o qual estabelece como Plano Nacional as metas e as estratégias para a
educação (Brasil, 2014). Nesse contexto, há uma ênfase na interpretação de que
a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um instrumento indispensável para a
qualidade e para o cumprimento do referido plano. Nessa discussão, Craveiro (2014a,
2014b) problematiza a referida e a reiterada tentativa de padronização curricular,
argumentando que alguns discursos hegemônicos têm sido defendidos desde os
anos 1990 e mantidos nas proposições da BNCC.
Tendo como referência estudos do currículo no Brasil (Lopes; Macedo, 2011),
salientamos que os sentidos produzidos nos contextos dos governos de Fernando
Henrique Cardoso, Luis Inácio Lula da Silva e da presidenta Dilma Rousseff convivem
com diferentes discursos que são reinterpretados ao mesmo tempo em que recriam
novas remobilizações culturais. No entanto, os aspectos relacionados à BNCC
recontextualizam esses três contextos, sendo necessariamente reiterados em um
novo contexto (Michel Temer) no qual a Base se encontra “sob nova direção” (Freitas,
2016), tendo como uma das principais mudanças, já anunciadas pela terceira versão,
um documento estruturado por competências5.
Em tal configuração, enfatizamos que determinados sentidos de formação docente e
de currículo que vinham sendo naturalizados, tendem a manter as projeções, porém
alicerçadas agora em uma perspectiva de competências a priori para adequação dos
4 Cf. http://movimentopelabase.org.br/
5 Cf. http://movimentopelabase.org.br/
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alunos, a qual possivelmente intensifica a “cultura da testagem” que ignora o campo
do currículo como produção acadêmica (Miller, 2014). Pesquisadores do campo
do currículo como Lopes (2015) e Macedo (2014) mencionam que nesse cenário
político determinados sentidos hegemônicos de formação de professores atravessam
a discussão em defesa de uma base curricular no Brasil, hoje, com um avanço mais
notado do conservadorismo nas políticas curriculares6.
No que se refere à produção de um documento curricular centralizador, levantamos
as seguintes questões: ele é necessário? Precisamos de uma BNCC? Trata-se de algo
indispensável para se atingir a qualidade educacional? Estamos realmente discutindo
uma demanda educacional indispensável? Com tais questões destacadas, organizamos
este texto: em um primeiro momento, destacando o quadro teórico que tem nos
permitido analisar as tensões e as questões elaboradas. A seguir, nos detemos em
alguns dos sentidos a respeito da Base. Posteriormente, excessiva ênfase no contexto
de influência, não se distanciando em alguns aspectos da abordagem estadocêntrica
que desejava superar. Desta forma, apesar de valorizar uma maior complexidade do
jogo político, Ball não supera a separação entre proposta e implementação, tendendo
a atribuir ênfases ao contexto de influência como “início” da política (Oliveira;
Lopes, 2011), o que acaba recaindo sobre o contexto da prática a possibilidade
de mudança (Craveiro, 2014b). Ora, isso contradiz a perspectiva de ciclo, já que o
mesmo não poderia apresentar nem início e nem fim. As autoras anteriormente citadas
também salientam a ausência de explicação nos ciclos de política de como ocorrem
predominâncias de interpretação nos documentos curriculares, deixando lacunas
no que tange ao processo em que as lutas se dão. Embasado por Michel Foucault,
Ball entende que os discursos são construídos continuamente, são incontroláveis e
não se limitam a materialidade do texto. Porém, o sociólogo mantém uma separação
questionável, hierarquizando termos e contextos; não compreendendo que não há
nada fora do jogo discursivo, algo relevante no trabalho de Ernesto Laclau. A Teoria
do Discurso pode então aprofundar a interpretação do ciclo de políticas, uma vez
que faltam em Ball categorias que possam dar conta dos processos articulatórios
que se inserem na definição das políticas em ciclos contínuos (Lopes; Macedo, 2011;
Oliveira; Lopes, 2011).
A Teoria do Discurso tem sido apropriada no campo do currículo como uma ferramenta
relevante de análise na medida em que permite novas formas de investigação frente
à complexidade dos contextos multiculturais, abrindo o enfoque para o entendimento
das articulações que garantem a constituição de um discurso (Laclau; Mouffe, 2015;
Laclau, 2013), como visto, aspecto este não explorado por Ball. Segundo Mendonça
e Rodrigues (2008), a teoria do discurso é inaugurada por Laclau e Mouffe na obra
Hegemony and socialist strategy: towards a radical democratic politics, publicada em
1985. Enfatizam os autores citados tratar-se de uma ferramenta de compreensão do
Conforme salienta Lopes (2015), não se trata de negar a materialidade, mas que tudo
é envolvido em uma dimensão do discurso, como dito não é apenas linguagem, mas
uma prática social. Nesse entendimento, o contexto não é um dado a priori, mas ele
mesmo produzido discursivamente. Assim, não há entendimento da realidade que
não demande uma passagem pelo discurso, pelo sentido, pela inserção de fatos
físicos, sejam eles humanos ou naturais, em sistemas de significação que situem e
hierarquizam esses fatos no mundo e participem da disputa pela significação (Burity,
2008; Giacaglia, 2006).
Portanto, com base nos autores que compõem o quadro teórico-metodológico, cultura
não é um “repertório de significados já dados por grupos distintos” (Lopes; Macedo,
2011), mas complexos “fluxos culturais” (Appadurai, 2004), ou seja, são práticas de
significação (Ribeiro, 2016), por meio das quais ocorre a hibridização, intensificadas
no contexto atual7, o que nos conduz ao currículo como espaço-tempo de fronteiras
(Macedo, 2006a, 2006b, 2009). Currículo é também uma política cultural, uma vez
que a política, com base nesta abordagem, é entendida como disputas entre discursos
em busca do poder de fixar um sentido. Assim, cultura e política estão imbricadas,
uma vez que a política ocorre neste entre-lugar ambivalente da negociação que é a
remobilização de sentidos (Bhabha, 1998). Trata-se sempre de uma negociação com
a alteridade de si, o que jamais estará dado (Derrida, 2011). Para o filósofo, não há
relação necessária entre significante e significado, este último é sempre postergado
para a relação circunstancial.
Nessa perspectiva de diálogo com leituras pós-estruturalistas, hegemonia foi
ressignificada por Laclau. Não se trata de um sentido no qual determinada ideologia
se torna comum a um coletivo (Laclau; Mouffe, 2015; Lopes; Macedo, 2011). Um
discurso particular se torna hegemônico no momento em que ocupa o lugar do
universal (Laclau; Mouffe, 2015; Laclau, 2013; Mendonça; Rodrigues, 2008). Para
que isso ocorra são necessárias “articulações”, entendidas “como uma prática que
estabelece um tipo de relações entre elementos que faz com que a identidade dos
mesmos se modifique como resultado da prática articulatória” (Giacaglia, 2006, p.
7 Estamos nos referindo a questões ligadas a intensificação dos fluxos culturais através de novos arranjos na
comunicação, gerados pelas novas tecnologias e por movimentos de imigração no processo atual da globalização.
Mais detalhes são discutidos por Appadurai (2004).
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106). Nesse sentido, frente ao discurso que se torna hegemônico, haverá outros
discursos que podem, a despeito das diferenças entre si, configurarem uma cadeia
de equivalências, unidos pelo antagonismo.
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2015) se fazem, portanto, pertinentes. O que é visto supostamente como “comum”
e/ ou “essencial” é sempre uma produção-exclusão no campo da discursividade.
Há sempre algo que ficará “de fora”, um exterior constitutivo (como as questões
relativas à valorização do magistério). Conforme Lopes (op. cit.): “a produção de
centros e contextos da política (de currículo) depende de atos de poder, constitui –
e é constituída por – certos discursos (pedagógicos)” (p. 447). Em suma, definir um
“comum nacional” é uma forma de regulação e de controle da diferença.
Identificamos no atual governo um cenário de reformas autoritárias e de investimentos
midiáticos que têm buscado ocultar o binarismo nas políticas (formação para pobres
e para ricos). O que se busca é convencer de que a reforma que estão fazendo é
necessária e de que se está favorecendo a liberdade de escolha. Destacamos ainda
investidas de setores conservadores reacionários na política curricular (Paraíso,
2016), tais como o movimento Escola sem Partido (ESP), os quais vêm produzindo
inúmeras medidas para regulação da liberdade de ensino, articulando o silenciamento
do debate de gênero por meio da ideia de que se estaria promovendo ideologias.
Nesse contexto, o argumento que procuramos defender em bases epistemológicas
de matriz pós-estrutural, de que a BNCC é uma investida desnecessária e temerosa,
se renova politicamente, apontando os riscos de uma centralização nacional e o
quanto o discurso “de que padronizar é democratizar o ensino” pode ser favorável
a determinados grupos.
Portanto, questionamos a respeito da necessidade da base, isto é, não apenas de um
ou outro aspecto do referido documento que poderia, ou não, ser melhorado. Nossa
questão antecede a esta, a saber: por que motivo investir recursos financeiros tão
volumosos para produção de mais uma proposta curricular? Qual é a necessidade
de uma base? Garantia de qualidade para educação? Como?
Segundo Alves (2014), na opinião da maioria dos que estudam currículo no Brasil
é de que não precisamos de base curricular nacional. Ela realça e retoma alguns
dos motivos já informados anteriormente: trata-se de uma importação de modelos
que desconsidera os contextos e singularidades; tem como enfoque um referencial
questionável de escola igual para todos; não atende aos questionamentos dos
antagonismos que vem sendo gerados ao longo do tempo em termos de políticas
setoriais, tais como as referentes à educação infantil, educação quilombola, educação
indígena e outras. A autora problematiza ainda a ilusória interpretação de que tudo
será resolvido a partir de uma BNCC e reforça a necessidade de atribuirmos ênfase
a outras metas e estratégias do novo PNE, tal como a meta 18, a qual se refere aos
planos de carreira e salarial do magistério, afinal de contas, provoca a pesquisadora,
serão os docentes os culpabilizados pelos supostos fracassos.
Com relação à subjetividade docente, Süssekind (2014) enfatiza, com base em William
Pinar, que um dos principais efeitos desta centralização curricular é a demonização
do professor, uma vez que as expectativas traçadas em torno deste documento
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eficiente dos professores na sala de aula e assegurada também por uma formação
“competente”. Dessa maneira, foram sendo hegemonizados determinados discursos
que padronizavam o “professor competente”. Nesse sentido, o discurso na BNCC
pautado pela meta e estratégia 15 do PNE traz aspectos já defendidos nos contextos
FHC, Lula e Dilma. Tais demandas, de certa forma, hegemonizadas no contexto
pedagógico como o das competências, atribuem importância à aquisição e ao
domínio de determinados conteúdos por parte de professores o que “garantirá” um
aprendizado competente por parte dos alunos, a necessidade de avaliações e índices
para aferir a proficiência. Todavia, essa aproximação de sentidos apenas aborda as
cadeias articulatórias dos três contextos, aproximando as fronteiras dos seus projetos
políticos.
No extenso período dos contextos FHC, Lula e Dilma, o discurso hegemônico da
aquisição de conteúdos, significado por diversas maneiras, não tem sido capaz de
trazer a tão almejada qualidade da educação. Craveiro (2014a, 2014b) defende que
os discursos dos contextos FHC e Lula aproximam-se por meio das demandas das
avaliações, dos padrões internacionais e dos índices de qualidade para a formação
docente. O discurso que legitima as avaliações institucionais externas para sinalizar
para a sociedade como a escola, ou melhor, como a Educação Básica está e também
para certificar a formação profissional dos professores apresenta o respaldo de
organismos como Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), Fundo Monetário Internacional (FMI) e UNESCO. No contexto Dilma, esse
respaldo quanto à certificação também é legitimado por parceiros privados como
Instituto Natura, Fundação Lemann, parceiros herdeiros do banco Itaú, conforme
Macedo (2014) destaca nos discursos em defesa da base comum nacional.
O discurso da meta 15 do PNE busca garantir “que todos os professores e as
professoras da educação básica possuam formação específica de nível superior, obtida
em curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam”. Até aqui, corrobora
com a formação de nível superior proposta na LDBEN 9394/96, todavia, em suas
estratégias 15.6 e 15.7 o foco do discurso destaca que os currículos da educação
básica “configurarão a base nacional comum curricular do ensino fundamental”
(cf. estratégia 2) e também “objetivos de aprendizagem e desenvolvimento que
configurarão a base nacional comum curricular do ensino médio” (cf. estratégia 3).
Compreendemos que tais discursos podem ser significados como um fechamento
provisório8, hegemônico, em defesa dos conteúdos já mencionados desde os
diferentes contextos políticos. Tais articulações fazem com que esses contextos (FHC,
Lula e Dilma) se aproximem e até diminuam a fronteira antagônica entre os mesmos
(Craveiro, 2014a). Todavia, buscamos entender as modificações e articulações de
sentidos do projeto social Dilma, pois, aparentemente, aproxima-se mais do contexto
FHC do que do contexto Lula uma vez que explicita a necessidade de conteúdos e
9 Retomamos que essas considerações tem por base a análise de Craveiro (2014a).
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adquiridos por parte dos professores e/ ou por parte dos alunos repercute na forma
com que os professores lidam com os conteúdos, bem como na sua aquisição e
desenho da matriz curricular. É recorrente a defesa do princípio metodológico de
ação-reflexão-ação e resolução de situações-problema, pois o “desenvolvimento de
competências pede uma outra organização do percurso de aprendizagem, no qual
o exercício das práticas profissionais e da reflexão sistemática sobre elas ocupa um
lugar central” (Brasil, DCN 009, 2001, p.19).
No que diz respeito às funções de “avaliação, regulação e supervisão da educação
superior”, o PNE (2014) aproxima-se dos discursos defendidos nos contextos FHC e
Lula em aspectos que as cadeias discursivas mais se aproximam do que se afastam
nos seguintes sentidos: quanto à necessidade de avaliações institucionais; quanto ao
entendimento do processo avaliativo como experiência vivenciada e da autoavaliação
profissional como parte do processo de aprendizagem e quanto aos padrões e índices
internacionais para as avaliações nacionais.
O discurso analisado do contexto Lula apresenta textos em que se justifica o
investimento na educação através de programas voltados para maior qualificação nas
licenciaturas a partir de índices nacionais e internacionais. A aprendizagem dos alunos
é comparada aos índices dos países da Organização para a (OCDE) e os relatórios
apresentados têm por base dados do (FMI), Base de dados mundial de economia
(2008), Relatório de Desenvolvimento Humano 2008/2009 do Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento, compilado com base em dados de 2006, Relatório
de Monitoramento Global do EPT, UNESCO. Desse estudo, conforme as análises
de Craveiro, partem as avaliações como SAEB (Sistema de Avaliação da Educação
Básica), Prova Brasil (Avaliação Nacional do Rendimento Escolar) e ENEM (Exame
Nacional do Ensino Médio), bem como a formação de professores por meio dos IFET
(Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia), Universidade Aberta do Brasil
(ou UAB – é um articulador entre governo federal e entes federativos que apoia
universidades públicas a oferecere cursos de nível superior e pós-graduação por meio
da modalidade da Educação à Distância) e Programa REUNI (Programa de Apoio a
Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais).
Os sentidos de avaliação dos contextos FHC e Lula são incorporados e
recontextualizados aos discursos do contexto Dilma retomando a necessidade de
garantir a eficácia das propostas por meio da aferição de conteúdos. Esse discurso
subsidiará a defesa pela necessidade da BNCC, ganhando possivelmente a ênfase
em Temer.
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Referências
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 51-69, fev. 2017 a mai. 2017. 67
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SUSSEKIND, Maria Luiza. As (im) possibilidades de uma base comum nacional.
Revista E-Curriculum, São Paulo, v.2, n.3, p.1512-1529, out./dez., 2014.
William de Goes Ribeiro é bolsista PDJ com apoio do CNPq, doutor em educação pelo
PPGE – UFRJ e participa do grupo de pesquisa Currículo, Subjetividade e Diferença
(Proped- Uerj), coordenado por Elizabeth Macedo. Professor Adjunto da Universidade
Federal Fluminense (UFF) onde é integrante do Grupo de Pesquisas Curriculares (GPeC)
do Instituto de Educação de Angra dos Reis (IEAR), coordenado por Clarissa Craveiro.
E-mail: wgribeiro@id.uff.br.
Clarissa Bastos Craveiro é bolsista PDJ com apoio do CNPq, doutora pelo Proped-
Uerj e participa do grupo de pesquisa Políticas de Currículo e cultura (Proped-Uerj),
coordenado por Alice Casimiro Lopes. Professora adjunta da Universidade Federal
Fluminense (UFF) onde coordena o projeto Identificação docente nas políticas
curriculares para formação de professores. E-mail: clarissacraveiro@id.uff.br
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Aportes para análise das políticas de ações
afirmativas na UFRGS
Resumo
O artigo desenvolve a categoria Cultura do Reconhecimento como aporte
teórico para analisar as transformações produzidas pelas ações afirmativas nas
universidades brasileiras. Realizaram-se revisão bibliográfica e observações
participantes na UFRGS. O trabalho se apoia na noção de habitus de Pierre
Bourdieu, na teoria do reconhecimento de Axel Honneth e na produção de Nancy
Fraser acerca da paridade participativa. As ações afirmativas podem promover
uma cultura do reconhecimento nas instituições? Conclui-se que foram dados
os primeiros passos para a materialização da cultura do reconhecimento e, por
outro lado, propõe-se um conjunto de ações para desenvolvê-la de forma mais
plena.
Abstract
The article develops the Recognition of Culture category as theoretical framework to
analyze the changes produced by affirmative action in Brazilian universities. There
were literature review and participant observations UFRGS. The work is based on
the notion of habitus of Pierre Bourdieu, in theory recognition of Axel Honneth
and Nancy Fraser over production of participatory parity. Can affirmative action
promote a culture of recognition at institutions? The conclusions point out that the
first steps towards materializing a culture of recognition were taken and, at the
same time, proposes a set of actions to develop it in a more comprehensive manner.
Resumen
Este artículo desarrolla la categoría Cultura del Reconocimiento como aporte
teórico para analizar las transformaciones producidas por las acciones afirmativas
en las universidades brasileñas. Se realizaron actividades como revisión bibliográfica
y observaciones participantes en la UFRGS. El trabajo se apoya en la noción de
habitus de Pierre Bourdieu, en la teoría del reconocimiento de Axel Honneth y en
la producción de Nancy Fraser acerca de la paridad participativa. ¿Las acciones
afirmativas pueden promover una cultura del reconocimiento en las instituciones?
Concluimos que los primeros pasos ya fueron dados para materializar la cultura del
reconocimiento y que, por otra parte, también ha sido planteado un conjunto de
acciones para desarrollarla plenamente.
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Apports pour analyser les politiques de
discrimination positive à IUFRGS
Resumé
Cet article présente une analyse des changements produits par les actions de
discrimination positive dans les universités brésiliennes, en ayant comme apport
théorique la catégorie de la Culture de la Reconnaissance. On a réalisé des révisions
bibliographiques, ainsi que des observations participantes à l’UFRGS. Le travail se
base sur la notion d'habitus de Pierre Bourdieu, sur la théorie de la reconnaissance
d'Axel Honneth et sur les écrits de Nancy Fraser à propos de la "parité de
participation". Les actions de discrimination positive peuvent-elles promouvoir une
reconnaissance de la culture dans les institutions? On conclut que les premiers pas
ont déjà été faits vers la matérialisation de la culture de la reconnaissance, et on
propose, par ailleurs, un ensemble d'actions pour la développer pleinement.
Introdução
O autor entende que o habitus gera uma lógica, uma racionalidade prática, é adquirido
mediante a interação social e, ao mesmo tempo, é o classificador e o organizador desta
interação. É condicionante das nossas ações, mas também condicionado por elas.
Apesar do esforço dialético empreendido por Bourdieu ao desenvolver um conceito
de habitus que designe algo estruturado pelo campo, mas também estruturante do
mesmo, críticas como a de Bernard Lahire (1998) (in: Caria, 2008) apontam que,
no conceito de habitus, pressupõe-se sempre uma prevalência do passado sobre o
presente: a estrutura estruturada prevalece sobre a estruturante, porque o improviso
tende a ser sempre a reprodução de uma relação de forças herdada e atualizada no
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presente. Entendemos que o peso conferido à estrutura e aos códigos consolidados
já existentes, dado por Bourdieu, ainda se justifica quando nos deparamos com a
realidade de instituições com sólida tradição como a universidade.
Importante salientar que o conceito de habitus, aqui reivindicado para dar suporte à
noção de cultura, tem suas dimensões individuais e coletivas. Habitus também pode
ser lido como o resultado da experiência biográfica individual, da experiência histórica
coletiva e da interação entre essas experiências. Os agentes sociais, indivíduos ou
grupos, incorporam um habitus gerador (disposições adquiridas pela experiência) que
varia no tempo e no espaço (Cherques, 2006).
Bourdieu aponta que habitus é uma capacidade infinita de gerar produtos-
pensamentos, percepções, expressões e ações cujos limites são definidos pelas
condições históricas e sociais situadas na sua produção. A liberdade condicional
que o habitus fornece é tão distante da criação de novidade imprevisível como é de
simples reprodução mecânica do condicionamento inicial. Ou seja, estamos falando
tanto de uma construção social herdada como de uma autoconstrução constante,
mas que sua regularidade exige tempo para ser tocada, pois pensar em inserir um
elemento no habitus de modo instantâneo é tão ingênuo como crer que os seres
humanos o reproduzem mecanicamente no seu cotidiano.
A cultura de uma instituição tem como base o habitus, esse tem existência em um
campo, que não é um recorte espacial fixo, mas o cenário físico e simbólico em
que o habitus é vivido e as relações de poder ocorrem. Por definição, o campo
tem propriedades universais, isto é, presentes em todos os campos e, também,
características próprias. As propriedades de um campo, além do habitus específico,
são a estrutura, a opinião consensual, as representações aceitas, as leis que o regem
e que regulam a luta pela dominação do campo (Cherques, 2006).
A vida acadêmica tem seu habitus, o meio acadêmico pode ser concebido como um
campo, os pesquisadores (docentes) possuem uma cultura profissional específica.
É nesse ambiente que nosso desafio teórico tem morada. Estamos cientes de que
desenvolver ou não uma cultura do reconhecimento em uma instituição do ponto de
vista objetivo, isto é, transformar em realidade um conjunto de práticas, esperanças
e juízos é bem mais difícil do que engendrar um conceito, mas a reflexão pode ser
semente nesse intento.
Quando estamos inseridos em um campo experimentando seu habitus, temos
grandes dificuldades de compreendê-lo, pois cristalizamos seus valores a ponto de
vislumbrarmos possibilidades restritas de mudanças ou rupturas. Assim como temos
de ter vigilância epistemológica ao fazer uma pesquisa, é importante ficar atento a
esses limites.
O meio acadêmico, como campo particular, tem um conjunto de códigos específicos,
que demandam daqueles que desejam participar do seu meio, uma imersão nesse
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sociais ou de suas demandas.
Estudos recentes, como o de Fuhrmann (2013), que analisou as origens do fenômeno
de rualização (ir morar na rua) infanto-juvenil no meio urbano, em Porto Alegre, e de
Gratius e Valença (2011) sobre as explicações da violência em Caracas, na Venezuela,
mostram a procedência da tese acima. Isto é, de que a deflagração de conflitos sociais
se dá, em grande escala, pelas experiências de menosprezo, desrespeito, humilhação
e não puramente por questões econômicas.
“A qualidade moral das relações sociais não pode ser mensurada exclusivamente em
termos de uma distribuição justa ou equitativa de bens materiais” (Honnett,2007, p.
81). Com base nessa reflexão, tendo como pano de fundo empírico a luta secular do
movimento negro no Brasil e o surgimento dos novos movimentos sociais identitários
é que julgamos fecunda a interpretação de que modalidades distintas de negação
de direitos e de desrespeitos produzem lutas organizadas que redesenham a noção
de conflito social.
Experiências individuais de desrespeitos vividas por sujeitos em suas relações com o
Estado ou com instâncias da sociedade civil, se compartilhadas em espaços solidários
de debate político, podem se transformar em experiências coletivamente percebidas.
Quando um círculo de indivíduos forma um grupo que tem em comum o problema
de negação de reconhecimento, mesmo que essa negação se dê de maneira distinta,
já se configura um novo modo de organização política.
Na medida em que os grupos se organizam e suas ideias passam a se inserir na
sociedade, como pauta de reivindicação, ou na forma de conflito, elas constituem
subculturas que apresentam outras maneiras de interpretar a realidade. Experiências
de desrespeito que antes eram tomados como privadas passam a ter uma dimensão
socializada e ser motivo mobilizador de luta por reconhecimento.
É na relação entre a experiência pessoal de negação de direitos e o vislumbrar em
um grupo social a mudança dessa experiência que se organizam os coletivos e, por
consequência, os conflitos que irão enfrentar.Essa é a direção conceitual que Honneth
segue para compreender o conflito, ele afirma ao conceituar luta social:
Trata-se de um processo prático no qual experiências individuais de desrespeito são
interpretadas como experiências cruciais típicas de um grupo inteiro, de forma que
elas podem influir, como motivos diretores da ação, na exigência coletiva por relações
ampliadas de reconhecimento. (Honneth, 2003, p. 257)
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Reconhecimento como paridade participativa
Essa passagem marca um desafio que a autora se fez e que encontra o encaminhamento
mais definitivo no artigo Reconhecimento sem ética? em que Fraser amadurece sua
crítica a Honneth e desenvolve sua proposta mais didaticamente. Basicamente, a
autora, no caminho do que já vem sendo refletido, propõe a construção de um modelo
teórico abrangente que tenha a redistribuição e o reconhecimento como dimensões
irredutíveis conforme a realidade exige.
Para tal, Fraser defende que o reconhecimento tem de ser vinculado à noção de
justiça e analisado como uma questão de status social ao invés do modelo de
identidade cultural que prioriza reivindicações de exclusivismo em detrimento de
reivindicações de superação de subordinações injustas (Fraser, 2007). Assim, questões
subjetivas e individuais dariam espaço para demandas coletivas de transformações
das culturas institucionais, ou seja, ao romper com o modelo de reconhecimento
ligado à identidade, Fraser prioriza não mais elementos da estrutura psíquica dos
indivíduos, mas sim, a interação social e as instituições.
O avanço de Fraser toma contorno quando ela desenvolve, dentro da concepção de
justiça, a norma comum da paridade participativa.
As reivindicações por reconhecimento, bem como por redistribuição, devem atender
anseios de colocar os grupos sociais em paridade para participar da vida social, seja em
aspectos culturais ou econômicos. Tanto as condições objetivas, quanto as subjetivas
são necessárias para a paridade participativa.
Uma inovação dessa proposta é notada quando Fraser se questiona se todas as
reivindicações por reconhecimento e redistribuição são justas. Todas devem ser
atendidas pelas comunidades e sociedades? Segundo a autora, a noção de paridade
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homogeneamente concebida, mas que contempla aspectos de distribuição de renda,
oportunidades e tensionamento de hierarquias sociais. A utilização de ambos os
elementos semânticos, reconhecimento e redistribuição, trazidos pelos autores, tem
o objetivo de aproveitar o que de relevante cada teoria tem para estudar o fenômeno
pesquisado.
As ações afirmativas, nas universidades, foram políticas que requisitaram o
autorreconhecimento dos sujeitos negros, sua identificação para superar injustiças
sociais. Neste caso, trata-se de um reconhecimento positivo, de valorização da
estética, da cultura e da história da população negra. Somando a histórica luta do
movimento negro e a politização da pauta, esses elementos foram dando base
reivindicatória e criando demanda para a implantação de políticas afirmativas.
A valorização cultural de identidades que, no passado, foram desprestigiadas
e degradadas é um fenômeno repleto de vicissitudes, ao mesmo tempo em que
faz da diferença, antes estigmatizada, agora um motivo de orgulho e de evolução
de autoestima, mas pode se constituir, se mal conduzido, em certo exclusivismo
culturalista. Esse pode reproduzir internamente, nos grupos demandantes, lógicas
hierarquizantes de grupos dominantes da sociedade em que a luta está inserida,
correndo o risco de não tocar no cerne do problema da exclusão e das desigualdades
materiais.
Em outras palavras, nenhuma valorização de identidade está alheia aos padrões
valorativos da sociedade como um todo, isto é, a lógica e os critérios para se conceber
uma identidade positiva em determinada sociedade tende a obedecer a padrões
hierarquizados pelos “bem-sucedidos”, pela elite dessa sociedade, mesmo que a
identidade em tela seja a de grupos sociais excluídos. O reconhecimento, enquanto
conceito, não pode se reduzir a uma pretensa aceitação de culturas discriminadas
historicamente e nem servir de álibi para que algumas lutas se transformem em meros
embates sobre identidade e pela marcação da diferença.
Por isso, as ações afirmativas devem ser geridas com os olhos direcionados ao
reconhecimento e à redistribuição, tendo claro que, nesse caso, houve a premência do
autorreconhecimento. Os sujeitos históricos, imbuídos de consciência de sua condição
específica e organizados, foram fundamentais para a confecção e implantação de
políticas de intervenção que mudam suas possibilidades de acesso ao mais alto grau
de escolaridade. Tendo a auto declaração como critério exigido para o acesso às
ações afirmativas, o autorreconhecimento simbólico e político é condição para o
estabelecimento e o êxito dessas políticas.
Concordamos com Féres Jr. (2002, p.571) que “o reconhecimento, como forma
positiva, deve ser o produto do engajamento concreto das pessoas na política e não
um valor a ser fixado através da especulação teórica”. Com isso, não estamos dizendo
que, para promover processos de mudanças sociais ou desenvolver políticas públicas
de intervenção que preveem reconhecimento e/ou redistribuição, seja imperativo o
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 70-87, fev. 2017 a mai. 2017. 81
Cultura do reconhecimento: um olhar sobre a realidade da
UFRGS
Nesse mesmo artigo, o autor argumenta que, no Brasil, a história do ensino superior
é marcada por um confinamento racial do mundo acadêmico. Em um levantamento
apresentado nesse trabalho, feito em grandes universidades do país, constatou-se
que, em nenhuma delas, que são vistas como referências nacionais na pesquisa,
havia 1% ou mais de professores negros no seu quadro docente. A UFRGS, segundo
o autor, tinha 0,2% de negros entre os docentes no início dos anos 2000.
Carvalho (2006) coloca em xeque as interpretações sobre as relações raciais no Brasil
quando feitas por um meio acadêmico segregado, justifica esse questionamento
ao lembrar que a noção de democracia racial, denunciada como mito por Florestan
Fernandes (1965), e todas as teorias que negam o racismo estrutural brasileiro
nasceram nesse contexto. Essa segregação racial do meio acadêmico nunca foi
imposta por lei ou regra, no entanto, ocorre na materialidade, constituindo um campo
e um habitus determinado.
Ao revés desse cenário, podemos pensar a categoria cultura do reconhecimento em
uma universidade como uma metáfora que pode tencionar a capacidade da instituição
de constantemente se democratizar em todos os seus aspectos. Ela está plenamente
ligada à função social da universidade perante a multiplicidade de desafios que a
sociedade a apresenta.
Cultura do reconhecimento também é um cobertor semântico com o qual podemos
identificar o grau de qualidade das respostas que a universidade vem dando, do ponto
de vista técnico, estrutural, político e científico, para essas demandas contemporâneas
apresentadas. Identificar essa qualidade vai de encontro com os métodos mensuráveis
que sustentam o conceito de excelência com base na meritocracia, isto é, a cultura
do reconhecimento pode oferecer outros critérios para se atribuir a qualidade de
uma instituição.
Avaliar, planejar e gerir são ações que podem ganhar outro horizonte, outra lógica
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 70-87, fev. 2017 a mai. 2017. 83
para funcionar, não é ingenuamente assumido aqui, que o novo advêm de vontades
individuais ou de grupos que desconsideram o instituído. Podemos dizer que a cultura
do reconhecimento é uma substância a ser inserida no habitus para vislumbrar outro
projeto ético de universidade, que traga outros princípios para execução do fazer
acadêmico e problematize os instituídos que não correspondam com os preceitos
que incluímos aqui no bojo do conceito de reconhecimento.
Uma universidade que tem no seio dos seus processos de funcionamento, um conjunto
complexo de dinâmicas, não terá homogeneidade nem nas práticas instrumentais
burocráticas, nem nas científicas pedagógicas. De alguma forma, uma cultura do
reconhecimento, à medida que já ingressou na esteira do habitus, no exemplo da
UFRGS, da instituição, ao mesmo tempo, ainda precisa reforçar esse ingresso. Isto
é, é na constância e na insegurança das formatações específicas que, através das
brechas das microrrelações, incluem-se novos elementos de reconhecimento.
Não há linearidade, nem coerência espaço-temporal nesse processo, enquanto, em
alguns ambientes da instituição existem avanços pontuais, em outros, eles ainda estão
para nascer e de um jeito distinto dos outros. As ações e atividades que atendam a
uma cultura do reconhecimento são átomos em meios a um corpo maior. A massa
total das instituições tem características imprecisas, mas que respondem, como vimos
quando conceituamos cultura, a aspectos hegemônicos, frutos das relações de poder.
A inclusão de pautas progressistas nas mais variadas instâncias administrativas da
universidade, os debates e as mudanças legislativas promovidos por essas pautas
formam o corpo empírico da cultura do reconhecimento. A criação de novos
cursos ligados às camadas populares (Educação do campo, Políticas públicas) e o
fortalecimento de esferas administrativas que sejam representativas dos movimentos
sociais, também caminham nessa direção.
A mudança dos critérios de correção das redações do vestibular na UFRGS, em 20112,
a criação da Coordenadoria de Ações Afirmativas, em 2012, a criação da Escola de
Desenvolvimento da UFRGS3, a criação de eventos anuais como os vários Salões de
Extensão, Ações Afirmativas, de Ensino, de Pós-graduação, de Relações Internacionais,
com temas inclusivos, são exemplos de mudanças institucionais orientadas para o
desenvolvimento da cultura do reconhecimento.
Há outros exemplos, como a ampliação do número de pesquisas e de grupos de
estudos ligados às pautas da população negra, dos indígenas, dos quilombolas, das
mulheres, da população LGBT. Esses são movimentos concretos que se estabelecem
2 A referida mudança fez com que se passasse a corrigir redações de 4x o número de vagas em cada modalidade
de ingresso. Isso fez com que mais candidatos às cotas fossem aprovados, em especial os negros.
3 Que tem como objetivo geral promover a qualificação dos servidores através de um conjunto de atividades
de aprendizagem e formação interdependentes, que permitam o desenvolvimento pessoal e profissional,
principalmente, dos funcionários de perfil de baixa escolaridade ligados a trabalhos operacionais.
Considerações finais
Diante dos elementos expostos até aqui, entendemos que as ações afirmativas
dirigidas à população negra nas universidades, ao provocarem desconfortos concretos
em subjetividades até então anestesiadas pelos privilégios, ou pela alienação acerca
do tema, constituem-se em ferramenta essencial para o desenvolvimento de uma
cultura do reconhecimento, ainda em germinais patamares no meio acadêmico
nacional.
A cultura do reconhecimento tem como motor fundamental, não o único, a implantação
das ações afirmativas e só poderá lograr êxito, tornando-se um novo habitus da
academia, à medida que essas políticas continuarem existindo e se aperfeiçoando.
Nossas observações indicam que as contradições e disputas pelo habitus ganharam
outro estágio de qualidade com um mínimo equilíbrio nas forças dentro da gestão da
universidade. Com a ascensão a cargos estratégicos de profissionais que compartilham
da necessidade de desenvolver uma cultura do reconhecimento na universidade,
tem-se uma mexida progressista na distribuição das peças no campo. Isso aconteceu
na UFRGS, ainda que de forma modesta.
Por outro lado, as resistências a mudanças representadas por importantes setores da
universidade, fazem com que a gestão lide de modo ponderado e, em alguns casos,
receoso, deixando de encaminhar e propor modificações legais e estruturais. Os
movimentos de estudantes, os sindicatos dos funcionários técnicos e um segmento
sindical dos docentes com inspiração mais crítica encontram dificuldades de pontuar
questões para o grande grupo da instituição. O debate da paridade, de concurso
público para segurança universitária, o questionamento de alguns convênios da
universidade não considerados estratégicos e adequados por esses grupos, não
entram na pauta global da universidade com a intensidade que merecem.
Cabe dizer que a real vivência de uma cultura do reconhecimento pressupõe que
a instituição cumpra com seu histórico papel de oferecer formação profissional,
promover pesquisa e extensão e, no caso das cotas, conseguir diplomar os sujeitos
dessa política em número, no mínimo, igual ao daqueles que ingressam pelo sistema
universal.
Por estarmos compreendendo as ações afirmativas comopolíticas redistributivas
de oportunidades, elas devem garantir o desenvolvimento formal de uma boa
trajetória acadêmica para seus usuários, isso não será exequível sem: a qualificação da
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permanência, o combate à retenção, a contínua formação dos professores e técnicos
em temática específica, um maior investimento em avaliação interna dos órgãos
institucionais, a oferta de disciplinas obrigatórias nas licenciaturas e bacharelados
que tratam das relações étnico-raciais, a ampliação dos espaços e mecanismos de
integração dos alunos cotistas, enfim, sem um conjunto amplo de ações institucionais.
O conjunto de ações listado acima é, ao ser colocado em prática dentro das suas
complexidades e possibilidades, ampla promoção da cultura do reconhecimento
dentro da instituição. Portanto, esse guarda-chuva semântico e teórico que é a
categoria de cultura do reconhecimento só poderá existir quando houver, em forma
de processo, o transplante do que foi aqui conceituado para a realidade concreta,
vivida e construída por sujeitos históricos determinados.
Referências
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O jornal Estrella do Sul como uma estratégia de
intervenção no debate educacional na primeira
metade de 1930
Adriana Duarte Leon
Instituto Federal Sul-rio-grandense
Resumo
Este trabalho visa analisar como o jornal católico Estrella do Sul participou do
debate educacional na primeira metade de 1930, no Rio Grande do Sul; o impresso
era uma publicação semanal, vinculada ao centro da Boa Imprensa; circulava de
forma ampla no centro do estado, era composto por quatro páginas, poucas
imagens, textos curtos e anúncios. Analisamos o conteúdo do impresso como
indicador das ações estabelecidas junto ao espaço educacional e percebemos
que o impresso se efetivou como uma estratégia de ação estabelecida pela Igreja
Católica com o objetivo de ampliar sua intervenção social, atuando de forma
prioritária na defesa do ensino religioso facultativo nas escolas públicas.
This paper aims to analyze how the catholic journal Estrella do Sul participated
in the educational debate in the first half of the decade of 1930, in the state of
Rio Grande do Sul; this printed was a weekly publication, linked to the center Boa
Imprensa literally "good press"; it circulated broadly in the central region of the
state, four pages format, few images, short texts and ads. We have analyzed the
contents of the printed as an indicator of the actions established in the educational
space and we have realized that the printed was accomplished as a strategy of
action stablished by the Catholic Church in order to expand its social intervention,
acting as priority in defense of religious education as option in public schools.
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Le journal Estrella do Sul comme stratégie
d’intervention dans le débat éducatif de la première
moitié de 1930
Résumé
Ce travail vise d’analyser comment le journal catholique Estrella do Sul a participé
du débat éducatif dans la première moitié de 1930 au Rio Grande do Sul. L’imprimé
était une publication hebdomadaire lié à l’éditeur Centro da Boa Imprensa; il
diffusait largement au centre de l’état, il était composé de quatre pages, de quelques
images, de textes courts et d’annonces. On analyse le contenu de l’imprimé comme
indicateur des actions prises dans l’espace éducatif et on comprend qu’il a été une
stratégie d’action de l’Église Catholique dans le but d’élargir son intervention sociale
en agissant avec priorité en défense de l’éducation religieuse facultative aux écoles
publiques.
Introdução
O presente trabalho visa analisar como o jornal católico Estrella do Sul participou
do debate educacional na primeira metade de 1930. O impresso em questão é uma
publicação vinculada ao Centro da Boa Imprensa do Rio Grande do Sul, sob influência
da arquidiocese de Porto Alegre. A primeira constituição republicana, ao anunciar
um Estado laico, estimula a Igreja Católica a estabelecer novas estratégias de ação
que a mantenha como espaço de referência religiosa e cultural no país. Dentre
estas estratégias, a produção de impressos foi uma ação recorrente e mesmo que
os impressos já fizessem parte da história do Brasil desde o século XIX é indiscutível
a ampliação desse meio de comunicação no século posterior.
Os impressos religiosos apresentam bom potencial como fonte e objeto de pesquisa,
ao contrário dos jornais diários, que no início do século XX promovem-se anunciando
certa neutralidade, os jornais religiosos assumem um caráter doutrinário e explicitam
muito das tensões presentes no cotidiano. Até meados de 1930, a Igreja Católica
mantinha alguns impressos de circulação nacional, como é o caso da Revista A Ordem;
o Boletim da Associação dos Professores Católicos e a Revista Brasileira de Pedagogia.
Além dessas, estimulava a publicação de impressos regionais com o objetivo de
ampliar o diálogo da instituição com a sociedade. A vantagem da publicação regional
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Sobre o impresso, sua produção e circulação
Dom João Becker é uma liderança da Igreja Católica no Rio Grande do Sul e aparece
constantemente na imprensa; utiliza-se estrategicamente desse meio de comunicação
para ratificar a posição que ocupa na hierarquia da instituição e promover a
publicização de suas orientações. Nota-se sua aparição regular na revista Unitas,
publicada mensalmente pela arquidiocese de Porto Alegre e sua aparição frequente
no jornal Estrella do Sul. Destaca-se no jornal a transcrição de trechos de suas cartas
pastorais, o júbilo manifestado nas suas aparições públicas e a publicação de seus
textos e comentários que orientam os leitores às questões práticas do dia a dia.
[...]
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 88-110, fev. 2017 a mai. 2017. 93
A 'Estrella do Sul' não representa apenas um criterioso repertório de abundantes informações,
mas é, sobretudo, uma defensoria temida e acérrima dos ensinamentos e preceitos da Igreja.
O vigário que lhe nega amparo priva-se de um poderoso auxílio no desempenho de
seus trabalhos apostólicos.
As revistas populares que se publicam dentro e fora do estado, ainda que mereçam nossa
inteira aprovação, não podem, de forma alguma, em face de sua finalidade especial,
substituir a 'Estrella do Sul', redigida com muito carinho e indiscutível competência.
Para despertar maior interesse local, é mister que os srs. vigários mandem regularmente
notícias e informações com referência ao movimento social e religioso de suas paróquias.
Dom João Becker esteve à frente da arquidiocese de Porto Alegre de 1912 a 1946,
vivenciou um período de intensificação da presença católica na vida Rio-grandense
e atuou ativamente no fomento da prática religiosa no estado. Becker preocupava-
se em formar um clero disciplinado e um laicato praticante dos sacramentos.
Comprometido com a ideia de romanização da Igreja Católica, afirmou a autoridade
episcopal como estratégia de controle sobre a postura do clero e do laicato. No
trecho publicado no Estrella do Sul e transcrito acima, Dom João Becker explicita
a função do jornal como defensor dos ensinamentos e preceitos da Igreja Católica,
paralelamente, responsabiliza o clero católico pelo êxito e divulgação das ideias
presentes na publicação.
Azzi (2008), ao tratar da história da Igreja no Brasil, no início do século XX, afirma
que a característica principal desse período é o esforço da Igreja pelo fortalecimento
de suas bases institucionais, por meio da organização das paróquias, dos colégios e
das dioceses. “A Igreja deseja consolidar o seu enraizamento no solo brasileiro, a fim
de manter e de preservar os valores tradicionais” (AZZI, 2008, p. 485). Na realização
dessa tarefa, a imprensa católica contribui de forma positiva, pois funcionava como
uma 'via de entrada' para o catolicismo em espaços distanciados da instituição e
assim ampliava sua base.
No início de 1930, o estado do Rio Grande do Sul estava dividido em quatro grandes
regiões eclesiásticas: a arquidiocese de Porto Alegre, diocese de Santa Maria, diocese
de Uruguaiana e diocese de Pelotas. Nota-se que a circulação do Estrella do Sul
ocorre de forma sistemática na arquidiocese de Porto Alegre, região onde o impresso
era publicado. É relevante destacar que, nas outras três regiões, também ocorre a
publicação de impressos católicos que não serão analisados neste texto, mas que
dialogavam entre si e mantinham unidade sobre a defesa de um ideário católico para
o país.
Jornal é jornal; não é missa rezada, nem sermão de quaresma. Clero e católicos precisamos
de um jornal, de um órgão diário, sim, aparelhado para a vida moderna, para defesas e
ataques em dados momentos que, por inevitáveis, apareçam, mas sem solidéu e sem
escapulário, à secular, nunca como arremedo e arremesso do missal diário.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 88-110, fev. 2017 a mai. 2017. 95
alguma questão importante. “Quem assina o Estrella do Sul, faz o bem; quem o
propaga, procede melhor. O primeiro cumpre o seu dever de católico; o segundo
torna-se apóstolo da mais santa das causas: a imprensa católica.” (ESTRELLA DO
SUL, 19/01/1930, p. 3).
Chartier (1996) utiliza a expressão cultura popular do impresso na tentativa de
identificar no impresso as características que dialogam de forma direta com a
população. No caso do jornal analisado, a cultura popular do impresso se apresenta
por meio das imagens, dos cartazes, dos anúncios diferenciados, das frases de efeito
apresentadas em negrito e por meio do humor.
A apresentação do jornal anuncia as entradas pretendidas com a publicação; nota-
se que elas vão além das questões relacionadas ao cotidiano funcional da Igreja, o
que corrobora com a ideia da imprensa católica como uma importante estratégia de
disputa social no período.
Figura 1 – Ilustração capa Estrella do Sul Figura 2 – Ilustração interna Estrella do Sul
O movimento católico coloca-se contra a ideia de uma escola laica e não contra
a instituição escolar; bem pelo contrário, a escola é valorizada como espaço de
formação do sujeito que deve, na lógica católica, propiciar uma formação integral,
incluindo a formação religiosa.
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Nessa lógica, é comum encontrar no impresso alguns trechos que sugerem a
obrigatoriedade do encaminhamento das crianças para as instituições educativas.
Nota-se que o jornal Estrella do Sul apresenta em destaque, impresso na primeira
página, em várias edições, a seguinte chamada: “O pai que não manda seu filho à
escola é um criminoso” (ESTRELLA DO SUL, 07/12/30, p. 1). A reprodução da mesma
nota várias vezes indica a valorização do espaço escolar e reafirma a responsabilidade
da família, representada na figura paterna, pela educação das crianças.
A investida presente na imprensa é a responsabilização da família pela educação da
prole. A escolha por uma educação de qualidade ou sem qualidade é responsabilidade
da família, que deve buscar o melhor para seus filhos. A família também é
responsabilizada pela atuação do Estado, ou seja, cabe à ela escolher e pressionar
os seus governantes para receber uma educação de qualidade e de acordo com seus
princípios.
A Igreja Católica utilizava o argumento da liberdade de ensino como elemento a favor
do ensino religioso nas escolas; defendia a possibilidade de cada um escolher o que
é necessário para a sua formação; no caso dos infantes, impossibilitados de escolher
pela sua imaturidade, cabia à família fazer a escolha.
O debate sobre a presença do ensino religioso no espaço escolar era uma tópica no
período e ocupa parte considerável das páginas do Estrella do Sul. Era um dos pontos
em disputa na reforma constitucional, embora a primeira constituição republicana
tenha estabelecido a laicidade nos estabelecimentos de ensino mantidos pelos
poderes públicos, a revisão constitucional de 1926 já anunciava a disputa acerca
desse tema. Na ocasião, o ensino religioso não voltou às escolas pela diferença de
onze votos. Francisco Campos foi um dos defensores da ementa constitucional que
propunha o retorno do ensino religioso às escolas e perdeu na votação. Entretanto,
em 1931, já como Ministro da Educação e Saúde do Governo Provisório, Francisco
Campos estimulará Vargas a assinar o decreto n. 19.941, de 30 de abril de 1931, que
reintroduz de forma facultativa o ensino religioso nas escolas.
Por sua vez, a Igreja Católica não estava satisfeita com o decreto de 1931 e Alceu
Amoroso Lima, importante intelectual católico, figura representativa do movimento
de renovação do catolicismo no Brasil, diretor da revista A Ordem e presidente do
Centro Dom Vital, afirmava que era necessário lutar para que os princípios básicos
da ordem cristã orientassem a constituição do país. O decreto de 1931 representou
uma vitória para o movimento católico, mas não era suficiente. A mobilização em
torno da constituição seguiu em todo país.
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A mulher que, até então, não era estimulada a participar da vida pública, ganha status
neste espaço, ocorre uma grande campanha estimulando a sua participação social nas
eleições de 1933, momento de escolha dos deputados à constituinte, que pautaria,
dentre outras questões, o ensino religioso facultativo nas escolas.
A Mulher e a Política
Como deve a mulher receber o direito do voto em relação à sua autonomia na sociedade?
Com a mais legítima satisfação. Se ela é parte integrante da sociedade, concorrendo com
os seus esforços para o progresso do país, justo é que interfira nos negócios públicos.
Existe já um grande número de brasileiras capazes, pela sua cultura, de dar
convenientemente o voto para a escolha dos que devem governar a nação.
(ESTRELLA DO SUL, 26/06/1932, p. 1)
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do governo.
A lei eleitoral, decretada por Getúlio Vargas, em 1932, estabelecia o voto feminino
desde que atendidas algumas restrições que foram eliminadas no Código Eleitoral de
1934, ainda que o voto feminino se mantivesse como facultativo e o voto masculino
como obrigatório até 1946, quando o voto feminino passou também a ser obrigatório.
Independente das restrições impostas à participação da mulher no pleito eleitoral,
é indiscutível que a possibilidade da mulher votar e ser votada inaugura um novo
espaço para ela na vida pública do país.
Ao estudar a participação das mulheres no processo constituinte de 1933, é comum
encontrarmos afirmativas sobre a baixa participação feminina no pleito. No entanto,
é relevante considerar que o exercício do voto pelas mulheres estava primeiramente
tutelado pelo marido e provavelmente sob sua influência política. Também cabe
destacar que um contingente considerável de mulheres não se enquadrava nos
critérios estabelecidos pelo código para credenciar-se como eleitora e ficou à margem
do processo eleitoral.
Após a realização das eleições, para a assembleia nacional constituinte, foram eleitos
254 deputados e, dentre eles, uma mulher. Carlota Pereira de Queirós foi eleita por
São Paulo. No dia 13 de março de 1934, proferiu seu primeiro discurso: preocupava-
se com a criança abandonada, com a situação da mulher, com a educação e com a
assistência social.
Fora os limites práticos, ou seja, nem todas as mulheres poderiam se alistar para
votar, recorre aqui outro aspecto que trataremos de forma pontual: as mulheres
não estavam habituadas a participar do debate político e exercer o voto exigia uma
mudança de comportamento neste sentido. Se o voto feminino estava atrelado a
algumas ressalvas e sob tais condições, as mulheres poderiam participar ativamente
do processo constituinte de 1933; restava ainda consolidar na sociedade brasileira
o lugar para a mulher eleitora. Nessa construção, a Igreja Católica atuou de forma
eficiente.
O voto feminino
Como é de domínio público, o novo Código Eleitoral da República instituiu, entre nós,
o voto feminino.
Novidade, que é, na nossa legislação eleitoral, tem dado lugar a desencontradas opiniões,
cada qual a mais absurda, no tocante ao assunto, quando, no entanto, o código é de
grande clareza.
Basta tão somente que, para se qualificarem, juntem, as senhoras e senhoritas, ao
requerimento em que pedem sua qualificação, a prova de idade.
Sejam casadas, solteiras ou viúvas; tenham ou não tenham rendimentos, uma vez que
sejam maiores de 21 anos, podem ser qualificadas e inscritas como eleitoras.
[...]
(ESTRELLA DO SUL, 20/11/1932, p. 1)
Incompreensão de um dever
“Pois eu não voto - sou contrária à intervenção de mulher na política”.
Essas palavras, caro leitor, são de uma zeladora do Coração de Jesus. Quero crer, porém,
que esta senhora peque por ignorância, por incompreensão.
Do contrário, que juízo se dê de sua religiosidade, de seu zelo.
Zelar significa dedicar-se ardentemente, desvelar-se.
Assim sendo, uma zeladora do Coração de Jesus deve zelar por tudo é que é d’Ele e
para Ele.
Pois bem.
Na política atual há duas correntes.
Uma quer, sob falsos escrúpulos de consciência, afastar o Brasil de Jesus e outra quer
mostrar ao mundo que o Brasil é uma nação católica.
A Sra. Zeladora não deseja, por certo, formar entre os que negam a Jesus o lugar a que
têm direito. Mas, formando entre os indiferentes, pouca distância a separa dos inimigos,
cuja vitória representa a derrocada dos ideais dos brasileiros católicos.
Senhora Zeladora! Lembre-se que não votar é desprezar as aspirações católicas.
Portanto, para que conserve dignamente o belo título de zeladora deve não só cumprir
pessoalmente o dever eleitoral, mas ainda zelar para que suas associadas cumpram.
Isto está nas atribuições de zeladora do Coração de Jesus, pois é por ele que a mulher
católica vai às urnas.
É para que seu nome abençoe nossa constituição!
É para que seja adorado por todos os brasileiros de boa vontade!
Anônima
(ESTRELLA DO SUL, 19/01/1933, p. 1)
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Embora a possibilidade de participar do pleito eleitoral na condição de eleitora ou
candidata anuncie um espaço novo para a mulher, esse lugar não precisa estar atrelado
à ideia de emancipação feminina, pois se analisado pelo viés do catolicismo, o voto
feminino dialogou, neste período, com a ideia de conservadorismo e, corroborando
com Perrot (2005), manteve um modelo existente.
O voto feminino, tratado insistentemente no impresso, indica o processo de
reorganização política do país, o que implica em uma reorganização cultural. Se para
algumas mulheres votar era algo fundamental, para outras não! A ideia do voto estava
em fase de consolidação, e parte considerável das mulheres brasileiras não se sentiam
em condições de opinar sobre política.
O magistério era composto majoritariamente pelo sexo feminino e, por esse motivo,
a convocatória para as eleições assume tom dúbio, junto a este grupo, e convoca
os professores a participarem ativamente da modernização do Brasil. “Professores
católicos, chegou o tempo de agir e do professorado católico entrar em fase de
atividade para modernizar o Brasil. A pátria e a igreja esperam por vós!” (ESTRELLA
DO SUL, 20/11/1932, p. 4).
Convencer as mulheres a explicitar uma posição política era algo novo e exigiu o
envolvimento de vários setores, dentre eles a Igreja, que disputava questões relevantes
no período. Diversas atividades eram divulgadas pelo impresso Estrella do Sul, dentre
elas observa-se uma palestra proferida pelo presidente da Associação Católica de
Professores do Rio de Janeiro, que tratou de diversas questões relacionadas ao
cotidiano do magistério no Brasil e, por fim, faz um apelo ao voto feminino.
VOTO FEMININO
Senhoras e senhores,
[…]
Destinam-se estas lições a convencer as senhoras Brasileiras, de todas as idades e
condições, de que chegou também para elas uma época de envolvimentos e arrancadas,
em que toda mulher, como Joana D'Arc, na Guerra dos cem anos, terá de decidir, não com
metralhadoras ou granadas de mão, mas mercê do voto político e de sua colaboração
na vida pública, da sorte e destino do Brasil.
[…]
O professor primário
Sinceramente, do fundo da alma, confesso que não reconheço quem mais trabalhe pela
honra e gloria da pátria e da humanidade, nem quem possa espalhar mais benefícios
no mundo. É por pensar assim é que me sinto revoltada contra quem desconhece a
influência da escola primária e muito mais ainda contra o próprio professor primário,
que não avalia no devido grão, a grandeza de sua missão.
Porque o dever do professor não se limita, não deve limitar-se a transmitir conhecimentos
ao espírito do aluno unicamente, e sim procurar, por todos os meios, incutir-lhe os sãos
princípios da moral, de par com os cuidados tendentes a assegurar-lhe robustez do
corpo, pois a educação é uma tríplice em seus fins’.
[…]
(ESTRELLA DO SUL, 17/07/1932, p. 1)
Ensino religioso nas escolas públicas: sua solene instalação na arquidiocese de PoA.
Foi anunciada a criação do Departamento de Catecismo da Arquidiocese que terá como
uma de suas funções subsidiar as professoras da rede pública para ministrarem as aulas
de ensino religioso, bem como supervisionar a implementação dessas aulas.
(ESTRELLA DO SUL, 22/11/1934, p. 1)
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formação pedagógica, teológica e espiritual.
Retiro Espiritual
No dia 20 do corrente, às 18h, começará o retiro espiritual fechado para professoras
e catequistas, no Ginásio Nossa Senhora do Bom Conselho, terminando na manhã do
dia 24, véspera de Natal.
[...]
(ESTRELLA DO SUL, 13/12/1934, p. 4)
Pode-se afirmar que a Igreja buscou construir, nesse período, um novo lugar
para a mulher e na constituição deste lugar ocorre uma redefinição dos papéis
desempenhados até então. O impresso católico anuncia esse novo espaço e se constitui
como uma estratégia de implementação desse lugar para a mulher. Considerando
que a educação escolar era o foco do debate, nota-se que os professores ganham
destaque nos impressos, pois eram convocados a participar ativamente do processo
de modernização do país.
Considerações finais
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 88-110, fev. 2017 a mai. 2017. 107
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Acervo Consultado
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Resumo
Apresentamos um estudo acerca do Manual de Dhuoda (século IX), visto por
estudiosos da obra como Espelho de príncipe, um gênero literário, cuja finalidade
era apresentar uma proposta de formação moral, política e religiosa para os
jovens desse período. Com essa perspectiva, este estudo situa-se no campo da
História da Educação Medieval, tendo como objetivo refletir acerca deste gênero
literário como elemento pertinente à formação do nobre cristão. A partir desta
perspectiva, tecemos reflexões ao sentido de autoridade e liderança; situaremos o
contexto histórico e as formulações contidas no Manual de Dhuoda, explicitando
em que medida sua proposta segue as premissas deste gênero literário.
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Prince mirror: reflections from the Manual of
Dhuoda
Abstract
We present a study of the Dhuoda Manual (nineteenth century), seen by scholars
as the work prince mirror, a literary genre whose aim was to present a proposal
for a moral, political and religious to the young people of that period. With this
perspective, this study lies in the field of Medieval History of Education, aiming to
reflect on this literary genre as a relevant element in the formation of the Christian
nobleman. From this perspective, we reflect the sense of authority and leadership;
We will place the historical context and the formulations contained in Dhuoda
Manual, explaining to what extent its proposal follows the premises of this literary
genre.
Resumen:
Se presenta un estudio del Manual Dhuoda (siglo IX), visto por los estudiosos
como el espejo príncipe trabajo, un género literario cuyo objetivo era presentar
una propuesta de moral, política y religiosa a los jóvenes de la época. Con esta
perspectiva, este estudio radica en el ámbito de la Historia Medieval de Educación,
con el objetivo de reflexionar sobre este género literario como un elemento relevante
en la formación del noble cristiana. Desde esta perspectiva, se reflexiona el sentido
de la autoridad y el liderazgo; colocaremos el contexto histórico y las formulaciones
contenidas en el Manual Dhuoda, explicando en qué medida su propuesta sigue las
premisas de este género literario.
Résumé:
Nous présentons une étude du Dhuoda Manuel (IXe siècle), vu par les chercheurs
comme le miroir des travaux de prince, un genre littéraire dont le but était de
présenter une proposition pour une morale, politique et religieux pour les jeunes
de cette période. Dans cette perspective, cette étude se situe dans le domaine de
l'histoire médiévale de l'éducation, dans le but de réfléchir sur ce genre littéraire
comme un élément pertinent dans la formation du noble chrétien. Dans cette
perspective, nous réfléchissons au sens de l'autorité et de leadership; nous allons
placer le contexte historique et les formulations contenues dans le manuel Dhuoda,
expliquant dans quelle mesure sa proposition suit les locaux de ce genre littéraire.
Introdução
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pensar reflexivamente sobre a educação, ou seja, é em decorrência de nossas
preocupações com o pensar e o agir, segundo nossos conhecimentos para o ato de
educar as pessoas no tempo presente, que nos debruçamos sobre obras clássicas
e, por conseguinte, voltamos nosso olhar ao passado.
Compreendendo que há diversas perspectivas de análise no campo da História e
da História da Educação para olhar o passado, explicitamos que o campo teórico-
metodológico adotado é o da História Social, seguindo as premissas de longa
duração. Desse modo, o objeto de estudo faz parte da totalidade representada
pelos diversos aspectos que envolvem os homens. A História da Educação, por
seu turno, nos permite compreender a educação como fenômeno social, fruto das
relações humanas, necessárias à formação dos sujeitos para viverem em sociedade.
Esses aspectos que envolvem os homens são os que permeiam as relações sociais:
educacional, econômico, político, etc.
Assim, ao mencionarmos a pouco que são as questões, situações, embates
observados e debatidos nos dias atuais que impulsionam nossas inquietações e, por
conseguinte, resultam em nossa escrita, observamos que esses questionamentos
giram em torno da responsabilidade que uma pessoa (cidadã, mãe, professora)
tempara com seu próximo e, por conseguinte, sua sociedade. Como cidadãs,
compreendemos que as ações convergem ou não para o bem comum, para a
vida em comum de uma sociedade que vive, como outrora disse Hannah Arendt,
‘em tempos sombrios1 ’. Como mães, concentramos nossa atenção na e para a
educação de nossos filhos e entes, como estes pensam e agem em seu cotidiano
segundo sua educação. Como professoras, a apreensão reside em saber como está
a qualidade da educação brasileira2, da qual fazemos parte seja como estudante
de um Programa de Pós-Graduação, seja como professora, cuja função compete
formação humana e intelectual, tanto dos alunos quanto de outros professores, seus
pares. Desse modo, surgem alguns questionamentos: o que baliza a educação?
Qual a responsabilidade que cada pessoa tem perante essa sociedade a qual
pertencemos? Somos ‘espelho’ aos alunos, entes e pares?
As inquietações são diversas e temos consciência de que elas não estão dispostas
em um plano simples de serem respondidas. Contudo, acreditamos que o leitor
1 Utilizamos a expressão ‘tempos sombrios’ para nos referirmos ao conturbado cenário político atual em que se
encontra a sociedade brasileira . A referida expressão é oriunda de um dos títulos dos diversos livros escritos
por Hannah Arendt (1906-1975), filósofa política alemã de origem judaica. A referida obra é Homens em tempos
sombrios, publicado, pela primeira vez, em 1968, reúne ensaios biográficos de homens e mulheres que viveram
os “tempos sombrios” da primeira metade do século XX marcados pelo afloramento de regimes totalitários
como nazismo e stalinismo. Nesse sentido, ainda que aquele assunto influencie nossa busca por conhecer os
“Espelhos de Príncipe”, afinal, nos permite refletir sobre as orientações, princípios, formação para o ideal de um
bom governante, destacamos que não adentraremos nos pormenores da atual conjuntura política no Brasil, uma
vez que nos distanciaria do objetivo deste estudo.
2 O que chamamos de qualidade é a educação que propicia a pessoa uma formação ampla e capaz de tornar o
sujeito uma pessoa atuante e consciente de seus papéis sociais.
3 Os clássicos, segundo Calvino (1993), se constituem como os notáveis escritos de formação, que transmitem
ensinamentos relevantes para qualquer momento da existência humana.
4 Compreendemos que a informação passa a ser conhecimento quando nos apropriamos dela.
5 Cumpre observar que o que entendemos por autoridade refere-se à responsabilidade do Ser mais experiente,
que detém conhecimento que o permita ser consciente de seus atos e de sua função social, capaz assim de
adquirir o respeito aos demais.
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Com essa perspectiva, ao lermos alguns estudos que tratam sobre a educação,
especialmente, sobre o papel do mestre/docente, dois nos chamaram a atenção
no que tange a forma como evidenciam a temática: A violência escolar e a crise
da autoridade docente, de Júlio Groppa Aquino (1998) e A crise na Educação de
Hannah Arendt (1961). Além destes, outro escrito que baliza nosso estudo é do
mestre medieval Boaventura de Bagnoregio , intitulado As seis asas do serafim.
Os três escritos não se reportam ao gênero literário Espelho de Príncipe, como
fez Dhuoda ao redigir um manual a seu primogênito, almejando uma formação do
perfeito nobre cristão, mas os textos suscitam-nos a reflexão sobre a autoridade e
a responsabilidade que as pessoas e, sobretudo, o professor/mestre desempenham
em seu lócus de atuação e, por conseguinte, na sociedade. Afinal, a nosso ver,
na ambiência educacional, são os professores que atuam como líderes, como
autoridades para o bem educar de seus alunos. Contudo, os referidos textos são
escritos por estudiosos de diferentes épocas, de áreas distintas do conhecimento,
com fundamentações teóricas diferentes, mas que nos apontam para percepções
que evidenciam a ausência do sentido de autoridade, de responsabilidade, o
‘espelho’ outrora visto como pertinente à formação prezada por Dhuoda.
Desse modo, procuraremos demonstrar, com este estudo, que olhar o passado
nos toca enquanto vida na medida em que nos permite pensar a educação. Nesse
sentido, se em Dhuoda vemos a preocupação em redigir um livro que sirva de
espelho para as ações de seu filho, de sua formação, para se torne um ‘perfeito
nobre’; observaremos em Boaventura de Bagnoregio o destaque à formação do
líder, da boa governança, dos ‘degraus’ necessários a serem trilhados pelo mestre
para que se torne, de fato, mestre, o exemplo, o espelho aos seus estudantes.
Esclarecemos, portanto, a organização deste estudo. Após as aproximações
com os textos e as questões elencadas, entrelaçaremos o contexto histórico e as
formulações contidas no Manual de Dhuoda, explicitando sua proposta pedagógica,
ou seja, ao ler o texto daquela que ensina, analisamos a relação educativa que
ela estabelece com o filho e entendemos isso como um projeto de educação,
procurando compreender em que medida sua proposta segue as premissas do
gênero literário Espelho de Príncipe.
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a direção.
No segundo texto, escrito por Hannah Arendt (1961), intitulado A crise na Educação,
a autora o inicia tratando do processo de crise em que a questão da educação se
deparou, no século XX, na América. A autora ressalta esta ideia evidenciando que
essa crise tornou-se um problema político. Contudo, Arendt (1961, p. 2) destaca que
em face das adversidades que assolam a política, a mesma não se atentou àquela não
só porque “[...] é tentador considerá-la como mero fenômeno local, desligadas dos
problemas mais importantes do século [...]”, como também, em seu ponto de vista, é
difícil pensar, de forma política, a educação.
Em virtude dessa crise, a autora considera imprescindível ‘retirar’ desse campo do
saber preconcepções que a cerceiam e produzem preconceitos, pois do ponto de
vista da autora “Uma crise só se torna desastrosa quando lhe pretendemos responder
com ideias feitas, quer dizer, com preconceitos” (Arendt, 1961, p. 2). Essa ‘retirada’
possível passa pela conscientização dos sujeitos da educação ao fazer com que não
se destituam de sua autoridade em função de uma educação democrática:
Deste modo, o que faz com que a crise da educação seja tão especialmente aguda entre
nós é o temperamento político do país, o qual luta, por si próprio, por igualar ou apagar
tanto quanto possível a diferença entre novos e velhos, entre dotados não dotados,
enfim, entre crianças e adultos, em particular, entre alunos e professores. É óbvio que
este nivelamento só pode ser efetivamente alcançado à custa da autoridade do professor
e em detrimento dos estudantes mais dotados. (Arendt, 1961, p. 5)
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ou aquele cuja função assenta-se na arte da governança, da perspectiva de liderança
com vistas ao bem comum. A partir da leitura desta obra, observamos o quão imbuído
de autoridade e sabedoria deve se apropriar um líder:
Dá ao sábio ocasião de aprender, e se lhe acrescentará sabedoria. Sendo que muitas
vezes o sábio, por uma simples ocasião, consegue adquirir sabedoria mais alta, como
também, não raro, se aprende pela estultícia de outrem, o presente opúsculo poderá
incitar à reflexão, sobretudo os novatos e os que ainda não possuem muita prática no
ofício de governo e no perfeito discernimento do bem e do mal [...] Dentre muitos devem
ser escolhidos superiores os mais idôneos. Os principiantes precisam de um mestre
(Boaventura, As seis asas de Serafim, Prólogo, § 1).
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e da tática militar. Segundo, a menção ao costume das mulheres de se olhar em um
espelho no intuito de averiguar a limpeza de seu rosto e, também, deixá-lo bonito
para seu respectivo esposo. Dhuoda deseja que Guilherme se entretenha com o
Manual como fosse um espelho e um jogo de tabuleiro:
Como el juego de las tablas entre los otros juegos mundanos aparece ahora como el
más conviniente y adaptado a los jóvenes, o como algunas mujeres tienen la costumbre
de mirar su cara en los espejos, para limpiar los defectos y mostrar su belleza com la
intención de agradar a sus maridos en esta vida, así espero que tu, atareado por las
muchas ocupaciones mundanas y seculares, leas frecuentemente este pequeño libro
que te he dedicado a ti, como si se tratara de un mirarse em los espejos y un juego de
tablas, em recuerdo mio, y no lo desprecies. [...] Encontrarás en él todo lo que deseas
aprender; también hallarás um espejo en el que podrás contemplar sin duda la salud de
tu alma, de forma que puedas agradar en todo, no sólo al mundo, sino también al que
te ha formado del polvo de la tierra. (Dhuoda, 1995, p. 55-56, grifos da autora)
O autor parte do vocábulo em latim para nos informar da acepção literal e figurada
de espelho e, então, apresentar a acepção medieval. Explicando que o termo refere-
se, primeiramente, à representação fiel de uma imagem, afirma que, no medievo,
relaciona-se à Sapiência: esse objeto (espelho) é um meio/possibilidade de os homens
medievais observarem a ação divina e a imagem de sua benevolência:
Por sua vez, na tradição filosófica ocidental, o Espelho também representa, desde Platão
(c. 429-347 a.C.) até Plotino (204/205 – 270 d.C.), a alma. Segundo este último, a imagem
de uma pessoa está sujeita a receber a influência de seu modelo, como um Espelho
(PLOTINO, Ennéades, Paris, IV, 3); a alma possui duas faces: um lado inferior, voltado
para o corpo, e um lado superior, voltado para a inteligência (PLOTINO, Ennéades, III,
43; IV, 88). [...] Platonista da escola de Orígenes, Gregório acreditava que para qualquer
método ser eficaz deveria se como um Espelho. Assim como uma virgem, espécie de
corpo-espelho onde as pessoas poderiam ter um vislumbre da pureza da alma, da imagem
de Deus. [...] (Costa, 2001, p. 340).
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peculiaridades desse estilo literário:
En primer lugar, la composición de la obra es relativamente libre y sólo limitada em su
organización por una comparación obligatoria entre las virtudes y los vicios. En la misma
obra - y constituye la segunda característica –, se preconiza un ideal social basado en una
combinación de la moral cristiana y la moral establecida por los caballeros de la época.
En tecer lugar, la argumentación esta toda ella imbuída del pensamiento agustiniano.
Finalmente, respecto al contenido, la obra depende totalmente del público al que esta
destinada. (TOUBERT apud MERINO, 1995, p. 21)
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 111-130, fev. 2017 a mai. 2017. 125
Dhuoda era sin duda uma de las mujeres más destacadas de su tiempo. Efectivamente,
el Manual posee um enorme cúmulo de citas bíblicas, em mayor abundancia las Del
Antiguo Testamento que lãs Del Nuevo, y da testimonio igualmente de lós conocimientos
más extendidos em la cultura de aquella época. Contiene, por ejemplo, um pasaje de la
Historia de la Natureza de Plinio el Joven, lugares de la obra de Prudencio, de Donato,
etc. Es verdad que lós gramáticos de aquel entonces gustaban aducir um gran número
de obras de lós autores clássicos, y por lo que el Manual nos transmite, Dhuoda debió
ser uma de lãs alumnas más aplicadas em este sentido. (Merino, 1995, p. 28)
Observa-se, assim, que sua cultura estava respaldada no saber medieval que é a
Sagrada Escritura e os escritos poéticos e gramáticos da antiguidade. O conhecimento
de Dhuoda leva alguns estudiosos como Riché (1975) e Nunes (1995), a considerá-
lo um saber especial e substancialmente original já que não era comum às mulheres
escreverem obras dessa natureza, pois:
O Manual de Dhuoda, diz Riché, destaca-se pela originalidade, já que o seu autor não foi
um clérigo mas uma mulher leiga, nobre e casada, “o que lhe confere um lugar único na
literatura latina da [...] Idade Média”. O Manual é um livro de educação que uma zelosa
e erudita mãe escreve para seu filho, e nesse gênero é uma obra literária única, que
Dhuoda redigiu como o seu testamento espiritual, sobre possuir caráter autobiográfico
que os outros espelhos não apresentam [...]. (Nunes, 1995, p. 140)
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Por prezar a formação de seu filho, a autora ensina o respeito, a honra, a leitura e a
oração como quatro aprendizados indissociáveis da formação que lhe está oferecendo
e que convergem para a sua integridade física e espiritual. Ela compreende que,
praticando essas quatro instâncias de seu projeto de educação, o ser divino poderia
conceder-lhe, além dos bens espirituais, o bem na terra. Portanto, a autoridade de
Carlos, o Calvo, como líder e governante, precisa ser respeitada, honrada pelos seus
pares, pelos seus súditos, dentre eles, Guilherme. É, pois sob estes aspectos, que
compreendemos a pertinência de primeiramente termos refletido sobre o sentido de
autoridade, liderança e governança, afinal, apesar de vários séculos nos distanciarem
de Dhuoda, e esta, dos autores anteriormente analisados, os três sentidos, ainda
que de forma peculiar, balizam o pensamento e ensinamentos contidos no Manual
de Dhuoda.
Observamos que a preocupação da autora com a integridade física e espiritual do
filho é encontrada desde o início do Manual, quando ela lhe pede que o tenha como
um espelho em que possa se mirar diariamente. Assim como o espelho permite ao
homem conhecer a si mesmo pelo reflexo da realidade externa, a obra dessa mãe
cumpre o papel de refletir o interior dos homens e, de modo especial, de seu filho.
Considerações finais
Dhuoda destaca a importância do conhecimento para praticar a fidelidade: o ato
de ler é um aspecto pedagógico importante em sua obra, pois seria o primeiro passo
para chegar à apropriação dos ensinamentos nela contemplados. A leitura deveria
fazer parte do cotidiano de Guilherme, porque lhe daria condições de aprender todo
conhecimento já propagado pelos doutores da Igreja, da Bíblia e dos demais autores
que balizam a erudição de sua educadora e mãe. O caminho da leitura e da ação o
auxiliaria a compreender a seriedade em cumprir com suas obrigações perante seu
senhor, Carlos, o Calvo. Reitera que somente a fidelidade nas ações juntamente
com a constante oração poderiam ajudá-lo a passar pelas adversidades que poderia
encontrar em tempos conturbados como aqueles.
Além disso, os preceitos pela autora apresentados poderiam servir de orientação
para os demais homens do período. Preceitos estes essenciais para a constituição
do sujeito pensante, ou seja, daqueles cujo papel na sociedade abarca direitos e
deveres, para que tenham consciência de que as ações humanas interferem no bem
comum. Em suma, observamos que o Manual de Dhuoda contém o estilo do Espelho
de Príncipe, mas com uma peculiaridade: ela não escreve para clérigos, laicos ou
príncipes, e sim para o próprio filho.
Portanto, no decorrer de todo o Manual observamos que Dhuoda segue as premissas
Referências
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Ana Paula dos Santos Viana é Doutoranda em Educação pelo Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Estadual de Maringá (UEM-PR). Bolsista
pela Capes. Membro do Grupo de Estudos, certificado pe lo CNPq, Transformações
Sociais e Educação nas Épocas Antiga e Medieval (GETSEAM). Email: ana_psviana@
hotmail.com
Resumo
Este texto apresenta os resultados de pesquisa realizada em uma escola pública,
com o objetivo de compreender as mudanças no seu processo de gestão, no
que se refere à participação e aos conflitos, em função da sua transformação
em Comunidades de Aprendizagem. Tem-se como referencial básico a teoria
da ação comunicativa e a metodologia comunicativa crítica. A investigação
indicou mudanças na unidade escolar, desde a implementação da proposta de
Comunidades de Aprendizagem, sendo as mais significativas a incorporação do
diálogo igualitário nos colegiados da instituição e a compreensão do conflito
como ponto de partida para a busca do entendimento, que se estabelece na
ação comunicativa.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 131
Participación y conflictos en la gestión de escuela
convertida en Comunidades de Aprendizaje
Resumen
Este trabajo presenta los resultados de una investigación llevada a cabo en una
escuela pública, con el fin de comprender los cambios en su proceso de gestión, por
lo que respecta a la participación y a los conflictos, en función de su transformación
en Comunidades de Aprendizaje. Se tiene como referencia básica la teoría de la
acción comunicativa y la metodología comunicativa crítica. La investigación ha
indicado cambios en la unidad escolar, desde la implementación de la propuesta
de comunidades de aprendizaje, siendo los más significativos la incorporación del
diálogo igualitario en los colegiados de la institución y la comprensión del conflicto
como punto de partida para la búsqueda del entendimiento, que se establece en la
acción comunicativa.
Abstract
This paper presents the results of research conducted in a public school, in order to
understand the changes in their management process, with regard to participation
and conflicts, due to its transformation into Learning Communities. It has been
as a basic reference the theory of communicative action and communicative
critical methodology. Research has indicated changes in the school unit, since the
implementation of the proposed Learning Communities, the most significant being
the incorporation of equal dialogue in the institution's collegiate and understanding
of the conflict as a starting point for the search for understanding, which is
established in communicative action.
Resumé
Ce texte présente les résultats de la recherche menée dans une école publique, afin
de comprendre les changements dans son processus de gestion, en ce qui concerne
la participation et les conflits, en raison de sa transformation en Communauté
d'Apprentissage. Notre référence de base est la théorie de l'action communicative et
la méthodologie communicative critique. La recherche a indiqué des changements
dans l'unité scolaire depuis la mise en œuvre de la proposition des Communautés
d'Apprentissage, dont les plus importants sont l’incorporation du dialogue égalitaire
entre les membres de l'institution et la compréhension du conflit comme un point de
départ pour la recherche d’une entente, qui s’établit dans l’action communicative.
Introdução
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 133
e a comunidade em que está inserida, reconheça seus saberes e com eles dialogue
em igualdade.
Ao se tornar uma CA, a escola passa também a ser um espaço no qual se busca a
superação dos obstáculos postos ao diálogo, fazendo uso desse para o alcance de
soluções que encaminhem para a aprendizagem máxima de todos/as os/as alunos/
as. Nesta proposta, indivíduos com diferentes culturas passam a dialogar entre si em
relação de igualdade, prevalecendo as ideias e não as pessoas, em função de suas
posições sociais. A proposta de Comunidades de Aprendizagem, assim, supõe que a
escola se torne parte da comunidade em que se encontra inserida, democratizando-a,
e por ela sendo democratizada.
A mudança ambicionada em Comunidades de Aprendizagem envolve a busca por
oferecer uma resposta às demandas da sociedade atual, partindo do compromisso
com o processo de transformação social, rumo a uma sociedade mais igualitária e
democrática. Buscando o êxito educativo, as CAs apostam em uma sociedade da
informação para todos/as, propiciando ao alunado a superação da barreira da exclusão
social e educativa.
Tendo em vista estas características de uma unidade escolar transformada em CA,
buscamos entender de que forma a participação de toda a comunidade escolar
efetivamente ocorria em uma escola municipal de educação básica – EMEB, e de que
maneira se manifestavam os conflitos nas relações entre os sujeitos e nos processos
de tomada de decisão. Isso porque os processos decisórios devem ocorrer com
base no diálogo, que adquire grande importância para que a comunidade chegue
ao consenso almejado e, em conjunto, possa agir em busca da transformação da
situação de exclusão social e educativa vivida pela população de periferia urbana
em uma cidade de médio porte, como é o caso da cidade de São Carlos/SP, onde
realizamos este estudo.
Como participação entendemos o modo pelo qual a gestão democrática é garantida,
proporcionando maior aproximação entre escola e comunidade, desencadeando um
processo coletivo de tomada de decisão e construção de objetivos compartilhados,
sobretudo, por meio do diálogo e busca do consenso. O tempo utilizado com o
diálogo nunca é perdido, já que por meio da problematização e da crítica ocorre a
inserção dos indivíduos na realidade, como sujeitos da transformação. “Toda demora
no início significa um tempo ganho em solidez, em segurança, em auto-confiança e
interconfiança”. (Quaglio, 2009, p. 149)
Em gestão da educação, aqueles que não fazem um esforço no sentido da ampliação
do diálogo rejeitam a organização e funcionamento do trabalho nas escolas como
situação dialógica de produção do conhecimento. Ao não aceitarem o diálogo
comunicativo, não geram “o processo de decisão cooperativa, que assegura o
desencadeamento das forças necessárias para promover o desenvolvimento almejado
em educação”. (ibid., 2009, p.150)
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 135
neste modelo de ação, é fundamental.
Em última instância, o conceito de racionalidade comunicativa, apresentado pelo
autor, possui conotações que remontam à capacidade que uma fala argumentativa
detém de reunir e de gerar consenso sem coações. Assim, os diversos participantes
superam a subjetividade inicial de seus respectivos pontos de vista e asseguram,
graças a convicções racionalmente motivadas, a unidade do mundo objetivo e a
intersubjetividade do contexto em que desenvolvem suas vidas, coordenando seus
planos de ação.
Supor que o entendimento funcione como mecanismo coordenador da ação significa
que os participantes em interação se colocam de acordo acerca da validade de suas
emissões ou manifestações, reconhecendo intersubjetivamente as pretensões de
validade com que se apresentam uns frente a outros. “Entender-se é um processo
de obtenção de um acordo entre sujeitos linguística e interativamente competentes”
(Habermas, 2001, p.368). Graças à sua estrutura linguística, um acordo alcançado
comunicativamente tem que ser aceito como válido pelos participantes, e não
apenas induzido por qualquer motivação externa, sendo assim proposicionalmente
diferenciado. A estrutura da argumentação deve excluir toda a forma de coação, se
utilizando tão somente do melhor argumento.
Os participantes no processo cooperativo de comunicação estão a serviço da
consecução de um consenso sob o qual possam coordenar os planos de ação e realizar
suas próprias intenções de ação. O consenso buscado deve se realizar mediante a
um acordo racionalmente motivado, ficando a ação comunicativa entre a expectativa
do consenso e o risco do dissentimento.
Habermas denuncia que o consenso nem sempre é alcançado na sociedade atual.
Há uma crise de consensos oriunda das patologias da comunicação inerentes à
estrutura da sociedade capitalista (Gomes, 2007). Segundo Habermas, à medida que
as distintas esferas de valor traduzem sua lógica própria em estruturas sociais das
correspondentes esferas da vida diferenciadas, o que corresponde a uma diferença
entre pretensões de validade no plano da cultura, a sociedade pode ser tomada por
tensões entre orientações de ações institucionalizadas, ou seja, por conflitos de ação.
(Habermas, 2001)
Quanto maior o grau de racionalidade comunicativa presente em uma comunidade em
comunicação, mais amplas se tornam as possibilidades de coordenação das ações sem
que se recorra à coerção, de modo a resolver consensualmente os conflitos de ação.
A busca permanente do consenso, pressuposta por Habermas, também pode ser
direcionada ao enfrentamento dos desafios educacionais atuais. A consolidação de
um projeto educativo voltado ao entendimento racional é a saída encontrada para o
alcance de um consenso que visa à superação das divergências e dos conflitos que
surgem nas relações sociais. Para isso, a ideia de consenso como fator de coordenação
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 137
comunicativamente. Órgãos como os conselhos de escola, de acordo com Pinto
(1996), podem ser entendidos como uma tentativa do mundo da vida de resgatar
seus domínios, tomados pela burocratização da escola.
Dessa forma, sobressai a necessidade de importantes mudanças no que concerne
à gestão da educação, que deve envolver processos comunicativos de busca de
consensos, alcançados por meio do entendimento. Como na ação comunicativa as
decisões são tomadas de acordo com o melhor argumento (democracia deliberativa),
e não por maioria de votos (democracia representativa), é dirimida a possibilidade
de que o segmento escolar mantenha o controle do colegiado, com independência
da posição de pais e alunos.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 139
Quadro 1: Siglas de identificação dos entrevistados
Entrevistado/a Sigla de identificação
Assistente de Direção E1AD
Coordenadora Pedagógica E1CP
Diretora E1D
Familiar E1F
Fonte: Dados da pesquisa.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 141
Durante o período em que foram realizadas observações comunicativas nos colegiados
da escola transformada em CA, foram acompanhados os encontros mensais do
Conselho de Escola da unidade, que contava com a participação da diretora, de
professoras PIII (Educação de Jovens e Adultos/EJA), de funcionários/as, pais e/ou
responsáveis e, como presidente do Conselho, uma professora PII (séries iniciais do
ensino fundamental).
Foram acompanhadas também as reuniões da Comissão Gestora, que ocorreram
quinzenalmente, contando com a participação de todos aqueles que manifestaram
interesse em acompanhar e compartilhar o processo de gestão. Durante o período
de observação, a comissão contava com a participação de gestoras da unidade, de
professores/as e pais, representantes da associação de moradores, assistente social de
uma empresa multinacional presente no bairro e representantes da Unidade de Saúde
da Família (USF), além da gestora comunitária, responsável pelo desenvolvimento do
projeto municipal “Escola Nossa”, aos finais de semana, na unidade.
As observações comunicativas permitiram a constatação de que a dinâmica já
adotada pelas pessoas que participavam da Comissão Gestora tinha a busca pelo
consenso como fator de coordenação da ação. Foi observada também a presença da
racionalidade comunicativa, manifesta por meio dos procedimentos estabelecidos
pelo uso da argumentação. O consenso, nestas reuniões, se mostrou fundamental
para o desenvolvimento da competência comunicativa entre os sujeitos, atuando
como critério de validação do pensar e do agir. Propiciava-se, assim, não somente
que familiares e profissionais da escola pudessem problematizar suas relações com
o mundo, mas também voluntários/as, moradores/as do bairro, representantes de
indústrias locais, comerciantes e demais representantes da comunidade pudessem
somar forças e juntos refletirem, reivindicarem, exigirem, posicionarem-se, agirem e
transformarem. Garantia-se, dessa forma, que a Comissão Gestora não consistisse
em mais um órgão burocrático vinculado ao sistema, mas em manifestação do mundo
da vida na busca por reconquistar seu espaço.
No entanto, convém dizer que foi comum identificar na fala dos entrevistados uma
baixa participação de pais e familiares nos colegiados, conforme pode ser observado
no quadro a seguir, que apresenta as dimensões transformadora e exclusora vinculadas
à participação:
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 143
Apesar do reconhecimento de todos/as os/as entrevistados quanto ao fortalecimento
dos colegiados nos últimos anos, a coordenadora (E1CP) e o familiar (E1F) apontaram
a necessidade de uma participação mais intensa de representantes da comunidade de
entorno para o alcance definitivo da articulação e colaboração entre esta e a escola.
A participação da comunidade nos processos de tomada de decisão era entendida pela
coordenação da escola como importante forma de trazer os familiares para sua práxis,
para que refletissem e agissem juntos, em colaboração. No decorrer da pesquisa fez-
se notório que, aos poucos, familiares e comunidade iam deixando de fazer parte
apenas das reflexões ocorridas nos colegiados, passando também a agir de forma
conjunta. Os entrevistados destacaram a nova significação que a participação adquire
quando a comunidade se percebe como capaz de refletir, agir, e assim transformar.
Diante da importância da participação de todos, alguns entrevistados argumentavam
que a escola deveria ainda tomar novas medidas, buscando maior aproximação com
a comunidade, cientes da força que o entendimento entre escola e entorno poderia
representar na coordenação dos planos de ação e busca da transformação almejada
por todos/as.
Como nos mostra Pinto (1996), ao focar a participação de familiares nos conselhos
escolares tendo como referência a teoria da ação comunicativa, a omissão dos pais
e sua não participação pode ser entendida como consequência da colonização do
mundo da vida pela racionalidade sistêmica e seus meios diretores dinheiro e poder:
À luz da teoria da ação comunicativa, esta omissão de assumir o papel de cidadão,
este medo de participar, de se expor, não pode ser entendido como fruto de um mero
ato de vontade do indivíduo, mas como consequência de um processo mais amplo de
colonização do mundo da vida pelos meios diretores dinheiro e poder, que atuam tanto
a nível da reprodução material do mundo da vida como no âmbito da reprodução de
suas estruturas simbólicas (cultura, sociedade e pessoa). (Pinto, 1996, p.151)
Esse contexto, todavia, não deve ser dado como definitivo. A descolonização do
mundo da vida, por meio da racionalidade comunicativa, a ser viabilizada também
pela participação nos colegiados e processos de tomada de decisão, deve continuar
a ser buscada pela escola. Tentativas podem ser empreendidas por meio de uma
maior adequação dos horários das reuniões aos horários disponíveis pelos familiares,
ouvindo suas sugestões, assim como procurando conhecer as razões pelas quais
têm participado pouco ou não têm participado. Buscar compreender os interesses
dos familiares e da comunidade, assim como aquilo que gostariam de ajudar a
viabilizar, pode consistir em mais uma maneira de trazer a comunidade para a escola,
fomentando a participação nos processos de reflexão, entendimento e tomada de
decisão.
Além da articulação entre escola e comunidade, vinha-se buscando a articulação
entre os dois colegiados da unidade. Dessa forma, discussões, reflexões e argumentos
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Quadro 4: Conflitos e processos de tomada de decisão
Dimensão transformadora Dimensão exclusora
E1AD- Conflitos na unidade diminuíram E1F- Existiam conflitos entre os/as alunos/
sensivelmente a partir do segundo semestre do ano as.
de 2007.
E1AD - Em 2007 as relações na unidade
E1AD – Relações conflituosas entre os profissionais eram bastante conflituosas, envolvendo
da EMEB diminuíram após a intensificação do alunos/as e também profissionais da EMEB.
diálogo.
E1AD - Algumas pessoas ainda não sabiam
E1AD - Diálogo entre os professores propiciou lidar com possíveis críticas.
o desenvolvimento de trabalhos em grupo
envolvendo professora que inicialmente se isolava
dos demais.
Considerações finais
Comunidades de Aprendizagem acredita na ideia de que todas e todos têm
a capacidade de transformar seus contextos por meio do diálogo intersubjetivo,
superando situações de desigualdade e exclusão. Não ignora, destarte, as diferenças
existentes entre as pessoas, mas acredita que estas não consistem em barreiras para
que elas alcancem o entendimento e lutem por objetivos que são comuns (Elboj et
al., 2002). Refletindo juntos, em comunicação, e questionando o mundo, homens e
mulheres deixam de se adequar a ele, tornando-se mais atuantes, humanizando-se
e vendo-se como capazes de criar e agir. (Freire, 1980)
A construção comunicativa de significados, mediante interação, consiste em meio
para que as pessoas conheçam a realidade, a compreendam e a transformem, fazendo
uso da intersubjetividade, da reflexão e das teorias das pessoas que integram a
realidade social que almejam transformar. O entendimento, alcançado pelas pessoas
em um processo de recíproco convencimento, com base em pretensões de validade
suscetíveis de crítica, leva os diversos participantes à coordenação das ações,
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 147
motivados por razões. Dessa forma, as pessoas enfrentam as situações que tem se
tornado problemáticas por meio da ação comunicativa, com a tomada de postura de
afirmação ou negação frente a pretensões de validade dos sujeitos, chegando a um
acordo. Este acordo deve, necessariamente, ser aceito como válido pelos participantes
e nunca imposto por motivação externa. (Habermas, 2001)
Buscando este entendimento, a superação das relações de poder e a democratização
dos processos decisórios, a CA tem se dedicado à ampliação da participação de
representantes de professores/as, familiares e comunidade de entorno nos colegiados,
propiciando a todos/as o direito à palavra, pela qual o homem pronuncia o mundo e
também o transforma (Freire, 1980). Assim, almeja que todos os sujeitos sejam capazes
de problematizar suas relações com o mundo e lutar pelas mudanças necessárias.
A participação, essencial para a efetivação da gestão democrática nas escolas, não
é algo que possa ser imposto, mas sim alcançado de maneira gradual, por meio do
convencimento das pessoas, ao se verem articuladas com uma proposta entendida
como viável e que produza resultados. A participação de todos/os na solução dos
problemas da unidade de ensino impulsiona e encoraja a equipe escolar, familiares
e alunos/as, integrando-os à escola e fazendo com que se sintam parte do processo,
conferindo mais significado a suas ações e levando-os a assumirem responsabilidades
nos procedimentos de tomada de decisão, aferindo maior importância à escola e
ao que nela é desenvolvido. Logo, escola e comunidade se aproximam, dando
origem a um processo coletivo de tomada de decisão que envolve a determinação
de objetivos construídos e compartilhados por meio do diálogo e do consenso. Por
meio da participação é que são formados cidadãos conscientes, política e socialmente
participativos e voltados à transformação social.
Sabemos, entretanto, que o entendimento comunicativo nem sempre se faz
presente nas relações entre os sujeitos. A coordenação das ações, dada por meio de
reivindicação de validade às pretensões apresentadas, passa pelo reconhecimento
dessas no espaço público das razões. Quando o consenso não é alcançado nos três
planos compreendidos na intenção comunicativa do falante - verdade, correção
normativa e veracidade - surge o que Habermas (2001) identifica como distorção na
comunicação, ocasionando os conflitos.
Os conflitos que se estabelecem nas sociedades modernas colocam em questão a
capacidade de integração que compõe a unidade do mundo da vida. Compreendemos,
porém, que a presença de um maior grau de racionalidade comunicativa em uma
comunidade em comunicação amplia a possibilidade de coordenação dos planos de
ação, sem que ocorra coerção, resolvendo os conflitos por meio do consenso.
Isso posto, o consenso deve estar presente no núcleo do processo educativo, nas
relações cotidianas e na sala de aula, assim como nos processos de tomada de
decisão da CA. Reconhecido sob pretensões de validade suscetíveis de crítica, deve
se sustentar no âmbito das próprias expressões linguísticas e no contexto do mundo
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 131-150, fev. 2017 a mai. 2017. 149
Referências
Resumo
O artigo se insere no campo temático da Educação de Jovens e Adultos,
seus objetivos são: apresentar as peculiaridades de um programa municipal
desenvolvido na cidade de Esteio/RS, o Programa Ação Integrada Adultos;
identificar as características da escola e da turma que embasaram a investigação
e refletir sobre as histórias de vida e perspectivas dos sujeitos de pesquisa. A
metodologia constituiu-se da análise dos documentos referentes ao Programa,
observações das práticas pedagógicas e atividades escolares e realização de
entrevistas semi-estruturadas. Pretende-se contribuir para o aprofundamento
das discussões sobre diferentes modalidades de EJA refletindo, a partir desse
estudo de caso, sobre suas possibilidades, limites e contradições.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 151-171, fev. 2017 a mai. 2017. 151
Ways and waywardness of the return to school:
Integrated Action Adults Program
Abstract
The article is included in the field of Youth and Adult Education. The objectives
of the analysis are: to present the peculiarities of the of a municipal program
developed in the city of Esteio/RS, the Integrated Adults Action Program; identify
the characteristics of the school and the class that underpin the research and
reflect about the stories of life and future prospects of research subjects. The
methodological approach is from the analysis of the documents relating to the
Program, observations of teaching practices and school activities and carrying out
semi-structured interviews. We intend to contribute to the deepening of discussions
about different types of Youth and Adult Education reflecting, from this case study,
on its possibilities, limits and contradictions.
Keywords: Youth and Adult Education. Life stories. Adults Integrated Action
Program.
Resumen
El artículo se inscribe en el campo temático de la Educación de Jóvenes y Adultos,
sus objetivos son: presentar las peculiaridades de uno programa desarrollado
en la ciudad de Estaio/RS, el Programa Acción Integrada Adultos; identificar las
características de la escuela y de la clase que basaran la investigación y reflejar sobre
las historias de vida y perspectivas de los sujetos de investigación. La metodología
consiste del análisis de los documentos referentes al Programa, observaciones
de las prácticas pedagógicas y actividades escolares y realización de entrevistas
semiestructuradas. Se pretende contribuir a la profundización de las discusiones
sobre diferentes modalidades de EJA reflejando, a partir de ese estudio de caso,
sobre sus posibilidades, límites y contradicciones.
Résumè
L'article est compris dans le domaine de l'éducation pour jeunes et adultes, les
objectifs sont: présenter les particularités d'un programme municipal développés
dans la ville de Esteio/RS, le Programme Action Intégrée Adultes; identifier les
caractéristiques de l'école et la classe qui a soutenu la recherche et réfléchir sur
les histoires de vie et les perspectives des sujets de recherche. La méthodologie
est à l'analyse des documents liés au Programme, observations des pratiques
d'enseignement et des activités scolaires et réalisation d'entretiens semi-structurés.
Il est destiné à contribuer à l'approfondissement des discussions sur les différents
modalités de l'éducation pour jeunes et adultes reflétant, à partir de cette étude de
cas, sur ses possibilités, limites et contradictions.
Introdução
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 151-171, fev. 2017 a mai. 2017. 153
tempo de permanência na escola ou a possibilidade de conclusão dos estudos após
repetidas reprovações. A segunda tendência relaciona-se ao reconhecimento da
necessidade de se aprofundar a reflexão sobre as especificidades dessa modalidade
de ensino. Nesse sentido, muitas investigações tratam da legislação e das diretrizes
curriculares específicas, da formação continuada de professores e profissionais
atuantes na área, da produção de materiais didáticos ou da observação dos distintos
contextos de vida dos estudantes.
Neste artigo pretende-se participar desse amplo diálogo a partir da abordagem de um
programa específico de EJA, o Programa Ação Integrada Adultos/PAIA, que tem como
característica o fato de ser ofertado a estudantes com 23 anos ou mais e que tenham
concluído a 5a série ou o 6o ano do Ensino Fundamental. A análise aqui apresentada
é parte de uma Dissertação de Mestrado3 realizada a partir do acompanhamento
de uma turma desse Programa. Os objetivos são: apresentar o Programa, com base
em sua trajetória e características de funcionamento; identificar as peculiaridades
da turma estudada e analisar as histórias de vida e os projetos de futuro relatados
pelos sujeitos de pesquisa a partir de seu retorno à escolarização4.
Optou-se por uma abordagem qualitativa com base nos seguintes procedimentos
metodológicos: análise dos documentos referentes ao Programa e à organização
da Escola, coleta de dados objetivos referentes à turma, relato das observações do
cotidiano das aulas e atividades realizadas ao longo do ano de 2014, e análise das
entrevistas com a supervisora escolar, com a professora titular, com a coordenadora
Municipal do Programa e com uma amostra dos estudantes sujeitos da pesquisa.
O artigo está assim organizado: na primeira seção, contextualiza-se brevemente o
campo empírico e apresentam-se as características do PAIA. Na segunda, analisam-
se as trajetórias e perspectivas observadas nas narrativas dos alunos entrevistados
e, na terceira, reflete-se sobre os impasses, contradições e alcances do Programa
com base na comparação entre as concepções apresentadas na documentação e as
observações realizadas ao longo da investigação.
3 Intitulada XXXXX, defendida junto ao Programa de Pós-Graduação XXXXX. Agradecemos aos professores XXXX
e XXXX pelas preciosas colaborações ao longo do processo.
4 A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da XXXX, conforme a Resolução 466/12 do Conselho
Nacional de Saúde.
5 O Instituto Integrar foi fundado pela Confederação Nacional dos Metalúrgicos da Central Única dos Trabalhadores
– CNM/CUT, em 1996 e desenvolve projetos de formação e qualificação profissional. No Rio Grande do Sul atua
desde 1997. Disponível em: <http://www.integrar.org.br/>.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 151-171, fev. 2017 a mai. 2017. 155
dividido em Adolescentes (entre 15 e 18 anos) e Adultos (23 anos em diante). Ao longo
do período de convênio, o Município de Esteio chegou a adotar os livros didáticos
elaborados pelo Instituto Integrar.
Decorridos dois anos, a Smee criou seu próprio Regimento de trabalho, pois algumas
dificuldades geradas pelo convênio precisavam ser superadas, entre elas, o fato de que
quem certificava os alunos não era a escola onde eles estudavam, e sim o Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense – IFSUL, de Pelotas.
Com o apoio dos professores ligados à EJA e da assessoria pedagógica da Smee foi
construído o Programa Ação Integrada, aprovado pelo CME – Conselho Municipal
de Educação, no final do ano de 2010, para que em 2011 os alunos pudessem ser
matriculados e certificados diretamente nas escolas da Rede Municipal. Ou seja, a
Prefeitura de Esteio, com base no estabelecido nas Diretrizes Curriculares Nacionais
para a EJA6, transformou o antigo convênio em uma política municipal diferenciada e
específica para a conclusão do Ensino Fundamental, ofertada ao público com idade
superior aos 23 anos. O Programa não se estende para o Ensino Médio e não possui
correspondente nos âmbitos estadual e federal de ensino.
Ainda segundo a Coordenadora, o principal objetivo do Programa é reconciliar o aluno
com a educação escolar, motivando-o a retornar e concluir os estudos. A escolha
dos professores baseia-se na indicação da direção da escola, em concordância com
a Smee, sendo requisito que estes possuam formação compatível e experiência na
EJA. A Coordenadora observou também que, a cada ano letivo as escolas optam pelo
funcionamento ou não do Programa, que pode ocorrer nos turnos diurno e noturno,
destinando-se a adolescentes e/ou adultos.
Entre os objetivos do PAIA estão o desenvolvimento de metodologias interdisciplinares
e interativas, a valorização dos saberes prévios dos educandos, a promoção de sua
realização no mundo do trabalho, a construção de conceitos necessários ao pleno
exercício da cidadania por meio das diferentes leituras do mundo, o desenvolvimento
da autonomia e da criticidade, a qualificação das diversas formas de expressão,
aprimoramento da leitura e interpretação a partir de diversas situações do cotidiano,
o trabalho a partir das dificuldades e das necessidades específicas de cada turma e o
estimulo à criatividade e à curiosidade (Esteio, Smee, 2009-2012, p. 7).
A inserção no campo empírico iniciou-se no mês de abril de 2014. A turma, que
havia recebido 37 matrículas, era então composta por 19 alunos, 11 mulheres e 8
homens, cuja faixa etária variava de 24 a 61 anos. Deste grupo, apenas um indivíduo
não possuía escolaridade prévia na EJA e 16 já haviam estudado naquela escola em
distintos períodos, entre 1978 e 2013. Em relação ao trabalho, 17 alunos exerciam
6 Conforme o Art. 6º da Resolução CNE/CEB Nº 1, de 5 de Julho de 2000, “Cabe a cada sistema de ensino
definir a estrutura e a duração dos cursos da Educação de Jovens e Adultos, respeitadas as diretrizes curriculares
nacionais, a identidade desta modalidade de educação e o regime de colaboração entre os entes federativos”.
(BRASIL, 2000a).
7 A Usina do Gasômetro forneceu energia elétrica à base de carvão de 1928 a 1974. Em 1991 tornou-se um
centro cultural do trabalho. A Fundação Iberê Camargo preserva e divulga a obra do artista e incentiva e expõe
produções de arte contemporânea.
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professora titular. As entrevistas foram realizadas ao longo dos meses de outubro
e novembro de 2014, portanto, em um momento em que os participantes estavam
próximos à conclusão do Programa8.
No primeiro contato estabeleceu-se que as identidades dos participantes seriam
mantidas em sigilo e que estes seriam apresentados com nomes fictícios, escolhidos por
eles. Essa medida reflete um duplo cuidado: não expô-los a situações constrangedoras
em função de suas falas e opiniões e procurar, com base no anonimato, garantir relatos
mais fluídos e espontâneos. Além disso, a aproximação ao grupo de entrevistados
levou em consideração a advertência, feita pelo sociólogo Michael Pollak, de que
[...] contar a própria vida nada tem de natural. Uma pessoa a quem nunca ninguém
perguntou quem ela é, de repente ser solicitada a relatar como foi a sua vida, tem muita
dificuldade para entender este súbito interesse. Já é difícil fazê-la falar, quanto mais falar
de si (Pollak, 1992, p. 13).
• Como foi tua vida escolar antes de ingressares no Programa Ação Integrada
Adultos?
• Conta sobre essa volta aos estudos. O que te motivou?
• Como foi tua experiência no Programa Ação Integrada Adultos?
• Pretendes continuar estudando?
8 O Programa tem duração de um ano letivo e a turma em questão concluiu as atividades no mês de dezembro de
2014.
9 Na transcrição das respostas foi mantido o tom coloquial, próprio da narrativa oral.
10 Tal situação remete à falta de prédios escolares em várias regiões do Brasil, pelo menos até o início dos anos
1960. Para o caso do RS a expansão do ensino elementar deu-se no governo Leonel Brizola (1959 a 1963). Sobre
o assunto ver: Quadros (2005).
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 151-171, fev. 2017 a mai. 2017. 159
marcam a vida de adultos que retornam à escola. Cada um dos entrevistados salientou
diferentes obstáculos: miséria, doença, inexistência de escola, desestruturação
familiar. O ponto em comum é o fato de terem interrompido antes de completarem
o Ensino Fundamental. Não se aprofundará a análise da evasão escolar no âmbito
deste artigo. Mas é interessante notar que duas de suas causas mais comuns também
aparecem nos relatos desse grupo. A primeira, o ingresso precoce no mercado de
trabalho, mencionada da seguinte forma por Adriano: “Já com uns oito, dez anos eu
comecei a trabalhar. Eu trabalhava numa olaria com meu avô. Ele era daquele tipo
antigo sabe? Era analfabeto também, não sabia nem assinar o nome dele” (Adriano,
15/10/2014). E, a segunda, a gravidez na adolescência. Assim relatada por Pink:
“Bom, eu estudei até a oitava. Na verdade, tinha tipo 16, estudei, não parei de estudar,
reprovei uns ano, mas continuei. [...] Aí, desisti porque engravidei, então parei de
estudar” (Pink, 20/11/2014).
No primeiro caso pode-se constatar que a noção de infância, como construção
histórica11, está diretamente ligada ao contexto de vida dos sujeitos. Nesse sentido,
note-se que geralmente a abreviatura da infância relaciona-se à supressão da vida
escolar. Muitos adultos, ao retornarem à escola buscam um direito de cidadania que
lhes foi negado na infância. No segundo caso, presente no relato de Pink, observa-se
a precipitada transição para a vida adulta e suas responsabilidades. Neste sentido,
a gestação na adolescência é, de modo geral, enfrentada com dificuldade porque:
Nessa transição abrupta do seu papel de mulher, ainda em formação, para o de mulher-
mãe, a adolescente vive uma situação conflituosa e, em muitos casos, penosa. A grande
maioria é despreparada física, psicológica, social e economicamente para exercer o novo
papel materno, o que [...] associado à repressão familiar, contribui para que muitas fujam
de casa e abandonem os estudos. (Moreira, Viana, Queiroz e Jorge, 2008, p. 315-316).
Pink reforçou que quando seu filho tinha dois anos, retornou à escola, frequentou-a
por um período de três meses e desistiu novamente devido às dificuldades de conciliar
a vida escolar e os encargos da maternidade. Seu relato exemplifica muito do que foi
apontado pelos autores acima. Ela não mencionou conflitos com os familiares, nem
mesmo com o pai do seu filho, porém deixou clara a preocupação com o olhar da
sociedade diante de sua situação, que foi decisiva para que abandonasse os estudos
no último ano do Ensino Fundamental. Em uma frase inconclusa refletiu: “Só desisti
porque adolescente, barriguda...” (Pink, 20/11/2014).
A segunda questão – Conta sobre essa volta aos estudos. O que te motivou? –
provocou relatos acerca dos diferentes caminhos percorridos pelos entrevistados,
desde a intenção até a decisão de retomar os estudos. Cada um deles rememorou
uma trajetória marcada por rupturas, dificuldades, mudanças de rumo que interferiram
11 Para uma leitura mais aprofundada sobre a noção de infância como construção histórica, ver: Kuhlmann (2000)
e Ariès (1981).
Ao longo de suas narrativas, alguns dos entrevistados apontaram para aspectos que
marcaram a passagem da adolescência para a vida adulta que se encontram em
consonância com os fatores acima. Para JC, Adriano e Betão, o “ser adulto” ocorreu
pela via do ingresso precoce no mercado de trabalho. Para Pink, a maternidade exigiu
responsabilidades de pessoa adulta, afastando-a dos estudos. Todavia, esses eventos
não abarcam a totalidade do complexo processo de tornar-se adulto. Flor do Campo,
por exemplo, devido a suas condições de saúde, transitou para a maioridade em um
contexto no qual não estão presentes o trabalho remunerado, a maternidade ou a
independência domiciliar.
Essas diferenças apontam para outra constatação, observada pelos mesmos autores,
a de que “[...] nas diversas sociedades, há pessoas que jamais completarão todo o
processo” (Oliveira, Rios-Neto e Oliveira, 2006, p. 1). Entretanto, independente de
suas peculiares, os estudantes observados foram considerados aptos a ingressarem
em uma turma de adultos. Nas narrativas a seguir podem-se perceber algumas das
variáveis apresentadas pelos entrevistados para justificar seu retorno à vida escolar.
JC havia frequentado até a quinta série do ensino fundamental e estava há mais
de quarenta anos afastado da escola. Contou que, depois de ingressar no mercado
de trabalho, havia realizado diversos cursos técnicos pelo Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial/Senai e que essa formação lhe garantiu um bom emprego.
Essa situação mudou quando, em 1993, “a empresa entrou em crise e como eu
tinha um salário muito alto, fui o primeiro a ser demitido” (JC, 06/10/2014). A partir
desta nova realidade, JC tornou-se autônomo, trabalhando em sociedade com um
amigo: “Compramo um caminhão pequeno, é semi-novo, prá transportá GLP [gás de
cozinha]” (JC, 06/10/2014). Essa situação de vida individual remete a um contexto
mais amplo, de reestruturação produtiva ocorrida no país ao longo dos anos 1990,
que acarretou “a diminuição crescente do emprego industrial e a expansão do setor
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 151-171, fev. 2017 a mai. 2017. 161
de serviços” (Druck, 1999, p. 43).
No relato de JC, o fator trabalho não é mencionado como algo preponderante em seu
retorno à escola, para ele a ampliação da escolarização não representaria nenhum
benefício imediato nesse aspecto. Mais importante em sua decisão foi a percepção
da desorganização de seu tempo, primeiro como desempregado e depois como
autônomo. O excesso de tempo livre, de não trabalho, tornou-se um pesado fardo e
passou a afetar sua estabilidade emocional. Em suas palavras: “E como antes eu tinha
um horário muito puxado, e depois eu fiquei em casa eu me senti muito mal. E aí
eu fiquei assim até meio fora da casinha. Até que eu cheguei aqui, bem complicado”
(JC, 06/10/2014).
A essa percepção da necessidade de ocupar seu tempo “com algo produtivo”, JC
acrescentou a pretensão de “buscar o que perdi e me atualizar no ensino”. Entretanto,
a questão decisiva parece ter sido a iniciativa de sua esposa – estudante do Curso de
Pedagogia – que realizou sua matrícula e incentivou-o a frequentar as aulas.
Para Flor do Campo, o fator trabalho também não pesou no retorno à escola. Em sua
narrativa a questão mais difícil a ser vencida, ao contrário do que ocorreu com JC,
foi justamente a oposição familiar. Sua mãe, temerosa por sua saúde e pelos perigos
de sair à noite, preferia que ela não voltasse a estudar. Sua estratégia foi narrada da
seguinte maneira: “Esse ano peguei e vim sozinha, me matriculei e depois cheguei em
casa, contei pra ela, comprei material também já, né?” (Flor do Campo, 28/10/2014).
A estratégia parece ter obtido sucesso uma vez que, a despeito de suas dificuldades,
ela conseguiu permanecer no Programa e concluir o Ensino Fundamental.
Já para Adriano, Pink e Betão a decisão de matricular-se no Programa justificou-se
pelas demandas do mercado de trabalho. No caso de Adriano e de Pink, a expectativa
era de ampliarem suas chances de conseguir melhores colocações. Nas palavras dele:
“Na prática eu sei tudo, faço tudo. Só que eu já perdi muita oportunidade em empresa
grande por não ter estudo. A gente chega lá com a prática, e pra eles não interessa.
Não tenho o canudo” (Adriano, 15/10/2014). E, nas palavras dela:
Até pra servente de limpeza precisa ter e eu não tinha [Ensino Fundamental completo].
Ai eu não conseguia nada, eu fiquei uns quatro meses desempregada, não conseguia
porque não tinha estudo. Agora tenho certeza que final do ano eu pego ali o diploma,
daí já consigo outra coisa melhor (Pink, 20/11/2014).
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Para outros o fator preponderante da experiência no Programa não passou
especificamente pela constituição ou relação entre saberes formais, mas sim pela
constituição de sociabilidades e por relações de afeto. Pink, por exemplo, destacou
a convivência e as amizades. Segundo ela, lembrará sempre
Das professoras e dos colegas [...] que são muito queridos, principalmente a professora
que, nossa, ela tá sempre assim, a gente falta dois dias e ela tá mandando mensagem.
Ela se preocupa, então não é aquela coisa aluno aqui só no colégio, não. Fora do colégio
também ela se preocupa (Pink, 20/11/2014).
13 Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da
acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida (BRASIL, 2000b).
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 151-171, fev. 2017 a mai. 2017. 165
20/11/2014). A seguir, relatou uma conversa que a professora titular realizou com
a turma: “A professora falou pra nós estudar pra fazer o ENEM, que daí passa. Eu
queria tentá fazê, sabe?” (Pink, 20/11/2014).
Esse conjunto de respostas permite refletir sobre os inúmeros fatores presentes na
definição e na complexidade de se estabelecer projetos de futuro. Para Gilberto Velho,
“as trajetórias dos indivíduos ganham consistência a partir de delineamento mais
ou menos elaborado de projetos com objetivos específicos”. Entretanto, segundo o
mesmo autor, “a viabilidade de suas realizações vai depender do jogo e da interação
com outros projetos individuais ou coletivos, da natureza e da dinâmica do campo
de possibilidades” (Velho, 1994, p. 47). Resta então a questão de quanto e como
a conclusão do Programa pode ter influído na reconstituição, reformulação ou
ampliação do “campo de possibilidades” dos sujeitos dessa pesquisa. Esse é o mote
de análise do próximo tópico, no qual se tratará das atividades desenvolvidas no
Programa, com base na observação realizada ao longo do ano letivo.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 151-171, fev. 2017 a mai. 2017. 167
Entretanto, preponderam nas respostas dos que tentaram e interromperam, queixas
relativas ao desapontamento com a dinâmica dos novos ambientes escolares.
Especialmente a divisão disciplinar do conhecimento, que resultava no contato
fragmentado e, não raro superficial, com um número maior de docentes e pela difícil
convivência com colegas adolescentes em sala de aula,ou seja, ressentiam-se da
descontinuidade metodológica em relação à experiência no PAIA.
Considerações finais
Quando se iniciou a pesquisa aqui apresentada, havia certa tendência, um
tanto ingênua, de considerar que o acesso e a finalização do Ensino Fundamental
garantiriam aos alunos investigados a possibilidade e a intencionalidade de
planejarem seu futuro. Esse planejamento, na hipótese original, deveria contemplar
a continuidade dos estudos e, com isso, a garantia de maior estabilidade pessoal e
profissional. A retomada do contato com os sujeitos da pesquisa mostrou o quão
distante da realidade essa formulação estava.
A desestabilização causada por tal constatação demandou um novo esforço
interpretativo. Este foi realizado com base na leitura das proposições do historiador
François Hartog (2013), especialmente suas reflexões sobre o “regime de historicidade”
dominante na sociedade contemporânea: o “presentismo”. Resumidamente, pode-se
dizer que essa noção elege o momento presente como definitivo, não conferindo
relevância ao passado e não atribuindo esperanças ao futuro que passa a ser visto
mais como ameaça do que como promessa. As demandas da manutenção da vida,
da sobrevivência num “presente eterno”, vivido na velocidade do instante, sem
esperanças e sem planos de continuidade caracterizam a “ascensão do presentismo”
(Hartog, 2013, p. 140).
Ao longo da investigação refletiu-se sobre o quanto as vivências escolares, em
geral, e a experiência aqui analisada, em particular, estão imersas nessa lógica. As
observações acima apresentadas identificaram rotinas que tanto desconsideram a
riqueza da experiência de vida, do passado, dos alunos – que foram em alguma medida
conhecidas nas entrevistas realizadas – quanto abrem mão de pensar possibilidades
de futuro em conjunto com eles. Tal situação pode ser percebida, por exemplo, na
descontinuidade metodológica observada na transição do Ensino Fundamental para o
Médio e na inexistência de diálogo entre as esferas municipal e estadual que poderiam,
trabalhando em conjunto, oferecer uma modalidade de ensino mais compatível com
o público da EJA. Conclui-se que o Programa Ação Integrada Adultos tem méritos
inegáveis, reconhece-se o engajamento dos profissionais envolvidos, mas nota-se
ainda a necessidade de interação entre as formulações presentes nos documentos
Referências:
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 151-171, fev. 2017 a mai. 2017. 169
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Márcia Regina da Silva é Mestra em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos
Sinos/Unisinos. Professora da Rede Municipal de Ensino de Esteio/RS. Integrante do
grupo de pesquisa Mediações Pedagógicas e Cidadania (CNPq). Email: maresiasol@
outlook.com
Isabel Bilhão é Doutora em História Social pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul/UFRGS. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Vale do Rio dos Sinos/Unisinos. Pesquisadora dos grupos de pesquisa Mediações
Pedagógicas e Cidadania e Educação no Brasil: memória, instituições e cultura escolar
(CNPq). Email: iabilhao@gmail.com
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Operação de divisão: possibilidades de intervenção
com jogos
Sonia Bessa
Universidade Estadual de Goiás
Resumo
A pesquisa teve como objetivos investigar o nível de compreensão da operação
de divisão pelos alunos do 4º ano do ensino fundamental; realizar intervenção
com jogos de regras e desafios específicos para o desenvolvimento da operação
de divisão. Fizemos uma intervenção pedagógica com 13 alunos que utilizou o
método clínico e foi eficaz na construção da operação de divisão aritmética pelos
estudantes que não a possuíam, pois os estudantes apresentaram expressivos
progressos nas noções aritméticas. A utilização de jogos e desafios mostrou que
podem atender necessidades cognitivas e afetivas dos estudantes.
Resumen
La pesquisa objetivó investigar el nivel de comprensión de la división por parte de
los alumnos del 4º grado de la Enseñanza Primaria; y realizar una intervención con
juegos de reglas y desafíos específicos para desarrollar la operación de división.
La intervención pedagógica realizada con 13 alumnos, utilizó el método clínico
y se mostró eficaz en la construcción de la operación de división aritmética que
los estudiantes no poseían y cuyos progresos en las nociones aritméticas fueron
expresivos. La utilización de juegos y desafíos mostró que pueden atender las
necesidades cognitivas y afectivas de los estudiantes.
Abstract
The research aimed to investigate the level of understanding of division by the
students of 4th year of elementary school; performing intervention with sets of
game rules and specific challenges for the development of the division operation.
We have made a pedagogical intervention with 13 students which used the clinical
method and was effective in building the arithmetic division operation by students
who did not have it, because the students showed significant progress in arithmetic
notions. The use of games and challenges showed that they can meet cognitive and
affective needs of the students.
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 172-196, fev. 2017 a mai. 2017. 173
Opération de division: possibilités d'intervention
avec des jeux
Resumé
La recherche visait à étudier le niveau de compréhension de la division par les élèves
de la 4e année de l'école élémentaire; effectuer une intervention avec les règles et
les défis spécifiques des jeux pour le développement de l'opération de division. Nous
avons fait une intervention pédagogique avec 13 étudiants. La méthode clinique
utilisée a été efficace dans la construction de l'opération de division arithmétique
par les étudiants qui ne l'avaient pas, parce que les étudiants ont montré des
progrès significatifs dans les notions arithmétiques. L'utilisation des jeux et des défis
a montré qu'ils peuvent répondre aux besoins cognitifs et affectifs des élèves.
Introdução
A distribuição envolve uma nova visão das relações parte todo, que difere de tais relações
em situações aditivas. Na distribuição há três valores a serem considerados: o total, o
número de receptores e a quota (ou o tamanho da distribuição). A quota e o número
de receptores estão em relação inversa um com o outro: enquanto um cresce o outro
diminui. A distribuição também envolve um outro tipo de número, as frações. (NUNES;
BRYANT, 1997, p.151)
A inserção de situações que exigem a divisão equitativa, por exemplo, deve acontecer
desde os primeiros anos do ensino fundamental. Kamii (2015, p. 91) defende a inserção
de problemas de divisão equitativa em classes de primeiro ao 5o ano do ensino
fundamental: "[...] problemas de divisão equitativa podem ajudar as crianças a aprender
e compreender as frações."
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 172-196, fev. 2017 a mai. 2017. 175
Para Morgado, na operação de divisão, encontram-se envolvidas duas estratégias, a
de subtração repetida e a de repartição de quantidades; a autora defende que, para
solucionar problemas dessa natureza, as crianças utilizam diversos procedimentos:
Exemplo: “25 ÷ 5, são 25 – 5 = 20 – 5 = 15 – 5 = 10 – 5 = 5, logo são 5. Repartição
de quantidades consiste em averiguar qual o número de vezes que o divisor é contido
pelo dividendo. Exemplo: 30 ÷ 5, são 5 + 5 + 5 + 5 + 5 + 5, logo são 6” (MORGADO,
1993, p.69-70).
Para Nunes et al. (2001), o conceito de divisão envolve a compreensão das
relações entre os três valores, representados pelo dividendo, pelo divisor e pelo
quociente. As crianças precisam compreender que, quanto maior for o número a
dividir (divisor), mantendo-se o dividendo constante, menor será o número final
(quociente); quanto maior o dividendo, mantendo-se o divisor constante, maior será
o quociente.
A compreensão inicial e intuitiva que a criança tem da divisão como o ato de repartir
deve progredir; uma vez que a divisão implica em subtração, multiplicação, divisões
sucessivas, busca de um quociente, pode ocorrer de não ter um resultado exato ou
ainda resultar em frações. Requer considerar simultaneamente o todo e as partes, bem
como a relação inversa entre o tamanho e o número das partes.
Até chegar à lógica das proposições existe um longo caminho a ser percorrido. Duro
e Becker (2015) fizeram uma pesquisa com 18 estudantes do ensino médio regular
com o intuito de compreender o pensamento combinatório na resolução de situações
experimentais. Os autores concluíram que a construção da combinatória passa por
patamares de equilíbrio que independem da idade ou série do estudante. O ensino
escolar não garante a construção da combinatória, sobretudo se a aprendizagem,
dele decorrente, consistiu em uma experiência de memorização mecânica, sem
maior significado cognitivo. Esses resultados vêm corroborar o que disseram
Inhelder e Piaget (1976, p.39): “[...] combinatória completa é precisamente o que
caracteriza o pensamento formal, cuja estrutura ultrapassa os agrupamentos aditivos
ou multiplicativos de classes e de relações e cria a estruturação de uma lógica de
proposições”.
Piaget (1976) já havia previsto quanto à síntese das estruturas anteriores de
agrupamento e que ao se tornarem combinatórias, as operações comportam todas
as combinações, ou seja, as inversões e as reciprocidades. Comuns ao fechamento
do pensamento operatório concreto.
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a uma boneca, e outra boneca, assim até repartir as seis. Aparentemente a criança
resolveu o problema, porém resolveu outro problema: a correspondência termo a
termo. Outra maneira de tratar esse problema é considerar as seis maçãs como um
todo contínuo, como se as seis maçãs formassem um retângulo. A criança visualiza
o meio do retângulo, coloca seu braço sobre ele e separa, de um lado e de outro, de
três em três maçãs. Desta maneira, a criança chega também a uma solução correta.
Porém é a noção de “meio” que lhe permite encontrar a metade. Muitas outras vezes,
pedir a metade de seis maçãs ativa outros esquemas, por exemplo, o esquema de
cortar cada maçã. Uma criança pequena pode fazê-lo, podendo também repartir as
metades que obteve e chegar a um resultado correto. Pode também, sem chegar à
solução correta, mostrar que a metade é a metade de uma só maçã ou ainda pode
mostrar todas as metades de todas as maçãs, ou ainda pode indicar que a metade
de todas as maçãs são algumas metades.
Uma criança maior de 9 ou 10 anos que proceda da mesma maneira (cortar as maçãs)
ver-se-á diante de problemas novos que não esperava e que podem perturbá-
la. Se a criança se coloca problemas novos, e se o resultado de sua própria ação
(ter cortado todas as maçãs) a perturba é porque está tratando de resolver outro
problema diferente do repartir coisas. A criança coloca o problema de coordenar
a participação de cada elemento (maçã) com a participação do conjunto. Assim,
esperando encontrar menos quando quer dar a metade, encontra mais, porque ao
dividir cada maçã multiplica o número de elementos. Confunde a coisa e o número,
a metade e o dobro. Esta confusão faz com que a criança não saiba qual é o valor
da unidade: a metade por referência à coisa, ou a metade por referência ao número.
Estes diferentes problemas provêm do fato de que a criança considera um referente
duplo, porém não é ainda capaz de coordená-los: a metade em relação a cada
elemento e a metade em relação ao conjunto.
Crianças pequenas são capazes de dividir o lanche, ou as figurinhas e até os pontos de
um jogo recém-concluído, mas segundo Kamii (2008), Macedo, Petty e Passos (2005)
Mantovani de Assis (2013) e Piaget (2013b) esses são conhecimentos espontâneos que
fazem parte da vida das crianças. O exemplo citado permite perceber a complexidade
da operação de divisão que requer um processo de sucessivas abstrações.
Essa construção não ocorre de modo abrupto, mas implica numa estrutura de grupo
que implica na reversibilidade. Essas duas reversibilidades vão implicar na construção
das operações lógico-matemáticas. As duas formas de reversibilidade mencionadas
por Piaget (2013a) são a reversibilidade por inversão ou negação cuja característica
reside em uma operação inversa, composta com a operação direta correspondente,
resultado numa anulação: + A - A = 0 e a reversibilidade por reciprocidade das relações,
cuja característica reside em que a operação inicial, composta com a sua recíproca,
renda numa equivalência. A reciprocidade é a forma de reversibilidade que caracteriza
os agrupamentos de relação. Essas duas formas de reversibilidade atuam isoladamente
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Metodologia
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A intervenção consistiu em 13 encontros semanais com duas horas de duração.
O trabalho aconteceu em pequenos grupos de dois a três alunos, e no pré e pós-
testes individualmente com a pesquisadora. Ao final da intervenção foi realizado o
pós-teste, com o mesmo instrumento do pré-teste. Os jogos de regras e desafios
escolhidos permitiram aos estudantes estabelecer relações e coordenações entre
as ações e chegar à dedução lógica e à inferência.
1. A 4º ano 9 I II
2. B 4º ano 9 - III
3. C 4º ano 9 - III
4. D 4º ano 9 II III
5. FM 4º ano 9 - II
6. GM 4º ano 9 I II
7. GC 4º ano 9 I II
8. I 4º ano 9 II III
9. JV 4º ano 9 I II
10. J 4º ano 9 I II
11. K 4º ano 9 II III
12. L 4º ano 9 II III
13. R 4º ano 9 - II
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Esses resultados permitem afirmar que no pré-teste nenhum dos estudantes foi capaz
de fazer compensação e antecipação, os que apresentaram a conduta II conseguiram
realizar correspondências biunívocas, isto é, termo a termo entre o objeto desejado
e o valor correspondente do dinheiro, mas, de forma intuitiva, não perceberam a
operação "n vezes", e não coordenaram as variáveis implícitas na divisão.
Após a intervenção pedagógica, no pós-teste, verifica-se um quadro bem mais
animador. Os estudantes apresentaram expressivos progressos, quanto à operação
de divisão. Houve uma significativa evolução das condutas do pré ao pós-teste.
No pré-teste, 5 estudantes estavam na conduta mais elementar, ou seja, a conduta I
e quatro estudantes não conseguiram concluir a atividade. A conduta I corresponde às
crianças que afirmam não poder comprar nenhuma outra coisa, ou somente objetos
que custam R$ l,00 não admitindo a possibilidade de fazer diferentes composições,
nem mesmo com conjuntos equivalentes. Somando-se o número dos estudantes da
conduta I com o número daqueles que não conseguiram concluir a atividade, verificou-
se que 9 estudantes do universo de 13 tiveram muita dificuldade na operação de
divisão.
Somente 4 estudantes alcançaram a conduta II que ainda é muito elementar. São
aquelas crianças que tentaram operar com conjuntos equivalentes, mas ainda
não existia uma compensação exata entre o número de conjuntos e o número de
elementos de cada conjunto dentro do mesmo todo. Parece haver um início de
tomada de consciência de que se comprarem mais objetos, têm de ser mais baratos
e vice-versa, sem que se chegue a uma quantificação exata. Os estudantes não
percebiam a necessidade de coordenação entre as três variáveis: multiplicando,
multiplicador e resultado final. Utilizavam procedimentos empíricos para alcançar
os resultados, tinham dificuldade em perceber as possibilidades de distribuição do
todo, característico da operação de divisão, não faziam antecipações com ou sem
suporte empírico.
No pós-teste após a intervenção pedagógica a evolução foi visível. Dos 5 estudantes
que estavam na conduta I, e dos 4 que não conseguiram concluir a atividade, todos
evoluíram para melhores condutas. Os outros 4 que estavam na conduta II evoluíram
para a conduta III. No pós-teste 6 conseguiram chegar à conduta III. Nessa conduta
a criança ainda não é capaz de fazer antecipações corretas, mas chega a uma
solução por meio de tentativas que podem começar desde um tateio assistemático,
compreendendo algumas propriedades, até um tateio sistemático, com todas as
possibilidades de distribuição do todo.
No pré-teste nenhum dos estudantes encontrava-se nesse nível, portanto houve uma
significativa evolução nas condutas da divisão para os alunos que participaram da
intervenção pedagógica. Ou seja, quase a metade da amostra chegou a essa conduta.
Nenhum dos estudantes chegou à conduta IV da divisão, que corresponde às crianças
que antecipam as possíveis composições do todo com os respectivos conjuntos
Conduta 1 5 -
Conduta 2 4 7
Conduta 3 - 6
Conduta 4 - -
Não concluiu a prova 4
Fonte: dados elaborados pelas pesquisadoras.
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de 1 a 5, os jogos de tabuleiro como o "esconderijo", "prova da corrida", "zigue zague"
e "paraquedas". Os jogos "pegue 10", "encontre 10", "memória de 10" e "desça 10"
apelam para a construção das dezenas, relações numéricas e valor posicional. Esses
jogos, com ênfase na unidade e dezena simultaneamente, auxiliaram na retomada
dos conceitos básicos de adição, subtração e cálculo mental com números de 1 a
10. Todos os jogos mencionados são de autoria de Kamii (2002 e 2008), e foram
adaptados para essa ocasião pelas pesquisadoras.
Inicialmente, todos os estudantes apresentaram muita dificuldade em realizar
operações bem elementares como 2 + 2 ou 5 + 5 ou até mesmo 5 + 1 nas situações
de jogos. Eles foram alertados que eram livres para usar materiais de contagem como
fichas, palitos ou qualquer outra coisa que quisessem. Quase todos os estudantes
preferiram usar os dedos, quando o número ficava maior recorriam às marcas de
contagem. Um dos estudantes desenhou 12 "tracinhos" (marcas de contagem) em
seguida escreveu 12 + 12 + 12 + 12. Quando perguntado por que fez as marcas de
contagem, respondeu que era para não esquecer quantos 12 ele precisava somar.
Alguns estudantes recorriam aos dedos e marcas de contagem ao mesmo tempo.
Uns poucos recorreram aos palitos e faziam a correspondência do número de palitos
com o número de pontos que deveriam somar, para continuar o jogo.
Kamii (2008), afirma que esse é um procedimento normal quando os estudantes
ainda não conseguem perceber a inclusão hierárquica que é a capacidade mental
de incluir "um" em "dois", "dois" em "três", e assim sucessivamente. É como se o
todo não existisse, elas conseguem até pensar no todo, mas não quando estão
pensando nas partes. "[...] Para comparar o todo com a parte, o estudante tem que
executar duas ações mentais ao mesmo tempo - dividir o todo em duas partes e
fazer com que essas duas partes voltem a formar o todo [...]" (KAMII, 2008, p.16).
Faltou aos estudantes a reversibilidade do pensamento, conforme descrita por
Piaget (2013a).
As crianças do quarto ano utilizavam com destreza os algoritmos das quatro
operações, contudo pelos resultados verificados no pré-teste, é possível que o
conhecimento e uso dos algoritmos não garantiram a compreensão das operações.
Os estudantes não percebiam a conservação lógica, nem a coordenação entre o todo
e as partes. O longo tempo utilizando o algoritmo de forma mecânica e destituída
de compreensão pode ter contribuído para a não compreensão das operações.
"A conservação do número não é abstraída dos objetos, pois para chegar a essa
operação o estudante precisa basear o seu julgamento num raciocínio dedutivo
que supõe a coordenação de suas próprias ações" (MANTOVANI DE ASSIS, 2013,
p. 79). Ao trabalhar com os jogos de regras e desafios, saindo do plano concreto
para chegar ao abstrato, os estudantes foram paulatinamente compreendendo os
processos implícitos nas operações.
- "B" - Vou lhe vender este carrinho. Coloque aqui o dinheiro suficiente para
comprá-lo.
- R$ 3.
- Quanto você pagou por ele?
- R$ 3. (Recolho este objeto e coloco 4 carrinhos).
- Coloque o dinheiro necessário para comprar todos esses carrinhos.
- R$ 12.
- Quanto dinheiro tem aí?
- R$ 12.
- Como é que você sabe que precisa de todo esse dinheiro para comprar esses
objetos?
- Fiz 4 x 3 = 12.
- E agora o que você gostaria de comprar?
- Peão.
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- Quanto custa?
- R$ 9.
- E para comprar todos esses (3)?
- R$ 27.
- Como você descobriu quanto dinheiro você precisava?
- 9 x 3 = 27.
- O que você gostaria de comprar?
- Mãozinha.
- Quanto custa?
- R$ 1.
- E para comprar todos estes (5)?
- R$ 5.
- Como você fez para descobrir quanto dinheiro você precisava?
- 5 x 1.
- Quais dos objetos sobre a mesa daria pra você comprar com estas fichas
(18) de tal maneira que não sobre e nem falte nenhuma ficha, mas que todos
os objetos sejam iguais?
- 6 carrinhos (R$ 3). (contou as fichas separando em agrupamentos de dois
em dois, depois de três em três até descobrir qual objeto poderia comprar).
- Como é que você sabe que dá para comprar 6 carrinhos?
- Contando o dinheiro de 3 em 3 aí descobri.
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Outro jogo utilizado na intervenção foi o chamado “atividades com dados”. Esse jogo
explora os conceitos de adição, multiplicação e divisão. Permite ao aluno realizar
diferentes procedimentos: cálculo mental, conservação numérica, construção da
multiplicação aritmética passando pelos procedimentos aditivos e multiplicativos
até a reversibilidade completa necessária à divisão.
Participaram dessas atividades os alunos “D”, “K” e “L”. Iniciou-se com duas fichas. Os
alunos deveriam colocar duas fichas para cada ponto que caiu do dado. Inicialmente
os alunos tiveram dificuldades de entender o princípio multiplicativo, mas quando
entenderam, gostaram muito do jogo. Passou-se então para 3 pontos. Eles deveriam
colocar 3 fichas para cada ponto que tirou no dado. Inicialmente eles utilizaram 1 dado
e depois 2 dados. Cada estudante trabalhava com um valor que tirava no seu dado.
Um dos alunos tirou 7 pontos nos dados,então ele iria trabalhar com 7 x 3 enquanto
o colega (K) tirou 9 pontos nos dois dados. Perguntei a “K”:
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Nos jogos de estratégia, os alunos foram aos poucos percebendo que poderiam
impedir que o colega ganhasse se jogassem no local correto, com esse exercício
eles se obrigavam a descobrir a jogada mais conveniente para impedir que o outro
grupo ganhasse. Os jogos também requeriam dos alunos cálculos mais sofisticados
e complexos, eles inicialmente utilizaram os dedos, mas à medida que jogavam se
desvencilharam do suporte material e recorriam ao cálculo mental. É possível que
a intervenção pedagógica foi capaz de provocar melhores condutas nas operações
de divisão.
Considerações finais
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Referências
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NguyenThuong Lang
Universidade Nacional de Economia - Vietnã
Resumo
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Política de educação profissional no Vietnã:
ofertas formativas sob a vigência da integração
internacional
Abstract
The article presents the changes that have taken place in the paradigm of
professional education policy in Vietnam during the process of shifting from a highly
centralized economy to a market economy oriented towards socialism in the midst
of proactive international integration. Using the evidence-based method and the
historical approach to the process demonstrates how the policy structuring phases
occurred: 1981-1999, 2000-2015 and beyond 2016. The professional education
policies of Vietnam have a clear objective to meet the state's plan and the needs of
the labor market.
Resumen
El artículo presenta los cambios en el paradigma de la política educativa en Vietnam
durante el proceso de pasar de una economía planificada altamente centralizada a
una economía de mercado al socialismo en medio de una integración internacional
proactiva. Al utilizar el metodologia basado en la evidencia y el enfoque histórico del
proceso, se muestra como ocurrió fases de estructuración de la política: 1981-1999,
2000-2015 y desde 2016. Las políticas de educación profesional de Vietnam, tiene
claro objetivo para cumplir con el plan del estado y las necesidades del mercado
laboral.
Introdução
O Vietnã tem sido modelo de uma dinâmica integração internacional com o resto
do mundo desde 2001. A troca bidirecional do comércio, investimentos e outros
entre o Vietnã e o resto do mundo tem sido crescente. Este processo traz para o
Vietnã uma série de oportunidades e desafios para a educação profissional. A fim
de aproveitar todas as oportunidades e superar os desafios, é necessário construir e
implementar políticas eficazes de educação profissional.
Durante o período da economia centralizada, antes de 1986, o Vietnã tinha adotado
o mesmo modelo de educação profissional da antiga União Soviética. A partir de
1986, período de economia de mercado socialista, que é a combinação de produção
industrial com forte expansão do ensino, e é percebida como essencial para que
a educação técnica e profissional possa adaptar-se às mudanças na estrutura da
economia, a educação profissional assume um novo formato combinando as demandas
do mercado de trabalho interno e as pressões internacionais. Em ambos os períodos,
a política de educação profissional do Vietnã obteve resultados notáveis, mas também
apresentou algumas limitações. Além disso, há fatores decorrentes da integração
internacional, como a presença de um grande número de estrangeiros no Vietnã à
procura de empregos e a forte concorrência dos bens importados que impulsionam
Linhas Críticas, Brasília, DF, v.23, n.50, p. 197-217, fev. 2017 a mai. 2017. 199
a massa de desempregados, que não dispunham de meios adequados para acessar a
educação profissional. No período 2002-2015, anualmente, o número de estudantes
do ensino médio no Vietnã aumentou de 2,4 a 3 milhões, representando 2,6 a 3%
da população (Figura 1), o que coloca forte pressão sobre a demanda por emprego
no mercado de trabalho. Dentro da composição educacional do Vietnã tem ocorrido
uma notável desproporção entre a oferta de cursos de graduação e a pós-graduação,
a faculdade e a formação técnico-profissional, em comparação com o mundo. No
Vietnã, a proporção é de 10:1, 3:0,92 enquanto no mundo a proporção é de 1:4:10
(Tuan, 2016).1
1 No Vietnã há 10 cursos de graduacões para cada 1,3 cursos de pós-graduacões e 0,92 cursos técnicos. Enquanto
que no resto do mundo, há 1 curso de graduacão para cada 4 cursos de pós-graduacões e 10 cursos técnicos.
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A revisão da literatura sobre a política de educação profissional
2 (http://www.dictionary.com/browse/vocational-education)
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Para a implementação do Decreto 126 / CP do Governo, o Ministério da Educação
era responsável pela educação geral, excluindo o ensino superior naquela época. A
carta Circular 33, de 17 de novembro de 1981, detalhou melhor qual seria o foco da
educação profissional:
- Estabelecer as necessidades para a formação profissional na escola para educar
a atitude do estudante em relação ao emprego e sua percepção correta sobre a
profissão; para organizá-los para a prática e para ser absolvido em algumas ocupações
principais e específicas dos locais; para compreender sobre a aptidão, tendências
da profissão de cada aluno, para incentivar, orientar e atualizar suas capacidades
profissionais da forma mais adequada; para mobilizá-los na abordagem para atuarem
nas indústrias e nas regiões que precisam de jovens qualificados.
- Fornecer as orientações para a implementação das tarefas da educação profissional,
uma vez que deve basear-se na educação abrangente e multifacetada; a tendência
para o desenvolvimento cultural, econômico das localidades, a demanda por emprego
da força de trabalho na reserva das localidades e do país; e seu conteúdo, forma e
metodologia devem ser adequados às características dos alunos em termos de saúde,
idade, nível educacional, etc.
- Regulamentar quatro tipos de atividades do ensino profissional como a educação
dos sujeitos (cultivo, alimentação animal, mecânica, técnica elétrica e eletrônica),
por meio da participação direta nas atividades de produção (bordado, artesanato),
introduzindo sobre as profissões novas ocupações nas localidades ou no país) e
realizando as atividades extras (fórum, exposição ou intercâmbio entre associações
profissionais, pais com alunos).
- Estabelecer o mecanismo de implementação do ensino profissional dentro do
sistema educativo nacional desde a atribuição das funções dos diretores das escolas,
as responsabilidades dos professores, as funções de gestão do Departamento de
Educação das localidades em nível provincial e municipal aos ministérios e outras
agências relacionadas. O Ministério da Educação foi responsável por acumular a
experiência, elaborar o currículo e fornecer os materiais de aprendizagem das tarefas
de implementação.
A Lei da Educação em 1998 é o primeiro marco legal da educação no Vietnã a qual
estipula que a educação geral contém 2 níveis de ensino tal como a escola secundária
que, variando do 6º ao a 9º ano, ou da idade de 11 a 15 anos e o ensino médio,
que varia entre 10º ao 12º anos ou desde os 16 aos 18 anos (artigo 22º). Após a
conclusão de cada nível de ensino, é concedido aos alunos os diplomas de ensino
secundário ou de ensino médio. O ensino secundário profissional é realizado em um
período de 3 a 4 anos de estudos para os alunos com diploma de ensino secundário
e de 1 a 2 anos de estudos para aqueles com diploma de ensino médio. A formação
profissional é conduzida em menos de 1 ano para o programa profissional de curta
duração ou programa pré-profissional, ou de 1 a 3 anos de longa duração para o
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tratam essa educação de forma independente (dos artigos 28 a 33) da Lei da Educação
(versão 1998) e concomitante; há a ampliação de conteúdos na Lei Revisada de
Educação em 2005, 2009, 2013 e 2015, dessa maneira, a formação profissional
torna-se disciplina obrigatória no currículo do ensino secundário e médio no Vietnã.
A Lei da Educação elaborada em detalhes no Decreto de regulamentação 33 / CT-
BGDĐT e promulgada pelo Ministério da Educação e Formação, em 23 de Julho de
2003, teve como objetivo melhorar a formação profissional dos alunos do ensino
secundário e médio em 5 pontos principais expostos a seguir:
1) melhoria da percepção dos gestores e professores sobre o significado, o
propósito, o conteúdo e as medidas para implementar a educação profissional
para os alunos do ensino médio e secundário;
2) classificação dos objetivos da construção do currículo, do seu melhoramento,
das escolhas dos livros didáticos para alunos e professores, do processo de
ensino de todas as disciplinas e da organização das atividades extras em todos
os níveis de ensino, do primário ao ensino médio;
3) execução, com seriedade, das atividades da educação profissional em todas
as escolas secundárias, de ensino médio e nos centros de educação técnica para
compreender a educação técnica baseado nos materiais didáticos publicados
pela Editora da Educação, gerida pelo Ministério da Educação e Formação,
em paralelo com um grupo alocado em cada escola para conduzir esse tipo de
educação;
4) melhoramento da qualidade do ensino profissional e expansão em escala
para assistir os estudantes no entendimento e aquisição de competências
profissionais . O Departamento de Educação e Treinamento das províncias
alocaram em todas as escolas e nos centros de educação técnica, de forma
obrigatória, um grupo de planejamento de ensino profissional, para verificação
do processo de aprendizado e da evolução dos resultados dos estudantes para
assim, serem capazes de conceder o certificado;
5) aquiescer o papel do departamento estadual ou municipal de Educação
e Formação e de outras agências estatais relacionadas com a educação
profissional, como companhias, indivíduos e organizações da sociedade civil e
as suas respectivas unidades do Partido Comunista para construir uma sinergia
a fim de atingir os objetivos desta educação.
Nesse período, a Lei da Educação revisada em 2005, 2009, a Lei da Educação de
2013, a Lei do Ensino da Educação Profissional de 2006, a Constituição revisada
de 2013, a Resolução 29/NQ-TW 2013 e a Lei da Educação Profissional de 2014,
institucionalizaram e melhoraram a regulamentação sobre a educação profissional.
Além disso, difere basicamente da Diretiva 33 na qual há mais responsabilidade do
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escolas de ensino secundário e superior, foram criadas várias instituições de ensino
profissional com instalações modernas (eletrônica, mecânica, dispositivos elétricos,
redes de negócios, informática, etc.) para satisfazer a procura crescente de formação
profissional (Cao, 2016). No entanto, o ensino profissional nas escolas secundárias e
de ensino médio não tem sido eficaz com os projetos de financiamento com capital
estrangeiro como da Samsung (Coreia do Sul), Cannon (Japão) e Intel (EUA), devido à
suas elevadas exigências de conhecimento técnico em mecânica, eletrônica e produtos
de alta tecnologia, o que demonstra que o investimento na melhoria da qualidade da
educação profissional deve ser uma prioridade.
Outro fato interessante é que desde o ano de 2014 muitos estudantes do ensino
médio não participaram da matrícula universitária, por exemplo, na província de Nghe
An, localizada no centro do país e famosa pela tradição de buscar certificação de
cursos em todo o Vietnã. Naquele ano, houve a diminuição de 21.159 (cerca de 27%)
pedidos de matrícula universitária em comparação com 2013 (Duc, 2014). Assim,
é possível perceber uma mudança da percepção da sociedade em relação à busca
por uma forma de educação que aprimore as suas competências profissionais e que
não apenas certifique, assim, talvez, este seja um sinal para o desenvolvimento da
educação profissional nos próximos anos.
A política de educação profissional para estudantes do ensino médio e secundário no
Vietnã entre 1981 e 2015 revelou algumas limitações. Em primeiro lugar, ocorreram
algumas mudanças no processo de transição de um mecanismo de planejamento
centralizado para uma economia de mercado orientada para o socialismo, logo,
a instabilidade política provocou as respostas passivas das escolas secundárias e
do ensino médio às mudanças do mercado de trabalho. Em segundo lugar, houve
imperfeições na percepção dos legisladores sobre o papel e o efeito de transformação
da política de educação profissional no sistema nacional de educação do país como
um todo, de modo que os investimentos para a melhoria da política não se mostraram
eficientes. A identidade cultural do povo vietnamita que priorizava o ensino superior
não tinha sido levada em consideração ao construir e implementar a política de
educação profissional. Em terceiro lugar, a relação entre as instituições formadoras
e as empregadoras não foram aprimoradas de forma adequada. Em quarto lugar,
a relação federativa dos agentes estatais para alcançar os objetivos das políticas
em educação profissional, também, não se mostrou eficiente, assim, ocorreu um
desperdício de esforços descoordenados na implementação da política.
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econômico.
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Considerações finais
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Consultores ad hoc 2017
Adriana Lia Friszman de Laplane Daniela Finco
(Universidade Estadual de Campinas - SP) (Universidade Federal de São Paulo)
218
Luciane Maria Schlindwein Ricardo Neder
(Universidade Federal de Santa Catarina – SC) (Universidade de Brasília - DF)
Otília Dantas
(Universidade de Brasília – DF)
Ranilce Iosif
(Universidade Católica de Brasília – DF)
219
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220
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acima (Tabela 1: título) e da fonte logo abaixo (Fonte: Sobrenome, ano, página).
Margem direita e esquerda justificada.
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7. Deve-se evitar a utilização de notas de rodapé de caráter explicativo. Em caso de
necessidade, a nota de rodapé deverá aparecer numa numeração consecutiva em
algarismos arábicos e com, no máximo, três linhas de extensão, espaço simples, corpo
10.
8. A utilização de itálico no corpo do texto se restringe a palavras estrangeiras.
Recomenda-se evitar termos e citações em língua estrangeira, adotando traduções
ou correspondentes em língua portuguesa sempre que possível.
9. Grafa-se em maiúsculo: Nomes de entidades e organizações; títulos de
documentos; fatos históricos, eventos, datas e eras; inicial da primeira palavra dos
títulos de obras e partes de obras; citações diretas precedidas de dois-pontos.
10. Grafa-se em minúsculo: Títulos e profissões (mestre, professor, pedagogo); áreas
do conhecimento, cursos e disciplinas (ciências humanas, pedagogia, pesquisa em
educação); níveis e modalidades de educação (educação básica, educação superior,
ensino fundamental, educação infantil, educação de jovens e adultos, etc). O uso da
letra minúscula nesses casos está amparado pelo Acordo Ortográfico de 1990, em
vigor no Brasil desde janeiro de 2009.
11. Uso de siglas: maiúsculas quando composta por até três letras (MEC,
PUC); somente inicial maiúscula com mais de três letras, se a leitura como
palavra for possível (Capes, Inep); letras maiúsculas, caso em sua leitura seja
necessário soletrá-la (IBGE, INSS). Devem ser citadas primeiro por extenso, e
em seguida indicadas entre parênteses: Ministério da Educação (MEC). Siglas que
221
tradicionalmente misturem iniciais maiúsculas e minúsculas são mantidas em sua
forma original (CNPq).
As citações ao longo do artigo devem seguir o seguinte formato:
a) Citações com mais de três linhas devem aparecer em parágrafo isolado,
espaço simples, utilizando-se recuo de 1.25 cm na margem esquerda, corpo 11,
sem aspas, seguidas da referência (Sobrenome, ano, p. 12). O ponto final da citação
deve vir após o final da frase, antes, portanto do parêntese, a não ser no caso de
citações de até 3 linhas, inseridas no texto, quando não terminam o parágrafo.
Deve haver um espaço de parágrafo 1.0 antes e um depois da citação.
b) As citações com menos de três linhas devem seguir o formato normal do texto.
Em caso de citação direta, deve estar entre aspas, seguida do sobrenome da
autoria, ano de publicação da obra e página. Exemplos: Segundo Gatti (2002, p.
82), observa-se a falta “[...] de capacidade de teorização, de crítica e de geração
de uma problemática própria” em muitas pesquisas. Ou: ...falta “de capacidade de
teorização, de crítica e de geração de uma problemática própria” (Gatti, 2002, p.
82) em muitas pesquisas...
c) Citação indireta deve estar sem aspas, seguida apenas do sobrenome do autor
e ano de publicação da obra. Havendo mais de um trabalho do mesmo autor, no
mesmo ano, usar a, b, c, imediatamente após a data (Sobrenome, 2010a).
d) Para obras com mais de um autor, usar ponto e vírgula para separar os autores
(Sobrenome; Sobrenome, ano, p. 119). Para quatro ou mais autores, indicar o
primeiro seguido de et al. (Sobrenome do primeiro et al., ano, p. 59)
12. As referências devem seguir a regulamentação da ABNT/NBR 6023:2002.
Devem estar em ordem alfabética, sem abreviatura de prenomes depois do
sobrenome. Para os grifos dos títulos das obras e periódicos deve-se utilizar o itálico,
conforme exemplos abaixo (os subtítulos não são grifados). Devem constar nas
referências somente as obras citadas no corpo do texto (citação direta e indireta,
conforme NBR 10520:2002). Os artigos submetidos com as referências incompletas
ou incorretas não serão encaminhados para a avaliação. Para maiores informações
consulte: < http://www.more.ufsc.br/>
Exemplos:
Livros
SOBRENOME DO AUTOR, Prenomes sem abreviatura. Título do livro: subtítulo.
Local de publicação: Editora, ano de publicação.
222
Capítulos de livros
SOBRENOME DO AUTOR, Prenomes sem abreviatura. Título do capítulo: subtítulo.
In: SOBRENOME DO AUTOR, Prenomes sem Abreviatura. Título do livro. Local de
publicação: Editora, ano de publicação. Páginas inicial e final.
Periódicos
SOBRENOME DO AUTOR, Prenomes sem abreviatura. Título do artigo: subtítulo.
Título do Periódico, Local de publicação, Instituição, número do volume (v.), número
do fascículo (n.), páginas inicial e final do artigo, mês (Exemplos: mar.-maio. set-dez.).
Ano de publicação.
Teses e dissertações
SOBRENOME DO AUTOR, Prenomes sem abreviatura. Título. Ano. N. de páginas
(169 f.). Dissertação (Mestrado em Educação) ou Tese (Doutorado em Educação) –
Programa de Pós-Graduação, Universidade, ano de publicação.
Anais de eventos
SOBRENOME, Prenomes sem abreviatura. Título: subtítulo. In: Nome do evento,
numeração do evento (se houver), ano e local (cidade) de realização, Anais..., local,
editora, data de publicação e página inicial e final. Disponível em: < url, se houver >.
Acesso em: dia mês (abreviado, com exceção de maio). Ano.
Documento eletrônico
SOBRENOME DO AUTOR, Prenomes sem abreviaturas. Título. Edição. Local:
ano. N° de pág. ou vol. (série) (se houver). Disponível em: < >. Acesso em: dia mês
(abreviado, com exceção de maio). Ano.
223
Instructions to authors
Critical Lines accepts for analysis previously unpublished articles by Brazilian
and foreign authors that are consistent, rigorous and original in the approach to
their topic. Articles should be written by a maximum of three authors. It publishes
thematic dossiers, general articles, reviews, tributes and interviews. The journal
does not accept for publication articles resulting from bibliographical reviews.
Papers sent concomitantly to more than one journal will not be accepted.
The article’s’ abstract and keywords should be sent in Portuguese, Spanish,
English and French. Articles should not include any identification of the authors
or institution in any part of the text, and should be submitted through the online
submission system at: http://periodicos.unb.br/index.php/linhascriticas/about/
submissions#onlineSubmissions. The identification information of the author
and institution should be typed in the appropriate fields of the registration page,
including full name, mailing address, a brief résumé, telephone numbers and emails
for contact with readers.
The brief résumé, must be up to five lines long, containing the following information:
last title obtained, institution, area of work or research group, and email address
for correspondence. The editorial committee does not simultaneously examine two
articles by the same author and reserves the right not to publish works by the same
author or co-author in intervals shorter that three issues.
The journal will receive for publication articles in Portuguese, Spanish, French and
English, already revised in their original language. After approval, articles in English
and French will be translated to Portuguese and revised by their authors, In such
cases, the articles will be published in both languages. Articles in Spanish will be
published only in their original language.
For coauthored articles, Critical Lines considers as authors those who have
contributed effectively, intellectually and scientifically, towards producing the paper.
The main author is responsible for the submission and the ethical integrity of the
article as a whole, taking responsibility for each author’s effective participation and
approval of the article’s content. The abbreviation of Critical Lines journal is Critical
Lines, which should be used in bibliographies, footnotes and references.
224
10 thousand characters (with spaces) and must follow the same formatting rules
as articles. The review must contain, in the text, a complete identification of the
reviewed work.
3. Title of article: 12 words maximum, bold, size 16. Titles of sections: bold, size 13,
no numbers. Titles of subsections: bold, size 11, no numbers. There must be a 1.5
paragraph size before and after the titles. Only the initial of the first word should be
in upper case in all titles.
4. Abstract in Portuguese, Spanish and English (between 550 and 700 characters,
including spaces). The abstract must be followed by three to five key words,
separated by periods.
5. Tables, graphs, charts and illustrations should be numbered with Arabic numerals,
in the sequence in which they appear in the text. They must come with a title
immediately above (Table 1: title) and the source immediately bellow (Source: Last
name, year, page). The right and left margins should be justified.
6. Illustrations should electronically entered in JPG, with a 300 dpi resolution, with
dimensions which allow for increasing or reducing them without losing legibility.
7. Explanatory footnotes must be avoided. If necessary, footnotes must be numbered
consecutively, with Arabic numerals, and must be, at the most, three lines long, single
spaced, size 10.
8. Italics should be used, in the body of the text, for foreign words only. We
recommend avoiding terms and quotes in foreign languages, but rather adopting
translations or correspondents in Portuguese, whenever possible.
9. The following should be written in upper case letters: Names of entities and
organizations; titles of documents, historical facts, events, dates and eras; the initial
of the first word of the titles of works and parts of works; and direct quotations
preceded by colons.
10. The following should be written in lower case letters: Titles and professions
(master, professor, teacher); fields of knowledge, courses and disciplines (humanities,
education, research in education); levels and modalities of education (elementary
education, higher education, early childhood education, education for youth and
adults, etc.). The use of lower case letters in these cases is covered by the 1990
Orthographic Agreement, in place in Brazil since January 2009.
11. Use of acronyms: in capital letters when comprised by up to three letters (MEC,
PUC); only the initial letter should be in upper case when comprised of more than
three letters, if it is possible to read it as a word (Capes, Inep); upper case letters if
it is necessary for readability to spell out the letters (IBGE,INSS). They should first
be cited in full and then written between brackets: Ministério da Educação (MEC).
Acronyms that traditionally combine upper and lower case initials are kept in their
225
original form (CNPq).
Quotations throughout the body of the text should follow the following format:
a) Quotations more than three lines long must be in exclusive paragraphs; single
spaced, with a drop of 1.25 centimeters on the left margin, in size 11, without
quotation marks, and followed by a reference (Last name, year, p. 12). The final
period of the quote should come after the end of the sentence, that is, before the
bracket, except in cases of quotes with up to three lines, inserted in the text, that
do not end the paragraph. There must be a 1.0 paragraph space before and after
the quote.
b) Quotations under three lines long should follow the normal format of the text.
Direct quotes should be in quotation marks, followed by the last name of the
authors, year of publication of the work and page. Examples: According to Gatti
(2002, p. 82) a lack of.... “capacity to theorize, criticize or generate one’s own
problems” is observed in much research”. Or: ... a lack of “capacity to theorize,
criticize, and generate one’s own problems” is observed in much research… (Gatti,
2002, p. 82)
c) Indirect quotes should not be in quotation marks, and should be followed only
by the Author’s last name and year of publication of the work. If there is more than
one publication by the same author in the same year, a, b, c, should be included
immediately after the date (Last name, 2010a).
d) For works with more than one author, use a semicolon to separate the authors
(Last name; Last name, year, p. 119). If there are four or more authors, name the
first followed by et al. (Last name of the first et al., year, p. 59).
12. References should follow the ABNT regulation NBR 6023/2002. They must be
in alphabetical order, without abbreviations of first names after the last name. For
emphasis of titles of works and periodicals, italics must be used, as in the examples
below (subtitles should not be in italics). Only the works quoted in the body of the
text should be included in the references (direct and indirect quotes, in accordance
with NBR 10520:2002). Articles submitted with incomplete or incorrect references
will not be forwarded for analysis. For more information consult: < http://www.
more.ufsc.br/>
Examples:
Books
LAST NAME OF AUTHOR, First names without abbreviations. Title of book: subtitle.
Place of publication: Publishing Trust, year of publication
226
Book chapters
AUTHOR’S LAST NAME, First names without abbreviations. Title of Chapter:
subtitle. In: AUTHOR’S LAST NAME, First names without abbreviations. Title of
book. Place of publication: Publishing trust, year of publication. First and last pages.
Periodicals
AUTHOR’S LAST NAME, First names without abbreviations. Title of article: subtitle.
Title of Periodical. Place of publication, Institution, volume number (v.), fascicle
number (n.), first and last page of article, month( example: mar.may. sept.-dec.). Year
of publication.
Theses and dissertations
AUTHOR’S LAST NAME, First names without abbreviations. Title. Year. Number of
pages (169s.). Dissertation (Masters in Education) or Thesis (Doctorate in Education)
– Graduate Program, University, year of publication.
Annals of events
LAST NAME, First names without abbreviations. Title: subtitle. In: Name of
event, number of event (if any), year and location (city) of event, Annals…, locality,
publishing trust, date of publication, and first and last pages. Available at: < url, if
any >. Accessed: date and month (abbreviated, with the exeption of May). Year. day,
month (abbreviated with the exception of May). Year.
Electronic documents
AUTHOR’S LAST NAME, First names without abbreviations. Title. Edition. Location:
year. Number of page or vol. (series) (if any) Available at <>, Accessed: day, month
(abbreviated except for May), year.
227
Instrucciones a los autores
Linhas Críticas acepta para análisis artículos inéditos de autores y autoras brasileños
y extranjeros, que presenten consistencia, rigor y originalidad en el abordaje del
tema. Publica artículos y reseñas científicos sobre cuestiones actuales en educación,
en sus diferentes áreas y líneas de investigación.
Los originales, conteniendo resumen y palabras clave en portugués, español e inglés,
no pueden presentar la identificación de autoría y de la institución, deben ser
encaminados por el sistema de sumisión online <http://seer.bce.unb.br/index.php/
linhascriticas> (ver también: www.linhascriticas. fe.unb.br).
Los datos de identificación deberán ser digitados en los campos apropiados de la
página de registro, incluyendo nombre completo, dirección postal, minicurrículum,
teléfonos y correo electrónico para contacto con lectores. El minicurrículum
debe tener como máximo cinco líneas poseyendo las siguientes informaciones:
última titulación, institución, área y grupo de investigación en que actúa, dirección
electrónica para correspondencia (Email:..). La comisión editorial no evalúa,
simultáneamente, dos artículos de un mismo autor y se reserva el derecho de
no publicar trabajos de un mismo autor o coautor en intervalos menores de tres
ediciones.
228
en JPG con resolución de 300 dpi, con dimensiones que permitan su ampliación o
reducción sin perder la legibilidad.
6. Se debe evitar la utilización de notas de pie de página de carácter explicativo. En
caso de necesidad, la nota de pie de página deberá aparecer en una numeración
consecutiva en números arábigos y con un máximo de tres líneas de extensión,
espacio simple, cuerpo 10.
7. A utilização de itálico no corpo do texto se restringe a palavras estrangeiras.
Se recomienda evitar terminos y citaciones en lengua extrangera, adoptando
traducciones o correspondientes en lengua portuguesa siempre que sea posible.
8. Se escribe en mayúscula: Nombres de entidades y organizaciones; títulos de
documentos; hechos históricos, eventos, fechas y eras; inicial de la primera palabra
de los títulos de obras y partes de obras; citaciones directas precedidas de dos
puntos.
9. Se escribe en minúscula: Títulos y profesiones (maestro, profesor, pedagogo);
áreas de conocimiento, cursos y disciplinas (ciencias humanas, pedagogía,
investigación en educación); niveles y modalidades de educación (educación básica,
educación superior, enseñanza primaria, educación infantil, educación de jóvenes
y adultos, etc). El uso de la letra minúscula em esos casos está amparado por el
Acuerdo Ortográfico de 1990, en vigor en Brasil desde enero de 2009.
10. Uso de siglas: mayúsculas cuando son compuestas por hasta tres letras (MEC,
PUC); solamente la inicial mayúscula con más de tres letras, si la lectura como
palabra es posible (Capes, Inep); letras mayúsculas, en caso de que su lectura sea
necesario deletrearla (IBGE, INSS). Deben ser citadas primeiro integralmente, y
en seguida indicadas entre paréntesis: Ministerio de Educação (MEC). Siglas que
tradicionalmente intercambian iniciales mayúsculas y minúsculas son mantenidas
en su forma original (CNPq).
11. Las citaciones a lo largo del artículo deben seguir el siguiente formato:
a) Citaciones con más de tres líneas deben aparecer en párrafo aislado, espacio
simple, utilizando retracción de 1.25 cm en el margen izquierdo, cuerpo 11,
sin comillas, seguidas de la referencia (Apellido, año, p. 12). El punto final de la
citación debe ir después del final de la frase, antes, por lo tanto del parêntesis , a
no ser en el caso de citaciones de hasta 3 líneas, inseridas en el texto, cuando no
terminan el párrafo. Debe haber un espacio de párrafo 1.0 antes y uno después
de la citación.
b) Las citaciones con menos de tres líneas deben seguir el formato normal del
texto. En caso de citación directa, debe estar entre comillas, seguida del apellido
del autor, año de publicación de la obra y página. Ejemplos: Según Gatti (2002, p.
82), se observa la falta “... de capacidad de teorización, de crítica y de generación de
229
una problemática propia” en muchas investigaciones. O: ... falta “de capacidad de
teorización, de crítica y de generación de una problemática propia” (Gatti, 2002, p.
82) en muchas investigaciones...
c) Citación indirecta debe estar sin comillas, seguida apenas del apellido del autor
y año de publicación de la obra. Habiendo más de un trabajo del mismo autor, en
el mismo año, usar a, b, c inmediatamente después de la fecha (Apellido, 2010a)
d) Para obras con más de un autor, usar punto y coma para separar los autores
(Apellido; Apellido, año, p. 119). Para cuatro o más autores, indicar el primero
seguido de et al (Apellido del primero et al., año, p. 59)
12. Las referencias deben seguir la norma NBR 6023:2002 de la ABNT. Deben estar
en orden alfabético, sin abreviatura de nombres después del apellido. Para los
subrayados de los títulos de las obras y periódicos se debe utilizar el itálico, según
ejemplos expuestos a continuación (los subtítulos no son subrayados). Deben constar
en las referencias solamente las obras citadas en el cuerpo del texto (citación directa
e indirecta, según NBR 10520:2002). Los artículos sometidos con las referencias
incompletas o incorrectas no serán encaminados para la evaluación. Para obtener
más información ver: <http://www.rexlab.ufsc.br:8080/more/index.jsp>
Ejemplos:
Libros
APELLIDO DEL AUTOR, Nombres sin abreviatura. Título del libro: subtítulo. Local
de publicación: Editora, año de publicación.
Capítulos de libros
APELLIDO DEL AUTOR, Nombres sin abreviatura. Título del capítulo: subtítulo.
In: APELLIDO DEL AUTOR, Nombres sin Abreviatura. Título del libro. Local de
publicación: Editora, año de publicación. Páginas inicial y final.
Periódicos
APELLIDO DEL AUTOR, Nombres sin abreviatura. Título del artículo: subtítulo.
Título del Periódico, Local de publicación, Institución, número del volumen (v.),
número del fascículo (n.), páginas inicial y final del artículo, mes (Ejemplos: mar.-mayo.
sep.-dic.). Año de publicación.
Tesis y disertaciones
APELLIDO DEL AUTOR, Nombres sin abreviatura. Título. Año. Número de páginas
(169 f.). Disertación (Maestría en Educación) o Tesis (Doctorado en Educación) –
Programa de Pos-Graduación, Universidad, año de publicación.
230
Anales de eventos
APELLIDO DEL AUTOR, Nombres sin abreviatura. In: Nombre del evento,
numeración del evento (si hubiere), año y local (ciudad) de realización, Anales..., local,
editora, fecha de publicación y página inicial y final. Disponible en: < url, si hubiese >.
Acceso el: día mes (abreviado, a excepción de mayo). Año.
Documento electrónico
APELLIDO DEL AUTOR, Nombres sin abreviatura. Título. Edición. Local: año. N° de
pág. o vol. (serie) (si hubiese). Disponible en: < >. Acceso el: día mes a excepción de
mayo). Año.
231
Instructions aux auteurs
Linhas Críticas accepte d’analyser les articles inédits d’auteurs brésiliens et étrangers
ayant au maximum trois auteurs, et présentant un contenu consistant, rigoureux et
original selon les thèmes abordés. La revue publiera dossiers thématiques, articles
, compte-rendus, hommages et entretiens. Les articles résultants de révisions
bibliographiques ne seront pas acceptés ainsi que les articles envoyés en même
temps à une autre revue.
Le résumé et les mots-clés de l’article doivent être en portugais, espagnol,
anglais et français. L’article ne doit porter aucune identification de son auteur
ni de son institution et doit être acheminé via le système de soumission
online à l’adresse http://periodicos.unb.br/index.php/linhascriticas/about/
submissions#onlineSubmissions .
Les données identifiant l’auteur et l’institution doivent être remplis à l’endroit
prévu dans le formulaire online dont le nom complet, adresse postale, CV résumé,
téléphones et e-mail de contact pour les lecteurs. Le CV resumé (maximum 5 lignes)
doit contenir les renseignements suivants: dernier diplôme, université, domaine
ou groupe de recherche et adresse mail. La comission éditoriale n’évalue pas deux
articles d’un même auteur et ne publiera les articles d’un même auteur ou co-auteur
que après un intervalle de trois éditions.
La revue recevra des articles en portugais, espagnol, français et anglais déjà revisés
dans la langue originale. Suite à leur acceptation, les articles en anglais et français
seront traduits vers le portugais et revus par les auteurs. Dans ce cas, les articles
seront publiés dans les deux langues. Les articles en espagnol seront publiés
seulement dans la langue originale.
Les co-auteurs : Linhas Críticas considère comme auteurs, ceux qui ont apporté
une contribution intelectuelle et scientifique dans le travail. L’auteur principal est
responsable pour la proposition et l’intégrité éthique de l’article. Il aura aussi la
responsabilité envers les autres auteurs et leur accord avec le contenu publié.
Règle de citation: Linhas Críticas est l’abbréviation de la revue Linhas Críticas à être
utilisée dans les bibliographies, notes de bas de page et références.
232
2. Le compte-rendu des livres publiés dans les 2 dernières années ne peut pas
dépasser 10.000 caractères (espaces inclus) et doit suivre les mêmes règles que
pour le format d’articles. Le texte doit contenir les références complètes de l’oeuvre
évalué.
3. Les titres et intertitres ne sont jamais numérotés : Titre d’article: 12 mots
maximum, en gras,16 points. Titre des sections: en gras, 13 points. Titre des sous-
sections: en gras, 11 points. Les différents niveaux de titre auront un espace de 1.5
avant et après. La seule majuscule des titres sera la première lettre du premier mot.
4. Résumé en portugais, espagnol, anglais et français (ayant entre 550 et 700
caractères, espaces inclus). Le résumé sera suivi de 3 a 5 mots clefs , identifiant le
contenu de l’article et séparés par un point.
5. Les tableaux, graphiques et figures sont numérotés en chiffres arabes en accord
avec la séquence du texte. Toutes les illustrations doivent être accompagnés d’un
titre au-dessus (Tableau 1 : Titre) et de la source en-dessous (Source : Nom, année,
page) en utilisant des marges de 2,5 cm à droite et à gauche.
6. Les illustrations seront transmises par fichier au format JPG, avec une résolution
minimale de 300 dpi afin de permettre leur réduction ou agrandissement en bonne
légibilité.
7. Eviter les notes de bas de page explicatives qui ne doivent être utilisées que
comme compléments d’informations et figurant dans le texte en numérotation
continue en chiffres arabes et en 3 lignes au maximum en type de 10 points.
8. L’italique ne doit être utilisé dans le texte que pour identifier les mots en langue
étrangère. Il est recommandé d’éviter les citations en langue étrangère, le traduisant
en portugais.
9. Les majuscules doivent être utilisées : Pour les sigles de noms des institutions et
organisations ; titres de documents ; faits historiques, évènements, dates et âges ; on
met une capitale uniquement à la première lettre de titres d’ouvrages et leur parties
; et citations précédées de deux-points. Et au cas où il est nécessaire de l’épeler pour
sa compréhension (IBGE, INSS)
10. Les minuscules doivent être utilisées : Pour les titres et professions (professeur,
maître), domaines des sciences, cours et disciplines (sciences humaines, recherche
en éducation) ; niveaux et modalités de l’éducation (éducation primaire, éducation
superieure, éducation de la jeunesse ou des adultes, etc.) dans ce cas l’utilisation des
minuscules se reporte à l’Accord Ortographique de 1990, en vigueur au Brésil depuis
janvier 2009.
11. Les sigles doivent être utilisées : en capitales sans point entre chaque lettre
jusqu’à 3 lettres (MEC, PUC); toutefois, lorsqu’un sigle forme un acronyme (lisible
phonétiquement) et qu’il est de notoriété publique, on met une capitale uniquement
233
à la première lettre (Capes, Inep). Tous les sigles doivent être développés dès la
première occurrence et indiqués entre paranthèses par la suite : Ministério da
Educação (MEC).
12. Les sigles qui traditionnellement mélangent majuscules et minuscules resteront
dans leur forme originale.
13. Les citations suivront les consignes de mise en forme suivantes :
a) Les citations de plus de 3 lignes seront détachées dans un paragraphe à part,
avec retrait à gauche de 1.25 cm, et type de 10 points, sans guillemets et suivies
de la référence (Nom, année, page). Le point final de la citation se trouvera à la fin
de la phrase, donc, avant les paranthèses, à l’exception de celles jusqu’à 3 lignes, à
l’intérieur du texte, si elles ne finissent pas le paragraphe. Il doit y avoir un espace de
paragraphe de 1.0 avant et après la citation.
b) Les citations de moins de 3 lignes doivent suivre le format du texte. Dans le cas
de citation directe , elle doit être entre guillemets, et suivie du nom de l’auteur,
année d’édition de l’ouvrage et page exacte de la citation. Exemple : Selon Gatti
(2002, p. 82), on observe le manque “[...] de capacité de theorisation, de critique
et de génération d’une problématique particulière” dans plusieurs recherches.
Ou : … manque “de capacité de théorisation, de critique et de génération d’une
problématique particulière” Gatti (2002, p. 82), dans plusieurs recherches…
c) Les citations indirectes doivent être sans guillemets, et suivies seulement du nom
de l’auteur et année d’édition de l’ouvrage. S’il y plus d’un ouvrage du même auteur
publié dans la même année, il faut utiliser a, b, c, juste après la date (nom, 2010a).
d) Les ouvrages signés par plusieurs auteurs, doivent comporter le point-virgule pour
séparer les auteurs (nom ; nom, année, page). Dans le cas d’ouvrages collectifs de
plus de 4 auteurs noter le nom du premier auteur et la mention et al. (nom et al.,
année, page).
Les références doivent suivre la réglementation de l’ABN/NBR 6023:2002. Celles-
ci doivent être mises en ordre alphabétique sans abréviations de prénoms après
le nom. Pour souligner les différents niveaux de titres des ouvrages et articles
l’utilisation de l’italique est conseillée, comme dans les exemples ci-dessous (les
intertitres n’ont pas besoin d’italique) . Les références des titres cités doivent se
trouver dans le texte (citation directe et indirecte en accord avec NBR 10520:2002).
Les articles dont les références seraient incomplètes ou incorrectes ne seront pas
évalués. Pour plus de détails veuillez consulter : http://www.more.ufsc.br/
234
Exemples:
Ouvrages
Nom de l’auteur, prénom sans abréviations. Nom de l’ouvrage: sous-titre . Lieu
d’édition : maison d’édition, année d’édition.
Chapitres d’ouvrages
Nom de l’auteur, prénom sans abréviations. Nom de l’ouvrage: sous-titre. Lieu
d’édition : maison d’édition, année d’édition. In : Nom de l’auteur, prénom sans
abréviations. Nom de l’ouvrage. Lieu d’édition: maison d’édition, année d’édition.
Pages initiales et finales.
Revues Periodiques
Nom de l’auteur, prénom sans abréviations. Nom de l’article: sous-titre . Titre du
périodique, Lieu d’édition, Institution, numéro de la publication, numero du fascicule,
pages contenant l’article, mois (exemple : mars-mai ou sep-déc) année d’édition.
Thèses et dissertations
Nom de l’auteur, prénom sans abréviations. Titre. Année. N° de pages ( 169p. )
Dissertation (Master en éducation) ou Thèse (Doctorat en éducation) – Programme
de post-graduation, Université, année de la publication.
Annales
Nom de l’auteur, prénom sans abréviations. Titre : sous-titre . In : Nom de
lévenement, numero (si pertinent) année et lieu de l’évenement, Annales …., Lieu,
date et maison d’édition, pages de début et fin. Disponibilité en URL (si pertinent),
mois et année de la consultation.
Documents électroniques:
Nom de l’auteur, prénom sans abréviations. Titre. , Lieu et année d’édition, numéro
de page. Disponibilité en URL : date de la consultation de l‘article : jour, mois, année
. nes.
235