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Maria Francisca Sales Vignoli

A FAMÍLIA COMO CAMPO DE ATUAÇÃO E INVESTIGAÇÃO DO


SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO


PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS
EM SERVIÇO SOCIAL

São Paulo/SP
2007
Maria Francisca Sales Vignoli

A FAMÍLIA COMO CAMPO DE ATUAÇÃO E INVESTIGAÇÃO DO


SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da


Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de MESTRE
em Serviço Social, sob a orientação da Professora
Doutora Maria Lúcia Silva Barroco.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO


PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS
EM SERVIÇO SOCIAL

São Paulo/SP
2007
BANCA EXAMINADORA:

_____________________________________

_____________________________________

_____________________________________
DEDICO

Aos meus pais Marinete e Armindo,


grandes incentivadores do meu
crescimento intelectual, vida, apoio e
estímulo incondicional.

Ao Paulinho, companheiro de todas


as horas, que me completa com amor,
respeito e carinho.

Aos meus filhos Isa e Flávio, fontes de


alegrias, bênçãos da minha vida.

A minha irmã Marta, meu cunhado


Luis e minhas sobrinhas Nathália e
Renata pelo apoio constante.
AGRADECIMENTOS

Agradeço a todas as pessoas que participaram neste processo, com estímulos


afetivos e intelectuais.
Aos meus pais, marido, filhos, irmã, cunhado, sobrinhas, parentes e amigos,
pela paciência e acolhimento.
À minha orientadora, Professora Doutora Maria Lúcia Silva Barroco, grande
mestra, pela sabedoria e compromisso.
Aos companheiros de trabalho, primeiramente na Prefeitura Municipal de
Birigüi e atualmente na Prefeitura Municipal de Araçatuba, pela amizade destes
anos, ensinando-me tanto no convívio diário.
Aos colegas docentes da UNIJALES, bem como aos alunos e funcionários
pelo incentivo, aprendizado e paciência.
Aos queridos professores e amigos do mestrado na PUC/SP que me
privilegiaram com seu conhecimento e amizade.
Aos membros da banca de qualificação, Professora Doutora Maria Amália
Faller Vitale e Professora Doutora Maria Lucia Martinelli, pelas substantivas críticas
e sugestões.
Ao CAPES, órgão que, por intermédio da PUC/SP, concedeu-me uma bolsa
de estudo fundamental para a realização desta pesquisa.
RESUMO

A presente dissertação trata das transformações ocorridas com as famílias,


contempladas na produção teórica do serviço social brasileiro. É uma pesquisa
histórica bibliográfica, realizada através do levantamento de alguns clássicos que
abordam o assunto, mas, principalmente das Revistas Serviço Social & Sociedade
com o título sobre família. Objetivamos conhecer as contribuições teóricas dos
assistentes sociais brasileiros sobre a temática, visando a ampliar nosso
conhecimento como profissional que atua diretamente com esses usuários. A
intenção deste trabalho foi seguramente pontuar indagações que foram sendo
alinhavadas no processo de estudo e na proximidade com essa demanda. Sentimos
a necessidade de buscar uma maior compreensão da família, que é uma instituição
social, problematizando-a em sua complexidade e contradições. Compreendemos
que temos que pensá-la em suas configurações atuais e as responsabilidades que
lhe são atribuídas. Para entender o que vem ocorrendo na contemporaneidade,
iniciamos nossa pesquisa retornando à antiguidade para conhecer concepções de
famílias em alguns países e principalmente as transformações ocorridas com elas no
Brasil. Estudamos as políticas sociais brasileiras e alguns marcos históricos das
gestões de Getúlio Vargas a Luis Inácio Lula da Silva (1930 a 2006). Preocupamo-
nos em pensar a política social voltada à família, as relações com o Estado nas
últimas décadas, priorizando a questão social, o serviço social e a atuação dos
assistentes sociais, junto a essa demanda. Este estudo possibilitou ampliar nosso
conhecimento sobre a temática, aprofundando assim o saber para enfrentamento de
desafios que demandam a intervenção profissional.

Palavras-chave: famílias, transformações, responsabilidades, estudo, intervenção.


ABSTRACT

The present dissertation concerns about the current transformation of families


regarded in the theoretical production of the brazilian social service. It is about a
historical bibliographer research, accomplisher through the survey of some classic
references which approach this subject but mainly through the renowned social
service & Society magazines which have brought the word family as title. We have
aimed at the acquaintance of theoretical contributions of the brazilian social
assistants about the thematic above mentioned and aimed at the widening of our
own knowledge as professionals who directly act on those mentioned users, as well.
This essay has intended to point out the inquiries that have been outlined during the
procedure of the study as well as requires closed to the mainly issue. We have been
in need to pursuit an extended understanding of family, which certainly is a social
institution, questioning its complexity and its contradictions. It has been realized that
family has to be regarded in all of its present configurations and in its imputed
responsibilities as well. In order to understand what have been happening in a
contemporaneous way, this research started from the antiquity with goal of getting to
know the conception of those families in some countries and, mainly, to understand
the transformations that took place in those families from Brazil. It has been also
studied the brazilian social politics and some historical facts of the government lead
by Getúlio Vargas and Luis Inácio Lula da Silva (From 1930 to 2006). It has been
concerned, as well, the social politics turned on families, their relations with the state
in the past few decades, giving priority to the social claims, to the social service and
to the social assistants actuation in regard to the mentioned requirements. This study
has helped us in the widening of our knowledge about this thematic, which has
allowed us to face the challenges that require professional intervention.

Key words: families, transformations, responsibilities, studies, intervention.


7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS 12

1.1 – CONCEPÇÕES DE FAMÍLIAS, EM ALGUNS PAÍSES, NA 14


ANTIGÜIDADE
1.2 – AS FAMÍLIAS NO BRASIL 24

1.3 – AS POLÍTICAS SOCIAIS: ORIGEM E FUNÇÃO 29

1.4 – ALGUNS MARCOS HISTÓRICOS DAS POLITICAS 31


SOCIAIS NAS GESTÕES DE VARGAS A LULA (1930 A 2006)

2 – POLÍTICA SOCIAL VOLTADA A FAMÍLIA, NA 49


CONTEMPORANEIDADE
2.1 – RELAÇÕES ENTRE FAMÍLIA E ESTADO, NAS ÚLTIMAS 53
DÉCADAS
2.2 – QUESTÃO SOCIAL, IMPLANTAÇÃO DO SERVIÇO 59
SOCIAL E ATUAÇÃO COM FAMÍLIAS

3 – ANÁLISE DA REVISTA SERVIÇO SOCIAL & SOCIEDADE 66

3.1 – BLOCO UM: A DÉCADA DE OITENTA 76

3.1.1 – AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A FAMÍLIA 76

3.1.2 – GÊNERO, VIOLÊNCIA E FAMÍLIA 78


8

3.2 – BLOCO DOIS: A DÉCADA DE NOVENTA E O NOVO 79


SÉCULO
3.2.1 – TRABALHO E FAMÍLIA 80

3.2.2 – GÊNERO, TRABALHO E POLÍTICAS PÚBLICAS 81

3.2.3 – GÊNERO, VIOLÊNCIA E FAMÍLIA 83

3.2.4 – A FAMÍLIA E A CRIANÇA E O ADOLESCENTE 83

3.2.5 – A FAMÍLIA E O PORTADOR DE TRANSTORNO 85


MENTAL
3.2.6 – AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A FAMÍLIA 85

3.3 – AS CONCEPÇÕES SOBRE A FAMÍLIA 89

CONCLUSÃO 91

BIBLIOGRAFIA 94
9

INTRODUÇÃO

As inquietações de pesquisadora, após ter concluído três especializações em


recursos humanos, serviço social e violência doméstica contra crianças e
adolescentes; de mestranda no programa de estudos pós-graduados em serviço
social da PUC/SP e da experiência adquirida como assistente social, primeiramente
atuando em empresa e, nos últimos anos, em prefeitura municipal, atendendo
cotidianamente famílias, foram sem dúvida os elementos propulsores para a escolha
do tema.

Assim, a intenção de abordar o assunto é seguramente pontuar indagações


que foram sendo alinhavadas no processo de estudo e na proximidade com essa
demanda.

Pretendemos pensar a família em suas configurações atuais e as


responsabilidades que lhe atribuímos.

Percebemos que a maioria dos profissionais com quem convivemos, tanto


assistentes sociais como de outras áreas, esperam das famílias atendidas que elas
produzam cuidados, proteção, aprendizado dos afetos, construção de identidade e
vínculos relacionais de pertencimento, capazes de promover o convívio saudável de
seus membros, sem parar para pensar se elas estão preparadas para assumir esse
papel.

O fato de participarmos, no nosso cotidiano, de vivências em família, durante


a nossa vida, não significa que conhecemos todos os instrumentos necessários para
atuarmos com elas. Há necessidade de um maior aprofundamento teórico-
metodológico do tema, para se intervir adequadamente.

Necessitamos buscar uma maior compreensão da família, que é uma


instituição social, problematizando-a em sua complexidade e contradições, pois esse
é um requisito para uma prática profissional comprometida com os nossos usuários.

No entanto, ao estudar o assunto nos deparamos com um problema: o tema


família é pouco desenvolvido no serviço social, seja nos debates da categoria, seja
na produção teórica. Pareceu-nos importante investigar essa produção para saber
10

se ela tem acompanhado as mudanças sociais que interferem na configuração das


famílias.

Nesse sentido, entendemos ser de suma importância estar pesquisando e


registrando o que outros estudiosos, principalmente os assistentes sociais, têm a
contribuir sobre a temática, sintetizando essas informações teoricamente e também
expondo nossas concepções como profissional que atua cotidianamente com essa
demanda.

Temos clareza de que o profissional, para atuar com a população, deve


conhecer e compreender a realidade, estudando e decifrando: o movimento de
estrutura e conjuntura da história, as contradições internas e externas às classes
populares, as possibilidades e os limites históricos com que se defronta.

Acreditamos que o serviço social tem muito a contribuir quanto a fornecer


informações sobre o que vem ocorrendo com as famílias brasileiras, pois os
assistentes sociais mantêm contacto direto com elas, ouvindo suas dificuldades e
conhecendo suas necessidades e expectativas.

Nosso objetivo foi conhecer as contribuições teóricas dos assistentes sociais


brasileiros sobre a temática, visando a ampliar nosso conhecimento como
profissional que atua diretamente com esses usuários.

A pesquisa foi bibliográfica, realizada através do levantamento de alguns


clássicos que tratam do assunto, mas, principalmente das Revistas Serviço Social &
Sociedade com o título sobre família.

Este estudo pretendeu ter uma dimensão histórica, expondo algumas


concepções de famílias, situando-as em relação às políticas públicas e ao serviço
social, mostrando a interdependência da família com a sociedade e com as
circunstâncias vivenciadas pelos diversos grupos sociais. Deteve sua atenção para
as famílias, e não para uma família específica, principalmente no interior da
sociedade brasileira.

Assim, apresentaremos alguns aspectos da história da família e seu processo


de modernização, na perspectiva de adentrarmos minimamente a complexidade que
a abrange e que devemos conhecer para atuar adequadamente com ela.
11

No primeiro capítulo pretendemos expor algumas mudanças ocorridas com as


famílias, em outros países, na antiguidade, e no Brasil, na contemporaneidade, uma
síntese da política social e dos períodos históricos importantes do país, onde se
evidencia que muitas famílias modificaram seu perfil em resposta as transformações
por que passou a sociedade brasileira.

No segundo capítulo buscaremos apresentar brevemente a política social


brasileira voltada à família, as relações com o Estado nas últimas décadas, a
preocupação com a questão social, o surgimento do serviço social no Brasil: as
principais transformações ocorridas desde sua origem até a atualidade e a
intervenção do assistente social junto a essa demanda.

No terceiro e último capítulo serão expostas as concepções dos assistentes


sociais sobre família e como trataram das transformações que ocorreram com as
mesmas, na história, através dos artigos publicados nas revistas Serviço Social &
Sociedade.

Esperamos expor elementos para o debate, somando-se a outras


contribuições existentes sobre a temática.
12

1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O título deste trabalho: a família como campo de atuação e investigação do


serviço social brasileiro leva a algumas considerações.

Quando estudamos o tema família, devemos pensar nelas em suas várias


configurações e formas de organizações, compreendendo suas particularidades
como pertencentes a diferentes camadas sociais.

Apesar das transformações que ocorrem com a configuração da família na


sociedade contemporânea brasileira, nos parece que ainda se pauta pelo ideário da
família nuclear burguesa, composta por pai, mãe e filhos.

Essa forma de compreender a família foi por muito tempo hegemônica para a
maioria dos pesquisadores, sendo referência para os diversos profissionais, entre
eles os assistentes sociais, na implementação de programas/projetos sociais.

Ainda há, na contemporaneidade, muita dificuldade em reconhecer os novos


arranjos familiares (não convencionais) como famílias.

Qualquer pessoa sabe o que é uma família porque todo mundo tem a sua.
Porém, não podemos comparar nosso modelo de relação familiar com aquela com
que trabalhamos. Esses estigmas podem nos impedir de perceber as possibilidades
e os recursos que as famílias buscam construir.

O discurso social sobre a família ideal ou perfeita, tão sonhada, na maioria


das vezes, está muito distante da real.

Também devemos considerar outras questões referentes à convivência entre


as pessoas na família, sua relação com a comunidade mais próxima e com a
sociedade mais ampla.

Para Chiara Saraceno, há uma imprecisão terminológica no termo família. A


família é uma construção sócio-histórica.
13

“É também um indicador da multiplicidade de discursos que definem o que é


uma família: discursos religiosos, morais, legais, das tradições culturais, das políticas
sociais, até a específica tradição de cada família, de cada indivíduo.” (Saraceno,
1992: 11-12)

Assim, embora para o senso comum a representação da família seja sempre


compreensível, existe uma infinidade de significados para essa palavra.

As pesquisas têm mostrado as diferenças na sua organização, tanto no que


se refere à composição quanto no que diz respeito às formas de sociabilidade que
vigoram em seu interior. Essa diversidade de configurações familiares tem sido, na
atualidade, objeto de reflexão de alguns estudiosos que pesquisam ou trabalham
com famílias. Para Symanski, ela pode ser formada através de vários tipos de laços:

“1) família nuclear, incluindo duas gerações, com filhos biológicos; 2) famílias
extensas, incluindo três ou quatro gerações; 3) famílias adotivas temporárias; 4)
famílias adotivas, que podem ser bi-raciais ou multiculturais; 5) casais; 6) famílias
monoparentais, chefiadas por pai ou mãe; 7) casais homossexuais com ou sem
crianças; 8) famílias reconstituídas depois do divórcio; 9) várias pessoas vivendo
juntas, sem laços legais, mas com forte compromisso mútuo.” (Symanski, 2002:10)

Concordamos com Heloisa Szymanski que compreende família como uma


associação de pessoas que escolhe conviver por razões afetivas e assume um
compromisso de cuidado mútuo.

Portanto, é um tema complexo, de difícil problematização porque a família é


algo tão próximo que acabamos esquecendo sua dimensão social e histórica.

Abordar o assunto implica levantar algumas questões: de quais famílias


estamos falando, de que país, de que estrato social, de que época e outras.

Mas para compreendermos o momento atual, é importante efetuarmos uma


retrospectiva histórica, pois os séculos passados foram caracterizados por profundas
transformações econômicas, sociais e culturais que incidiram diretamente nas
estruturas das famílias.
14

1.1 – CONCEPÇÕES DE FAMÍLIAS, EM ALGUNS PAÍSES, NA ANTIGÜIDADE

Segundo Friedrich Engels1 (2002), até o início de 1860 não se pesquisava o


tema família. As ciências históricas se embasavam nos Cinco Livros de Moisés. A
forma patriarcal exposta se identificava à família burguesa atual. Era como se ela
não tivesse evoluído. Apenas cogitava-se que nos tempos primitivos pudesse ter
havido um período de “promiscuidade” sexual. Conheciam-se a monogamia e a
poligamia no Oriente, e a poliandria na Índia e no Tibete. Em poucos povos do
mundo antigo e algumas tribos selvagens, a descendência era contada por linha
materna e não paterna, porém ninguém sabia como abordar tais fatos.

O estudo da história da família começa, realmente, em 1861, com o Direito


Materno, do pesquisador suíço Jakob Bachofen.

Bachofen escreveu que entre os gregos e os povos asiáticos existiu, antes da


monogamia, uma época em que não só o homem mantinha relações sexuais com
várias mulheres, mas também o inverso, sem que isso violasse a moral estabelecida
e que a validez da filiação feminina se manteve por muito tempo.

John Fergusson Mac Lennan voltou a tocar no assunto em 1865, sem


conhecer as idéias de seu antecessor. Foi considerado, pelos ingleses, o fundador
da história da família. Expôs que entre muitos povos selvagens, bárbaros e até
civilizados, houve uma forma de matrimônio em que o noivo raptava sua futura
esposa da casa dos pais, ou seja, os homens de uma tribo roubavam mulheres de
outras, pela força.

Para Mac Lennan ocorreram duas situações: uma em que os homens eram
obrigados a buscar esposas, e as mulheres, maridos, fora do grupo (exógamas) e
outra em que só podiam procurá-las no seio de seu próprio grupo (endógamas). E
que, entre as raças exógamas, existiu primitivamente a união da mulher com
diversos homens (irmãos ou primos) e que o primeiro sistema de parentesco foi o
que reconhecia o vínculo de sangue pelo lado materno.

1
Engels, em seu livro, A origem da família, da propriedade privada e do estado, trata do tema com
muita clareza. Assim, consideramos oportuno trazer citações de obras de intelectuais por ele
pesquisados como: Jakob Bachofen, John Fergusson Mac Lennan, John Lubbock, Lewis Henry
Morgan, Lorimer Fison, no início deste primeiro capítulo.
15

John Lubbock, também inglês, em 1870, em seu livro A Origem da


Civilização, reconheceu como fato histórico o casamento por grupos, escrevendo
que entre povos mais desenvolvidos ocorreram outras formas de famílias, nas quais
vários homens tinham em comum várias mulheres.

O americano Lewis Henry Morgan, em 1871, apareceu com novas


informações, no seu livro Sistema de Consangüinidade e Afinidade da Família
Humana, levando a discussão para um campo mais amplo. Tomou como ponto de
partida os sistemas de parentesco e reconstituindo as formas de família a eles
correspondentes, possibilitou enxergar mais longe, a pré-história da humanidade. A
aceitação desse método acabou com as construções de Mac Lennan.

Morgan, em 1877, lançou o livro A Sociedade Antiga, onde informou que a


existência de tribos exógamas não foi provada. Colocou que, na época em que
dominava o matrimônio por grupos, a tribo dividiu-se num certo número, de gens
consangüíneas por linha materna, onde era proibido o casamento, embora os
homens de uma gens pudessem conseguir suas mulheres dentro da própria tribo, o
que acabavam fazendo. No entanto, tinham de consegui-las fora de sua gens. As
gens grega e romana que eram um enigma para os historiadores, acabaram sendo
entendidas, dando nova base ao estudo de toda a história primitiva.

Morgan pesquisou por muito tempo os iroqueses (estabelecidos no Estado de


Nova York) sendo adotado por uma de suas tribos (a dos Senekas). Identificou um
sistema de consangüinidade diferente dos seus reais vínculos de família, na qual o
matrimônio era facilmente dissolúvel, por ambas as partes, e chamado, por ele, de
família sindiásmica.

A descendência do casal era reconhecida por todos, e não surgia dúvida


quanto às denominações pai, mãe, filho, filha, irmão ou irmã, porém, o casal
chamava filhos e filhas, além dos seus, os de seus irmãos, os quais, por sua vez, o
considerava pai. Já os filhos de suas irmãs eram os sobrinhos e sobrinhas, e tio para
ele. Inversamente, a iroquesa chamava de filhos os seus e os de suas irmãs, e
esses a denominavam mãe; e os filhos de seus irmãos, os sobrinhos e sobrinhas, a
consideravam tia. Era um sistema de parentesco elaborado e que expressava
diferentes relações de parentesco em um único indivíduo. Essa estrutura, além de
vigorar entre todos os índios da América, também existiu, quase sem nenhuma
16

modificação, entre os Aborígenes da Índia, as tribos Dravidiana do Dekan e as


Gauras do Indostão.

As designações pai, filho, irmão, irmã, não eram simples títulos, mas, ao
contrário, implicavam deveres definidos e cujo conjunto formou uma parte essencial
do regime social desses povos.

Já no Havaí, na primeira metade do século XIX, todos os filhos de irmãos e


irmãs eram irmãos e irmãs, considerados filhos comuns.

Ao estudar a história da família, Morgan chegou à conclusão, como vários


outros historiadores, de que existiu no seio da tribo, em uma época primitiva, o
comércio sexual “promíscuo”, no qual cada mulher pertencia igualmente a todos os
homens e vice-versa. Porém, poucos estudiosos tocaram nesse assunto.

Morgan acreditava que desse estado primitivo de “promiscuidade” formou-se:


1 - família consangüínea, na qual os grupos conjugais classificavam-se por
gerações: todos os avôs e avós eram maridos e mulheres entre si. O mesmo
acontecia com seus filhos, isto é, com os pais e mães; os filhos desses são o
terceiro círculo de cônjuges comuns, e seus filhos, os bisnetos, o quarto círculo. Os
pais e filhos não tinham relações sexuais recíprocas (primeiro progresso da
organização da família). Irmãos e irmãs, primos e primas em todos os graus eram
todos, entre si, irmãos e irmãs, e por isso mesmo maridos e mulheres uns dos outros
(com relação carnal mútua). Essa família desapareceu, e o que indica que ela deve
ter existido é o sistema de parentesco havaiano.

2 - família punaluana, na qual aconteceu o segundo progresso na organização


familiar, ou seja, a exclusão dos irmãos nas relações sexuais recíprocas. Uma vez
proibidas essas relações sexuais, o grupo se transforma numa gens, constituindo-se
num círculo fechado de parentes consangüíneos por linha feminina, distinguindo-se
de outras gens da mesma tribo. A família punaluana explicou o sistema de
parentesco entre os índios americanos e foi também a base para a dedução da gens
do direito materno.

3 - família sindiásmica, ou seja, um homem vivia com uma mulher; mas a poligamia
e a infidelidade ocasional continuavam a ser um direito dos homens, e, enquanto
durasse a vida em comum, exigia-se a mais rigorosa fidelidade das mulheres, que
17

recebiam castigo por prática de adultério. O vínculo conjugal podia ser facilmente
quebrado por qualquer parte, e os filhos pertenciam à mãe.

4 - família monogâmica, baseava-se no poder do homem que tinha por finalidade


procriar filhos, e cuja paternidade era indiscutível. Nessa época, só o homem podia
romper os laços conjugais. Somente ele podia ser infiel, desde que não trouxesse a
concubina ao domicílio conjugal. Quanto à mulher legítima, exigia-se que ela
aceitasse tudo e guardasse uma fidelidade rigorosa. A esposa era apenas a mãe
dos filhos, a que cuidava da casa. Na verdade era monogamia apenas para a
mulher. Foi a primeira forma de família que não se baseava em condições naturais,
mas econômicas.

Um pesquisador que também contribuiu com esse tema foi o missionário


inglês Lorimer Fison, que durante anos, estudou essa forma de família (matrimônio
por grupos), na Austrália.

Fison identificou que entre os negros australianos do monte Gambier, no sul


da Austrália, a tribo inteira dividia-se em duas grandes classes: os Krokis e os
Kumites. Eram proibidas as relações sexuais dentro de uma dessas classes, porém
todo homem de uma delas era marido nato da mulher da outra e vice-versa. Não
havia nenhuma restrição de idade ou de consangüinidade, salvo a determinada pela
divisão em duas classes exógamas.

Esse sistema também foi identificado nas margens do Rio Darling, mais a
leste, e em Queensland, no nordeste, demonstrando ser bastante difundido. Excluía
apenas os matrimônios entre irmãos e irmãs, filhos de irmãos e filhos de irmãs por
linha materna, porque esses pertenciam à mesma classe.

Já entre os Kamilarois, às margens do Darling, na Nova Gales do Sul, duas


classes dividiram-se em quatro. As duas primeiras (originárias) eram esposos natos
uma da outra, mas, segundo a mãe pertencesse à primeira ou à segunda passavam
os filhos à terceira ou à quarta. Os filhos dessas duas últimas classes igualmente
casavam um com a outra e seus filhos pertenciam de novo à primeira e à segunda, e
assim sucessivamente. Então os filhos de irmão e irmã (por linha materna) não
podiam ser marido e mulher, porém, podiam sê-los os netos.
18

Percebeu-se que a tendência de impedir o matrimônio entre consangüíneos


manifestou-se, mas de maneira espontânea, sem consciência clara dos fins
objetivados.

O casamento por classes inteiras, como ocorreu na Austrália, foi considerado


a forma mais primitiva de matrimônio por grupos. Já a família punaluana permeou o
que conduziu ao grau imediatamente superior de desenvolvimento. Provavelmente
devem ter existido outros graus intermediários.

Porém, ainda continuou acontecendo, em algumas tribos, a união por grupos.


Exemplo disso foram as quarenta tribos da América do Norte, nas quais o homem
que se casasse com a moça mais idosa tinha direito de tomar, igualmente como
mulheres, todas as irmãs dela, logo que chegassem à idade própria.

Entre habitantes da Península da Califórnia, em certas festividades,


aconteciam de se reunirem várias tribos para praticar sexo. O mesmo costume
também ocorreu na Austrália.

Nas Ilhas Baleares, entre os Augilas Africanos e entre os Báreas, na


Abissínea, na antiguidade, os amigos e parentes do noivo, ou os convidados,
exerciam durante o casamento, o direito à noiva, por costume; e ao noivo só
chegava a vez por último, depois de todos.

Em outros povos, um personagem oficial, chefe da tribo ou da gens, fosse


cacique, xamã, sacerdote ou príncipe aquele que representasse o grupo, era quem
exercia com a mulher que se casava o direito da primeira noite. Igualmente
aconteceu entre a maioria dos habitantes do território do Alasca e os Tanus do Norte
do México.

Ao introduzirem a criação do gado, a elaboração dos metais, a arte do tecido


e, por fim, a agricultura, as coisas mudaram, principalmente depois que os rebanhos
começaram a ser propriedade de algumas famílias. Passando essas riquezas em
propriedade particular, e aumentadas depois rapidamente, influenciaram a
sociedade alicerçada no matrimônio sindiásmico.

Ao homem, na divisão do trabalho, cabia procurar a alimentação e os


instrumentos desse trabalho. Conseqüentemente era, por direito, o proprietário
desses. Assim, em caso de separação, levava-os consigo, enquanto a mulher
conservava os seus utensílios domésticos. Nessa separação, os filhos não podiam
19

herdar bens do pai. Anteriormente, esse fator não teve importância porque
praticamente nenhuma das partes tinha o que dividir, mas depois que o homem
começou a adquirir riquezas, isso influenciou na organização familiar.

Ao possuir valores, o homem foi ganhando uma posição mais importante que
a da mulher na família e, por outro lado, fizeram que nascesse nele a idéia de se
valer dessa vantagem para modificar, em proveito de seus filhos, a ordem da
herança anteriormente estabelecida. Porém, isso não poderia ocorrer se continuasse
prevalecendo o direito materno. Foram abolidas então a filiação feminina e o direito
hereditário materno, sendo substituídos pela filiação masculina e o direito hereditário
paterno. Passou-se assim ao patriarcado. Isso ocorreu entre os povos cultos, ainda
nos tempos pré-históricos.

O homem também começou a mandar na casa em domínio e a mulher a ser


servidora (instrumento de reprodução).

Essa forma de família assinala a passagem do matrimônio sindiásmico à


monogamia.

Porém, em vários países do mundo, continuaram existindo comunidades


familiares (onde moravam várias gerações da mesma família).

Os gregos diziam que os únicos objetivos da monogamia eram a


preponderância do homem na família e a procriação de filhos que só pudessem ser
seus, para herdar. O casamento, para eles, era uma carga, um dever para com os
deuses, o Estado e seus antepassados.

A antiga liberdade de relações sexuais não desapareceu completamente com


o matrimônio sindiásmico, e nem mesmo com a monogamia.

Bachofen afirmou que a passagem do heterismo à monogamia realizou-se


essencialmente graças às mulheres.

Morgan falou do heterismo (no período da monogamia) que eram as relações


extra-conjugais de homens com mulheres não casadas, ocorridas em todas as
épocas da civilização e que se transformaram em prostituição.

Em outros povos, o heterismo provém da liberdade sexual concedida às


jovens antes do casamento (isso não deixava de ser um resto de matrimônio por
grupos).
20

É dúbia a herança que a união conjugal por grupos legou à civilização: de um


lado a monogamia, de outro o heterismo, incluída a sua forma extrema, a
prostituição.

Na monogamia desenvolveu-se uma outra contradição: como o marido


apelava para o heterismo, a esposa ficava abandonada. O adultério passou a ser
uma instituição social inevitável. Foi uma forma de a mulher se rebelar contra o
domínio do homem.

A família monogâmica não foi igual em todos os lugares e épocas. Entre os


romanos a mulher era mais livre e considerada. Lá elas podiam romper o vínculo
matrimonial.

Só na monogamia que se pôde desenvolver o amor sexual, porém, não se


sabe se esse amor era mútuo entre os cônjuges.

Segundo Engels (2002), em todas as classes históricas dominantes, do


período monogâmico, o matrimônio continuou sendo de conveniência, arranjado
pelos pais.

O casamento burguês assumiu duas feições:

1 – nos países católicos, os pais proporcionavam ao jovem a mulher que lhe


convinha, do que resultou naturalmente o heterismo por parte do homem e o
adultério por parte da mulher.

2 – nos países protestantes, o filho teve mais ou menos liberdade para procurar
esposa dentro da sua classe. Assim, o amor pôde ser, até certo ponto, a base do
casamento, pelo menos aparentemente, ou seja, o marido não praticava o heterismo
sempre e a infidelidade da mulher foi mais rara.

Mas nos dois casos, o matrimônio baseava-se na posição social dos


contraentes e, assim, uma união de conveniência. Essas situações só ocorreram
para as classes burguesas.

Para o proletariado foi diferente, principalmente quando a mulher ingressou


no mercado de trabalho, pois, como ela também era colaboradora nos rendimentos
da casa, passou a ter direito nas decisões familiares.

A América foi considerada a terra clássica da família sindiásmica, que só


começou a ter a monogamia estável depois do descobrimento e da conquista.
21

Gueiros, em breve retrospectiva histórica, expõe que, antes do século X, a


família não tinha expressão. A partir daí e com as oscilações do Estado, a
concepção de linhagem ganha forças tendo como uma das preocupações a não
divisão do patrimônio.

“No século XIV, começam a se operar mudanças na família medieval, que vão
se processar até o século XVII. Neste período, a situação da mulher é também alvo
de mudanças, caracterizadas pela perda gradativa de seus poderes, o que culmina,
no século XVI, com a formalização da incapacidade jurídica da mulher casada e a
soberania do marido na família. Assim, a mulher perde o direito de substituir o marido
em situações nas quais ele se ausenta ou é considerado louco e qualquer ato seu
tem efeito legal apenas se autorizado pelo marido.” (Gueiros, 2002: 106)

Segundo Ariès (1978), na Idade Média, a transmissão de conhecimentos,


entre as gerações ocorria pela participação das crianças na vida dos adultos, através
do contato diário. Por volta dos sete anos, ou seja, depois que desmamavam, essas
tornavam-se companheiras naturais daqueles.

“... A criança desde muito cedo escapava à sua própria família, mesmo que
voltasse a ela mais tarde, depois de adulta, o que nem sempre acontecia. A família
não podia portanto, nessa época, alimentar um sentimento existencial profundo entre
pais e filhos. Isso não significava que os pais não amassem seus filhos: eles se
ocupavam de suas crianças menos por elas mesmas, pelo apego que lhes tinham,
do que pela contribuição que essas crianças podiam trazer à obra comum, ao
estabelecimento da família. A família era uma realidade moral e social, mais do que
sentimental....” (Ariès, 1978: 221)

Naquela época a família assegurava a transmissão da vida, dos bens e dos


nomes, porém não penetrava na sensibilidade.

O sentimento da família era desconhecido na Idade Média e nasceu nos


séculos XV e XVI. Foi a partir dessa época que ela foi reconhecida como um valor.
Era a família conjugal, formada pelos pais e filhos.
22

“A idéia essencial dos historiadores do direito e da sociedade é que os laços


de sangue não constituíam um único grupo, e sim dois, distintos embora
concêntricos: a família ou mesnie, que pode ser comparada à nossa família conjugal
moderna, e a linhagem, que estendia sua solidariedade a todos os descendentes de
um mesmo ancestral. Em sua opinião haveria, mais do que uma distinção, uma
oposição entre a família e a linhagem: os progressos de uma provocariam um
enfraquecimento da outra, ao menos entre a nobreza. A família ou mesnie, embora
não se estendesse a toda a linhagem, compreendia, entre os membros que residiam
juntos, vários elementos, e, às vezes, vários casais, que viviam numa propriedade
que eles se haviam recusado a dividir, segundo um tipo de posse chamado frereche
ou fraternitas. A fereche agrupava em torno dos pais os filhos que não tinham bens
próprios, os sobrinhos ou os primos solteiros. Essa tendência à indivisão da família,
que aliás não durava além de duas gerações, deu origem às teorias tradicionalistas
do século XIX sobre a grande família patriarcal. A família conjugal moderna seria
portanto a conseqüência de uma evolução que, no final da Idade Média, teria
enfraquecido a linhagem e as tendências à indivisão.” (Ariès, 1978: 211)

Com o decorrer do tempo, alguns estudiosos começaram a perceber que as


crianças não estavam preparadas para o mundo dos adultos e sim deviam ser
ensinadas em escolas.

Somente a partir do século XV que poucas famílias começam a sentir a


necessidade de maior entrosamento entre pais e filhos, principalmente quando o
conhecimento começou a ser transmitido pela escola, pois essa passou a ser,
juntamente com a família, um instrumento de iniciação social, da passagem do
estado da infância ao do adulto.

A escola era importante por vários motivos, e entre eles, por isolar os jovens
do mundo dos adultos, para mantê-los “inocentes” e concorria para despreocupar os
pais de vigiar seus filhos mais de perto. A partir daí, ocorre uma aproximação da
família e da criança. Segundo Ariès (1978), começa a existir o sentimento de
pertencimento à família.

Durante muito tempo, as meninas foram educadas pela prática e pelo


costume, e muitas vezes em casas alheias. Elas apenas começaram a freqüentar a
escola a partir do século XVIII e início do XIX.
23

Houve um período em que se tinha o costume de beneficiar com riquezas um


dos filhos, geralmente o mais velho. Temiam que, se dividissem seus bens,
diminuiriam seus prestígios. Porém, a partir da segunda metade do século XVII, esse
hábito começa a ser questionado.

O cuidado dispensado às crianças começou a inspirar uma afetividade, o


sentimento moderno da família. Os pais já não se satisfaziam mais em por filhos no
mundo, em privilegiar apenas alguns deles, esquecendo dos outros. A moral da
época estabelecia proporcionar a todos, e não apenas aos mais velhos, os mesmos
direitos, inclusive às meninas.

A família e a escola retiraram a criança da sociedade dos adultos. Porém, a


escola, num primeiro momento, confinava esses jovens num regime disciplinar
rigoroso que nos séculos XVIII e XIX resultou no internato.

Antes do século XVIII, o sentimento da família existia para poucos. Só a partir


daí ele estendeu-se a todas as camadas sociais.

No século XVIII a família começou a se isolar da sociedade. A organização da


casa era uma defesa para o mundo externo. Essa se tornou uma sociedade
fechada.

A experiência familiar apesar de parecer ser comum a todos os indivíduos


depende das várias culturas e vai se modificando conforme as transformações
sociais que vão ocorrendo com o tempo.

Segundo Gueiros (2002), foi apenas a partir da segunda metade do século


XIX que o modelo patriarcal passa a ser questionado, iniciando-se a família conjugal
moderna, na qual o casamento começa a ocorrer por escolha dos parceiros, com
base no amor romântico. Porém, o modelo antigo ainda continua prevalecendo, em
muitas famílias, até o século XX. No Brasil, essa conquista somente virou lei com a
Constituição de 1988.
24

1. 2 – AS FAMÍLIAS NO BRASIL

No Brasil, no início dos séculos XVI e XVII, a economia da colônia esteve


praticamente assentada nas plantações de cana, localizadas no Nordeste. Nos
engenhos, as famílias nobres viviam nas mansões, cercadas de escravos. O poder
de decisão, na maioria delas, pertencia ao marido, como protetor e provedor da
esposa e dos filhos. A mulher tinha como responsabilidade o controle dos afazeres
domésticos e a orientação moral da prole. Apesar de, na lei, essas uniões serem
consideradas legítimas e modelos, nas quais o papel dos sexos estava bem definido
por costumes e tradições, na realidade isso não acontecia em todas famílias, com
tanta rigidez.

A descoberta de minas de ouro, na década de 1690, provocou alterações,


deslocando o eixo econômico, antes localizado no nordeste, para o sul.

As populações mais pobres começaram a migrar para a região mineira em


busca do enriquecimento, provocando uma vida urbana mais intensa. Aumentaram
os concubinatos e os filhos ilegítimos. Mais mulheres passaram a exercer atividades
econômicas fora do âmbito doméstico e as mães solteiras ou viúvas, a chefiarem. A
sociedade que estava se formando era uma mistura de raças e origens diversas,
muito difícil de ser controlada pela igreja e coroa portuguesa, principalmente a dos
escravos.

Com essas transformações econômicas se processando vai ocorrendo a


modernização das relações familiares, enfraquecendo também as obrigações
mútuas entre gerações.

Como a mulher, com todas essas modificações, passa a ter maior controle
sobre suas decisões pessoais, alguns homens passam a se desobrigar das
responsabilidades familiares.

No século XVIII, essas mudanças continuam se processando. Os núcleos


urbanos prosseguem em crescimento, conseqüentemente a vida rural vai ficando
cada vez mais modesta. Nos engenhos, o número de escravos foi diminuindo, e, na
falta desses braços, lavradores empobrecidos trabalhavam a terra com suas
famílias.
25

No meio urbano, uma gama variada de serviços ligados ao abastecimento foi


surgindo, favorecendo assim a atuação das mulheres trabalhadoras que, pouco a
pouco, vão ocupando os espaços deixados pela migração masculina e a falta de
escravos.

Essas mudanças se acentuam ao longo do século XIX, com o


desenvolvimento econômico no sul do país, provocado pela cafeicultura.

Existiram também modificações políticas importantes, entre elas: a abolição


da escravatura em 1888, a proclamação da república em 1889 e a entrada de
imigrantes.

Especialmente na segunda metade do século XIX, abriram-se novas


oportunidades de empregos e as mulheres passaram a ocupar uma fatia desse
mercado, principalmente na indústria têxtil, porém num nível de trabalho não
qualificado. Mesmo com algumas delas passando a trabalhar fora, elas continuaram
exercendo suas funções básicas de mãe e de donas de casa, para as quais tinham
sido socializadas e educadas.

A tendência da chefia familiar feminina está associada à história da


colonização; com a crescente ruptura da sobrevivência baseada na economia
familiar e a transição para o assalariamento individual. Assim, a sobrevivência dos
membros da família passa a depender do trabalho e rendimento individual, fora do
ambiente familiar.

No final do século XIX inicia-se o curso da industrialização. Esse fator


também ocasionou a precipitação da urbanização. Vários acontecimentos
concorreram para o início desse processo: a agricultura que se modernizou exigindo
novas técnicas, a disposição de um grande contingente de população por um
território amplo, a criação e desenvolvimento das cidades maiores, pois novas
atividades estavam surgindo e principalmente a expansão das atividades públicas
governamentais.

No início do século XX, mulheres da elite e das classes médias urbanas foram
ocupando espaço nas universidades.
26

“Com a adoção do sistema capitalista como sistema produtivo em substituição


a outras formas de produção, a família foi perdendo a posse dos meios de produção.
Se inicialmente era necessário haver famílias numerosas (o que implicava uma alta
taxa de fertilidade, uma vez que a unidade principal de produção era o grupo
familiar), o desenvolvimento para a forma capitalista determinou que a família
perdesse sua característica de unidade produtiva, fazendo com que cada membro
desta se transformasse em vendedor de sua força de trabalho.” (Hermácula et al.,
1982: 144)

O aumento da participação feminina no mercado formal foi se acentuando ao


longo do século, porém também estava inserida nos setores informais,
principalmente através do trabalho domiciliar que reforçava ou mantinha o
orçamento.

O rápido crescimento da população, no mesmo espaço, em tão pouco tempo,


não poderia deixar de causar um desequilíbrio dos serviços de infra-estrutura e
equipamentos, ou seja, deficiências nas condições de habitação, saneamento
básico, transporte, lazer, saúde etc.

Muitos passaram a dirigir-se para a cidade porque verificaram que os


moradores dos centros urbanos tinham várias facilidades como assistência médica,
educação e outros benefícios. Isso fez com que a população do campo almejasse
ter acesso a esses serviços, além do sonho de obter um emprego estável com
melhor salário. Porém, ao chegar à cidade, esses contingentes populacionais
deparavam com a inexistência de emprego para tanta mão-de-obra, tendo que se
sujeitar às precárias condições de vida, se quisessem continuar sobrevivendo na
zona urbana.

Segundo Iamamoto e Carvalho (1986), nesse período ocorrem


transformações importantes ao nível econômico, social e político. Aconteceu uma
intensa retomada do aprofundamento capitalista tanto ao nível da expansão da
produção industrial quanto de outras atividades produtivas de realização interna e
agro-exportadora. Conseqüentemente ocorre uma intensificação da taxa de
exploração da força de trabalho. O Estado passa a intervir no mercado de trabalho,
bloqueando a capacidade de reivindicação dos sindicatos operários e restringindo
aspectos importantes da legislação trabalhista. Assim, o Estado fortalece a
27

aceleração da acumulação. É nesse período que é criada a Legião Brasileira de


Assistência (LBA) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) que
surge em 1942 para qualificar a força de trabalho necessária à expansão industrial.

“A desmoralização dos Círculos Operários e de outras formas de intervenção


no movimento operário, assim como o crescimento da organização e combatividade
desse movimento, são fatores que contribuem fortemente para o surgimento e
orientação de instituições assistenciais atualmente de relevo, como por exemplo o
SESI. Da mesma forma, as primeiras experiências de eleições democráticas (1945 e
1946), (...), contribuirá para o aparecimento de outras instituições, como a Fundação
Leão XIII, no Rio de Janeiro. “ (Iamamoto e Carvalho, 1986: 254-255)

Na década de sessenta, ocorreram várias acontecimentos que influenciaram


nas formas de ser da família, dentre eles, os movimentos de conquistas de direitos,
onde ganham destaque os das mulheres, que lutaram pela sua emancipação.

“As mulheres eram consideradas colaboradoras da eficientização dessas


medidas, no âmbito privado da família, cabendo a elas ajudar a reproduzir a força de
trabalho efetiva e futura e, quando muito, receber uma atenção vinculada às
contingências da maternidade, da viuvez, da separação, da filiação etc., que sua
relação de dependência com o pai e depois, com o marido implicava. Isso ensejou,
de certa forma, uma recusa do casamento por parte de muitas mulheres.” (Pereira,
1995: 108)

O movimento feminista contribuiu, a partir de seus questionamentos e críticas,


para demonstrar que a emancipação da mulher só seria possível se ela fosse titular
de direitos civis, políticos e sociais.

Posteriormente foi descoberta a pílula anticoncepcional que pôde separar a


sexualidade da reprodução, provocando a redução da fecundidade e a diminuição
do tamanho médio das famílias. Possibilitou à mulher o direito de optar pela
maternidade ou não. Facilitou seu ingresso no mercado de trabalho remunerado e
nas universidades. Ocorreu a fragilização dos laços matrimoniais, com as
28

separações, divórcios e os novos acordos sexuais. Como conseqüência do divórcio


e dos recasamentos, surgiu outra configuração que vem sendo chamada “família
reconstituída”. Observou-se o crescimento da família monoparental, ou seja, aquela
geralmente chefiada por mulheres.

Mais tarde, a partir dos anos 80, as novas tecnologias reprodutivas


(inseminações artificiais, fertilizações in vitro) dissociaram a gravidez da relação
sexual entre homem e mulher, determinando alterações nas estruturas familiares.

Na década de 90, passa a ser possível o exame de DNA. A comprovação da


paternidade possibilita a sua reivindicação, tanto pela mulher como pelo filho,
forçando o homem a assumir sua responsabilidade, pelo menos legalmente, em
relação ao filho.

Segundo Maria Amália Faller Vitale, nos segmentos da classe média:

“A inserção da mulher no mercado de trabalho e o controle da reprodução são


fatores fundamentais para a emergência de um rearranjo sobre os papéis e funções
femininas, com repercussão direta no padrão de relacionamento familiar. As novas
representações sobre o papel feminino decorrente destes aspectos gestam a
necessidade de novos acordos que podem ser explícitos ou, por vezes, implícitos
quanto à estrutura de poder, quanto à forma de expressão da sexualidade e do afeto
na família. Como dinâmica complementar, há um redimensionamento (pelo menos
parcial) do papel de marido e pai. O desenvolvimento da condição feminina e suas
implicações no relacionamento da família não ocorre, no entanto, de forma linear
mas sim contraditória. Coexistem, no mesmo espaço familiar, modelos de relação
calcados no papel feminino de ordem tanto tradicional quanto modernizante. A
mulher considerada sede e esteio do mundo, da casa, convive com a mulher que ao
trabalhar, faz parte do mundo da rua. Em contrapartida, o homem passa a agir de
forma mais expressiva em esferas que eram, antes, pertinentes ao universo feminino,
aproximando-se da intimidade com os filhos e participando de novas formas na
socialização destes.” (Vitale, s.d.: 285–286)

Todos esses e outros fatores contribuíram para alterar o quadro da


organização familiar. Assim, os séculos passados e, principalmente o XX,
significaram importante marco para os estudos sobre as transformações ocorridas
com as famílias brasileiras.
29

1.3 – AS POLÍTICAS SOCIAIS: ORIGEM E FUNÇÃO

As políticas sociais vinculam-se, em sua origem, ao enfrentamento da


questão social, no contexto do processo de industrialização que provocou inúmeras
transformações, como a migração acelerada do campo para as cidades, fato esse
gerador de inúmeros problemas sociais no meio urbano, entre outros.

Com o passar dos anos, o termo social, antes compreendido como ligado à
caridade, deixou de ser entendido como tal e passa a ser pensado em relação ao
indivíduo pertencente a uma sociedade e também à melhoria das condições de vida
da população urbana notadamente aquela trabalhadora de baixa renda, a quem
restava viver nas cidades que, inchadas com esse novo contingente, oferecia
apenas condições sub-humanas de vida.

A expressão “Estado – Providência” aparece na língua francesa em torno de


1860, e “Estado Social”, na língua alemã, por volta dos anos de 1880; já a expressão
inglesa “Welfare State” ou “Estado de Bem-estar” é bem mais atual, firma-se na
década de 1940 e é desse tipo de Estado que emerge a preocupação mais formal
com o social.2

São muitas as concepções desse século a respeito das funções da política


social, legitimação do Estado, regulação social, correção das imperfeições do
mercado, eliminação das injustiças sociais e outras. Essa variação na forma de
conceber as políticas sociais se dá em conseqüência das várias correntes teóricas
existentes e que explicam historicamente o movimento, a aplicabilidade e a
efetividade dessas medidas.
Em termos da teoria política existem três matrizes que influenciaram as
concepções de política social: a liberal, a marxista e a social-democrata.

A visão liberal destaca que a competição é o caminho para o progresso


econômico, gerando o bem-estar coletivo. Assim os serviços prestados pelo Estado
devem atender apenas aqueles que têm alta prioridade social. O gasto social é
considerado uma carga que prejudica o crescimento econômico, daí porque a

2
As reflexões aqui apresentadas estão assentadas em Luiz Fernando Rodrigues de Paula. Estado e
políticas sociais na Brasil, 1992 e Evaldo Vieira. Democracia e Política Social, 1992.
30

destinação de recursos para a esfera social sofre restrições e cortes que não
permitem o atendimento efetivo das necessidades sociais da população carente.
Para a marxista, a política social do estado capitalista visa a assegurar a
reprodução das relações sociais, ou seja, é uma resposta do estado às contradições
de classe. Nesse sentido, a política social tem uma dupla dimensão: é, ao mesmo
tempo, uma resposta às necessidades sociais dos trabalhadores e, por outro lado,
uma forma de ocultar as contradições de classe.

Na social democrata, os problemas sociais resultam de falhas de


funcionamento do mercado que distribuem mal seus recursos. Cabe à intervenção
estatal acabar com a injustiça e a pobreza que terminam compensando os
problemas existentes pelas falhas do mercado. O gasto social é um instrumento
auxiliar no processo de desenvolvimento econômico, contribuindo para o
crescimento da economia.
A configuração política do estado brasileiro está vinculada ao
desenvolvimento do capitalismo, com a industrialização, a mudança de poder da
oligarquia agrária agro-exportadora para a nascente burguesia industrial. O governo
Vargas marca a origem das políticas sociais no Brasil, configurando uma resposta do
estado “populista” à questão social, tendo em vista a regulação da força de trabalho
da classe operária que se formava nos grandes centros urbanos e que vinha de
forma crescente e expressiva manifestando sua insatisfação diante das condições
de trabalho.

Foi a partir do ângulo das relações de trabalho que o governo começou a


intervir na questão social, por meio de políticas sociais, demonstrando que o mesmo
muda sua concepção sobre seu papel frente às questões sociais emergentes
passando a intervir através de ações ditas “populistas” junto a essa nova classe a do
operariado.

No âmbito das análises sobre as políticas sociais, coloca-se uma polêmica


sobre a questão da existência ou não de um “Estado do bem-estar” ou “Estado
protetor” no Brasil. Entretanto, vale lembrar que foi a partir do século XX que foram
formados os grandes sistemas organizacionais em algumas áreas sociais como, por
exemplo, o previdenciário e o habitacional, considerados sistemas de determinado
padrão de proteção social do país.
31

Após o término da segunda guerra mundial, o Estado alargou sua intervenção


no campo econômico e social. É interessante destacar que a direção das
transformações de atitudes da classe dominante depende basicamente do jogo das
forças sociais, particularmente da pressão dos movimentos trabalhista.

“Não tem havido, pois, política social desligada dos reclamos populares. Em
geral, o Estado acaba assumindo alguns destes reclamos, ao longo de sua
existência histórica. Os direitos sociais significam, antes de mais nada, a
consagração jurídica de reivindicações dos trabalhadores. Não significam a
consagração de todas as reivindicações populares, e sim a consagração daquilo que
é aceitável para o grupo dirigente do momento. Adotar bandeiras pertencentes à
classe operária, mesmo quando isto configure melhoria nas condições humanas,
patenteia também a necessidade de manter a dominação política.” (Vieira, 1992: 23)

Assim, vê-se que no caso brasileiro as políticas sociais expressam um


conjunto de medidas que buscam o atendimento a reivindicações populares, mas,
ao mesmo tempo, contraditoriamente, se configuram como instrumentos de
manutenção do poder. Isso é percebido quando analisamos a trajetória dessas
políticas ao longo da história.

1.4 – ALGUNS MARCOS HISTÓRICOS DAS POLÍTICAS SOCIAIS NAS


GESTÕES DE VARGAS A LULA3 (1930 A 2006)

Utilizaremos os marcos da década de 30 para iniciar nossa periodização


porque nesse período também foi implantado o serviço social no Brasil.

Getúlio Vargas exerceu seu primeiro mandato como Presidente da República


durante o período compreendido entre 1930 a 1945. Apesar de assumir um governo
provisório, deixou clara sua intenção de deter em seu poder tanto as decisões
políticas quanto as econômico-financeiras.

3
Os dados históricos e comentários nesta parte do trabalho além de constarem na bibliografia citada
anteriormente e nas Constituições Brasileiras, também estão embasados em Renato Francisco dos
Santos Paula. Trabalho, família e ser social: elos que unem a centralidade do trabalho às relações
familiares, 2005; Nelson Piletti. História do Brasil, 1982; Francisco de Assis Silva e Pedro Ivo Bastos.
História do Brasil, 1989; Evaldo Vieira. Estado e Miséria Social no Brasil, 1983 e 2. ed. 1985.
32

Como o café era a base da economia nacional e essa passava por uma crise
de superprodução em conseqüência da crise mundial de 29, provocando vários
problemas para outros setores econômicos como o comércio e a indústria, Getúlio
institui uma nova política cafeeira no país. Em 1931, cria o Conselho Nacional do
Café (C.N.C.) que foi substituído em 1933 pelo Departamento Nacional do Café
(D.N.C.). As oligarquias cafeeiras opuseram-se à política agrária de Vargas por
estarem sentindo-se prejudicadas com essa nova política cafeeira, pelo fato de
terem que se submeter às decisões econômicas do governo federal, além de
perderem o poder político.

Getúlio Vargas também teve que lutar contra a revolução de São Paulo que
pretendia a constitucionalização imediata do país.

“Entretanto, se a Revolução Paulista de 1932 foi um fracasso do ponto de


vista militar, foi um sucesso do ponto de vista político, pois em 1933 Getúlio Vargas
promoveu eleições para a Assembléia Constituinte, que se instalou a 10 de
novembro, sendo responsável pela elaboração de uma nova Constituição,
promulgada em 1934.” (Silva e Bastos, 1989: 261)

A Constituição promulgada a 16 de julho de 1934, em pleno governo


Vargas, foi a terceira Constituição do Brasil e a segunda da República, considerada
de inspiração liberal e centralizadora. Consta dessa Constituição: a estrutura
federativa do país; eleições diretas para presidente; mandato presidencial de 4 anos;
extinção do cargo de vice-presidente; instituição da Justiça do Trabalho; salário
mínimo; jornada de trabalho de oito horas diárias; repouso semanal remunerado;
férias remuneradas; indenização por dispensa sem justa causa; criação do mandato
de segurança, limitação do hábeas-corpus; voto secreto e feminino; voto aos 18
anos; ensino primário gratuito e obrigatório; autonomia dos sindicatos; obrigação de
as empresas estrangeiras manterem no mínimo dois terços de seus empregados
brasileiros e outras. Vemos aí, pelo menos de forma oficial, a preocupação do
33

governo com o social através das instituições que, de certa forma, deveriam garantir
alguns direitos sociais que estão em vigência até hoje.
34

Quanto à família consta nessa Constituição, título V, capítulo I:

“Art. 144. A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção
especial do Estado.

Paragrapho único. A lei civil determinará os casos de desquite e de annulação do


casamento, havendo sempre recurso ex officio, com effeito suspensivo.

Art. 145. A lei regulará a apresentação pelos nubentes de provas de sanidade


physica e mental, tendo em attenção as condições regionaes do paiz.

Art. 146. O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento perante
ministro de qualquer confissão religiosa, cujo rito não contrarie a ordem publica ou
bons costumes, produzirá, todavia, os mesmos effeitos que o casamento civil, desde
que, perante a autoridade civil, na habilitação dos nubentes, na verificação dos
impedimentos e no processo de opposição, sejam observadas as disposições da lei
civil e seja elle inscripto no Registro Civil. O registro gratuito e obrigatório. A lei
estabelecerá penalidade para a transgressão dos preceitos legaes attinentes a
celebração do casamento.

Paragrapho único. Será também gratuita a habilitação para o casamento, inclusive os


documentos necessários, quando o requisitarem os juizes criminaes ou de menores,
nos caso de sus competência, em favor de pessoas necessitadas.

Art. 147. O reconhecimento dos filhos naturaes será isento de quaesquer sellos ou
emolumentos, e a herança, que lhes caiba, ficará sujeita a impostos iguaes aos que
recáiam sobre a dos filhos legítimos.” (Constituição da República dos Estados Unidos
do Brasil, 1934: 46–47)

Com o crescimento populacional das áreas urbanas, encontrava-se maior


oferta de trabalho. Emergem daí as contradições que agravam o panorama geral,
quadro esse que permitiu a intervenção do governo brasileiro como agente defensor
das classes dominantes. Essa interferência vem regular as relações sociais com
vistas a harmonizar os antagonismos surgidos dentre as novas classes que
emergiam no cenário brasileiro.
35

O Estado dedicou-se ao urbano com intuito de encontrar mecanismos que


demonstrassem seu interesse em amenizar os problemas existentes na sociedade.
Essa intervenção de natureza política fez criar um conjunto de órgãos e entidades
cuja finalidade seria a de formular a política das cidades. Ao fazê-lo, deveria levar
em conta as exigências técnicas e econômicas do capital e também propiciar
soluções para as necessidades de reprodução da força de trabalho.

O governo passa a promover os serviços coletivos urbanos e também a infra-


estrutura básica para a produção do capital, porém a maior beneficiada foi a
iniciativa privada que teve acesso a esses bens coletivos de maneira diferenciada,
acompanhando os interesse políticos reinantes. O Estado deveria, além de dirigir-se
à iniciativa privada, voltar-se ao atendimento dos anseios da população, cujas
necessidades estão ligadas diretamente à reprodução da força de trabalho.

O período foi marcado pelo choque de duas correntes ideológicas: a Ação


Integralista Brasileira (A.I.B.) e a Aliança Nacional Libertadora (A.N.L.). Getúlio
Vargas aproveitou-se do confronto desses dois grupos para demonstrar a população
os perigos de uma política aberta.

Em 10/11/37 Vargas com o apoio da forças armadas, deu um golpe de Estado


utilizando-se do pretexto de os comunistas estarem preparando uma nova revolução.
Dissolveu o Congresso Nacional, as Assembléias Legislativas e as Câmaras
Municipais. Os governadores dos Estados foram substituídos por interventores.
Outorgou uma nova Constituição em 10/11/37, criando o “Estado Novo”.

A constituição estabelecia a ditadura, ou seja, um Estado Autoritário que


permitia ao chefe do governo controlar os poderes Executivo, Legislativo e também o
Judiciário. Getúlio acabou com a independência dos sindicatos, além de proibir as
greves. Extinguiu todos os partidos políticos, regulamentou a pena de morte no
Brasil, exilou vários políticos, criou o Ministério da Aeronáutica. Destacava que sua
política econômica caracterizava-se pelo nacionalismo, intervencionismo estatal e
protecionismo.

Completando a política trabalhista iniciada com a criação do Ministério do


Trabalho, regulamenta as relações entre trabalhadores e patrões. Cria o imposto
sindical. Em maio de 1940, surge um decreto-lei fixando o primeiro salário mínimo.
Em 1943, elaborou a C.L.T. (Consolidação das Leis Trabalhistas).
36

Promoveu a diversificação agrária, incentivando a policultura.

A industrialização sofreu grande impulso a partir de 1940, em conseqüência


de vários fatores: diminuição das importações, aumento das exportações de
produtos industrializados e outros, tudo em virtude da segunda guerra mundial.

“Dentro do âmbito da Assistência Social, distinguia-se a atuação do Serviço


de Alimentação da Previdência Social (SAPS), da Legião Brasileira de Assistência
(LBA), do Serviço Social da Indústria (SESI) e do Serviço Social do Comércio
(SESC), embora Vargas apresentasse também a expansão de uma forma de
assistência onde não havia necessidade de contribuição por parte do beneficiário.
Tratava-se do que ele denominava de ‘abono familiar’, destinado às famílias
numerosas, a fim de estimular a natalidade e de proteger os filhos ...” (Vieira, 1985:
55)

Porém, a opinião pública exigia a redemocratização do país.

Por decreto-lei de 02/02/45, foi designado o dia 02/12/45 para realização das
eleições para Presidente da República e para membros do Congresso. Assim foram
realizadas as eleições no dia marcado.

Eurico Gaspar Dutra foi eleito Presidente da República em dezembro de 1945


e tomou posse em 31/01/46.

Declarando-se “representante de todos os brasileiros”, inicia seu mandato


juntamente com a abertura da Assembléia Nacional Constituinte. Considera-se que o
fato mais importante ocorrido em sua gestão foi à promulgação da nova Constituição
(18/09/46).

Consta da Constituição: regime republicano, federativo, presidencialista e


representativo; eleições diretas para Presidente e Vice-presidente da República,
além de mandato de cinco anos; voto secreto e obrigatório, para maiores de 18
anos, salvo exceções; liberdade de opinião e de pensamento; defesa da propriedade
privada; igualdade de todos perante a lei e outras.
37

Quanto à família, consta nessa Constituição, título VI, capítulo I:

“Art. 163. A família é constituída pelo casamento de vínculo indissolúvel e terá direito
à proteção especial do Estado.

1.º O casamento será civil, e gratuita a sua celebração. O casamento religioso


equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei, assim o
requerer o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato inscrito no
registro público.

2.º O casamento religioso, celebrado sem as formalidades deste artigo, terá efeitos
civis, se, a requerimento do casal, fôr inscrito no registro público, mediante prévia
habilitação perante a autoridade competente.

Art. 164. É obrigatória, em todo o território nacional, a assistência à maternidade, à


infância e à adolescência. A lei instituirá o amparo das famílias de prole numerosa.

Art. 165. A vocação para suceder em bens de estrangeiro existentes no Brasil será
regulada pela lei brasileira e em benefício do cônjuge ou de filhos brasileiros, sempre
que lhes não seja mais favorável a lei nacional do de cujus.” (Constituição dos
Estados Unidos do Brasil, 1946: 45)

Praticamente sem oposição, o governo completou a institucionalização do


regime, organizando o Conselho Nacional da Economia, o Tribunal Federal de
Recursos e as Comissões de Planejamento Regional.

Intensificou as relações com os norte-americanos. Dessa amizade nasceu o


plano SALTE (Saúde, Alimentação, Transporte e Energia que constituíram os
objetivos do projeto, executado apenas em parte).

Dutra seguia as tendências liberais, seu governo foi considerado conservador


e sem muitas iniciativas. Desenvolveu seu mandato em ambiente de paz e
tranqüilidade.

Getúlio Vargas regressou novamente à Presidência da República em


03/10/50 quando foi eleito com quase maioria absoluta de votos. Sua posse ocorreu
em 31/01/51 com a sustentação dos militares.
38

Dizia retomar a liderança das massas populares, deixada pelo seu


afastamento em 1945. Surge como “porta-voz de todos os trabalhadores brasileiros”.

Getúlio buscava a conciliação de forças diferentes que sobressaíam na luta


pelo poder, ou seja, acreditava ser um intermediário entre as massas populares e o
próprio governo. Não se descuidava da manutenção da ordem social vigente,
aconselhando as pessoas a limitarem seus movimentos e protestos.

Em 1951 foi criada a Comissão Nacional de Bem-estar Social, com a


finalidade de promover os estudos e as providências indispensáveis à estruturação
de uma política tendo por meta a melhoria das condições de vida do povo brasileiro.
Essa comissão estava vinculada ao Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio.

“ ... No segundo governo de Vargas, ele ofereceu resistência à derrubada de


seus anseios de emancipação da economia brasileira. De um lado, o radicalismo
conservador se agitava com as formulações e com as realizações nacionalista do
Presidente da República. De outro, temia a participação das massas populares no
jogo político, mesmo através da mobilização controlada por Vargas e pela máquina
estatal. A política econômica de caráter nacionalista correspondia à política social de
natureza trabalhista. Assim, a política social do segundo governo de Getúlio Vargas
reduziu-se a um conjunto de deliberações predominantemente setoriais na
Educação, na Saúde Pública, na Habitação Popular, na Previdência Social e na
Assistência Social. Não houve transformações gerais e essenciais da política social,
mas decisões particulares a cada questão importante e urgente.” (Vieira, 1985: 230)

Após o suicídio de Vargas, quem assumiu o governo, em agosto de 1954, foi


o Vice-presidente Café Filho. Em novembro de 1955, o Presidente Café Filho, por
moléstia, foi substituído por Carlos Luz, Presidente da Câmara dos Deputados.
Como se acreditasse que se preparava um golpe de Estado, no dia 14 desse mesmo
mês foi o Presidente interino deposto pelo General Teixeira Lott, Ministro da Guerra,
com apoio de outros militares, cabendo a Presidência da República ao substituto
legal de Carlos Luz, Nereu Ramos (Vice-presidente do Senado).
39

Em 03/10/55 Juscelino kubitscheck foi eleito Presidente da República e João


Goulart, vice. Tomaram posse em 31/01/56.

Juscelino não tentava comparar-se a Vargas a nível dos compromissos com


as massas populares, principalmente no que diz respeito à Política Social. Agia
através de intervenções de cunho setorial, conforme as carências do momento.

Declarava-se “protetor dos trabalhadores” em suas conquistas. Porém não


conseguiu levar a cabo providências inovadoras voltadas para o atendimento das
carências da população.

“ ... O governo juscelinista delimitara o espaço consentido para a mobilização


dos trabalhadores, embora chegasse a admitir suas reclamações e até a concordar
com a influência deles sobre as alianças partidárias. A política econômica
preponderou sempre, no tempo de kubitschek, sobre a política social. O
desenvolvimento vinha para acabar com as precárias condições de vida. Mas, em
certo sentido, às vezes terminava por agravá-las e daí, dizia o Presidente da
República, tornava-se imperioso maior desenvolvimento. A política social vivia
unicamente de uma série de decisões apenas setoriais na Educação, na Saúde
Pública, na Habitação Popular, na Previdência e na Assistência Social. Não
aconteceram transformações mais profundas, capazes de alterar substancialmente a
política social. Kubitschek orientou suas decisões para os casos de emergência.
Indicam-se a Lei Orgânica da Previdência Social e sua Regulamentação como atos
de maior importância, realizados por ele no âmbito da política social. Durante o
governo juscelinista, desenvolveu-se em grande parte a Campanha em Defesa da
Escola Pública, como resposta autêntica ao projeto da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional.” (Vieira, 1985: 230–231)

Em 03/10/60 Jânio Quadros elegeu-se Presidente da República, substituindo


Juscelino. Tomou posse em 31/01/61.

“ ... Jânio Quadros jogou com a mágoa da pequena burguesia e assumiu a


auréola do carisma, tão a gosto das massas populares em seus momentos de
irracionalismo diante do poder político. Aos desgostos da pequena burguesia e ao
40

irracionalismo dos trabalhadores, ofertou uma política antiinflacionária que, enfim,


vinha prejudica-los.” (Vieira, 1985: 231)

Em 25/08/61 Jânio Quadros renuncia. Essa decisão surpreendeu toda


população brasileira. De acordo com a Constituição, quem deveria assumir o
governo com a renúncia de Jânio era seu Vice-presidente João Goulart. Porém os
militares, visando a propor um golpe, não concordavam, acusando-o de comunista,
haja vista que Goulart fez carreira graças a Vargas, por isso era tão odiado por
setores direitistas da sociedade e das Forças Armadas. Entretanto outros grupos
levantaram-se em defesa da Constituição.

“O Congresso Nacional propôs, então, uma solução negociada para a crise e


foi promulgado um Ato adicional que estabelecia o parlamentarismo no Brasil. No dia
07 de setembro de 1961, depois de doze dias de ameaça de uma guerra civil, Jango
assumiu o poder.” (Silva e Bastos, 1989: 289)

Por ocasião da renúncia de Jânio, Goulart encontrava-se no exterior, na


China Comunista; quem ocupou o cargo interinamente foi o Presidente da Câmara
dos Deputados Sr. Ranieri Mazzili.

João Goulart tomou posse no dia 07/09/61, indicando Tancredo Neves como
primeiro ministro. Sua posse foi tumultuada, pois havia um conjunto de obstáculos
impostos pelos opositores.

O sistema parlamentarista de governo manteve-se até 06/01/63, quando o


plebiscito trouxe de volta o presidencialismo. Foi a partir daí que Goulart começou
realmente exercer as funções de Presidente da República.

“ ... João Goulart confiou bastante na legalidade, embora por vezes se


propagasse o contrário. Como Jânio, João Goulart procurou vencer as
inconsistências políticas, econômicas e sociais, por meio da conciliação entre
ideologia nacionalista e capitalismo internacional. Jango defendeu mais
intensamente a contenção do custo de vida, ao mesmo tempo em que colocava a
emancipação econômica como condição de derrota do subdesenvolvimento. Os
41

eventos de 1964 eliminaram o projeto de reformas de base do período janguista,


acabando igualmente com a política de massas, presente até então no Brasil. As
reformas propostas por Goulart, de resultados parciais e acanhados em termos de
conquistas para os trabalhadores, conseguiram encontrar condições para pôr-se em
prática .... ” (Vieira, 1985: 231)

Como Jango pendia para reformas populares consideradas radicais como


desapropriações de terras e outras, exigindo para tanto uma nova carta
constitucional, muitos conservadores derrubaram-no com uma intervenção militar.
Assim, depois de fugir para o Rio Grande do Sul, ele asilou-se no Uruguai.

Estando João Goulart exilado, em 02 de abril, o cargo de Presidente da


República foi entregue ao deputado Ranieri Mazzilli. Ainda no dia 09 do mês de abril,
o denominado Supremo Comando Revolucionário (composto por três ministros
militares: Marechal Arthur da Costa e Silva, Brigadeiro Francisco de Assis Correia de
Mello e Vice-almirante Augusto Hamann Rademaker Guinewald) publicou o ato
institucional nº 1. O ato institucional concedeu o privilégio de retirar os direitos de
vários políticos por 10 anos, inclusive cassando mandatos legislativos federais,
estaduais e municipais, sem qualquer exame judicial dessas medidas. Ficou mantida
a Constituição de 1946 e as Constituições Estaduais com suas emendas.
Posteriormente, propôs-se a eleição do novo Presidente e Vice-presidente da
República pela maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional.

Foi indicado como candidato único o Marechal Castelo Branco, escolhido pelo
Supremo Comando Revolucionário e apoiado por várias entidades como a cúpula
militar, pelos governadores e, sobretudo, por grupos da burguesia.

Em 11/04/64 foi eleito, por eleições indiretas, pelo Congresso Nacional, para o
cargo de Presidente da República o Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco
e José Maria Alkimim, seu Vice-presidente. Assumiram o governo em 15/04/64.

Na área política, esse governo efetuou uma série de modificações


principalmente através da extinção dos vários partidos, criando em substituição
outros dois: a ARENA (Aliança Renovadora Nacional), à qual filiaram-se os
governistas e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), aqueles que
representavam a oposição.
42

A publicação do ato nº 2 normatizou a nova formulação partidária brasileira.


Em fevereiro de 1966 foi decretado o ato institucional nº 3, regulando as eleições
indiretas pelas Assembléias Legislativas e ainda em dezembro de 1966, saiu o ato
institucional nº 4 estabelecendo as condições de votação pelo Congresso Nacional
da nova Constituição.

A sexta Constituição do Brasil foi promulgada em 24 de janeiro de 1967, a


qual conservava o federalismo e reforçava o regime presidencial, determinando que
as eleições do Presidente e Vice-presidente da República fossem indiretas, por meio
de um colégio eleitoral, composto pelo Congresso Nacional e de delegados das
Assembléias Legislativas dos Estados.

Quanto à família, consta nessa Constituição, título IV:

“Art. 167 - A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos
Poderes Públicos.

Parágrafo 1.º - O casamento é indissolúvel.

Parágrafo 2.º - O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento


religioso equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e as prescrições da lei,
assim o requerer o celebrante ou qualquer interessado, contanto que seja o ato
inscrito no registro público.

Parágrafo 3.º - O casamento religioso celebrado sem as formalidades deste artigo


terá efeitos civis se, a requerimento do casal, for inscrito no registro público,
mediante prévia habilitação perante a autoridade competente.

Parágrafo 4.º - A lei instituirá a assistência à maternidade, à infância e à


adolescência.” (Constituição do Brasil, 1967: 63)

Em março de 1967, tomou posse o Marechal Arthur da Costa e Silva que fora
eleito em outubro de 1966 pelo Congresso Nacional. Assim, Costa e Silva passou a
governar de acordo com a nova Constituição da República Federativa do Brasil e
não Mais dos Estados Unidos do Brasil.
43

Na gestão de Costa e Silva houve inúmeros conflitos, não só entre policiais e


estudantes, como entre universidades. Por causa dessa situação que se agravava a
cada dia, o governo decretou o ato institucional nº 5, o mais rigoroso do que todos
aumentando os poderes do Executivo que assim poderia intervir nos Estados.

Em 1969 foi outorgada outra Constituição. Quanto à família, consta nessa


Constituição, título IV:

“Art. 175. A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos
poderes públicos.

1.º O casamento é indissolúvel.

2.º O casamento será civil e gratuita a sua celebração. O casamento religioso


equivalerá ao civil se, observados os impedimentos e prescrições da lei, o ato for
inscrito no registro público, a requerimento do celebrante ou de qualquer interessado.

3.º O casamento religioso celebrado sem as formalidades do parágrafo anterior terá


efeitos civis, se, a requerimento do casal, for inscrito no registro público, mediante
prévia habilitação perante a autoridade competente.

4.º Lei especial disporá sobre a assistência à maternidade, à infância e à


adolescência e sobre a educação de excepcionais.” (Constituição da República
Federativa do Brasil, 1969: 73)

Em fins de agosto de 1969, impedido por doença, Costa e Silva foi substituído
pela junta militar, não passando a Presidência da República a seu Vice-presidente
Pedro Aleixo, tolhido por um golpe de Estado dirigido por três Ministros militares:
General Aurélio de Lira Tavares (Exército), Brigadeiro Márcio de Sousa e Melo
(Aeronáutica) e Almirante Augusto Hamann Rademaker Grienewald (Marinha). Ao
Congresso Nacional coube a função de abrir suas portas para eleger o candidato
indicado pelas forças armadas: General Emílio Garrastazu Médici.

O General Emílio Garrastazu Médici foi eleito em 31 de outubro de 1969


Presidente da República pelo Congresso Nacional, juntamente com o Almirante
Rademaker Vice-presidente.
44

Médici enfatizava que em seu governo o país atravessava a fase de um


verdadeiro “milagre brasileiro”. Também publicou o primeiro Plano Nacional de
Desenvolvimento – PND.

“Internamente, o ‘milagre’ resultou de um grande desenvolvimento industrial


fundamentado na produção de bens de consumo, numa austera política salarial e
nas concessões de privilégios e vantagens aos empresários internacionais, o que
estimulou uma maior aplicação de capital, principalmente estrangeiro no Brasil. Esse
‘progresso’ econômico causou uma euforia consumista, onde a classe média,
beneficiada por altos salários, passou a consumir em larga escala e a praticar a
especulação imobiliária. Mas o grande beneficiado pelo ‘milagre’ foi o capital
estrangeiro, que praticamente passou a dominar a economia nacional, ‘engolindo’ a
pequenas e médias empresas e aumentando o endividamento externo, que passou a
consumir uma parcela considerável da riqueza nacional.” (Silva e Bastos, 1989: 297)

Emílio Garrastazu Médici foi fiel ao prazo de seu mandato.

O General Ernesto Geisel foi eleito Presidente da República pelo Congresso


Nacional, juntamente com o General Adalberto Ferreira dos Santos, assumindo em
15 de março de 1974.

Geisel deu prosseguimento à política econômica da gestão anterior. Em


dezembro de 1977, saiu o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND).

Em conseqüência das contestações, Geisel revoga o ato institucional nº 5 e


inicia o processo de abertura política.

O General João Batista Figueiredo assumiu a Presidência da República em


15 de março de 1979. Encontrou o país em profunda crise econômica, política e
social, ou seja, alta dívida externa, inflação galopante, economia em recessão,
desemprego crescente e muitas greves.

Figueiredo criou o terceiro Plano Nacional de Desenvolvimento (III PND).

Aprovou a nova Lei Orgânica possibilitando a organização dos partidos.


45

Em 20/08/79 foi aprovada a lei de anistia dos crimes políticos, quando a


maioria dos exilados voltaram ao país e os presos políticos foram soltos.

Em 1982 ocorreram eleições diretas para governadores de Estados.

Em 15 de janeiro de 1985, o colégio eleitoral escolheu, por ampla maioria,


Tancredo Neves como novo Presidente da República e José Sarney como Vice-
presidente. A posse deveria ser realizada em 15/03/85.

Na noite de 14/03/85, enquanto o país inteiro preparava-se para a posse do


primeiro Presidente da República civil após período militar, Tancredo Neves foi
internado no Hospital de Base de Brasília onde foi submetido a uma cirurgia de
emergência. O estado de saúde de Tancredo agravou-se a ponto de levá-lo à morte
na noite de 21 de abril.

José Sarney assumiu a Presidência da República prometendo concretizar os


planos de Tancredo, através de uma “Nova República”.

A “Nova República” originou-se de uma rearticulação de forças políticas do


país, em virtude do aprofundamento da crise decorrente do endividamento externo,
inflação galopante, arrocho salarial, especulação financeira, desemprego, serviços
precários de saúde, fome, entre outros. Essa situação por sua vez provocou ampla
mobilização, que ameaçava a estabilidade institucional, social e política da nação.
Contrariando os princípios reclamados pelas “Diretas Já”, um grupo de
parlamentares dissidentes do P.D.S. formaram a Frente Liberal, unindo-se ao
P.M.D.B. na chamada “Aliança Democrática”, que, no contexto político, significava
uma transição conservadora que se desdobrou no Colégio Eleitoral e no Governo
Sarney.
Em função das reivindicações e protestos da população brasileira frente a
gravidade situação econômica por que passava o país, o presidente José Sarney
cria, em 1986, uma plano de estabilização econômica chamado Plano Cruzado.
Posteriormente instaurou-se uma outra crise política e o governo lança o
Plano Cruzado II, voltando a aumentar os preços e a inflação.
Em 1987 o ministro da fazenda, Dílson Funaro, foi substituído por Luis Carlos
Bresser Pereira que também anuncia outro plano, o Bresser. Em 1988 muda-se
novamente o ministro da fazenda, assumindo Maílson da Nóbrega que anuncia o
Plano Verão e muda a moeda que passa a chamar-se cruzado novo.
46

“Essa sem dúvida foi a conjuntura dos planos desastrosos. A Nova República
pode ser entendida como um período de investidas ‘amadoras” na regulação macro
econômica da sociedade brasileira. “ (Paula, 2005: 84)

Em 05 de outubro de 1988, foi promulgada a Constituição da República


Federativa do Brasil, que continua vigorando até os dias atuais. Em relação à família
em seu capítulo VII, artigo 226, destaca:

“A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

1º O casamento é civil e gratuita a celebração.

2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem


e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento.

4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer


dos pais e seus descendentes.

5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente


pelo homem e pela mulher.

6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial
por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato
por mais de dois anos.

7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade


responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado
propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada
qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a


integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.”

Em 15 de março de 1990, Fernando Collor de Mello assumiu a Presidência da


República juntamente com Itamar Franco, enfatizando que pretendia fazer do país
um “Brasil Novo”.
47

Collor também baixou um pacote de medidas econômicas, financeiras e


administrativas, dando o nome Plano Brasil Novo, mais conhecido como Plano
Collor, ou Plano Cruzeiro. Porém, o presidente não conseguiu colocar em prática
várias propostas de seu plano.
Com a imposição de tantas medidas provisórias, Collor deixava claro o
autoritarismo do seu governo, provocando um descontentamento tanto no legislativo
como na maioria da população brasileira.

Fernando Collor de Mello, o primeiro Presidente eleito depois de quase trinta


anos de autoritarismo, foi acusado de cometer vários crimes (corrupção). Em
conseqüência dessas denúncias, foi formada uma Comissão Parlamentar de
Inquérito para apuração. Em 02/10/92 o Presidente Collor foi notificado de que a
Câmara dos Deputados lhe impusera afastamento do cargo para ser submetido a
um processo de “impeachment”. Nesse mesmo dia seu vice Itamar Franco foi
proclamado Presidente interino.

Itamar encontrou um país desmoronado, em total recessão, inflação


galopante, ou seja, um país com problemas econômicos, sociais e também políticos.

“Seguindo a tradição de seus antecessores, Itamar Franco, assume o governo


e após sucessivas trocas de ministros, anuncia um novo plano de estabilização
econômica sob o comando do então ministro da fazenda, Fernando Henrique
Cardoso. Nasceria aí o Plano Real.” (Paula, 2005: 93)

À medida que a pretensa estabilidade econômica foi mantida, o Estado deixou


de investir na área social ocasionando a ausência de um sistema de proteção social
de bases sólidas.
Assim o Estado passa a incentivar a sociedade civil a assumir boa parte da
questão social. Expande-se nesse período o terceiro setor que além de atender as
tradicionais demandas de serviços sociais, também focam suas ações em
reestruturação dos núcleos familiares.

Itamar teve muitas dificuldades, haja vista não ter canais de comunicação
com o mundo empresarial, sindical e, mesmo no mundo político, sua base era
precária. A maior realização dessa gestão foi dar início ao processo de estabilização
da economia. Conseguiu eleger seu sucessor.
48

Fernando Henrique Cardoso foi eleito presidente da república em 1994,


assumindo em 1995. Insistiu nas metas de estabilização propostas anteriormente
pela via do controle inflacionário e conseguiu como custo social desse processo:
desemprego, recessão, arrocho salarial etc.
Foi reeleito em 1998. O seu segundo mandato foi marcado: por turbulências
no cenário econômico internacional e pressões internas. Em seu governo houve uma
maior abertura da economia nacional ao capital estrangeiro e também grande déficit
social.
Em 2003 passa o cargo para o presidente Luís Inácio Lula da Silva que
também acabou sendo reeleito.
Lula assumiu a presidência da república em 2003 e convidou Antonio Palocci
para o ministério da fazenda. A primeira medida de sua gestão foi a implantação de
um grande programa social para combater a fome e a pobreza: o Fome Zero.

“Palocci e Meirelles aprofundam a chamada austeridade mantendo cada vez


maiores as taxas de juros, batendo recordes históricos na arrecadação de superávits
primário. Com a gorda poupança interna – ao contrário do que fez FHC que
privilegiou aumentar divisas focando na poupança externa – o pagamento da dívida
estaria assegurado. O risco Brasil diminuiu e a credibilidade no país causa um clima
de euforia, principalmente para o setor financeiro. Estrategicamente semelhante ao
antecessor a política econômica da equipe de Lula não apresenta possibilidades de
redistribuição efetiva da renda, não contempla a realização da propalada reforma
agrária, não revê as bases para uma política efetiva de criação de empregos e
também não retarda o avanço do setor privado no trato da questão social.” (Paula,
2005: 110)

“Logo notamos que o papel da família em constituir-se como núcleo que


possibilita a satisfação das necessidades de seus membros – mesmo com as crises;
não se transfere mecanicamente para as demais esferas da vida social, por
imposição e necessidade dela própria. Esta transferência pode aparecer de maneira
diferenciada pelos contextos e construções históricas, mas o fato é que nem mesmo
governos ou grupos sociais significativos são capazes de desconsiderar a
capacidade mutante da família. (...) A família nesse sentido não só pode apresentar
um desgaste em suas relações e enfraquecer suas possibilidades de prover
estratégias de sobrevivência, como pode também, ao mesmo tempo, reforçar os
49

vínculos e pactuar novas formas de relacionamento com vistas a superação das


dificuldades ... .” (Paula, 2005: 105)

Não se pretendeu neste trabalho proceder a uma análise profunda dos


governos brasileiros em seus aspectos políticos, econômicos e sociais, mas
demonstrar que esses cenários afetaram as famílias.
50

II

2 – POLÍTICA SOCIAL VOLTADA A FAMÍLIA, NA CONTEMPORANEIDADE

Segundo Cormely4 (1987), na década de 1940, para grande parte dos


analistas do tema, a família era vista segundo a concepção funcionalista, de corte
positivista, conceituada como a célula básica da sociedade, como um universo
fechado, estático, de relações intrafamiliares.

“A família nuclear tem sido tratada predominantemente, no âmbito das


ciências sociais, pela linha teórica do funcional-estruturalismo. Dentro dessa
perspectiva teórica, a sociedade é considerada como um sistema em equilíbrio, no
qual os diversos componentes se encontram num estado de interdependência,
desempenhando funções essenciais para a subsistência e funcionamento da
sociedade como um todo. Essa abordagem enfatiza o estudo da sociedade com
base nas inter-relações que se estabelecem entre o sistema social e as instituições,
destacando-se a maneira como estas contribuem para o funcionamento da
sociedade, ficando os indivíduos num segundo plano e sujeito às estruturas
estabelecidas. Com base nesses pressupostos, pode-se tratar das diversas
instituições sociais dentro da perspectiva do equilíbrio e da funcionalidade do
sistema. Assim, a família é vista como um componente do sistema social cujo bom
funcionamento permite atingir um equilíbrio na vida social.” (Calderón e Guimarães,
1994: 23–24)

As políticas sociais, neste período, eram setoriais (crianças, mulheres,


deficientes, idosos, negros e outras) e não focalizadas para a família de forma
global, conforme se almeja na atualidade.

O Estado pretendia garantir a reprodução, a proteção e a socialização da


sociedade. Para tanto, tentou assumir algumas funções das famílias, entre elas a
educativa. Com a instrução obrigatória, acreditou-se que o conhecimento

4
Neste segundo capítulo, grande parte do referencial teórico são as Revistas Serviço Social &
Sociedade.
51

socialmente necessário para as crianças/adolescentes poderia ser transmitido pela


escola. Assim, a maioria das mães começou a se preocupar mais com a saúde física
e emocional do filho.

Quanto à assistência aos doentes e aos idosos, em muitos casos, passou a


ser relegada às instituições. Com o tempo não mais se viam membros de três
gerações viverem juntos, e os conhecimentos tão necessários, passados de uma
geração a outra, acabaram sendo desvalorizados.

Para muitos, a casa deixou de ser o lar, passando a ser mais um albergue
onde os filhos encontravam alimento e abrigo. Seus membros, pela vida corrida,
deixaram de conversar e de dividir afeto ou felicidade.

Esses e outros fatores implicaram a mudança de numerosas e importantes


funções sociais das mulheres no seio da família, principalmente na gestão da esfera
afetiva.

Nesse período, o discurso era permeado pela concepção da família nuclear


burguesa e quem não se enquadrava nessa regra era considerada “desorganizada”.
Assim, problemas que afetaram a relação de parentesco com o desemprego, os
“vícios” os mais variados, a violência etc, foram designados como “desestruturação”
da família. Acreditavam que, para resolver os problemas, era só educar a mesma. O
pai devia ser o chefe da casa, a mãe submissa e “bondosa”, e os filhos educados
dentro de uma rígida disciplina moldada aos padrões tradicionais.
Justificava-se que a sociedade tinha “problemas” porque a família estava
deixando de cumprir suas responsabilidades. A família era culpabilizada pela
estrutura social em que ela estava inserida, sem que a mesma fosse colocada em
questão.

Alguns pesquisadores chegaram a essas conclusões porque seus estudos


foram fragmentados teoricamente e localizados contextualmente, não gerando
trabalhos com amplitude suficiente para entender as transformações que ocorreram
com as famílias de forma global.

Na verdade, a família não se desestruturou, mas sim houve mudanças nas


relações de gênero e nas relações amorosas que estavam vinculadas às
transformações que afetaram os ideais pré-concebidos, principalmente nas práticas
conjugais.
52

A família não estava acabando, como acreditavam vários estudiosos, na


época, mas mudando seu perfil, ou seja, o que esteve agonizando foi a idealização
romântica que vários pesquisadores construíram sobre ela, tornando-a dependente
desse modelo.

“O conceito de famílias conjugais e nucleares, chefiadas pelo provedor


masculino, é, portanto, uma construção duplamente problemática para inúmeras
sociedades, bem como para o Brasil. Nem as famílias nem os domicílios são
necessariamente conjugais ou nucleares, nem tampouco exclusivamente chefiados
por membros masculinos. (...) A denominação chefia familiar feminina é em si
reveladora, pois é empregada tão-somente quando o homem adulto não está
presente, como se a família chefiada por mulheres fosse uma anomalia, pois não se
faz a discriminação da terminologia por gênero quando a situação é inversa, ou seja,
quando o homem está presente. A tradição nos recenseamentos, nos programas
governamentais, nas práticas sociais quotidianas tem imposto, dessa forma, um
padrão de autoridade e de responsabilidade econômica familiar que nem sempre
corresponde à realidade ou é reconhecida pela própria família.” (Carvalho, 1998: 77)

O grupo familiar extenso, ou a junção de parentes ou amigos, ou a pequena


comunidade rural criam sistemas próprios que garantem os padrões de reprodução
social. A vida no grupo familiar aumenta as possibilidades de se garantir a
sobrevivência dos membros.

Os períodos de transição caracterizam-se pelas reconfigurações no interior


dos grupos em redor das relações de parentesco. Essas remodelações são
marcadas por mudanças gerais que influenciam ou determinam, de acordo com o
tempo histórico e o contexto social, transformações que se operam nas relações
intergrupais.

Em tantos contextos de crise, como a família poderia desenvolver suas


funções essenciais de núcleo central de intimidade e de procriação, educação,
socialização, geração de um ambiente de paz, amor e apoio a seus membros?
Obviamente ela teve que se defender com seus meios para garantir a sobrevivência
de sua prole.
53

Tentou-se moldar a família como instituição do sistema para reproduzir o


modo de produção capitalista, para gerar nela apenas as transformações
convenientes. Porém, como ela é dinâmica, acabou se rebelando ao modelo que lhe
foi imposto porque precisava sobreviver.

As políticas sociais desse Estado capitalista sempre obedeceram aos


interesses da acumulação. Assim, as de proteção à família também seguiram essa
lógica.

Outros pesquisadores, já naquela época, compreenderam a sociedade em


movimento, inacabada, em construção e reconstrução e, conseqüentemente, a
família também em movimento, em mudança permanente. Ela é a mediação entre a
sociedade e os indivíduos.

Nesse contexto mais geral, a família é o núcleo básico da produção e


reprodução social, um sujeito histórico.

“A família permanece sendo a única forma de comunidade real, é a ‘casa’, o


‘porto seguro’ do indivíduo. No mundo externo ninguém tem piedade do outro,
ninguém se interessa pela personalidade do outro e é dentro da família que cada um
deseja receber atenção, respeito e o reconhecimento da própria personalidade. O
termo ‘casa’ não significa mais apenas o local de moradia, a cidade, ou o país de
nascimento, ‘casa’ é agora muito mais do que isto, é sinônimo de família. Assim, a
família torna-se a esfera íntima da existência, o local exclusivo onde se pode exprimir
a própria emoção e agregar-se aos outros. O local onde se pode relaxar em
conjunto, o local enfim onde se pode desfrutar a sensação de pertencer. Representa,
ainda, o lugar onde se pode refazer-se das humilhações sofridas no mundo externo,
expandir a agressividade reprimida, exercitar o próprio autocontrole, repreender e
vencer o outro.” (Heller, 1987: 10)

No cotidiano da família existe um movimento dialético entre elementos


repetitivos e inovadores. É no seio dela que se desenvolve o movimento de
produção e reprodução das relações sociais e onde também se desenvolve a
natureza histórica do ser social.
54

A família deve ser enxergada dentro da sociedade de classe em que vivemos.


Também não se podem entender as transformações que vêm ocorrendo com as
famílias fora da divisão do trabalho.

A família é uma instituição social historicamente determinada que, ao mesmo


tempo, produz impactos societários.

Pesquisadores entenderam que a família não pode ser vista como um modelo
único, pois ela se transformou. Novas configurações surgiram. Ela continua, mas
hoje não existe família e sim famílias.

2.1 – RELAÇÕES ENTRE FAMÍLIA E ESTADO, NAS ÚLTIMAS DÉCADAS

A família ocupa, na atualidade, uma posição de centralidade no âmbito da


sobrevivência material. Isso porque as condições de vida dos indivíduos dependem
da inserção social de todos os membros da família, pois é aí que ocorrem as mais
diversas formas de alternativas para superar as situações de precariedade social.

A família é um canal de iniciação e aprendizado dos afetos e das relações


sociais e é o alicerce para que os indivíduos desenvolvam suas primeiras
experiências como membros da sociedade.

“... A família revela-se como um dos lugares privilegiados de construção social


da realidade a partir da construção social dos acontecimentos e relações
aparentemente mais naturais. De facto, é dentro das relações familiares, tal como
são socialmente definidas e regulamentadas, que os próprios acontecimentos da
vida individual que mais parecem pertencer à natureza, recebem o seu significado e
através destes são entregues à experiência individual: o nascer e o morrer, o
crescer, o envelhecer, a sexualidade, a procriação.” (Saraceno, 1992: 12)

A socialização ocorre na família, na escola, igreja, mídia etc.


55

“A família não é o único canal pelo qual se pode tratar a questão da


socialização, mas é sem dúvida, um âmbito privilegiado, uma vez que este tende a
ser o primeiro grupo responsável pela tarefa socializadora. A família constitui uma
das mediações entre o homem e a sociedade.” (Carvalho, 2002: 90)

É na família que se identificam a multiplicidade de possibilidades e


experiências de vida, organizadas pelos indivíduos com vistas à reprodução
biológica e social.

Os estudos sobre as funções da família na sociedade capitalista também


tornam evidente o papel dela como unidade de renda e consumo.

“ ... A família não é um simples terminal passivo de mudança social, mas um


dos actores sociais que contribuem para definir as formas e os sentidos da própria
mudança social, ainda que com diferentes graus de liberdade e segundo as
circunstâncias.” (Saraceno, 1992: 14)

“ ... Fenômeno eminentemente histórico, a família tem também uma história


interna própria, que transforma continuamente as regras e as formas das relações, e
as gerações, bem como as relações e os intercâmbios entre família e sociedade.”
(Saraceno, 1992: 16)

No Brasil, a família sempre funcionou como anteparo social, diante da


inexistência de políticas públicas que assegurem a proteção social.

A centralidade da família como elemento vital para os indivíduos justifica-se


diante da despolitização das questões referentes à reprodução social dos
trabalhadores. É, através da família e do trabalho, que seus membros vislumbram
possibilidades de inserção social.

No quadro atual de retração do Estado da esfera social, a família passa a ser


revalorizada. Na ausência de direitos sociais, é na família que os indivíduos tendem
a buscar alternativas para lidar com as circunstâncias difíceis. Assim, as situações
mais complexas de precariedade social como desemprego, doença etc, são
56

consideradas como problemas da esfera privada que devem ser solucionadas no


seio da família.

Pereira destaca que as famílias são:

“... fortes, porque elas são um componente central da integração social mediante a
qual os indivíduos podem encontrar um refúgio contra o desamparo e a exclusão.
Fortes, ainda, porque é nelas que se dá a reprodução e onde são transmitidos
valores culturais básicos. Mas elas também são frágeis pelo fato de que não estão
livres de despotismos, violência, confinamentos, desencontros e rupturas. Tais
rupturas, por sua vez, podem gerar inseguranças, mas também abrir as portas para a
emancipação e o bem-estar de indivíduos particulares. Novamente aqui se ressalta o
caráter contraditório da família.” (1995: 109)

Sobre as formas familiares se constroem mitos positivos e negativos.

“Analogamente, ao lado das imagens também contemporâneas da família


refúgio, da família lugar de intimidade e de afectividade, espaço de autenticidade,
arquétipo de solidariedade, da privacidade, juntam-se às imagens da família como
lugar de inautenticidade, de opressão, de obrigação, de egoísmo exclusivo, a família
como geradora de monstros, de violência, a família que mata.” (Saraceno, 1992: 13)

“O que torna comuns todas estas imagens diferentes, mesmo na sua


contraditoriedade, é por um lado a sua a-historicidade, e por outro, o facto de
parecerem considerar a família como uma realidade plenamente enquadrada,
interiormente homogênea e apreciável como tal em qualquer contexto social e
histórico – precisamente a família.” (Saraceno, 1992: 13)

As famílias chefiadas por mulheres, na atualidade, são alvo de políticas


sociais por vários motivos, entre eles:

- cada vez mais ocorre o aumento de famílias sem a presença masculina


(chefiadas por viúvas, mães solteiras ou mulheres separadas);
57

- crescente isolamento feminino na manutenção econômica da família, ou seja,


a mulher é responsável pela sobrevivência do grupo familiar,
independentemente da família contar com a presença de um homem;

- as mulheres serem vistas apenas como mães e “donas de casa”, com


disponibilidade de tempo e receberem status secundário e complementar ao
do marido.

“Dadas as características predominantes da sociedade brasileira, do sistema


de valores e parentesco existentes e da ausência do Estado no provimento da
satisfação de necessidades básicas, um enorme contingente de pessoas sobrevive
graças aos processos de redistribuição que ocorrem dentro das famílias e
domicílios.” (Carvalho, 1998: 93)

Na última década, a família tornou-se o elemento central da intervenção das


políticas de assistência social, enquanto alvo privilegiado dos programas sociais.

À medida que o Estado restringe sua participação na atenção de questões de


determinados segmentos (crianças, adolescentes, deficientes, idosos etc), a família
tem sido chamada a preencher esse espaço.

Nas metas de intervenção social, apresentadas pelos neoliberais, eles


recomendaram uma maior participação da iniciativa privada na prestação de bens e
serviços sociais.

Assim, o Estado vem propondo:

- descentralização: repartição de responsabilidades entre os governos federal,


estadual, municipal e iniciativa privada;

- participação: envolvimento dos atores sociais na provisão de benefícios e


serviços;

- co-responsabilidade: criação de redes informais e comunitárias para a


prestação de assistência social.

O Estado vem distribuindo algumas de suas responsabilidades para a


sociedade, da qual a família faz parte. Porém, com tantas mudanças se
58

processando, como esperar que a família possa ser um agente tranqüilo de proteção
social?

Não podemos atribuir às famílias, principalmente àquelas em situação de


vulnerabilidade, uma função de proteção aos seus membros sem lhes oferecer
meios para isso.

O Estado vem deixando de assumir muitas de suas responsabilidades e


depositando nas famílias uma sobrecarga que, na maioria das vezes, elas não
conseguem suportar, levando em consideração as precárias condições sócio-
econômicas da maioria da população. Isso é acentuado quando se trata de
configurações familiares que não são reconhecidas social e legalmente.

As constituições brasileiras, até 1969, reconheciam, para fins de proteção do


Estado, apenas a família constituída pelo casamento.

A ampliação do conceito de família ocorreu na constituição de 1988, sendo


reconhecidos, no artigo 226, o concubinato, as famílias monoparentais e a igualdade
de direitos e deveres entre marido e mulher. Porém, mesmo assim, ainda percebe-
se a reafirmação do casamento como a forma ideal de família:

“3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem
e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento.

4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade familiar formada por


qualquer dos pais e seus descendentes.

5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente


pelo homem e mulher.” (Constituição da República Federativa do Brasil, 1988: 155)

A Constituição Brasileira de 1988 incorporou algumas mudanças ocorridas


nas famílias na atualidade, todavia não contemplou totalmente a sua diversidade.

No contexto brasileiro, as famílias têm sido chamadas a assumirem um lugar


de destaque na política social. A Constituição Federal de 1988, em seu capítulo VII,
artigo 226 destaca:
59

“A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado” e no


parágrafo 8º “O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos
que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas
relações.”

Na Política Nacional de Assistência Social aprovada em Novembro de 2004,


consta no capítulo 3, item 3.1.1:

“... Por reconhecer as fortes pressões que os processos de exclusão


sociocultural geram sobre as famílias brasileiras, acentuando suas fragilidades e
contradições, faz-se primordial sua centralidade no âmbito das ações da política de
assistência social como espaço privilegiado e insubstituível de proteção e
socialização primárias, provedora de cuidados aos seus membros, mas que precisa
também ser cuidada e protegida.”

Acredita-se que, mesmo com tantas transformações, a família não perdeu o


que lhe é essencial, suas possibilidades de proteção, socialização e criação de
vínculos relacionais.

O Estado não pode devolver à família a responsabilidade com a reprodução


social, sobrecarregando-a, sem lhe dar condições para tanto. Só tornando-se de fato
alvo de políticas que levem em consideração as novas configurações da questão
social no Brasil, é que poderemos atribuir mais responsabilidades às famílias.

A família passou a ser vista como base estratégica para a condução de


políticas públicas, beneficiária de serviços e programas. Porém, o assunto ainda
constitui um desafio a ser pesquisado.
60

2.2 – QUESTÃO SOCIAL, IMPLANTAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL E ATUAÇÃO


COM FAMÍLIAS

A preocupação com a questão social expressa-se, no Brasil, com a formação


e o desenvolvimento da classe operária, exigindo seu reconhecimento no cenário
político. Foi a partir do momento em que o proletariado se fortaleceu politicamente
através de suas reivindicações e pressões organizadas em lutas por direitos, que o
Estado passou a intervir, não mais através da repressão, mas da instituição de
políticas sociais e da prestação de serviços sociais.
O serviço social começa a ser implantado no Brasil após o fim da primeira
guerra mundial. Sua origem está vinculada aos movimentos operários, entre eles os
de 1917 e 1921, que, com suas reivindicações e lutas, colocam ao estado a
necessidade de responder à questão social, através das políticas sociais. Ganha
destaque, nesse sentido, a “intervenção moral” do assistente social junto à família
operária, buscando “integrá-la” à sociedade.

“À medida que aprofundam a experimentação empírica dos ‘problemas


sociais’, através das diversas frentes em que se decompõe sua atuação, com maior
precisão os assistentes sociais vêem a necessidade de intervir na crise de ‘formação
moral, intelectual e social’ da família. É necessário reajusta-la através de uma ação
educativa de longo alcance, para que obtenha um padrão de vida que lhe possibilite
um ‘mínimo de bem-estar material’, a partir do qual se poderá começar sua
reeducação moral. Procuram, portanto, segundo uma perspectiva muito próxima à
filantropia tradicional – que tanto criticam – minorar de forma autoritária e paternalista
esses problemas de ordem material.” (Iamamoto e Carvalho, 1986: 212)

Assim, a política social desenvolvida a partir do Estado pós-30 é aplicada nos


meios urbanos, onde a legislação social é ampliada, buscando o controle da classe
operária através de legislação sindical, com medidas de proteção ao trabalho.
61

“Em suma, é preciso reeducar a família – e a religião será o esteio moral de


sua estabilidade – e leis que garantam o direito da família e dos filhos na sociedade,
abono familiar, e salários que permitam um mínimo de bem-estar, exonerando a
mulher da necessidade de trabalhar fora do lar.” (Iamamoto e Carvalho, 1986: 214)

Inicia-se pela mobilização da igreja, através de seu movimento católico leigo,


tendo por meta a moralização da questão social e a cristianização da sociedade,
principalmente pela perda dos valores tradicionais, em conseqüência do
desenvolvimento capitalista.

Quando, em 1936, foi fundado pelo CEAS (Centro de Estudos e Ação Social
de São Paulo) a primeira Escola de Serviço Social do Brasil, já existia uma demanda
de instituições que necessitavam de pessoas com formação técnica especializada
para intervir na realidade.

“A questão social fica, assim, relegada a um obscuro segundo plano. ‘A


questão social não atraiu a atenção das lideranças católicas, que dela não se
ocuparam concretamente. Sobre questões sociais foram raros os artigos na revista A
Ordem, nos anos 20 a 30; na Pastoral de 1922 foi muito pequena a referência que
lhe foi feita’. As análises, pouco freqüentes, sobre a situação do proletariado,
assumem apenas o caráter de constatação das penosas condições de trabalho a que
eram submetidas mulheres e crianças, e de crítica moralista, à promiscuidade entre
sexos nas oficinas e a desagregação da família.” (Iamamoto e Carvalho, 1986: 148)

O serviço social inicia-se no Brasil como profissão, principalmente atuando no


setor público e organizações patronais privadas de caráter empresarial que visavam
a ampliar o controle junto à sociedade civil.

“A Escola de Serviço Social passará por rápidos processos de adequação. O


primeiro se dá a partir do convênio firmado entre o CEAS e o Departamento de
Serviço Social do Estado, em 1939, para a organização de Centros Familiares. Essa
demanda terá por reflexo a introdução no currículo da Escola de um Curso Intensivo
de Formação Familiar: pedagogia do ensino popular e trabalhos domésticos. O
62

segundo se dará, logo em seguida, para atender à demanda das prefeituras do


interior do Estado.” (Iamamoto e Carvalho, 1986: 181)

Iamamoto e Carvalho, expõem que:

“... o alvo predominante do exercício profissional é o trabalhador e sua


família, elemento mais vital e significativo do processo de produção ... .” (1986: 86)

Ainda segundo Iamamoto e Carvalho, as Escolas de Serviço Social contavam


com muitos alunos bolsistas patrocinados principalmente pelo Estado, por grandes
instituições estatais ou para-estatais, como as Prefeituras Municipais, o
Departamento Nacional da Previdência (e os diversos institutos e caixas), a Legião
Brasileira de Assistência, o Serviço Social da Indústria, o Serviço Nacional de
Aprendizagem Industrial etc.

“Os relatos existentes sobre as tarefas desenvolvidas pelos primeiros


assistentes sociais demonstram uma atuação doutrinária e eminentemente
assistencial. Os Centros Familiares organizados pelo CEAS a partir de convênio com
o Departamento de Serviço Social do Estado, que funcionam a partir de 1940 em
bairros operários e que se deveriam constituir em modelo de prática de serviço
social, não fugiram a essa caracterização. Sua finalidade seria a de ‘separar as
famílias das classes proletárias, prevenindo sua desorganização e decadência e
procurando elevar seu nível econômico e cultural por meio de serviços de assistência
e educação. Nesses Centros manterão serviços diversos, como plantão para
atendimento de interessados, visitas domiciliares, bibliotecas infantis, reuniões
educativas para adultos, curso primário para proteger as crianças cujas mães são
obrigadas a trabalhar fora’ cursos de formação familiar (moral e formação doméstica
para o lar), restaurante para operários, etc. O tratamento dos casos será
basicamente feito através de encaminhamentos, colocação em empregos, abrigos
provisórios para necessitados, regularização da situação da família (casamento, etc)
e fichário dos assistidos.” (Iamamoto e Carvalho, 1986: 193-194)

Nos anos seguintes começam a se organizar novas escolas de serviço social


em outros Estados.
63

“ ... O portador dessa qualificação não mais necessariamente será uma moça
da sociedade devotada ao apostolado social. Progressivamente se transformará num
componente de força de trabalho, possuindo uma determinada qualificação
englobada na divisão sócio-técnica do trabalho.” (Iamamoto e Carvalho, 1986: 183)

Iamamoto e Carvalho também observam o caráter conservador do serviço


social, em sua origem, a serviço das classes dominantes, e como é possível que, em
outro momento, parcela da profissão passe a se posicionar de outra forma, em favor
das classes subalternas, influenciada pelo movimento de reconceituação. Os
autores lembram que não se questionou, nas duas situações, a realidade do
mercado de trabalho do assistente social.

“Ora, o serviço social, como instituição componente da organização da


sociedade, não pode fugir a essa realidade. As condições que peculiarizam o
exercício profissional são uma concretização da dinâmica das relações sociais
vigentes na sociedade, em determinadas conjunturas históricas. Como as classes
sociais fundamentais e suas personagens só existem em relação, pela mútua
mediação entre elas, a atuação do assistente social é necessariamente polarizada
pelos interesses de tais classes, tendendo a ser cooptada por aqueles que têm uma
posição dominante. Reproduz também, pela mesma atividade, interesses
contrapostos que convivem em tensão. Responde tanto a demandas do capital como
do trabalho e só pode fortalecer um ou outro pólo pela mediação de seu oposto.
Participa tanto dos mecanismos de dominação e exploração como, ao mesmo tempo
e pela mesma atividade, da resposta às necessidades de sobrevivência da classe
trabalhadora e da reprodução do antagonismo nesses interesses sociais, reforçando
as contradições que constituem o móvel básico da história. A partir dessa
compreensão é que se pode estabelecer uma estratégia profissional e política, para
fortalecer as metas do capital ou do trabalho, mas não se pode excluí-las do contexto
da prática profissional, visto que as classes só existem inter-relacionadas. É isto,
inclusive, que viabiliza a possibilidade de o profissional colocar-se no horizonte dos
interesses das classes trabalhadoras.” (Iamamoto e Carvalho, 1986: 75)
64

José Paulo Neto, em seu livro Ditadura e serviço social: uma análise do
serviço social no Brasil expôs que, desde o final da década de 1950, parcela dos
profissionais principalmente envolvidos com as lutas sociais começam a questionar o
tradicionalismo do serviço social apontando para a problematização do
conservadorismo do SS. Segundo ele, esse é um início do processo de ruptura que
vai ser desencadeado nos anos sessenta, devido a vários fatores, dentre eles, o
processo de renovação profissional que se dá em função da erosão das bases do
Serviço Social tradicional.
Nos anos oitenta o projeto de ruptura tem condições de se fortalecer porque a
sociedade brasileira vivia um momento de redemocratização, oferecendo as
possibilidades de ressurgimento dos movimentos sociais, de organização política da
categoria profissional. O CBAS de 1979 foi um marco nesta direção.
O movimento de renovação do serviço social, que foi impulsionado a partir
dos anos 60 pelo processo de erosão das bases do serviço social tradicional, pelo
movimento de reconceituação, entre outros, ganha força na década de oitenta com a
organização política da categoria e a sua produção teórica.
Essa renovação rebate nas discussões sobre a família no serviço social,
como podemos observar na Revista Serviço Social & Sociedade nº 21 – no
Relatório-síntese do Seminário Latino-americano sobre Família e Comunidade.

O Seminário Latino-Americano ocorrido em Porto Alegre/RS no período de 11


a 15 de maio de 1986 foi um evento preparatório para a XXIII Conferência
Internacional onde se discutiu a questão da família, da comunidade e sua inserção
no processo de desenvolvimento social.

Os três temas desenvolvidos no seminário foram:

I – A família e a comunidade latino-americana

II – A família e a comunidade: ação dos organismos oficiais, privados e movimentos


populares.

III – A família e a comunidade: perspectivas de mudanças e alternativas de ação

Nessa conferência chegou-se à conclusão, através dos trabalhos


apresentados, de que a América Latina encontra-se em crise social que repercute
diretamente sobre a família.
65

“A aguda crise social que assola nosso continente por certo traz inúmeras
repercussões sobre a família que, enquanto unidade social, expressa e reproduz as
contradições da sociedade em que se insere.” (Martinelli e Alayon, 1986: 147)

“A família encontra-se em crise, incapaz de responder às funções que lhe são


próprias e, por outro lado, não encontra no Estado, cujo aparato político-institucional
encontra-se defasado, respostas à suas demandas no plano social.” (Martinelli e
Alayon, 1986: 144)

Na América Latina, onde os países se inserem no “Terceiro Mundo”, cuja


característica é o capitalismo periférico e dependente, se busca o estabelecimento
de política social que possa gerar o fortalecimento da relação familiar.

“Tornam-se imprescindíveis o revigoramento da família e da comunidade, o


resgate do exercício da cidadania, da capacidade de organização e de luta, como
forma de avançar no processo de desenvolvimento social.” (Martinelli e Alayon, 1986:
142)

“A família, portanto, dentro de um enfoque teórico-crítico mais abrangente,


passa a ser visualizada como um potencial agente sócio-político de transformação.”
(Martinelli e Alayon, 1986: 145)

É importante o papel político, social, econômico e cultural da família na


perspectiva dos processos de transformação social.

“Neste sentido, a família nuclear, clássica, própria do paradigma positivista,


praticamente será absorvida por outras formas de organização social, sofrendo,
portanto, radicais transformações.” (Martinelli e Alayon, 1986: 145)
66

Foi a partir desse momento que as faculdades começaram a implantar a


extensão na rotina universitária, com verdadeiros projetos-pilotos, visando a testar
as propostas de renovação do serviço social.

“O próprio papel do Estado diante da questão familiar deve ser revisto, assim
como a prática social deve passar por profundas transformações, apoiando-se
essencialmente em uma política educativa e participativa e não mais assistencialista
e paliativa.” (Martinelli e Alayon, 1986: 145)

A implantação do serviço social esteve relacionada às profundas


transformações econômicas e sociais que ocorreram na sociedade brasileira.

Os assistentes sociais sempre foram considerados agentes profissionais


preparados para implementarem políticas sociais, porém poucos se dão conta da
quantidade de ferramentas de que dispõem para promover mudanças e acabam,
muitas vezes, se acomodando, sendo apenas executores das exigências
institucionais.

O assistente social, no exercício de sua função, em qualquer organização,


dedica-se ao planejamento, operacionalização e viabilização de serviços sociais
para a população. Atua como intermediário entre a instituição e os usuários dos
serviços. Dispõe de um poder de selecionar os indivíduos que têm ou não direitos de
usufruir dos programas/projetos institucionais, devido à incapacidade da rede de
atender todo o público que necessita dos serviços sociais.

O assistente social também não pode esquecer sua condição de intelectual


que pode produzir conhecimentos científicos explicando o que identifica na prática
teoricamente.

Por trabalhar com a questão social nas suas mais variadas expressões
cotidianas, entre elas a família, o assistente social dispõe de um acervo privilegiado
de dados e informações que, analisados, poderão fornecer subsídios para propostas
de trabalhos inovadoras.
67

III

3 – ANÁLISE DA REVISTA SERVIÇO SOCIAL & SOCIEDADE

A primeira Revista Serviço Social & Sociedade foi editada no ano de 1979
pela Cortez. Somente em 1982, revista nº 8, foi publicado um artigo pertinente ao
tema família.

Segundo estatística fornecida pela editora, em 28/11/06, por e-mail, até a


presente data foram elaboradas 88 revistas, sendo cerca de 740 mil o número de
exemplares publicados, porque houve muitas reedições. A Cortez conta com 800
articulistas do país e alguns do exterior e 95% pertencem à categoria de Assistentes
Sociais.

Identificamos que, nesses 27 anos de existência (1979 a 2006), foram


escritos 39 textos com o título sobre família. Entre esses, 2 artigos em espanhol, 1
em francês e 10 de autores de outras áreas (advogado, filósofa, antropólogo,
sociólogos e economista). Apenas 26 autores eram assistentes sociais brasileiros,
ou mestrandos ou doutorandos em serviço social e alguns em parceria com outros
profissionais.

Assim, nos detivemos no terceiro capítulo, nos artigos escritos por assistentes
sociais brasileiros, mas somente aqueles pertinentes às famílias brasileiras; por este
motivo os textos de Cristina Almeida Figueiras (1993) que trata das trabalhadoras
sociais e as famílias pobres em Paris, e o de Louis Ruddelesden traduzido por
Viviane N. A. Guerra (1995), que retrata um trabalho desenvolvido na Inglaterra, não
foram analisados aqui. Porém estes e os demais artigos foram lidos e muito
contribuíram, para nossa reflexão, nos capítulos anteriores.

Segue tabela com títulos dos artigos sobre família.


68
69

REVISTAS SERVIÇO SOCIAL & SOCIEDADE – ARTIGOS SOBRE FAMÍLIA

Nº DA ANO DE TÍTULO AUTOR FORMAÇÃO


REVISTA PUBLICAÇÃO

08 1982 Pró-família: planejamento Maria Virgínia Hermácula, Assistentes Sociais


familiar ou controle da Marista A. Evangelista,
natalidade? Neusa C. Lima e Yurico
Tatamiya

11 1983 A família e a propriedade no Carlos Simões Advogado


código de menores

21 1986 Relatório-síntese do Maria Lúcia Martinelli e Assistente Social e


seminário latino-americano Norberto Alayon
Assistente Social
sobre família e comunidade

22 1986 A família e a comunidade: Maria Cecília Tobón Assistente Social


perspectivas de mudança e
alternativas de ação

24 1987 A concepção de família no Agnes Heller Filósofa marxista


estado de bem-estar social húngara
70

24 1987 A violência no cotidiano das Maria Amália Faller Vitale Assistente Social, Mestre
famílias de camadas em Serviço Social e
populares Terapeuta de família.

25 1987 Seminário latino-americano Seno Antonio Cornely Assistente Social


sobre família e comunidade
– palestra de abertura

25 1987 La família y la comunidad Maria Atilano Uriarte, Assistente Social e


latino americana Lautaro Prado Bravo
Assistente Social

33 1990 Administração da produção Maria das Dores Costa e Assistente Social e


doméstica e reprodução da Sandra Lúcia B. Cavalcanti Doutora em Serviço
força de trabalho das Social e
famílias inseridas no setor
Mestre em Administração
informal de Natal, RN

37 1991 Planejamento familiar como Rosi Maria Sinjal Assistente Social


um direito humano: uma
experiência em empresa do
interior do Paraná
71

42 1993 As trabalhadoras sociais e Cristina Almeida C. Assistente Social


as famílias pobres em Paris Figueiras
(1919 – 1939)

42 1993 A proteção social destinada Maria do Carmo Brant Assistente Social e


às famílias brasileiras Doutora em Serviço
Social

42 1993 Informativo sobre o Ano Romeu Kazumi Sassaki Assistente Social


Internacional da Família

46 1994 Das famílias José Rogério Lopes Antropólogo e


“desestruturadas” às famílias Doutorando em Ciências
“recombinadas”: transição, Sociais da PUC/SP
intimidade e feminilidade

46 1994 Família: a crise de um Adolfo Ignácio Calderón, Sociólogo, Mestrando em


modelo hegemônico Rosamélia Ferreira Ciências Sociais da
Guimarães PUC/SP e Assistente
Social, Doutoranda em S.
S. da PUC/SP
72

46 1994 A mulher migrante Maria Luzia Clemente Assistente Social e


nordestina e a organização Mestre em Serviço Social
do cotidiano na dinâmica do pela PUC/SP
seu grupo familiar

48 1995 Desafios contemporâneos Potyara A. P. Pereira Assistente Social


para a sociedade e a família

48 1995 A experiência com famílias Louis Ruddlesden e Assistente Social e trad.


substitutas em Kent Tradução e notas de Viviane Mestre e Doutoranda em
N. A. Guerra Serviço Social

49 1995 El análisis de las políticas Nidia Aylwin de Barros Assistente Social e


sociales desde una Mestre em Educação
perspectiva familiar

55 1997 Família e Serviço Social: Regina Célia Tomaso Mioto Assistente Social e
contribuições para o debate Doutora em Saúde
Mental
73

57 1998 Famílias chefiadas por Luiza Carvalho Mestre em Economia e


mulheres: relevância para Doutora em Sociologia
uma política social dirigida

64 2000 Desenvolvimento da política Carlos Aurélio Pimenta de Sociólogo, Mestre em


sueca para a família: Faria Ciências Sociais e
múltiplas lógicas e inflexões Doutor em Ciência
Política

67 2001 Poder judiciário e violência Lourdes de Maria Leilão Assistente Social e


doméstica contra a mulher: a Nunes Rocha Mestre em Políticas
defesa da família como Públicas pelo UFMA
função da Justiça

67 2001 Família de apoio: uma Abigail Aparecida de Paiva Assistente Social e


experiência inovadora Franco Doutoranda em S. S.

67 2001 Néthodologie de la médiaton Justin Lévesque por Eliedite Mediador familiar e


familiale Mattos Ávila – Tradução de Assistente Social
Eliedite Mattos Ávila
74

71 2002 Viver em família como Heloisa Szymanski Psicóloga, Mestre e


experiência de cuidado Doutora em Psicologia
mútuo: desafios de um da Educação
mundo em mudança

71 2002 Perspectivas jurídicas da Silvia Pimentel Doutora em Filosofia do


família: o novo código civil e Direito
a violência familiar

71 2002 Famílias monoparentais: Maria Amália Faller Vitale Assistente Social e


indagações Doutora em Serviço
Social

71 2002 O trabalho da mulher, Virginia Paes Coelho Assistente Social e


relações familiares e Doutora em Serviço
qualidade de vida. Social

71 2002 Família e proteção social: Dalva Azevedo Gueiros Assistente Social e


questões atuais e limites da Doutoranda em Serviço
solidariedade familiar Social
75

71 2002 A família na Amazônia: Carlos Alberto Batista Maciel Mestre em Antropologia


desafios para a assistência e Doutorando em
social Sociologia

71 2002 Os saberes construídos Lucia Cristina dos Santos Doutora em Serviço


sobre a família na área da Rosa Social e Doutora em
saúde mental Sociologia

71 2002 Famílias: uma experiência Rosamélia Ferreira Assistente Social, Mestre


em grupo Guimarães e Doutora em Serviço
Social

71 2002 Famílias de baixa renda na Regina Maria Giffoni Assistente Social, Mestre
periferia do município de Marsiglia e Doutora em Ciência
São Paulo: questões para os Política
serviços de saúde

76 2003 Os problemas das famílias Margarida Cerqueira, Cientista da Educação,


multiproblemáticas: Daniela Figueiredo, Ana Socióloga, Cientista da
comparação da perspectiva Matos, Susana Pires e Educação, Socióloga e
dos profissionais e das Eliana Monteiro Psicóloga
próprias famílias
76

80 2004 Retratos da vida das famílias Susana Pires, Ana Matos, Socióloga, Socióloga,
multiproblemáticas Margarida Cerqueira, Cientista da Educação,
Daniela Figueiredo e Liliana Cientista da Educação e
Sousa Psicóloga

81 2005 Direito à convivência familiar Dalva Azevedo Gueiros e Assistente Social ,


Rita de Cássia S. Oliveira Doutoranda em S. S. e
Assistente Social, Mestre
em S. S.

83 2005 Relato de experiência: Abigail Aparecida de Paiva Assistente Social e


instituição do programa Franco Doutora em Serviço
família de apoio na direção Social
de política pública de
acolhimento

86 2006 Gênero, políticas públicas e Cássia Maria Carloto Doutora em Serviço


centralidade na família Social pela PUC/SP
77

Observação: as formações dos profissionais citados nesta tabela são referentes à época da redação.
78

Esta pesquisa documental, tendo por base os textos da Revista Serviço


Social & Sociedade, possibilitou a seleção de algumas tendências sobre famílias, a
partir de parâmetros que foram orientados pela nossa análise teórica geral, levando
em conta:
- se os autores trataram das transformações que ocorreram com as famílias na
história;
- se situaram a família em um contexto mais amplo, apontando as
determinações históricas e elementos que influenciaram e a particularizaram;
- se eles explicitaram concepções de família.
Agrupamos as produções em dois blocos: o primeiro, que abrange artigos
escritos entre as décadas de setenta e oitenta, que pertencem a um período
marcante na trajetória da profissão e da sociedade brasileira, porque foi nesse
momento que após a ditadura a sociedade se reorganizou politicamente, oferecendo
as possibilidades de ressurgimento dos movimentos sociais e de organização
política da categoria profissional. Também em 1988 foi promulgada uma nova
Constituição, possibilitando que o Serviço Social continuasse se fortalecendo em seu
processo de ruptura com o conservadorismo e na construção do projeto ético-político
profissional. Esse processo de renovação do Serviço Social se expressou na
produção teórica e nas discussões sobre a família que também apareceram na
Revista Serviço Social & Sociedade, que cumpre um papel importante na divulgação
das idéias da profissão nesse contexto. O segundo bloco de textos abrange os da
década de noventa em diante, momento em que o Serviço Social esteve atento às
mudanças que se processaram rapidamente na sociedade provocando
repercussões na economia, política, cultura etc, exigindo que os assistentes sociais
fizessem a critica à globalização neoliberal, defendessem as políticas públicas frente
ao desmonte do Estado e os direitos e as conquistas das classes trabalhadoras.
Observamos as seguintes características das abordagens sobre a família:
- A família não é tratada a partir dela mesma, mas em relação a um contexto
mais amplo, que, em geral, foi visto como sendo determinado por:
– condições econômicas e situações de classe;
– influências ideológicas e políticas;
– determinações culturais e morais
79

- Nas conjunturas, a família foi abordada em relação aos seguintes elementos:


– as políticas públicas para a família;
– gênero, violência e família;
– trabalho e família;
– gênero, trabalho e políticas públicas;
– gênero, violência e família;
– a família e a criança e o adolescente;
– a família e o portador de transtorno mental.

- As concepções teóricas sobre a família.

3.1 – BLOCO UM: A DÉCADA DE OITENTA

3.1.1 – As políticas públicas para a família

Vários textos trouxeram questões sobre os critérios que deveriam orientar a


formulação das políticas para a família. Observamos que os que foram produzidos
na década de oitenta expressaram a renovação do Serviço Social em busca de
superação de sua perspectiva tradicional, de construção de uma crítica à visão
conservadora, o que foi conquistado pela profissão com as transformações do
currículo das escolas de Serviço Social, em 1982, com a mudança do Código de
Ética, em 1986, com a produção teórica influenciada pelo marxismo, com Iamamoto
(Iamamoto e Carvalho, 1982), com a organização política da categoria, tendo como
marco o “Congresso da Virada” (1979), entre outros.
Os artigos de Serviço Social desse período se destacaram, pela visão
histórica, por situar criticamente as políticas sociais e a política de família no
capitalismo, em uma perspectiva de totalidade.
Ressaltamos os que apresentam as discussões e propostas do Seminário
Latino–Americano sobre Família e Comunidade, realizado em Porto Alegre, em
1986:

Maria Lúcia Martinelli e Norberto Alayon (1986) expuseram que o Seminário


foi uma iniciativa do Conselho Internacional de Bem-Estar Social, composto por 76
80

Comitês Nacionais e 24 Organizações Internacionais de Desenvolvimento e Bem-


Estar Social, que se organizaram para promover um evento preparatório para a XXIII
Conferência Internacional. O evento promoveu a reflexão sobre a questão da família,
da comunidade e de sua inserção no processo de desenvolvimento social, visando
do estabelecimento de uma política social capaz de gerar o fortalecimento da
relação familiar. Fizeram uma síntese dos temas tratados, os resultados das
discussões, inclusive concepções de famílias e movimentos sociais, já expostos no
2º capítulo deste trabalho. Finalizaram com alguns questionamentos objetivando
levantar outras reflexões para diversos profissionais, entre eles, os assistentes
sociais: o sistema social predominante na maioria dos países não prioriza o
desenvolvimento social, sendo que grande parte dos problemas que atingem a
população tem sua origem no social, porém a ordem social reinante tenta exigir dos
oprimidos a solução dessas dificuldades. A atuação do serviço social se dá no bojo
das contradições das relações sociais, devendo os profissionais acabar com as
concepções ingênuas que vigoraram por muito tempo, encarando as limitações de
sua ação e ao mesmo tempo se colocando a serviço das classes populares.
Maria Cecília Tobón (1986), no mesmo seminário, propôs a implementação
de várias políticas (desenvolvimento econômico, habitação, saúde, educação,
cultura entre outras). Também enfatizou a necessidade da revisão dos códigos de
família objetivando garantir a defesa do direito ao desenvolvimento integral e
incentivando a liberdade de todos seus membros. Destacou a necessidade de
serviços básicos que possibilitem a participação das famílias nas propostas de
alternativas de soluções para seus problemas, inclusive revendo o conceito de
planejamento familiar, adequando-o ao contexto sócio-cultural do país.

Seno Antonio Cornely (1987), também se referindo a esse seminário, indicou


a contradição existente nas políticas de proteção à família, que possibilita a
reprodução da lógica de acumulação produzindo, simultaneamente, algum benefício
à família e aos seus membros. Ele propôs que as políticas para essa demanda
fossem tratadas em relação com as demais políticas. Esclareceu que a precariedade
de vida da maioria das famílias, frente ao sistema capitalista reinante, dificulta que
elas assumam suas funções fundamentais. Salientou a necessidade de politizar as
famílias para que elas participem na elaboração de propostas dessas políticas
sociais. Expôs que o Estado deve deter maior atenção na temática familiar, além da
81

necessidade da revisão do conceito de família para que possa atender as


transformações por que elas passaram.
Na década de oitenta também houve críticas aos programas de governo para
a família, a exemplo do Pró-Família, programa do Governo do Estado de São Paulo,
implantado pela Secretaria da Promoção Social (SEPS), para planejamento familiar.
O artigo de Maria Virgínia Hermácula, Marista A. Evangelista, Neusa C. Lima e
Yurico Tatamiya, produzido a partir de um TCC5 (1982), discute a questão dos
movimentos sociais e do controle da natalidade, vinculando o Programa aos
interesses internacionais da BENFAM (Sociedade Civil Bem-estar Famíliar no
Brasil). Segundo as autoras o programa não atende a realidade da população
porque não ataca as causas dos problemas. O Estado quis conter o aumento da
população pobre utilizando-se de paliativos. Consideraram que as pessoas não têm
consciência da sua situação dentro da estrutura social. O Pró-família também
interfere na reprodução humana, onde mulheres não têm o direito de optar entre ter
filhos ou não, além do espaço de tempo entre eles. As autoras destacaram que as
mulheres devem ter o direito de decidir sobre seu número de filhos sem a
interferência do Estado. E qualquer política para essa demanda deve ser
implementada com ampla discussão entre todos os setores sociais. A Associação
Profissional dos Assistentes Social de São Paulo – APPASSP - encerrou o artigo
protestando contra a implantação do programa e denunciando a forma autoritária
com que o mesmo foi elaborado.

3.1.2 – Gênero, violência e família

Também é característico das produções desse período o trabalho em


comunidade, a valorização da participação popular, das classes subalternas, a
pesquisa participante, o trabalho com mulheres.
Maria Amália Faller Vitalle (1987), ao apresentar sua experiência prática,
realizada em um trabalho comunitário com mulheres, em 1978, em Embu-Guaçu.,
mostrou situações de violência na família. Através da pesquisa participante, onde a

5
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado pelas autoras à Faculdade de Serviço Social da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação da professora Graziela Acquaviva
Pavez, em dezembro de 1981.
82

autora foi discutindo com as mulheres e suas famílias os problemas de seu


cotidiano, foram se apresentando diversas formas de violência vividas por elas e
pelos filhos, que são retratadas no texto. Através dos depoimentos verificou-se que a
tarefa de servir cabe tanto à mulher/esposa como à mulher/filha, ou seja, o cuidado
com a casa, além da educação dos filhos e irmãos. Ao mesmo tempo, o não
cumprimento dessas funções, adequadamente, pode gerar a violência que se
manifesta nas agressões verbais e físicas. Assim, a família passa a ser o local onde
também ocorre a violência, em conseqüência da insatisfação de seus membros. Ao
mesmo tempo, o medo do abandono faz com que essas mulheres suportem a
violência, porque um homem em casa significa proteção contra a violência externa,
além de também poder contar com alguém que se responsabilize por elas. Por esse
motivo as mulheres se sentem numa situação de dependência, existindo uma
relação assimétrica no casamento. Porém o que se identificou na realidade foi que
as mulheres, sem ter clareza disso, têm um importante papel, através do seu
trabalho, na sobrevivência da família.

3.2 – BLOCO DOIS: A DÉCADA DE NOVENTA E O NOVO SÉCULO

Entre as grandes transformações que ocorreram com o capitalismo, nas


últimas décadas do século vinte, destacamos as do mundo do trabalho que geram o
desemprego, a perda dos direitos, afetando a vida dos trabalhadores e dos
profissionais. Repercute na família, em sua estrutura econômica e emocional,
acirrando a violência, entre outros aspectos. Isso rebate na produção teórica do
Serviço Social. A partir da década de noventa, o trabalho aparece como um tema de
pesquisa e de produção teórica do Serviço Social. Nesse contexto, na Revista
Serviço Social e sociedade, a discussão da família é relacionada com as políticas
públicas, com o trabalho, com a questão de gênero, da violência etc. Com a
globalização também começaram a ser mais divulgadas as experiências
internacionais com programas e políticas para a família. É também na década de
noventa que o ECA é aprovado, o que rebate na Revista, em artigos sobre a relação
entre a família e a criança e o adolescente. Em seu Editorial, a Revista Serviço
Social e Sociedade nº 42, em 1993, informa que o ano de 1994 seria dedicado, pela
83

ONU, à família. Nesse número é publicado o informativo: “preparando-nos para o


Ano Internacional da Família”.
Na década de oitenta, foram publicados 08 artigos sobre família, enquanto
que apenas entre 1993 e 1995 foram publicados 09 artigos, o que mostra um grande
desenvolvimento do debate sobre família neste período.

3.2.1 – Trabalho e família

O primeiro artigo sobre família da década de noventa, de Maria das Dores


Costa e Sandra Lúcia Barbosa Cavalcanti (1990), trata da administração da
produção doméstica e reprodução da força de trabalho das famílias inseridas em um
setor informal em Natal, no Rio Grande do Norte, onde ocorreu uma pesquisa em
800 domicílios, com famílias de baixa renda. As autoras destacaram que ocorre a
produção doméstica através de atividades desenvolvidas no lar, onde se realizam
tarefas necessárias à reprodução da força de trabalho diária e geracional, além dos
serviços que os membros da família prestam uns aos outros. Quando o ganho da
família diminui, desorganiza-se a produção doméstica, acarretando a necessidade
de mais membros ingressarem no mercado de trabalho. As pessoas que participam
da produção doméstica, na pesquisa realizada, são basicamente mulheres e filhos.
Sendo que os filhos em sua maioria combinam tarefas no lar com estudo ou outras
atividades que gerem rendimentos. Também foi significativo o percentual de
mulheres com ocupações extradomésticas (emprego formal e informal). Com essa
atividade, a mulher fica sobrecarregada por uma dupla jornada de trabalho. Nessa
pesquisa observou-se que a maioria das mulheres só permanecem no trabalho por
necessidade, ou seja, ausência do marido ou complementação do orçamento
familiar. Porém identificou-se que, na maioria dos domicílios, a maior parte das
mulheres ainda permanecem cuidando de seus lares, participando os filhos do
mercado de trabalho, principalmente os maiores de 18 anos. Quando a mulher
necessita ingressar no mercado de trabalho sobra para os filhos assumirem as
tarefas domésticas.
Rosamélia Ferreira Guimarães expõe o trabalho realizado com famílias
pobres no Programa de Renda Mínima, no município de Santo André/S.P. Segundo
a autora “... a atenção direta aos grupos de famílias favorece a expressão de sua
84

vivência cotidiana, em termos de sua estrutura, colaborando para que não se sintam
marginalizadas e deslocadas face à realidade. Ao mesmo tempo, é construída com
elas uma nova concepção de família como lócus onde existem afeto, solidariedade e
responsabilidade.” (2002: 177). O trabalho com grupos possibilita a ampliação do
conhecimento do que se passa na atualidade com as famílias para facilitar a atuação
dos diversos profissionais com essa realidade.

3.2.2 – Gênero, trabalho e políticas públicas

A questão de gênero aparece vinculada ao trabalho e às políticas públicas.


Maria Luzia Clemente (1994) comentou uma pesquisa de campo em serviço
social, realizada com mulheres que migraram do nordeste brasileiro para a capital,
na década de 80. Essas mulheres, nos momentos difíceis recorreram a instituições
assistenciais como a Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor – FEBEM e
Instituto de Assuntos da Família – IAFAM, de São Paulo. Objetivou-se com esse
estudo compreender os papéis que essas mulheres desempenhavam na dinâmica
de seu grupo familiar, e para tanto se pesquisou seus históricos de vida. Teceu
algumas considerações sobre o trabalho no nordeste, situou São Paulo no contexto
nacional, a mulher e a organização do cotidiano na dinâmica do grupo familiar,
educação dos filhos, aspectos sobre as relações familiares e as características da
família nordestina. A decisão de migrarem para São Paulo se deu em função da
busca de melhores condições de emprego e vida para as famílias. As mulheres
assumindo o papel de chefe da casa ou permanecendo ao lado do
marido/companheiro tem um dinamismo incontestável, tomando iniciativas, suprindo
assim as necessidades que surgem no seu cotidiano. Porém, quando existe um
homem na família, de forma geral, este auxilia na segurança do convívio familiar.
Maria Amália Faller Vitale chama a atenção para esta nova forma de família
apontando que foi a partir dos anos 1970 que elas passam a ter visibilidade. Informa
que as famílias monoparentais masculinas são em número menor que as femininas.
Esclarece que isto também implica na questão da pobreza e conseqüentemente nos
efeitos perversos que recaem sobre as famílias. Essas questões podem levar a
discriminações, como subentender que as mulheres são menos “capazes” de cuidar
de suas famílias. Ainda segundo a autora, “...a associação entre famílias
85

monoparentais, chefiadas por mulheres e pobreza aponta claramente estes


segmentos como foco de critérios para programas sociais.” (2002: 51) Complementa
que na realidade estes programas sociais dirigidos a essa demanda “...deverão
contribuir para sua autonomia e não para estigmatizá-las como sem condições de
oferecer cuidados e proteção aos seus membros.” (2002: 52) Destacou o sistema de
trocas intergeracionais, colocando o papel dos avós como anteparo diante das
fragilidades familiares e também as redes de solidariedade. Lembrou que não se
deve entender um período de tempo onde ocorre a monoparentalidade como algo
negativo.
Virginia Paes Coelho (2002) descreve uma parte da pesquisa por ela
realizada quanto às mudanças ocorridas nos padrões de conduta feminino nas
últimas décadas, estudando histórias familiares de duas gerações de segmentos
médios, e nascidas na década de 1960. Destaca o ingresso das mulheres no
mercado de trabalho como fator mais importante relacionado às transformações que
ocorreram com as famílias, porém, mesmo apresentando maior grau de instrução do
que os homens, permanecem ganhando menos. Expõe sobre a discriminação que
muitas mulheres sofrem no ambiente e relações de trabalho; além do acúmulo de
tarefas que elas têm que assumir. Destaca que a presença dos filhos é o fator que
mais interfere em relação à participação feminina no trabalho. Todavia mais
mulheres começam a ter consciência de que o trabalho é uma possibilidade
emancipadora em sua vida (realização pessoal) e que os pais começaram a
colaborar mais nos cuidados e educação dos filhos.
Cássia Maria Carloto chama a atenção para necessidade de ampliar o debate
teórico no campo das políticas públicas que contemplem a questão de gênero.
Coloca que “... embora o conceito de gênero tenha ganhado força e destaque
enquanto instrumento de análise das condições das mulheres, não deve ser utilizado
como sinônimo de ‘mulher’. O conceito é usado tanto para distinguir e descrever as
categorias mulher e homem, como para examinar as relações estabelecidas entre
eles.” (2006: 142) A proposta do artigo foi enfocar as dificuldades enfrentadas pelas
mulheres. Observou que há necessidade de políticas públicas de enfrentamento das
desigualdades de gênero pensadas no conjunto das desigualdades sociais.
86

3.2.3 – Gênero, violência e família

No contexto do novo século, a violência é um tema que invade o cotidiano e


também demanda a reflexão teórica.
Lourdes de Maria Leilão Rocha analisa a violência contra a mulher, problema
que se encontra nas “relações assimétricas entre homens e mulheres marcadas pela
desigualdade, pela hierarquização e pela dominação.” (2001: 113) e que rebate na
família. Como mostra a autora, vivemos em uma sociedade “... estruturada por
relações de classe, de gênero, e de raça/etnia, caracterizadas pela dominação e
pela desigualdade, em que a instituição familiar constitui um dos elementos
utilizados para a reprodução e manutenção da ordem social vigente.” (2001: 114).
Nesse contexto, justiça-se o silêncio e a omissão em relação à violência contra a
mulher tendo em vista a defesa da instituição familiar.

3.2.4 – A família e a criança e o adolescente

Três textos tratam da questão da criança e do adolescente em relação à


família, tendo em vista a lei (ECA e Constituição) e o sistema judiciário. O sistema
sócio-jurídico é um tema que começa a ser debatido no início do novo século no
Serviço Social por envolver um grande número de assistentes sociais e questões
muito complexas, especialmente ligadas à família.
O artigo de Abigail Aparecida de Paiva Franco (2001) retratou uma
experiência vivenciada na cidade de Franca que substituiu a institucionalização de
crianças e adolescentes pela família de apoio e teve resultados muito significativos.
Dalva Azevedo Gueiros e Rita de Cássia Silva Oliveira (2005) tratam da
importância da convivência familiar para a criança e o adolescente. Reconhecem a
dificuldade de se garantir esse direito, previsto em lei, frente à crise econômica,
política e social por que passa o país, que gera uma série de problemas, afetando
principalmente as famílias mais pobres. A convivência familiar se difere de uma
camada social para outra, e em qualquer delas não se pode assegurar a capacidade
protetora da relação parental. O desenvolvimento dessa condição na família está
relacionado a fatores econômicos, culturais, sociais etc. Quando existem
87

deficiências, seus membros, entre eles as crianças e os adolescentes, ficam sujeitos


a maior vulnerabilidade social. Assim, a crise por que passa o país repercute
diretamente em muitas famílias que deixam de ter condições de prover os mínimos
necessários à sobrevivência de sua prole, ocasionando transtornos para a
convivência familiar. Essa deficiência no acesso a trabalho e políticas públicas
ocasiona abandono de crianças porque os próprios pais ou responsáveis se sentem
negligenciados pelo Estado, acarretando, em alguns casos, a necessidade de
entrega desses filhos para serem criados por terceiros. Trazem alguns dados da
prática de abrigamento, entre eles a informação de que, após a promulgação do
Estatuto da Criança e do Adolescente, houve o crescimento da rede de abrigos,
mesmo a lei prevendo priorizar a convivência familiar. Expõem que, na
impossibilidade de convivência dos filhos com seus pais biológicos, também existe a
possibilidade da família substituta, em lugar do abrigamento. Porém, tanto a prática
de institucionalização como a família substituta somente são viáveis quando
esgotados todos os recursos para que as famílias assumam os cuidados e educação
das crianças e adolescentes.
Abigail Aparecida de Paiva Franco (2005) escreveu outro texto sobre família
de apoio descrevendo as ações desenvolvidas ao longo da década de 1990 até o
ano de 2004, relatando assim sua experiência como assistente social. O artigo
decorreu da tese de doutorado6. Franco faz um detalhamento da ação para
implantação do programa, expondo marcos evolutivos na implementação, a busca
da consolidação da política de acolhimento, formação do aparato jurídico e
administrativo do programa, sistematização e regulamentação na esfera municipal e
judiciária, configuração do trabalho de acolhimento e fontes de financiamento. O
programa foi assumido pela Prefeitura de Franca, através da Secretaria de
Assistência Social, Juizado da Infância e Juventude e Conselho Tutelar. Concluiu
que para esse programa prossiga alcançando os resultados almejados deve
continuar contando com as famílias de apoio que concretizam o acolhimento.
Enfatizou também que o Estado só conseguirá eficiência na atenção da criança e do
adolescente através do esforço comunitário. Esse deve atender aos anseios da
população, tendo o devido amparo técnico e financeiro do Estado. Finalizou

6
A tese foi intitulada A família acolhedora na comarca de Franca, defendida em 2004, no Programa
de Pós-graduação em Serviço Social da UNESP/Franca sob a orientação da professora doutora
Maria Rachel Tolosa Jorge.
88

ressaltando que a família de apoio em Franca é hoje uma política pública, fruto do
esforço coletivo e da ação democrática e participativa.

3.2.5 – A família e o portador de transtorno mental

Lúcia Cristina dos Santos Rosa (2002) fez um balanço histórico da relação
família com o portador de transtorno mental. Para a autora a família sofre com a
enfermidade e ao mesmo tempo acaba sendo, muitas vezes, culpabilizada pelas
causas da doença. Retorna a história desde o nascimento da psiquiatria para que os
leitores possam entender o que ocorre na contemporaneidade na área. Relata que
foi a partir dos anos de 1980, depois da reforma psiquiátrica, que o tema família na
área de saúde mental passou a ter maior visibilidade.

3.2.6 – As políticas públicas para a família

Em 1991 a Revista publicou um artigo onde outra autora expôs que acredita
no planejamento familiar. Relatando sua experiência Rosi Maria Sinja expõe o
trabalho desenvolvido com funcionários (as) de uma empresa e seus familiares,
onde a maioria das famílias conta com número de filhos acima de 4 e com renda
familiar mensal em torno de 2 salários mínimos. A equipe que desenvolveu o projeto
foi composta por assistente social, médicos e técnicos de medicina do trabalho. A
assistente social ficou responsável pela atuação com as mulheres. A campanha
atingiu 260 domicílios. Primeiramente atuou-se na prevenção de várias doenças,
entre elas o câncer. Posteriormente prosseguiu-se com a implantação do programa
de planejamento familiar, com reuniões, onde foram tratados os temas: câncer de
mama, doenças sexualmente transmissíveis, AIDS, hipertensão, verminoses,
vacinação etc. Rosi concluiu que pode sim haver um trabalho de planejamento
familiar que obtenha resultados satisfatórios, desde que desenvolvido por pessoas
89

sérias e compromissadas e sem a interferência de órgãos governamentais que


tenham outros interesses.
90

Maria do Carmo Brant (1993) lembra que a proteção e a promoção das


famílias ficaram esquecidas por muito tempo, chegando-se a minimizar o seu papel
social. O Estado acreditou que poderia garantir a reprodução, proteção e
socialização dos membros das famílias. O indivíduo foi eleito politicamente como
foco de atenção das políticas públicas. O trabalho com famílias passou a ser
periférico e, na maioria das vezes, como uma prática conservadora e disciplinadora.
Assim, quando se atuava com família, ela não era o alvo, mas a mulher, a criança, o
idoso, o deficiente, o negro e outros. Na contemporaneidade, com o descaso do
Estado com as políticas sociais, ressurgiram a família e a comunidade. A família,
como unidade econômica e como direito da criança. A comunidade, como
possibilidade de o Estado partilhar responsabilidades. Na atualidade a sociedade-
providência brasileira é a base de proteção da família. É nela que as camadas
populares se organizam para resistir e encontrar soluções para continuar
sobrevivendo frente às carências e pobreza. Também é nela que se organizam
redes não-governamentais de verdadeira solidariedade para auxiliar nos momentos
de crise. Essa sociedade providência é composta por: solidariedade parental e
conterrânea (parentes, vizinhos, compadres, como suportes nas situações difíceis),
solidariedade apadrinhada (onde um ou mais membros da família mantêm laços
próximos com as classes média e alta assegurando um canal de doação de roupas,
remédios etc.), a solidariedade missionária (as várias igrejas através de seus
programas pastorais, representam suporte espiritual, emocional, afetivo e material).
A autora alertou para a necessidade de repensar as ações cotidianas destinadas às
famílias, atentando em que situações elas vivem e quais suas reais necessidades.
Romeu Kazumi Sassaki (1993) expôs que 1994 foi proclamado pela
Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) como o Ano
Internacional da Família (AIF). Para tanto, haveria necessidade da junção de todos
os setores da sociedade, envolvidos com essa questão, para organização dos
preparativos das atividades a serem desenvolvidas nesse ano. Romeu propôs no
informativo ações imediatas e inadiáveis a serem tomadas, explicou o que significa o
emblema AIF, o tema, os objetivos e os princípios do AIF e sugeriu propostas para
1993 e 1994.
Adolfo Ignácio Calderón e Rosamélia Ferreira Guimarães (1994) destacaram
que em 1994 estava sendo comemorado o Ano Internacional da Família e que a
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lançou a Campanha da
91

Fraternidade com o tema: “A família como vai?” Os debates ocorridos nesse período
foram em relação à importância da família como espaço de desenvolvimento e
socialização dos cidadãos e da falta de programas sociais voltados para essa
demanda. Também foi salientada a dificuldade de os trabalhadores sociais atuarem
com famílias diferentes do modelo da nuclear burguesa. Expuseram sobre o modelo
de família da linha teórica do funcional estruturalismo, dos novos arranjos familiares
que existem na atualidade, na família ideal tão sonhada e outros (informações já
constantes nos capítulos anteriores). Concluíram que muitos trabalhadores sociais
não têm conseguido vislumbrar as mudanças que vêm ocorrendo nas estruturas das
famílias ocasionando dificuldades para o trabalho cotidiano com elas.

Potyara A P. Pereira (1995) descreveu as mudanças ocorridas nas estruturas


das famílias brasileiras, entre elas: queda da taxa de fecundidade, diminuição do
número de casamentos e aumento das separações, alteração na composição da
unidade familiar (novos arranjos), aumento do número de famílias monoparentais, ou
seja, chefiadas por um só dos cônjuges, e de forma geral chefiada por mulheres
viúvas, descasadas ou solteiras. Destacou, que na atualidade, não é mais
concebível compreender somente a família como o modelo nuclear composto por
pai, mãe e filhos, que existia há 50 anos. Também não se devem entender essas
mudanças ocorridas nas estruturas das famílias como tendências negativas, ou
sintomas de crise. As transformações que vêm ocorrendo com as famílias são
conseqüências das transformações econômicas, políticas e culturais do Brasil.
Também todas essas mudanças têm atingido e modificado os tradicionais
mecanismos de solidariedade familiar. Para a autora o Estado deve continuar
proporcionando políticas públicas, mas que atendam realmente a necessidade das
famílias brasileiras.
Regina Célia Tamaso Mioto (1997) expõe sua preocupação quanto à relação
teoria/prática colocando que existem poucas reflexões teóricas do serviço social na
temática família, comparado ao que a categoria poderia contribuir uma vez que
mantém contato direto com essa demanda cotidianamente. Informa alguns dados da
Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio – IBGE realizada em 1994 quanto às
características da população brasileira para explicar as causas das mudanças
ocorridas na configuração da família. Finaliza o artigo expondo que no espaço
institucional a família não é atendida de forma integral, mas sim cada indivíduo
92

separadamente. Na realidade a família necessita de atendimento como um todo e


não apenas um membro dela que necessita de atenção, como se cada problema
não fizesse parte da mesma estrutura. Então os problemas identificados nas famílias
devem ser analisados dentro de uma perspectiva de totalidade e fazendo parte de
um processo de contínuas mudanças.
Dalva Azevedo Gueiros (2002) coloca sua preocupação quanto à ausência de
políticas de proteção social voltadas às famílias brasileiras. Observa que o Estado
vem se retraindo nesse campo e a família passou a ser vista como alternativa para o
enfrentamento de determinados problemas sociais. Fez breve histórico da família, do
processo de modernização em que ela está inserida, expôs questões atuais da
família e finaliza o artigo enfatizando a necessidade de investimento público em
políticas que assegurem efetivamente proteção social.
Regina Maria Giffoni Marsiglia (2002) apontou algumas características
econômicas e sociais identificadas em famílias atendidas pelo Programa de Saúde
da Família em São Paulo. Esclareceu que esse programa ganhou importância pelo
Ministério da Saúde, principalmente a partir da segunda metade de 1990. Porém,
somente conseguem atender famílias de uma área delimitada por grupos que vivem
em piores condições de vida. Refletiu sobre as estratégias buscadas pelas famílias
de baixa renda para enfrentar os problemas cotidianos numa metrópole. Esclareceu
onde vivem essas pessoas, suas estrutura e composição, relações familiares, nível
social, sociabilidade, problemas de saúde enfrentados e informou que, quanto à
saúde, houve uma ampliação das responsabilidades do Estado. Enfatizou a
necessidade de capacitação dos recursos humanos que atuam na área para que
consigam entender as transformações que ocorreram com as famílias para buscar
os instrumentos necessários para atuação com essa demanda.
De modo geral, todos os textos atenderam aos critérios 1 e 2, ou seja,
consideraram, com diferentes graus de aprofundamento, as transformações que
ocorreram com as famílias na história e situaram a família em um contexto mais
amplo, com uma visão crítica, mas com diferentes abordagens.
93

3.3 – As concepções sobre a família

Os textos de análise teórica sobre a família das décadas de setenta e oitenta


situam a família em uma perspectiva marxista e apresentam o funcionalismo como
oposição a essa forma de pensar.
Seno Antonio Cornely afirma que existem duas fontes para a análise da
família: a funcionalista, de corte positivista que entende a família como:

“...a célula básica da sociedade, (...) universo fechado e estático, de relações


intrafamiliares, que se esgotam em si mesmas.” e a marxista que a entende como
“... instância de mediação entre a sociedade global e os indivíduos, (...) variável
intermédia nos processos de transformação social.” (1987:6-7)

Maria Lúcia Martineli e Norberto Alayon abordaram concepções de família


extraídas do Seminário Latino-Americano realizado em Porto Alegre/RS no período
de 11 a 15 de maio de 1986:

“ – A família é uma unidade em movimento, em construção, é o lócus


privilegiado do processo de transformação;

- A família é uma instância de mediação para o processo de transformação


social, é o agente sócio-político de tal processo;

- A família é uma unidade de produção e reprodução, é o agente de mudança


social.” (1986: 148)

Dos textos que a partir da década de noventa, situam teoricamente


concepções sobre a família destacamos:
Regina Célia Tomaso Miotto considera que a família é uma:

“... instituição historicamente condicionada...” e como parte da sociedade


expressa as suas contradições (...) se constitui no decorrer de sua vida ou em
momentos dela, tanto num espaço de felicidade, como num espaço de infelicidade.”
(1997:117).
94

Maria Amália Faller Vitale em seu artigo conceitua:

“...os lares monoparentais são aqueles em que vivem um único progenitor


com os filhos que não são adultos.” (2002: 46)

Dalva Azevedo Gueiros e Rita de Cássia Silva Oliveira entendem família


como:

“...uma construção histórica e sociocultural....” (2005: 118)

Em cima dessas concepções podemos perceber que já na década de 1980


alguns pesquisadores apontaram mudanças na concepção de família. Assim,
somente alimentados por uma atitude investigativa teremos possibilidade de
vislumbrar novas alternativas de ação.
95

CONCLUSÃO

Este trabalho pretendeu proporcionar uma pequena contribuição aos


profissionais da área social, quanto a entender as transformações que ocorreram
com as famílias, segundo as contribuições teóricas dos assistentes sociais
brasileiros, e ao mesmo tempo refletir se elas estão preparadas para assumirem as
responsabilidades propostas na política social reinante, na contemporaneidade.

Um dos maiores desafios para os profissionais comprometidos com a


população usuária é compreender a realidade em sua dinâmica histórica, para
construir propostas de trabalho capazes de efetivar os direitos do cidadão.

Nosso estudo possibilitou identificar a variedade de experiências familiares


que ocorreram, apresentando, assim, um inesgotável modo de compreender
famílias.

A pesquisa demonstrou que o fato de os assistentes sociais terem a família


como objeto de intervenção, ao longo da história da profissão, não lhes proporcionou
uma ampla discussão teórica, pelo menos na revista da sua categoria profissional,
porém acreditamos que isto ocorreu porque por muitos anos as políticas sociais
foram setoriais (crianças, mulheres, deficientes, idosos, negros e outros) e não
focalizadas para a família de forma global.

As transformações ocorridas, em especial ao longo da segunda metade do


último século, têm redefinido progressivamente os laços familiares. Essas alterações
verificadas nas estruturas das famílias são decorrência de mudanças na economia,
nos processos de trabalho e nas relações sociais. Estão relacionadas às
transformações mais amplas, desencadeadas pela dinâmica global das forças
produtivas e das relações de produção que governam as formações sociais.

O Estado vem deixando de cumprir muitas de suas responsabilidades, com a


ausência de políticas públicas consistentes ante questões sociais que se expressam
no âmbito da família.
As políticas sociais brasileiras, não conseguem minimizar as desigualdades
sociais e também não oferecem proteção social suficiente para atender todos
aqueles que dela necessitam.
96

A família tem sido chamada a assumir as seqüelas da questão social por


causa da crise financeira por que vem passando o regime de proteção social
brasileiro.

Espera-se assim, das famílias, respostas para as graves situações vividas


pelos indivíduos que dela fazem parte. A transferência de responsabilidades do
Estado para as famílias implica uma sobrecarga, principalmente para as mulheres.

Na realidade, as solidariedades familiares nunca acabaram, e apenas na


atualidade, estão sendo valorizadas para suprirem a crise de proteção social do
Estado. Esse é um fator preocupante uma vez que essa forma de proteção pode
acentuar as desigualdades, em vez de compensá-las.

Muitas vezes atuamos com famílias desconhecendo as mudanças que se


processaram na sociedade. Elas foram obrigadas a se modificar como estratégia de
sobrevivência.

Antes do profissional atribuir à família a responsabilidade quase exclusiva do


futuro de seus membros, ele deve analisar as alterações que ocorreram na
organização e dinâmica familiar, as quais atingem e modificam os mecanismos de
solidariedade, e também a grave crise econômica do país, expressa no desemprego
crescente, rebaixamento dos salários, precarização das condições e relações de
trabalho, desregulamentação de direitos sociais que interferem diretamente no
ambiente familiar.

Ao se pensar na família, na atualidade, temos que considerar as


transformações que estão ocorrendo em nossa sociedade que afetam a dinâmica
familiar como um todo e, de forma particular cada família conforme sua composição,
história e pertencimento social.

A dinâmica relacional estabelecida em cada família é construída a partir de


sua história e de negociações cotidianas que ocorrem internamente entre seus
membros e externamente com o meio social. Elas vivem no seu cotidiano o que foi
possível construir no seu processo de vida, levando em conta seus valores, suas
carências emocionais, sociais e econômicas.
No nosso cotidiano profissional, freqüentemente deparamos com situações
que nos levam a pensar nos recursos disponibilizados pelas políticas sociais, através
do Estado, em prol das famílias.
97

Temos clareza da necessidade de ampliação dos recursos por parte do


Estado para implementação de políticas públicas de caráter universalista que
assegurem proteção social. Essas políticas devem possibilitar também a autonomia
das famílias.
98

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