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CETCC – CENTRO DE ESTUDOS EM TERAPIA

COGNITIVO–COMPORTAMENTAL

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM TERAPIA


COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

DANIELA BARROS SIMÕES

INTERVENÇÕES COGNITIVAS COMPORTAMENTAIS


PARA AS TENTATIVAS DE SUICÍDIO: UMA REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA

SÃO PAULO
2013
DANIELA BARROS SIMÕES

INTERVENÇÕES COGNITIVAS COMPORTAMENTAIS


PARA AS TENTATIVAS DE SUICÍDIO: UMA REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA

Trabalho de conclusão de curso de


Especialização
Área de concentração: Terapia cognitivo-
comportamental
Orientadora: Profª. Msc. Eliana Melcher Martins
Coorientadora: Profª. Dra. Renata Trigueirinho
Alarcon

SÃO PAULO
2013
Dedico esse trabalho aos meus pais que sempre
se mostraram presentes ao longo
da minha caminhada.
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por ter me dado força para iniciar e


conseguir concluir o curso.

Agradeço a eterna ajuda dos meus pais, que sempre, de alguma


maneira me mostram que tenho que lutar pelos meus objetivos e
principalmente no meu crescimento profissional.

Agradeço meu irmão Leandro, pela ajuda na construção desse


trabalho.

Agradeço as amigas de grupo: Marina, Célia e Cinthia pelas


discussões de caso, pelo apoio, incentivo e aprendizagens. Além de
todos os colegas de turma que colaboraram com meu crescimento
acadêmico e profissional

Agradeço a Eliana e o Élcio, além de todos os profissionais, por


toda ajuda e conhecimento ao longo desses dois anos de curso.
SIMOES, D. B.; Intervenções cognitivas comportamentais para as
tentativas de suicídio: Uma revisão bibliográfica. Trabalho de conclusão de
curso de especialização pelo Centro de Estudos em Terapia Cognitiva
Comportamental, 2013.

Resumo

Esse trabalho apresenta um estudo sobre as intervenções utilizadas pela


Terapia Cognitiva Comportamental (TCC) para lidar com pacientes suicidas. O
tema torna-se relevante pela importância de realizar novos estudos sobre esse
comportamento, que desafia muitos profissionais e que, é hoje, considerado
uma questão de saúde publica. Traz importância cientificamente para a
psicologia porque pretende dar uma contribuição para os estudos na área,
assim como fornecer reflexão a respeito dos aspectos envolvidos no ato
suicida. Através do levantamento bibliográfico, foi possível perceber que o
estudo sobre formas de acompanhamento de pacientes potencialmente
suicidas é relativamente novo, e segundo os artigos consultados não trás
evidencias claras sobre o tratamento, mesmo que mostre que a técnica trouxe
a redução de pensamentos, planos e atitudes autodestrutivas após o
tratamento.

Palavras-chave: Suicídio; TCC.


SIMOES, D. B.; Cognitive behavioral interventions for suicide attempts: A
bibliographic review. Final paper for completion of the specialization course at
the Centro de Estudos em Terapia Cognitiva Comportamental, 2013

Abstract

This study aims to analyze interventions used by Cognitive Behavioral Therapy


(CBT) to deal with suicidal patients. The topic is relevant for the importance of
conducting further studies on this behavior, which challenges many
professionals and is today considered a public health matter. It also contributes
to the studies in the area, what brings scientifically importance to psychology
and provides a reflection about the issues involved in the suicidal act. Trough
bibliographical survey, it was revealed that studies about the ways to monitor
potentially suicidal patients are relatively new and, according to the articles
consulted, there are not clear evidences about treatment, even when it shows
that the techniques applied caused the reduction of thoughts, plans and self-
destructive behaviors after treatment.

Keywords : Suicide ; CBT.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ......................................................................................... 7
1.1 Histórico sobre Suicídio ............................................................................ 7
1.2 Definição ................................................................................................... 11
1.3 Epidemiologia ........................................................................................... 12
1.4 Fatores de risco ........................................................................................ 17
1.5 Suicídio e Prevenção ............................................................................... 31
2. OBJETIVOS ........................................................................................... 34
3. MATERIAL E METODOS....................................................................... 35
4. RESULTADOS ....................................................................................... 36
5. DISCUSSÃO .......................................................................................... 61
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................... 63
7. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ...................................................... 64
ANEXO............................................................................................................. 67
7

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho irá apresentar um estudo sobre as intervenções


utilizadas pela Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) para lidar com o
paciente potencialmente suicida, para isso será realizada uma revisão
bibliográfica.

1.1 Histórico sobre Suicídio

Segundo Meleiro e Bahls (2004), a etimologia da palavra suicídio vem do


latim sui (si mesmo) e caedere (ação de matar), ou seja, é o ato intencional de
matar a si mesmo, mas esta definição etimológica é ampla demais e não
engloba todos os detalhes deste comportamento tão complexo. Dessa forma
existem outros termos para englobar cada ato, como: tentativa de suicídio, ato
suicida, ideação suicida, potencial suicida, suicidalidade, suicídio assistido,
parasuicídio, que serão explicados detalhadamente no decorrer do trabalho.
Segundo Kurcgant e Wang (2004), o suicídio durante anos foi aclamado
como ato de heroísmo, outras vezes como prova suprema de liberdade e
outras, ainda, como objeto de reprovação social.
Segundo Barnes (1997), na história grega houve muitos suicídios, pelos
mais variados motivos: os suicídios patrióticos de Menecéia, Isócrates,
Teméstocles, Demóstenes; o suicídio por remorso de Aristodemo; o suicídio
por honra de Cleomeno; o suicídio por fidelidade religiosa de Pitágoras; o
suicídio para escapar da velhice de Hipo; os suicídios filosóficos por desprezo
da vida de Zenão, Cleanto, Hegésias, Diógenes, Epicuro.
Segundo Kurcgant e Wang (2004), na Roma Antiga, os escravos e os
soldados estavam impedidos de cometer suicídio. No primeiro caso, o suicídio
é considerado um atentado contra a propriedade. No segundo, eram previstas
no exercito algumas penas contra aqueles que sobrevivem depois de uma
tentativa de suicídio. Para os homens livres, não existia interdição legal ou
religiosa contra o suicídio.
De acordo com Kurcgant e Wang (2004), apesar dos poucos dados sobre a
morte voluntária na Idade Média, verificou-se que ela era praticada em todas as
8

categorias sociais e por ambos os sexos. A morte voluntária era considerada


uma tentação diabólica ou uma atitude de loucura. O ato em si era considerado
criminoso e, portanto, estavam previstas as punições sobre o cadáver e o
confisco dos bens do morto.
De acordo com Kurcgant e Wang (2004), no século XVI, havia inquérito
após o suicídio, onde a maioria dos juristas estabelece que era preciso
proceder a um relatório detalhado relativo ao lugar em que foi encontrado o
corpo, que os barbeiros deveriam examinar detalhadamente o cadáver, que
deveriam se informar da vida e dos hábitos do defunto, e das razões que o
teriam levado ao suicídio. Era ainda preciso nomear um curador do corpo, que
seria o defensor do defunto diante do tribunal e convocar família e herdeiros.
Segundo Stone (1997) apud Kurcgant e Wang (2004), por volta dos anos
1600, os intelectuais e os médicos passaram a analisar o processo psicológico
que conduz ao suicídio e passaram a utilizar o termo melancolia para designá-
lo. O desespero é uma noção moral, é um pecado, mas a melancolia é uma
noção psicológica, é um desequilíbrio mental. Trata-se de um excesso de bílis
negra, associada ao mais sombrio dos elementos, a Terra, e ao mais sombrio
dos planetas, Saturno. Este caráter é adquirido desde o nascimento, mas pode
ser corrigido ou agravado pelo envolvimento social e pelo comportamento
individual.
As autoridades reagem no século XVII contra a legitimação do suicídio.
A condenação mais rígida é dos teólogos, católicos e protestantes, que não
deixam nenhuma abertura possível. Os moralistas revelam-se um pouco mais
flexíveis, admitindo algumas exceções em casos extremos, mas os juristas
mostram-se ainda mais indulgentes. Os juristas estabelecem uma distinção
entre os suicídios culpáveis e suicídios desculpáveis. Por exemplo, em 1665,
são isentados de condenação os que se matam por motivo de doença, frenesi
ou qualquer outro acidente.
As explicações médicas e somáticas das tendências suicidas avançam
no sentido da irresponsabilidade daqueles que se suicidam, que se tornam,
assim, mais vitimas do que criminosos. Os autores passam a abandonar
gradativamente as causas sobrenaturais e demoníacas da loucura e do
suicídio. A internação daqueles que tentam se matar passa a ser utilizada. A
9

fim de prevenir novas tentativas, são fechados em gaiolas de verga, com as


mãos amarradas (FOUCAULT, 1978).
A palavra “suicídio” é utilizada pela primeira vez na Inglaterra no século
XVII. O termo aparece na obra do inglês Sir Thomas Browne, chamada Religio
Médici, publicado em 1642. O autor desejava distinguir o termo self-killing
cristão, inteiramente condenável, do suicidium pagão de Catão. Este ultimo,
baseado no latim sui (de si) e caedes (assassinato) (Sena,1967 apud Kurcgant
e Wang, 2004).
De acordo com Kurcgant e Wang (2004), no século XVIII, no interior da
elite culta, conhecem-se novos motivos para o suicídio, ligados aos
movimentos filosóficos. Trata-se de apresentar a própria morte como o
resultado da recusa da vida, a partir do momento em que a vida oferece mais
sofrimentos do que alegrias. A partir de 1770, aparece o suicídio por solidão,
vazio da alma, “mal viver”, recusa da passagem do tempo.
Em 1897, Émile Durkheim publica seu estudo sociológico sobre o
suicídio. Para ele, o suicídio revela algumas causas sociais que permitem
dividi-lo em três categorias: o suicídio egoísta, que atinge os indivíduos menos
ligados aos seus grupos familiares, religiosos e políticos; o suicídio altruísta
que é quando o individuo, ao contrario do suicídio egoísta, se sacrifica pelo
grupo; e o suicídio anômico, devido à falta de regras sociais que não
asseguram a satisfação das necessidades mais elementares.
Na revolução francesa, inicia-se um debate sobre o suicídio. Por um
lado, questiona-se se o suicídio é considerado como a consequência de um ato
de loucura passageira, o que torna o autor irresponsável pelo seu ato. Por
outro, quaisquer que sejam as causas de suicídio e do grau de
responsabilidade da vitima, as sanções revelam-se inúteis e injustas, A morte
voluntária é considerada um ato nefasto e condenável. Na medicina, discute-se
a relação entre suicídio e hereditariedade, localização cerebral e dados
estatísticos (Berrios e Mohanna, 1999 apud Kurcgant e Wang, 2004).
Com o capitalismo, as taxas de suicídio aumentam, uma vez que os
indivíduos ficam mais isolados, pois os sistemas de corporação desaparecem e
as falências são numerosas. Ocorre também um aumento dos miseráveis, além
dos invernos rigorosos, das doenças e das guerras. A imprensa também noticia
10

os suicídios vulgares por amor, por problemas conjugais, por luto, por
violações, por remorso e por todos os dramas humanos (Minois, 1998).
Entre muitos filósofos avança a ideia que o suicídio é um caso de
loucura, ou um mau funcionamento fisiológico, que está mais ligado à medicina
do que a justiça ou a religião. Os trabalhos científicos da época contribuem
para desculpabilizar o ato suicida. O desenvolvimento das ciências humanas
contribui involuntariamente para reforçar a culpa individual e coletiva em
relação ao suicídio. As estatísticas, a psiquiatria e a sociologia colocam em
evidência a amplitude do fenômeno.
Com o passar do tempo às taxas de suicídio evoluem e desta vez as
estatísticas existem para demonstrar. Cada região, cada grupo social e cada
contexto socioeconômico comportam uma proporção de mortes voluntárias
quase sempre constantes, que os sociólogos conseguem delimitar de forma
progressiva (Minois, G. História do suicídio, 1998).
A medicina, no começo do século XIX, utiliza o “tratamento moral”,
baseado na punição para tratar a propensão ao suicídio. São exemplos de
“sedativos morais”, a ducha brutal, a cadeira rotativa, a cadeira de força, o
isolamento, a fome, a sede, as ameaças e os ataques ao amor-próprio
(Foucault,1978).
Segundo Kurcgant e Wang (2004), no século XX, a reprovação e as
contradições sobre o suicídio permanecem. Ocorre a admiração aos suicídios
na literatura, pelo suicídio de militares que se recusam a abandonar seus
postos, pelo suicídio de resistentes que tomam cianeto para não falarem sob
tortura e, ao mesmo tempo, a condenação dos suicídios cujos motivos não
pareciam ser muito nobres. No século XX também ocorrem suicídios celebres,
como de Stefan Zweig, Ernest Hemingway, Cesare Pavese, Primo Levi, Marilyn
Monroe, Maiakovski, Mishima, Adolf Hitler, Budd Dwyer, Camilo Castelo
Branco, Michael Hutchence, Robert E. Howard, Vincent Van Gogh e tantos
outros.
No século XXI, os estudos sobre o suicídio convergiram a uma questão
de saúde pública, uma vez que o ato suicida pode ser evitado. Em 2006 é
lançado “Prevenção do suicídio: manual dirigido a profissionais das equipes de
saúde mental”, onde o suicídio é classificado:
11

Como um sério problema de saúde pública, a prevenção do


comportamento suicida não é uma tarefa fácil. Uma estratégia
nacional de prevenção, como a que se organiza no Brasil a partir de
2006, envolve uma série de atividades, em diferentes níveis, e uma
delas é a qualificação permanente das equipes de saúde. Uma vez
que várias doenças mentais se associam ao suicídio, a detecção
precoce e o tratamento apropriado dessas condições são
importantes na sua prevenção (OMS, p.6).

1.2 Definição

De acordo com Meleiro e Bahls (2004), o suicídio é visto como um


comportamento humano complexo. Inclui uma gama de atitudes, cognições e
comportamentos, cujos limites são vagos e ambíguos. Nas ultimas décadas
tornou-se um grave problema de saúde pública, sendo que cada caso de
suicídio é único e particular. É impossível algo universal e absoluto sobre o
funcionamento dos indivíduos que cometem o suicídio.
Segundo Rosut, Silva Jr. e Alburquerque (2000) suicídio é definido
como: ato ou efeito de suicidar-se. Ruína ou desgraça, procurada
espontaneamente ou por falta de juízo.
A definição de suicídio para Durkheim (1982) é todo o caso de morte que
resulta direta ou indiretamente de um ato positivo ou negativo praticado pela
própria vítima, ato que a vítima sabia que iria produzir este resultado. Já a
tentativa de suicídio é o ato definido, mas interrompido antes da morte.
Segundo Meleiro e Bahls (2004), um fator chave para o suicídio é a
existência de um sofrimento de intensidade insuportável: uma dor psíquica que
não consegue ser aliviada por nenhum meio, exceto pelo suicídio. As pessoas
não conseguem ter recursos para satisfazer as necessidades vitais e a
frustração torna-se intolerável. A vida perde seu sentido e há a impossibilidade
de continuar a viver.
Beck, Brown e Wenzel (2010) definem suicídio como morte causada por
ferimentos autoinfligidos com qualquer intenção de morrer como resultado
desse comportamento. Essa definição ilustra três componentes importantes:
que a pessoa está morta; que o comportamento dessa pessoa causou sua
própria morte; e que a pessoa tinha a intenção de causar sua própria morte.
12

Segundo Durkheim (1982), o suicídio é vulgarmente um ato de


desespero de um individuo a quem a vida já não interessa. Mas, na realidade,
ainda está ligado à vida no momento de deixá-la, não deixa de ser difícil
abandoná-la, onde um ser vivo abandona assim o mais precioso dos seus
bens. O que é comum a todas as formas possíveis desta renuncia suprema, é
que o ato que a consagra é realizado com conhecimento de causa, já que a
vitima no momento de agir, sabe o que vai resultar da sua conduta, seja qual
for a razão que a levou a conduzir assim.
De acordo com Kovács (1992), tentativas de suicídio são atos
deliberados de autoagressão, em que a pessoa não tem a certeza da
sobrevivência, manifestando uma intenção autodestrutiva e uma consciência
vaga do risco de morte. A autodestruição começa muito tempo antes do ato
suicida, é como se a pessoa tivesse um encontro com a morte, embora,
aparentemente pareça fugir dela.
Segundo Beck e cols. (1997), o grau de intenção suicida de uma pessoa
deve ser considerado como um ponto em um continuum: de um lado está a
certeza absoluta de matar-se e no outro extremo está a intenção de seguir
vivendo.

1.3 Epidemiologia

De acordo com Seminotti, Paranhos e Thiers (2006), considerando


pessoas de qualquer faixa etária, o suicídio fica entre as 10 principais causas
de morte no mundo e na segunda ou terceira colocação para as idades entre
15 e 34 anos. No Brasil em 2004, o coeficiente é de 6,6 mortes por suicídio em
100.000 habitantes.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) (1999), a
mortalidade por suicídio aumentou em 60% nos últimos 45 anos (coeficiente
calculado para o ano de 1995: 16 suicídios para cada 100.000 habitantes).
Nesse período, os maiores coeficientes de suicídio mudaram da faixa mais
idosa da população para faixas mais jovens.
13

Segundo a OMS (1999), as taxas de suicídio no Brasil entre 1980 a 2000


foram consideravelmente mais baixas do que as de muitos países. Em
números absolutos de mortes por suicídio, o Brasil ocupa a nona posição no
ranking mundial, quando considerado números de casos de suicídio por
habitantes, o Brasil foi posicionado em 71º lugar na classificação mundial.
De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria (2009), no Brasil
ocorrem 4,5 suicídios por cada 100.000 habitantes por ano. Em números totais
de mortes, comparados com outros países, o Brasil está em nono lugar numa
escala mundial, com 24 mortes por dia. A região sul do Brasil, mais
especificamente o Rio Grande do Sul, apresenta as maiores taxas de óbito por
suicídio. Segundo dados do ano de 2005, a média estadual foi de 10 suicídios
para cada 100 mil habitantes.
Segundo a OMS estima-se que em 2020, aproximadamente 1,53
milhões de pessoas no mundo morrerão por suicídio. Um número 10 a 20
vezes maior de pessoas tentará suicídio, o que representa um suicídio a cada
20 segundos e uma tentativa de suicídio a cada um a dois segundos. Estes
números indicam que mais pessoas morrerão por suicídio do que em todos os
conflitos armados e, em muitos países, correspondem a um numero igual ou
maior de mortes em acidentes de trânsito (Bertolote, Mello-Santos e Wang,
2004).
Botega e Rapeli (2002) citam que, de acordo com a OMS, os
coeficientes de mortalidade por suicídio variam desde mais de 35 por 100.000
habitantes por ano em países como Lituânia, Estônia e Rússia, a menos de 10
por 100.000 em Portugal, Espanha, Grécia, Itália, Reino Unido e na maioria dos
países latino-americanos. Nesse último grupo podem-se incluir os países da
América do Sul, com exceção do Uruguai, que se coloca entre os países com
taxas médias de suicídio (10 a 19 suicídios por 100.000 habitantes como
também é o caso de Cuba, El Salvador, Porto Rico e Estados Unidos).
Ainda de acordo com a OMS (1999), no Brasil o coeficiente de
mortalidade por suicídio, para cada cem mil habitantes foi de 3,5 no ano de
1992 (5,6 para homens e 1,6 para mulheres). Embora as taxas tenham se
mantido estáveis nos últimos 12 anos, elas cresceram entre homens na faixa
dos 15 e 34 anos e decresceram entre homens na faixa dos 35 e 44 anos.
14

De acordo com o Departamento de Informática do Sistema Único de


Saúde (DATASUS), no período de 1980 a 2000, houve aumento de cerca de
40% da taxa de suicídio para o sexo masculino (de 4,6 em 1980 para 6,4 em
2000), já o sexo feminino manteve-se estável (de 2 em 1980 para 1,6 em
2000). Considerando as taxas totais, os homens brasileiros suicidaram-se de
2,3 a 4 vezes mais que as mulheres nesse período.
Segundo Botega e Rapeli (2002), em 1992 em São Paulo, os
coeficientes de mortalidade por suicídio foram 8,6/100.000 para o sexo
masculino e 2,4/100.000 para o feminino. Algumas características como a
gravidez e a maternidade, seriam fatores protetores para o sexo feminino
(Bertolote, Mello-Santos e Wang, 2004).
Bertolote, Mello-Santos e Wang (2004) reportaram que, de acordo com a
faixa etária, os idosos acima de 65 anos constituem o estrato com as maiores
taxas de suicídio ao longo dos últimos 30 anos. O efeito da idade é uma
tendência crescente a partir da faixa dos 45 aos 54 anos, aumentando
rapidamente até o estrato dos indivíduos com mais de 75 anos. O suicídio para
a faixa dos jovens no estrato de 5 a 14 anos foi uma condição infrequente,
contudo houve grande aumento para a faixa etária de 15 a 24 anos. Embora as
taxas de suicídio entre os indivíduos jovens ainda se mostrem relativamente
baixas, o ritmo acelerado de crescimento dessas taxas (42,8% entre 1979 e
1998) já constituem um forte motivo para preocupação. Estratégias preventivas
direcionadas a esta população são vitais, estimular grupos de discussão de
adolescentes, conscientizar educadores e pais sobre essa problemática,
treinamento de profissionais capazes de assistir este grupo, treinamento
ocupacional e encaminhamentos adequados são algumas estratégias que
poderiam ser implantadas e ter eficácia avaliada.
Segundo Botega e Rapeli (2002), os dados oficiais relativos a tentativas
de suicídio são mais falhos do que os de mortalidade por suicídio. Estima-se
que os coeficientes de tentativa de suicídio sejam, pelo menos, 10 vezes
superiores aos de suicídio.
Segundo um estudo brasileiro, a tendência é de que os homens
brasileiros suicidem-se mais que as mulheres, na proporção de 3:1 o que
concorda com estudos internacionais. Entretanto, essa relação inverte-se
quando estudada as tentativas de suicídio: as mulheres tentam suicídio três
15

vezes mais que os homens, proporcionalmente (Bertolote, Mello-Santos e


Wang, 2004.
Segundo Botega e Rapeli (2002), de 15 a 25% das pessoas que tentam
o suicídio tentarão se matar no ano seguinte. Dos que tentam o suicídio, 10%
conseguem se matar nos próximos 10 anos. Ainda, 15% dos casos de
depressão grave, 15% das pessoas dependentes do álcool e 10% dos
esquizofrênicos cometem suicídio. Dos suicidas, 45 a 70 % apresentavam
transtornos do humor.
No Brasil, dados oficiais apontam o enforcamento como o método mais
frequentemente utilizado para o suicídio, seguido por arma de fogo e
envenenamento. No município de São Paulo, o envenenamento, que era o
método mais utilizado entre os homens em 1960, cedeu lugar para a arma de
fogo e enforcamento. Nas mulheres, o envenenamento persiste como o
principal meio de cometer o suicídio. Atos mais violentos, como atirar-se de
alturas, ferimentos por armas de fogo, enforcamento e acidentes de transito
propositais geralmente ocorrem com pessoas mais velhas, com maior
intencionalidade suicida. Sabe-se que, quanto mais letal o método utilizado,
maior a chance de nova tentativa de suicídio. Entretanto, a intencionalidade
suicida não deve ser desconsiderada quando o método envolveu menor perigo
para a vida do paciente (BOTEGA e RAPELI, 2002)
De acordo com Cassorla (1992), no município de São Paulo predomina
a arma de fogo como método para matar-se pelos homens, seguido do
enforcamento e precipitação de lugares elevados, enquanto as mulheres
preferem o envenenamento, seguido também de queda de lugares altos.
Conforme citado por Bertolote, Mello-Santos e Wang (2004),

O alto potencial letal dos métodos de suicídio é uma característica


mais comum no homem do que na mulher. Mesmo para as tentativas
de suicídio, os homens costumam apresentar maior intencionalidade
de morte. Enquanto o homem busca no ato suicida a solução drástica
para o seu fracasso pessoal, a mulher tenta remediar condições
adversas. (p. 105)

Pacientes que se ferem repetidamente com lâminas de barbear, cacos


de vidro ou com cigarros, geralmente justificam seus atos como uma tentativa
de diminuir a angústia e a vivência de despersonalização. A visão do próprio
16

sangue é acompanhada por sensação de alívio e prazer. Baixa auto-estima,


comportamento impulsivo, abuso de álcool e de drogas, juntamente com
transtornos de identidade sexual são encontradas nesse grupo (BOTEGA e
RAPELI, 2002).
Em um estudo realizado no Hospital de Clinicas da UNICAMP, mostrou,
entre as tentativas de suicídio, uma grande quantidade de pessoas com
ingestão de excesso de medicamentos (60% dos casos atendidos), entre eles
em primeiro lugar os benzodiazepínicos (50% dos casos), barbitúricos (16%
dos casos), analgésicos (13%), antibióticos (13%) e outros grupos de
psicofarmacos (8%) (Botega e cols., 1995 apud Botega e Rapeli, 2002).
De acordo com Bertolote, Mello-Santos e Wang (2004), as informações
brasileiras de mortes por suicídio extraídas dos atestados de óbito apresentam
deficiências, limitações e muitas falhas qualitativas. No Brasil, diversos locais
não possuem serviços de referencia para o esclarecimento de mortes por
causa externa, outras localidades não enviam regularmente tais informações
para o Ministério da Saúde, órgão responsável pelas informações relativas aos
óbitos em geral.
No sistema brasileiro, os casos de suicídio são registrados na seção das
Causas Externas da Classificação Internacional de Doenças (CID-10). As
informações registram eventos letais não decorrentes de doenças biológicas,
monitorando, sobretudo, as mortes resultantes de violência, acidentes fatais e
suicídio.
Segundo Cassorla (1992), é difícil precisar quantas pessoas se matam
ou tentam suicídio, já que o número de suicídios que consta das estatísticas
oficiais é extraído das causas de morte assinaladas nos atestados de óbito.
Mas, esses atestados nem sempre são confiáveis, uma vez que, a família e a
própria sociedade frequentemente pressionam para que a causa seja
falsificada.
Muitas vezes, o suicídio é ocultado por familiares ou mesmo
autoridades. Estima-se que os registros de óbito por suicídio sejam duas a dez
vezes maiores que os reais. A sociedade brasileira, especialmente os
familiares ainda apresentam dificuldade e preconceito para lidar com essa
questão, o que acaba distorcendo a magnitude real das taxas de suicídio.
17

De acordo com Bertolote, Mello-Santos e Wang (2004), frequentemente


os médicos legistas não esclarecem a causa básica da morte no atestado de
óbito, especificam somente a natureza da lesão, dificultando a obtenção de
dados conclusivos sobre a morte. Os Institutos Médicos-Legais (IML) nem
sempre utilizam todas as informações disponíveis para preencher as
declarações de óbito, classificando cerca de 9,8% dos casos como suicídio e
homicídio. Verificando-se ainda que cerca de 20,9% das declarações não
continham informações que permitissem considerar o óbito decorrente de
suicídio, sendo que 66% dos óbitos por causas externas foram aferidos
incorretamente como acidentais.

1.4 Fatores de risco

A existência de dados epidemiológicos brasileiros representa um


importante avanço para dimensionar a magnitude do problema no País.
Permite identificar os grupos de maior risco na população geral, para
desenvolver estratégias diferenciadas de intervenção, focalizando nas
características de cada grupo. Mas os dados obtidos sobre os comportamentos
suicidas no Brasil ainda são escassos, dificultando os estudos e prevenção
(Bertolote, Mello-Santos e Wang, 2004).
De acordo com Resmini (2004), por risco entende-se a possibilidade de
um perigo previsível, porém incerto, que ameaça a pessoa de sofrer dano à
saúde ou à vida. O fator de risco pode ser qualquer característica ou
acontecimento na vida de uma pessoa, ou de seu ambiente, que contribui para
alterar negativamente suas reações comportamentais. O fator de risco insere-
se em uma conexão com outros elementos da historia do paciente,
destacando-se como um sinal de alerta para uma possível evolução de
comportamentos suicidas futuros.
Durkheim (1982) relata que em cada grupo social há uma tendência
especifica para o suicídio que não pode se explicar nem através da constituição
orgânico-psíquica dos indivíduos nem através da natureza do meio físico.
18

Portanto, por eliminação, depende necessariamente das causas sociais e


constitui, por si só, um fenômeno coletivo.
De acordo com Meleiro e Teng (2004), existem fatores que podem estar
associados com menor risco de comportamento suicida, sendo chamados de
fatores de proteção. Gravidez, religiosidade, senso de responsabilidade para a
família, satisfação em viver, crianças em casa, presença de habilidades
positivas de enfrentamento, suporte da rede social além da relação terapêutica
positiva são exemplos de fatores de proteção. Reforçar e/ou instalar alguns
destes fatores pode diminuir o risco potencial de suicídio, apesar de alguns dos
fatores modificáveis dependerem de processos terapêuticos longos, como o
desenvolvimento de aspectos cognitivos de enfrentamento e solução de
problemas, e outros dependerem de características de história pessoal como a
religiosidade.
De acordo com Resmini (2004), fatores individuais de senso de valor
próprio, confiança em si mesmo, capacidade de buscar ajuda, flexibilidade para
aprender coisas novas e habilidades para comunicação, grupo familiar coeso,
apoio de pessoas importantes, inserção social e trabalho fixo podem estar
relacionados a fatores protetores contra o ato suicida
De acordo com Resmini (2004), os fatores de risco são divididos em
fatores fixos e fatores potencialmente modificáveis. No primeiro grupo temos
sexo, idade, grupos étnicos, orientação sexual, tentativas de suicídio prévias,
transição socioeconômica dos países, anomia (falta de normas sociais). No
segundo grupo temos acesso aos métodos, doenças físicas, transtornos
mentais, o isolamento social, desesperança, situação conjugal e situação
ocupacional.
O risco de suicídio aumenta com a idade, sendo baixo em crianças,
tendo um grande aumento na adolescência e atingindo seu maior nível após os
65 anos.
O suicídio, no Brasil e na grande maioria dos países, é duas, a três
vezes mais frequente em homens que em mulheres. Na tentativa de suicídio
ocorre uma inversão, as mulheres tentam mais do que os homens (cerca de
3:1), sendo que dois terços têm menos que 35 anos (pico em mulheres de 15 a
30 anos).
19

As tentativas de suicídio em mulheres são mais frequentes como a


expressão do sofrimento ou a modificação do comportamento de outras
pessoas. Ocorrem menos comportamentos suicidas em mulheres grávidas,
puerperas ou com filhos pequenos, exceto de quadros psiquiátricos associados
à fase puerperal. Porém, quando a gravidez é indesejada e em adolescentes, o
qual o risco de suicídio pode estar aumentado.
Segundo Resmini (2004), o comportamento suicida nas mulheres
geralmente reflete os sentimentos de serem rejeitadas ou não amadas, os
quais são sintetizados em frases do tipo: “Não tenho esperança de vir a tê-lo e
não consigo mais viver sem você”.
Os homens, ao contrário das mulheres, apresentam intenções de morrer
e utilizam meios mais violentos para as tentativas ou concretizações dos
suicídios, provavelmente por desejarem mais a morte, por conhecerem
métodos mais violentos e temerem menos a desfiguração corporal.
Segundo Resmini (2004), nos homens os atos autodestrutivos
relacionam-se com questões de autoafirmação, não corresponder às
expectativas sociais de força, desempenho e dúvidas quanto ao conceito de
masculinidade. A frase deles seria: “É melhor morrer do que parecer um fraco
ou fracassado”
Entre as diferenças nos fatores de risco, o abuso de substancias é mais
comum nos suicídios masculinos e a anorexia nervosa nos femininos. Os
homens são mais atingidos pelas alterações socioeconômicas que as
mulheres.
As profissões mais associadas com o suicídio são os dentistas e os
médicos, seguidos pelos enfermeiros, assistentes sociais, cientistas,
matemáticos e artistas. De acordo com a APA (2003), algumas explicações
possíveis seriam: acesso a substâncias ou métodos mais letais (profissionais
da saúde, cientistas, agricultores, policiais), estressores específicos das
profissões ou tendência para agregar mais indivíduos com transtornos
psiquiátricos.
Segundo a APA (2003), existe uma associação consistente entre abuso
físico ou sexual na infância e comportamento suicida, em especial ideação
suicida e tentativa de suicídio. Segundo Beck, Brown e Wenzel (2010) o
20

histórico de abuso na infância é associado com níveis maiores de perturbações


psiquiátricas e com uma maior chance de engajamento em atos suicidas.
História de abuso sexual também é comum em pacientes com
transtornos psiquiátricos sendo que o risco de comportamento suicida aumenta
com a presença deste tipo de histórico quando comparado com pacientes com
o mesmo tipo de transtorno sem este tipo de histórico. Nos pacientes
psiquiátricos com historia de abuso sexual, as tentativas ocorrem em idade
mais precoce e eles apresentam múltiplas tentativas. Também, indivíduos que
tentaram o suicídio e que possuem história de abuso na infância apresentam
maior risco de tentarem novamente, em comparação com os que não têm esta
história.
De acordo com Resmini (2004) a criança maltratada ou negligenciada
tende a desenvolver sentimentos de desvalia, sentimentos de culpa e
tendências para esperar o sofrimento como uma contingência natural de sua
existência. Portanto, o enfraquecimento da autoestima em decorrência de
abuso ou negligência, representa importante fatore de predisposição para o ato
suicida.
Segundo a OMS (2000) a maioria das pessoas que comete suicídio
passou por acontecimentos estressantes nos três meses anteriores ao suicídio,
como: problemas interpessoais, rejeição, perdas, problemas financeiros ou no
trabalho.
Cerca de 56% dos suicidas morrem na primeira tentativa, especialmente
os homens, com 62% de mortalidade comparados com 38% das mulheres. Os
sobreviventes de uma tentativa de suicídio continuam sob alto risco de repetir
este comportamento e completarem o suicídio. Até 12% dos sobreviventes
acabam se suicidando, um risco 38 vezes maior que a população em geral e
superior a qualquer transtorno psiquiátrico. Este risco é maior nos primeiros
anos após a tentativa. Outros fatores importantes que aumentam o risco de
suicídio naqueles que tentaram suicídio são suporte social pobre, doença física
de longa duração, tentativas múltiplas de suicídio ou tratamento psiquiátrico
prévio.
De acordo com Resmini (2004), a tentativa prévia mais ou menos
recente, a que foi acompanhada de intenção de morte ou a que faz parte de
uma sequência de várias tentativas anteriores possui maior significado clínico.
21

A tentativa prévia exerce esse papel de predisponente a uma progressão até o


suicídio completo, especialmente no sexo masculino. Uma história de tentativas
prévias revela que as causas que as motivaram não foram devidamente
tratadas e modificadas, causando a repetição e, não raramente, o agravamento
da situação.
A desesperança é a principal dimensão psicológica associada ao
comportamento suicida. Está presente em grande intensidade na maioria dos
pacientes que tentaram o suicídio e dos suicidas, independente do diagnóstico
de transtornos psiquiátricos (APA, 2003). Hall e cols (1999) apud Melereiro e
Teng (2004), os sintomas psiquiátricos com maior poder preditivo para uma
tentativa de suicídio grave foram desesperança, insônia, intensa ansiedade e
inquietação, além de humor deprimido.
A impulsividade e agressividade são características do comportamento
que estão fortemente correlacionadas com comportamento suicida,
especialmente em esquizofrênicos e pacientes com transtorno do humor.
Segundo Meleiro e Bahls (2004):

A maioria das pessoas com intenção suicida comunica seus


pensamentos e intenções suicidas através das palavras nas quais
apresentam temas como sentimento de culpa, desvalia, ruína moral
e desesperança. Quaisquer que sejam os problemas, os sentimentos
e pensamentos da pessoa suicida, tendem a ser os mesmos em todo
o mundo. (MELEIRO e BAHLS, 2004, p. 26).

Segundo a OMS (2000), existem três características psicopatológicas na


mente dos suicidas:

1 - Ambivalência: o desejo de viver e o desejo de morrer batalham em uma


gangorra. Há uma urgência de sair da dor de viver e um desejo de viver. Muitas
pessoas suicidas não querem realmente morrer. Se for dado o apoio emocional
necessário, o desejo de viver aumentará e o risco de suicídio diminuirá.

2 - Impulsividade: o impulso para cometer suicídio é transitório e dura poucos


minutos ou horas. É comumente desencadeado por eventos negativos e
estressores do dia-a-dia. Acalmando essa crise, o profissional pode ajudar a
diminuir o desejo suicida com uma abordagem empática.
22

3 - Rigidez: seus pensamentos, sentimentos e ações são focados no suicídio, e


não são capazes de perceber outras maneiras de sair do problema, agindo
drasticamente.

Cassorla (1992) refere que não existe nenhuma teoria que possa
explicar todos os casos e situações de comportamentos suicidas, pois eles são
a expressão de múltiplos fatores que interagem de forma específica em cada
indivíduo e resultantes de aspectos constitucionais da história do
desenvolvimento, de circunstâncias sociais e de fantasias próprias sobre a
morte e o pós-vida.
Para Carvalho (1996) os pacientes potencialmente suicidas dividem-se
naqueles que realmente querem se matar, utilizando de um método seguro e
irreversível, e se este, por algum motivo falhar, eles tentarão novamente, até
conseguirem seu intento. Aqueles que tentam de uma maneira não tão letal,
que deixam a possibilidade da chegada de pessoas a tempo de socorro. E
aqueles que querem morrer, que vão se matar, que não tem mais sentido viver,
mas não atentam contra si próprios. Na concepção da autora, o maior grupo de
risco é o primeiro citado.
Segundo Cassorla (1992), as motivações psicológicas e sociais das
pessoas suicidas são diferentes. Os suicidas que morrem geralmente usam
métodos mais violentos, a intensidade e gravidade de seus conflitos é maior e
verifica-se que apresentam maiores dificuldades de contato social e são mais
isolados. As pessoas que tentam suicídio e não morrem têm mais facilidade em
contato humano e o ato suicida muitas vezes pode ser entendido como forma
de comunicação com o ambiente, como um pedido de ajuda de pessoas que
não se sentem compreendidas. Portanto, o que se percebe é que com maior
frequência os suicidas se isolam de modo a seu ato não ser descoberto,
enquanto que os que tentam e se salvam, são menos cuidadosos no preparo
do ato.

Segundo Kovács (1992),

É necessário observar e cuidar do individuo que pede ajuda. O


grande perigo é que, muitas vezes, estas pessoas não são levadas a
sério. As tentativas de suicídio são muitas vezes taxadas
pejorativamente de atos histéricos. É conhecida a reação do grande
23

público a ações espetaculares, incitando o sujeito a finalizar o ato. Às


vezes, o indivíduo planeja tudo, pensando que vão salvá-lo e ao ver a
reação contrária, pode se sentir ainda mais desesperado. Sabe-se
que a pessoa que tenta suicídio, tem alto risco de repetir o ato, se
não receber a ajuda de que necessita, procurando formas mais letais
e eficazes. São frequentes as histórias de sujeitos com inúmeras
tentativas, até que finalmente uma dá certo. É importante cuidar de
questões, como: defesas enfraquecidas, apoio dos valores pessoais,
possibilidade de expressão de sentimentos, ênfase em novas
relações e elevação da autoestima (KOVÁCS, 1992, p. 192).

De acordo com Meleiro, Botega e Prates (2010) todas as ameaças de


suicídio devem ser encaradas com seriedade, mesmo quando possam parecer
falsas ou manipulativas. Independentemente do diagnóstico, é essencial o
estabelecimento de uma aliança terapêutica com o paciente. Além disso, deve-
se procurar compreender o estado agudo do mesmo, as razões pelas quais ele
decidiu pelo suicídio.
Segundo Cassorla (1991), é totalmente falso que quem fala em morrer
ou matar-se não cometerá o ato. A maioria dos futuros suicidas dão sinais
sobre suas intenções, de forma direta ou indireta. Frases do tipo: “não vale a
pena continuar vivendo assim”, “estou cansado do mundo”, “não sei o que será
de meus filhos”, “sei que vou morrer logo”, “isto logo vai acabar”, são
comumente usadas pelos suicidas, mas passam despercebidas.
A grande maioria das pessoas que comete suicídio apresenta algum
transtorno psiquiátrico e mental diagnosticável.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010), a presença de um ou
mais tipos de perturbações psiquiátricas é a variável central na etiologia de
atos suicidas, já que 90% ou mais dos indivíduos que morrem por suicídio são
diagnosticados com um ou mais transtornos psiquiátricos. Definimos
perturbação psiquiátrica como um caso no qual uma pessoa preenche os
critérios para um ou mais transtornos psiquiátricos ou relata ou exibe sintomas
psiquiátricos associados a prejuízo funcional, com sofrimento subjetivo ou
ambos.
De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria (2009), a
existência de um transtorno mental é considerada um forte fator de risco para o
suicídio. Uma revisão de 31 artigos científicos publicados entre 1959 e 2001,
englobando 15.629 suicídios na população geral, demonstrou que em mais de
24

90% dos casos caberia um diagnóstico de transtorno mental à época do ato


fatal.
De acordo com Bertolote (2004), a presença de um transtorno mental
não é condição obrigatória para ocorrer o suicídio, mas é um dos mais
importantes fatores de risco para o suicídio. Entretanto, mais de 90% dos
suicidas apresentam algum transtorno psiquiátrico associado, sendo 58% a
85%, depressão ou alcoolismo. A combinação de transtornos psiquiátricos
tende a aumentar o risco de suicídio, especialmente quando uma dessas
condições combina-se, com, por exemplo, depressão e alcoolismo; ou ainda,
comorbidades ligadas à depressão, ansiedade, impulsividade e agitação.
De acordo com Kutcher e Chehil (2007), estudos publicados tem sido
notado que cerca de 50% das pessoas que morrem de suicídio podem sofrer
de doença depressiva. Os transtornos do humor conferem um aumento de 20
vezes no risco de morte por suicídio. A depressão maior e as fases depressivas
e mistas do transtorno bipolar são os diagnósticos mais frequentemente
encontrados nas mortes por suicídio. Para pacientes mais jovens que sofrem
de depressão maior ou transtorno bipolar, os suicídios têm ocorrência mais
provável nas fases iniciais da doença, particularmente se os sintomas
depressivos são acompanhados de ataques de pânico, ansiedade grave,
concentração diminuída, insônia grave, abuso de álcool e anedonia. A
presença de desesperança, variando de pessimismo e expectativas negativas
sobre o futuro até desesperança sobre o futuro, também tem sido associada
com risco aumentado de suicídio particularmente em estágios mais tardios da
doença. Indivíduos que atravessam um episódio depressivo dentro do contexto
da doença bipolar podem estar sob um risco ainda maior de suicídio do que os
que têm depressão unipolar.
Conforme Beck, Brown e Wenzel (2010) o transtorno bipolar é associado
ao comportamento suicida, mas parece que os pacientes suicidas estão em
maior risco se realizarem atos suicidas quando eles estão em fase depressiva
ou de humor misto da doença, durante a mania é raro.
De acordo com Kutcher e Chehil (2007), o comportamento suicida na
depressão é a expressão de uma interação complexa entre a doença e fatores
ambientais. Quando a depressão ocorre simultaneamente com uma condição
25

médica crônica (como dor ou doença cardíaca) ou com uma doença médica
ameaçadora à vida (como câncer) o risco de suicídio pode estar aumentado.
Considerando os pacientes graves (com história de internação), o risco
de suicídio é maior em pacientes com depressão maior do que o dos bipolares.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010), em pacientes
depressivos, quanto maior a desesperança, maior será o desejo dos pacientes
em se matarem, uma vez que apresentam expectativas negativas frente ao
futuro. Estudos sugerem que a desesperança foi responsável por 76% das
associações entre depressão e intenção suicida em 384 pacientes que foram
hospitalizados por tentativa de suicídio. Percebe-se que a intensidade da
intenção suicida era mais altamente correlacionada com a desesperança do
que com a depressão. Segundo a OMS (2000) a depressão é o diagnóstico
mais comum em suicídios consumados.
Alguns sintomas comuns da depressão são: sentir-se triste durante a
maior parte do dia; perder o interesse em atividades rotineiras; perder peso ou
ganhar peso repentinamente; dormir demais ou de menos; sentir-se cansado e
fraco o tempo todo; sentir-se inútil, culpado e desesperançoso; sentir
dificuldade em concentrar-se, tomar decisões ou lembrar-se de coisas; ter
pensamentos frequentes de morte e suicídio. Segundo Kutcher e Chehil (2007),
todo paciente depressivo deve ter monitoramento constante do risco de suicídio
– mesmo quando estão sentindo-se melhor.
De acordo com Resmini (2004) quadros depressivos entre adolescentes,
tem elevada incidência em tentativas de suicídio.
Segundo Meleiro e Teng (2004) pessoas com transtorno de
personalidade também apresentam risco aumentado de suicídio em até 12
vezes para homens e 20 vezes para mulheres, especialmente os transtornos
de personalidade borderline e antissociais, além de apresentarem associação
com outros transtornos psiquiátricos maiores, principalmente os transtornos do
humor e abuso de drogas. Estressores psicossociais como problemas no
trabalho, discórdia familiar ou dificuldades financeiras parecem ser importantes
fatores desencadeadores em indivíduos com transtornos de personalidade. Em
pacientes com transtorno de personalidade borderline, impulsividade e abuso
de drogas foram os principais fatores associados ao maior número de
tentativas de suicídio.
26

De acordo com Kutcher e Chehil (2007), existem fatores de risco


adicionais para o suicídio completado para transtornos de personalidade, que
são: desemprego, dificuldades financeiras, desavenças familiares, conflitos
interpessoais, perdas e impulsividade.
De acordo com a APA (2003), pacientes esquizofrênicos ou portadores
de outros transtornos crônicos psicóticos apresentam um risco de suicídio
aumentado entre 8 e 14 vezes em relação a população em geral, com risco ao
longo da vida em torno de 4%. Segundo a OMS (2000) aproximadamente 10%
dos esquizofrênicos acabam cometendo suicídio.
Os suicídios em esquizofrênicos ocorrem mais em indivíduos do sexo
masculino, nos primeiros anos de doença, principalmente em períodos
próximos a internações psiquiátricas, o que acaba diminuindo a idade média
quando comparada com a população em geral. Quando casos de
esquizofrênicos suicidas foram comparados com controles suicidas com outros
diagnósticos psiquiátricos, a principal diferença foi a menor importância dos
eventos vitais no desencadeamento do suicídio para os esquizofrênicos,
sugerindo a piora do quadro psiquiátrico e consciência da doença na
determinação do comportamento suicida dos esquizofrênicos. Já a associação
com depressão parece aumentar o risco de suicídio em esquizofrênicos. O
risco máximo de cometer suicídio é durante o período pós-psicótico, devido a
perda de apoio, redução na supervisão, não adesão ao tratamento e re-
exposição a fatores estressantes prévios (Meleiro e Teng, 2004).
Segundo Kutcher e Chehil (2007) estudos demonstram que até 50% dos
pacientes esquizofrênicos podem tentar o suicídio em algum momento da
doença. As tentativas de suicídio na esquizofrenia são frequentemente
precipitadas pela depressão, estressores psicossociais, são quase sempre
sérios do ponto de vista médico e associados com um alto grau de
intencionalidade. Pacientes que se sentem aterrorizados por seus sintomas,
aqueles que apresentam delírios persecutórios e aqueles que apresentam
alucinações de comando agressivas ou suicidas podem estar sob risco elevado
de comportamento auto-lesivo e suicídio completado.
De acordo com Resmini (2004), existem evidências que correlacionam o
transtorno esquizofrênico com a maior incidência de comportamento suicida.
Os pacientes esquizofrênicos se matam por motivos diferentes daqueles
27

porque se matam pacientes com outros diagnósticos. O suicídio ocorre nas


fases iniciais da doença, quando ele experimenta angústia de desfragmentação
e vivências catastróficas, durante o curso de alucinações auditivas que lhes
ordenam que o façam ou nos denominados quadros de depressão pós-
psicótica, quando o paciente percebe sua incapacidade provocada pela doença
e desenvolvem mais depressão, desesperança e risco de suicídio.
Segundo Kutcher e Chehil (2007) para muitos pacientes, o período
posterior à alta e durante períodos de melhora depois de recaídas, o risco de
tentativas de suicídio é maior. Isto pode ser parcialmente atribuído a melhora
do juízo crítico que geralmente acompanha a melhora dos sintomas, que pode
proporcionar ao paciente a capacidade de avaliar o impacto da doença em sua
capacidade funcional e aceitação pela sociedade, a perda de habilidades
prévias, relacionamentos e posição social, e as consequências da
estigmatização e da discriminação. Adicionalmente, o inicio da depressão pós-
psicótica após um episódio agudo têm sido identificado como um período de
vulnerabilidade para pacientes esquizofrênicos, particularmente homens jovens
com boa percepção e bom funcionamento pré mórbido.
De acordo com Resmini (2004), a ansiedade é um sintoma relacionado
com uma expectativa negativa sobre o futuro, tanto pela incapacidade do
individuo fazer frente aos problemas (ansiedade depressiva) quanto por sentir
os outros como hostis e contrários a seus propósitos (ansiedade paranóide).
Os indivíduos ansiosos antecipam os acontecimentos e convencem a si
mesmos de que os fatos vão ocorrer de uma forma prejudicial para si e para os
que amam. Eles imaginam constantemente catástrofes, desgraças e um futuro
assustador. A ansiedade enrijece o individuo, limita sua capacidade de pensar
e sua criatividade. Rígido, ele não considera alternativas para suas
expectativas sombrias. A ansiedade torna-se mais incômoda quando está
associada ao humor depressivo e ao sentimento de desesperança. A
associação da ansiedade com a desesperança gera o desespero e o pânico.
Segundo Meleiro e Teng (2004) os transtornos ansiosos estão
associados a um maior risco de suicídio que a população em geral, porém,
menor que o risco observado para os transtornos depressivos. Esse aumento
de risco poderia ser atribuído a maior chance de associação entre os
transtornos ansiosos e os transtornos depressivos, de personalidade e abuso
28

de drogas, uma vez que os casos de suicídio em transtornos ansiosos também


tinham comorbidades psiquiátricas. Apesar das controvérsias, pacientes com
transtornos ansiosos e sintomas ansiosos proeminentes necessitam de uma
avaliação mais detalhada do risco de suicídio, principalmente os casos que são
diagnosticados erroneamente como doença física (APA, 2003).
Os transtornos de ansiedade estão envolvidos em 15 a 20% dos
suicídios e conferem um aumento de 6 a 10% no risco de suicídio,
particularmente se associado com ataques de pânico, depressão e/ou uso de
álcool. A presença de ansiedade grave ou ataques de pânico, dentro ou fora do
contexto de qualquer transtorno ansioso, tem por si só sido associada com
riscos aumentados de suicídio. (KUTCHER E CHECIL, 2007)
De acordo com Resmini (2004), entende-se substancia psicoativa como
aquela capaz de modificar o humor e o comportamento dos indivíduos.
Incluem-se nesse grupo as drogas lícitas e ilícitas. Álcool, maconha, LSD,
cocaína, opióides, anfetaminas (inibidores do apetite), ecstasy, tabaco,
tranquilizantes prescritos por médicos (benzodiazepínicos), solventes voláteis
(lança-perfume, loló), entre outros.
Segundo Meleiro e Teng (2004) problemas com álcool e drogas são
comuns entre os suicidas. A intoxicação por álcool tem sido identificada em
aproximadamente 50% dos suicídios em diversos países, inclusive no Brasil.
De acordo com a OMS (2000), cerca de um terço dos casos de suicídio estão
ligados à dependência do álcool. Estima-se que cerca de 5 a 10% das pessoas
dependentes de álcool terminam sua vida pelo suicídio.
Existe dificuldade em classificar tentativa de suicídio, correlacionada
com abuso excessivo de álcool (overdose) e uso de múltiplas drogas, como
cocaína e álcool, confundindo o real impacto de cada droga. De acordo com a
APA (2003), é bastante claro um aumento do risco de suicídio associado ao
uso de álcool e outras drogas (de 5 a 20 vezes maior), sendo a associação de
drogas um fator agravante desse risco, assim como a presença de transtornos
comorbidos, principalmente a depressão e os transtornos de personalidade.
Pode-se associar o aumento de tentativas de suicídio, entre jovens menores de
30 anos com problemas de uso/abuso/dependência, o que leva a hipótese de o
aumento de suicídio em jovens ser decorrente da maior facilidade de acesso ao
álcool e outras drogas.
29

De acordo com Kutcher e Chehil (2007), em contraste com a depressão


e a esquizofrenia, o suicídio entre abusadores de substâncias geralmente
ocorre mais tarde no curso da doença, depois que seus efeitos crônicos
impactaram pesadamente a saúde e o funcionamento social, interpessoal,
vocacional/ocupacional e econômico. O abuso de álcool no contexto de uma
doença psiquiátrica é um fator de risco importante para o suicídio. Episódios
depressivos maiores podem ser identificados em até três quartos dos
alcoolistas que morrem por suicídio.
Entre as mulheres, o risco aumenta muito mais do que entre homens,
sendo que as mulheres suicidas com problemas com álcool são mais jovens do
que os homens suicidas, além de elas terem mais comorbidades psiquiátricas e
problemas de dependência com drogas prescritas por médicos.
De acordo com a OMS (2000), pessoas dependentes de álcool que
comentem suicídio não só começam a beber em idade precoce e bebem
intensamente, como também vêm de família de alcoolistas. A presença
conjunta de alcoolismo e depressão em um indivíduo aumenta enormemente o
risco de suicídio.
Segundo Resmini (2004) o sentimento de solidão e de vazio interior num
jovem que tem características pessoais de impulsividade, tendência ao agir em
substituição à reflexão, intolerância a frustração e voracidade predispõe tanto
ao abuso de drogas quanto a conduta suicida.
De acordo com Kutcher e Chehil (2007), existem alguns fatores de risco
adicionais para o suicídio relacionados ao uso de substâncias que são: perdas
interpessoais recentes ou iminentes, presença de outros transtornos
psiquiátricos, perda ou conturbação de uma relação interpessoal próxima,
ameaça de perda de uma relação e presença de um episódio depressivo.
Também existem fatores de risco adicionais em transtornos relacionados ao
álcool, que são: comunicação de intenção suicida, tentativa de suicídio prévia,
ingestão contínua ou progressiva de álcool, desemprego recente, viver sozinho,
suporte social deficiente, dificuldades legais, dificuldades financeiras, doenças
médicas sérias, outros transtornos psiquiátricos, distúrbios da personalidade e
uso de outras substancias.
Segundo Meleiro e Teng (2004) o risco de mortalidade em geral é 9,6
vezes mais alto nos pacientes com transtornos alimentares, assim como a
30

mortalidade específica por suicídio é aumentada em até 58 vezes. Esse


excesso de mortalidade pode ser atribuído à anorexia nervosa, sendo que
estudos mostram maior incidência de comportamento suicida em pacientes
bulímicas. Apesar dos poucos estudos disponíveis neste tema, o alto risco
descrito associado ao caráter secreto destes transtornos exige dos clínicos um
alto índice de suspeita destes transtornos nos casos de tentativa de suicídio e
também um cuidado especial para avaliar o risco de suicídio em pacientes com
transtornos alimentares.
Segundo Kovács (1992), o suicídio é um ato muito complexo, não pode
ser considerado em todos os casos como psicose ou como decorrente de
desordem social. Também não pode ser ligado de forma simplista a um
determinado acontecimento como rompimento amoroso, ou perda de emprego.
Trata-se de um processo, que pode ter tido o seu início na infância, embora os
motivos alegados sejam tão somente os fatores desencadeantes.
De acordo com Resmini (2004), a presença de comorbidade entre um
transtorno de humor depressivo e um transtorno de conduta ou de
personalidade borderline aumenta significativamente a frequência e gravidade
das tentativas de suicídio. A comorbidade do transtorno por abuso de
substancia e o transtorno do humor também são comuns. Entretanto, naqueles
indivíduos de diversas faixas etárias que fizeram tentativas de suicídio de alta
gravidade médica, o transtorno de ajustamento foi o diagnóstico mais comum.
O transtorno de ajustamento pode apresentar sintomatologia semelhante a um
transtorno de humor, de ansiedade ou de conduta; entretanto, seu surgimento
guarda relação direta com a presença de um estressor e a duração do
transtorno é limitada. A associação do transtorno de ajustamento com o
transtorno de personalidade histriônica ou borderline tem sido a comorbidade
preponderante nestes casos. Por outro lado, entre os pacientes que fizeram
tentativas de suicídio suficientemente graves para provocar a morte, na
investigação retrospectiva, houve maior frequência de transtorno depressivo
maior.
31

1.5 Suicídio e Prevenção

Segundo Meleiro e Teng (2004), as causas mais comuns para provocar


o ato suicida, são as depressões, transtorno bipolar, esquizofrenia, alcoolismo,
abuso de drogas, transtornos alimentares, transtorno de personalidade, abuso
de medicações. Além dos fatores psicológicos e psiquiátricos, também existem
fatores médicos como: câncer, AIDS/HIV, como também fatores familiares,
financeiros e amorosos.
O ato é considerado como um grande problema de saúde publica, já que
em média, quase três mil pessoas cometem suicídio diariamente, de acordo
com a OMS. Para cada um desses óbitos, há no mínimo cinco pessoas ao
redor cujas vidas são profundamente afetadas emocionalmente, social e
economicamente.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010) o suicídio é um grande
problema de saúde publica para homens e mulheres de todas as idades, raça e
etnias. Aumentar a atenção do publico para esse problema por meio da
exposição do impacto do suicídio em nossas vidas, em nossas comunidades,
em nosso governo e na mídia constitui uma abordagem nacional para a
prevenção do suicídio. Famílias e outros indivíduos que tem um ente querido
que morreu por suicídio ou que tentou o suicídio podem não se sentir
confortáveis para discutir esse tópico em publico. Assim mesmo, uma maior
conscientização publica do problema pode estimular os que experimentaram a
tragédia a irem em frente e tornarem conhecidas suas preocupações para os
outros. Há cinco passos para prevenir o suicídio da perspectiva da saúde
publica:
a) vigilância ou definição da abrangência do problema;
b) avaliação dos fatores de risco e de proteção;
c) desenvolvimento e testagem de intervenções;
d) aplicação e testagem de intervenções baseadas em evidências nas
comunidades;
e) disseminação e programas de avaliação de esforços para prevenir o
suicídio.
32

Segundo Beck, Brown e Wenzel (2010), a premissa central da teoria


cognitiva é que as pessoas atribuem significados a um estímulo ambiental
particular, que por sua vez desempenha um papel fundamental, moldando seu
humor seguinte, o que está associado as suas respostas comportamentais.
Portanto, as experiências emocionais das pessoas são determinadas em sua
maior parte, pela maneira como percebem, interpretam e julgam as implicações
dessas situações. Essas reações emocionais são perturbadoras por si mesmas
e retroalimentam pensamentos adicionais que as pessoas têm sobre a situação
e suas consequências, o que tem o potencial para acentuar ainda mais o
humor negativo e o comportamento desadaptativo. O objetivo da teoria
cognitiva é identificar esses significados, percepções, interpretações e
julgamentos. Além disso, as reações não precisam ser sempre restritas a
emoções, pois elas podem englobar respostas fisiológicas e comportamentos
subsequentes.
A terapia cognitiva é baseada em uma estrutura específica de sessões e
um leque de estratégias cognitivas e comportamentais a partir das quais os
terapeutas podem escolher, com base na conceituação cognitiva do caso do
paciente (ou seja, a compreensão do quadro clínico do paciente a luz da teoria
cognitiva). A terapia cognitiva para pacientes suicidas compartilha muitas
similaridades básicas com a terapia cognitiva para pacientes que enfrentam
outros tipos de dificuldades, como a terapia cognitiva para a depressão,
ansiedade, transtornos da personalidade e para transtorno de dependência de
substancias (BECK, BROWN e WENZEL, 2010).
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010), não é incomum para os
terapeutas experimentarem ansiedade quando trabalham com pacientes
suicidas, já que eles acreditam que não serão capazes de lidar com as
múltiplas crises do paciente. Os terapeutas precisam manter um delicado
equilíbrio entre responder habilmente as ideações suicidas dos pacientes e
tolerar o fato de que muitos pacientes suicidas experimentam ideações suicidas
e desesperançosas crônicas. Além da ansiedade, muitos terapeutas também
podem sentir raiva e defensividade, uma vez que se sentem manipulados pelos
pacientes.
Segundo Meleiro, Botega e Prates (2004) em muitos casos o paciente
manifesta profunda desesperança e constrição cognitiva, não consegue
33

pensar, e vê apenas uma saída drástica. Há um sofrimento psicológico intenso,


abandono de si e sensação de solidão e de impossibilidade de ser ajudado. A
vivência da perda, isolamento, angustia insuportável e sensação de não ter
saída pode se agravar se o paciente sentir que “merece” esse profundo
desespero, como pode ocorrer na depressão melancólica.
Ainda de acordo com os autores acima, não há uma modalidade
terapêutica única que possa adequadamente dar conta das necessidades de
um individuo potencialmente suicida. A tentativa de suicídio, bem como a
ideação suicida, são sinais de alarme. Revelam a interação de fenômenos
psicossociais complexos, afetando pessoas que vivem sob tensão e que
expressam de modo agudo o seu padecimento. O manejo do paciente sob o
risco de suicídio geralmente envolve um conjunto de medidas, incluindo
combinações de psicofármacos, psicoterapia individual, contato com familiares
ou amigos, chegando, em alguns casos mais graves, à hospitalização.
Beck, Brown e Wenzel (2010) reconhecem que existem pelo menos
duas classes de pacientes suicidas: 1) Aqueles que apresentam uma forte
sensação de desesperança e um forte desejo de morrer. 2) Aqueles que não
apresentam uma forte sensação de morrer ou desesperança significativa,
porém apresentam dificuldade em modular o humor e o comportamento
impulsivo, que as vezes podem tentar suicídio com a única finalidade de
comunicar algo aos outros.
A terapia cognitiva para pacientes suicidas é fundamentada em um
esquema que agrupa a teoria cognitiva geral, a específica para os atos suicidas
e a estudos empíricos projetados para identificar importantes processos
cognitivos associados aos atos suicidas (Beck, Brown e Wenzel, 2010).
Ainda de acordo com os autores citados acima, a TCC oferece técnicas
para serem utilizadas em todas as fases do tratamento dos pacientes suicidas.
Na fase inicial é trabalhada a conceitualização cognitiva, a compreensão do
quadro clínico do paciente, fatores de vulnerabilidade, crenças e cognições
relacionadas ao suicídio. Na fase intermediária trabalha-se o desenvolvimento
de estratégias específicas e concentra-se em administrar crises suicidas e
reduzir os fatores que fazem os pacientes vulneráveis a futuros atos suicidas. A
fase avançada se dá pela consolidação das estratégias cognitivas e
comportamentais para aplicação em crises imaginadas.
34

2. OBJETIVOS

O presente estudo teve como objetivo realizar uma revisão bibliográfica


sobre as tentativas de suicídio e investigar quais as intervenções cognitivas
comportamentais são utilizadas com pacientes potencialmente suicidas.
35

3. MATERIAL E METODOS

Para a realização desse estudo foi utilizado um levantamento


bibliográfico, por meio de livros e artigos científicos pertinentes ao assunto
abordado no trabalho, utilizando bases de dados da BIREME, PUBMED e
Scielo com as palavras chaves: Terapia cognitivo-comportamental e suicídio, e
em inglês com os termos CBT e suicide.
Na base de dados virtual foram selecionados 72 artigos de língua inglesa,
desses foram utilizados 3 artigos. Os critérios de inclusão no trabalho foram a
preferencia de artigos que estudavam as tentativas de suicídio de forma
especifica sobre as técnicas da prevenção do suicídio dentro da TCC. Os
critérios de exclusão foram os trabalhos que abordaram grupos, transtornos ou
outras técnicas que não o uso da TCC.
A literatura brasileira é muito escassa na abordagem da TCC e suicídio.
A revisão incluirá leitura brasileira e inglesa dos últimos 20 anos.
36

4. RESULTADOS

A terapia cognitiva-comportamental do suicídio teve como precursor


Aaron T. Beck, que realizou diversos estudos, como escalas e outros
instrumentos para ajudar no tratamento de pacientes suicidas.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010), os objetivos da terapia
cognitiva é desenvolver estratégias eficazes de resolução de problemas, para
promover o desenvolvimento de outras estratégias cognitivas e
comportamentais para gerenciar futuras crises suicidas, desenvolver razões
para viver, melhorar as relações sociais e aumentar a conformidade com outros
tratamentos médicos e psiquiátricos.
O foco na prevenção do suicídio é central para a terapia cognitiva, seja
de forma direta (estratégias que modifiquem a ideação e a intenção suicida) ou
de forma indireta (estratégias que os pacientes possam usar para provocar
esperança para o futuro e acrescentar sentido para suas vidas).
Outra característica fundamental da terapia cognitiva é que uma grande
parte da intervenção é focada nas interpretações de situações dos pacientes e
nos meios de avaliar essas situações de uma forma realista. Os terapeutas
educam os pacientes sobre modelo cognitivo e as maneiras pelas quais
interpretações errôneas estão associadas com certas experiências emocionais
e reações comportamentais. O modelo cognitivo é reforçado usando exemplos
da própria vida dos pacientes, que compreendem que irão desenvolver
habilidades para identificar e avaliar seus pensamentos negativos relacionados
a perturbações e crises suicidas. Eles então, irão associar os pensamentos que
emergem em situações especificas a crenças mais fundamentais que definem
a maneira na qual eles vêem a si mesmos, o mundo e o futuro, e trabalharão
para modificar as crenças (BECK, BROWN e WENZEL, 2010, pg. 93 e 94).
A terapia cognitiva também inclui estratégias que são de caráter
fundamentalmente comportamental. Por exemplo, para pacientes ansiosos
geralmente são usadas técnicas de relaxamento e para pacientes depressivos,
geralmente um monitoramento de atividades. Estratégias comportamentais são
úteis na obtenção de alívio de sintomas perturbadores e no desenvolvimento
de meios hábeis de administrar sintomas quando eles surgirem no futuro.
Entretanto, estratégias comportamentais também produzem mudanças
37

cognitivas, de modo que demonstram aos pacientes que eles têm habilidade
para tolerar e administrar perturbações e que seus problemas não são
insolúveis.
É de suma importância que os terapeutas demonstrem uma postura
empática, colaborativa e isenta de julgamentos. Portanto, o objetivo da terapia
cognitiva não é que o terapeuta aconselhe os pacientes a como abordar melhor
os problemas em suas vidas, e sim, proporcionar meios para que os pacientes
descubram formas alternativas de interpretar e responder aos problemas em
suas vidas, essa meta só poderá ser atingida através de uma postura de
aceitação e validação por parte do terapeuta.
Ainda de acordo com os autores citados acima, indivíduos suicidas
muitas vezes são caracterizados por esquemas negativos associados a algum
tipo de transtorno psiquiátrico, o que por sua vez, acentua um processamento
de informações defeituoso, humor negativo e comportamentos desadaptativos.
Os esquemas são estruturas cognitivas hipotéticas que influenciam o
processamento da informação ou que guiam a direção na qual as pessoas
canalizam sua atenção e codificam, organizam, armazenam e recuperam
informações. Os esquemas negativos não estão continuamente ativos, as
estruturas cognitivas se formam a partir de experiências anteriores, muitas
vezes durante a infância, mas permanecem latentes até que a pessoa
experimente um estresse significativo.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010), a terapia cognitiva para
pacientes suicidas é baseada em um esquema que incorpora a teoria cognitiva
geral, a teoria cognitiva que é especifica para os atos suicidas e os resultados
de estudos empíricos projetados para identificar importantes processos
cognitivos associados aos atos suicidas. Reconhecendo que a categoria de
“pacientes suicidas” não é homogênea, pode-se dizer que existem duas
classes de suicidas – aqueles que são caracterizados por uma sensação
penetrante de desesperança e um forte desejo de morrer e aqueles para quem
a desesperança e a intenção de morrer não são características salientes, mas
que tem dificuldades em regular o humor e o comportamento impulsivo, ou que
fazem sua tentativa para comunicar algo aos outros.
De acordo com Beck (1997), as razões mais comuns relatadas pelos
pacientes para atentarem contra sua vida são desistir e escapar da vida e
38

buscar um ponto final. A vida é “simplesmente demais” ou “não vale a pena


viver”. Sua angustia mental interna ou emocional é intolerável, não vêem saída
para as suas situações problemáticas e estão “cansados de lutar. Outros
relatam que “jogam com a morte” como forma de obter alguma mudança
interpessoal, como forma de trazer alguma pessoa importante ao seu convívio,
ou até como mudança de situações ambientais, para que consiga fugir do
ambiente que o perturba.
Para Resmini (2004), o paciente suicida apresenta uma rigidez cognitiva,
já que costumam ver somente uma versão dos problemas. Vêem o mundo sob
a ótica dicotômica do bem e do mal, do certo e errado, e tem dificuldades em
considerar novas perspectivas dos problemas. A falta de flexibilidade define
que as pessoas com tendência suicida percebam poucas alternativas para as
situações a serem enfrentadas. Este tipo de pessoa tende a assumir atitudes
passivas diante da vida, as quais consistem em deixar a ação a critério dos
outros, em confiar na sorte ou em esperar que as mudanças ocorram
espontaneamente. Também pode se considerar a falta de habilidades sociais,
já que se sentem inferiorizados, rejeitados e isolados dos outros.
De acordo com Resmini (2004), o comportamento suicida comumente
acontece durante a vigência de um contexto depressivo. O paciente quando
está depressivo usualmente apresenta a tríade cognitiva de Beck, que é aquela
na qual obtém informações de como a pessoa percebe si própria, os outros e o
mundo. Na depressão a visão usualmente encontrada é a de pensamentos
negativos nessas três áreas. A visão negativa de si mesmo conduz o indivíduo
a atribuir suas vivências desprazerosas a algumas falhas intrínsecas e a sentir-
se sem valor. A interpretação negativa da experiência atual leva a interpretar as
situações de forma negativa, mesmo quando existirem alternativas mais
aceitáveis e positivas de encarar os fatos. A visão negativa do futuro conduz ao
sentimento de que suas frustrações e sofrimentos não terão fim. A ocorrência
desta tríade determina a falha na auto-estima e a desesperança característica
dos depressivos. Essas crenças disfuncionais refletem o “esquema
depressivo”, e deixam a pessoa mais vulnerável para a depressão.
Resmini (2004) pontua que para o desenvolvimento do comportamento
suicida é preciso primeiramente diferenciá-los. A desesperança é o sentimento
de que mudanças numa situação intolerável são impossíveis de ocorrer. O
39

desespero implica não somente a desesperança sobre a possibilidade de


ocorrer mudanças, mas um sentimento de que a vida é impossível sem elas.
Desespero é mais do que desesperança. Quando estamos diante do
desespero, significa que sobre a desesperança agregou-se um estado de
ansiedade e um sentimento de urgência. Nas pessoas que têm risco de
suicídio estaria presente um sentimento de desespero, não meramente
desesperança.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010) as variáveis psicológicas
(cognição, afeto ou comportamento) são de fato passíveis de serem
modificadas nos pacientes suicidas por meio de intervenções psicoterápicas
focadas. As principais variáveis psicológicas são a desesperança, cognições
relacionadas ao suicídio, impulsividade aumentada, déficits na resolução de
problemas e perfeccionismo.
A desesperança está singularmente associada à intenção suicida. A
desesperança é uma cognição, é uma crença de que o futuro é ameaçador,
que seus problemas nunca se resolverão. Conteúdos cognitivos distorcidos são
uma parte importante dos esquemas negativos. Existem dois tipos de esquema
de suicídio – um esquema é caracterizado pelo traço de desesperança e o
outro por percepções de intolerabilidade.
Níveis de desesperança que persistem ao longo do tempo
aparentemente são preditores ainda mais fortes de atos suicidas do que a
desesperança medida em apenas uma ocasião.
Tanto a ideação quanto a intenção suicida, são consideradas cognições
relacionadas ao suicídio, já que são atos mentais associados com a motivação
de cometer suicídio.
Em relação à impulsividade, que é percebida com uma ênfase no
presente, rápida tomada de decisão, falha em considerar as consequências de
suas ações, desorganização e/ou incapacidade de planejar. A impulsividade
caracteriza um subgrupo de pacientes suicidas e ela aumenta o risco por meios
indiretos, é um dos muitos fatores de vulnerabilidade disposicional que operam
em alguns, mas não em todos os pacientes suicidas e que exacerba o
estresse, as perturbações psiquiátricas generalizadas e os processos
cognitivos associados ao suicídio.
40

Alguns estudos mostram que o ato suicida exige um grau de


impulsividade mas, no entanto, ela é definida e conceituada de muitas
maneiras, como um déficit comportamental (uma inabilidade de inibir
respostas), um problema cognitivo (inabilidade de planejar o futuro) e um traço
de personalidade. A impulsividade disposicional pode estar mais relacionada
aos atos suicidas que são acompanhados pela percepção de intolerabilidade,
ou da vontade de comunicar algo aos outros por meio da tentativa e não à
desesperança ou a uma forte intenção de morrer. Portanto, a impulsividade
disposicional pode aumentar a probabilidade de atos suicidas apenas quando
esquemas de suicídio caracterizados por percepções de intolerabilidade são
ativados.
É comum encontrar pacientes suicidas que indicam que realizaram suas
tentativas por não conseguirem vislumbrar nenhuma outra saída de suas
circunstancias de vida, o que sugere déficits na resolução de problemas.
Uma tentativa de suicídio é em parte uma abordagem desadaptativa
para a resolução de problemas. Os déficits na resolução de problemas
constituem um fator de vulnerabilidade disposicional para alguns atos suicidas,
de modo que eles estão associados a perturbações psiquiátricas e emocionais
e produzem estresse, de uma forma muito similar ao que ocorre com um estilo
de personalidade impulsiva. Também é possível que soluções pobres para
problemas desempenhem um papel importante durante crises suicidas, como a
ideação e a desesperança sendo exacerbadas à medida que o indivíduo
suicida encontra dificuldades em identificar meios de abordar e de lidar com
adversidades em sua vida.
Modelos cognitivos ligando os déficits na resolução de problemas aos
atos suicidas sugerem que, em momentos de estresse de vida, os indivíduos
suicidas percebem suas situações como intoleráveis e concluem que eles não
têm habilidades de mudá-las, o que leva a um aumento de desesperança e
então a ideação suicida. A inabilidade de soluções para problemas
provavelmente coloca os indivíduos em risco de atos suicidas em contextos de
eventos estressores e, na verdade, gera eventos estressores desnecessários
por si só, ativando esquemas de suicídio caracterizados pela desesperança.
Portanto, tratamentos cognitivos comportamentais para atos suicidas colocam
grande ênfase no desenvolvimento de habilidades de resolução de problemas,
41

pois presume-se que essas habilidades irão reduzir de forma geral a


quantidade de estresse na vida do paciente suicida, bem como proporcionar
estratégias para sair da fixação atencional em meio a uma crise suicida.
Segundo Tarrier, N., K. Taylor, et al. (2008), tais déficits podem incluir a
inabilidade de regular as emoções, inabilidade de resolver problemas,
incapacidade de tolerar sofrimento, inaptidão de direcionar pensamentos
negativos, ou ainda, crenças e sentimentos de desesperança e inutilidade.
O que é mais associado com a desesperança e com a ideação suicida é
o perfeccionismo, definido como uma dimensão interpessoal envolvendo
percepções da própria necessidade e habilidade de atender padrões e
expectativas impostos pelos outros. Existe outra dimensão que é o
perfeccionismo voltado para si, que são fortes motivações próprias de ser
perfeito, manter expectativas irrealistas para si mesmo, lógica do tudo ou nada
e o foco nos próprios defeitos. O perfeccionismo é, portanto inerentemente um
conjunto de cognições distorcidas sobre as expectativas de outros e as
consequências de não atingir esses padrões.
Um modelo cognitivo dos atos suicidas precisa ser capaz de incorporar a
teoria cognitiva geral, os construtos teóricos relacionados ao suicídio e os
construtos psicológicos relacionados ao ato suicida.
O modelo cognitivo integrado aos atos suicidas compreende os fatores
de vulnerabilidade disposicionais, incluindo a impulsividade, os déficits de
resolução de problemas, o perfeccionismo, e outras atitudes que estão
relacionados com os atos suicidas de três maneiras. Primeiro, eles tem o
potencial de ativar esquemas negativos relacionados a perturbações
psiquiátricas em momentos de estresse. Segundo, as variáveis disposicionais
provavelmente geram estresse por si mesmas, ou no contexto de estressores
que exacerbam perturbações psiquiátricas, ou no contexto de estressores que
são mais diretamente precursores de atos suicidas. Terceiro, as variáveis
disposicionais influenciam o curso do processamento cognitivo durante crises
suicidas.
Esquemas negativos são ativados em momentos de estresse.
Pensamentos desaptativos, interpretações, julgamentos e imagens
remanescentes do conteúdo desses esquemas negativos são desencadeados
por antecedentes internos ou externos, ou ambos. A pessoa por sua vez exibe
42

reações desaptativas emocionais, fisiológicas e comportamentais que


fortalecem ainda mais o esquema negativo. Em indivíduos suicidas, o ciclo de
retroalimentação negativa entre as cognições desaptativas e as reações
emocionais, fisiológicas e comportamentais insufla, de modo que o esquema
negativo assume grande força ou esquemas negativos adicionais são ativados.
O ciclo de retroalimentação é representado pela seta para a direita.
Quando um esquema de suicídio é ativado e quando a pessoa está
experimentando estresse, é provável que ela vá experimentar um estado de
desesperança. Quando a pessoa detecta sinais relacionados ao suicídio e está
em um estado de desesperança, existe uma probabilidade aumentada de ter
dificuldade em desvencilhar das informações relacionadas ao suicídio, o que
serve para restringir o foco atencional, limitando sua habilidade de engajar-se
em resoluções efetivas de problemas, exacerbando seu senso de desespero e
aumentando sua ideação suicida representado pelo retângulo na parte inferior
da figura. Esse limiar de tolerância é diferente para cada indivíduo e é
provavelmente determinado por experiências anteriores, como tolerar
incômodos, experiência prévias com dor e ferimentos.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010), um enquadramento que
expande o modelo cognitivo geral é do módulo suicida. Módulos são
suborganizações especificas dentro da organização da personalidade que
incorporam os componentes relevantes dos sistemas básicos da
personalidade: o cognitivo, o afetivo, o comportamental e o motivacional. Esses
componentes formam uma rede cognitivo-afetivo-comportamental integrada
que é ativada em resposta a uma situação particular ou quando alguém está
tentando atingir um objetivo. Portanto, crenças sobre si, sobre o mundo e sobre
o futuro representam o componente cognitivo do sistema, mas outros sistemas
são ativados em conformidade com o sistema cognitivo para facilitar uma
resposta coerente.
De acordo com Rudd (2004) apud Beck, Brown e Wenzel (2010), os
indivíduos com alto risco para atos suicidas são aqueles com crenças intensas
relacionadas ao suicídio, instabilidade afetiva e falta de habilidades
comportamentais de coping (enfrentamento em situações de crise). As crises
suicidas são limitadas no tempo e requerem altos níveis de ativação dos quatro
43

sistemas (cognitivo, afetivo, comportamental, motivacional), o que é


desencadeado por algum tipo de agravante.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010) quando as cognições da
ideação suicida e a intenção suicida se acumulam, determinam a probabilidade
de uma pessoa se engajar em um ato suicida, de modo que, quanto mais
frequentemente um indivíduo experimentar essas cognições, quanto mais
tempo elas durarem e quanto mais severas elas forem, maior a probabilidade
de o indivíduo tentar suicídio.
Ainda de acordo com os autores citados acima, alguns pacientes
descrevem um estado de desorientação cognitiva no momento imediatamente
antecedente a sua tentativa de suicídio, experimentam pensamentos
acelerados, muitas vezes acompanhados por uma inquietude e agitação
agudas, experimentam “visão em túnel”, focando-se no suicídio como a única
solução para seus problemas e ficam mentalmente consumidos por idéias de
que não existe uma forma de escapar e fariam qualquer coisa para acabar com
a dor. Quanto mais eles se fixam no suicídio como a única solução, mais sem
esperança eles estão a respeito de suas circunstancias de vida, ou mais
propensos estão para perceber suas circunstancias de vida como intoleráveis.
Um aumento no estado de desesperança toma conta dos indivíduos suicidas,
obscurece seu julgamento e aumenta a probabilidade de concluírem que não
há saída. O estado de desesperança aumenta a fixação atencional, e o foco
estreito no suicídio como sendo a única opção aumenta o estado de
desesperança.
Abaixo será descrito as etapas do processo psicoterápico com pacientes
suicidas baseada nas idéias de Beck, Brown e Wenzel (2010).

 Estrutura de terapia cognitiva

As sessões de terapia cognitiva seguem uma estrutura básica de


sessão, incluindo uma breve verificação de humor, uma retomada da sessão
anterior, o estabelecimento de uma agenda, as atribuições e a revisão da tarefa
de casa, a discussão de questões na agenda, as sínteses periódicas, e por fim,
um resumo e um feedback. Seguir essa estrutura da sessão permite uma
avaliação continua dos sintomas do paciente e do risco de suicídio.
44

De acordo com Beck (1997) logo na entrevista inicial o terapeuta precisa


abordar sobre os pensamentos suicidas e entrar no mundo do paciente para
enxergar como ele percebe o seu redor. Identificando o motivo autodestrutivo o
terapeuta pode decidir sobre qual foco terapêutico e técnica usar. “Por
exemplo, se a meta do paciente é encontrar um fim e escapar para a morte
através do suicídio, o ponto focal seria sua desesperança e ausência de
perspectivas positivas.” (pg. 153)
No começo de cada sessão os terapeutas cognitivos avaliam
brevemente o humor de seus pacientes. É interessante no começo de cada
sessão iniciar com um inventario padrão de autorrelato como o inventário de
depressão ou desesperança de Beck.
Os terapeutas também podem avaliar verbalmente o humor dos
pacientes, pedindo a eles que classifiquem o seu humor em uma escala de 0 a
10 (0 = humor extremamente ruim e 10 = humor extremamente bom). Também
é útil investigar sintomas perturbadores como transtornos do sono e fadiga. A
breve verificação do humor não deve ultrapassar 5 minutos. A verificação de
humor tem grande importância uma vez que permite ao terapeuta expressar
cuidado e preocupação com as questões dos pacientes que são mais salientes
para eles e revela “alertas vermelhos” como o aumento no uso de substancias,
a presença de desesperança ou a não adesão ao uso de medicações.
A retomada da sessão anterior é uma estratégia bastante breve para
garantir que os pacientes lembrem o que aconteceu na sessão anterior.
Também liga o conteúdo da sessão anterior ao da sessão atual, de modo que o
terapeuta possa seguir com questões introduzidas na sessão anterior e
trabalhar com os pacientes para obter uma resolução adequada.
O estabelecimento da agenda é um processo explicito e colaborativo
que ocorre entre o paciente e o terapeuta para estabelecer questões que serão
focadas na sessão. A ordenação dessas questões é por prioridade de temas
seguindo o mesmo objetivo, nesse caso, a prevenção de uma futura crise
suicida. O estabelecimento da agenda é uma característica central da terapia
cognitiva porque ele organiza os problemas do paciente, relaciona-os aos
objetivos do tratamento e garante que o tempo na sessão será usado
eficazmente.
45

A tarefa de casa também é um ponto central da terapia cognitiva porque


garante que os pacientes terão a oportunidade de aplicar as habilidades
desenvolvidas durante a sessão para os problemas que eles experimentam em
suas vidas.
As sínteses periódicas proporcionam um meio para os terapeutas e os
pacientes resumirem os principais temas desenvolvidos em diferentes partes
da sessão. As sínteses periódicas ocorrem após a discussão de cada item da
pauta e consistem em uma reafirmação do problema, da principal conclusão
aprendida a partir da discussão do problema e das maneiras pelas quais os
pacientes planejam lidar com ele.
As sínteses finais e feedback são realizados nos últimos minutos da
sessão, onde é realizado um resumo final dos temas abordados na sessão e é
uma oportunidade dos pacientes proporcionarem um feedback para o
terapeuta. O feedback “é outra forma de comunicar que a terapia é um
processo colaborativo e que o clinico está disposto a fazer modificações se
existir algum aspecto da experiência que não está satisfatório” (BECK, BROWN
e WENZEL, 2010, pg. 100).
A avaliação de cognições desaptativas é uma atividade central na
terapia cognitiva. Após adquirir prática com a identificação desses
pensamentos e imagens associados às experiências emocionais negativas, os
pacientes desenvolvem estratégias para questionar a validade dessas
cognições e incorporar todas as informações disponíveis para o
desenvolvimento de uma expectativa alternativa e mais adaptativa. Uma
mudança cognitiva duradoura ocorre quando essas crenças disfuncionais são
identificadas e modificadas ao longo do curso do tratamento.
Segundo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), na terapia cognitiva com
pacientes suicidas, a maior parte dos pensamentos e crenças que são
abordados na sessão são relacionados a ideação suicida, a intenção suicida e
a desesperança. Deve-se fazer uma psicoeducação com os pacientes sobre os
termos utilizados na terapia que são: pensamentos automáticos, crenças
centrais e crenças intermediárias.
Pensamentos automáticos são pensamentos que emergem em
situações especificas e que são associados a uma mudança negativa de
humor. Eles são chamados de automáticos porque eles aparecem tão
46

rapidamente que os pacientes não estão totalmente conscientes deles e pode


não se dar conta de suas conseqüências comportamentais e emocionais.
Quando os terapeutas guiam os pacientes na identificação de pensamentos e
imagens automáticas, é importante que eles liguem diretamente essas
cognições a experiência emocional dos pacientes para reforçar o modelo
cognitivo, ou seja, que a cognição está intimamente relacionada ao humor.
Uma vez que os pacientes tenham desenvolvido a habilidade de identificar
pensamentos automáticos, eles podem voltar suas atenções para estratégias
que modifiquem esses pensamentos e desenvolvam respostas alternativas que
reflitam uma apreciação mais balanceada das suas circunstancias de vida. Os
terapeutas utilizam um questionamento socrático para ajudar os pacientes a
avaliarem a validade de seus pensamentos automáticos, ou seja, os terapeutas
conduzem os pacientes a avaliar evidências que suportem ou refutem os
pensamentos automáticos e a probabilidade de os resultados catastróficos que
eles predizem realmente ocorrerem. O terapeuta com esse exercício deseja
estimular o pensamento crítico do paciente, afim de que os pacientes
encontrem respostas alternativas.
O tratamento de TCC com intuito de evitar tentativas de suicídio inclui
estratégias de reestruturação cognitiva, tais como a identificação e avaliação
dos pensamentos automáticos.
Crenças centrais: são as concepções fundamentais que as pessoas têm
de si mesmas, do mundo e do futuro. As três categorias de crenças centrais
nos pacientes suicidas incluem: desamparo, desamor e desvalor.
Crenças intermediarias: são mais facilmente identificadas e articuláveis
de serem mudadas do que crenças centrais e elas formam as pontes entre as
crenças centrais e os pensamentos automáticos. Muitas vezes crenças
intermediárias assumem a forma de atitudes rígidas, regras ou pressupostos de
como o mundo funciona.
Como os pacientes suicidas muitas vezes estão batalhando com um
número de dificuldades psiquiátricas, interpessoais e situações crônicas, não é
realista esperar que as crenças sejam totalmente modificadas durante o
período do tratamento que é diretamente focado nas estratégias de prevenção
do suicídio. Ao final da compreensão das crenças os pacientes terão as
ferramentas para identificar suas crenças e compreender a maneira pela qual
47

elas influenciam os pensamentos automáticos, as reações emocionais e as


respostas comportamentais, e programar estratégias para avaliar
periodicamente a força das crenças e modificá-las conforme necessário.
Como estratégias comportamentais podem ser utilizadas com técnicas
de relaxamento muscular e/ou respiração controlada, como forma dos
pacientes restaurarem seu senso de controle e também o experimento
comportamental onde os pacientes podem testar a validade de suas crenças
ou prognóstico distorcido em situações de vida real. Muitas vezes os pacientes
suicidas são depressivos e relatam não sentirem prazer em nenhuma atividade,
nesses casos pode-se utilizar o monitoramento e a programação de atividades,
para identificar como os pacientes estão realmente passando seu tempo e
quando eles poderiam programar uma atividade prazerosa.
Portanto o objetivo da terapia cognitiva é modificar os pensamentos,
imagens e crenças que são associadas com altos níveis de afetos negativos.
Os terapeutas primeiro guiam os pacientes no desenvolvimento das
habilidades para identificar essas cognições distorcidas e usam como
estratégias o questionamento socrático e experimentos comportamentais para
avaliá-las de uma forma realista e adaptativa.
Cognições que trazem à tona afetos intensos são provavelmente
representativas de crenças centrais. Essas crenças influenciam as informações
para as quais os pacientes dão atenção ou ignoram em seus ambientes e
definem a maneira como os pacientes interpretarão informações neutras ou
ambíguas. A modificação de crenças disfuncionais é associada a uma
mudança duradoura na terapia cognitiva. Em acréscimo a terapia cognitiva, as
estratégias comportamentais são utilizadas para reduzir sintomas
perturbadores e implementar mudanças positivas na vida dos pacientes.
O desenvolvimento de estratégias para prevenir crises suicidas é o alvo
principal da terapia cognitiva, mesmo que os pacientes introduzam outros
assuntos como depressão ou abuso sexual, é fundamental o foco na ideação
suicida do paciente e nas questões associadas a crise suicida recente. Uma
vez que os pacientes demonstrarem evidencias de terem desenvolvido
habilidades para gerenciar futuras crises suicidas, o terapeuta pode então se
voltar para as outras questões subjacentes, para a continuação do tratamento.
48

A terapia cognitiva é baseada nas premissas de que pacientes suicidas


necessitam de importantes habilidades cognitivas, comportamentais e afetivas
para lidar com as situações; falham durante as crises suicidas em usar
habilidades aprendidas previamente; ou falham em fazer uso de recursos
disponíveis durante as crises suicidas, ressaltam Stanley, B., G. Brown, et al.
(2009).

 Fase inicial da terapia

De acordo com Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), o objetivo primário


desse tratamento é reduzir a probabilidade de futuros atos suicidas o que é
obtido ao adquirir estratégias adaptativas de enfrentamento; desenvolvimento
de ferramentas cognitivas para identificar razões para viver e promover
esperança; melhorar as habilidades de resolução de problemas; aumentar a
conexão dos pacientes com suas redes sociais de apoio e aumentar a
conformidade dos pacientes com as intervenções médicas e/ou psiquiátricas
que estão recebendo paralelamente.
O tratamento é dividido em quatro principais seções: A fase inicial do
tratamento, a conceituação cognitiva do caso clínico, planejamento do
tratamento, a fase intermediaria e a fase avançada.
De acordo com Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), na fase inicial do
tratamento os objetivos são obter um consentimento informado e socializar os
pacientes na estrutura e processo da terapia cognitiva, engajar os pacientes no
tratamento, conduzir uma avaliação do risco de suicídio, desenvolver um plano
de segurança, transmitir um senso de esperança e fazer com que os pacientes
proporcionem uma descrição narrativa dos eventos que ocorreram durante a
última crise suicida.
No consentimento informado é de extrema importância abordar a
confidencialidade, os pacientes devem saber que a informação é mantida
confidencial exceto sob circunstancias especificas, como quando houver perigo
iminente para si mesmo ou para os outros. Também devem ser informados
sobre a possibilidade de desconfortos emocionais, o risco de que um ato
suicida possa ocorrer durante o tratamento e potenciais efeitos negativos da
quebra de confidencialidade.
49

De acordo com Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), o terapeuta deve


demonstrar uma compreensão da realidade interna dos pacientes e demonstrar
empatia com suas experiências, colaborar com os pacientes o tanto quanto
possível para que terapeuta e paciente possam funcionar como equipe, solicitar
o feedback dos pacientes e respondê-lo ao longo da sessão e demonstrar
níveis ótimos de preocupação, confiança e profissionalismo, para engajar os
pacientes no tratamento.
Os terapeutas que trabalham com pacientes suicidas devem ser
capazes de estabelecer empatia com as experiências de seus pacientes
enquanto focam a resolução de problemas e as habilidades de gerenciamento
do suicídio. Os terapeutas devem a todo o momento modelar esperança,
mesmo quando uma solução ao problema presente não é imediatamente
aparente. Instigar esperança é um importante elemento para todas as
psicoterapias, mas é ainda mais crucial quando se trata de pacientes suicidas,
pois a desesperança é um fator preditor significativo de suicídio.
Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), ratificam que o terapeuta tem a
responsabilidade de conduzir uma avaliação abrangente do risco de suicídio no
começo do tratamento e avaliações mais breves em cada início de sessão.
Uma avaliação abrangente do risco de suicídio inclui questionar diretamente o
atual estado mental dos pacientes, a administração de mensurações de
autocorrelato e observações clinicas do comportamento do paciente. Os
objetivos dessa avaliação abrangente do risco de suicídio são identificar os
fatores de risco e os fatores de proteção que determinam o nível de risco de
suicídio dos pacientes, identificar transtornos médicos e psiquiátricos
concomitantes, que são especialmente relacionados ao comportamento
suicida, determinar o nível mais apropriado de cuidado (como tratamento
ambulatorial ou internação) e identificar os fatores de risco que são
modificáveis com o tratamento.
Após o terapeuta ter feito uma avaliação final do risco e ter determinado
que o paciente possa ser tratado com segurança, ele trabalha com o paciente
para desenvolver um plano de segurança que abordará meios de lidar com os
fatores que o colocam em um risco de futuras crises suicidas. O plano de
segurança é uma lista escrita de estratégias e recursos priorizados de
enfrentamento que os pacientes concordam em fazer ou em contatar durante
50

uma crise suicida. A lógica do plano de segurança é que ele auxilia os


pacientes a diminuírem seu risco de tentar o suicídio no futuro imediato usando
uma lista predeterminada de estratégias e recursos de coping. Os
componentes básicos do plano de segurança incluem: reconhecer sinais de
alerta que precedem as crises suicidas, identificar estratégias de coping que
podem ser utilizadas sem se contatar outras pessoas, contatar amigos ou
familiares e contatar profissionais ou estabelecimentos de saúde mental.
Segundo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), a conceituação de caso
convoca o terapeuta a desenvolver uma formulação individualizada de cada
caso, que serve como um guia para o planejamento do tratamento e da
intervenção. Portanto, o terapeuta aplica a teoria cognitiva para compreender o
quadro clinico de seu paciente logo no começo do curso do tratamento e, ao
longo do tempo, modifica a conceituação baseado nas novas informações que
ele adquiriu. Fatores cognitivos, comportamentais, afetivos e situacionais
associados a crises suicidas são integrados na conceituação, por sua vez, é
utilizada para guiar a seleção e a aplicação de estratégias cognitivas e
comportamentais especificas que podem ajudar a prevenir um futuro ato
suicida. Para a realização da conceituação é necessário fazer uma avaliação
psicológica e clínica do paciente, fazer uma investigação precisa dos eventos
que transcorreram antes, durante e depois da recente crise suicida, onde será
possível identificar os pensamentos automáticos do momento. É importante
realizar uma linha do tempo da crise suicida, que incorpora o evento ativador e
as respostas cognitivas, emocionais e comportamentais.
Segundo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), o foco da conceituação
cognitiva do caso é o desenvolvimento de uma compreensão mais profunda da
crise suicida, levando em consideração outros fatores que estão presentes no
histórico psiquiátrico do paciente. Portanto, não apenas a conceituação inclui
os eventos e os pensamentos automáticos que foram diretamente
experimentados na crise suicida, como ela também incorpora experiências
anteriores e as crenças centrais e intermediarias que estão relacionadas aos
pensamentos automáticos.
O plano de tratamento resume os problemas específicos que são
apresentados pelos pacientes e os objetivos do tratamento, os quais são
informados pela avaliação psicológica, pela conceituação cognitiva do caso e
51

pelas informações fornecidas pelos pacientes. A prevenção de futuros atos


suicidas é o mais fundamental dos objetivos do tratamento, entretanto existem
objetivos adicionais do tratamento que geralmente envolvem fatores de
vulnerabilidade disposicionais que são relacionados ao risco de suicídio.
De acordo com as ideias apresentadas pelos autores acima Stanley, B.,
G. Brown, et al. (2009), a fase inicial do tratamento agudo ocorre durante as
primeiras três sessões e consiste em cinco pilares. Os três primeiros: Análise
em Cadeia, Planejamento de Segurança, Psicoeducação ocorrem nas duas
primeiras sessões. Já os dois últimos: Razões pra Viver e Esperança e
Conceituação ocorrem geralmente a partir da terceira sessão.
Abaixo discutir-se-á sobre cada componente que ocorre durante a fase
inicial do tratamento, segundo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009):
A estratégia básica da estrutura do trabalho da TCC é uma análise
detalhada da cadeia de eventos associadas à tentativa de suicídio ou a crise
suicida. O procedimento inclui a identificação dos fatores de vulnerabilidade,
eventos associados à crise, assim como os pensamentos, sentimentos,
comportamentos e a reação a esses eventos.
A análise da cadeia de eventos inclui desde quando o paciente acordou
na manhã da tentativa ou na noite anterior à tentativa. Conduzir a cadeia de
análise, por si próprio, é benéfico, não apenas porque detalhar a sequência de
eventos, sentimentos, pensamentos é crucial pra selecionar estratégias de
intervenção, mas também porque dá a chance do paciente entender e mitigar o
sentimento frequente que o comportamento suicida apenas aconteceu ou foi
apenas algo fortuito e casual.
Compartilhar os detalhes da tentativa ou crise suicida e as
circunstâncias envoltas facilita entrar no mundo do paciente, assim como ajuda
o paciente a se engajar no tratamento. A intervenção também auxilia a
contextualização do risco do suicídio do paciente no futuro. Uma vez que a
análise em cadeia esteja escrita e arquivada, pode-se revisitar e revisar o
arquivo durante o tratamento.
Planejamento de segurança é a técnica que ajuda o paciente a
permanecer em segurança e afastar o comportamento suicida pelo menos até
a próxima sessão. Planejamento de segurança, conforme os preceitos da TCC
com enfoque em prevenir suicídios propicia ao paciente um conjunto de
52

prioridades especificas, estratégias de enfrentamento e fontes de suporte que


podem ser usados durante a crise suicida.
As estratégias internas compreendem uma lista de atividades que o
paciente pode fazer pra enfrentar os impulsos suicidas sem ajuda de terceiros,
tais procedimentos englobam atividades comportamentais que são feitas com
intuito de distrair o paciente de pensar em suicídio. Os pacientes são
informados quando a estratégia interna não está funcionando, nesse caso
específico o paciente deve tentar as estratégias externas.
Já as estratégias externas incluem procedimentos como receber a ajuda
de familiares ou amigos para acelerar o processo de avaliação psiquiátrica ou
possível hospitalização. As estratégias externas começam quando pessoas
próximas são inseridas no círculo social do paciente com intuito de ajudar a
distraí-lo. Ajuda de adultos podem ser solicitadas pelo paciente.
Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), ressaltam que o terapeuta e o
paciente devem revisar de forma colaborativa cada passo do plano de
tratamento com intuito de resolver os problemas e possíveis obstáculos na
implementação do mesmo. O plano deve incluir uma lista dos sinais de aviso
que precedem uma crise suicida, baseada em possíveis situações, estado
emocional ou comportamentos que indicam quando o plano de segurança deve
ser acionado. O plano de segurança é discutido e revisado em cada sessão de
TCC, especialmente depois que o mesmo é acionado.
Ainda de acordo com Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), para a sessão
inicial, pode não haver tempo hábil para desenvolver uma elaboração completa
do plano de segurança com base em uma análise de cadeia, entretanto, é
essencial desenvolver um planejamento de segurança rudimentar, os quais
serão elaborados nas sessões posteriores, assim mais informações são
reunidas e resultam em uma análise mais detalhada e completa.
É importante incluir estratégias de tratamento que estimulem o senso de
esperança, pois a desesperança está associada ao risco de suicídio. Uma
estratégia pra aumentar a esperança logo no início do tratamento é discutir as
razões pessoais pra viver.
Delimitando razões pra viver é uma importante atividade, pois aprender
a enfrentar impulsos suicidas cai no vazio se o paciente acha que não tem
razões pra fazê-lo.
53

As razões pra viver podem incluir indivíduos que se importam com o


paciente, coisas que o paciente pode fazer no futuro, atividades que gosta de
fazer e com o que se importa. A habilidade de recuperar razões pra viver pode
ser usada como estratégia de enfrentamento específica em períodos de
angustia.
Seguindo as duas primeiras sessões, o terapeuta desenvolve a
Conceituação de caso. Como mencionado anteriormente, o terapeuta identifica
problemas cognitivos, comportamentais, afetivos e contextuais específicos e
então seleciona as estratégias correspondentes para resolvê-los. Ambos,
terapeuta e paciente, discutem objetivos específicos para reduzir o risco de
suicídio e a aproximação mais indicada de forma colaborativa.
O plano de tratamento é ajustado para cada paciente. É necessário
priorizar o treinamento de habilidades específicas que sejam mais apropriadas
na prevenção de uma tentativa de suicídio subsequente e que construam no
paciente pontos fortes.
De acordo com Beck (1997) deve-se fazer juntamente com o paciente os
motivos para viver e motivos para morrer, para pesar os prós e contras do
suicídio. Inicialmente o paciente pode ter dificuldade de oferecer razões para
viver no momento, mas geralmente ele é capaz de recordar suas razões para
viver durante um período anterior mais feliz. Dessa forma, o terapeuta apura
quais das razões passadas para viver são válidas no presente, ou no futuro.
A abordagem do terapeuta sobre os aspectos positivos não deve ter
uma abordagem de convencê-lo a não se suicidar, mas sim empírica, como:
“Embora você possa estar convencido da sua decisão, vale a pena listar os
fatores positivos na sua vida e ver o que você pensa deles”. Após listar as
razões para viver, o terapeuta e o paciente podem listar as vantagens e
desvantagens de morrer. Já que depois disso, o paciente geralmente aumenta
sua objetividade e suas razões para morrer não parecem tão absolutas e
compulsórias como antes.
O paciente que apresenta-se desesperançado vê o suicídio como a única
forma de lidar com seus problemas indeléveis. Se a desesperança está no
núcleo dos desejos suicidas, uma variedade de métodos pode ser usada para
transmitir ao paciente que:
54

A) Há interpretações alternativas de sua situação de vida e de seu futuro


que são menos trágicas do que as que ele pondera
B) Ele tem outras opções além de seu comportamento atual, que podem,
de fato, estar conduzindo a um beco sem saída.

 Fase intermediária do tratamento

Na fase intermediária do tratamento, o terapeuta visa ajudar os


pacientes a desenvolverem habilidades de enfrentamento cognitivos,
comportamentais e afetivos para administrar a ideação suicida e reduzir a
probabilidade de eles se engajarem em futuros atos suicidas. Na fase
intermediária utiliza-se as mesmas técnicas da fase inicial como tarefa de casa.
Sempre se avalia o risco de suicídio, uso de álcool e drogas, avaliação da
conformidade ao tratamento e revisão do plano de segurança.
De acordo com Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), as intervenções
específicas que são aplicadas durante a fase intermediária são classificadas
dentro dos domínios comportamentais, emocionais e cognitivos. Estratégias
comportamentais incluem aumentar as atividades prazerosas, melhorar o apoio
social, aumentar a conformidade com os tratamentos médicos, psiquiátricos, de
dependência química e com os serviços sociais. Estratégias emocionais
promovem habilidades de coping afetivo, o que ajuda a regular a reatividade
emocional durante momentos de perturbação. Estratégias cognitivas incluem
modificação das crenças associadas à crise suicida recente, identificar razões
para viver quando estão em uma crise e vulneráveis a focarem em razões para
morrer, nessa parte pode-se realizar um kit de esperança, onde os pacientes
colocam dentro de uma caixa itens significativos que os lembrem dos motivos
para viver e que pode ser usado em momentos de crise, outra técnica utilizada
também pode ser os cartões de coping que são pequenos cartões com
lembretes positivos que possam lidar com a desesperança e a ideação suicida;
aumentar as estratégias de resolução de problemas e reduzir a impulsividade.
As três áreas são utilizadas em conjunto para atingir o resultado esperado.

 Fase avançada do tratamento


55

Na fase avançada o principal objetivo é avaliar se os pacientes


aprenderam e conseguem aplicar habilidades específicas que podem ajudá-los
a dissipar uma crise suicida. Portanto, as sessões avançadas da terapia
cognitiva consolidam, revisam e aplicam estratégias que foram as mais úteis
para os pacientes no enfrentamento de perturbações ao longo do tratamento.
Existem quatro tarefas principais que o terapeuta assume na fase avançada:
sintetizar e consolidar habilidades que foram aprendidas durante a fase
intermediária do tratamento, aplicar essas habilidades em uma série de
exercícios de imaginação guiada, revisar o progresso em direção aos objetivos
do tratamento e planejar para a continuação do tratamento, encaminhar para
outro tratamento ou preparar o termino do tratamento.
Segundo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), nessa fase é realizado um
protocolo de prevenção de recaídas que é um conjunto de exercícios de
imaginação guiada, onde os pacientes imaginam uma crise suicida passada e
descrevem o modo como iriam lidar com os pensamentos, sentimentos,
comportamentos e circunstancias ligadas ao suicídio.
O protocolo de prevenção de recaídas apresentam cinco etapas:
1) Preparação: Explicar para o paciente a premissa do protocolo e
confirmar seu entendimento; Descrever potenciais reações emocionais
negativas e discuti-las; Abordar preocupações do paciente e obter o
consentimento do paciente.
2) Revisão da crise suicida recente: avaliar se o paciente consegue
produzir uma imagem vivida, caso não consiga, ensiná-lo a fazer isso;
Solicitar ao paciente que descreva, verbalmente no presente, a
sequência de eventos que o levaram a crise suicida; Focar
pensamentos, emoções, comportamentos e circunstancias que foram
relevantes para a crise suicida.
3) Revisão da crise suicida recente usando habilidades: solicitar que
novamente ele descreva a sequência que o levou a crise suicida;
estimular o paciente a descrever as estratégias de coping e respostas
adaptativas para os eventos ativadores.
4) Revisão de uma futura crise suicida: solicitar que o paciente imagine e
descreva uma sequência de eventos que o levaria a uma futura crise
suicida; focar nos pensamentos, emoções, comportamentos e
56

circunstancias mais relevantes para provocar a ideação suicida;


estimular o paciente a descrever as estratégias de coping e as respostas
adaptativas para os eventos ativadores.
5) Debriefing e seguimento: solicitar que o paciente resuma o que
aprendeu durante esse exercício; descrever a maneira na qual as
mudanças que o paciente fez em tratamento foram refletidas em seu
manejo das crises suicidas imaginadas; identificar questões que tenham
emergido nesses exercícios que permanecem problemáticas para o
paciente; determinar se o paciente está experimentando ideação suicida,
caso esteja, trabalhar colaborativamente e desenvolver um plano para
aborda-lo; revisar o plano de segurança; oferecer sessões adicionais ou
chamadas telefônicas de acompanhamento.

Segundo Segundo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), durante a fase


avançada o terapeuta e o paciente revisam todas as habilidades que
foram aprendidas e praticadas. Essa revisão é apropriada quando os
pacientes não mais relatam qualquer desejo de cometer suicídio; os
pacientes percebem que a maior parte das questões (se não todas) que
desencadearam suas crises suicidas foi abordada; a severidade dos
sintomas agudos dos pacientes tenha diminuído; os pacientes
demonstram que adquiriram habilidades para lidar com crises ou
perturbações futuras.
Se as principais áreas problemáticas que eram associadas à crise
suicida recente foram adequadamente abordadas, o foco na prevenção do
suicídio pode ser encerrado e problemas e questões mais duradouros podem
então assumir o foco primário do tratamento na fase de continuação.
O fechamento da fase de prevenção de suicídio do tratamento não é
recomendado até que os pacientes sejam capazes de completar com sucesso
o protocolo de prevenção de recaídas.
Após a conclusão bem-sucedida do protocolo de prevenção de recaídas,
terapeuta e paciente avaliam o progresso que foi feito em direção aos objetivos
do tratamento que foram estabelecidos ao final da fase inicial. Uma avaliação
de risco deve ser conduzida para determinar se os pacientes continuam a ter
alguma ideação suicida, uma intenção suicida ou pensamentos sobre um plano
57

de cometer suicídio. Os pacientes que continuam relatando ideação suicida


não devem ser dispensados do tratamento, a menos que um tratamento
alternativo tenha sido identificado e que eles estejam plenamente engajados
nele.
Depois da conclusão bem–sucedida do protocolo de prevenção de
recaídas e da revisão dos objetivos do tratamento, terapeuta e paciente
discutem três opções de tratamento: continuação do tratamento;
encaminhamento para tratamento adicional e encerramento do tratamento.

Os autores Stanley, B., G. Brown, et al. (2009) também relatam a tarefa


de prevenção de recaídas que é utilizado em 10 a 12 sessões, geralmente
marca o fim da fase aguda do tratamento. A tarefa de prevenção de recaídas é
uma técnica de imaginário conduzido "in-vivo" para testar a eficácia da
aquisição das habilidades e capacidades de enfrentamento na prevenção de
comportamentos suicidas no futuro. Se o paciente tem dificuldade em
completar a tarefa de prevenção de recaídas, o terapeuta e o paciente
identificam os obstáculos para a sua conclusão e podem rever as
competências anteriormente ensinadas ou adicionar novas habilidades.
Segundo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), a tarefa de prevenção de
recaídas inclui cinco etapas: (1) Preparação, (2) Análise da Tentativa
Cadastrada ou Crise Suicida, (3) Análise da Tentativa ou Crise Suicida usando
as competências, (4) Análise de um Cenário Futuro de Alto Risco, e (5)
Informação e Acompanhamento. Durante a fase de preparação, o terapeuta
introduz a razão para esta tarefa na tentativa de aumentar a motivação do
paciente, e obtém o consentimento verbal. Os pacientes são informados de que
eles serão convidados a relembrar sua recente tentativa de suicídio ou a crise
suicida, seus pensamentos, sentimentos e as reações das pessoas, além de
tentar imaginar, o máximo possível, que eles estão revivendo nesse momento.
De acordo Segundo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), os pacientes
são informados que ao imaginar e reviver a dor vivenciada pela tentativa de
suicídio, tem-se a oportunidade de avaliar se as habilidades de enfrentamento
aprendidas durante o tratamento podem ser recuperadas. Durante a revisão da
tentativa ou crise suicida, o paciente é convidado a imaginar a sequência de
58

eventos que levaram à tentativa de suicídio, os pensamentos e sentimentos


que se seguiram até e depois do ato.
O terapeuta mais uma vez leva o paciente a relembrar a mesma
sequência de eventos, mas dessa vez o terapeuta encoraja o paciente a
imaginar e utilizar as habilidades aprendidas para lidar com os acontecimentos,
sentimentos e pensamentos. Ao imaginar, os pacientes são convidados a
descrever a sequência de eventos e habilidades de enfrentamento em voz alta
e com o tempo presente. Os pacientes são incentivados a ensaiar e aplicas as
habilidades aprendidas na análise em cadeia com o intuito de aprimorar os
resultados.
De acordo Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), durante a próxima etapa
os pacientes são encorajados a imaginar e descrever em detalhes, um possível
cenário futuro que o levará a uma crise suicida. A parte crucial da tarefa é
antecipar como e quando eles podem aplicar as habilidades aprendidas em
situações futuras.
Finalmente, um debriefing é realizado depois que a tarefa de prevenção
de recaídas for concluída e planos de acompanhamento são formulados. Os
pacientes são incentivados na execução das tarefas, além disso, as reações
devem ser obtidas a partir do paciente.
No final da intervenção e nas sessões seguintes o terapeuta revisa as
mudanças que foram feitas durante o curso do tratamento e as habilidades
aprendidas. É importantíssimo que eles revisem o plano de segurança antes do
paciente deixar o programa de segurança de recaídas.
A fase de manutenção é um adicional de doze semanas e consiste em
até seis sessões que tem frequência atenuada com o passar do tempo. Pode-
se realizar até três sessões familiares. Durante essa fase o terapeuta pode
introduzir novas habilidades ou continuar a ajudar paciente e família a
aprimorar as habilidades já aprendidas na fase aguda.
As sessões finais incluem a discussão explícita das reações para a
conclusão do tratamento de forma eficaz, revisar as estratégias de sucesso que
foram aprendidas, cumpridas e levaram o tratamento ao êxito, assim como,
discutir se é necessário tratamento em outros transtornos do paciente como
ansiedade, síndrome do pânico, bulimia, entre outros.
59

Na fase final, o terapeuta encoraja o cliente a identificar, especificar e


antecipar dificuldades ou situações estressantes, mas é claro, sem esquecer
de revisar o uso das novas habilidades que podem ser aplicadas em futuras
situações.
Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), ressaltam que é importante preparar
o paciente para as variações de humor e dificuldades inerentes ao processo,
assim como discutir os sinais específicos de risco pessoal que foram
identificados durante a análise em cadeia com o paciente.
A importância do tratamento de manutenção ou continuação deve ser
discutida com a família e inclui: revisar os sinais de sintomas depressivos e
suicidas, objetivos alcançados durante a terapia, o impacto do tratamento no
resto da família, estratégias para lidar com possíveis recaídas no futuro e a
necessidade de um novo tratamento.
De acordo com Stanley, B., G. Brown, et al. (2009), o tratamento com
paciente de baixo ou moderado risco incluem: agendar avaliações de risco de
seguimento; agendar a próxima sessão de terapia; agendar o próximo contato
telefônico; contatar outras instituições ou serviços que também são
responsáveis pelo cuidado do paciente; obter ou rever os registros médicos
para mais informações que possam influenciar a determinação final do risco; e
contatar familiares ou outros indivíduos. Agora se o paciente estiver em risco
iminente para si ou para os outros, então é imperativo que intervenções mais
intensas sejam consideradas para prevenir ferimentos.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010), os pacientes suicidas
estão entre os mais desafiadores pacientes tratados por terapeutas já que
geralmente esperam ter de lidar com múltiplas crises, hospitalizações e
documentações extensivas. Além disso, muitos são hesitantes ao tratar
pacientes suicidas, pois temem a possibilidade de ramificações legais e éticas
no caso do paciente vir a cometer suicídio.
De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010),

“Não é incomum para os terapeutas que trabalham com pacientes


suicidas encontrarem quadros clínicos desafiadores. Em certos,
momentos, o comparecimento dos pacientes suicidas é esporádico,
pois suas vidas não são estruturadas, tem estilos de vida caóticos e
eles estão lidando com múltiplos estressores. Em outros momentos,
os pacientes continuam em risco de se engajarem em atos suicidas e
60

requerem a atenção do clinico entre as sessões para garantir sua


segurança. Alguns pacientes se apresentam para as sessões sob a
influência de álcool ou drogas ou com uma ideação homicida
concomitante.” (p. 184)

De acordo com Beck, Brown e Wenzel (2010), apesar do valor para a


saúde pública de se avaliar tratamentos que diminuam as taxas de suicídio,
existe uma escassez de testes clínicos que tenham desenvolvido ou avaliado
novos tratamentos ou avaliado tratamentos existentes para esse problema.
61

5. DISCUSSÃO

A partir do estudo realizado foi possível perceber as modificações que a


tentativa de suicídio teve com o decorrer dos séculos. Mesmo depois de muitos
estudos realizados e de modificações na sociedade, o suicídio continua sendo
visto como um tabu, sendo os suicidas vítimas de preconceito, pena,
discriminação, raiva, já que as pessoas não conseguem observar a dimensão
psicológica envolvida no ato e essa postura também é presente nas equipes de
saúde como em médicos e enfermeiros.
O suicídio com o passar dos anos está se tornando cada vez mais
rotineiro no mundo todo, o que é uma estatística alarmante para a população,
por isso atualmente é considerado um problema de saúde pública já que os
casos de tentativa de suicídio estão aumentando, o que significa que as
pessoas estão sendo submetidas a constantes pressões as quais não estão
conseguindo dar conta emocionalmente ou financeiramente, e se vendo sem
saída recorrem para o suicídio como a única forma de fuga para seus
problemas, já que viver significa apenas sofrer.
Os psicólogos necessitam estar atentos aos mais simples movimentos
dos pacientes que demonstrem uma ideação suicida, favorecendo uma escuta
empática, respeitar seus sentimentos, sem julgamentos ou criticas,
favorecendo o estabelecimento de uma aliança terapêutica baseada na
confiança. Quando confirmada a ideação suicida, o terapeuta necessita focar o
tratamento nessa questão deixando as outras demandas para outro momento,
já que o paciente está vivenciando um momento de crise que necessita de
prevenção imediata.
O paciente necessita ser acolhido no seu mais profundo sofrimento e
precisa enxergar no terapeuta um aliado para encontrar estratégias que
modifiquem a ideação ou a intenção suicida, estabelecendo estratégias que
possam usar para promover esperança no futuro, proporcionando meios para
que os pacientes descubram formas alternativas de interpretar e responder aos
problemas em suas vidas, que só poderá ser atingida através de uma postura
de aceitação e validação por parte do terapeuta.
O estudo sobre formas de acompanhamento psicológico de pacientes
potencialmente suicidas é relativamente novo, com bibliografia escassa
62

principalmente na literatura brasileira, que correlacione terapia cognitiva


comportamental e suicídio, sendo um campo importante para futuros estudos.
A literatura consultada mostra uma homogeneidade no que se refere às
técnicas, o que facilita o caminho do terapeuta que busca instrumentos para
guiar o acompanhamento psicológico com pacientes suicidas.
Segundo os artigos consultados não há evidencias comprovadas sobre o
a eficácia do tratamento, mesmo que mostrem que as técnicas da abordagem
cognitivo comportamental trouxeram redução de pensamentos, planos e
atitudes autodestrutivas após o tratamento.
A terapia cognitiva-comportamental tem se mostrado a abordagem mais
eficiente para o tratamento de pacientes suicidas, já que são elaborados planos
de enfrentamento de forma individualizada e empática para cada caso. As
técnicas usadas são claras e objetivas, visando o restabelecimento emocional
de cada paciente.
63

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a realização do trabalho foi possível perceber o quanto os casos de


tentativa de suicídio tem aumentado ao longo do tempo, hoje já sendo
considerado um grave problema de saúde publica.
O atendimento de pessoas suicidas é um desafio para o terapeuta, já que
podem emergir ansiedades em relação a sua própria conduta frente aos
sentimentos crônicos de desesperança, é necessário manter um equilíbrio em
relação ao discurso dos pacientes para então entender a singularidade do
sofrimento de cada um e então adequar a técnica mais eficaz para haverem
mudanças dos comportamentos e pensamentos possíveis de mudanças por
meio de intervenções psicoterápicas focadas.
O envolvimento da família e de outros profissionais da saúde é de grande
importância para lidar com esses pacientes, que demonstram uma grande
fragilidade emocional.
A TCC mostra-se uma abordagem eficaz para o tratamento dos pacientes
potencialmente suicidas, por suas técnicas diretivas e colaborativas que
auxiliam a restruturação cognitiva desses pacientes, que no final do processo
encontram novas habilidades para enfrentar seus pensamentos disfuncionais,
que podem ser usadas em futuras situações.
Percebe-se também a importância do desenvolvimento de novas pesquisas
sobre o papel da TCC em pacientes suicidas para que se possa comprovar
ainda mais sua eficácia e quem sabe, a criação de novas técnicas para lidar
com esses pacientes.
Concluindo, a terapia cognitivo–comportamental tem potencial de ser um
poderoso tratamento para a prevenção de atos suicidas em função de seu foco
definido, da orientação para o envolvimento de uma equipe e de serviços
adjuntos no tratamento do paciente. O foco no desenvolvimento de estratégias
cognitivas e comportamentais concretas que podem ser usadas durante as
crises.
64

7. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

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67

ANEXO

Termo de Responsabilidade Autoral

Eu Daniela Barros Simões, afirmo que o presente trabalho e suas


devidas partes são de minha autoria e que fui devidamente informado da
responsabilidade autoral sobre seu conteúdo.

Responsabilizo-me pela monografia apresentada como Trabalho de


Conclusão de Curso de Especialização em Terapia Cognitivo Comportamental,
sob o título “INTERVENÇÕES COGNITIVAS COMPORTAMENTAIS PARA AS
TENTATIVAS DE SUICÍDIO: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA”, isentando,
mediante o presente termo, o Centro de Estudos em Terapia Cognitivo-
Comportamental (CETCC), meu orientador e coorientador de quaisquer ônus
consequentes de ações atentatórias à "Propriedade Intelectual", por mim
praticadas, assumindo, assim, as responsabilidades civis e criminais
decorrentes das ações realizadas para a confecção da monografia.

São Paulo, __________de ___________________de______.

_______________________

Assinatura do (a) Aluno (a)

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