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CURSO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA

MELISSA FERREIRA DIAS

O MUNDO FASHION: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A TRANSIÇÃO


DA PRODUÇÃO DE LUXO PARA O CONSUMO DE MASSA

MARINGÁ - PR
2015
MELISSA FERREIRA DIAS

O MUNDO FASHION: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A TRANSIÇÃO


DA PRODUÇÃO DE LUXO PARA O CONSUMO DE MASSA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


à Famma – Faculdade Metropolitana de
Maringá, como parte dos requisitos para
obtenção do título de Bacharel em Publicidade
e Propaganda.

Orientadora: Profa Ms. Renata Oliveira dos


Santos

MARINGÁ - PR
2015
AGRADECIMENTOS

Um feliz e saudoso momento de comemorar e agradecer pelo fechamento de


mais um ciclo. Finalmente acabou, e felizmente sinto que embarquei toda a carga
que poderia carregar desse período de aprendizagem e experiências.
Agradeço primeiramente a Deus por ter concedido todas as possibilidades
(físicas, materiais e psicológicas) para eu trilhar esse caminho de quatro, extensos e
bem valorizados, anos.
Agradeço IMENSAMENTE à minha família que é o amor maior da minha vida,
primeiramente meus pais, pela paciência infinita, pela compreensão desmedida e
principalmente pela atenção e mimos que me dedicaram a cada momento de
desabafo ou de cansaço.
Agradeço a minha irmã Carol pelas contas, mensalidades e temakis pagos
nessa temporada. Finalmente, teremos nossas noites de volta, podemos curtir até
"tarde" agora (você entenderá).
Um agradecimento infinito para minha Avó Dona Flor e para a minha Tia
Celina, vocês são meu TUDO. À minha Vó pelas palavras mais amáveis e corretas
que me disse nas inúmeras ligações interurbanas que fiz lamentando das
"dificuldades" da vida, das mudanças, do cansaço e tudo mais. Talvez vocês ainda
não entendam o que um publicitário faz, mas conseguem entender que estou muito
satisfeita com a minha escolha.
Agradecimentos imensos também para a minha orientadora maravilhosa,
paciente e empenhada Renata Oliveira dos Santos. Pelas orientações que
terminavam em conversas sobre viagens e experiências da vida. Você sabe que é a
professora mais amada de Maringá, sem dúvidas, te admiro muito.
Agradeço também as professoras: Mariana Galuch por me fazer encantar
ainda mais pela sociologia com toda a sua delicadeza; Fernanda Accorsi por
expressar com finesse o equilíbrio entre firmeza e simpatia; Bianca Almeida que
mostrou que sempre é possível fazer melhor.
Finalizando as pessoas amáveis que aos "trancos e barrancos" fizeram parte
integralmente desse caminho, em primeiro ao meu anjo da guarda Vitor Schmitt,
pela afinidade e sintonia que criamos desde o começo e que espero levar para a
minha vida. Meu querido e estimado amigo Jhon Teixeira, pela companhia no skype
nas madrugadas de produção, dicas de músicas que me mandava para me manter
acordada e por todas as vezes que me ajudou em layouts e artes para trabalhos da
faculdade. Pessoas especiais que também merecem um espaço especial aqui
Priscilla, Juliana, Cintia, Amanda e Paulo, esses quatro anos foram apenas um teste,
agora essa amizade tem que resistir nos próximos anos também.
Não posso deixar de agradecer aos incríveis John Mayer, John Legend e
Djavan pelas músicas que inspiraram e me acompanharam no desenvolvimento de
cada parte desse trabalho.
Bem que a minha Avó disse, precisava daquele choro todo? Já acabou. Mas
em momento algum foi um karma do qual estou me libertando, apenas gosto de
pensar no "acabar" dessa fase como uma missão que conclui, um desafio que
cumpri com sucesso.
DIAS, Melissa Ferreira. O MUNDO FASHION: UM ESTUDO DE CASO SOBRE A
TRANSIÇÃO DA PRODUÇÃO DE LUXO PARA O CONSUMO DE MASSA. 53
folhas. Graduação – FAMMA. Orientadora Prof. Ms. Renata Renata Oliveira dos
Santos. Maringá, 2015.

RESUMO

O presente trabalho consiste em desenvolver um estudo de caso que irá analisar o


processo de transição de diferentes perfis de produção de moda. De um lado o
produto de moda exclusivo de luxo da marca Lethicia Bronstein, e do outro a
transformação desse produto em uma mercadoria de consumo de massa da
empresa de fast fashion Riachuelo. Para compreender essa transformação será
necessário o entendimento do conceito de fetiche da mercadoria marxista e da
reprodutibilidade benjaminiana, que podem colaborar com a ideia de entender a
transição e otimização da relação de produção e desenvolvimento criativo da
estilista, ao destinar seu produto para diferentes classes de consumo.

PALAVRAS-CHAVE: Moda. Fetiche. Produção.


ABSTRACT

This work is to develop a case study that will examine the process of transition of
different fashion production profiles. On the one hand the product of unique luxury
fashion brand Lethicia Bronstein , and on the other the transformation of this product
on a mass consumer merchandise Riachuelo fast fashion company. To understand
this transformation will require the fetish of conceptual understanding of Marxist
commodity and Benjamin reproducibility, which can contribute to the idea of
understanding the transition and optimization of the relation of production and
creative stylist development, to allocate your product for different classes of
consumption.

KEYWORDS: Fashion . Fetish. Production.


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................... 8

2 CONTEXTUALIZAÇÃO: A MODA E A TRANSIÇÃO ....................... 12

3 A MODA NA SOCIEDADE: FORMAS DE AÇÃO E SIGNIFICAÇÃO 26

4 MODA, PUBLICIDADE E CONTEXTO SOCIAL: A DEFINIÇÃO DE


UM OLHAR SOBRE ESSE UNIVERSO ............................................ 32
4.1 PUBLICIDADE: ALIENAÇÃO OU DEMOCRATIZAÇÃO? .................. 34

5 DO CONCEITO À PRÁTICA: LETHICIA PARA RIACHUELO POR


LETHICIA BRONSTEIN ..................................................................... 42

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................... 49

REFERÊNCIAS .................................................................................. 52

ANEXOS ............................................................................................. 54
8

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho busca impulsionar a discussão sobre o processo de


transição entre os segmentos da moda luxo para o fast fashion. A abordagem feita
se refere a entender o processo em que um determinado produto é direcionado para
outro perfil de público, nesse caso do seleto e exigente público da exclusividade e do
luxo para as massas das produções em larga escala e distribuição grandes
magazines populares.
Considerando esse processo, o posicionamento proposto nesse trabalho
busca entender que esse movimento possibilita gerar uma democratização do
consumo, tendo-o como fator social não alienador, e por semelhante modo, enxergar
a mercadoria de moda como elemento simbólico de significação social.
A gênese da discussão desse caso em específico deu-se início a partir da
situação ocorrida em novembro de 2014, com o lançamento da coleção Versace
para Riachuelo, no São Paulo Fashion Week, e um evento específico onde uma
artista “olimpiana”1 surgiu na mídia usando uma das peças da coleção e foi alvejada
de críticas por estar usar um modelo versão “comercial” da renomada marca
italiana2.
Nesse âmbito que se inicia a discussão sobre o valor representativo, onde o
que se discute é: uma marca perde a sua identidade ao ser direcionada a outro
público?
Acredito ser válido compreender além dos limites básicos das críticas prontas
e buscar apresentar um novo olhar sobre as inúmeras possibilidades da
democratização da moda, a viabilização do consumo e da receptividade da aura
para outros públicos, não restringindo a determinados nichos sociais. Para essa
análise busquei embasamento teórico nas propostas de Walter Benjamin (1994),
cujos estudos são abordados no decorrer do trabalho.

1
Termo apropriado da teoria de Edgar Morin, cujo descreve os olimpianos modernos – astros do
cinema, artistas, realeza, personagens que ocupam relevantes cargos políticos, campeões – como
produtos originais da cultura de massa, no qual destaca que “a imprensa de massa, ao mesmo tempo
que investe os olimpianos de um papel mitológico, mergulha em suas vidas privadas a fim de extrair
delas a substância humana que permite a identificação” (MORIN, 2005, p. 107).
2
Versace é uma renomada e mundialmente conhecida marca italiana de moda feminina e acessórios
de luxo, criada em 1978 por Gianni Versace, em Milão, Itália. Disponível em
<http://www.versace.com/en/history>. Acesso em: 22 out. 2015.
9

Para compreender a construção esse trabalho pode ser dividido em alguns


pontos cruciais. Inicialmente, fez-se necessário compreender o universo da moda,
contextualizando historicamente a trajetória das funções sociais adquiridas no
decorrer dos anos, e no processo da construção dos segmentos de Alta Costura e
prêt-à-porter de luxo e do Fast Fashion.
A retomada contextual e histórica da moda diz respeito a delinear o
entendimento desde a semântica do termo, quanto a sua representação no âmbito
social. Essa parte do trabalho inicia com a definição bibliográfica explicando que a
moda, segundo levantamentos de Barnard, (2003), é originado dos termos latim fatio
e facere, que possuem relação com a ideia de algo a se fazer e não de usar, como é
identificada usualmente. Além de também ter relação de ser objeto de fetiche,
segundo a teoria de Marx3, e ser reconhecido como um dos itens mais fetichizados
na sociedade capitalista.
Ainda na contextualização é desenvolvida a conceituação da sociedade estar
de certo modo baseada na roupa. A moda torna a sociedade possível, através das
relações de trabalho, de uso e interações e significações sociais. Nesse sentido, são
discutidas algumas das funções exercidas em que ocorrem processos de
significação da moda, de acordo com o posicionamento de Barnard (2003). Entre
elas, ressalto as funções comunicativa, de expressão individual e a de lazer.
A função comunicativa diz respeito ao caráter simbólico da moda ter a
possibilidade de comunicar o pertencimento a algum grupo social, para
reconhecimento dos membros do próprio grupo ou para distinção dos demais.
No quesito de expressão individual, Barnard (2003), argumenta que a moda,
embora seja um elemento cultural social, pode ser utilizado como caráter individual,
isso porque, segundo SIMMEL (1971), os indivíduos desejam e necessitam do
pertencimento a grupos sociais, mas precisam definir-se a partir da individualidade
para garantir sua sobrevivência emocional. O que também retoma a teoria da aura
de Benjamin4, em que é motivada a aproximação do indivíduo com a obra para que
crie a própria identificação e reconhecimento do que está consumindo.

3
Termo apropriado da teoria do Fetichismo da mercadoria, proposta por Marx, em O Capital (2009),
para compreender o “caráter misterioso da mercadoria”, e o surgimento de uma cultura de fetiche.
Abordagem apresentada no primeiro capítulo desse trabalho.
4
Walter Benjamin em A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica (texto original escrito em
1935) define a aura como “uma figura singular, composta de elementos espaciais e temporais: a
aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja” (BENJAMIN, 1994, p. 170),
formada pela autenticidade e pela unicidade. Autenticidade que representa o “aqui e agora” da obra,
10

Por fim, a função de lazer que a moda assume é colocada como algo
relacionado ao prazer. O momento de uso ou aquisição de uma mercadoria pode
colaborar para uma ocasião prazerosa.
Assim, outros fatores relevantes na compreensão da moda são as definições
apresentadas diferenciando os segmentos que compõe o universo fashion. Atenho-
me a dois principais, analisados com respaldo principal dos estudos de Lipovetsky,
(2009), sendo a Alta Costura e ao Fast Fashion. Cujas origens representam
períodos e contextos históricos e econômicos distintos, mas que acabaram se
coincidindo na realidade de mercado atual.
Seguindo as abordagens teóricas, faz-se necessário compreender o processo
do capitalismo e o comportamento social atual para destacar a relevância do
direcionamento do desejo pela mercadoria e a compreensão do que está sendo
consumido.
Nesse quesito é imprescindível entender a teoria do fetichismo da mercadoria,
conforme Marx (2009) propõe em O capital, para que se esclareça, o entendimento
sobre as sutilezas da mercadoria, a relação do fetichismo com o processo de
produção, com a possibilidade de enxergar o desejo é algo favorável na construção
de sentido da mercadoria.
Compreender o processo da transição, segundo a lógica capitalista,
possibilitando um entendimento mais aprofundado do que realmente é proposto,
considerando principalmente o contexto histórico em que estamos, e permitindo
enxergar além do produto material, reconhecê-lo em sua essência de mercadoria e
fator de significado e idealizações sociais.
Fechando o desenvolvimento teórico do trabalho de modo complementar aos
pressupostos de Marx (2009) é trazido o posicionamento de Walter Benjamin (1994),
além da teoria da aura já citada, a proposta da necessidade de exposição e
reprodução da mercadoria em que permitiria uma difusão e popularização do
consumo da mesma, sem limitar e restringir a determinadas esferas sociais, mas
tornando-as de certo modo, acessível a novos públicos.
O autor levanta discussões que analisa a ligação entre moda como elemento
artístico, o que permite a emancipação da mesma para se destacar no seu ritual de
desejo e de celebração.

sua existência única no lugar em que se encontra, e unicidade, por sua vez, o caráter único e
tradicional da obra.
11

Logo, a proposta geral das análises contidas nesse trabalho permeiam por
uma compreensão de que mercadoria precisa ser “fetichizada”, pois isso poderá
contribuir com a apreciação social da mesma. Dessa maneira, criam-se vínculos que
permitem avançar fronteiras de classes para que mais indivíduos criem seus
próprios significados e auras sobre determinado produto ou ideia.
A junção das análises teóricas com a transição da Alta Costura para a
produção e comercialização fast fashion, é apresentado em forma prática a partir do
estudo de caso, buscando identificar na parceria comercial e criativa entre as
marcas nacionais Atelier Lethicia Bronstein e Riachuelo esse processo.
Através de uma entrevista com a estilista Lethicia Bronstein, objetivando obter
um conhecimento mais complexo sobre as relações que envolvem esses distintos
segmentos, e compreender sobre a difusão da concepção atual de fetiche de
consumo e produção a partir do processo criativo, pensado para oferecer uma
simbologia, figurada em produto para alcançar e atender as concepções e
expectativas sociais e individuais de um novo público, o do fast fashion (BORGES,
2013; DELGADO, 2008).
Outros trabalhos acadêmicos 5 já apresentaram a relação de marcas fast
fashion no contexto de alcançarem perfil de público mais elitizados através das
parcerias com marcas ou personalidades famosas. Porém, a fundamentação deste
trabalho poderá colaborar com a compreensão social em abranger o caminho
contrário, em que haja a possibilidade de marcas famosas utilizarem de estratégias
do fast fashion para se tornarem acessíveis a outro perfil de público, satisfazendo
seus desejos de consumo, pelo menos no que diz respeito à moda.

5
BORGES, C. . A invasão do fast fashion ao redcarpet do Oscar 2013. In: VI Seminário Nacional de
Pesquisa em Arte e Cultura Visual, 2013, Goiânia. Anais do VI Seminário Nacional de Pesquisa em
Arte e Cultura Visual, 2013.
DELGADO, Daniela. Fastfashion: estratégia para conquista do mercado globalizado. Modapalavra e-
periódico. Ano 1, n. 2, p. 3-10. Agosto a dezembro, 2008.
12

2 CONTEXTUALIZAÇÃO: A MODA E A TRANSIÇÃO

A moda pode ser definida como um fator ou vertente social que representa
costumes, hábitos, regulamentações ou preferências a determinado perfil de
produto, comportamento, atitudes ou cultura, agindo muitas vezes de maneira cíclica
e principalmente transitória e vulnerável a transformações constantes, cujos sujeitos
buscam se apropriar e adequar-se aos modos, formas e sutilezas a fim de sentirem-
se aptos ao pertencimento social.
Nesse trabalho, restrinjo a significação de moda em relação à indumentária
do perfil fast fashion e concepção de consumo, mais especificamente no quesito
ideológico da construção de sentido por meio do fetichismo da mercadoria e forma
de distribuição para um consumo de massa, visando identificar a significação social
dessa transição da alta costura a partir da criação uma mercadoria que ao tornar
produto de massa torna-se repleta de interferências culturais e simbólicas.
De acordo com a análise de Malcolm Barnard (2003), no livro Moda e
Comunicação, a palavra moda, fashion em inglês, é derivada do termo factio do
latim, que etimologicamente remete ao conceito de fazer ou fabricar.
O sentido original de moda estava mais relacionado à ação de produção do
que a conotação que é empregada como algo para ser usado. Ainda em outras
derivações da palavra, Barnard (2003), destaca que o conceito de fashion também
possui relação etimológica com a ideia de objeto de fetiche. Essa compreensão será
crucial para a captação das propostas teóricas que serão desenvolvidas neste
trabalho.
O advento do capitalismo6 foi determinante para a emancipação da moda
como fenômeno cultural. Em cada período histórico, a moda obteve uma função
social. Deixa de exercer sua função básica de proteção e altera a sua natureza

6
O advento do capitalismo é referido aqui como o surgimento de uma economia mercantil, onde as
relações sociais de produção assumem forma de coisas e se expressam através de coisas. A
estrutura da economia mercantil leva as coisas a desempenharem um papel social particular e
importante, e a adquirir propriedades sociais específicas, graças às quais não só oculta as relações
de produção entre as pessoas, como também as organiza, servindo como elo entre as pessoas.
(RUBIN, 1980).
13

social, para adquirir importante participação na construção social dos indivíduos


(BARNARD, 2003).
Assim, na atualidade, faz-se necessário, compreender o processo em que
de funcionam os perfis de moda como pret-à-porter de luxo e o fast fashion. Uma
vez que são os objetos a serem analisados ao longo desse trabalho e que tendem
designar formas diferentes de produção e consumo.
Começando pela Alta Costura, processo que antecede o estilo pret-à-porter.
Alta Costura, ou Haute Couture em francês, é uma “Indústria de luxo por excelência”
de acordo com a definição de Gilles Lipovetsky (2009).
Trata-se de um segmento de produção, surgido no final do século XIX como
uma tradição a fim de inovar e elitizar o universo da moda: “A alta costura disciplinou
a moda no momento em que ela engatava um processo de inovação e fantasia
criadora sem precedente” (LIPOVETSKY, 2009, p.84).
A Alta Costura, de acordo com o sociólogo José Carlos Durand “é o
artesanato de luxo que veste mulheres de elite” (DURAND, 1988, p.19), pois trata-se
da produção de modelos exclusivos, sob encomenda prévia e elaborados em um
processo minucioso e artesanal.
14

Figura 1: Atelier de Alta Costura em Paris.

O seu diferencial é justamente prezar pela exclusividade de peças “feitas à


mão”, cujas marcas são selecionadas pela Câmara Sindical da Alta Costura
Parisiense e autorizadas a utilizar o termo Haute Couture, e que devem preencher
inúmeros requisitos para pertencer a este almejado e milionário rol. Possuem um
caráter praticamente insubstituível, que têm como função principal, ditar as próximas
tendências do setor, conforme descreve Lipovetsky, (2009), em seu panorama sobre
a história da moda.
Bom, se a Alta Costura pertencia a esse universo limitado de produção, logo
a distribuição também ocorria de forma limitada, apenas para os poucos
privilegiados com grande poder aquisitivo.
Era necessário buscar meios de ampliar a produção, haja vista a
necessidade de ampliar o público de consumo e a distribuição. Tendo “O impulso da
confecção de um lado, o das comunicações de massa do outro” (LIPOVETSKY,
2009, p.85), essa possibilidade começou a ser cogitada a partir dos anos 1920, com
a Chanel desenvolvendo simplificações para o vestuário feminino, cuja atitude
15

favoreceu, de certo modo, a acessibilidade por se tornar mais fácil de ser imitada,
permitindo, mesmo que timidamente, a internacionalização e a democratização da
moda:

O processo – da democratização -, contudo, não se realizou sem um


certo equívoco: o luxo permaneceu, de fato, com a condição de ser
eufemístico, um valor insubstituível de gosto e de refinamento de
classe no coração da Alta Costura. A democratização da moda não
significa uniformização ou igualação do parecer; novos signos mais
sutis [...] de cortes, de tecidos, continuaram a assegurar as funções
de distinção e de excelência social. Ela significa redução das marcas
da distância social, amortecimento do princípio aristocrático
(LIPOVETSKY, 2009, p. 87).

Mesmo nessas condições sociais, a Alta Costura não deixou de criar suas
sofisticadas e elaboradas peças de festas, mas surge um estilo mais funcional de
produção:

À democratização da aparência correspondeu a extensão e depois a


generalização do desejo de moda, outrora circunscrito às camadas
privilegiadas da sociedade. A moda de cem anos não só aproximou
as maneiras de vestir-se, como difundiu em todas as classes o gosto
das novidades, fez das frivolidades uma aspiração de massa,
enquanto concretizava o direito democrático à moda instituído pela
revolução [...] (LIPOVETSKY, 2009, p. 90).

Eis que surge a revolução que transforma a lógica da produção industrial: o


Pret-à-porter. Segundo Lipovetsky (2009),
16

Figura 2: Fábrica de costura pret-à-porter em 1930.

A expressão foi lançada em 1949, por J. C. Weill, na França, baseada na


expressão americana ready to wear, traduzido como pronto para vestir:

À diferença da confecção tradicional, o pret-à-porter engajou-se no


caminho novo de produzir industrialmente roupas acessíveis a todos,
e ainda assim “moda”, inspiradas nas últimas tendências do
momento [...] quer fundir a indústria e a moda, quer colocar a
novidade, o estilo, a estética na rua (LIPOVETSKY, 2009, p. 126).

Até o final dos anos de 1950, o pret-à-porter era uma continuidade, ou


melhor, uma extensão fiel ao estilo ditado pela Alta Costura, mas com técnicas de
produção otimizada para grandes quantidades. Foi apenas a partir dos anos de
1960, que o segmento passou a criar roupas um estilo peculiar, desvencilhando-se
dos excessos, das produções sob medida e limites do perfil pioneiro da Alta Costura
(LIPOVETSKY, 2009).
O pret-à-porter na intenção da junção da produção industrial e informação de
moda, passou a associar estilistas no desenvolvimento criativo, para dar forma à
estética diferenciada que pretendiam criar e traduzir as tendências de maneira que
fossem aplicáveis na produção em escala. A junção do estilista no desenvolvimento
17

do vestuário no pret-à-porter contribui para que tornasse de fato um produto de


moda:

A espiral da democratização da moda prossegue seu curso: após o


momento em que instalou uma moda industrial de massa, mas de
qualidade medíocre, sem estilo nem toque de moda, o momento em
que a indústria do pret-à-porter oferece preço mais ou menos baixo,
produtos de qualidade estética e de criação de moda específica. A
democratização do sistema não se baseia apenas na exclusão de
fato da Alta Costura, mas sobretudo na promoção concomitante da
qualidade moda do vestuário de massa (LIPOVETSKY, 2009, p.
132).

Com isso, compreende-se que a proposta do pret-à-porter sessentista


refere-se a produção de confecção industrial e democrática, que é complementada
com um caráter criativo e estético específico, proporcionando a valorização do
produto, por serem peças elaboradas e desenvolvidas como produtos de moda, e
não apenas produção imitada em larga escala.
Esse modo de produção, também foi se desenvolvendo de acordo com as
novas condições sociais de consumo, o fast fashion mesmo, compartilha da mesma
lógica de produção, mas com especificidades voltadas para as condições e
necessidades econômicas do mercado.
A partir da década de 1990, em um cenário mais atual, é o conceito de fast
fashion que eclode no mundo da moda. Em tradução literal é a moda rápida, que
busca ser o mais assertiva possível no mercado, cativando seu público com
inúmeras e frequentes novidades na cartela de produtos, produzida em quantidades
limitadas, objetivando uma rotatividade de mercado, sem se desvincular do caráter
estético e principalmente do preço dos produtos.As primeiras marcas precursoras a
aderir o segmento fast fashion foram às empresas varejistas: a espanhola Zara e a
norte americana H&M, (DELGADO, 2008).
18

Figura 3: Interior da loja H&M.

O fast fashion é o chamado circuito curto que compreende o processo de


produção criado em Sentier7, um bairro em Paris, onde comerciantes do segmento
têxtil, iniciam sua produção tardia para estarem embasados na efetividade das
tendências (ERNER, 2005).
Em outras palavras tais marcas, só produzem após terem certeza de que o
público gostou de determinado estilo e que terá boa receptividade para venda em
larga escala, e, por conseguinte obterem menos chances de erros de mercado e
prejuízos.
Pode-se compreender melhor o formato atual de produção e distribuição do
fast fashion na descrição a seguir:

Na tentativa de atender a um público diversificado, algumas


empresas trilham entre um mercado que dá importância ao status
que uma marca representa, com criações semi-exclusivas e
preocupação com a estética/estilo da roupa e um mercado popular,
cuja exclusividade não é importante, mas o preço é o fator primordial
em detrimento da estética. Cabem às empresas grandes

7
O Sentier é um bairro da capital francesa, na região da Bolsa de Valores de Paris considerado o
maior centro atacadista de roupas da Europa, e um dos maiores do mundo. Segundo estimativas são
aproximadamente 4 mil lojas que compõem o complexo. Embora já existisse desde o contexto da
Idade Média, foi a partir da década de 1960, junto com a industrialização da moda e o pret-à-porter,
que passou a centralizar a distribuição de moda francesa popular. No Brasil, funcionam de maneira
similar, os bairros paulistanos Brás e Bom Retiro.
19

investimentos em sua imagem, na pesquisa e no lançamento de


produtos diferenciados para a manutenção de sua marca e constante
conquista de seu público (DELGADO, 2008, p.4-5).

Outras características do perfil fast fashion é o apelo visual das coleções,


curta duração de vida dos produtos e com baixos preços. Essa estratégia é a que
melhor se encaixa no contexto da sociedade do consumo8.

Sobre as especificações do fast fashion, pode-se compreender que:

As marcas devem, portanto, permanecer vigilantes no que se refere


à sensibilidade dos consumidores ao preço, à inflação de lançamento
de produtos novos, à duração de vida dos produtos, aos efeitos
perversos da promoção, às novas maneiras de dar as cartas em
matéria de distribuição e, enfim, à qualidade de serviço assim como à
formação do pessoal de vendas (BALIAN, 2017, p. 5).

Percebe-se que na estratégia do fast fashion o foco de análise para as


ações a serem tomadas, está direcionado para as preferências de consumo. O
comportamento e tendências são menos importantes, uma vez que o principal é
garantir a rotatividade das vendas e frequente atualização dos produtos com o que
os clientes desejam.
Dessa forma, é possível satisfazer as pretensões de consumo e desejo, ao
mesmo tempo em que cria uma manutenção da necessidade de consumo por
apresentar sempre novas opções de produtos e de maneira aquisitivamente
acessível.
Pensando nesse contexto da ideia entre um mundo fashion, que tende a
convergir alta costura com consumo de massa, o presente trabalho visa refletir sobre
esse processo, a partir das duas marcas componentes do caso a ser estudado, e
que pertencem aos respectivos segmentos: Atelier Lethicia Bronstein Pompeu e a
varejista Riachuelo.
Em dezembro de 2014, diversos sites sobre moda e revistas anunciaram a
parceria entre as marcas Lethicia Bronstein e Riachuelo, com lançamento de uma

8
Os principais autores que abordam definições sobre Sociedade do Consumo são Baudrillard (1981),
Bauman (1999), Lipovetsky (1989). Em resumo, esses autores são considerados como pessimistas
em suas abordagens. Na sociedade do consumo os sujeitos sociais são vistos como meros
consumidores, em que o exercício do consumo é uma prática padronizada que molda as relações dos
indivíduos. Bauman ainda reforça a relação de ser uma sociedade baseada na lógica do efêmero,
uma vez que a estrutura do consumo é a multiplicidade e a manutenção da rotatividade de produtos,
onde relações pessoais, de produção e ou de consumo, ocorrem de forma superficial e transitória.
20

coleção no segundo semestre de 2015. Devido o quesito Alta Costura só poder ser
apropriado às maisons designadas a isso, o Atelier Lethicia Bronstein Pompeu, é
devidamente identificada como marca de pret-à-porter de luxo.
A estilista, cuja marca leva o seu nome, produz vestidos de noiva “para
mulheres que buscam looks exclusivos, dignos de um RedCarpet 9 ” e roupas de
festa, com materiais e detalhes sofisticados “assim como um vestido dos sonhos
deve ser”, conforme descrição institucional constada no próprio site da marca10.

Figura 4: Estilista no Atelier Lethicia Bronstein Pompeu em São Paulo.

Mesmo produzindo peças exclusivas com acabamento artesanal, a marca é


caracterizada por também produzir peças no segmento pret-à-porter, isso porque,
conforme foi visto a definição e aplicação do tema, a marca conta com uma estilista,
homônima, que desenvolve suas criações para um determinado nicho de mercado,

9
O termo RedCarpet em tradução literal significa tapete vermelho e representa os principais eventos
e premiações internacionais como Oscar, Grammy, entre outros, onde artistas e celebridades
“desfilam” looks de marcas renomadas e produções milionárias. Disponível em
http://www.modadocumenta.com.br/anais/anais/5-Moda-Documenta-2015/03-Sessao-Tematica-
Fotografia-Cultura-Visual-e-Moda/Nayara-Tognere_ModaDocumenta2015_-A-PUBLICIDADE-DE-
MODA-NA-FIGURA-DO-ATOR-DE-CINEMA.pdf. Acesso em: 19 nov. 2015.
10
Disponível em http://www.lethicia.com.br/. Acesso em: 28 mar. 2015.
21

utilizando de uma estética e técnicas próprias de produção, em quantidade restrita.


Os preços praticados pela marca são elevados, levando em conta todas as minúcias
que envolvem a produção e consumo de um produto exclusivo.
A Lethicia Bronstein e o perfil alta costura, passam a ingressar no segmento
democrático de consumo, considerando que o estilo criativo da estilista foi mantido,
sendo ajustado para as condições de produção e distribuição do fast fashion.
Por sua vez, a marca varejista Riachuelo é um dos principais exemplos do
segmento fast fashion no Brasil. Nos últimos anos, têm feito parcerias com estilistas
e personalidades renomadas no mundo da moda, criando novo perfil de produto,
que otimiza a junção estética, informação de moda e preço acessível.
No site11 da empresa Riachuelo consta a seguinte definição:

A Riachuelo se consolidou no mercado como a maior empresa de


moda do País, principalmente pelo fato de ser a única do segmento
que pesquisa, cria e produz, entre outras inovações. Com este
modelo inédito de negócios, a empresa - que possui o maior parque
fabril da América Latina - incorporou, com exatidão, o verdadeiro
conceito fast fashion, objetivando democratizar o acesso às últimas
tendências das passarelas nacionais e internacionais.

Descreve ser uma marca que utiliza de pesquisa de tendência para o


desenvolvimento e produção das peças. Ou seja, embora tenha mais 250 lojas pelo
país, e produza inúmeras peças de cada modelo, a marca preza em oferecer peças
com conteúdo e informação de moda aos seus clientes, seguindo a lógica de
produção do próprio perfil fast fashion.

11
Disponível em http://www.riachuelo.com.br/. Acesso em 28 mar. 2015.
22

Figura 5: Fachada da loja Riachuelo no Shopping Eldorado em São Paulo.

Nesse processo, em que um produto e marca que já possui um universo de


afinidades e significações em um determinado ambiente social, passam a ser
inseridos em outro contexto social, ocorrem relações de desejo de consumo. Esse
segmento que transita entre o que é exclusivo ou popular, será analisado pelo
princípio que um produto pode vir a adquirir um status ao ser consumido, gerando
um desejo, que está implícito ao seu consumo.
Devido à inconstância e necessidade sempre imediata de renovação dos
produtos e códigos da moda, a multiplicidade, reprodução técnica são partes
inerentes e congênitas a esse processo. Todavia, me atenho a observar as relações
que envolvem a produção e pretensões do consumo em larga escala da moda
enquanto mercadoria com informação e significado social.
Logo, faz-se necessário observar se a forma que uma cliente do atelier
Lethicia Bronstein compreende a simbologia de um produto de moda, aproxima à
ideia que um consumidor de fast fashion teria sobre os mesmos produtos. Pois a
multiplicidade e reprodução, quantidade e formas de acesso a esses produtos,
buscam otimizar um possível estreitamento de relações e concepções entre as
diferentes classes de consumo, principalmente através da transformação da
23

mercadoria que a princípio figura como algo exclusivo e para poucos e tornar-se
repleto de idealizações e significações sociais para quem a consumir.
Um fato ocorrido em novembro de 2014, permite compreender a gênese da
problemática entre a transição dos universos de produção e consumo analisados.
Durante a edição de Inverno da São Paulo Fashion Week, a marca de fast fashion
Riachuelo programou um desfile de lançamento da coleção exclusiva Versace para
Riachuelo, desenvolvida pela própria estilista italiana Donatella Versace. Embora já
tenha lançado coleções em parcerias com marcas famosas – e caras - pela primeira
vez no Brasil e especificamente nessa rede de venda de varejo, surgia uma coleção
que contava com colaboração de grande reconhecimento internacional.

Figura 6: Imagem da campanha de lançamento da coleção em 2014.

As peças na rede de varejo foram comercializadas a preços até R$399,00,


tendo em vista que as peças originais da marca Versace (acessórios, vestuário,
calçados, perfumes) permeiam sempre entre valores superiores a R$1.000,00, as
24

possibilidades de consumo são bem mais elitizadas à uma esfera específica de


público com potencial aquisitivo de compra.
Na tentativa de compreender o envolvimento da concepção de consumo
primeiramente dos compradores da fast fashion, que talvez não tivessem poder
aquisitivo para comprar um vestido Versace com preço acima de cinco mil reais, mas
que compreendiam a relevância da marca e o lifestyle inerente a mesma, e que
agora teriam a possibilidade de tê-la a valores acessíveis nas versões Riachuelo.
Em outras palavras, trata-se de um processo de democratização do
consumo. Entende-se de acordo com Lipovetsky (2009) que democratização
representa principalmente a redução do distanciamento das classes sociais e do
princípio aristocrático de determinado status, antes elitizado. Nesse caso refere-se
ao segmento de moda, cujos padrões e inconstâncias têm se revelado tornarem-se
mais flexíveis, como no caso em questão, para talvez possibilitar-se ser mais
abrangente.
Retomando o evento ocorrido, pode-se afirmar que independente de terem
sido compradas em uma loja de varejo fast fashion, as peças ganharam um valor
representativo devido ao vínculo criativo com a grife italiana. Logo, independente de
do seu valor, absolutamente ainda existia a aura de ser Versace.
Mas essa questão foi amplamente discutida e destacada socialmente com o
outro evento ocorrido em fevereiro de 2015, quando a cantora pop brasileira Anitta
esteve presente a uma festa de casamento da atriz global Fernanda Souza com o
cantor Thiaguinho, com um vestido da coleção Versace, vendido na rede popular12.
O ocorrido impulsionou um bombardeio nas mídias sociais e sites com
comentários de críticas e questionamentos devido uma consumidora ter visto o
mesmo vestido em uma das lojas da rede, lançado inicialmente com o preço de
R$349,90, já em liquidação por R$49,9013.
14
O fato de uma personagem inclusa no “Olimpo” dos famosos e
celebridades, estar inserida no pacote de consumo acessível de Versace tornou-se
motivo, mais do que suficiente de argumentos e espetacularização, pois é muito

12
Disponível em http://ego.globo.com/casamento/noticia/2015/02/na-promocao-vestido-de-anitta-no-
casorio-de-fe-souza-e-de-rede-popular.html. Acesso em 20 nov. 2015.
13
Ver em anexo A.
14
Na Mitologia Grega o Monte Olimpo (uma das montanhas mais altas da Grécia), era a morada dos
deuses gregos mais imponentes e intocáveis, conhecidos como Deuses do Olimpo. Disponível em
http://www.historiadomundo.com.br/grega/religiao-grega.html. Acesso em: 3 jun. 2015.
25

forte socialmente a ideia de que existe um amplo distanciamento entre os “mortais”


consumidores comuns e o admirável mundo dos famosos.
Morin (2005), descreve os olimpianos modernos – astros do cinema, artistas,
realeza, personagens que ocupam relevantes cargos políticos, campeões – como
produtos originais da cultura de massa, no qual destaca que

a imprensa de massa, ao mesmo tempo que investe os olimpianos


de um papel mitológico, mergulha em suas vidas privadas a fim de
extrair delas a substância humana que permite a identificação
(MORIN, 2005, p. 107).

Uma vez que artistas e astros célebres já haviam sido promovidos à


divindades, o novo curso da cultura de massa os humaniza criando uma
proximidade de identificação humana. Concedendo assim, a possibilidade de terem
dupla natureza, e de projetarem-se socialmente através dela.

Os olimpianos, por meio de sua dupla natureza, divina e humana,


efetuam a circulação permanente entre o mundo da projeção e o
mundo da identificação (...) Conjugando a vida quotidiana e a vida
olimpiana, os olimpianos se tornam modelos de cultura no sentido
etnográfico do termo, isto é, modelos de vida. São heróis modelos.
Encarnam os mitos de auto realização da vida privada (MORIN,
2005, p.107).

Sendo assim, compreende-se o sensacionalismo do evento ocorrido com a


cantora Anitta, onde através do uso do vestido versão fast fashion e popular de
Versace, houve uma projeção de aproximação com o seu perfil humano, haja vista
que esse perfil de coleção teria sido criada direcionada aos humanos e “mortais”
componentes da sociedade comum, enquanto os semi-deuses deveriam desfrutar
apenas da aura e estética do exclusivo e do original.
Segundo Morin (2005), a estética e a práxis são reflexos gerados da cultura
de massa, da mesma forma que o universo mitológico moderno, logo na cultura de
massa a mitologia ultrapassa a estética, no real e no imaginário, por meio da aura
olimpiana.
Logo, a expressão do fato ocorrido com a cantora Anitta, possibilita questionar
que o que passa a ser relevante nesse conflito mitológico é a compreensão, ou
melhor a falta de compreensão e de reconhecimento entre o real e o imaginário,
entre humanos e semi deuses. Onde o posicionamento de determinado produto foi
26

transformado para aceitação da aproximação entre o exclusivo e o popular. Porém,


a reação gerada pode ser tomada como um estranhamento com relação à
identificação real e a possibilidade de “permearem” entre os dois mundos.
Considerando a proposta do caso aqui analisado, será melhor abordado mais
a diante, porém é possível observar que uma das estratégias de lançamento foi
justamente divulgar as peças da coleção versão original da Riachuelo em pessoas
influentes e formadoras de opinião no universo fashion nacional e com uma
peculiaridade: todas que pertenciam a cartela de clientes do atelier Lethicia
Bronstein. Isso de certo modo possibilitou “desmitificar” as personalidades do seu
âmbito de “semi-deusas” para já criar uma aproximação e identificação com o novo
produto, ainda sendo uma criação Lethicia Bronstein.
Nesse quesito, devido a essa aproximação foi possível posicionar a coleção e
esse novo perfil de produto visando otimizar a relação do público com a significação
pretendida, de valorização desse novo produto. Isso direciona a observar como a
moda acontece no que diz respeito a essa construção de sentido aos indivíduos.
27

3 A MODA NA SOCIEDADE: FORMAS DE AÇÃO E SIGNIFICAÇÃO

De acordo com Barnard, (2003), a trajetória histórica sobre a moda e a


indumentária como elementos socialmente culturais, transitou pelas funções de
proteção, elemento de encobrimento segundo contextualização bíblica, definição do
papel social, expressão individual, diferenciação de status, lazer, símbolo político,
ritos sociais, entre outros. Em cada uma dessas funções adquiriu significados e
sentidos sociais diferentes.
Alguns teóricos defendem que a ornamentação é a primeira finalidade das
roupas, considerando como necessidade espiritual dos povos bárbaros. Outros, por
sua vez apontam que a primeira aplicação prática da vestimenta ainda não como
moda, mas no sentido de proteção pode ser considerada no período dos primórdios
paleolíticos aos quais recorriam a peles de animais como forma de proteção às
baixíssimas temperaturas enfrentadas naquele período, e a ataques de animais.
Mas, a função de proteção pode ser estendida para além de proteger o
corpo das temperaturas, pode ser vista também como proteção a ações externas
como acidente ou perigos físicos e inclusive psicológicos, cujo termo Barnard
apropria da definição de Flügel para mostrar que a indumentária pode garantir um
caráter de “adorno mágico” capaz de repelir ações místicas ou espirituais, e em uma
classificação mais geral de oferecer proteção “contra a hostilidade do mundo como
um todo” (FLÜGEL apud BARNARD, 2003, p. 81).
Além do que já foi visto sobre a moda vale ressaltar que o seu o
entendimento pode ser compreendido ainda por meio de três funções sociais da
moda se fazem imprescindíveis: a moda enquanto elemento de comunicação,
expressão individual e lazer, conforme análise de Barnard (2003).
A função comunicativa da moda está atrelada a possibilidade de uma
vestimenta, estilo ou comportamento comunicar alguma representação de
pertencimento a um determinado grupo, podendo ser para o reconhecimento para os
membros deste ou de outros grupos, mas em ambos os casos induz a destacar um
aspecto de distinção e diferenciação. Essa função é um dos fatores principais que
provocam a identificação do caráter simbólico da moda:
28

Assim, através da moda, do vestuário e da indumentária a posição


de um indivíduo naquela ordem social é experimentada e
comunicada (...) Roach e Eicher mostram, por exemplo, que moda e
indumentária atam uma comunidade mantendo-a unida. (Roach e
Eicher 1979: 18). Sugeriu-se que o acordo social sobre o que se
vestirá é ele próprio um vínculo social que, por sua vez, reforça
outros vínculos sociais. A função unificadora da moda e da
indumentária serve para comunicar a afiliação de um grupo social,
tanto para aqueles que são seus membros quanto para os que não o
são (BARNARD, 2003, p. 91).

É na função da comunicação que a moda pode expressar a necessidade de


ser “fetichizada”, o que será melhor destacado mais a diante, contudo contribui com
a apreciação social do consumo enquanto mercadoria, uma vez que Barnard (2003),
afirma que a moda pode ser a forma mais significativa pelas quais as relações
sociais entre as pessoas são construídas, experimentadas e compreendidas, e
complementa afirmando que “as coisas que as pessoas vestem dão forma e cor às
distinções” (BARNARD, 2003, p.24). Dessa forma, cria-se a permissividade para
avançar fronteiras de classes e fazer com que mais indivíduos criem seus próprios
significados sociais.
Compreende-se então, que a existência da moda está diretamente
relacionada e condicionada ao fato de haver classes diferentes na sociedade, bem
como permitir criar a possibilidade e o desejo de haver um movimento de ascensão
entre classes:

Não seria possível, por meio da moda e da indumentária, apontar


que alguém seja membro de uma classe específica se não houvesse
classes diferentes a que pertencer. Obviamente, e do mesmo modo,
seria completamente inútil uma pessoa indicar o seu desejo de ser
ou de ser considerada membro de uma classe específica, por meio
da moda e da indumentária, se esse movimento ascendente ente
classes não fosse possível (BARNARD, 2003, p.149)

Primeiramente, é válido ressaltar que o movimento descendente também é


possível, contudo, segundo a ideologia do capitalismo é visto como o indesejado das
gentes15. Por conseguinte, entende-se que através da moda e da indumentária que
as posições de classe são construídas, evidenciadas e reproduzidas. Isso ocorre
devido à interação social que criam, que torna-se um dos fatores que constituem a
15
Referência ao poema Consoada, Manuel Bandeira – Publicado em Antologia Poética, São Paulo,
Global, 2013, p. 240.
29

identidade de classe, logo, reforça a ideia de que “moda e indumentária não são
simplesmente uma expressão ou um reflexo das condições econômicas.”
(BARNARD, 2003, p.153). Outros pontos sobre o movimento de classes sociais
serão vistas mais detalhadamente nos argumentos sobre o posicionamento de Marx,
mais a frente.
Quanto ao critério de expressão individual, a priori torna-se contraditório
compreender a moda que é um elemento cultural social como um elemento de
caráter individual:

A sobrevivência emocional dos seres humanos depende, de certa


maneira de sua habilidade para alcançar um equilíbrio entre
conformar-se à sociedade e preservar um senso de identidade
própria. Moda e indumentária são modos pelos quais os indivíduos
podem diferenciar-se como indivíduos e declarar alguma forma de
singularidade. Roupas que são raras, ou porque muito antigas ou
muito novas, por exemplo, podem ser usadas para criar e exprimir
uma singularidade individual. Roupas que não são nem muito antigas
nem muito novas e que são, além disso, produzidas em massa,
podem também ser usadas para criar esse efeito (BARNARD, 2003,
p. 93).

Mesmo em toda a sua amplitude de coletividade e uniformização, a moda


exerce um papel de singularidade. Barnard (2003) cita o sociólogo Simmel (1971), o
qual defende que a moda se estabelece a partir de duas tendências sociais, sendo a
necessidade de união e o anseio pelo isolamento. Os indivíduos devem desejar o
pertencimento a grupos sociais, mas não deixarem definir-se apenas pelo coletivo,
faz-se necessário manter sua individualidade.
A moda, bem como os elementos artísticos, são elementos de criações da
coletividade direcionados para uma unicidade, segundo as colocações de Benjamin.
Portanto, o ritual individual de apreciação, ao qual Benjamin destaca, está
relacionado com a possibilidade de reproduzir de maneira ampla e ao mesmo tempo
em aproximar de um caráter único de consumo.
Por conseguinte, a função de lazer que a moda assume é colocada por
Barnard, (2003), como algo relacionado ao prazer. O momento de uso ou aquisição
de uma determinada vestimenta pode colaborar como ferramenta de obter prazer ou
ainda incitar uma ocasião prazerosa.
Morin (2005), descreve que o lazer surge como o tecido da vida pessoal, onde
o ser social busca o elemento de afirmação do indivíduo privado:
30

É essencialmente esse lazer que diz respeito à cultura de massa (...)


Dirige-se às necessidades da vida do lazer, às necessidades da vida
privada, ao consumo e ao bem-estar, por um lado, ao amor e à
felicidade, por outro lado. (...) O lazer não é apenas o pano de fundo
no qual entram os conteúdos essenciais da vida e onde a aspiração
à felicidade individual se torna exigência. Ele é, por si mesmo, ética
cultural (MORIN, 2005, p.69).

Importante ressaltar que o fato de proporcionar um sentimento de


divertimento ou prazer, a moda não se limita a ser reconhecida como elemento
vulgar ou banal de alienação, mas tem sua relevância enquanto fator social e
cultural:

Assim enquanto moda e indumentária podem ser assunto de


diversão, uma oportunidade para brincadeiras inconsequentes, elas
não são apenas isso. Além de tudo, a análise do que entendemos
por diversão, como poderíamos definir o prazer, e para quem, não
são questões simples (BARNARD, 2003, p. 106).

Esses termos denotam que a expressão e entendimento da moda está mais


próxima à subjetividade dos objetos do que à compreensão racional dos mesmos. O
prazer a que refere pode ser proporcionado para alguns na experiência ao vestir
uma roupa e da sensação provocada através do olhar e não obrigatoriamente no
uso, embora podem também representar prazer de forma diferente para cada um
dos indivíduos (BARNARD, 2003).
Essa possibilidade de expressar a partir de um elemento, no caso a moda, um
leque de fatores mais complexos que fazem enxergar que não se trata apenas de
usar roupa ou adorno, mas de comunicar através dos signos da moda
posicionamentos sociais, culturais e significados.
Sabe-se que comunicação humana se desenvolve através dos signos, e
tomando a moda através de um cunho linguístico de caráter comunicativo de signos
e significados, proponho uma analogia à teoria dos signos de Saussure, onde é
possível elaborar uma lógica para entender o processo de significação da moda.

O signo compõe-se de duas partes. Essas partes são denominadas


de “significante” e de “significado”. Saussure preocupa-se com a
linguagem, e para ele “significantes” são a parte física dos signos,
são os sons, ou os formatos das palavras. O “significado” é o
31

conceito mental a que se refere o significante. É o sentido do


significante, juntos eles formam o “signo” (SAUSSURE 1974:65-7
apud BARNARD, 2003, p. 122).

Considerando que a moda seja o signo, haverão dois agentes primordiais que
irão produzir forma e sentido a ele, em primeiro lugar o estilista que tem a
incumbência de transformar uma ideia, o conhecimento do seu contexto histórico
social e experiências para gerar uma mercadoria. E em segundo, a sociedade irá dar
sentidos de uso, cultural e social a tal criação.
O perfil do estilista de criar uma estética própria que interprete tendências e
identifique o estilo de uma determinada marca para um respectivo público, ainda no
período da Alta Costura foi considerado um como um trabalho artístico. Sendo pelo
quesito de desenvolver um trabalho artesanal para desenvolvimento das suntuosas
peças de Alta Costura ou para criar e dar forma a um estilo o antigo costureiro
ganha outro status social, torna-se um gênio artístico Lipovetsky, (2009). Ainda,
segundo o autor os criadores de moda – no contexto dos ateliers franceses de Alta
Costura – se igualam a nobreza artística dos poetas e pintores.
Da mesma forma que o universo artístico é variável de acordo com as
vanguardas, que definem formas, cores, técnicas que identifiquem determinado
estilo de arte, a moda também passa por essas transições.
Barnard, (2003), afirma que não é apenas o estilista durante o seu processo
criativo que propõe significações às suas criações, as relações sociais também o
fazem, contudo, o estilista por ter de exteriorizar sua concepção do pensamento de
que tais formas, cores, padronagens ou modelagens poderiam se tornar em algo
significativo à sociedade em um determinado contexto histórico, o mesmo aparenta
ser o único responsável pelo significado da função da moda e de cada item da
indumentária.
O caráter da moda permite que seja a expressão dos elementos culturais,
econômicos, comportamentais e históricos de uma sociedade, a mesma sociedade
que a cria como produto sensível e como significado. Por sua vez, a moda enquanto
produto artístico, desenvolvido no processo de concepção artística do estilista,
também possui caráter simbólico e deve ser entendida através dele.
Para isso faz-se necessário compreender o contexto teórico que envolve
essas relações de percepção da moda enquanto mercadoria e como produto
artístico a ser interpretado socialmente, conforme abordado a seguir. Pois,
32

compreender a construção da mercadoria representa entender desde a sua


produção, as relações que estão envolvidas, no que diz respeito ao trabalho
aplicado na transformação de matéria em mercadoria, valor que é adquirido, criação
do desejo, divulgação da mercadoria e como todo esse processo será percebido
pelo indivíduo.
33

4 MODA, PUBLICIDADE E CONTEXTO SOCIAL: UMA REFLEXÃO SOBRE


ESSE UNIVERSO

O conceito do termo fetiche de acordo com o dicionário Houaiss (2009) é


definido como “Objeto inanimado a que se atribui poder sobrenatural (...)” é
designado na palavra e conceito de feitiço, enquanto o fetichismo designa o ato de
cultuar tais objetos inanimados.
No campo sociológico a ideia de fetiche é apropriada pelo sociólogo Karl
Marx, para compreender o “caráter misterioso da mercadoria” (MARX, 2008, p.93), e
analisar as relações sociais no âmbito capitalista, onde descreve a existência de
uma cultura de fetiche e inicia sua abordagem sobre o fetichismo da mercadoria no
seguinte trecho:

À primeira vista a mercadoria parece ser coisa trivial, imediatamente


compreensível. Analisando-a vê-se que ela é algo muito estranho,
cheio de sutilezas metafísicas e argúcias teológicas. (…) É evidente
que o ser humano, por sua atividade, modifica, por exemplo, a forma
da madeira, quando dela faz uma mesa. Não obstante, a mesa ainda
é madeira, coisa prosaica, material. Mas, logo que se revela
mercadoria, transforma-se em algo ao mesmo tempo perceptível e
impalpável (MARX, 2009, p. 92).

Segundo a teoria marxista (2009), na sociedade as mercadorias assumem


um caráter não apenas material, tão pouco, algo sem significado e sentido, elas se
tornam elementos que proporcionam um determinismo do indivíduo ao consumir e a
sua relação com a sociedade.
A mercadoria pode configurar e transpor posição de pertencimento social,
ou de diferenciação e valorização ante os demais indivíduos. Essa analogia da mesa
de madeira trazida na citação de O Capital (2009) ilustra claramente a relação de um
produto (algo material) transformado em mercadoria dotada de valor e poderes
“mágicos”, que funciona muito bem como um código social, em termos Marxistas
“hieróglifo social”.
Porém, para um produto ser transfigurado e promovido a mercadoria, tem-se
o trabalho humano para criá-lo e as determinações de valor. Não apenas para dar
forma a madeira, mas para dar sentido através das relações sociais. “O fetichismo é
inseparável da produção da mercadoria” (MARX, 2009, p. 94).
34

Dessa forma são as relações sociais que designam os significados às


mercadorias, e as mercadorias criam e projetam as relações sociais:

Assim, os homens não relacionam os seus produtos de trabalho


entre si como valores porque essas coisas vigorem para eles como
meros invólucros coisas de trabalho humano da mesma espécie. Ao
invés: na medida em que, na troca, igualam entre si os seus produtos
de diversa espécie como valores, eles igualam entre si os seus
diversos trabalhos como trabalho humano. Eles não o sabem, mas
fazem-no. Por isso, o valor não traz escrito na testa aquilo que é. O
valor, isso sim, transforma cada produto de trabalho num hieróglifo
social (MARX, 2009, p. 95).

Quando Marx (2009) decifra esse caráter de hieróglifo da mercadoria


também destaca a contrariedade quando trata da assimilação da mercadoria e sua
forma de valor de troca pelos indivíduos.
O valor de troca é um fator trazido a partir da fetichização da mercadoria e
da produção abstrata, diz respeito a equiparar as mercadorias com o trabalho
aplicado na produção das mesmas, embora determinados momentos a abstração
ignora o trabalho humano. Todavia essa comparação só é possível devido às
mercadorias serem produtos criados através do trabalho, ocorre então um
despendimento da força de trabalho em apenas um conceito de trabalho:

No objeto de consumo, o vestígio dessa produção deve se tornar


esquecido. Ele deve parecer como se não fosse mais de modo algum
fabricado, para não revelar que justamente aquele que troca não o
produziu, mas se apropria do trabalho contido nele. A autonomia tem
como origem o ocultamento do trabalho (BENJAMIN, 1997, p. 70).

Ao entrar em circulação, a mercadoria apresenta apenas as suas qualidades


significativas como algo natural às quais são atribuídas os valores, esquecendo
plenamente da relação na qual foi produzida.
Essa atribuição de valores acontece através das relações sociais dos
indivíduos, que conforme Marx (2009) descreve, converte o produto do trabalho em
hieróglifos sociais, e torna-se contraditória, pois os próprios indivíduos buscam
decifrar tais hieróglifos por intermédio do consumo da mercadoria, buscando
soluções subjetivas para suprir o desejo, ou de posicionamento social.
Atualmente, o fetiche da mercadoria e o fato dela ser um totem ou amuleto
simbólico e representativo de algo muito além do material, bem como a concepção
35

em relação ao trabalho abstrato, tornaram-se naturais e aceitáveis, que passaram a


ser percebidos como coisas socialmente necessárias para a construção do
indivíduo.
O principal eixo crítico da cultura de fetiche descrita por Marx (2009) na
sociedade capitalista, não estava relacionada com as relações de valores,
determinismo social, ou com a mercadoria em sua forma material ou abstrata, mas
sim com a questão de ser um sistema que ciclicamente alimenta o capitalismo
industrial, através da exploração do consumo, da alienação da consciência de
trabalho e pela aceitação do universo simbólico das mercadorias como algo natural.

4.1 PUBLICIDADE: ALIENAÇÃO OU DEMOCRATIZAÇÃO?


.
A publicidade possui uma participação influente e relevante na construção
do universo significativo das mercadorias. É dada como uma atividade menos
voltada à difusão de ideias e valores como no caso da propaganda política, e visa
explorar o universo prático dos desejos, além de ser mais indutiva (CARVALHO,
2003).
Embora em alguns textos o termo mais relacionado à publicidade seja
manipulação, faz necessário compreender as possibilidades que o universo da
publicidade otimiza:

O papel da publicidade é tão importante na sociedade atual,


ocidentalizada e industrializada, que ela pode ser considerada a mola
mestra das mudanças verificadas nas diversas esferas do
comportamento e da mentalidade dos usuários/receptores
(CARVALHO, 2003, p.10).

Sobre a moda no contexto da sociedade atual, a publicidade utiliza de


princípio da moda para agir, “a originalidade a qualquer preço, a mudança
permanente e o efêmero” e assim como a moda vive de “se fazer notar”. Uma das
estratégias da publicidade consiste em uma “corrida interminável para o inédito, o
efeito, o diferente, para captar a atenção e a memória dos consumidores”
(LIPOVETSKY, 2009, p. 215).
Ações publicitárias, conforme as propostas pela empresa Riachuelo,
conseguem criar um imaginário que junta o desejo, o prazer e satisfação através da
36

democratização de informação de moda. “Hoje a publicidade criativa solta-se, dá


prioridade a um imaginário quase puro, a sedução está livre para expandir-se por si
mesma [...]” (LIPOVETSKY, 2009, p. 215).
Dessa forma, a amplitude da publicidade permite criar e difundir uma
comunicação mais direcionada, ajustada às pretensões dos indivíduos, aproximando
suas estratégias de forma mais assertiva.
No que diz respeito ao desejo, Lipovetsky (2009), destaca que tal como a
moda, a publicidade é pautada na estética, no ambiente ideal, na sedução das
aparências, ampliando as possibilidades de prazer da vida cotidiana. A plataforma
sólida racional de estratégias existe e por cima dela “poetiza o produto e a marca”
(LIPOVETSKY, 2009, p. 218).
No contexto da Escola de Frankfurt 16 os filósofos e sociólogos alemães
Adorno e Horkheimer defendiam que a reprodução de produtos com relação cultural,
como no caso da moda, conduziria para uma inevitável perda de identidade e
autenticidade dos valores culturais originais da mercadoria, e que passariam por
diversas adequações para incluir-se em outros mercados e pólos de consumo
(entende-se aqui como o fenômeno da globalização), além de conduzir para uma
inevitável alienação do pensamento crítico (ADORNO, HORKHEIMER, 1947).
Estes pensadores que semelhante a Marx, descreveram o processo do
fetichismo da mercadoria cultural, apontam também a existência de caráter
subjetivo. Se o caráter objetivo descrevia sobre as relações de trabalho, valores de
troca e uso, a necessidade do desejo de consumo criada em detrimento do próprio
consumo e aceitado de forma passiva pelos indivíduos sociais, o caráter subjetivo
direciona a compreender sobre uma provável humanização dos objetos e
coisificação dos sujeitos (SILVA, 2010).
Na abordagem adorniana e horkheimeriana esse processo de coisificação
dos indivíduos refere-se a compreendê-los como simples ferramentas de produção,
baseados apenas nas relações subjetivas entre si e no decifrar dos hieróglifos da
mercadoria:

16
O Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, dirigido pelos filósofos Max Horkheimer e Theodor
Adorno, foi responsável pelo desenvolvimento da teoria crítica da sociedade, o que fundamentou o
famoso ensaio Teoria Crítica em que apropriam do termo indústria cultural, às industrias com
interesse na produção de massa de bens culturais. (RUDIGER, 1999.)
37

As mais íntimas reações das pessoas estão tão completamente


reificadas para elas próprias que a ideia de algo peculiar a elas só
perdura na mais extrema abstração (...) Eis aí o triunfo da
publicidade na Indústria Cultural, a mimese compulsiva dos
consumidores, pela qual se identificam às mercadorias que eles, ao
mesmo tempo, decifram muito bem (ADORNO; HORKHEIMER,
1947, p. 79).

Ainda sobre as abordagens da Dialética do Esclarecimento (1947) sobre o


fetichismo da mercadoria, os frankfurtianos, considerando a realidade da sociedade
do período da década de 1940, em meio a uma intensa da difusão focada na
produção com fins mercantis e não mais artísticos, destacando principalmente para
acessibilidade de consumo, que contribuiu para a perda da autenticidade da
mercadoria da indústria cultural:

Actualmente, as obras de arte são (...) inculcadas a um público


relutante a preços reduzidos. Elas tornaram-se tão acessíveis quanto
os parques públicos.Mas isso não significa que, ao perderem o
carácter de uma autêntica mercadoria, estariam preservadas na vida
de uma sociedade livre, mas, ao contrário, que agora caiu também a
última protecção contra sua degradação em bens culturais. A
eliminação do privilégio da cultura pela venda em liquidação dos
bens culturais não introduz as massas nas áreas de que eram antes
excluídas, mas serve, ao contrário, nas condições sociais existentes,
justamente para a decadência da cultura e para o progresso da
incoerência bárbara. Quem, no século dezenove ou no início do
século vinte, desembolsava uma certa quantia para ver uma peça
teatral ou para assistir a um concerto dispensava ao espectáculo
pelo menos tanto respeito quanto ao dinheiro gasto. (ADORNO;
HORKHEIMER, 1947, p. 75-76).

Por sua vez as colocações de Walter Benjamin (1994), enxergava através da


perspectiva, rigidamente crítica, dos demais frankfurtianos. Para esse autor, a
proposta de reprodução da mercadoria permitiria uma difusão e popularização do
consumo da mesma, sem limitar e restringir a determinadas esferas sociais, mas
tornando-as de certo modo, acessível a novos públicos. Benjamin levanta
discussões que analisa a ligação entre moda como elemento artístico, o que permite
a emancipação da mesma para se destacar no seu ritual de desejo e de celebração.
Segundo Walter Benjamin (1997) em seus escritos da obra inacabada “O
Trabalho das passagens”, a moda é descrita como um ritual, no qual o objeto de
adoração é a mercadoria, e o fetiche o seu fator essencial de manutenção:
38

Se a moda é, conforme Benjamin, um ritual que celebra o fetiche, ela


é, tal como os rituais, uma cerimônia de caráter simbólico. […] Isso
significa que não há ritual sem um desejo que o sustente, a moda
enquanto um ritual que celebra o fetiche é também sustentada por
um desejo.” (FERRARI, 2007, p.179).

O caráter principal da moda é ser a expressão dos elementos culturais,


econômicos, comportamentais e históricos de uma sociedade, a mesma sociedade
que a cria como produto sensível e como significado. A moda enquanto produto
artístico, desenvolvido no processo de concepção artística do estilista, também
possui caráter simbólico e deve ser entendida através dele.
Em um dos principais textos de Walter Benjamin (1995) “A obra de arte na
era de sua reprodutibilidade técnica”, é possível compreender que o quesito de uma
obra de arte ser reproduzida a priori permite gerar uma aproximação entre indivíduos
e obra, possibilitando alcançar espaços e públicos inicialmente inalcançáveis à sua
forma mais original, exclusiva e autêntica.
A necessidade de uma obra ser reproduzida, e criada sobre estrutura
simbólica garantirá a sua existência enquanto função ritual, pois:

Com a reprodutibilidade técnica, a obra de arte se emancipa, pela


primeira vez na história, de sua existência parasitária, destacando-se
do ritual: A obra de arte reproduzida é cada vez mais a reprodução
de uma obra de arte criada para ser reproduzida (BENJAMIN, 1955,
p. 171).

Sendo assim, assegurando a reprodutibilidade haverá manutenção das


relações sociais de significação. Porém, na reprodução pode haver a perca do que
Benjamin pontua como sendo a autenticidade, o seu “aqui e agora”, algo
instransponível, que diz respeito a quintessência, a parte mais pura “tudo o que foi
transmitido pela tradição, a partir de sua origem, desde sua duração material até o
seu testemunho histórico” (BENJAMIN, 1955, p. 170).
Considere a seguinte ilustração: uma mulher de tem um evento para ir, por
exemplo, um casamento, e procura um vestido que satisfaça sua necessidade
estética e aquisitiva. Talvez ela encontre algum modelo que goste, porém que esteja
muito além da sua pretensão financeira. Uma das alternativas, portanto, é encontrar
uma costureira que faça uma reprodução manual do modelo, com materiais, técnica
e acabamento similares. A personagem então terá de fato uma falsa realidade de
39

que estará usando um vestido de uma marca conceituada, porém, ela apenas se
apropriou do modelo para criar uma falsificação.
Embasando essa analogia com a teoria de Benjamin, a autenticidade da
peça é quebrada, pois envolve outro estilo de reprodução, que não possui relação
com o produto original, pois foi apenas inspirado em tal para se criar um falso
modelo. Para isso Benjamin descreve que:

A esfera da autenticidade, como um todo escapa à reprodutibilidade


técnica, e naturalmente não apenas à técnica. Enquanto o autêntico
preserva toda a sua autoridade com relação à reprodução manual,
em geral é considerada uma falsificação, o mesmo não ocorre no
que diz respeito à reprodução técnica, e isso por duas razões. Em
primeiro lugar, relativamente ao original, reprodução técnica tem
mais autonomia que a reprodução manual. [...] Em segundo lugar, a
reprodução técnica pode colocar a cópia do original em situações
impossíveis para o próprio original. Ela pode principalmente,
aproximar do indivíduo a obra [...] (BENJAMIN, 1994, p. 167-168).

Considerando o estudo de caso da parceria criativa e comercial entre


Riachuelo e Lethicia Bronstein, a possibilidade de um modelo criado pelo atelier ser
reproduzido segundo padrões do fast fashion, retira a necessidade de haver falsas
reproduções dos modelos, pois torna o produto mais acessível. Mantém as
características originais e informações de moda sobre estilo de criação da estilista,
contudo se adapta para entrar no segmento democrático reproduzido de maneira
técnica. Logo, o vestido ou a peça continuará tendo sua autenticidade mantida e
colocada em aproximação à realidade de outro perfil de público:

Fazer as coisas “ficarem mais próximas” é uma preocupação tão


apaixonada das massas modernas como sua tendência a superar o
caráter único de todos os fatos através da sua reprodutibilidade.
Cada dia fica mais irresistível a necessidade de possuir o objeto, de
tão perto quanto possível [...] na sua reprodução (BENJAMIN, 1994,
p. 170).

Assim sendo, no contexto de “Lethicias” e “Versaces” sendo multiplicadas e


acessíveis nas lojas Riachuelo, a moda – entendida em sua totalidade desde a sua
essência etimológica, como objeto fetiche, bem como pela definição de
benjaminiana de ser um ritual sustentado pelo desejo e que celebra o fetiche, e
ainda elemento de cunho artístico, segue a orientação de que a reprodutibilidade é
40

mais eficaz nesse sentido, do que manter-se no restrito espaço original, em ateliers
e modelos exclusivos sob medida.
Contudo, para que o processo da do ritual da aura seja “completos”, faz
necessário primeiramente ter a mercadoria acessível ao novo público, dando a
viabilidade de estar em locais e a preços mais acessíveis, e para celebrar o fetiche,
necessariamente existir e alimentar o desejo com relação à mercadoria, para que o
indivíduo se identifique na mercadoria e saiba traduzi-la para sua necessidade.
Se a satisfação do desejo representa o próprio fim, então a lógica da
sociedade do consumo é criar o desejo de continuar desejando 17 . Inventar a
necessidade de criar necessidade e ter ou de consumir: “A promessa de satisfação,
no entanto, só permanecerá sedutora enquanto o desejo continuar irrealizado; (...) A
sociedade do consumo consegue tornar permanente a insatisfação.” (BAUMAN,
2009, p. 105). E faz isso satisfazendo o desejo de forma que inevitavelmente
provoque novos desejos e necessidades.
Ainda de acordo com as abordagens de Bauman, ele ressalta que “Todos os
seres humanos são e sempre foram consumidores” (BAUMAN, 2009, p.108), e como
já pontuado, as relações de consumo estão interligadas com as relações pessoais e
sociais.
Para o sociólogo, o mercado de consumo detém a função de estabelecer e
cortar relações, podendo aproximar ou separar os indivíduos, alterando e influindo
nas relações de todos os âmbitos. Com isso entende-se que o processo de
fetichização das mercadorias e da construção da aura das marcas, existem em
detrimento da sociedade de consumo.
Em referência a um contexto socioeconômico e histórico totalmente
diferente, onde no século XIX a concepção de uma sociedade capitalista industrial
estava em formação, a proximidade com os produtores e comerciantes, grande parte
da população residia nas áreas rurais, os níveis de instrução eram baixos, existia
demanda do trabalho artesanal nos ateliês e o comércio ocorria principalmente em
feiras públicas, e o resultado pode-se destacar abaixo:

As feiras e mercados eram, em sua maioria, ao ar livre, nas ruas, e


fluíam em sentidos horizontais. As lojas de departamentos

17
Citação de Zizek no documentário O guia pervertido da ideologia (2006).
41

verticalizaram as operações de compra. […] Nas feiras havia a


possibilidade da troca de objetos e mercadorias e, nelas, coisas
como habilidade de negociação, necessidade, escassez,
contingências, menor ou maior grau de dificuldade do acesso ou
relacionamento entre pessoas, agiam num processo
multidimensional. […] Os comerciantes foram substituídos por
funcionários, que como agentes de regras e ordens, transformam
poderes estabelecidos ao fazerem desaparecer as relações
interpessoais que influenciavam o ato da troca. [...] As feiras e
mercados eram centros de referência na vida comunitária dos
vilarejos e a loja oitocentista se apropria dessas características
através da humanização estilística dos espaços, que remetiam a
casa, à vila ou ao café. Ao englobar tais signos se transforma em
mediadora de um leque de possibilidades, agenciando gostos e
estilos para indivíduos, grupos, categorias e famílias (ROCHA, 2008,
p. 4).

Nesse artigo do autor Rocha (2008), compreende-se a relevância crucial da


transição da ideia de consumo e a relação indivíduo e mercadoria através do
surgimento de novas organizações comerciais de troca, no caso as lojas de
departamento no século XIX, para a sociedade capitalista industrial.
Compreende-se naquela realidade socioeconômica as trocas mantinham
forte o caráter humanista, a proximidade entre o trabalho e a troca de produtos, além
de estarem próximos com a necessidade de obter tais produtos, não ainda com o
desejo. Por conseguinte a abordagem de Marx é explicada em associação a todo o
contexto relacionado com a análise executada.
É lógico observar que os indivíduos ainda não sabiam compreender a
mercadoria como elemento representativo de si mesmos, bem como a própria
participação crucial no processo de produção e agentes intermediários do sistema
capitalista. Precisavam buscar meios de se adaptarem ao ambiente urbano e
industrial, de realizar suas ações de troca e construir outra estrutura para as
relações sociais.
Na Europa do século XIX, o surgimento das lojas foram responsáveis por
“uma transição entre passado e futuro como lugar onde sonhos e desejos se faziam
tangíveis no encontro físico entre bens de consumo e atores sociais.” (ROCHA,
2008, p. 2).
Assim, a forma a qual a construção da ideia de desejo relacionado ao
consumo é vista hoje, teve sua emergência nesse período e contexto citados, porém
as mudanças ocorridas através da participação da publicidade, meios e estratégias
42

de comunicação, novas mídias, e novas estruturações de relações sociais criaram-


na tal como existe atualmente, na sociedade do consumo.
43

5 DO CONCEITO À PRÁTICA: LETHICIA PARA RIACHUELO POR


LETHICIA BRONSTEIN

Formada em moda, com especialização em Londres e um vasto portfólio em


marcas nacionais, Lethicia Bronstein Pompeu é uma das referências quando
celebridades e socialites pensam em um look de festa exclusivo. Já criou peças
exclusivas para novelas, vestidos de noiva para famosas, e possui uma cartela fiel
de clientes renomadas e exigentes.
A entrevista com a estilista e designer carioca Lethicia Bronstein foi realizada
através de questionário, cujas questões foram dividas entre compreender sobre o
público, a percepção entre o fast fashion e a moda de luxo, e por fim sobre o
desenvolvimento do produto. Para o desenvolvimento da análise as respostas foram
transcritas e contextualizadas juntamente com o texto, mas o questionário pode ser
conferido completo em anexo.
O resultado da pesquisa foi obtido no período após o lançamento oficial da
coleção, o questionário foi enviado por e-mail à assessora da estilista, Priscila
Capelaro, que foi muito solícita e vez a intermediação com a estilista que também foi
muito receptiva às questões apresentadas e pontuou todas de forma muito completa
e objetiva.
O lançamento ocorreu em 22 de outubro 201518, com desfile durante a São
Paulo Fashion Week, o principal evento de moda nacional, o mais relevante da
América Latina e de grande reconhecimento internacional.

18
Disponível em http://www.riachuelo.com.br/blog/lethicia-bronstein/lethicia-na-midia/5731. Acesso
em 22 nov. 2015.
44

Figura 7: Imagens do Desfile Lethicia para Riachuelo no São Paulo Fashion Week 2015.

Diversos sites de moda, blogs e mídias sociais fizeram cobertura do evento, e


já vinham acompanhando sobre a parceria das marcas desde que anunciaram a
coleção Lethicia para Riachuelo, a qual foi divulgada a partir de uma criação da
Lethicia que a modelo Carol Ribeiro usou durante a cobertura do Oscar 2015.

Figura 8: Carol Ribeiro com vestido Lethicia para Riachuelo.


45

O desfile no SPFW contou com grande presença de olimpianos, entre


blogueiras, formadores de opinião do segmento de moda, artistas e celebridades
convidados como expectadores participantes 19 . Participantes, pois, algumas das
convidadas, clientes do Atelier Lethicia Bronstein já compareceram no desfile
usando algumas das peças da coleção, mesmo antes da comercialização, cujas
peças foram liberadas para venda apenas no dia posterior ao desfile, em lojas
selecionadas da rede fast fashion Riachuelo.
Segundo a estilista, o processo de desenvolvimento da coleção teve um
período de dois anos. Processo esse que contou com reuniões entre a estilista
juntamente com a equipe de desenvolvimento da Riachuelo, elaboração de croquis,
aprovação das peças, e que foram da fábrica da rede em Guararapes, até na China
onde a empresa também mantém um centro de produção.

Figura 9: Campanha de divulgação da coleção.

A designer carioca destaca que não precisou alterar o estilo para o


desenvolvimento criativo de sua versão fast fashion, destaca ainda que:
19
Disponível em http://www.riachuelo.com.br/blog/lethicia-bronstein/lethicia-para-riachuelo-quem-ja-
usou/5741. Acesso em 22 nov. 2015.
46

O que a Riachuelo procurava era o estilo Lethicia Bronstein nas suas


peças. Quanto aos produtos, os vestidos clássicos estavam muito
presentes, mas também aproveitei para fazer peças que amo, mas
que não fazem parte do meu trabalho, uma vez que sou dedicada a
moda festa.

Compreende-se que houve mais uma adequação incluindo outros perfis de


produtos do que reduzindo o que a estilista cria para o próprio atelier. Para a
concepção da coleção, no que refere-se ao estilo, ressalta que principalmente o que
prezou manter foi justamente o estilo Lethicia Bronstein, característico pelo trabalho
diferenciado que cria com rendas, uma das principais o qual inclusive ela considera
sendo o próprio “DNA criativo”.

Figura 10: Croquis das peças da coleção Lethicia para Riachuelo

O que de certo modo interferiu, mas ainda assim a estilista Lethicia pontua
como sendo um aprendizado, foi a novidade de trabalhar em um segmento ainda
desconhecido, pois embora já tenha trabalhado em outras marcas foi a primeira vez
que acompanhou o lançamento completo de uma coleção, o que lhe proporcionou
uma troca de experiências as quais diz serem relevantes até mesmo para serem
aplicadas no Atelier.
Ao ser questionada sobre a repercussão da parceria relacionada ao
reconhecimento da marca, a estilista Lethicia pontuou de forma confiante que “com a
47

coleção Lethicia para Riachuelo com certeza levei meu nome para todas as regiões
do Brasil. E isso proporciona um crescimento muito grande para a minha marca”.
Quanto à percepção dos públicos a estilista pontua que:

As clientes que vem ao Atelier buscam algo mais exclusivo em um


ambiente mais intimista, com um atendimento especializado e
dedicado. A Coleção Lethicia para Riachuelo foi desenhada com
base no meu DNA, que são as rendas, para um público que admira o
meu trabalho e me acompanha nas redes sociais, mas que não têm
poder aquisitivo para adquirir um modelo exclusivo.

Tanto do Atelier quanto do fast fashion, a designer explica que há sim a


diferenciação de interesses, mas que a coleção Lethicia para Riachuelo cria
justamente a viabilidade desse outro indivíduo, cliente do segmento de fast fashion,
obter um produto diferenciado.

Figura 11: Vitrine Loja Riachuelo.

Embora haja de fato a adequação de matéria (tecidos, aviamentos e mão de


obra) diferenciada para a produção e distribuição em larga escala, há também a
preocupação em ter similaridade com o original, visando garantir custo reduzido,
mas que esteja dentro do perfil de qualidade que o público exige, e nesse caso em
específico umas das coisas que a Lethicia prezou em garantir, considerando que é o
nome e a credibilidade da marca que estavam em pauta.
48

Pois para ela o público do fast fashion é o que objetiva estar atualizado nas
tendências de moda, mas se uma forma aquisitiva acessível. Pretendem gastar
menos, na maioria das vezes por não ter condições econômicas, mas que não
abrem mão da possibilidade de se inserir socialmente no universo da moda. E o
objetivo do fast fashion é tornar isso possível através da democratização do
consumo.
Para a designer também existiu a preocupação em oferecer a mesma aura da
exclusividade, cuja clientes do Atelier usufruem ao adquirir uma peça sob medida.
Para isso buscou acompanhar e participar do desenvolvimento da coleção de perto,
tendo controle e prezando pelo resultado final, e também oferecendo um pouco da
exclusividade do Atelier na loja varejista.
No blog da marca Riachuelo20 foi divulgado que no primeiro dia de vendas da
coleção, algumas lojas da rede fast fashion e alguns clientes puderam usufruir de
um pouco mais da exclusividade, pois a estilista juntamente com uma equipe de
modelagem fizeram alguns modelos sob medida da coleção Lethicia para Riachuelo
para as clientes que optaram pagar pela exclusividade. O que custou mais do que as
peças da coleção normal, mas ainda assim valores abaixo dos que são praticados
no Atelier.
Prosseguindo sobre a percepção e recepção do produto de moda, embora a
entrevista seja a partir do processo de produção e não do consumo do produto, mas
observo como relevante complemento abordar, considerando a grande repercussão
obtida com o lançamento da coleção, e a aceitação do consumo inclusive por
olimpianos.
Por ser um assunto muito recente, cujos principais acontecimentos ocorreram
durante o desenvolvimento desse trabalho, a principal e mais acessível ferramenta
de pesquisa foi a internet, por acompanhar e atualizar as informações sobre a
coleção e sobre o lançamento periodicamente.
Através dos comentários e matérias divulgadas sobre a coleção em sites de
notícias, blogs de moda e mídias sociais, após o lançamento, a forma que a coleção
foi recebida pelo público denota uma aceitação positiva com relação a aproximação
principalmente com o conceito da marca e do estilo criativo da Lethicia Bronstein.
Uma vez que o objetivo da coleção e uma das preocupações da estilista era criar

20
Disponível em http://www.riachuelo.com.br/blog/lethicia-bronstein/lethicia-sob-medida/5730. Acesso
23 nov. 2015.
49

essa possibilidade de aproximar o público do fast fashion com o universo do


exclusivo, e de forma consciente viabilizar o sentimento de experimentar participar
mesmo que por uma peça do sentimento, ou em termos benjaminianos da aura do
luxo.
A parceria Lethicia para Riachuelo concretizou a transição produto de luxo
para fast fashion, cujas expectativas eram de compreender como o conceito seria
ajustado para esse novo mercado, compreender que a transição de produto para um
outro nicho comercial e de consumo ocorre seguindo adequações e restrições, mas
que respeitam e prezam pela autenticidade. E nisso manter a aura presente no
nome Lethicia Bronstein, ao desejo de consumir um produto exclusivo.
Tendo em vista que mesmo a quem não conhecia o perfil criativo ou a marca
Lethicia Bronstein, teve a percepção da aura, cuja expectativa e o desejo foram
construídos juntamente com a imagem do produto, a partir da publicidade, e das
referências dos olimpianos que participaram na “exaltação” do ritual de lançamento,
valorizando ainda mais a mercadoria.
Esses elementos que formam a base de “sutilezas” que dão forma ao desejo
e a fetichização da mercadoria. Mais especificamente ao reconhecimento de um
vestido etiquetado com Lethicia para Riachuelo como uma peça que possui um
pouco do mistério e encanto do universo dispendioso do luxo, visto com uma
possibilidade de ter um pouco dessa aura por um valor aquisitivo mais acessível, e
por um valor de reconhecimento social alcançável.
50

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo do trabalho foi possível definir uma linha de compreensão sobre


moda enquanto símbolo social e de como a transição e o intercâmbio de segmentos
do luxo ao popular têm ocorrido na sociedade do consumo.
Primeiramente a construção da moda enquanto elemento simbólico social
permeia pelo seu contexto histórico, está diretamente relacionada com contexto
social e econômico no qual se encontra.
Assim, os três segmentos da moda: Alta Costura; prêt-à-porter e o fast
fashion, os quais se relacionam com o caso estudado, foram abordados para
compreender o conceito e o diferencial existente entre eles, considerando o período
e contexto social em que surgiram. Com isso foi possível analisar que a Alta Costura
pertenceu a um período em que exigia-se criar uma elitização da moda, e
juntamente dando origem ao status e necessidade de diferenciação social, bem
como ao sentimento da exclusividade.
Com o advento principalmente das comunicações de massa que aumentaram
a demanda do consumo, onde a partir da divulgação ampliou-se o desejo pelo
consumo de tal produto elitizado, foi na reprodução em larga escala que
encontraram a possibilidade em ampliar a oferta e oferecer um produto acessíveis a
um público maior, porém, dando mais uma função à moda, no caso remeter ao luxo
no qual existia o desejo, contudo, de forma mais acessível para o novo público. A
primeira construção de uma possível democratização do consumo de moda.
Já no momento em que o fast fashion surge, em meio a uma sociedade do
consumo que já exigia uma produção também em larga escala, porém com um
período de circulação de mercado específico, e a preços mais acessível para um
público que buscava uma diferenciação no consumo.
E nesse momento, acredito que a necessidade da produção de reinventar
tornou-se imprescindível para garantir a manutenção do desejo pelo novo e também
a possibilidade de oferecer o novo ao consumo de massa. Logo, parcerias criativas
entre redes de fast fashion e marcas renomadas, são possibilidades do público
também reinventar seus significados sociais.
Conforme questionado no início deste trabalho, é justamente nesse quesito
que acredito que as marcas ou estilistas renomados do mercado de luxo em
momento algum perdem a identidade ou a aura existente ao ser direcionado para o
51

popular e ao consumo de massa. Ao contrário, com isso permite-se reinventar em


novos significados e relações sociais, garantindo a aura do seu valor representativo.
Para isso o processo de democratização da moda amplia o olhar para essas novas
possibilidades para outros públicos.
O fato é que a viabilização da moda na sociedade atual acompanha não
somente o quesito de otimizar o acesso à ela, mas também a consciência da
sociedade do consumo a qual produtos e relações possuem um tempo específico, e
relativamente curto, de duração.
Não podemos esquecer que existe um período de sobrevivência do
significado de consumir determinado produto ou marca. Por esse motivo que trata-se
de uma coleção específica. Em breve virão outras parcerias da rede Riachuelo com
outras estilistas e marcas com suas auras, criando novos significados e construindo
novos desejos.
Observar a lógica da transição através do viés de produção, acredito ser
como buscar na essência e no cume de desenvolvimento, pois trata-se de entender
as estratégias, técnicas e conceitos aplicados na prática.
No caso Lethicia para Riachuelo, a relação que a própria estilista teve com
todo o desenvolvimento da coleção que contribui para que não fossem criadas
apenas uma série de roupas com etiqueta do atelier Lethicia Bronstein, mas sim
peças que carregassem um pouco do seu "DNA" e da aura do luxo e do exclusivo
presentes no estilo criativo.
Embora a análise tenha sido a partir do viés criativo, o acesso às inúmeras
matérias divulgadas na internet, blogs e mídias sociais que mostravam a aceitação e
percepção do público com relação a coleção, indicam que, embora seja uma coleção
destinada ao segmento do popular fast fashion do consumo de massa, até mesmo
olimpianos foram alcançados pela aura criada, mostrando que tanto no perfil
exclusivo quanto na versão popular, o sentimento de autenticidade da marca esteve
presente.
Contudo, uma proposta interessante ainda seria buscar compreender no
público do fast fashion as relações de consumo e a forma que veem e criam a aura
das marcas de luxo.
Com o desenvolvimento desse trabalho pude aprender principalmente que
mudar o percurso de uma situação ou elemento pode criar e otimizar grandes
possibilidades. Nisso me refiro à mercadoria, e neste caso a moda de luxo, poder se
52

significar também no âmbito popular, viabilizando em magazines comerciais


populares a possibilidade de alcançar tais significados, antes restritos à ateliers e a
altos valores aquisitivos.
Portanto, acredito que a produção da moda entendeu, e se tem feito entender
que o público da massa também possui desejo pelo autêntico e pelo novo e a partir
dessas transições de mercado, e que socialmente e economicamente são muito
importantes, isso felizmente torna-se possível.
53

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O GUIA pervertido da Ideologia. Direção: Sofhie Fiennes. Irlanda. Documentário


(134min.) 2012.
55

8 ANEXOS

ANEXO A
56

ANEXO B

Questionário – entrevista Lethicia Bronstein

 PUBLICO

Você acredita que essa parceria com uma empresa fastfashion mudou de
alguma forma a concepção que o seu público atual possui com relação ao seu
estilo criativo e ao valor percebido das criações do Atelier Lethicia Bronstein?
- Acredito que não, pois são 2 públicos bem diferentes. As clientes que vem ao
Atelier buscam algo mais exclusivo em um ambiente mais intimista, com um
atendimento especializado e dedicado. A Coleção Lethicia para Riachuelo foi
desenhada com base no meu DNA, que são as rendas, para um público que admira
o meu trabalho e me acompanha nas redes sociais, mas que não tem poder
aquisitivo para adquirir um modelo exclusivo.

Como você descreve o público de fastfashion?

- Com a facilidade de acesso aos meios de comunicação através da Internet, como


as redes sociais, a moda ficou muito mais flexível e as mudanças muito mais
rápidas. Hoje, todo mundo quer ter a roupa da moda, mas muitas vezes não tem o
poder aquisitivo para comprar. O público do fastfashion é exatamente esse. São
pessoas que querem estar na moda, mas gastando menos. O conceito da Riachuelo
é exatamente esse, a democratização da moda no Brasil.

Você acredita que os clientes do fastfashion que adquiram alguma peça da


coleção Lethicia para Riachuelo irão usufruir do mesmo sentimento da
exclusividade de usar Atelier Lethicia Bronstein?

- Com certeza! Sou muito preocupada com as peças que levam meu nome. No
Atelier tudo é feito internamente, desde o corte até o bordado, exatamente para que
eu tenha esse controle total dos meus produtos. Desde as primeiras conversas com
a Riachuelo, eu mostrei essa minha preocupação e eles entenderam. Tanto que
57

aprovei todas as peças e acompanhei a produção tanto na China quanto no Brasil,


na fábrica de Guararapes.

Como você imagina que o seu público exclusivo recebeu a coleção Lethicia
para Riachuelo? Acredita que isso poderia de alguma maneira interferir na
relação de reconhecimento da marca?

- No dia do lançamento da coleção muitas das minhas clientes foram até a


Riachuelo me prestigiar e todas saíram com muitas sacolas de compras! Isso
demonstra que meu público entendeu o conceito da minha coleção para a
Riachuelo, onde eu tenho peças que podem ser usadas em todos os momentos, e
no Atelier elas encontram aquelas peças exclusivas para uma festa igualmente
exclusiva.

 FAST FASHION X LUXO

Como você percebe o processo de produção e distribuição fastfashion? Quais


as vantagens ou desvantagens desse segmento?

- Todos os meus produtos são feitos internamente, desde a modelagem até o


bordado. Já o fastfashion é feito em linha de produção, muitas vezes em fábricas
dedicadas a alguma parte do processo, para aproveitar o máximo a especialidade e
baratear o s custos. Acho que, para a proposta do fastfashion, é válido utilizar essa
forma de produção. Eu mesma quando fui à fábrica de Guararapes fiquei encantada
com a linha de produção da Riachuelo e trouxe muitas ideias para utilizar no Atelier.
Em relação à distribuição, eu estou admirada até agora! Eles possuem uma logística
que segue o que o marketing determina de peças por região até mesmo por ponto
de venda. E todas as peças estão no local na data programada. No caso específico
da minha coleção, tivemos que readequar a distribuição de algumas peças que
tiveram estoque esgotado. E no dia seguinte, quando a loja abriu, ela já possuía
todo o estoque novo.
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Como foi para você participar desse processo de criação envolvendo outro
público, outro canal de venda, processo de produção, etc.

- Tudo foi novidade e todo dia eu ficava mais maravilhada com o que eu conhecia.
Trabalhei em outras marcas antes de criar o Atelier Lethicia, mas nunca tinha
acompanhado de perto todos os passos para o lançamento de uma coleção. Trouxe
muita coisa do aprendizado para o meu dia a dia e tenho certeza que hoje
trabalhamos melhor.

No programa “A Estilista” é mostrado como você busca conhecer o perfil,


histórico e preferências das clientes antes de desenvolver a peça, muitas delas
inclusive já são conhecidas, o que contribui para tornar a criação mais
assertiva para um sentido e um significado ao utilizar alguma peça. Como esse
processo de reconhecimento foi adaptado na criação Fast Fashion?

- Para a coleção fastfashion eu preferi utilizar o meu DNA, que são as rendas, e é o
que todo mundo espera... Além disso, criei também peças que não fazem parte do
trabalho que faço no Atelier Lethicia, como o jeans, alfaiataria e peças para o dia a
dia.

Quão relevante socialmente você identifica as parcerias criadas pela Riachuelo


e demais marcas e estilistas renomados? Considerando relevância tanto para
a marca quanto para o público.

- As parcerias entre estilistas renomados com as marcas de fastfashion aproximam o


grande público do dia a dia das redes sociais. É tão importante para ambos que não
conseguiria mensurar sua relevância!

O lançamento da coleção Lethicia foi feito a partir da criação para a top Carol
Ribeiro no redcarpet do Oscar 2015; De que maneira esse “intercâmbio” de
posições em que o Fast Fashion chega ao redcarpet e a Costura de luxo no
Fast Fashion tornam-se importante para o universo da moda, na sua
concepção?
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- A minha parceria com a Riachuelo começou há 2 anos atrás e o vestido que a top
Carol Ribeiro usou no Oscar fez parte da imagem que a marca quis comunicar para
suas clientes. Assim, mais uma vez a Riachuelo mostrou que a moda é acessível à
todos. Essa quebra de paradigma é importante tanto para o mercado de luxo, que
tem sua moda reconhecida por todos, como para o fastfashion que entra na moda!
Como foi participar do desfile do SPFW de 2015 com a parceira da Riachuelo?
- Foi uma experiência incrível para os dois lados. Foi o primeiro desfile da Riachuelo
no calendário oficial do Fashion Week e também uma experiência nova para mim.
Então, juntos criamos desde a concepção do desfile, incluindo local, a aprovação
das modelos, os looks de passarela, até a música e o desfile em si!

 PRODUTO

Qual o período de idealização da coleção Lethicia para Riachuelo?

- Desde a assinatura do contrato até o lançamento na loja foram 2 anos de muito


trabalho.

Como se constituiu esse processo?

- Tivemos muitas reuniões para definição de coleção, elaboração de croquis,


aprovação em conjunto com a Riachuelo, elaboração e aprovação das peças pilotos,
viagem para China para aprovação das peças que seriam elaboradas lá, visita à
fábrica de Guararapes, organização do desfile...

Quanto tempo durou desse o convite da Riachuelo até a apresentação da


coleção?

- Foram tantas conversas até assinatura do contrato que nem sei quanto tempo
ficamos negociando... Mas acredito que foi em torno de 6 meses de negociação até
a assinatura do contrato.

De que maneira você percebe a inserção desse produto no Mercado? Ele


proporciona que sua marca chega mais adiante?
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- Com a coleção Lethicia para Riachuelo com certeza levei meu nome para todas as
regiões do Brasil. E isso me proporciona um crescimento muito grande para a minha
marca.

Considerando a coleção do ano anterior, Versace para Riachuelo, um dos


destaques das peças foi a apropriação de algumas estampas originais criadas
por Gianni Versace em 1992. Quais detalhes ou elementos que você apropriou
do estilo original das peças exclusivas do Atelier para essa coleção?

- Com certeza foram as rendas e o patchwork que faço com elas, mesclando
diversas renda numa só peça.

Foi necessário mudar o seu estilo e produto para a concepção criativa da


coleção Lethicia para Riachuelo?

- De forma alguma! O que a Riachuelo procurava era o estilo Lethicia Bronstein nas
suas peças. Quanto aos produtos, os vestidos clássicos estavam muito presentes,
mas também aproveitei para fazer peças que amo, mas que não fazem parte do
meu trabalho, uma vez que sou dedicada a moda festa.

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