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Unidade 3: Moçambique independente (1975 - )

Principais temas da Unidade 3


4.1. O percurso político
4.2. A evolução económica: da economia centralmente planificada à liberalização
4.3. A guerra interna, os conflitos e a integração regional

Objectivos específicos da aprendizagem


 Identificar as principais mudanças do Moçambique independente;
 Analisar a evolução política, económica e social de Moçambique até ao final do
século XX;
 Debater a integração de Moçambique nas relações regionais e do mundo

Como deve ser do seu conhecimento, a independência de Moçambique foi proclamada a


25 de Junho de 1975 pelo Presidente Samora Moisés Machel no Estádio da Machava,
arredores da cidade de Lourenço Marques, actual Maputo. Esta proclamação foi
antecedida pelos acordos de Lusaka, de 7 de Setembro de 1974, que marcaram o fim da
luta armada de libertação nacional e que definiram o percurso imediato que levaria à
independência de Moçambique. Este período intermédio foi conduzido pelo governo de
Transição, liderado por Joaquim Chissano e que contou com membros da FRELIMO e do
governo português. A partir de 25 de Junho de 1975 entrava em vigor uma nova
constituição que marcava a materialização do direito à autodeterminação dos
moçambicanos.

4.1. O PERCURSO POLÍTICO


A evolução política de Moçambique independente conheceu dinâmicas interessantes. De
qualquer forma dois períodos podem ser distinguidos. O primeiro momento político,
entre 1975 e 1990, Caracterizou-se pelo desenvolvimento do sistema político mono
partidário no qual um partido dirige o país. Moçambique, sob direcção da FRELIMO,

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optou por uma orientação de tendência socialista. Durante este período assistiu-se a uma
tentativa clara de organizar o Estado através da montagem de um aparelho administrativo
independente do antigo colonizador. Neste quadro, políticas como nacionalizações nas
áreas de educação, saúde e habitação foram implementadas. Adicionalmente, durante os
primeiros anos da independência, foram instituídos os grupos dinamizadores, as aldeias
comunais, as cooperativas de produção, as machambas estatais e outros moldes de
organização através dos quais se esperava desenvolver formas de produção colectivas,
rentáveis e uma sociedade moçambicana mais justa e igualitária. Durante este período, os
presidentes de Moçambique foram Samora Moisés Machel (1975 – 1986) e Joaquim
Chissano (1986 – 2004).
O segundo momento político, a partir do início da década de 1990, inicia com a
aprovação da Constituição de 1990. Através desta, a designação oficial do país passava a
ser “República de Moçambique” e adoptou –se o sistema político multipartidário. Esta
constituição foi seguida pelo Acordo Geral de Paz, de Outubro de 1992 em Roma, entre o
governo de Moçambique e a Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO). As
primeiras eleições multipartidárias de 1994 foram uma das consequências imediatas
destas mudanças. Estas eleições gerais consistiram em Presidenciais e Legislativas.
Concorreram para as Presidenciais 12 candidatos tendo sido vencedor Joaquim Chissano
do partido FRELIMO seguido por Afonso Dhlakama do partido RENAMO. Nas
Legislativas o vencedor foi o partido FRELIMO com 129 assentos, seguido pelo partido
RENAMO (112 assentos) e pela União Democrática (9 assentos).

Depois destas, mais quatro eleições gerais tiveram lugar (1999, 2004, 2009 e 2014) e
foram introduzidas outras formas de democratização e descentralização que permitiram a
realização de eleições municipais (1998, 2003, 2008 e 2014) e ainda as eleições
provinciais (2009 e 2014). Nas eleições presidenciais, os vencedores foram todos do
partido FRELIMO, nomeadamente Joaquim Chissano (1999), Armando Guebuza (2004 e
2009) e Filipe Nyusi (2014).

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ACTIVIDADE
1. Identifique os 2 períodos principais do percurso político de Moçambique. Quais são as
principais diferenças?

4.2. A EVOLUÇÃO ECONÓMICA: DA ECONOMIA CENTRALMENTE


PLANIFICADA À LIBERALIZAÇÃO ECONÓMICA
É possível desenvolver diversas periodizações sobre a evolução económica de
Moçambique. De qualquer forma, uma das periodizações mais consensuais é aquela que
divide a evolução económica de Moçambique em dois períodos principais, o da economia
centralmente planificada e o da economia liberalizada.

O período da economia centralmente planificada se estende de 1975 até 1986/1987.


Tratou – se do desenvolvimento de uma economia centralizada, na qual se tentou
implementar políticas económicas de tendência socialista, dinamizadas especialmente no
III Congresso da FRELIMO realizado em 1977 (onde a FRELIMO declarou-se um
partido de orientação Marxista - Leninista). Ali, a agricultura foi considerada a “base” da
economia e a indústria o “factor dinamizador”. Uma das consequências das decisões
acima referidas foi a implementação de estratégias como o Plano Prospectivo Indicativo
(PPI), um programa que visava liquidar o subdesenvolvimento na década de 1980/1990 e
que priorizava o papel do sector estatal e grandes projectos no desenvolvimento
económico e o cumprimento das metas físicas de produção em detrimento das pequenas
iniciativas privadas e da eficiência ou custo económico destas metas. Nos primeiros anos
da independência registou –se um abandono significativo de colonos que eram a maioria
da mão de obra qualificada para os empreendimentos herdados do colonialismo. Este
abandono foi acompanhado pela sabotagem às empresas e desvio de capitais, levando a
crise em muitos destes empreendimentos. Neste quadro, a tentativa de reorganização da
economia levou a nacionalizações e ou “intervenção” do estado nas empresas. Portanto,
muitas empresas deixaram de ser privadas e passaram a ser estatais.

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O período de economia liberalizada inicia-se em 1987 com a introdução do Programa
de Reabilitação Económica (PRE). Esta política económica foi adoptada no contexto da
crise interna, precipitada pelas calamidades naturais, guerra interna, fracasso na
implementação de algumas políticas económicas, bem como a situação da economia
internacional, com destaque para a crise do bloco do Leste, ou seja, a queda do poderio
da União Soviética que fragilizou os restantes países socialistas. Nesta fase, que foi
influenciada pela adesão de Moçambique ao Banco Mundial (BM) e Fundo Monetário
Internacional (FMI), desde Setembro de 1984, ocorre a transição de Moçambique da
vertente tendencialmente socialista para uma mais pró capitalista. A partir de 1987 notou-
se, entre outras acções, a privatização de empresas, a liberalização do Metical, a abertura
de mercado e a redução de subsídios estatais em alguns serviços sociais.

Com estas mudanças a economia do país evoluiu positivamente, pelo menos em termos
dos indicadores macroeconómicos. No entanto, o custo destas políticas é que grande parte
da população desfavorecida não se beneficiou dos avanços económicos, pois o Banco
Mundial e o FMI são instituições preocupadas em ver o avanço macroeconómico do país.
A vertente social não constituía prioridade, apesar da introdução desta componente desde
princípios dos anos 1990 (com o Programa de Reabilitação Económica e Social – PRES),
uma vez que estas instituições não permitiram que o governo fizesse uma “livre”
aplicação dos capitais concedidos. Portanto, nos primeiros anos do PRE a reestruturação
da economia levou à falência de muitas empresas, ao aumento de desemprego e à subida
de preços dos produtos básicos que não foi acompanhado pelos níveis de salários o que
levou a manifestações e greves ao longo da década de 1990.

ACTIVIDADE
2. Identifique os 2 períodos principais do percurso económico do Moçambique
independente. Quais são as principais diferenças?

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SAIBA MAIS: Leitura complementar
As mudanças internacionais da década de 1980 e sua influência em Moçambique e
na região da África Austral
Logo após ao término da II Guerra Mundial assistiu-se ao desenvolvimento de um
conflito ideológico que influenciou a situação sociopolítica e económica internacional,
que dividiu o mundo em dois blocos antagónicos de interesses divergentes – o capitalista
e o socialista. Tratou –se da chamada “Guerra Fria”. Desde os meados da década de 1970
que este conflito influenciava a evolução dos acontecimentos na região pois os países que
se tornavam independentes adoptavam políticas predominantemente socialistas –
Tanzânia, Zâmbia, Angola, Moçambique e Zimbabwe – para o desespero da África do
Sul que se tornava cada vez mais isolado. Ora, a África do Sul, do regime do Apartheid,
tornou-se mais militarista e agressivo e desencadeou acções de sabotagens contra os seus
vizinhos sob pretexto de estar a defender a região contra o avanço do socialismo
(“comunismo”, segundo o regime). Esta situação adiava a tomada de medidas (sanções e
pressões) mais fortes contra o regime do Apartheid por parte dos países do ocidente
(predominantemente capitalistas) ao mesmo tempo que levava os mesmos países a
apoiarem os movimentos rebeldes que actuavam nos diferentes territórios da região em
nome do derrube do “comunismo”. Com as reformas na União Soviética, nos meados da
década de 1980, e o consequente “derrube” do socialismo a justificação dos ataques sul-
africanos e apoio a guerras contra o “comunismo” deixou de existir. Daí se justifica o
clima de negociações de paz que caracterizou os últimos anos da década de 1980 e
princípios da década de 1980 que culminaram com a independência da Namíbia (1990),
as eleições multipartidárias em Angola (1992), o fim da guerra em Moçambique e as
eleições gerais na África do Sul (1994).

Breve cronologia do Moçambique independente


1975 (Junho) – independência de Moçambique
1975 (Julho) – nacionalizações nas áreas de saúde, educação
1977 – III Congresso da FRELIMO

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1977 (Dezembro) – reestruturação do sistema bancário
1980 – Introdução da nova Moeda, o Metical, em substituição do Escudo
1983 – IV Congresso do partido FRELIMO
1984 – Adesão de Moçambique ao Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional
1986 (Outubro) – Morte do presidente Samora Machel; Joaquim Chissano torna-se
presidente da República Popular de Moçambique
1987- Introdução do Programa de Reabilitação Económica (PRE)
1990 – Aprovação da nova Constituição da República
1992 (Outubro) – Acordo Geral de Paz, entre o governo de Moçambique e a RENAMO
1994 – Primeiras eleições gerais (multipartidárias)
1998 – Primeiras eleições Municipais
2009 – Primeiras eleições para Assembleias Provinciais

ACTIVIDADE
3. Seleccione uma data (acontecimento e ou processo) e explique a sua importância para
a História de Moçambique

4.3. A GUERRA INTERNA, OS CONFLITOS E A INTEGRAÇÃO REGIONAL

No ano que se seguiu à independência de Moçambique deu-se início a um período de


instabilidade político – militar no país. O governo de Moçambique teve que enfrentar três
conflitos: a guerra interna com a Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO), que
durou 16 anos, os ataques da Rodésia do Sul, até a independência do Zimbabwe em 1980
e, a partir desta data, as agressões do regime do Apartheid da África do Sul.
Como é do seu conhecimento, Moçambique tornou-se independente em 1975 como
resultado da luta desencadeada contra o colonialismo português. É do seu conhecimento
também que o colonialismo era um regime que beneficiava a minoria em detrimento da
maior parte da população. Ora, no momento da independência, Moçambique tinha dois
vizinhos de regimes minoritários (e racistas) nomeadamente a África do Sul e a Rodésia
do Sul. Nestes países os regimes minoritários não estavam satisfeitos com a
independência de Moçambique porque, de entre outros motivos, receavam o apoio que o

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novo governo concederia aos movimentos que lutavam pela autodeterminação das
populações africanas (ou por governos da maioria). Assim o regime rodesiano, liderado
por Ian Smith, atacou sistematicamente as províncias de Manica e Gaza através de raids
terrestres e principalmente aéreos alegadamente como forma de destruir as bases dos
guerrilheiros Zimbabwianos (da ZAPU e ZANU). Com a independência do Zimbabwe a
África do Sul liderada por Pieter W. Botha acelerou as acções de agressão a Moçambique
sob pretexto de destruir as bases de apoio do Congresso Nacional Africano (ANC). Os
ataques destes dois regimes minoritários foram extremamente violentos e, juntamente
com a guerra interna, provocaram muitas mortes e destruição de infra-estruturas
económicas de importância significativa para Moçambique.

Paralelamente, os países da região desenvolveram as suas formas de luta contra os


regimes minoritários com destaque para a Linha da Frente que incluía países como
Moçambique, Zâmbia, Botswana, Tanzânia e Angola. A Linha da Frente foi crucial para
a independência do Zimbabwe e, a partir dali, para a formação de uma organização que
visava reduzir a dependência económica do regime do Apartheid, a Conferencia
Coordenadora para o Desenvolvimento da África Austral (SADCC). Esta organização era
constituída por 9 países da região nomeadamente Moçambique, Zâmbia, Tanzânia,
Angola, Zimbabwe, Botswana, Suazilândia, Lesoto e Malawi. Nesta forma de integração
regional cada país era responsável por uma área específica de desenvolvimento –
Moçambique por exemplo era o responsável pela área dos transportes e comunicações.

Apesar das relações entre os países da região e a África do Sul do Apartheid serem
tensas, não se pode concluir que já não havia contactos políticos e especialmente
económicos entre os países que formaram a SADCC e a África do Sul. No caso de
Moçambique, para além do comércio e outros serviços, os trabalhadores continuaram a
migrar para as minas no quadro dos acordos do trabalho migratório. De qualquer das
maneiras, como se pode verificar no quadro abaixo, o número de moçambicanos nas
minas sul-africanas, nos primeiros anos da independência, foi reduzindo drasticamente
(se comparado com o do período colonial).

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Trabalhadores moçambicanos recrutados nas minas sul-africanas 1975- 1983
Ano Número de trabalhadores
1975 102.725
1976 40.626
1977 43.855
1978 42.560
1979 29.933
1980 41.542
1981 37,751
1982 41.542
1983 39.731
Fonte: Gaspar, 2006: 41 adaptado de Departamento do Trabalho Migratório – Ministério do Trabalho,
‘Mineiros Moçambicanos Recrutados para as Minas na África do Sul’, Maputo, 2004: p.1

No contexto de mudanças regionais – clima de paz e democratizações – a SADCC foi


substituída pela Comunidade do Desenvolvimento da África Austral (SADC) em 1992.
Neste contexto, a integração regional visava incluir todos os países da região incluindo os
das ilhas do Oceano Indico. Assim, para além dos membros da antiga SADCC, a nova
organização, a SADC, foi admitindo mais membros: Namíbia, África do Sul, República
Democrática do Congo, Madagáscar, Maurícias e Seicheles.
ACTIVIDADES
4. Acha que existe alguma relação entre a evolução da guerra interna (de 16 anos) e os
conflitos regionais da década de 1970 e 1980? Justifique.
5. Compare a SADCC e a SADC, tendo em conta os objectivos da sua formação e a
conjuntura em que evoluíram.

Breve cronologia de Moçambique no contexto regional


1975/6 – Formação da Linha da Frente
1976- Moçambique decreta sanções à Rodésia
1980 - 9 países da região da África Austral, incluindo Moçambique, formam a SADCC
1981 – 1983 – Ataques (directos) sul-africanos a Moçambique
1984 – Acordo de Nkomati, entre Moçambique e África do Sul
1992 – Formação da SADC em substituição da SADCC

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GLOSSÁRIO
Guerra Fria – conflito ideológico que desenrolou entre o período imediatamente
posterior a II Guerra Mundial e os finais da década de 1980 e que opôs o bloco capitalista
(liderado pelos Estados Unidos) e o bloco socialista (liderado pela União Soviética). Os
dois blocos pretendiam dominar o mundo (ou pelo menos ganharem maior influencia).
As principais potências não chegaram a confrontarem-se militarmente mas apoiaram
grupos rivais nas lutas pelo controlo político nas diferentes regiões e países do Mundo.
Intervenção nas empresas – tratou-se da política do governo que, baseada na lei 16/75
de Janeiro de 1975, visava a tomada (pelo Estado) das empresas privadas abandonadas ou
mal geridas. As empresas intervencionadas passavam a ser estatais porém é preciso
distinguir este conceito (ou acção) das nacionalizações que se concentraram
especialmente em sectores mais sociais como educação, saúde e educação.

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Bibliografia básica
CASTEL-BRANCO, C. N. (org) (1994) Moçambique: perspectivas económicas. Maputo:
Universidade Eduardo Mondlane/Fundação Friedrich Ebert,

NEWITT, M. (1995) História de Moçambique. Sintra: Europa-América

Bibliografia complementar

CARDOSO F. J. (1993). Gestão e desenvolvimento rural. Moçambique no contexto da


África sub sahariana. Lisboa: Fim do Século

EGERO, B (1992) Moçambique: os primeiros dez anos de construção da democracia.


Maputo: Arquivo Histórico de Moçambique

GASPAR, N. (2006) The reduction of Mozambican workers in South African mines: a


case study of the consequences for Gaza Province - District of Chibuto (MA
Dissertation), Wits, Johannesburg.

HANLON, J. (1984) Mozambique: The revolution under fire, Londres.

ROLIM, C., FRANCO A. BOLNICK, B. e ANDERSSON, P. (Org) (2002) A economia


Moçambicana Contemporânea – Ensaios. Gabinete de Estudos do Ministério das
Finanças de Moçambique

Autor:

Napoleão Gaspar (UEM – DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA 2017)

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