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(trechos do livro "Joãã o Pessoã Perãnte ã Histoó riã", do historiãdor pãrãibãno Joseó
Octãvio)
"Essã singelã nãrrãtivã feitã ãqui, neste ãmbiente íóntimo, servirãó de exemplo ãos
moços, de incentivo ãos homens de meiã idãde e de registro ãos que jãó ã ultrãpãssãrãm.
"Tinhã oito irmãã os e, nã quãlidãde de mãis velho, quãndo desãpãrecesse o progenitor,
cãbiã-lhe, como uó nicã herãnçã, orientãr ã fãmíóliã. Torturãdo pelã necessidãde, um diã foi
obrigãdo ã ãbãndonãr ã cãsã pãternã. Apoó s incãnsãó veis esforços, inenãrrãó veis
pãdecimentos, conseguiu, tempo depois, ingressãr num estãbelecimento militãr dã
Repuó blicã. Sem quãlquer ãdjutoó rio, sem, ão menos, umã pequenã mesãdã, ãs suãs
necessidãdes, se nãã o erãm mãiores, erãm; em todo cãso, prementes. Inuó merãs vezes nãã o
tinhã 200 reó is no bolso pãrã ir ãà cidãde em visitã ã um pãrente, que muito estimãvã, o
quãl, mãis tãrde, quãndo teve o poder nãs mãã os, grãndemente o ãuxiliou.
"Um diã, poreó m, em virtude de um movimento perturbãdor dã ordem militãr, ã escolã
foi fechãdã. Todos os ãlunos expulsos ã bem dã morãlidãde ãdministrãtivã. Voltou ãà cãsã
pãternã. Lãó , ãs vicissitudes ãindã mãis ãumentãrãm, e quis pãrtir pãrã o norte. Nesse
entrementes, regressã ãà Escolã ãnistiãdo e, dois ãnos depois, eó novãmente ãfãstãdo do
estãbelecimento de ensino, em consequü eê nciã de um novo movimento revolucionãó rio. Foi
entãã o deportãdo. Percorreu ãs costãs do Brãsil ã bordo do Cãrlos Gomes, que levou 45 diãs
do Rio de Jãneiro ão Pãrãó . Tinhã por leito o tombãdilho do nãvio. Nãã o tinhã sido permitido
conduzir ã bãgãgem. Erã obrigãdo ã fãzer dãs botinãs, enquãnto existirãm, o seu
trãvesseiro. (Pelo visto lhe roubãrãm ãs botinãs. enquãnto dormiã).
"Chegãndo ão Pãrãó , ãs dificuldãdes dã vidã se lhe tornãrãm mãiores, sendo que ã
estremecidã mãã e jãmãis deveriã ter conhecimento dã situãçãã o miserãó vel em que o filho se
encontrãvã. Pãssãvã fome, dormiã nos jãrdins e, ãfinãl, quãndo ã fome erã mãis cruentã,
tinhã hospitãlidãde no corãçãã o de umã generosã pretã, que lhe dãvã um pouco do que
fãziã pãrã vender, ãà portã de suã pobre cãsinhã. Essã pretã o ãcolheu com verdãdeiro ãmor
mãternãl, compreendendo que tinhã fome, dividiã cãrinhosãmente com ele um pouco do
seu ãlimento, ãdquirido com o produto de suãs vendãgens. Assim, diãs e meses se
pãssãrãm.
"Foi forçãdo ã ãbãndonãr ã vidã militãr, empregãndo-se no comeó rcio em umã cãsã de
estivãs. Logo no primeiro meê s ãdoeceu, sendo recolhido ã um hospitãl, onde ficou
ãbãndonãdo e ãà morte. A fãmíóliã, tendo cieê nciã do que lhe sucediã, resolveu telegrãfãr ãà
cãsã comerciãl, pedindo que pãgãsse ãs despesãs do seu ex-empregãdo ãteó o seu Estãdo.
Regressou ã bordo de um nãvio do Lloyd, trãncãdo em um cãmãrote. Chegãndo ão porto
do destino, mãã os cãrinhosãs ãrrãncãrãm o infeliz, jãó desãlentãdo, de dentro do beliche.
Levãdo ãà cãsã, ãindã sofreu mãis de seis meses e, restãbelecido pretendiã voltãr
novãmente pãrã ã Amãzoê niã, ã fim de cuidãr de vidã novã, quãndo ã boã sorte lhe bãte ãà
portã.
"Forã nomeãdo pelo pãrente jãó referido pãrã exercer umã funçãã o puó blicã nã
Fãculdãde de Direito do Recife. Aíó mãtriculou-se formãndo-se mãis tãrde. Veio ã fortunã.
Quãndo estã lhe sorriu, nãã o olvidou ã pretã que o socorrerã nã desgrãçã, mitigãndo-lhe ã
fome. Infelizmente, nãã o mãis ã encontrou. Continuã, entretãnto, guãrdãndo dessã pobre
velhinhã ã mãis vivã lembrãnçã, como sinãl de imorredourã grãtidãã o.
"Quereis sãber de quem se trãtã? o humilde cãndidãto ãà vice-presideê nciã dã
Repuó blicã, que nestã horã vos fãlã".
João Pessoa
Nãscimento: 1878, Umbuzeiro (PB); Morte: 1930, Recife (PE)