You are on page 1of 86

....

-
.
Renascimento:
Capítulo humanismo;
.Reforma e
Contrarreflrma.

A Renascença é o período compre-


endido entre os séculos XV e XVI e leva
esse nome por significar a retomada dos
valores greco-romanos. Também cha-
. mada de Renascimento, desencadeou o
movimento conhecido como humanismo,
indicando a procura de uma imagem do
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) ser humano. e da cultura, em contrapo-
(Câmara Brasileira do Livro, Sp, Brasil) sição às cóncepções predominantemente
Amnha, Maria Lúcia de Amlda teológicas da Idade Média e ao espírito
História da educ:ll.'ào e da pedagogia: genll e Ilutoritário .delas decorrente. Embora a
Brasil / Maria Lúcia de Armda Ar.mha. - 3. ed ..- Renascença não fosse irreligiosa, como
rev e ampl. - São Paulo: Moderna 2006. veremos a segu"ír,há um esforço para su-
Bibliografia perar o teocentrisr'no, ao se enfatizarem
os valore~ antropocêntricos, propriamen-
1. Educ:lI•.'ào - História 1. Título. te humanos, mais terrenos.
N.a primeira parte deste capítulo exa-
05-8901 . CDD-370.9 minarEiinjos.o .que foi a Renascença euro;
peia e c(ual a sua influência nas mudan-
Indices Para catálogo sistemático: ças no campo da educação e da reflexão
.1. Educafião : História 370.9
( O Renascimento foi a época pedagógica. Na segunda pa~, encon-
Reprodução proibIda. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. das viagens ultral1'}arinas tramos o Brasil recém-descoberto pelos
que ampliaram os negócios portugueses. Veremos então o~ procedi-
Todos os direitos reservados da burguesia europeia mentos para a catequese. dos indígenas
emergente. Em 1500, os e a educação dos ~Ihos de colonos, sem
EDITORA MODERNA LTDA. portugueses tomaram posse
~bs descuidarmos, porém, de examinar
das "terras do pau.brasil",
Rua Padre Adelino, 758 - Belenzinho
São Paulo - SP - Brasil - CEP 03303-904 dando inicio à colonização a ligação entre essas atividades e os in-
e à catequese dos índios. teresses políticos, econômicos e religiosos
Vendas e Atendimento: Te]. (0__ 11) 2790-1'500
• Detolhe de A prime;ra da metrópole.
Fax <0_-lU 2790-1501
m;ssa no Bras;I. Cândido
www.modema.com.br
Portinari, 1.948.
2011
imprr!ssu 110 Brasil 123 ..
" ,, P A Jt T', E' ,I '- ,,
a difusão da cultura; a bússola permitiu au- empréstimo a'juros, os protestantes viam no ••
mentar as distânci~ com maior segurança: enriqu~ciménto um sinal do favorecimento
o caminho para as Indias e a conquista da 'divino. Lutero recebeu a adesão dos ifobres,
América no século XV alargaram o hori- interessa:80s no confisco dos bens dóiclero, ••
Renascença europeia zonte geográfico e comercial e possibilita- e Calvino teve" Q apoio da rica burgúesia. '
ram o enriquecimento da burguesia . Portanto, as divergências não eram apenas
. Nas artes em geral (pintura; arquitetu- "
Contexto histórico religiosas, mas sinaliz~vam as. altera«;ões
ra, escultura e literatura) houve criação' ~,
~ 3. Reforma e Contrarreforma sociais e econômicas, que mergulharam a
1. O humanismo intensa, e a Itália se destacou como centro
Europa em' sangUip.olentaslutas.
irradiador da nova produção cultuJ1l. Âin- ::~ O espírito inovador do Renascimento À expansão da crença protestante, a
Durante o Renascimento prevaleceu a da quando persistiam assuntos religiosos, a ;
manifestou-se inclusive na religião, com Igreja Católica desencadeou forte reação,
tendência um tanto exagerada, e até in- visão adquiria um viés humanista, prevale- ';,
a critica à estrutura autoritária da Igreja, conhecida como ContrarrifOrma, a fim de re-
justa, de considerar a Idade Média, na to- cendo temas tipicamente burgueses. ,.
centrada no poder papal. Interesses políti- cuperar o poder perdido. 'As novas diretri-
talidade, como a "idade das trevas" ou "a Por fim, acentuou-se na Renascença a l cos nacionalistas e de natureza econômica zes tomadas no Concilio de Trento (154-5-
grande noite de mil anos", Como vimos no busca da individualidade, caracterizada ';-
sustentavam os movimentos de ruptura re- -1563) reafirmaram a supremacia papal
capítulo anterior, esse longo período não foi pela confiança no poder da razão para esta-;'
presentados pelo luteranismo, pelo calvinis- e os principios da fé, além de estimular a
de total obscuridade. A oposição dos renas- belecer os próprios caminhos. O espírito de \:.
mo e pelo anglicanismo. criação de seminários, para formar padres.
centistas devia-se antes à recusa dos valores liberdade e critica opunha-se ao principio :'1.:
Embora a Idade Média se caracterizas- A Inquisição tornou-se mais atuante, sobre-
medievais, respondendo às aspirações dos da autoridade. "- "\ij
'!!: se pela unidade da fé, esse consenso .esteve tudo em Portugal e Espanha.
novos tempos. ~~ ameaçado inúmeras vezes: "no' século XI'
O retorno às fontes da cultura greco-lati- 2. Ascensão da burguesia rit.
:1..
it houve o Cisma Grego; q~e resultou na se- Educação
na, sem a intermediação dos comentadores paração entre as igrejas Romana e Ortodo-
medievais, foi um procedimento que visava A maneira de pensar do humanismo as- ";
xa; no século XIv, por ocasião do Grande 1. Nascimento do colégio
também à secularização do saber, isto é, a socia-se às transformações econômicas que !l:
Cisma, foram efeitos dois' papas, um em
desvesti-Io da parcialidade religiosa, para vinham ocorrendo desde o final da Idade '1.:
Avinhão, na França, e outro em Roma. É impressionante o interesse pela educa-
torná-lo mais humano. Procurava-se com Média, com o desenvolvimento das ativida- '"
Desde o século XTI, as heresias ~e dissemi- çãonoRenascimento-sobretudosecompa-
isso formar o espírito do indivíduo culto des artesanais e comerciais dos burgueses,!{i
naram por toda a Europa, quando então foi rado com o mauifestado na Idade Média -,
mundano, "cortês" (o que frequenta a cor- os antigos servos libertos. A Revolução Co-~,
criada a Inquisição (ou Santo Oficio), como principalmente pela proliferação de colé-
te), o gentil-homem. mercial do século XVI caracterizou-se pelo ;~
instrumento de combate aos desvios da fé. gios e manuais para alunos e professores.
A negação, do ascetismo medieval re- novo modo de produção capitalista, acen- -.;,
As causas desses movimentos não eram Educar tornava-se questão de moda e uma
Vela-se na busca de prazeres e alegrias do tuando a decadência do feudalismo, cuja ;:~;
apenas de natureza religiosa. Ventos novos exigência, conforme a nova concepção de
mundo, desde o luxo na corte, o gosto pela riqueza era baseada na posse de terras. ~,!
de rebeldia surgiam nas cidades, que co- ser humano.
indumentária cuidadosa, até os amenos de- Contrapondo-se aos senhores da nobre-
meçavam a se libertar dos senhore~ feudais Em O cortesão, livro publicado em 1528 e
leites da vida familiar. za feudal, os burgueses fizeram aliança com
e das restrições ecoJ;1ôrDÍcas,como a con- muito conhecido na época, o italiano Cas-
.":O olhar humano desviava-se do céu os reis, que desejavam fortalecer o poder
• a terra, ocupando-se mais com as denaÇão 'ao empréstimo a juros feita pela tiglione fez a síntese do modelo de cortesia
para central contra düques e barões. Essa união
Igreja, por exemplo. Além disso, a teoria da do cavaleiro medieval e do ideal da cultura
, questões do cotidianO~A curiosidade, agu- levou à consolidação dos Estados nacionais
supremacia da autoridade papal era rejei- literária tipicamente humanista.
çada para a observação direta dos fatos, e conseqüentemente ao fortalecimento das
tada porque o universalismo da Igreja con- Enquanto os mais ricos ou da alta nobre-
redobrou o interesse pelo corpo e pela monarquias absolutistas.
trariava o nascente ideal do nacionalismo, za continuavam a ser educados por precep-
natureza circundante. Nos estudos de me" Não por acaso, o Renascimento é o pe-
expresso na formaçãc: das monarquias e no tores em seus próprios castelos, a pequena
-dicina ampliaram-se os conhecjrnentos ríodo das grandes invenções e viagens ul-:i:
.'i
fortalecimento do poder dos reis. nobreza e a burguesia também queriam
~e anatomia com a prática de dissecação tramarinas, decorrentes da necessidade de:';
ampliação dos negócios da burguesia. Por ".' 'A crise maior da Igr:eja, no entanto, deu- educar seus filhos e os encaminhavam para
de cadáveres humanos, até então proibi-
'se no século XVI, com a Reforma Protes- a escola, na esperança de melhor prepará-
\ da pela Igreja. O sistema heliocêntrico de exemplo, ao destruir a.sfortalezas do caste- ,
tante. Contrariando as restrições feitas pe- los p~ a lideratlça e a administração da
Copérnico construiu uma nova imagem lo, a pólvora fragilizou ainda mais a nobre-i;
los católicos àos negócios e a condenação ao política e dos negócios. Já os interesses pela
do mundo. ' za feudal; a imprensa e o papel ampliaram"
)
Renascimento: humanismo, Reforma e Contrarreforma 125~
124 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil ;~i
.-.:',

' 1i ..
educação de segmento.s populares, em ge- conta das ordens. religiosas. Apesar disso, pela consulta direta ao texto bíblico, sem como veremos, outras ordens tenham dado
ral, não eram levados em conta, restringin- por iniciativa de particulares leigos foram a intermediação dos padres, estabeleci&\ sua contribuição. •
criadas escolas mais bem adaptadas ao es- pela tradição cristã católica. No plano re- Inácio de Loyola (1491-1556), militar
do-se à aprendizagem de oficios.
pírito do humanismo. Na Alemanha surgi- ligioso surgia a característica humanista espanhol basco, ao se recuperar de um fe-.
O aparecimento dos colégios, do século
ram as FliTstenschulen, escolas para príncipes; de defesa da personalidade autônoma, que rimento em batalha, viu-se envolvido. por
XVI até o XVIII, foi um fenômeno corre-
o mesmo esforço de renovação notava-se na repudiava a hierarquia, para re~tabelecer.o súbito ardor religioso e resolveu colocar-se
lato ao surgimento da nova imagem da in-
França, nos Países Baixos e na Inglaterra. . vínculo direto entre Deus e o fiel. Ao dar a serviço da defesa da Ie, tornando-se ver-
fància e da farmua. Na Idade Média mistu-
ravam-se adultos e crianças de diversas ida- Muitas delas proliferaram na Itália, com iguais condições de leitura e interpretação dadeiro "soldado de Cristo". Fundou então
destaque para o trabalho de Vittorino da da Bf1Jlia a todos, a educação torno,u-se im- a Compailhia de Jesus, daí o nome jesuftas
des na mesma classe, sem uma organização
maior que os separasse em graus de apren- Feltre (1373?-l446), considerado o primeiro portante instrumento para a divulgação da dado ac::>sseus.seguidoreS. .
grande mestre de feitio humanista. Convi- Reforma. Criada.em 1534 e oficialmente aprova-
dizagem. Foi a partir do Renascimento.que
dado para ser o preceptor dos filhos de tiro Ao contrário da tendência elitista pre- da pelo papa Paulo m em 1540,.á Ordem
esses cuidados começaram a ser tomados,
marquês, em Mântua, Itália, aí fundou uma dominante, Lutero (1483-1546) e Melan- estava vinculada d.iI:etamente.à autoridade
assumindo contornos maiS lÚtidos apenas
chthon (1497-1560) trabalharam para a papal e,'portanto, distanciava-se da hierar-
no século xvn. escola, a Casa Giocosa, cuja divisa era ''Vm-
de, meninos, aqui se ensina, não se atormen- implantação da escola primária para todos. quia comum da Igreja. P9r não se retirar
A fim de proteger as crianças de "más
ta". O nome da escola reflete o novo espírito: É bem verdade que nessa proposta havia em conventos, seus adeptos eram chama-
.'influências", propôs-se uma hierarquia di-
ferente, submetendo-as a severa disciplina, giocosa é palavra italiana que significa "ale- uma nítida distinção: para ás camadas tra- dos padres seculares, isto é, que se misturam
gre" e vem do latimjocur, ou seja, "diverti- balhadoras, uma educação primária ele- aos fiéis no mundo, no século, como se cos- .
in,clusive a castigos corporais. A meta- da
escola não se restringia à transrrllssão de mento, gracejo", e, daí, 'jogo". mentar, enquanto para as privilegiadas era tumadizer.
Feltre cuidava não só de recreação e reservado o ensino médio e superior. Apesar A Ordem estabelecia rígida. disciplina
conhecimentos, mas à formação moral. O
exercício fisico, mas do desenvolvimento da disso, Lutero defendia a educação universal militar e tinha como objetivo inicial a pro-
regime de estudo era de certo modo rigoro-
sociabilidade e do autodominio. A sua es- e pública, solicitando às autoridades oficiais pagação missionária da fé, a luta contra os
. so e extenso. Os programas continuavam a
cola oferecia cursos de eqUitação, natação, que assumissem essa tarefa, por considerá- infiéis e os heréticos. Para tanto os jesuítas
se basear nos .clássico,~trWium e quadrivium,
persistindo, portanto, a educação formal de esgrima, música, canto, pintura e jogos em ,. -la competência.do Estado. se espalharam pelo mundo, desde a Euro-
geral. A formação intelectual voltava-se De acordo com o espírito humanista, pa, assolada pelas heresias, até a Ásia, a
gramática e retórica, como na Idade Mé-
para o ideal renascentista da mais ampla Lutero criticava o recurso a castigos, bem'\ África e.a América.
dia. Não foi abandonada a ênfase no estudo
como o verbalismo da Escolástica. Propôs Logo descobriram que, diante da intole-
ii do latim, com frequente descaso pela língua
materna. Tal sistema de ensino era dura-
cultura' humanística, com atenção especial ..:,
ao ensino de grego e latim. EmboTá objeto jogos, exercícios fisicos, música - seus co- rância dos adultos, era mais segura a con-
de cuidado, a disciplina pretendia ser me- rais eram famosos -, valorizou os conteú- quista das almas jovens, e o instrumento
mente criticado pelos humanistas, sobretu-
!j do por Erasmo e Montaigne. . nos rude e intolerante. . dos literários e recomendava o estudo de
história e das matemáticas.
adequado para a tarefa .'seriaa criação e
multiplicação das escolas. Daí o traço mar-
As universidades continuavam decaden- Na mesma linha de propostas culturais
til: I alternativas surgiram as academias, insti- ;;. A educação proposta pelos protestantes cante da influência dos jesuítas,. a ação pe-
tes, impermeáveis às novidades. Em 1452,
• 1 sofreu ainda a influência de Calvino (1509- dagógica que formou infuneras gerações de
I. ao se reestruturar a Universidade de Paris, tuições privadas com a intenção de suprir:~
liti as falhas das universidades. Ofereciam a -1564), teólogo francês que atuou no seu estudantes, durante mais de duzentos anos
a Faculdade de Artes tornou-se propedêuti-
ca às outras três (filosofia, medicina e leis), oportunidade de acesso à cultura desinte- país e em Genebra, Suíça. ~ (de 1540 a 1773).
11
ressada, algumas de caráter exclusivamente . . Para se ter uma ideia da extensão desse
lançando-se desse modo a semente do curso
! 4. Reação católica: o colégio dos jesuítas tra~alho, em 1579 a Ordem possuía 144
li
I
colegial, o que favoreceu a separação mais literário, .outras filosóficas, e só no século -
XVII apareceram as primeiras academias colégios espalhados pelo mundo, número
lÚtida dos graus secundário e superior.
i 2. Educação leiga
científicas (época em que ocorreu o chama-
do renascU:tento científico).
Para combater a expansão do protestan-
tismo, a Igreja Católica incentivou a criação <f
que chegou a 669 em 1749.

de ordens religiosas. Aqui daremos maior-' Formação dos mestres jesuítas


Embora presente em teoria, o ideal de 3. Educação religiosa reformada atenção ao colégio dos jeSUÍtasdevido à in-
fluência que exerceu não só na concepção ' A eficiência da pedagogia dos jesuítas
seculariZação do humanismo renascentista
da escola tradicional europeia como tam- deveu-se ao cuidado com o preparo ri$O-
.1
"I
I nem sempre se cumpria porque a imphinta-
ção da maioria dos colégios continuava por
A Reforma Protestante criticava a Igreja
medieval e propunha o retorno às origens, bém na formação do brasileiro; embora, roso do mestre e à uniformidade de ação.

~I
• História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Renascimento: humanismo, Reforma e Contrarreforma 127..
126
Em 1550 foi fundado o Colégio Romano, codificadas no Ratio Studiorum aplicavam-se Ovidio, Vrrgílio, Esopo, Plauto, Píndaro e Os alunos que mais se destacavam eram
para formar professores. Como unidade nos seguintes cursos: outros. COJ'110esses autores eram pagãos, incentivados à emulação com prêmios
centralizadora, recebia os relatórios das ex- • Stwlia Uiferiora: procuravam adequá-los aos ideais cristãos, • concedidos em solenidades, pomposas, nas
periências realizadas em todas as partes do - letras humanas, de grau médio, com fazendo resumos, adaptações e até supri- quais participavam as famílias, as a~tori.-
mundol• O Colégio Germânico, também duração de três anos e constituído por gra- mindo trechos considerados "perigosos dades ec:lesiásticas e civis, a fim.de dar-lhes
em Roma, especialiwu-se no preparo de mática, humanidades e retórica, formava o para a fé". Proibiam as obras contempo- brilho especial. Montavam peçaS de teatro,
padres para as missões na Alemanha. alicerce de toda a estrutura do ensino, base~ râneas, sobretudo contos e romances, por com os devidoscui~adosna seleção dos
O resultado das experiências regular- ada na literatura clássica greco-latina. serem "instrumentos de perversão moral e te..'<:tos,
desde simples diálogos até comédias
mente avaliadas, codificadas e reformuladas - filosofia e ciências (ou curso de artes), , dissipação intelectual" . e tragédias cláSsicas, sem deixar geprivile-
adquiriu forma definitiva no documento também com duração de três anos, tinha Esse programa atendia ao ideal de elo- giar os,dramas litúrgicos. 9s melhores estu-
RatW Studúrrum (a expressão latina Ratio atque por finalidade formar o filósofo e oferecia qüência latina do século XVI, e segundo dantes expunham sua produção intelectual
Institutio Studiorum significa "Organização e as disciplinas de lógiCa, introdução às ciên- o jesuíta e filósofo brasileiro, padre Leonel nas academias.
plano de estudos"), publicado em 1599 pelo cias, cosmologia, psicologia, fisica (aristoté- Franca, "a gramática visa a expressão clara Os jesuítas tOrI:laram-se famosos pelo
padre Aquaviva. Obra cuidadosa, com re- lica), metafisica e filosofia moral. e correta; as humanidades, a expressão bela empenho em institucionalizar o colégio
gras práticas sobre a ação pedagógica, a .or- • Studia superiora: e elegante; a retórica, a expressão enérgica como local por excelência de formação reli-
ganização administrativa e outros assuntos, - teologia e ciências sagradas, com du- e convincente"2. giosa, intelectual e moral das crianças e dos
destinava-se a toda a hierarquia, desde o ração de quatro anos, coroava os estudos e Com a didática, os jesuítas mostravam- jovens. Para atingir esses objetivos, instau-
provincial, o reitor e o prefeito dos estudos visava à formação do padre. , se bastante exigentes, recomendando a raram rígida disciplina, aplicada nos inter-
até o mais simples professor, sem se esque- Nas classes de gramática, o latim era repetição dos exercícios para facilitar a natos criados para garantir proteção e vigi-
cer do aluno, do bedel e do corretor. ensinado até o perfeito domínio da língua. memorização. Nessa atividade eram au- lância. Além de conlTolar a ad~rlÍssão dos
No final do século XVII, o padreJou- Isso porque, mesmo que no dia-a-dia as xiliados pelos melhores alunos, chamados alunos, concediam férias bem curtas para
vency preparou o então mais completo pessoas fizessem uso da língua materna, decuriões3, responsáveis por nove colegas, evitar que o contato com a família afrou-
manual de normas gerais e informações ainda no Renascimento e início da Idade de quem tomavam as lições de cor, reco- xasse os hábitos morais adquiridos.
bibliográficas necessárias ao magistério, re- Moderna persistia o costume de filósofos lhiam os exercicios e marcavam em um Mesmo quando se tratava de externato,
duzindo os riscos decorrentes do arbítrio e e cientistas escreverem em latim, ultrapas- caderno os erros e as faltas diversas. Aos o olhar dos mestres seguia os alunos, exi-
da iniciativa dos mestres maisjovens. Corno sando as fronteiras das diversas nacionali- sábados as classes inferiores repetiam as gindo o afastamento da vida mundana e re-
garantia da unidade de pensamento e ação, dades e promovendo a universalização da lições da semana toda: vem daí a expres- criminando as famílias que não assumissem
farta correspondência entre os membros da cultura. Os jesuítas tornaram obrigatório são sabatina, usada durante muito tempo o encargo dessa vigilância. A obediência,
Companhia mantinha a comunicação con- seu uso até na mais trivial conversação, de para indicar a avaliação. Para as classes considerada virtude não só de allmos, como
tínua. ," modo que os alunos pudessem assimilá-lo mais adiantadas, organizavam torneios também de padres, submetia a todos a ri-
O ideal de universalidade na atuação, com a familiaridade da língua vernácula. de erudição. , gida disciplina de trabalho, sem inovações
no entanto, não se confundia com rigidez. Num colégio em Paris no século XVII, pen- Outra característica do ensino jesuítico perso:galistas.
Sob vigilância constante, certa flexibilidade saríamos estar em Roma de antes de Cristo: era a emulação, ou seja, o estímulo à com- Tal~ez devido a tão rigorosa organiza-
aos costumes do lugar onde a Ordem se im- conversação exclusiva em latim e análise de petição entre os indivíduos e as classes. Por ção, as sanções não se tornassem muito
plantava facilitou a obra missionária, per- autores latinos. '. ~ exemplo, os alunos recebiam títulos de im- constantes, mas aplicadas sempre que ne-
mitindo maior eficiência. Os alunos estudavam as principais obras , perador, ditador; cônsul, tribuno, senador, cessário, cabendo ao mestre castigar ape-
greco-latinas e aperfeiçoavam a capacidade cavaleiro, decurião e edil. Para incentivá- nas com palavras e admoestações. Quando
o ensino nos colégios de expressão e estilo, permanecendo muito -los, as classes.se dividiam em duas facções: não bastassem, ou a falta fosse muito gra-
presos aos padrões clássicos. Voltados para os romanos e os cartagineses4• ve, as punições 'fisicas ficavam a cargo de
As práticas e conteúdos que os jesuítas o melhor da formação humanística, os je-
desenvolveram de acordo com as regras suítas usavam textos de Cícero, Sêneca,
2 O mitodo pedagógico dosjmdtos: o Ratio Sludimwn. Rio de Janeiro, Agir, 1952, p. 80.
, Decurião: no exército romano, uma decliria era um corpo de cavalaria e infantaria composto de dez soldados
I Note-se, como veremos na parte lI, que os relatórios frequentes e minuciosqs dos jesuítas aos seus superiores e que tinha por chefc o decurião,
facilitaram a posterior consulta de rico matcrial para a historiografia, ao contrário de outras ordens que não " Durante o século m a.C" romanos e cartagineses defroptaram-sc nas três Gucrras Plinicas, que terminaram
deixaram igi1al registro, com a destruição de Cartago (cidade do norte da África),

128 História da Educação e da Pedagogia -Geral e Brasil Renascimento: humanismo, Reforma e Contrarreforma • 129
tadas. Ocupava-se mais com exercícios de movimento da Reforma, que introduziu o Na mentalidade quinhentista, porem,
um "corretor", pessoa alheia aos quadros
erudição e retórica, e a maneira de analisar protestantismo em diversos países. Não por tanto reino como Igreja atuavam no sentido
da Companhia e contratada só para esse
os textos não propiciava o desenvolvimento acaso, essas nações encaminharam-se para de homogeneizar as diferenças, nivelando a
• I serviço. Para contrabalançar a disciplina,
I
do espírito crítico. a economia mercantil e capitalista, dando todos pelo que se considerava ve11ladeiroe .
os jesuítas estimulavam as atividades recre-
Nos cursos de filosofia e ciências, osjesuí- os primeiros passos para a atividade manu- superior (a cUltura cristã europeia). O ah~'
ativas, por proporcionarem ambiente mais
,I alegre e vida mais saudável. tas mostraram-se conservadores por retor- .~ fatureira que iria fortalecer o capitalismo tropólogo brasileiro Luiz Felipe Baêta Ne-

I: A polêmica sobre o ensino jesuítico


narem à filosofia escolástica, baseando-se, ,')
nos textos de Santo Tomás de Aquino e de '.'~"
Aristóteles, deixando à parte toda a contro-
industrial nascente. Enquanto isso, Portu-
gal e Espanha mantiveram-se católicos e
no campo econômico não se prepararam
ves, a propósito da catequese dos indígenas,
comenta: ~'ACOl:ripanhiadeJesus foi funda-
da para difunê:lira Palam.-ae,speci.almentea
\I É muito dificil encontrar análises desa- vérsia do pensamento filosófico moderno: para a industrialização. Não só: seus reis povos que não Aconheciam - e por meio
ignoraram Descartes - um de seus ilustres eram cristãos e, mais que isso, tinham a de uma socialização pro1ongada:R.j.rigem-
paixonadas da obra dos jesuítas, ql,le des-
I pertaram tanto ardorosos defensores como ex-alunos - e recusavam-se a incorporar responsabilidade de facilitar a salvação do -se a homens que não são, P0rtantõ, iguais
as descobertas científicas de Galileu, Ke- seu povo. a si - e quer transformáAos para incorpo-
críticos severos. Não se pode negar sua in-
pler e Newton, ocorridas no século XVII. Assim diz o professor José Maria de Pai- rá-los à cristandade. Duas diferenças pri-
fluência na formação do hoTlTléte Iwmme da
A Companhia de Jesus foi acusada de va, a respeito dessa prerrogativa do rei: meiras: não são padres e não' são cristãos.
época barroca. Essa expressão francesa de
decadente e ultrapassada. Afinal, o ensino "Não só a prática do culto e a conversão Uma semelhança: são homens. É esta seme-
dificil tradução significa de modo amplo o
universalista e muito formal distanciava os do gentio estavam sob seus cuidados, mas lhança somada àquelas diferenças que dão
gentil-homem, culto e polido, conforme as
alunos do mundo, tomando-o ineficaz para a própria administração do religioso era da a po'Ssibilidadee o sentido do plano catequé-
exigêní:1as daquela sociedade aristocrática.
a vida prática. O ideal do hUTlflite Iumune vin- sua esfera. Por isso, a ele cabia cobrar e ad- tico. A catequese é, então, um esforço para
No século XVIII, após mais de duzentos
culava-se a um humanismo desencarnado, ministrar os dízimos, apresentar e sustentar acentuar a semelhança e apagar as diferen-
anos de ação pedagógica jesuítica, recru-
voltado para as belas-letras e o "saber por diretamente os bispos, os cabidos, os vigá- ças"G.Desse modo, osjesuítas querem tornar
I desceram as críticas ao monopólio do en-
'r
11
sino religioso. "Os jesuítas não me ensina- saber" de letrados e eruditos. Esses aspectos
deixavam de ter sentido em um mundo no
rios, como também organizar a política de
distribuição dos beneficios eclesiásticos, das
o outro, o não-cristão -, seja indigena, seja
infiel ou herege -, em cristão, para tornar
i
ram senão latim e tolices", diz um dos en-
qual a revolução nas ciências e nas técnicas ordens religiosas; das confrarias, das irman- os hornms o mais iguais possível.
ciclopedistas, o filósofo Voltaire. O escritor
e historiador Michelet completa com certo requeria um indivíduo prático, cujo saber dades, e garantir seu ordenamento jur,ídi-
exagero apaixonado: "Nem um homem em visava a transformar. Não mais se justifi- co. (... ) A Igreja estava, pois, jiJncional.mente
trezentos anos!". cavá o desprezo ao espírito crítico, à pes- incorporada ao Reino. (... ) Chamo nova-
quisa e à experimentação. Ao contrário, os mente a atenção do leitor para que não 1. A s~ulari~ação do pensamento
Em 1759, o marquês de Pombal, primei-
ro-ministro de Portugal, expulso!! os jesuí- jesuítas eram considerados excessivamente atribua a religiosidade da educação ao fato
dogmáticos, autoritários e por demais com- de serem padres seus promotores. Insisto: A produção intelectuaJ.do Renascimento,
tas do reino e de seus domínios (inclusive do
prometidos com a Inquisição. Na paixão era toda a sociedade portuguesa que assim seja na literatura, seja na filosofia, demons-
Brasil). O mesmo aconteceu mais tarde em
do debate, a Companhia foi acusada de percebia"~. trava 'int,eresse em supeJ;'ar as contradições
outros países, até que finalmente em 1773
ter enriquecido e de exercer poder político Além disso, só na contemporaneidade entre õ pensamento religioso medieval e o
o papa Clemente XIV extinguiu a Com-
sobre os goveTJ;l!;ls,
visando a suas próprias os estudos de etnologia nos alertaram para anseio de secularização da burguesia.
panhia de Jesus. Restabelecida em 1814,
conveniências. o respeito às diferençaS que existem entre Ainda no pré-Renascimento, o florenti-
11 continuou a sofrer inúmeras perseguições
! Nos estudos mais recentes, no entanto, povos e culturas. A partir desse conheci- no Dante Alighieri (1265-132"1), autor da
durante o século XIX.
procura-se examinar a atuação dos jesuít!S mento, mlldou a disposição para aceitá-los, Di:oina comédia, escreveu o seu poema na
Segundo seus detratores, o ensino jesuí-
dentro do contexto histórico da época em que ,sem considerá-los inferiores: -hoje em dia a língua italiana e não em latim, o que re-
tico promoveu a separação entre escola e
viveram, respeitando o entendimento que en- educação deve atender às demandas plurié- presentava uma novidade na época. Além
vida, porque, no afã de retomada dos clássi-
tão prevalecia sobre as relações entre Igreja e tnicas e manter-se multiculturaI. ti;' disso, no texto político A monarquia elaborou
cos, não trânsmitia aos alunos as inovações
do seu tempo; não dava muita importân- Estado.•Caso contrário, corremos o risco de
:,
,: cia à história ~ à geografia, e a matemáti- preconceito anacrônico, ao julgá-lossegundo
; "Igreja e educação DO Brasil colonial", in Maria 13tephanou e Maria Helena Camara Bastos, (orgs.), Histórias e
i nossosvalores laicos contemporâneos.
ca -.:- essa "ciência vã" - também sofreu mem6rias da eóu&açãll no BrasiL Petrópolis, Vozes, 2004, v. I: Sécuws XVI-XVIII, p. 79,80 e 85.
restrições, excluída do primeiro ciclo e pou- Examinemos esse outro olhar. O que en- 6 O combate dos.soldados ih Cristo na Terra dos papagaios: colonialisrno e repressão cultural. Rio de Janei.rtT,:Forensc

quíssimo estudada nas classes mais adian- contramos na Europa daquele tempo foi o Universitária, 1978, p. 45.,
131,
História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Renascimento: humanismo, Reforma e Contrarreforma
130
teses naturalistas, reconhecendo a capacida- mo e Tomás Morus, tendo sido preceptor , Tratava com ironia a produção intelec- medicina. Representa a corrente enciclo-
de humana de se guiar pela razão. Defendeu de Catarina de Aragão. Quando ela se tual medi~val e zombava do formalismo • pédica da' Renascença que buscava resga-
a autoridade do rei independente do poder casou com. o rei Henrique VIII, Vives a das universidades, reduto de escolásticos. tar o saber greco-latino, com igual cuidado
do papa e da Igreja. Pouco depois Petrarca acompanhou à Inglaterra, onde lecionou Erasmo representou a corrente erudita da pelo~ recentes estudos da ciência que' en~'
(1304-1374), também poeta italiano, descre- na Universidade de Oxford. Renascença, que buscava nos clássicos as tão nascia: Como os demais humanistas de
veu o drama humano entremeado de pai- Se no Renascimento não havia estudos fontes da sabedoria grega. Embora não seu tempo, criticou a tradição escolástica,
xões e desejos. No século XVI, Maquiavel sistemáticos sobre educação, Vives era uma desprezasse a ciência, sua atenção estava mas o fez de maneira irônica' esabórosa.
(1469-1527) investigou as bases de uma nova exceção, por ter escrito copiosa obra peda- voltada sobretudo para questões literárias Suas obras for.i1TI várias veze)i condenadas
ciência política descomprometida com a gógica, cujo principal trabalho é o 'Tratado , e estéticas. No seu famoso Elogio da loucu- e proibidas ria Universidade de Sorbonne,
moral cristã e, portanto, laica, secularizada. do ensino. Escreveu inclusive sobre a educa- ra, critica a hipocrisia e a tolice humanas o que o obrigou a fugir às ameaças da In-
Nesse contexto de crítica à tradição ção da mulher, mesmo considerando fill1- e todas as formas de tirania e superstições, quisição ..
medieval, a educação procurava bases na- damental sua presença no lar. ao mesmo tempo que reflete sobre a neces- Rabelais não escreveu uma obra propria-
turais, não-religiosas, a fun de se tornar Embora vinculado às ideias aristotélico- sidade das paixões, de uma "loucura sábia" mente pedagógica, mas nos dois romances
instrumento adequado para a difusão dos -tomistas, Vives revelou-se homem do seu responsável pelo amor e pelo prazer. satíricos Pantagruel e Gargantua transparecem
valores burgueses. Embora defendido com tempo ao recomendar o cuidado com o Entremeando reflexões a respeito da so- suas ideias a i'espeito da educação. Trata-
vigor na obra de literatos, filósofos e peda- corpo e a atenção com o aspecto psicoló- ciedade do seu tempo, Erasmo defendia o -se de escritos divertidos, em que tudo é
gogos, nem sempre esse ideal foi alcança- gico no ensino. Acompanhando as mudan- respeito ao an1adurecimento da criança e exagerado, a começar pelos próprios per-
do nas escolas, como vimos no exemplo de ças do pensamento científico, valorizava: por isso criticava aeducaçãovigente;'exces- sonagens, gigantes que tinham um apetite
inúmeras escolas religiosas conservadoras, os métodos. indutivos7 e. experimentais, sivamente severa. Recomendava o cuidado descomunalu;
como as dos jesuítas. reconhecia a in1portância' da observação com a graduação do ensino e o abandono' Ao iniciar sua educação, o preceptor de
Ainda que fosse grande a produção in- dos fatos e a ação como meio de aprendi- das práticas de castigos corporais. Ao con- Gargantua deu-lhe de beber o líquido de
telectual na Renascença, não havia. pro- zagem. Além diS<'o,ao lado do latim, insis- tJ'ário, seria bom mesmo que as crianças uma planta cl1amada heléboro "para que
priamente uma filosofia da educação como tia na necessidade do adequado estudo da aprendessem se divertindo, sem a preocu- esquecesse de tudo o quanto havia aprendi-
sistema de pensamento coerente e organi- língua materna. pação com resultados imediatos. do com os seus antigos preceptores". Nessa
zado - com exceção de Vives, como vere- passagem, Rabelais quer simbolizar a ne-
mos -, mas sim inúmeros fragmentos de 3. Erasmo 4. Rabelais cessidade de expurgar toda a lembrança da
reflexão pedagógica como parte de uma tradição para o novo ensino ser mais bem
produção filosófica mais ampla. Foi o caso o holandês Erasmo de Rotterdam' (1467- '1'
J' François Rabelais (c. 1494-1553), frade aproveitado. No final da primeira parte
de Erasmo, Rabelais e Montaigne, ou ain- -1536) foi um dos principais expoentes do T e médico francês, levou uma vida cheia de deste capítulo, veja o dropes I,em que Gar-
da ó exemplo das utopias de Tomás Morus novo pensamento renascentista, considera- percalços e perseguições, devido'à sua pena ,gantua escreve ao fill10Pantagruel sobre as
e Campanella. do por muitos um representante do pré-llu- afiada e crítica mordaz. Muitos o identifi- expectativas quanto à sua formação.
minismo. Cristão pertencente à Ordem dos caram a um epicurista devasso, embora Embora tivesse uma sede insaciável de
2. Vives Agostinianos, criticou severamente a Igreja outros o descrevessem como uma cristão conhecimentos e recomendassc uma apren-
corrupta e autoritária, e apoiou alguns pro- que também não desprezava os prazeres dizagem enciclopédica, criticava o ensino
Juan Luis Vives (1492-1540), humanista nU)Jciamentos de Lutero sem, no entanto, 'da vida. Inicialmente esteve no convento livresco e estimulava a educação do corpo
espanhol, participou do convívio de Eras- aderir à Reforma. dos franciscanos, mas depois foi acolhido e do espírito. Ao contrário dos que o acu-
pelos beneditinos, de sistema mais aberto savam de imoralidade,' defendia uma ética
e cujas regr.as eram menos severas, e no de acordo com as exigências da natureza e
7 A inthlfão é um tipode argumentaçãopelaqual,a partirde diversosdadossingularescoletados,chegamosa final da vida tornou-se padre secular. Fre- da vida, por isso mesmo devia-se aprender
proposiçõesuniversais, ouseja,procedemosa umagCMTali<.llfão indutiva. Aocontrário,ospensadoresmedievais quentou diy~rsos cursos nas universidades, com alegria, porque "o riso é próprió do
valorizavama dedufiW, um tipoae argumentaçãoemquea conclusãoéinferidanecessariamente dasproposi- aprendeu várias línguas, formou-se em homem".
çõesquea antecedem,podendoir de umaproposiçãogeralpara o particular,ou ao geralmenosconhecido;
issosignificaquena conclusãonãosedizmaisdo quejá está:naspremissas,apenasse extr.uu quejá estádito
ndas.Emboraa deduçãosejaumraciocinioa querecorremoscomfrequência,a indução,apesardeincerta,é • Aindahoje,usa-sea elI.-pressão
"apetitepantagruélico",para designarosque comeme bebemem dema~ia,
umafurmamlÚtofecundadepensar,responsável peladescobertade nossosconhecimentos davidadiáriae de Ollosquedefendemideiasepicuristas.AsobrasdeRahelaistinhan1extcnsostítulos:"O horrívCÍ:lc espantosos
grandevalianasciênciasexperimentais .. feitose proezaSdomlÚafàmadoPantagruel"e '1\vidainestimáveldo grandeGarg'<lIltua,
pai de Pantagruel".

132 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Renascimento: humanismo, Reforma e Contrarreforma 133
Oxford, Inglaterra, desde a Idade Média medieval, manteve-se ainda fortemente
5. Montaigne era estudar, sim, os antigos autores greco-
demostraram interesse pelas ciências expe- hierarquizada: exôllÍa dos propósitos edu-
-romanos, mas de acordo com um olhar re-
rimentais e pela atuação social. Voltaremos cacionais a grande massa popular, com ex-
Michel de Montaigne (1533-1592) per- ligioso que pudesse adaptá-los às verdades
eternas da fé. Por isso estudavam Platão e a eles na segunda parte deste capítulo. ce?ão dos reformadores p'rotestantes, que
tencia a uma família francesa da burguesia agtam motivados também Rela divulgação
que, enriquecida com a posse de terras e Aristóteles sob o viés cristianizado de Santo
Conclusão religiosa. .
propriedades, conseguira um título de no- Agostinho e Santo Tomás.
Profundas alteraçqes. estavam ocorreo-
breza. A educação do menino foi cuidado- Como vimos em capítulos anteriores, a
Como pudemos observar, o Renascimen- do, apesar de tudo .. Suchodolski refere-se
sa: acompanhado por preceptores desde o pedagogia que transparecia naqueles filó-
to foi um período de contradições típico das a toda peôagOgl;,l.antiga como essencialis-
berço, aprendeu latim antes da língua ver- sofos, tanto da Antiguidade como da Idade
épocas de transição. A classe burguesa, en- ta, porque tinha por funç~o realiZar o que
nácula. Média, baseava-se em uma visão essencia-
riquecida, assumia padrões aristocráticos o ser humano. deve vir a ser, a' partir de
Montaigne lia com facilidade as obras lista, segundo a qual a educação teria por
e aspirava a uma educação que permitisse um modelo, segundo a concepçãó de uma
latinas e escreveu uma sériç imensa de frag- objetivo desenvolver as potencialidades do
formar o homem de negócios, ao mesmo essência humana universal. No Renasci-
mentos, reunidos em um gênero novo, o en- ser humano.
tempo capaz de conhecer as letras greco- mento, embora continuaSse a perspectiva
saio, que bem representa a tendência subje- Essa perspectiva foi retomada pelos je-
latinas e de dedicar-se aos luxos e prazeres essencialista, 'que so mudaria com Rous-
tivista renascentista. Ao descrever a si pró- suítas, cuja pedagogia era aristotélico-to-
da vida. Por outro lado, as escolas religiosas seau (século XVllI), já se tinh.:'la percep-
prio e refletir sobre suas experiências, traça mista. Não que muitos deles ignorassem aS
multiplicavam-se na Europà e no resto do ção mais aguda de problemas que, hoje,
o perfil da natureza humana, apresentando novidades da ciência e da filosofia do seu
.mundo coloniz_ado. chamaríamos de existenciais, numa recusa
um indivíduo que tem interrogações, dúvi- tempo, uma vez que a Companhia prepa-
Essa sociedade, embora rejeitasse a au- à submissão aos valores eternos e.aos dog-
das e contradições, o que encaminha seu rava com cuidado os futuros mestres. Acha-
toridade dogmática da cultura eclesiástica mas tradicionais.
pensamento para um certo ceticism09• vam importante, porém, evitar os conheci-
Mesmo sem produzir obra propriamen- mentos que pudessem levar a desvios pelo
te pedagógica, no seu alentado Ensaio Mon- livre-pensar dos humanistas.
taigne dedicou alguns capítulos especifica- Lembrando que essa postura interessava ttlro;es
.', #-r-"' ...
o Novo Testamento e a Epístola dos
mente à educação. Critica o ensino livresco sobretudo aos reinos de Portugal e Espa- Apóstolos, depois em hebú~u o Velho
e o pedantismo dos falsos sábios, valoriza a nha, diz o professor português António Go- 1 ~ Quanto ao conhecimento dos fatos Testamento.
educação integral e elogia seu pai por ter mes Ferreira: 'Mnal, os poderes estavam da natureza, quex:o que se adorne cui- (... ) Mas, porque segundo o sábio
sabido escolher os preceptores para educá" interessados nessa interpretação autoritária dadosamente deles; que não haja mar, Salomão, sabedoria não entra absolu-
-lo com docilidade e sem castigos. do saber e a escolajesuítica não tinha pátria ribeiro ou fOIitedos quais não conheça tamente em alma malévola, e ciência
Para Montaigne, a edl,lcação tem por fi- porque o latim era a sua língua, o catoli- os peixes; todos os pássaros do ar, todas sem consciência não é senão a ruína da
nalidade preparar um espírito ágil e crítico, cismo a sua ídeologia e a Escolástica a sua as árvÓres, arbustos e frutos das flores- "'~a, convém servir,~ar e .crer em
valores importantes para a. formação do compreensão do mundo" lO. tas, t64as as ervas da terra, todos os me- De~ e n'Ele colocar seus pensamentos
gentil-homem. Nem todas as orientações religiosas, no tais esco.ndidos no ventre QOsabismos, t sUaSêspetanças, e pela fé, formada de
entanto, distanciaram-se tanto do huma- ", as pedrari~ do Oriente e do Sul, nad,a caridade, estara ~le associado, de sorte
6. A pedagogia da Conlrarreforma nismo renascentista. Uma exceção foi a r.~.
lhe seja desconhecido. que jamais seja desanipã.rado pelo pe-
Congregação do Oratório, que, no século .Depois, cuidadosamente, estude cado. (Rabelais)
Na resistência às novas ideias que co- xvn, sem renegar o aristotelismo, busca- .sem cessar Os 'livros dos médicos ire-
meçavam a se delinear no Renascimento, va conciliá-lo com as ideias da pedagogia gos, árab.es e iâtinos, sem condenar tal- 2 • Pelo modo como a aprendemos (a
colocaram-se os cristãos' católicos adeptos humamsta. Outra tendência é represen- f
e
.mudÍ,sl:fl.Scabalistas; e, .por frequentes ciência] nã~ é de ~que nem
da .Contrarreforma. Para eles, a intenção tada pelos franciscanos, que, na Escola de .estudos de Anatomia, adq~' perfeito alunos nem mestres se tornem n:uris
conhecimento do outro mt{.'I1doque é capazes embora se façam mais doutos.
o .homem. E, durante, algumas horas Em verdade, os cUidados e despesas de
do dia, entre em contato COrhas san- nossos pais visam. apenas encher-nos a
9 Ceticismo: doutrina segundo a qual não se pode conhecer com certeza; os céticos concluem pela suspensão do
juizo e pela dúvida permanente. . • tas epístolas, prinieiramente em grego e
cabeça de ciência, de bom senso virtu-
10 "A educação no Portugal Barroco: séculos XVI a XVIII", in 1yfaria Stephanou e Maria Helena Camara
.Bastos (orgs.), HIStórias e mem6ria.r da eáu&afãono BrasiL v. I: Siculos XVI-XVIII, p. 62.

Renascimento: humanismo, Reforma e Contrarreforma 135..


134 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil
Preleção. Na preleção só se expliquem os mesmo pensamento com frases mais inte-
de não se fala. Mostrai ao povo alguém . indagar quem sabe melhor e não quem autores antigos, de modo algum os moder- ligíveis. Caso e.xplique em vernáculo, con-
que passa e dizei "um sábio" e a outro sabe mais .. . nos. De grande proveito será que o profes- serve quanto possível a ordem de colocação
.;,(
qualificai de bom; ninguém deixará de (... ) Tüdo se' submeterá ao exáil1e' sor não fale sem ordem nem preparação, das palavras para que se habituem os ou-.
atentar com respeito para o primeiro. da criança e nada se lhe enfiará na ca- mas exponha o que escreveu .refteôdamente vielas ao ritmo. Se o idioma vulgar não. o'
Não mereceria essa gente que também beça por simples autoridade e. crédito .. em casa e leia antes todo o livro ou discurso peimitir, primeiro traduza quase tudo pa-
a apontassem gritando: "cabeças de Que nenhum principio, de Aristóteles, que tem entre mãos. A forma geral da pre- lavra por palavra, depois; segundó a úidole
pote!". Indagamos sempre se o indiví- dos estoicos ou dos ~picuristas, seja seu. leção é a seguinte: do vernáculo. .
duo sabe grego e latim, se escreve em principio. Apresentem-se-lhe todos .em Em primeiro lugar leià seguidamente Em quarto'lugar, retomando o trecllo de
verso ou prosa, mas perguntar se se tor- sua diversidade e que ela escolha se pu- todo o trecho, amenos que, na Retórica princípio faça as observações adaptadas a
nou melhor e se seu espírito se deSenvol- der. E se não o puder fique na dúvida, ou na Humanidade, fosse demasiadamente. cada classe, a menos que prefira inseri-las
veu - o que de fato importa - não DOS pois só os loucos têm certeza absoluta longo. na própria explicação. Se julgar que algu-
passa pela mente. Cumpre entretanto em sua opinião. (Montaigne) Em segundo lugar exponha em poucas mas devem ser apontadas - e não convém
palavras o argumento e, onde for mister, a
sejam muitas -:- poderá ditá-las ou a inter-
conexão com o que precede.
valos durante a explicação; ou, terITÜnadaa
Em terceiro lugar leia cada período e,
preferência os mestres aprovados e as dou- lição, em separado. É bom que os gramáti-
• Leitura complementar ,. no caso de explicar em latim, esclareça os
trinas que, pela experiência dos anos, são ,'. cos não. tomem notas senão mandados.
mnis-obscuros, ligue um ao outro e expla-
Regras do Ratio Studiorum' maisadotadas.nas.escolas católicas. ne.o.pensamento,:uão.com metafrase pue-'. Leonel Ft'anca, O mélndo jJedag6gico dos jesuítas: o Ra-
ri! inepta, substituindo uma palavra latina tio Studiorwll. Rio deJaneiro; Agir, 1952, p. 145, 146,
Aliança das uirtudes sólidas com o estudo. Apli- Repetições em casa. Todos os dias, exceto por outra palavra latiha, mas declarando o 175 e 186.
quem-se aos estudos com seriedade e cons- os sábados, os dias feriados e os festivos,
tância: e como se devem acautelar para que designe uma hora de repetição aos nossos
o fervor dos estudos não arrefeça o amor escolásticos para que assim se exercitem as
das virtudes sólidas e da vida religiosa, as- inteligências e melhor se esclareçam as difi-
Af'iviclacles 4. Quais são os focos comuns sobre a
sim também se devem persuadir que, nos culdades ocorrentes. Assim um ou dois se-
educação de Vives, Erasmo, Rabelais e
colégios, não pocierão fazer coisa mais agra- jam avisados com antecedência para repetir
Q1testões gerais Montaigne?
dável a Deus do que, com a intenção que se a lição de memória, mas só por um quarto
. disse acima, aplicar-se diligentemente aos de hora; em seguida wn ou dois formulem
1. Dê exemplos de aspectos do huma- 5. "Em verdade o homem é de nature-
estudos; e ainda que não cheguem nunca objeções e outros tantos respondam; se ain-
IÚsmo renascentista que representam .za muito pouco definida, estranhamente
a exercitar o que aprenderam, tenham por da sobrar tempo, proponham-se dúvidas.
o esforço de secularização do pensa- desigual e diverso. Dificilmente o julgarí-
certo que o trabalho de estudar, empreen- E para que sobre, procure o professor con- .):
mento. amos.de maneira decidida e uniforme."
dido, como é de razão, por obediência e servar rigorosamente a argumentação em ,~
a) Compare essa afirmaÇão de Mon-
caridade, é de gtande merecimento na pre- forma [silogística]; e quando nada mais de
sença da divina e soberana majestade. novo se aduz, corte a argumentação.
2. Por que protestantes e católicos, ~o taigne com'óintuito dos missionários de
século XVI, passaram a se interessar catequizar os índios.
pela ação pedagógica? Compare as duas b) Explique como esse asPecto re-
Evite-se a nouidade de opiniões. Ainda em Ordem nos pátios. Nos pátÍQs e nas aulas,
orientações em suas linhas principais, in- presenta uma das muitas contradições
assuntos que não apresentem perigo algum ainda superiores, não se tolerem armas, , (~
diCando as coincidências e as diferenças. vividas no Renascimento ..
para a fé e a piedade, ninguém introduza ociosidade, correrias e gritos, nem tampou-
questões novas em matéria de certa im- co se permitam juramentos, agressões por
portância, nem opiniões não abonadas por 3 Analise de que perspectiva a peda- 6. O dropes I contém trechos de'um li-
palavras ou fatos; ou o que quer que seja
gogia dosjesuítas atende às expectativas vro de Rabelais, em que o pai (o gigante
nenhutn autor idôneo, sem consultar os su- de desonesto ou leviano. Se algo acontecer,
do "novo homem renascentista e como Gargantua) faz recomendações ao filho
periores, nem ensine coisa alguma contra restabel~ça logo a ordem e trate com o Rei-
também a elas se opõe. (pantagruel). Responda às questões:
os principios fundamentais dos doutores e tor do que possa perturbar a tranquilidade
o sentir comum das escolas. Sigam todos de do pátio.

136 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Renascimento: humanismo, Reforma e (ontrarreforma 131

.... ;~
. CQntexto histórico economia pré-capitalistas, com grandes
I proprietários de terra. A economia colonial
a) Identifique os elementos que indi- Q1.estáe$ sobre a leitura. expandiu-seemOtorno do engenho de açú-
A históriá .do Brasil no século XVI não
carri oposição à tradição medieval. cmnpkmen.tar car, reco~endo ao trabalho escravo, inicial- .
pode ser desvinculada dos acontecimentos
b). Embora a frase muito' citada' de mente dos índios e, depôis, dos negros afri-'
da Europa, já que a colonização resultou
Rabelais "Ciência sem consciência não 1. Compare o comentário de ¥ontaig- canüs. _LatijUndio, escravatura, monocultura, eis
da necessidade de expansão comercial da
é senão ftÚna da aIrria"nocontexto se ne (dropes 2) sobre a memória'coma . as caracteristi~ da estrutura .econômica
burguesia enriquecida com a Revolução
refira ao amor a Deus, de que forma po- valonzação que dela fazem os jesuítas. '.• colonial que explicam' o caráter patriarcal
'Comercial. As colônias valiam não só para
deríamos aplicá-la para compreender os da sociedade, centrada no poder:do senhor
ampliação do comércio, como também por
problemas atuais decorrentes do desen- 2. Discuta a importância da individuali-' de engenho.. :. .
fornecer produtos tropicais e metais precio-
volvimento científico e tecnológico? dade no R.enascimehto, baseada emMort-
sos para as metrópoles. Convêm não esqueéer que o-.:Brasil era
taigne. Como a ela se opõem as Re~? uma colônia de economia ágrícolatcujo lu-
No caso do Brasil, a colonização assumiu
.7. "Não menos que sa»er; duvidar me cro ficava co~ os comerciantes na metrópo-
aspectos que dependeram da forma pela
apraz" (Dante Alighien'). Ainda que o po- ,3 .. Como poderiamos defender a pro- le, o que caract~riza uma economia de mo-
qual Portugal e Espanha se situaram no
. eta italiano tenha vivido no século XIII posta do Ratio Studiorum como documen- ~
..
quadro do desenvolvimento econômico e delo agrário-exportador dependente. No entanto,
de certa forma antecipa. algumas id~ to inserido em seu contexto histórico? ,~,
ainda que Portugal tivesse o monopólio da
cultural europeu. Como vimos na primeira
do Renascimento: relacione a citação dele produção de açúcar brasileir(), as refinarias
parte, enquanto França e Inglat~rra incen-
CGm o pensamento de Montaigne e dis- ~o eram construídas naquele país, mas na
tivaram as manufaturas, a burguesia portu-
tinga-a da proposta religiosa dos jesuítas. Holanda, Inglaterra e França.
gues<].permaneceu atrelada ,aos interesses
do absolutismo real, que ainda refletia~ a Nesse contexto, a éducação não cons-
consciência mediéval. Por ser um país cátó- tituía meta prioritária, já que o desempe-
lico, que resistiu 'ao movimento protestante MO de funções na agricultura não exigia
com a Contrarreforma e a Inquisição, Por- formação especial. Apesar disso, as metró-
tugal condenava os juros, o que restringiu a poles europeias enviaram religiosos para o
acumulação de capital e retardou a implan- trabalho missionário.e pedagógico, com a
Brasil: catequese e início da colonização tação do capitalismo. Por outro lado, por finalidade principal de converter o gentio e
. manter seus privilégios, a nobreza onerava impedir que os colonos se desviassem da fé
os cofres públicos e dificultava a aliança do católica •.éonforme as orientações da Co.n-
A partir desse capítulo, intercalamos-na
rei com a burguesia. Além disso, enquanto trarreforma.
segunda parte a história da educação no
C~~!Qe;b ~m oc1lll!l=a~ão a Europa renascentista se preparava para o A intenção dos missionários, porém,
Brasil. No entanto, desde o presente ca-
pítulo até o oitavo, só veremos os tópicos . GiJD . ma'CCoifeê~'gãC!l .', livre-pensar que se consolidaria no llumi- não se reduzia simplesmente a difundir a.
nismo do século XVIII, Portugal permane- religiãq. Numa época ,de absolutismo. a
Contexta histórico e Educação, por não poder-
mos tratai de uma pedagogia- brasileira • Fase heroica: de 1549 a 1570 cia cioso da herança cultural clássico-me- • Igreja, submetida ao poder real, era ins-
- catequese. dieval, preservando o latim, a' filosofia e a trumento importante para a garantia da
propriamente dita, já que estivemos todo
• Fase de conso~dação: de 1570 literatura cristãs. ' .- unidade política, já que uniformizava a
esse tempo atrelados ao pensamento es-
a 1759 - expansão do ensino se- Por levar mais tempo para encontrar fé e a consciência, A atividade missioná-
trangeiro. Essa situação se atenua no final
~ cundário nos colégios; . . metais no Brasil, de ~cio a ação dos por- ria facilitava sobremaneira a dominação
do século XIX, quando já é possível exa-
. • Reformas pombalinas:de 1749 tugueses restringiu-se à extração do pau- • metropolitana e, nessas circunstâncias,
.minar expressães-mais-ateIitassobre os te-
a 1808 - instrução pública. brasil e a algumas expedições exploratórias. a educação ass~mia papel de agente
mas pedagógicos. Por fim, no século ~,
• Periodo joanino: de 1808 a A partir de 1530 teve início ~olonizaçào, colonizador.
chl.do o- grande volume de informações,
1822. com o sistema de capitanias ht"reditárias e a No Brasil, segundo a historiografia tra-
preferimos estudar o Brasil em capítulo se-
monocultura da cana-de-açúcar. dicional, foram os jesuítas que, em maior
parado da história europeia.
.. Enquanto na Europa os ~tos da mo- número e atuação efetiva, obtiveram re-
sultado mais significativo ••porque, se em-
dernidade exorcizavam a tradição medie-
val, no Brasil implantavam-se formas de penharam na atividade pedagógica, para

~13;o8--~--------:-~'-:-;-:---;--::-;---------- Renascimento: humanismo, Reforma e Contrarreforma 139


Hist6ri.a da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil
eles considerada primordiaC No entanto, telectual, além do controle da fé e da moral ~. fase heroica: a catequese ca, poesia, diálogos em verso. Pelo teatro e
estudos recentes têm mostrado que outras ' dos habitantes da nova terra. dança, os meninos} aos poucos,' aprendiam
ordens religiosasforam importantes - mas Era dificil a empreitada de .instalar um Diante das críticas e defesas da ação a moral e:a religião crist.ã,
que não deixaram o mesmo volume de do- sistema de educação em terra estranha e de catequética dos jesuítas no Novo Mundo, Logo teve 'iníci~ o:chóque entre os valo- .
cumentação da Companhia de Jesus -, povo tribal. De um lado, osindígenas de lín- nunca é demais relembrar que, embora a' res da culttrra nativa e os do co!onizadar.'
tais corno os franciscanos, os carrneJitas e gua e costumes desconhecidos e, de outro, etnologia contemporânea tenha uma com- O sociólogo brasileiro contemporâneo Gil-
os beneditinos, os colonizadores portugueses, que para cá. preensão diferente sobre o contato de cul- berto Freyre, na obra CQ$a-gran~ e senzala,
vieram sem suas Ínulheres e famílias,muito turas tão diversas, aqui vamos' enfocar essa diz que os primeiros nUssionários substitu-
Educação rudes e aventureiros; com hábitos criticados ação a partir do conceito que dela tinham Íamas "cantigas' lascivas", 'entoadas pelos
pelos religios?s. os próprios missionários. .índios, por hinos ,i Virgem e cantos devo-
1. A chegada dos jesuítas Embora osjesuítas recebessemformação Desse modo, retornemos o impacto pro- tos, condenavam a poligamia, pregando a
rigorosa e orientação segura doRatio Stu- vocado nos europeus'por povos tão "rud~s", forma cristã de casamento, Dessa maneira
Para melhor çompreendet a ação dos je- diorum (rever priméira parte deste capítulo), "sem lei" e "sem fé". Muitos chegavanl a começaram .a. abalar o sistema comunal
suítas no Brasilé conveniente rever a primei- enfrentaram sérios desafiospara se adaptar pensar na impossibilidade de conseguir al- primitivo.
'ra parte deste capítulo, em que analisamos a às exigências locais. É bom lembrar quanto , gum sucessono processo "civilizatório" dos Tornara-se tão comum falar na "língua
Companhia deJesus no seu contexto históri- lhes valia, nesses casos, a sua tão conhecida nativos, enquanto para outros, incluindo ai geral" - mistura de tupi, português e latim
co; Yrmos que, após a Reforma, o Conólio flexibilidade. os missionários, os indígenás eram como - que os padres a usavam até no púlpito.
de Trento empreendeu' a Contra.r-refonrra; Ao se deslocar'da-B:~apara1)"Sul;.fun- filhos memrre&;uma, "folha, em branco" O procedímento"perdurou':por: algum:.tem--
destinada a impedir a:propagação da. dissi-. daram o ColégiO'de São 'Vicente,no litoral, em cwe., se poderia"inculcar os:val?res. da po,até que.-agautoridades'passassemaexi-
.dêneia"religitlSa~representada- peJa.,.reJigiào-<,.
,.-depois,transferido para-fua.tinínga,~I1.O'-pla-_.; .' .~~c;ristãJ~ump.eia~.:tNesse"'.sentido} gir.~usividade~p~a.a lirigJ¥'E.oEtugue~,
protestante. Além dos jesuítas, com ação naltoj onde, a partirdoGolégioll,errt1554, convictos degue o cristianis~o repres.en- temerosas de que a língua nativa predomi-
mais intensa, eficaz e dW'adoUl"2.,outras or- St1..rgitI
a cidade de São Paulo. tava uma vocação. humana.. universal que nass.e.
dens empenharam-se nesse trabalho. Com espírito empreendedor, opâdreMa-" implicamtegràção .e ,unidade; '.lançaram"se' O fato é que odndi:ose encontra:.va'ãmer-
Quando o primeiro governador-geral, nuel da Nóbrega organizou as estruturas do com. empenho na incorporaçãO' territorial de
cê três interessei, que ora se complemen-
Tomé de Sousa, chegou ao Brasil em 1549, ensino, atento às condições novíssimasaqui e espiritual desSasetnias, na esp&ança de tavam, ora se chocavam: a metrópole dese-
veio acompanhado por diversosjesuítas en- encontradas. O primeiro jesuíta a aprender acentuar as semelhanças ....: todos eram se- java integrá-lo ao processo colonizador; o
cabeçados por Manuel da Nóbrega. Ape- a língua dos índios foi Aspilcueta Navarro, res humanos ~ ê apagar-as diferençãs: jesuíta que.ri,aconvertê-lo ao-cristianismo e
nas quinze dias depois, os missionários já também pioneiro na penetração nos sertões Começam então a tentar conquistar o aos ~ores europeus; e o colono queria ~!Í-
faziam funcionar, na-recém-fundada ddadeeÍn missão evangelizadora.A essasduas figu- chefe da tribo e a desmascarar o pajé. Logo -lacomo escravo para o trabalho.
de Salvador, uma escola "de ler e escrever". ras veio sejuntar, em 1553, o noviçoJosé de percebem que a ação é mais eficaz solm: os
Era o início do processo de criação de es- Anchieta, de apenas 19 anos, que mais tarde filhos dos indígenas, os curumins (também 3. As mi!isões
colas elementares, secundárias, seminários se destacaria no trabalho apostólico. columins ou cu1umins), alunos prediletos,
- e missões, espalhados pelo Brasil até o ano . Fernando de Azevedo, historiador brasi- porque sobre eres ainda não se sentia de Após' i.un período de pregação em que
de 1759, ocasião em 'que os jesuítas foram leiro da educação, refere-se a essa "trindade maneira ~ada a influ~cia do pajé. permaneciam um tempo .nas tribos e reali-
expulsos pelo marquês de Pombal. . esplêndida - Nóbrega, o político,NaV'arro; A fase heróica da missão jesuítica vai ' zavam batismos, os religiososseguiam para
Nesse penado de 210 anos, os jesuítas o pioneiro, e Anchieta, o santo" - como dos anos de 1549 a 1570, data da morte do outro local. Mas logo descobriram que as
:-f' . promoveram maciçamente a catequese dos símqolo da '~tividade extraordinária dosje- padre Nóbrega. Nesse período, os padres conversões não se consolidavam, além de se
-~~~~~~-,,--Í11dios,-a.educação dos ~os dos colonos, a suítas no século XVI, a fase mais bela e he- aprenderam a Iingua tupi.:guara.t?ie elabo- tratar de empreitada perigosa.
formação de novos sacerdotes e da elite in- róica da história da Companhia deJesus"12. raram textos para a catequese, ficando a Para realizar a a.ção missionanã -com
--.-' -.- ..._------ ------ cargo de Anchieta a organização de uma menos riscos e consolidar as conversões,
~*'. '~.

gramática tupi. foram então criadas as missões, localizadas.


11 O colégio instalado no planalto não se chamava São Paulo, como se costuma dizer, lIlllS sim Colégio Santo no sertão, longe dos colonos ávidos de es-
Inicialmente os curumins aprendiam a
.• ' • -Imidoj vale lembrar que funcionava mais como uma casa de meninos" e não como colégio propriamente
u
cravos. As principais ficavam-ao norte do_
dito. "
ler ~ a escrever ao lado dos filhos dos colo-
12 h-cullura hrosileira: introdução ao estudo da cultÚra no Brasil, 4. ed. rev. e ampL Brasília, Ed. UnB, 1963, nos. Anchieta usava diversos recursos para o México, na orla da floresta J\mazônica. e
p.505. . atrair a atenção das crianças: te~, músi- no interior da América do Sul, em que se

140 História da Educação e da Pedagogia- Geral e Brasil Renascimento: humanismo, Reforma e Contrarrefõrma 141 ..
-~~::;;==~::~~=i~=~=~~.
I~~,;':",o::,~~~=;
outras no território brasileiro de norte a sul. ComÇlo uso de sanções violentas era hábit~ passi~os;à mulher e a criança. Educando o
Terminado o curso de artes, apresenta-
vam-se ao jwem duas alternativas:
• estudar teologia, opção que ajudava a
Aqui, as primeiras e várias delas aparece- europeu naqueles tempos, esse costume fOl, menino, conseguiam manter viva a religio- manter viva a obra ?os jesuítas no tempo, '
ram na Bahia. . trazido para cá. As penalidades variavam sidade da família. formando-se padre ou.mestre;
Vejamos.o que os missionários se propu- conforme a gravidade da culpa.,usandb~se Era tradição das famílias portuguesas • preparar-se para as carreiras profanas
nham mudar, para e'uropeizar e cristianizar o açoite, o tronco e até m]ltilações,cuja exe:, orientar os filhos para diferentes carreiras. das profissões liberais, como direito,filo-
os nativos. Surpreenderam-se de início com cução devia ser púb~ca e exemplar. . . O primogênito herdava o patrimônio do sofia e medicina; neste. caso, encaminha-
o fato de cem a duzentas pessoas viverem As missõesprosperaram de modo Slgnifi- pai e continuava seu trabalho no engenho; va-se para uma das. diversas faculdades
na mesma oca, sem divisões que preservas- cativo. Além da atividade agrícola, confor- o segundo, destinado para as letras, fre- europeias - os brasilei.;.osprocuravam so-
sem a intimidade das famílias n~m reparti- me o lugar havia criação de gado, artesa- quentava o colégio, muitas vezes concluiu- bretudo a Universidade de Coimbra, em
ção de funções e tarefas, porque ali dentro nato, fabricação de instrumentos musicais, do os estudos na Europa; o terceiro enca-' Portugal. .>

tudo se fazia. construção de templos. Tudo adrriinistrado minliava-se para a vida religiosa. Como se . Para esse programa/os jesuítas foram
Por isso,Osjesuítas deslocaram os nativos pelos jesuítas, sem intervençãó externa. vê, -osjesuítas agiam sobre os dois últimos. apoiados oficialmente pela Coroa, que
para outras áreas, onde criaram as aldeias Porém, 'a segregação de tribos inteiras nas Mesmo quando os filhos não eram envia- também os auXilioucom generosas doações.
reunindo várias etnias, designadas por eles, missões, esse "ambiente de estufa~',fragili- dos aos colégios e recebiam educação na de terras. O governo de Portugal sabia o
de modo homogêneo, como o "gentio". Ali zava ainda mais os índios. O confinamento própria casa-grande, ficavam aos cuidados quanto a educação era importante como
se con~truíram as casas, onde se alocava facilitava aos COlOI~OS capturar tribos i?tei- dos capelães e tio;:;-padres. mei9 de domínio político e; portanto, não
cada família, a uDidade sO,cial.Assim diz rasoDurante o século XVII, os banderran- Outro modo de ação cumpria-se no con- intervinha nos planos dos jesuítas.
Baêta Neves: "Na aldeia cada coisa deve ter . tes realizaram diversas expedições de apre- fessionário.O padre ouvia ospecados e assim
seu lug(lT e sua hora. Há urrt local para o tra" samento e destruíram muitas povoações, in- modelavao pensar dos'colonos.Em casosex- 5. Outras ordens religiosas
palho, outro para o descanso, outro, para o clusive as dirigidas por jesuítas espanhóis. , tremas, negar a absolviçãodos pecados reve-
culto, outro para a familia"13.Mudaram ai Depois da:expulsão dos jesuítas (século lados no confessionárioera uma maneira de Embora tenha sido costurile l:nfatizar-se
práticas nômades, consideradas bárbaras, e XVIII), desmoronou-se a estrutura cria- pressionar à mudança de algum comporta- a ação dosjesuítas na'educação da colônia,
estabeleceram um sistema agrícola restrito da pelos padres, e os índios aculturados" menta consideradoimoral ou ímpio. .outras ordens aqui estiveram com o mesmo
a áreas determinadas, onde se fazia a divi- não conseguiram mais subsistir moral e No campo da educação prop~ente propósito, tais como franciscanos, carmeli-
são de tarefas e observavam-se os "mdmen- ecemomicamente. dita, desde o séêulo 'xVI oS jesuítas mon- tas, qeneditinos. Para alguns estudiosos que
tas de semear, podar, colhe!; queimar". taram a estrutura dos três cursos a serem se debruçam sobre o assunto não deixa de
Desse modo os missionários pensavain 4. Período de consolidação: a instrução seguidos após a aprendizagem doe"ler, es- ser estranho o relativo silêncio sobre essas
estar prestando um' serviço civilizatório, ao da elite crever e contar" nos colé'gios:a) letras hu- contribuições. . •.~
retirar os nativos da "ociosidade", da "pre- manas; b)filosofiae ciência (ou artes);c)teg- O professor Luiz Fe~do Conde San- •
guiça", da "indisciplina" e da "desorganiza- Vrmos que as primeiras escolaSreuniam logia e óências sagradas. Esses três cursos genis1+ nos esclarece que em 1585 foi criada
ção". Introduziram regras de higiene, manei- os filhos dos índios e dos colonos, mas a eram destinados respectiVamente à forma- a Custódia de Santo Antônio da Brasil, em
ras dé.comer, condenaram a antropofagia, a tendência da educação jesuítica que se con- ção do 4lJIIlanista,do filósofo e do teólogo. Olinda, Pernambuco, onde, no ano seguin-
embriaguês, o adultério. Lutaram também firmou foi separar os "catequizados" e os No curSo de humanidades, de grau mé- te, franciscanos recém-c;hegados fundaram
contra a nudez, suprimindo aos poucos os "instruidos". A ação sobre os indígenas re- dio, ensinavam latim e gramática para. os um internato para os curumins. Ali era
adgrnos c~nsiderados "deformadores" e de- sumiu-se então em cris~¥ e pacificar, meninos brancos e mamelucos (mestiçosde ensinado o catecismo, bem como a ler, es-
finindo Uma "geografia do corpo" segundo a tornando-os dóceis para o trabalho nas al- '- __branco~)_Em-aIguns:.colégios, como crever e contar. Depois se estenderam pelo
qual havia partes que poderiam ser mostra- deias. Com os filhos dos colonos, porém, a o de Todos os Santos, na Bahia, e o de-8ão Rio Grande do Norte" Alagoas, Parrooa,
• das e outras a serem cobertas. educação podia se estender além da escola Sebastião, no Rio deJan~, eram ofereci- Grão-Pará e Maranhão. Na região'Sul, fa-
Por considerarem que os nativos viviain elementar de ler e escrever, o que ocorreu a dos.também os outros doi'{cursos, de artes ziam missões-volantes, não estabelecendo
a "inf'ancia dahumanidade", os jesuítas se partir de 1573. e de teologia,já de grau sURerior. residência permanente nas aldeias.
..
H "Franciscanos na educação brasileira", in Maria Stephanou e Maria Helena Garoara Bastos (orgs.), Histórias
,. O Combau dtJs soldtuios dt Cristo na Tmrz dos papagaÜJS: colonialismo e repressão ~tural, p. 130. 611!t11l1Íritl.r da ~cl1fiIo no BrasiL \t I: Skulos XVI-XVIII, p. 93.107.

História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil _Renas.~.:JJJJmanismo. Reformae Cpntriil'reforma 143


142
A pouca informação que ternos sobre antropologia, é inevitável admitir que a
as outras ordens dêve-se a diversos mo- desintegração -da-c~~ indígena iniciou Dropes niuito. Estes meninos falam português,
tivos. Lembramos que a' Companhia de com eles. cantamã" noite:a, doutrina pelas ruas,.
Jesus deixou 'abuD.d.ante documentação, Lembrando os versoa irreverentes de e encomendam as almas do purgató- ..
1 ~A lei, que lhes hão-de dar, é defen-
porque os padres deviam prestar cont?S Oswalcl-de Andrade - em que o poeta la- rio':. (Adaptido de Darcy' Ribeiro.)
der-lhes comer carne humana e gUer-
freqüentes aos seus superiores e suas car- menta o fato de o descobrimento do Brasil rear sem licença do Governador; fazer-
tas permaneceram como registros impor- não ter sido em um dia de so~ para que os 3 • O colégio [dos jesuítas] 'estava~
-lhes ter uma só mulher; vestirem-se
tantes, inclusive pela imprensa. Acresce o índios despissem os portugueses - os pa- ; com efeito, siciiado. numa.sodeda.
pois têm muito algodão, ao menos de-
fato de que os jesuítas n~o só atuavam nas dres vestiram literalmente os índios, para ' de religiosa, que .se concretizava: em
.~ 'pois de cristãos, tirar-lhes os feiticeiros,
missões, convertendo os indígenas, mas que se envergonhassem da nudez. Também hábitos. e yalores, práticas e devo-
mantê-los emjUstiça entre si e para com
também nas cidades e junto aos engenhos os "vestiram" simbolicamente' de outros va- ções, instituições e organização; (.. ;)
os cristãos; fazê-los viver quietos sem se Assim, toda a vida social era perme-
de açúcar, ocupando-se, portanto, com a. lores, de cultura di(erente: impuseram-lhes
mu~m para outra parte, (... ) tendo ada de' simbolismos' crisÜ.os, desde o
educação da elite. outra língua, outro Deus, outra moral e até
terras repártidas que lhes bastem, e nascimento de lima criança, corri o
Enquanto isso, as demais ordens reli- outra estética. .
giosas não preservaram da mesma forma Convém, no entanto, considerar a ad-
com estes Padres da Companhia para
os doutrinarem. (Trecho de urna carta
a
batizado, até morte, com o viático,
a sua memória. Entre elas, os franciscanos vertência feita na primeira parte deste com confissão, unção dos enfermos,
capItulo, sobre a percepção que os eu- • do padre Nóbrega, enviada a Lisboa em . bênção do corpo na Igreja, enterro
procuravam "os povoados dependentes da
caridade dos filhos de São Franc:istb>t;-com ropeus tinham naquela época sobre os 1558.) acompanhado do clero, com-:cânti-
I
, menor visibilidade de sua atuação. Além povos "selvagens" e o intuito. de homúge- cos e orações, cemitério religioso etc.
disso, privilêgiavamos' türsos das primeiras neizaçãoque comãD:da.va-todo processo 2 ~.Padre Cardím, que. foi reitor do As repartições'públicas trazi~ o cru-
letras e só voltaram a atenção ao ensino se- educacional. Para eles,. ciVilizar os pOlias Colégio da Bahia, visitou Váriasmissões cifixo ou imagens de santos. ~ ruas
. cundário no século XVllI, após a expulsão era .fazer o. possível para igualá-los aos entre os anos de 1583 e 1590, Relata se encontravam. oratórios. O calendá-
dos jesuítas. "melhores", par isso desenvolveram um que, no comum das aldeias, "há esco- rio era balizade pela liturgia. -O clero
Adiantando um pouco o que veremos em processo desilenciarnento das culturas las de ler e escrever, aonde os padres tinha destaque em qualquer cerimô~
outros capítulos, os franciscanos também se "estranh'as"-,-- ~ ..- ~:: • • - . ensinárn os meninos índios: e alguns, nia. As festas do lugar tinham a mar-
dedicaram ao ensino superior, fundando no . Pela, a-hJ.ação c~nst2,Ilt~ até~ô'.-século' } mais hábeiS também ensinam a con- ca religiosa, a.procissão se fazendo o
século XvII'Um convento de altos estudos XVIII, não só entre os nativos, mas sobre- ~, tar, cantar e tanger; tudo tornam bem, ato de exibição social por excelência.
de teolo~a e filosofia, que antecipou a ins~ tudo IU). sociedade colonial, podemos dizer t. e há já muitos que tangem flautas, vio- .0 público estava impregnado de sagrado
tituição dos cursos superiores ocorrida no que osjesuítas imprimiram de modo mar- las, cravos e oficiam missas e~ canto e a "Igreja." estava por toda parte pre-
século se~te. cante o ideário católico !la concepção d~ .~ d'órgão, coisas que os pais estimam .gente. (Jo~éMaria de J;>aiva)
.mundo dos brasileiros' e 'consequentemen-'
Concfusão te introduziraÍn a.tradiçãg.~.!!~ d~_~n:
sino que perdurou até a República.-
Por mais que tenham sido admiráveis Voltaremos' â analisar a' influência da velha maloca taracuá (... ) Sabe V Rvma .
• Leitura complementar.
a coragem, o empenho e a boa-te desses Companhia deJesilS no éapítulo à, pór oca- que para o índio a maloca é cpzinha, dor-
sião de sua expulsão das terras brasileiras.
.. missionários, hoje, à luz dos estudos de .
t.. ~
.
[A maloca indígena] mitório, refeitório, tenda de trabalho, lugar
de reunião na estação de chuvas e sara de
..<-'-'-

• No início do século XX, o monsenhor .dança nas grandes solenidades. É onde nas-
0 o .-,_. -_----' - - 'c -., Pedro Massa, missionário salesiano que • ce, vive e morre o índio; é o seu mundo .. ,
'.o

'~~_. participou da catequização dos Tukano, A maloca é também, como costumava dizer
descreve: o zeloso dom Bazola, a 'casa do diabo', pois
.-'", "Refiro-me à destruição que, auxiliados que ali se fazem as orgias infernais, maqui-
por um grupo de Índios e de. rapazes, pu- nam-se as mais atrozes vinganças contra os
demos fazer da grande (20 x 40 metros) e brancos e contra outros índios: na maloca

--.,.' ..-' - ..•. s.dm..ento: humanismo, Reforma e Contrarreforma 145.


144 História da Edu€af
transnlltem-se os vícios de pais a filhos, .. de 'dorimo espiritual e social. A comu-
, J Ora bem: esse mundo do' índio, 'essa casa nidade maloca é a unidade da primitiva
do diabo não exÍste mais em Taraucá: nós
6. "Retome a se~da leitura comple-
'organização s'emicomunista dessas tri-~. mentar '1\mérico Vespúcio tinha ra- ,
a desencantamos e substituímos por um bas. Levantada pelos esforços conjugados .:~.: flitestãe.s gerais . zãD?" do capítulo 1 e responda às ques- "
discreto número de casinhas, cobertas de de seus habitantes, todos têm parte em :i tões a seguir: .- .
folhas de palmeira e com paredes de bar-
ro. Não se mostraram descontentes os ín-
sua posse, sujeitos, porém, à direção pa- ;. 1. Que in~eresseseconômicos e religio- a) Explique çomo a avaliação de'
ttiarcal do tuxaua1B• Devido ao parentes~ :\ sos da metI'Ópolejustificam a coloniza- Américo Vespúcib éra9piniã6 corrente
dios por causa do arrasamento da maloca: co de sangue e à estreita convivência, o ~~ ção? 'Com() a ação catequética dos je- na Europa dó sécclo XVI.
antes ficaram satisfeitos, reconhecendo a ~~.:
laço que une esta comunidade é muito for- :; suítas contribuiu para.Q alcance dessas
grande utilidade de cada família ter sua b) Como p~derian:-0: hoje, com os
te. A arquitetura da maloca está inteira- j metas?
casinha, seu lar, especialmente para evitar conhecÍIi1entosda etno~ogiacontempo-
mente de acordo com o primitivo s;stema ~i
rânea, contradizer o na~gador?
o contágio. Foi-se, pois, a ,maloca dos tu~ familial e social. Ela se divide em cinco r 2. Po~ que a educação não é assunto
canos!".
zonas (uma de cada ,lado) pertencentes,
Curt Nimuendajul5, etnólogo que COnvi- às diversas famílias que nelas fazem seus ~
r ~rioritári~ no Brasil colonial?
7. Faça uma pesq1-ÚSà
para desenvolver
veu com diversas tribos na mesma época, compartimentos, duas aos trabalhos co- 3•..J'or que os~giosos,resolv~ a avaliação crítica sobre ,processo de °
também. descreve no relatório para o SPI'6 desenvolver ,o trabalho de ,catequese genocídio e extermínio' da cultura indí-
muns e o espaço grande do meio- às ce- "j '.
( ...): ';';' em missões? Quais su~ 'caractl1rísticas gena. São possíveis linhas de trabalho:
',i rimônias públicas religiosas e profanas. ;,
. '~ malocas são em geral muito bem principais e os r),scosda empreitac4t!1. • pesquisa em livros de história;
Na maloca condensa-se a cultura pró-o
construídas, suas cobertas oferecem inteira • consulta de notícias recentes em '
pria do índio; tudo ali respira tradição ~
garantia contra o mais violento aguaceiro; independência e é por isso que elas têm
4. Que influências os jesuítas~erce- jornais e revistas nbre a política "indige-
o chão é enxuto e limpo e de tarde reina de cair". 'l. ram sobre os colorios? E ernque medi- nista do governo;
em sua p~numbra uma fresc1"lfaagradável. da foram importantes para a constitui- • lev:mtamentt' de estudos feitos
, Essâs duas descrições da maloca dos
As casinhas modernas, pelo contrário, são ção da cwtu.ra brasileira? " por 'antropólogos sobre o processo 'de
Tukano, nação que hoje habita o alto do
o mais das vezes quentes e mal acabadas. rio Uapés no Amazonas, representam aculturação;
Quanto ao prejuízo que a convivência de 5. Com base n~ dropes 3, responda às • análise de arligos de leis de prote-
duas visões contrárias. No entanto, essa questões a seguir:
diversas famílias na maloca dizem acarre- tribo praticamente já abandonou esse tipo ção de povos indígenas.
tar' é simplesmente falso. Devido à rigorosa a) :Explique qual era a relação e~tre
de construção, devido à redução de sua a Igreja e a sociedade em Porrugal, no
exogamia17 não existem relações ámorosas população e à desorganização provocada (bustõe.s sobre a leitura
século XVI, e como essa ligação se pro-
entre os filhos de unia mesma maloca ...
'
. •1
.. O principal motivo, porém, da aversão do
pela invasão de' garimpeiros e minerado- longou até recentemente no Brasil. .
complementar '
res, principalmente a partir da década b)Discuta com seu grupo como ajuda
missionário contra a habitação coletiva é de 70. hoje se colocam questões desse tipo mes- 1'~
Co~are os dois re1afos,produzidos
outro; vê nela, e com toda razão, o símbo- na mes~6p9ca, e indique ,suas discre-
mo nos Estados laicos:por exemplo, cru-
lo, o verdadeiro baluarte de organização pâncias.
cifixoem sala de aula de eScolapública,
e tradição primitiva, Qa cultura pagã que a polêmica so~re a proibição, na França,
tanto contraria seus planos de conversão, de mulheres árabes frequentarem aulas 2. Posicione-se pessoalmente -sobre o
com o véu que,cobre os cabelos etc. assunto.

u Curt Nimuendaj~ (1883-1945), etnólogõ autodidata, nascell na Alemanha e seu verdadeiro nome e~. Kurt
"Unkel. Morou muito tempo entre os nativos e adotou o nome que em tqpi-guarani significa "aquele que fez
seu próprio lar".
16 SPI: Serviço de Proteção do Índio, órgão de defesa dos interesses indígenas, substituido em 1967 pela F~da-
ção Nacional do Índio (Funai). •
gamia (união): casamento com pessoas de fora da tribo ou entre famílias diferentes.
17 Exogamia -'-I!X (fora)
18 Tuxaua: chefe de família.

146
História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil a-e-C..;..o-n-tr-a-rr"""";ef:-orm-a---:-----------:j';14b.
-R-en-a-s-cim-en-t-o:-h-u-m-a-ni-sm-o-,-R-ef-o-rm-. 7~ __
i

"
I
'
:'
,"

I'
I"
, ,I
, I
. ,

I
I
'I '
:1 1 ,.... '.' h.

I ;1

"
I
• I •
I
I'

I
!

I •

'I

',,'

'H
I
. ;~
..

Capítulo
_ I

Século XVIL.
a.peqagogia realista

Os historiadores costumam.determinar
o século XV como o início da Idade Mo-
derna, que se estende até 1789,.dota da
Revolução Frsmcesa, quando então co-
meça a Ida•.de Contemporânea.' .
Na primeira parte deste. capítulo ve-
remos as grandes alterações que ocor-
reram na Europa, devido à Revolução
ComerGÍal, sinalizando a ascensão da
burguesia, cujos anseios já se esboça-
Aranha, Maria Ltkia de Arruda
vam nas teorias 'política e econômica.
~~stória ~ e~ucaçào e da pedagogia: geral e
Bra.'iJ! I Mana LUCIa de Amlda Aianha. - 3. ed. _ do liberalismo. Inaugurava-se então um
rev e ampl. - São Paulo: Moderna 2006. novo paradigmá para o pensamento e
ação da modernidade: não por acaso, o
Bihliogrnfia
século XVU é o "século do método", que,
1.. Edue.H,'ão -'História I. Tírulo. ao fecundar a ciêncide a filosofia, reper-
cutiu nos teorias pedagógicas. •.
NJ;ssegunda parte, veremos a defasa-
05-8901
. COD-370.9 gem ~\re .os acon.tecimentos da Europa
(odices para catPlogo sistemático: (o nséculo do método" é e os d6 Brasil colônia, que permanecia
.1. Educa~'ão: Hist6ria.370.9 ~. também o século do saber
JJ numa fase pré-capitalista. Na educação,
ativo", que fez a anança predominou a educação jesuítica, com
Reprodução proibida. Ar1.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fe;vereiro de 1998 .. entre a ciência e sua
ênfase no ensino secundário paro a for-
aplicação prática. A Hew
Todos os direit~~ reservados Sysfem of Mathematics mação_da .elite/- além ~dº. Horescim~to
(1681), liVrOpioneiro dos missões, no interior.
EDITORA MODERNA LIDA. do inglês Jonas Moore,
Rua Padre Adelino. 758 - B~lenzjnho estudioso de trigonometria
São Paulo - SP - Brasil - CEP 03303-904 e um dos fundadores
Vendas.e Atendimento: Td. <0__ 11) 2790-1 'iDO da Rayal Mathematieal
School, destinava-se 005
..
F:1X (0 __ 11) 2'1'90-1501
alunos ~eIo'escol. de
'W'w\v.modema.com.br
navegação •.
2011
149 ..
Impresso no Brasil ---------------------- .-
.~
P A R T E I justifica-se até o direito à insurreição, caso : Durante o século XVII,' um dos campos
()soberano não atenda ao interesse público. que esses novos ventos fecundaram foi o.da

o século do método Daí a importâÍ1cia'do legislativo, poder que


controla os abusos çloexecutivo.
filosofia. Podemos dizer que na Idade Mo-
derna começou llIll3.nova forma de pensar
..'1Jm dos aspectos progressistas do pensa- que partiu doproblema do conhecimento. Filóso-
Contexto histórico 2. liberalismo econômico e político mento liberal reside na origem dêmoêrática foScomo Descartes, Bacon, Locke, Hume,
. e parlamentar do poder político, detertrli: Espinosa discutiram .a teoria do conheci-
1. A burguesia se fI rtalece ~tY~~A~pmB11~~~Md}ta!~qill-;. nado pelo voto e não mais pelas condições mento segundo questões de método!, isto é,
tomava forma ateoria doliberali#llo,fanto ,de nascimento, como na nobreza feudal.' colocando em discussão os procedimentos
No século xvn, ainda persistiam as do ponto de vis~'político, pelo questiona- llimbora a te.oria liber(J,L.se_apre~, da razão na investigação. da verdade, an-
contradições decorrentes do processo .de mento da legitimidade, do poder real, como cõino democráti.ca,-éinevitáveL encontrar tes de se permitir teorizar sobre qualquer
desmantelamento da ordem feudal e 'da no seu aspecto econômico, perceptível na~ ';;:asua ra~elitismoque a distin~econ; tema~
ascensão da burguesia, com o consequente críticas ao excessivo controle estatal C!a expressão d~.~teresses da b~esi~a Outro. CaIJ'lpOdo saber em que houve
desenvolvimento do' capitalismo. Intensifi- economia. Tanto é que, no final do século Vida em sociedade, somente aqueles que uma revolução metodológica foi o da ciên-
cando-se .o comércio, a colonização assu- xvn, a Revolução Gloriosa (1688) liqui-~. . têm propriedades, no sentido restrito de' cia. Como viinos nos capítulos anteriores,
mia características empresariais, enquanto dou o absolutismo e instaurou a monarquia fortuna, podem participar de fato da polí- tanto na Antiguidade como na Idade Mé-
ã. Europa era inundada pelas riquezas eX- constitucional na Inglaterra. tica, por serem. os que teriam reais condi~ • dia predominava a concepção de ciência
traídas da América. . O principal intérprete d:asideias políti- ções de exercer a cidadania. Essa mesma puramente contemplativa, vinculada à fi-
O clescimento das manufaturas alterou cas liberais foi o filósofo inglêsJohn Locke perspectiva elitista defil,l,ea reflexão sobre losofia e desligada das aplicações do saber,
. as formas de trabalho. Os arteaãos de pro- (1632-1704). Por ser uma teo?a que expri- a educação. por isso ciência e técnica achavam-se sepa-
dução doméstica perderam seus instrumen- me os' anseios da burguesia, 'o liberalismo O pensamento liberal de ~cke, divulga- radas. A gnmde novidade da nova ciência
tos de trabalho para os capitalis1:a!le, reuni- opunha-se ao absoiutismo dos rejs, fazendo , do no final do século xvn, exerceu grande foi a valorização da.técnica, ao privilegiar
dos nos galpões onde nasceram as futuras restrições à interferçncra do Estado na vida' . influência no século seguinte, por ocasião o método experimental, mérito que coube
fábricas, passaram a receber salário. dos cidadãos, em defesa da iniciativa priva- .., da Revolução Francesa e das lutas de eman- a Galileu Galilei (1564-1642). Em oposição
'-A nov,aordem consolidou~se coril o mer- da. As críticas ao mercantilismo seriam in- ' cipação colomal nás Américas.' . ao discurso formal da fisica aristotélico-to-
cantilismo, sistema' que supõe o controle
o tensificadas no século seguinte com as teo- mista, Galileu valorizou a experiência e o
'da economia pelo Estado e que resultou rias econômicas de Adam Smith e David 3. O séc~lo do método testemunho dos sentidos. Seu método re':
. da aliança entre reis e burgueses. Estes fi- Ricardo . sultou do feliz encontro'da experimentação
'nanciavam a monarquia absoluta que ne- à pensamento de Locke parte da ques- . Desde o Renascimento, muitos opunham com a matemática, da ciência com a téc-
cessitava de exército e marinha, enquanto tão da legitimidade do poder: o que torna ao critério da fe e da revelação a capacida- nica. TaiS procedimentos não provocaram
em troca os reis ofereciam vantagens como legítimo o poder do Estado? DesenV'91ve de da razão humana de discernir, distinguir simples evolução na ciência, mas uma ver-
incentivos e concessão de monopólios, favo- então a hipótese do ser humano em "es- e co~parar. À tendência antrQpocêntrica~ dadeiraruptura com a tradição, decorrente
recendo a acumulação de capital. tado de natureza", em que todos seriam 'ou st'ja, de resgatar a dimensão humanã danava lliiguagem científica, de um novo
-Politic:amen:te,o séculoXVII caracteriza- livres, iguais e independentes. Os riscos sob todos os aspectos, favorecia a mentali- paractigma.
se pelo ab~olutismo real, e entre oS'teóricos das paixões e da parcialidade seriam mui- dade crítica, 'que contrapunha ao dogmatis- O renascimento científicopode ser com-
que defendiam ess~tipo de poder irrestrito, to grandes porque, se "cada um é juiz em mo a possibilidade da dúvida e rejeitava o preendido como expressão da' ordem bur-
o mais contLecido é o filósofo inglês Tho- causa própria", torna-se impossível a yida
princípio da:autl?ridade ao questionar tan- . guesa. Os inventos e as descobertas são
mas Hobbes (1588-1679). Não se tratava, •comum. Para superar essas dificuldades, as
to interpretações religiosascomo.a...filosofia.. inseparáveis da nava ciência, já que, para
no entanto, de buscar os fundamentos do pessoas consentem em instituir o corpo po-
aristotélica. Essa atitude polêmica com a a crescimento da indústria, a burguesia ne-
absolutismo a partir do "direito divino dos lítico por meio de um contrato, um pacto
tradição provocou 1J:laicização do saber e cessitava de uma ciência que investigasse
'reis", mas sim de acordo com o contrato, o originário que funda o Estado.
estimulou a luta contra os preconceitos e a as forças da natureza: queria dominá-las,
,pacto social. 'Este é um sinal dos tempos em ~Para Locke, os direitos naturais não
intolerância. usando-as em seu beneficio. A ciência dei-
que as e.'q>licaçõesreligíosas começam a ser aesaparecem em consequência desse con,"
• ,substituídas pela valorização da autonomia sentimento, mas subsistem paia limitar o
'da razão. poder do soberano. 'Em' última: instância: I Método signifiCadireção, pminho para um fim, instrumento que permite a construção do conhecimento .
• 150 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil
---.,..-'---~'-_._---.,.-----:---------------:-:=7
SécuJO.l0JlLap.edâgogia.rea]js.ta______ 151
a fiI9s0Racartesiana (do filósofoDescartes); No currículo, o ensino do francês prece-
xa de ser um saber contemplativo para que, Nas questões de fé, o ideal de tolerância
;:r:s1!".avam o francês e outras línguas mo- dia o do latim. Criticavam o verbalismo, a
.~ ! afinal, indissoluvelmente ligada à técnica, se contrapunha às luta;, rdígiosa.>,çontinu-
dernas, além do latim; estudavam história memórização e a erudição estéril, em fran-
servisse'à nóva classe. Como resultado des- ando ativas as forças que polarizavam, de
e geografia co~ o uso de mapas; encora- ca oposição .aosmétodos dosjesuítas.
sa interdependência entre ciência e técnica, um lado, a religião e a moral cristãs e, de
outro, as t~dências à laicização. javam a curiôs~dadecientifica e utilizavam
a ação humma sobre a natureza foi am-
Eram sinais da gestação de outros tem- um sistema disciplinar brando. 2. Educação pública
pliada: chama-se ideal baconumo a concepção
Os jansenistas constituírariJ. outro _gru-
do filósofo Francis Bacon (1561-1626), para pos, em que o novo lutava para se impor-
po religiosoque também se opôs ferrenha- Vimos que, ne R-enascimento, por ins-
quem o "conhecimento é poder", poder de ao velho.
mente aos jesuítas. Reuniam-se na abadia piração da Reforma, as escolas da Ale-
controle científico sobre a natureza.
de Port-Royal,perto de Paris, e a partir de manha buscavam a universaliiação do
Educação
1646, sob a direção de Saint-Cyran, os.cha- ensino eIementar comO'forma de. propa-
4. A "crise da con~ciência europeia"
mados "solitários de Port-Royal" organiza- gar a fé religiosa. No século~xvn, ainda
1. Educação religiosa
ram as famosas "pequenas escolas", que em persistia aquel.a tendência, em 'oposição
No século XVII ocorreu -uma revolução
breve tempo desempenharam importante ao ensinp dos jesuítas, tradicionalmente
espiritttal que foichamada de crise da consciêncÍa No século XVII, os esforços para insti-
papel na formação de lideres para a Igreja centrado no nívei secundário e, portanto,
IJUropda. Ao opor à ciência contemplativa um tucionalizar a escola; iniciados no século
e o Estado. mais elitista.
saber ativo, o indivíduo não mais se conten- anterior, aperfeiçoaram-se com a legisla-
Inspirados por Jansênio, co~iQ.eravam Embora a Guerra dos Trinta Anos
tava em apenas "saber por saber", como.um ção que contemplou tópicos referentes à
a natureza humana- intrinsecamente má e (1618-1648) dificultasse a re:ilização dos
simples'espectador da harmonia do mundo, obriga,toriedade, aos programas, -níveis e
retomaram os temas agostinianos da graça projétos de educação pública, na Europa os
~i mas desejava "saqer para transformar". " métodos.
_. e do pecado. Desejosos de promover a re~ alemães foram. os que conseguiram melho-
'A teoria geocêntrica do mundo finito A Companhia de Jesus continuava atu-
forma moral e espiritual na Igreja Católi- _resresultados. Em lô19, o Ducado de Wei-
contrapôs-se a-teoria heliocêntrica de espa- ante e entraria no século seguinte com mais
ca, julgavam que a finalidade da educação mar' regulamentou a obrigatoriedade esco-
ço infinito, alterando a concepção humana de seiscentos colégios espalhados pelo mlm-
era impedir o desenvolvimento da natureza lar para todas as crianças de 6 a 12 anos.
do Universo.' Habituados que estamos com do. Apesar de organizados e competentes,
corruptível. Por isso, o número de alunos Em 1642, o duque de Gotha est:.be1eceu
. a visão da.mundo dada pela astronomia co- os jesuítas representavam o ensino tradi-
em cada classe deveria ser pequeno, para leis para a educação prj.mária obrigatória,
pernicana2, talvez não possamos avaliar com cional mais conservador, Como vimos no
que a vigilância fosse constante e segura. definindo os graus, as horas de trabalho, os
toda a grandeza o.impacto dessas transfor- capítulo anterior, eles tomavam por base a
\ mações sobre os indivíduos, que por séculos Escolás.ticamedieval e a ciência aristotélica,
- Apreciavam a filosofia de Descartes e exames regulares e a inspeção. A seguir, em
outras localidades houve manifestações se-
escreveram manuais de lógica (conhecida
se acostumaram ao sistema ptolomaico. desprezando o ensino de ciências e filosofia
por lógica de Port-Royal). A racionalida- melhantes,' inclusive quanto à for~çãQ de'
. As transformações na ciência geraram modernas, além de enfatizarem o ensiná do
de, valorizada como exigência de rigor e mestres.
descompassos em outros setores, e a ordem latim e da retórica. .
de clareza de ideias, seria capaz de auxiliar Na França, destacoti~se o trabalho do
econômica também se ressentiu. Embora < . Outras congregações religiosas desen-
no combate às paixões. É bem verdade que, bbade _Charles Démia (1636-1689), quç
. prevalece~em o mercantilismo e o absolu- volveram um trabalho mais adequado ao
para eles, também a razão nada' era sem a publicou wn livro deferldendo a-'educação
tismo, delineavam~e os anseios liberais na espírito moderno, como os oratoriànos,
fé, sem a graça divi.na.Dentre seus segtrido- popular. Sob sua influência e direção foram
política, na economia e na ética. Também da Congregàção do Oratório, fundada em
reªJ destacou-se o filósofo Blaise Pascal". fundadas diversas escolas gratuitas para
em muitos segmentos sociais acentuou-se o 1614. Opositores constantes do sistema je-
Inspirados pdo método cartesiano,. os crianças pobres e um. seminário para a for-
estreitamento dos laços familiares, configu- S1.Útico,seriam seus substitutos quando a
jansenistas só passavam para o desconheci- mação de mestres.
rando:"se o processo de formação da família Companhia de Jesus foi dissolvida, no sé-
do por meio do já conhecído e nada ensina- . Na opinião do pedagogo francês Com-
.nuclear, típica- da socit::dade-burguesa. culo xvm. Acolheram as novas ciências e
vam que não pudesse ser compreendido pela payré (1843~1913), es'sas escolas visavam
mente em formação da criança. Usavam . à' instrução religiosa, dis:iplinar e de
o
"i com frequência ilustrações e mapas. Aplica- trabalhos manuais, de tal modo que "vi-
2 A teoria geocêntrica surgiu na Anúguidade (século IV a.C.), com Eud~xo e Aristóteles. No século TI da era vam o método fonético na aprendizagem da nham a ~er agências de informação ou
c;ristã, Eu.ire:cmada,pclo matc~tico. e &cômetra Cláudio Ptolomeu, c sua obra, Almagesto; influenciou o pensa- leitura, ensinando as crianças a conhecer as lugares de mercado. em que as pessoas
mento Clen.tífico, at~ que, t'l~ ~éculo XVI, o monge Nicolau Copérnico defendeu a hipótese do helioccntrismo. abonadas pudessem ir buscar servi.dores
letras somente Eela sua pronúncia real e não
M~o ~rm, a an~ga ~~cação ptolomaica cOlltinuava aceita, tanto que no século},."VII, quando retomou o domésticos ou empregados comerciais
helioccntnsmo, Galileu rOlJUlgado pela Inquisição c, após ter abjurado, permaneceu em prisão domiciliar.
com os nomes pelos quais são designadas.

Século XVII:a pedagogia realista 153


~ 151 Histária da Eduéação e da Pedagogia -Gerafe Brasil

""-"""--.--'.~
~-

-

1
,
ou industriais''3. De fato, aiInplantação
~~colas ocorreu justamente na cid'lde
francesa de Lyon, importante centro fabril
e mercantil - necessitada, pois, de mão.
p~.~'
1. Filosofia moderna: racionalismo e em-
pirismo
verdade, sem que precis~mos confiar na tra-
dição livresca e na autoridade dos dogmas.
O espírito humano tem em si os meios de
alcançar a verdade, se sóuber cultivar sua in-
uma fábula rasa (tábua sem inscrições), por
isso o conhecimento só começa após a ex":
periência sensivel.

-de-obra com certa instrução - e palco de dependência e conduzir-se'com método"~. 2. O realismo na 'Pedagogia.
frequentes revoltas operárias, o que exigia Vunos no Contexto histórico que o século
-----
A certeza é possívelporque o espírito hu-
maior ação disciplinar, segundo muitos. xvn caracterizou-sepelo cuidadocom o mé- mano já possuiideias gerais clára;se distintas, Qual a influência.das ideias racionalistas
Ainda na França, outra tentativa impor- todo na filosofia,na Ciênciae na educação. que não derivam do particular, mas são ina- e empiristas na pedagogia? Q!a, ainda hoj~,
tante de instrução elementar gr'!-tuitapara Ao retomarmos a discussãofilosófica:da- tos (porque inerentes à capacidade de pen- mesmo quândo o professor não teoriza a
os pobres foi levada a efeito por São João queles que se <?cuparam com o problema sar) e, portanto, não estão sujeitas ao erro: respeito do processo do .conhecimento, tra-
Batista de La Salle, que em 1684 fundou do conhecimento, encontramos duas ten- A primeira ideia inata é o cogito, pelo qqal balha com. pressupostos filosóficos>em que
o Instituto dos Irmãos das Escolas Cristãs. dências opostas: a do racionalismo, cujo prin- nos descobrimos como seres pensantes; de- pode predominar uma ou outra tendência.
Sua obra espalh0!l-se nos séculos seguin- cipal representante foi o filósofoDescartes, pois, são inatas também as ideias de infini- No século XVII, essas ideias, associadas
tes pelo mundo, ampliando a área de ação e a dos empiristas, de filósofoscomo Bacon e tude e da perfeição (por isso podemos ter a ao renascimento científico, influenciaram
pedagógica para o ensino secundário e su- Locke, entre outros. Essas orientações irão ideia de Deus), e as ideias de extensão e de . os pedagogos, cada vez mais interessados
perior e também para a formação de pro- marcar as maneiras de pen~ar na pedago- movimento, constitutivas do mundo fisico. pelo método e pelo realismo em educação.
fessol"es.La Salle privilegiava o francês em gia, inclusive até os dias de hoje. . Enquanto o racionalismo de Descar- A ênfase maior estava na busca de métodos
detrimento do lati.me preferia lições práti- Descartes (159.671650), .considerado o tes prioriza. a razão, na consciência, como diferentes, a fim de tornar a educação mais
.• ~ cas para os alunos, agrupados em classes e Pai da Filosofia Moderna, iniciou um tipo ponto ,de partida de todo conhecÍI]1ento, agradável e ao mesmo tempo eficaz na vida
por níveis de dificuldade. de refie."ãocontraposto à tradição escolásti- Baconi.e Locke-desenvolvem a. concepção prática.
ca. Ao analisar o processo pelo qual a razão empirista. . . Ser realista (do latim res, "cais",")significa
3. Academias atinge a verdade, usou o.recurso da dúuidu. O filósofo inglês Francis Bacon valori- privilegiar a experiência, as coisas do mun-
• metódica. Começou duvidando de tudo: do za a indução e insiste na necessidade da do e dar atenção aos 'problemas da época.
tAs academias do séculoXVI, como vimos, senso .comum, dos argumentos de auto- experiência, criticando o caráter estéril Por.isso, cada vez m~ os autores usavam o
não eram escolasinstitucionalizadas,mas vi- ridade, do testemunho dos sentidos, das da lógica aristotélica, predominantemente vernáculo: nas escolas, apesar de persistir o
savam a atender aos interesses da nobreza informações da consciência, das verdades dedutivista5• . ideal enciclopédico do peno do anterior, a
na formação cavalheirescade seusfilhos.No . deduzidas pelo raciocínio, da realidade do Na mesma linha, Locke - a quemjá nos língua materna se sobrepunha ao latim e a
século JWll, a procuradelasfoi intensifica. mundo exterior e do próprio corpo. Só in- referimos ao tratar do liberalismo - afiro educação física era também valorizada. ..
da justamente porquetepresentava:mã tran~ terrÓmpe a cadeia de dúvidas diante do seu ma que nada está no espírito que não te- A pedagogia realista contrariava a edu-
sição dos padrões conservadores no erisino próprio ser que duvida. Se duvido, penso: nha passado primeiro pelos sentidos. Aliás, cação antiga, excêssivamente formal e re-
- que não mais atendiam aos seusinteresses "Penso, logo ~xisto" (Cogito, erga .rum). a palavra empirismo vem do grego empeiria, tórica. Ao contrário, preferia: o rigordas
- para uma formação mais realista. A partir da capacidade. ordenadora que significa "experiência". Portanto, ao ciências da natureza, buscando .superar .a
- Devido ao progresso da ciência e ante .do conhecimento pelo sujeito que co- contrário do racionalismo, o empirismo tendênCia literária e estética própria do hu-
a decadência das universidades (exceto as nhece, Descartes introduz uma grande • enfatiza o papC:!da ~eriência sensível no manismo renascentista.
da Alemanha), surgiram as academias cien- modificação no pensamento moderno: processo do conhecimento. O que não sig- Por considerar que a educação devia es-
tíficas, às quais os cientistas se associavam "O pensamento, metodicamente conduzi- nifica depreciar o trabalho da razão; mas tar voltada para a compreensão das coisas
para a troca de experiências e publicações. do, encontra primeiramente em si os crité•. "privilegiar ~ experiência, subordinando a e não das palavras, a pedagogia mod~rna
Tornaram-se importantes a Academia ele rios que permitirão estabelecer algo como ela o trabalho posterior çla razão .. exigia outro tipo de didática. No trabalho
Ciências (da qual>participaram Descartes, verdadeiro". Ou seja, trata-se da "crença na Locke critica a teoria das ideias inatas de de instauração dessa escola se empenharam
Pascal e Newton), a Real Sociedade rle autonomia do pensamento, a ideia de que a Descartes, afirinando que a alma é como. educadores leigos e religiosos.
Londres e a Academia de Berlim. razão, bem 9irigida, basta para encontrar a

• Franklin Leopoldo e Silva, Descartes: a metafirica da modernidade. São Paulo, Moderna, 1993, Coleção Lagos,
, Apulà Aníbal Ponce, EdW:llfão e luta IÚ classes. 7. ed. São Paulo, Cortez/Autores Associados, 1986, p.• 124 e p. 8 e 19. .. •
125. 5 Sobre indUção e .rJeáufãtJ, consultar .nota 7 do capítulo anterior.

154 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil -Se-O


c-ul-o-X-Vl....,.I:-a-p-ed-a-g-og-ja-re-al~is-ta---- --------'---------155

..
~:~_",-".- .. r.' '"":"";
••.• ,.";".~rff','.,_.7'. ,"'-;~ _. -.".'" - "'!":"'."'i~~~''''''_.''''_
.._' __ ~';.:~,:,,"-~:''_.
3. Locke: a formação do gentil-homem Locke mostra-se severo quando se tra- diferentes, configurando-se assim o caráter em que cada passo se relaciona com figu-
ta de criança elT. idade mais tenra, com .elitista da sua pedagogia. ras.
Embora- vivendo no século XVII, o in- o propósito de submetê-la à vontade dos Para Comênio, o ensinodeviaser feitopela
glês John Locke .exerceu influência muito adultos é de tornar-lhe o "espírito dócil e
obedieIlte". Essa austeridade contrasta com
';<J
,!,
.
4. Comênio: "ensinar tudo a todos" ação e estar voltado para a ação: "Só fazen-.
do, aprendemos a fazer". Além disso, é im~
grande nos séculos seguintes por causa das
concepções sobre o liberalismo e a teoria a recomendação de uma educação ale-' i" A escola da Idade Moderna; em conso- portante não ensinar o que tem valor apenas
empirista do conhecimento. Merece desta- gre, em que o educador nada deve impor; 1..
.;o nância com seu tempo, propunha-se uma para a escola, e sim o que seIVe.paraa.vida.
que também a sua teori~ pedagógica, ex- Ao mesmo tempo que adverte serem os cas- tarefa: se há método para conhecer correta- A utilidade de que trata Comênio faz da pes-
pressa em Pensamentos sobre educação. Na prá- tigos inefic~es, tece considerações a respei- .mente, deverá haver para ensinar de forma soa lIDlser morai, por isSoas escola5'.são"ofi-
tica, Locke exerceu a função de preceptQr to de como punir as crianças. Sobre o tema, mais rápida e mais segura. cinas <4 humanidade";'verdadélrã Iniciação
do filho do conde de Shaftesbury. afirma o pedagogo francês contemporâneo _,i Esse foi o empenho de toda a vida de à vida. Não por acaso,a religiosidádedesem-
Ao criticar o racionalismo de Descartes Georges Snyders: "Não se trata, natural- +.i João Amós Comênio (1592-1670), nascido .penhavapapel marcante na visão'& mlIDdo
Locke desenvolve uma concepção da ment~ mente, de tachar Locke de contradição e, • na Morávia7• O maior educador e pedago- desseeducador e pastor~rotestante.'-
infantil e da educação; enfatizando o papel do menos ainda, de incoerência. Tentamos go do ~éculo XVII, conhecido com justiça £m consonância com o espírito do seu
mestre ao propàrcionar experiênciasfecundas mostrar: Locke encarna um momento de " como o Pai da Didática Moderna, produ- tempo, Comênio queria _"ensinar tudo a
para auxiliar no uso correto da razão. transição que conserva, em grande parte, ziu uma obra fecunda e sistemática; cujo todos". Atingir o ideal da pansofia (de grego
Na lÚJha dos principais criticos da velha os valores antigos, ao mesmo tempo que ,i:'
.principal livro é Didática magna. Sugestiva- pan., "tudo", e sophia, "sabedoria": sabedo-
tradição medieval, Locke lamenta a ênfase descobre novos pontos de vista; e o que há .t: mente, mil dos'capítulos chama-se "Como. ria universal), no entanto, não significa"a.
no latim e G descaso com a língua vernácula 'dé caracteristico é que .unssejustapõem aos para ele erudição vazia (ver leitura comple-
se deve ensinar e aptender com segurança,
e 9 cálculo. Sua pedagogia rea.li$tarecusa a outros, sem que já se.sintam as oposições ..'. mentar). Pensava ser possívelum inventário
. para que seja impossível não obter bons re-
r~tórica e os excessosda 16.gi.ca,ressaltando que, no correr da história da pedagogia, metódico dos conhecimentos universais, de
sultados", enquanto outro trata das""Bases
o estudo ~e história, geografia, geometria não tardarão em estalar"6.
para rapidez dõ ensino, com economia de modo que o allIDoalcançasseum saber geral
e ciências naturais. Valoriza a educação fí- Para Locke, os fins da educação concen- ,1\ tempo e de fadiga" .. e integrado, airida que simplificado,desde o
sica e, como médico e de saúde frágil,- dá tram-se no caráter; muito mais importante
Comênio pre~endia tornar a aprendiza- ensino elementar. Nos outros graus; o apro~
inúmeros conselhos para o fortalecimento que a formaçãp apenas intelectual, embora
.gem eficazoe atraente mediante cuidadosa fundamento possibilitaria a análise critica e
do corpo, o aumento da resistência e do au- esta não devesse absolutamente ser descui-
organização de tarefas. Ele próprio se em- a invenção, pois a educação permitiria ao
todomínio. Para ele, o jogo constitui exce- dada. Propõe o trlplice dese~volvirnento
físico, ~oral e intelectual, característico do penhava na elaboração de manuais - uma .aluno pe~sar por si mesmo, não como "sim-
lente au.'Ciliarda educação, como exercício
novidade para a época - e minuciosamen- ples espectador, mas ator". Só assim haveria
físico, desafio e p.ossibilidadede superação gm.!feman (o gentil-homem). Por isso al:onse-
• lha escolher com cuidado os preceptores, te detalhava o procedimento do mestre, . progresso intelectual, moral e espiritual.ca-
dos próprios limites. .
que dentro de casa cuidarão da educação segundo gradações das dificl.)1dadese co.m paz de aproXimaro indi..nd.uode Deus.
Bom representante dos interesses bur-
ritmo adequado à capacidade de assimila- Para Comênio, o complemento de sua
gueses, valoriza o estudo de contabilidade da criança, evitando-se a escola, onde ela ."
pqdena não ser bem acompanhada ou Vi- ." ção dos alunos. • pan!>ofiaé a ~'Piração democrát-icado ensi-
e escrituração comercial, numa prepara-
giada nos menores passos. O pontoode partida da aprendizagem é no, ao qual todos teriarrtacesso, homens ou
ção mais ampla para a vida prática. Re-
Percebe-se aí, nitidamente, o dualismo sempre o conhecido, indo do simples para mulheres, ricos ou pobres, inteligentes ou
comenda a aprendizagem de algum oficio,
que-persistirá nos séci..tlossubsequentes, ao o com~lexo, do .concreto para o abstrato. ineptos. Corri estas poucas referências, per-
como jardinagem ou carpintaria, sem que
se destinar à classe dominante uma forma- " O verdadeiro estudo iniCia nas próprias cebemos o caráterinovador.do pensamento
isso significasse valorizar o trabalho ma-
nual como ta~ mas como necessid'\de de ção diferente da que é ministrada ao povo coisas, no "livro da natureza", o que repre- de Comênio, de sabor muito atual.
desenvolver umã atividade qualquer, se- em geral e superior a ela. Ao concrár:iode senta Vivaoposição ao ensino retórico' dos
gundo a perspectiva da escola:ativa. Como Comênio (como veremos), Locke não de- '~ escolásticos. A-experiência- senSível, como - -5. Fénelon: a educação feminina
veremos; apenas no século XIX, por influ- fende a universalizaçãà da educação. Para ", fonte de todo conhecimento, exige a eduql.:
ência socialista, o trabalho assumirá uma ele, a formação d~' que irão governar e a . ção dos sentidos. No livro O mundo ilustrado Aberta a discussão sobre liberdade indi-
função de maior destaque na educação. daqueles que serão governados deviam ser (Orbis pictus), Comênio elaborou um texto vidual e o papel da educação para alcan-

. ,

6 'i<\ peda,,"'Ogiaem França nos sé~u1osXVII e XVIII",- in M. Debesse e G. Mialaret (orgs.r, TraJodo das ci1ncias
pedagdgiCrLf. São Paulo, Naàonal, 1974, v. 2: HlSlÓ1ia da pedagugia, p. 331. -
..--- .
1 A Morávia é uma .região que pertencia ao antigo ;eino da Boêmia, -atual República Tcheca.

156 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Jéculo XVII:a pedagogia realista 157
çá-la, tornou-se quase inevitável tratar da Esse internato pretendia ser a alternativa
formação feminina. Não exageremos, no secularizada -aos conventos femininos, ex- Dropes tiv~se olhos por todos os lados seria
entanto. A perspectiva dessa educação não cessivamente rigorosos na disciplina moral monstruoso, da mesma .forma osena,
via a mulher como pesso~ autônoma, mas e negligentes na formação intel~çtual. Após" ,,I ;ó'Aptéhdá.-seà fazer fazendo. o Estado se todos os' seus cidadãos fos-'
.'~;,
como apêndice em um mundo essencial- seis anos, mesmo perdendo as característi. ,;: ,Os mecânicos não d~têm os apren- sem eruditos'; ,menos obediência seria
mente masculino. cas liberais, ainda continuava' sendo umaS dizésdas silasartes com esPeculações encontrada, e orgulho e' presunção se-
:ii 'riam mais comuns" O intercâmbio de
No Renascimento, Erasmo já tinha teóncas,mas, põem~nosjInediatamente
aconselhado maior cuidado com a educa- :~ç:ai:t~P~~::~~:s~:c:::'~:~ ~~~i.l
ij
a tráb;{lli~para q~ aprendam a fabri- letras huri:i.anasbaniria completamente
ção. fem¥llna, que mereceu de Vives uma , car' fabricando, a esculpir esCulpindo, o do cOIIlérciõ;arruinaria a agTicultura, ,
Conclusão, "i! a verdadeira mãe adotiva ,deis'povos, e
obra especial. No século XVIi, Comêmo a pilÍtar pintaJido, a dançar daIlçaIldo
t::rrnbémtrata do ássunto, mas foi o hispo :t etc, Portanto, t3:rnbémnas ,escolas,deve destruiria -em'potico tempo a criação
de soldados que surgem mais frequen-
Fénelon (1651-1715) que o retomou em No século XVII a Europ'a ainda se deba- aprender~se a escrever' escrevendo, a
A educação dasjo7JCTlS. ' tia na contradição de um~visão aristocráti- .l.
fal:ar'falando,'a cantar cantando, ara. temente em meio à ignôiâp.cia e rudeza
Fénelon viveu na França e foi preceptor ca da nobreza feudal diante de um mundo cIocinar raciocinando etc., para que as que numa atrnosferadecultura polida;
de um dos netos do absolutista Luís XIv, que se construía segundo valoresburgueses. %'!' escolas:uão, sejam senão oficinas onde fin~ente enclIeria a França de charla-
conhecido como Rei Sol. Vivendo na corte, Essa contradição se refletiu, portanto, na .1 se trabalha fervidament~;Assi,m; final- tães mais capazes de arruinaras fanú-
observava com atenção a superficialidade e educação. 'Por um lado, existia a aspiração mefltê, pelos bons resultados da práti- lias pçuiÍculares e perturbar a paz pú-
frivolidade das mulheres, ger3.lmente-mcito a uma pedagogia realista e, em alguns casos, ji ca, todOs experimentirãoa .verdade..do' blica do que aptos a asseguraI-quàlquer
dadas a mexericos e ações tolas. Amaioria até tlllÍ.versalj'estendida a todos.Por.outro, 'j', pro;vérbio:~endb aprendemos a fazer . vantagem para o país. " Se as letras fos-
!.

era semianalfabeta, e algumas, precaria- para além das.discussõesdosfilósofos e te- ,j • ffa/Jrii:anáa fabric~17~ sem profanadas para todos os tipos de ,
mente instruídas, tinham a intolerável'afeta- óricos da educação, de maneira geral as es- Mostre-se o uso dos instrumentos, espírito ver-se-iam,mais'pessoas prontas
ção que resulta da ccl.turamal digerida. Para colas,continuavam ministrando um ensino .r :çnais,colIl,a prá;ti.ça,qp,e'com pala~S, a,levantar dúvidas do que.a resolvê-las,
Fénelon, esses defeitos advinham da falsa conservador, predominantemente nas mãos ?' isto, é, mais com exemplos que com ,emuitas estariam mais prontas a opor-
educação, daí seu empenhei em estabelecer dos jesuítas e de outras ordens religiosas. ~ se à verdade do que a defendê-la. É
régras.(Co~ênio)
novas diretrizes da educação feminina. Por isso, ainda era cedo para sefalar em ~ ::: por esta razão que a política exige em.'
Recomendava uma educação alegre,' educação universal, como pensava Comê-o 2 - Embora o cOIihecimento das letras um Estado bem regulamentado mais
com base mais no 'prazer que no esforço, ruo. O que prevaleceu no século XVII foi seja eminentemente necessário para um ,mestres de arte's mecânicas que de ar-
para que as moças adquirissem instrução a formação do gentleman, do Iwnnê~ Iwmme, país, é 'certo que não devem ser ensina- tes lib~rais para ensinar letras. (Cardeal
geral: gramática, poesia, história e leitura do cortesão, do modelo de uma nobreza " das a todos. Assim como um corpo qlJ.e Richelieu)
selecionada de obras clássicase religiosas. aburguesada (e também de um burguês,
A formação mtelectual da mulhe~ no 'que desejava ser fidalgo). Na realidade, es-
entanto, não e;a absolutamente prioritária, boçava-se na eduçação o duafumo escolar,
• Leitura complementar criatu;a raeional, senhora das outras criatu-
por isso alguns cuidados precisariam ser to- que IDa se manifestar claramente no século
ras, imagem verdadeira do seu Criador: To-
mados. Só as moças de tendências excep- seguinte, ao se destinar um tipo de escola
Didótico magna dos, por isso, devem ser encaminhados de
cionais seriam encoraJadis a continuar os para a elite e outro para ó povo.
modo que, embebidos seriamente do saber,
estudos, enquanto às demais reservava-se Apesar disso, é preciso reconhecer, esta-
Que devem ser enviados às escolas não da virtude.e da religião, passem utilmente
a educação religiosa e moral, que enrique-" "Vanascendo a escola tradiCional, que vai con- ,.
apenas os filhos dos ricos ou dos cidadãos a vida presente e se preparem dignamente
cia a vida doméstica de mães e esposa.&.De solidar-se no século XIX, sobretudo-com.<
~ .pnncipais, -mas todos por igua}, nobres e para a futura. Que, perante Deus, não há
fato, o papel da mulher no lar só poderia Herbart. Essa base aparece, por exemplo, '
plebeus, ricos e pobres, rapazes e raparig~, pessoas privilegiadas, Ele próprio o afirma
ser bem desempenhado se ela fosse pr~pa- nas atenções de Comênio com-o método, a
em todas as cidades, aldeias e casais isola- , constantemente. Portanto, se nós admiti-
rada para exercê.lo. orgariização, do conhecimento, o emprego
dos, demonstram-no as razões seguintes: mos à cultura do espírito apenas alguns,
Na mesma época, em 1686 Madame de racional do tempo de estudo, a noção de
Em primeiro lugar, todos aqueles que excluindo os outros, fazemos injúria, não
Maintenon, mulher de Luís XIV; fundou o programa, o cuidado com ó -mâter:i.aldida-
nasceram homens, nasceram para o mesmo só aos que participam conosco da mesma
Colégio dé Saint-Cyr, para menin?-sentre 7 , rico, a valorização do mestre como guia do
fim priiicipal, para serem homens, ou seja, natureza, mas também ao próprio Deus,
e 12 anos, que aí permaneceriam até os 20, processo de aprendizagem.

)58 Século XVII:a pedagogia realista 159"


História da Educação e da~dagogia - Geral e Bra .
que quer ser conhecido, amado e louvado pectadores, mas-também de atores. Deve,
por todos aqueles em quem imprimiu a su:J.. portanto, prcvidenciar-se e fazer-se um es-
laucos .. Oú seja, na Idade Moderna
imagem. E isso será feito com tanto' mais forço par;.t.que a ninguém, enquanto está
teve Mcio um pr.ocesso que, seguI).-
fervor, quanto mais acesa esti;er a luz do neste ml.mdo, surja qualquer coisa que lhe "". ",!.-'
~stões .gerais do Michc;l.Fou,cault, vai caracterizar
conhecimento: ou seja, amamos tanto mais, seja de tal modo desconhecida que sobre 'Z;
a, sociedade "disciplinar" no .século'; .
quanto' mais conhecemos. ela não possa dar modestamente o seujuízo •.
Em segundo lugar, porque não nos é evi. e dela se não possa servir prudentemente 'I' 1. Relaciane surgimento da burgue- seguinte: "Nas grandes oficinas q~e
sia, ecanomia capitalista, renascimento começam a se formar, 'nó exêr~ito, na
dente para que coisa nos destinou a divina para um dC!terminado uso, sem cair em er.. 01"

científicoe mudanças na educação. escala, qu~d6 se ol:1servana Europa


providência. É certo, porém, que, por vezes, ros nacivos,
um grande pr:!>gressoda. alfabetiza-
de pessoas paupérrimas, de condição bai. (00.) Por isso, seja para os professores re. ;1:
:~~ 2. Comente: o interesse peias q~es- ção, aparecem essas novas técnicas de
xíssima e obscurantissima, Deus constituí gra de' ouro: que cada coisa seja apresen- ~{ 11,.'
tões do método, no século ~I, rela- poder que são uma dãs grandes inven-
órgãos excelentes da sua glória. Imitemos, tada àquele dos sentidos a que convém, ou 'i;
ciana-se com a busca do realismo na ções de século XVIII". (Microfísica do
por isso, o sol celeste, que ilumina, aquece sejay as coisas visíveis à vista, as audíveis ao ::~; .~
pedagogia. poder,'p. 105) .
e vivifica toda a terra, para que tudo o que ouvido, as odorosas ao olfato, as saborosa~. "
a) A que função da escola.serefere a
pode viver, verdejar, florir e frutificar, viva, ao gosto, as tangíveis ao tato; e se algumas',",
3. Coma a educaçãO'física era vista na texto deJacques Gélis?' .
verdeje, floresça e frutifique. poc;lem,ao mesmo tempo, ser percepcion\l--,,:
educaçãO'medieval e cómo passou a ser b) Com base na segundo texto, rela-
(.. ,) das por vários sentidos, sejam colocadas, ao .i:
considerada na Idade Maderna? ciane o conteúdo dos dois trechos.
Importa agor-a demonstrar que, nas es. mesmo tempo, diante de vários sentidos: !,
"
c) AfuCIã:hoje podemos sentir os
colas; se deve ensinar tudo a todos. Isto não (00.) Desejamos que o método de ensinar,?
4. Quais as semelhanças que existiam efeitos desse micropoder de, que fala
quer dizer, todavia, que exijamos de todos atinja tal perfeição que, entre a forma de')';
entre as escolas dosjesuítas e as demais, FO,ucault?
o conhecimento de todas as ciências e de instruir habitualmente usada até hoje e;' r
nossa nova forma, apareça claramente que mesmo aquelas que os hastilizavam. E-
todas as artes (sobretudo se se trata de um
vai a: diferença--que vemos entre a arte de quais são as principais diferenças? 6. Compare as semelhanças e diferen-
conhecimento e~to e profundo). Com efei.
ças que existem entre a pedagogia do
to, isso, nem, de sua natureza, é útil,' nem, multiplicar os livros, copiando-as à pena,
pela 1;Jrevidadeda nossa vida, é possível a como era uso antigamente, e a arte da im-, 5. Leiq.as' dois trecho~ a seguir e res- Renascimento e a da séculO'XVII.
prensa, que depais foi descoberta e agora ponda às questões propostas.
qualquer dos homens. Vemos, com efeito,
é usada. Efetivamente, assim como a arte '~ navas estruturas educativas, em . 7. Trace as principais caractensticas da
que cada ciência se alarga tão amplamente
particular as dos colégios, Ioga recebem pedàgOgiade Comênio e identifiql;leos
.e tão suti.lni.ente(pense.se, por exemplo, nas tipagráfica, embora mais clificil,mais cus-
a adesãO'dos 'país, convencides de que. 'aspectosque ainda a tornam bastante
ciências fisicas.e naturais, na matemática:, tosa e mais trabalhosa, tadavia é mais aco-
,. modada para escrever livros com maior ra- seu filho está sempre à mercê de instin- atual.
na geometria, na astronomia etc. e ainda na
pidez; precisãO'e elegância, assim também tos primários que devem ser reprimidas
~gricultura ou na silvicultura etc.) que pode
este novo método, embora a princípio meta e de que é preciso stg'eitar seus desqos ao .8.'.Relacione a filosofiapolítica de LO-
preencher toda a vida mesmo de inteligên-
comando da razão." Gacques Gélís) cke cOm.a,sua pedagagia liberal. Discu-
cias grandemente dotadas que acaso quei- medo com as suas dificuldcrdes,todavia, se ~,
ta por que a pe<iagogiade Locke pode
ram dedicar-se.à teoria e à prática, como for aceite nas escolas, sel'VÍrápara instruir
0bserve a interessante coinCidên- ser considerada elitísta.
aconteceu com Pitágoras na matemática, •. um número muito maior de alunos, com
cia (coincidência m~smo?) no século
com Arquimedes na mecânica, com Agrí- . um aproveitamento muito mais certo e com 9. Qual é a importância e a' novidade
maior prazer, que com a vulgar ausência de em que.é intensificada a vigilância da
cola na mineralogia, com Longólio na retó-
criança na escola. Na França, a par- da pedagogia de Fénelon?
rica (o qual se ocupou de uma só coisa, para métada [ametodeiaJ. •
tir de 1656, 'cada ciàade importante
que viesse a ser um.perfeito ciceroniano).
João Am6s Comênio, Didática magna: tratado da pássou a ter um Hospital Geral, ins- 1 O. Considerando a questão anterior,
Pretendemos apenas que se ensine a todos
arte universal Ji,' ensinar tudo a todos. Lisboa, Ca- tituiçãO' que englobava diversas esta- discuta com seu ~po a respeito da ~i-
a conhecer os fundamentos, as razões e os louste Gulbenkian, 1966, p, 139 e 140; 14:5 e 146; belecimen!os sob uma administração tuação da mulher na sociedade:
objetivos de todas a;; coisas principais, das 307; 455.
única e destinada a internar todes os a) Em q~e Fénelon inova no seu tem-
que existe~ na natureza como das que se
~endigos, desocupados, libertinos .e po' a respeito da educac?0 feminina?
fabricam, pois somos colocados no mundo,
• não somente para que nos façamos de es-

'160 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Século XVII: a pedagogia .realista. 16.1
= ataques de inimigos da Espanha, como Educação
QJustáes sobre 4 leitIlra . franceses, ingleses, e holatldeses. A mais
b) Sob que aspectoll, atualmentl<,
complementar importante e duradoura dessas invasões foi 1. O fortalecimento das missões
a justificativa sobre a necessidad: da ..•........ ,,'o .•••. , "'4 a dos holandeses, em Pernambuco (1630-
educação da mulher Já se baseia em
1. Selecione no texto e comente as pas- -1654). '., Desde;Q séçuloXVI e durante' o X:VU,o
razões diferentes daquelas defendidas
por Fénelon? . sagt::nSque indic<;lIIlas novidades'dá pe-" . No interior do Brasil, prosseguia a ex- modelo de catequese dos índios alterava-se,
dagagia de Comênio. . pansão territorial levada a efeito pelos com o confinamento dos indIgenas nas'redu-
c)Posicionc;:-sepessoaimente.sob~e o .- .. ."
,:.-, ", ..... ,: •...•.
'.",'
bandeirantes, para além do Trata;do de ções ou mis~ões, povoamentos com organiza-
assunto, .huscando contra~argumentar
2. Por.que a paÍJ.s~fianão 'seconfunde Totdesilhas. Estes aventureiros saíam em ção bem complexa, que incluía c(mversão
com Fénelon.
com (J~ples enciclop,edismo? buSca de metais preciosos e apresamento religiosa, educaç~o e trabaiho. As que ~ais
11. Com base nodropes 2, e.<plique de índios para mão-de-obra escrava. Às ve-
se destacaram foram as missões da Amazô-
por que essetextoérepresentativo do pe- 3. Em que o pens~ento de Comênio ies capturavam tribos inteiras, sobretudo ni~ e, ao sul, as da região do rio da Prata.
ríodo estudado no capítulo;Em seguida,. ,contrasta com ode Richelieu? nas missões, onde osjesuítas promoviam a ,Na Amazônia, as missões dos carme-
desenvolvauma argumentação t~ntando aculturação e os protegiam da cobiça dos litas e dos franciscanos 'instalaram-se na
"coilVencer" Richelieu de que muitos 4. Quais os elementos ainda (ltuais do "; colonos. margem esquerda do rio Amazonas, e na
dos se~ temores são infundados. pensamelltod.eCornênio? 0': O maior controle de Portugal sobre o margem direita, para o sul, acomodaram-
Brasil provocou os primeiros conflitos na. -se os jesuítas. Dentre estes,.destacou-se a
tivistas ~ como a Revolta de Re~an no ... átuação do Padre:AntônÍo Vieira, que:fjcou
Maranhão em 1684 -c- devido ao: acirra- na história devicl,oà sua eloquência e aos
P A R i E 11 mento:'da contÍ:adição: entre' os inter.esses Sermões, considerados verdadeiras, p~ças li-
da metr..,6polee os da colônia, uma vez que terárias. Mas a luta de Vieira contra os co-
as restrições ao comércio prejudicavam os lonos que escravizavam indígenas foi cheia
.i Ó Brasil do século XVII colonos brasileiros. Foram.muitos os em- de percalços, desde a primeira vez em que
bates contra osjesuítas, por conta da pro- esse missionário, conselheiro.dorei portu-
Contexto histórico lo econômico da colônia era o agrêrrio-exporta~ teção que davam aos indígenas, até que os guês D.João Iv, chegou ao Brasil;em 1653.
dor depmdente, baseado na produção da cana- colonos enriquecidos começaram a trocar Sua tarefa era evangelizar, erguer igrejas e
No século XVII, continuavam nos países -de-açúcar com o emprego de mão-de-obra os índios pelos escravos africanos. realizar missões entre os úidios do Mara~
europeus a.política absolutista e o mercan- escrava,em que a matéria-prima era enviada Quanto ~ contradições internas, houve nhão. Vencido pelos colonos, por duas ve-
.tilismo. De 1580 a 1640 Portugal esteve sob a Portugal e revendida a outros países. diversos conflitos entre o senhor de enge- zesprecisou se retirar, retornando em 1680,
o domínio espanhol, período em que come- Ainda no período de dominação espa- nho de açúcar e o escravo negro. Um dos ao recuperar seu prestígio. A essa altura, as
çou a sua decadência política e econômica, nhola, a colônia sofreu, com frequência, mais importantes'núcleos de resistênCiafoi ,missões jesuíticas já eram hastante ativas,
tendo perdido muitas colônias na África e o Quilombo tios Palmares (1630-1694), com criação de gado e plan~ões de cana,
na Ásia, como represália dos países con- liderado na fase final por Zumbi e que algodão e cacau..
tra os quais a Espanha estava em guerra: Breye~,..nologfci cI. chegou a abrigar de 20 mil a 30 mil escra- No Sul, os povoamentos conhecidos _
. Por ser a colônia mais' importante, o Bra- perioclo vos fugidos, na região do atual estado de como os Sete Povos das Missões8 inicial-
sil sofreu com o enrijecimento da política Alagoas. Outros se formaram em :Minas mente formavam reduções esparsas nas re-
mercantilista, e a exclusividade do mono- '.Éntradas e balÍd~ . Gerais, onde se deu a descoberta de ouro e .giões do Paraná, Rio Grande do Sul, Pa-,
pólio do comércio passou a ser vigiada com '158Ó~ 1640 ""-.PortUgal sob, o pedras preciosas, no final do século XVII. raguai, Argentina.e Uruguai._Emalguns ,_ "-
maior ateQ.ção.Além disso,Portugal depen- dótní¥0 éSPanh°L ..' . .' .''.. Começava então a deslocar-se o eLxoeco- locais predominavàm os jeSuítas espanhóis
dia cada vez mais da Inglaterra, T:'0tência .'1630":16'54 :-;';:'Rólàndeses'em nômico cIoNordeste para o Sudesté. • e em outros os portugueses, urna;rez que,_
em ascensão. PernaiÍ1buco. .
Ao contrário da Europa, em que.o capi- " ~16S4'':';':::RêVóIci..deBeckmán.
8 Os "sete povos" (tradução do termo .espanhol ptublo, que significa "aldeia'') eram as seg;.ll.t!te.s
missõ:s: ~ão
talismo florescia pela expansão do comércio .'. 1694 -,morte deZtimbi (QUi-
Francisco BOlja,São Nicolau, São Luiz Gonzaga, São Miguel, São Lourenço, São João Batista e Santo Angelo.
e instalação dás manufaturas, o Brasil ainda lombo dos Pa.Jma;res). &, ruínas que restaram dessas missões ~o loc~ de turismo; a igreja matriz de São Miguel foi declarada pela
permanecia na fase.pré-capitalista. O mode- UI)escopamm8mo histórico cultural da humanidade. '

162 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil . Séculõ XVII:a pedagogia realista 163
pelo Tratado de Tordesilhas, essa região Quanto à destruisão das Sete Missões, panhia; quase toda a mocidade, de brancos de Pernambuco pelos holandeses, quando
pertenceriíl- aos espanhóis. Acossados pelos diz o ar.tropólogo Darcy Ribeiro que elas e mestiços,.tinha de passar pelo molde do . a cidade de Recife entrou em periodo de
bandeirantes que aprisiohavam os índios ou foram "assaltadas pela burocracia colonial, ensinojesuítico, .manipulado pelos padres, breve florescêricia. O príncipe Mauricio
os massacravam, recuaram para a margem pelos assuncenos e peI~s mamelucos paulis- em seus colégios e seminários, segundo os de Nassau cerc~u-se de intelectuais, arqui-
esquerda do rio Uruguai, instalando-se aí tas, propositadamente desorganizadas para . pri?clpios' da flimosa ordenação escol~,. e tetos e artistas, remodelou a cidade, cons-
nas Sete Missões. abolir caracteristicas comunÍZantes.Já em distribuída para as funções eclesiásticas,a truiu palácios, pontes, canais; lojas, ofi-
As redu.ções eram assim chamadas por- fins do século XVIII, os 'índios missionei- .~ magistratura e as letras"9, cinas e instaur!Ju um clima de tol~rância
que os indígenas eram "reduzidos" à Igre- ros haviam sido dispersado;, escravizados A única saída dC?sbrasileiros desejosos religiosa. Naquele momento e"local talvez
de seguir as carreiras profanas, as profissões
ja e à sociedade civil (ver dropes 5). Sua
história chegou a nós envolta em muitas
e conduzidos a regiões longínquas, dissol.
vidas no mundo dos gaúchos, ou, airida,
refugiado~ nas matas onde esforçav3.lJ1 por
.
','1

A
liberais, era o e~1:Udo na metrópole, mesmo
porque ri Colégio da Bahia teve negado o
tivesse se ~esenvolvido uma cultura dife-
rente da jesuítica .
lendas sobre a República Guarani, que, se-
gun.do alguns, se caracterizaria por um co- reconstituir a vida tribal, enquanto suas ter- pedido de equiparação à Universidade de 3. A cultura silenciado
munismo teocrático. De .qualquer forma, ras e seu gado passavam às mãos de novos Évora (portugal), em 1675. -
s~be-se que osjesuítas consegulram tornar donos", A maioria dos estudantes diriiia-se para No século XVII, os núcleos urbanos
essas missões autossuficientes, ensinando a Universidade de Coimbra, também con" ainda eram pobres e dependentes das ati-
os índios não só a ler e escrever, ma~ a 2. Os jesuítas e a educação da elite fiada aosjesuítas, a fim de estudar ciências vidades do campo, onde se concentrava a
se especializar em diversas artes. e oficios' teológicas ou jurídicas. Outros escolhiam maior parte'da população. Por se tratar de
mecâriicos, além, é claro, de submetê-los à No séculoXVII, o ensino no Brasil não Montpellier,na Fra;nça,para a especializa- uma sociedade agrária e escravista, não
conversão religiosa. A aldeia organizava-se apresentou grandes diferenças COIll relação ção em medicina. havia interesse pela educação elementar,
em torno de rigorosa administração, for- ao"do sécultl anterior. O ensino jesuítico Embora recebessem educação padroni- daí a grande massa de iletrados. As mu-
talecida durante os séculos XVII e XVIII manteve a l':scola conservadora, alheia à zada, os brasileiros .entravam em contato lheres encontravãm-se excluídas do ensi~
e sustentada por invejável infraestrut"lra. revolução intelectual representada pelo ra- com outros estilos de vida e traziam a:sas- no, do mesmo modo -que os negros, cujos
Além da igreja, havia hospital, asilo, esco- cionalismo cartes~ano e pelo renascimento pirações da, dvilização urbana mais avan-
filhos nunca deSpertaram o interesse dos
la, casa; os índios aprendiam as práticas científico. Centrada no nível secundário, a çada vislumbrada no Velho Mundo para
pàdres, comô acontecia com os curumins.
agrícolas e de criação de gado, bem como educaçã() visava à formação humanística, contrapor ao modo de vida rural e patriar-
Apenas os mulatos, um pouco mais tar-
a fabricar instrumentos musicais, artigos privilegiãndo o estudo do latim, dos clássi- cal da colônia. Esses elementos de diferen-
de, começaram a reivindicar espaços na
em couro, embarcações, sinos, relógios, cos e da religião. Não faziam parte do cur- cia~ã"Ofizeram germinar ideais políticos e
educação. Diante da importância dada
cerâmica, tecelagem etc. riculo escolar as ciências físicasou naturais, . sociais reveladores da insatisfação com o
aos graus acadêmicos para a classifica-
O al..6e do desenvolvimento dessas mis- bem como a técnica ou as artes. status quo. As univ.ersidades europeias, so-
ção social, aumentou a procura' da escola
sões.ocorreu no século XVIII, quando as A educação interessava apenas a poucos bretudoas portuguesas, ao reunir os estu-
por parte dos mestiçds, o que provocou,
discussões diplomáticas entre Portugal e Es- elementos da classe dirigente e, ainda assim, dantes, desempenharam papdimportante
em 1(389, um incidente conhecido como
panha sobre as fronteiras daquelas regiões como ornamento e erudição. Era literária, . no alargamento de horizontes, inclusive
"questão 'dos' moços p3.rdos":-os col€gios
do rio da Prata se tornaram agudas, uma abstrata ~ além de dogmática -, afastada .' favorecendo o nascente sentimento nati-
vista, cujas-primeiras manifestações surgi- dos jesuítas haviam proibido a m~.tricula
vez que os portugueses haViam desõbedeci- dos interess~s materiais, utilitários, e até es-
ram no século xvn (como já citamos no de mesti~os "por serem muitos e provoca-
do à divisão proposta pelo Tratado de Tor- . tranha, por tentar trazer o espírito europeu
tópico Contexto histórico) e intensificaram-se rem arruaças", mas tiveram .de renunciar
desilhas. A decisão final deu à Espanha. a urbano para ~ ambiente agreste e rural.
no século seguinte. à decisão discriminatória, tendo em vista
Colônia do Sacramento, ficando'com Por- Com J) tempo, a ed~ção atendia a um
segmentQ.novo, o da pequena burguesia Outro foco de alteração no pa.""lorama os subsíqios que receb~,-por .serem es-
tugal as Sete Missões. Só que os indígenas
urbana qne aspirava à ascensão social. Diz .- da tradição colonial ocorreu com a invasão cotas públicas 10.
deveriam mudar-se dessas aldeias para a
parte ocidental do rio Uruguai, o que signi- F~d~ ~e.Azevedo; "En~e as três ins~-
ficava abandonar tudo o que haviam cons- ttnçoes sbClalSque maIS sern.ram de canalS
truído, além de se exporem à gana dos co- de ascens~o, a farn:íliapatriarcal, a Igreja e a ~I
n li r:uJtura brasileira: introdução ao estudo da cultura no Brasil. 4. ed..rev. e ampl. Brasília, Ed., UnB, 1963,
lonos.•Lutaram bravamente nas chamadas escola, estas duas últimas, que constituíram ~n3. .
"guerras guaraníticas", até sucumbirem à um contrapeso à influência da casa-grand~ Apud Maria Luísa S. Ribclro, Hirlúria da educação brasiieira: a organização escolar. 17. cd. Campinas, Autor~
III

navaordem. estavam praticamente nas mãos da Com- Associados,2001, p. 24.

História da Educação e da Pedagogia '-'- Geral. e Brasil Século XVII:a pedagogia reansta. 165
164
A visão etnocêntrica que motivava a de arte~ãos fez com que ~s padres trouxes-
educação europeia na colônia fez com que sem irmãos oficiais -para praticarem aqui Dropes Só aqueles que pretendiam dar aos fi-
- , sempre se desprezasse a cultur~ popular, suas especialidades, como também, e prin- lhos a pôssibilidade de uma carreira no
influenciada pelos indígenas e negros e cipalmente, para ensw.arem seus misteres l' '. Senhora Dona Bahia, / nobre e serviço dlj.Coroa é que se preocupavam,
que permaneceu marginal e condenada à a escravos, homens ]iwes, 'fossem negros, opulenta cidade, / madrasta' dos natu- . com o ensino formal. (Maria .Beatriz
expectativa de homogeneização, umll. vez mestiços e índios". rais, / e dos estrangeiros madre. Nizza da Silva)
que a cultura erudita e europeizada erã. o Apesar desse empenho, continuou no. Dizei-nie por vida vossa / em que
modelo a ser seguido. Mais ainda, os co- Brasil um certo desprezo pelo trab.alho fundais o ditame / de exaltar os que 4 - A força militaI; a sujeição ao tra-
lonizadores de início concebiam os índios man~al, que, por ser oficio de escravos, ín- balho, seivil .e '8;8 doenças epidêmicas'
, aqui vêm / e aba~er os que aqui nas-
como seres inacabados, que mereciam o dios e pobres, sempre foi visto como "tra~ trazidas pelós europeils provocaram o
cem? (Gregório de Matos)
"aperfeiçoamento" pela educação. E de- balho desqualificado". maior genocídio da história da,humani.
dade: no primeiro século da conquista,
pois, na medida em que os temiam, os se- 2 - A forma em que se expnrmam
a população originária da América foi
gregavam corno "ferozes" 'e "inferiores" e Conclusão oral:!ores,cronistas' e poetas era, como
reduzida em cerca'de 90% - dos cerca
que, portanto, deveriam ser submetidos à continuaria a ser por muito tempo, a da
de 80 milhões.dehabitaiJ.tes do momen-
força. O mesmo menosprezo ocorria com Um olhar crítico sobre o Brasil do século língua culta falada na metrópole, na sua
to da 'chegada de,Colombo, no irlício do
os sabere~, a religião e a música da cultura xvn nos revela o profundo fosso entre a pureza. vOcabulare sint;í.tica,e com as
século XVII restavam não mais que 8
negra. vida 'da colônia e a da metx:ópole,devido qualidades ou vícios.de' estilo variáveis
milhões~(Marcos Del Roia)
. Apesar da influência dessas culturas" que. às.intenções de exploração de Portugal. Por cQm,~g~stos individuais.e as,moedas
podemos sentirg,té hoje, o que se destaca . isso, manteve-se a economia agrária deren- Iii:etácias.tánto o&.Sermões.do padre 5 • Diariamente, neste povoado re-
é a. exclusão explícita desses s.egrnerrto:r$ ",dente;:fundada na, escravidão ,e à margem Antôrriu Vieira, coma:. sua' magnífica. ducional" ouve-se o som metálico do
educação formaL das mudanças implantac:lasna Europa. éloquência, como as sátiras de Oregó- sino,' chamando os indígenas para
No campo da educação, enquanto na .rio de'Matos, apelidado o "boca de in- o ensino, para a catequese, a missa
4. A aprendizagem de ofícios ferno", peraS mas invectiyas e pelos seus 'ou para. o trabalho comunitário. (... )
Europa se estabelecia a contradição entre
reIn0ques. cé?ntra tudo e. coirtra todos, É neste espaço urbano que poderiam
o ideal da p~dagogia realista e a educação
dirigiain-se a um público de classe,mais ser abandonadas. as atitudes e os pa-
Os segmentos subaltern;s preparavam- . conservadora, no Brasil a atuação da Igreja
preparado para compreendê-los, seme- drões culturais julgados impróprios, e
-se para a sociabilidade e para o trabalho permaneceu muito mais forte e duradoura.
lhante ao público escolhido de Lisboa, substituídos pelas normas comporta-
por meio de uma educação informal. Diz Segundo Fernando' de Azevedo, esse
de Coimbra ou do Porto. (Fernando de mentais julgadas comO ideais na orga-
Luiz Antônio Cunha: 'í\. aprendizagem ensino promgveu a uniformização do pen-
Azevedo) nização política, econômica e cultural.
dos oficios, tanto para os escravos quanto samento brasileiro "do norte e do sul, do
, Pára atingir esses objetivos, era neces- .
para os.homens livres, era desenvolvida no litoral e do planalto", impondo a religiosi- 3 -,A partir dos 7 anos, os filhos de 'sária a Redução, ou seja, que os indíge-
próprio ambiente de trabalho sem padrões dade cristã sobre as influências do juáeu, . pleb~us, ou mecâcicos, iam geralmen- rtasJossemreduzidos à Igreja e à vida
ou regulamentações, sem atribuições de do índio e do negro. Se o catolicismo di- te aprender um oficia-com um artesão, civif{?zd...(cclesiam
etuitam civilem esset re-
tarefas para os aprendizes"lI. • fundido pela Companhia de Jesus foi o ficarido mesmo a morar em casa do' ductz). Para'uma. perfeita cristianização,
- No entanto, podiam-se: se encontrar "cimento da nossa unidade", pergunta- mestre com seus aprendizes. Os filhos era necessário, inicialmente, reduzir os
"escolas-oficinaS" para a formação de ar- mos se educar seria realmente neutralizar de lavradores com poucos escravos co- indígenas ao novo espaço urbano, pois
tesãos e outros oficios, por. iniciativa dos as diferenças. No capítulo 11 veremos que, meçavam a ajudar nas fainas agrícolas. só ali seriam levados a viver "-política-
. jesuítas.Já vimos noitem I como esse en- de acordo com a visão" contemporânea, , Os tropeiros levavam os -filhos com as mente" como na antiga cidade-estado
sino existia nas missões guaranis. Nos cen-. democratizar a educação não significa ho- tropas. Os mercadores punham-nos nas_ ~(pólis), reme~ando assim a "in:acio-
tros,urbanos, segundo' Cunha, "a raridade mogeneizar culturas. suas lojas ou armazéns e os grandes ne- nalidade". de andarem dispersos pelos
t:
. gociantes começavam a treiná-los para montes e matas, vivendo como "feras"
caixeiros depois de os fazerem passar e adorando "falsos ídolos": (Amo Al-
pelo aprendizado das primeiras letras. . varez Kern)
, .
11 O mrina tk qficios artesanais e TTW:Tl1f!ir.turms no B~ trCTtlllocmta, apud Silvia Maria Manfredi, Educa;ão projissio;al
no Brasil. São Paulo, Cortez, 2002, p. 67 e s.

166 História d~ Educaçã.o e da Pedagogia - Geral e Brasil Século XVII:a pedag!lgLa,~re=a=lis=ta~ _ 167
o Leitura complementar NIStoestá, talvez, a maior diferença entre
o clima mental do período heroico (..., e o . ;, trabalho." Com bas~ nessa citação de
e
[A educação a realidade social] do novo período, que se lhe sucede.Naquele,
os missionários e educadores compartilham
).
,,:,, ~,
Fernandó de Azevedo e no dropes 3,
responda às questões:
;:
.. No isolamento dos colégios, cerçados das necessidades e anseios da coletividade e ., . a) Como ê compree~dida'na colônia "
de conforto, começam a medrar a rotina, se identificam ponto por ponto' com os seus !: 1;,,Ocolonialismo foi um modo encon- a ~elaçãoentre trabalho int~lectuale ma-
a .despreocupação e o desinteresse pelos problemas econômicos, políticos e sociais; trado .p'elo capItalismo europeu para nual? '.'
problemas temporais e materiais da so- para sobre eles atuarem num sentido bené- crescer.:Quais as vantageI1;Sque as me- b) Em que medi<h a tradição es-
ciedade colonial em formação~ Como' fico, construtivo e mesmo salvador.Neste, os . trópoles obtinham das colônias?Discuta cravista pode t'er iI:fluençiado' essa '
desfastio, os estudos proporcionam uma educadores, voltados para a cultura do passa- sobre,quais foram as repercussões desse forma de avaliação? ..
evasão. Nesse otium cum dignitate12 repon- do clássicoe medieval, abdicam dessa função Pt<>c:~so nohIteresse pela educação. c) Por 'que 'se pod~ considerar "de
tam as especulações metafisicas, as dispu- de liderança social, divorciam-sedas realida- ornamento" a formação intelectual da
t~ções filosóficas e as sutilezas da casuís- des imediatas e.comprazem-se nas sutilezas 2. Com'base na questão anterior, discu- elite?
tica formal, girando em torno de postu- formais da cultura, nos requintes de erudição , ta com seu grupo quais são as sequelas
lados,i!JCiomas e princípios abstratos da . e na imitação dos paradigmas ciceronianosa. da' colonização 'que até hoje se~tiru.os 7. Relacione os dropes 4'e 5 e posicio-
Escolástica tradicional. O ensino torna-se, então, formal, desp.rovi- . na e~ucaçãobcisileira. . . ne-se a respeito.
O retorno às fontes autorizadas do sa- dô de conteúdo ideológico e social; quando
ber clássico e medieval oferece a essa elite muito, forma literatos que irão ocupar me- 3. Compare a continuidade e ~ mu- 8. O que vimos até agora faia inter-
de estudiosos uma fuga ~ uma compen- dioCremente os cargos intermediários da dança na atuação dos jesuítas no século ferência do europeu na cultura nativa,
sação reconfortante aos aspectos mais' ronceira 15 administração pública da colônia. XVI e no X.VILquanto. aos seguintes seja:'doíndio, seja do africano: Faça uma
grosseiros e materiais -da luta pela vida, A cultura deixa de ser posta a serviço d,,!so. pontos: missões; educação seeundária; pesquisa com seu grupo a fim de levan-
em que lá fora se debatem os colonos. ciedade, como força no'rteadora e propulso. aprendiZagem de oficios; na sociedade. tar aspectos daquelas "culturas silencia-
A especulação abstrátiva os enobrece e ra, para se colocar à margem da vida, dedi-' das", mas que perduram até hoje.
dignifica, colocantlo-os à parte e acima cada inteiramente ao culto do passado e à 4.. Comente o traço nativista que trans.
do rudimentar escalonamento social que conservação dos :esquemasmentais clássicos parece no poema de Gregório de Matos Q.uestões sobre a leitura
se esboça na colônia. Cria-se, .assim, um e das convenções sociais estabelecidas. (dropes1). compleme~tar
mundo irreal, entretecido de abstrações e Es.sedivórcio; no Brasil,entre a cultura e a
minúcias de erudição. As peças de retó- realidade social incq:rporou-sena nossa tra- 5. Com base no dropes 2, responda às 1. Como o autor Caracteriza a educa-
.rica e de perenética 13 sacra, interc.aladas
com versificações latinas, apólogos e epi-
gramas, completam o quadro cultural em
dição e chegou até nossos dias. Ainda hoje
lutamos contra a inércia dessa tradição, pro-
curando restabelecer, na educação nacional,
que se alimenta esSa elite deestudio~os. O _ o nexo vital entre ti. cultura e a vida social,
,r't'
,,, : .,,~
questões a seguir:
• a) Em oposição à língua culta,tínha-
mos a lf.ngua geral. Discorra sobre o as-
ção ministrada pelos j~uítas no século
'~
2. Q~_~ diferençl.S.3
que aparecem
sunto, consultando o capítulo anterior
retorno saudosista ao passado, à mentali- perdido desde o período heroico. para relembrar do que ~etrata. . na educação do século XVII?
dade da Idade Média, justifica e sq.nciona ""~ ::, .' b) Comente a semelhança entre a re-
o alheamentoe a fuga dessa elite intelec-
tual às trepidantes e triturantes realidades sil:
Luiz Alves de Mattos, Prim6rdios da eductlfiIo no Bra-
o período heroico (1549 a 1570): Rio delaneiro,
"'1'
... -, ..
I.
:'
'l""
ferida produção literária e a educação 3. A partir do que foi estudaçlo no ca-
l1: ." da elite no Brasil colonial. Posicione-se pítulo, explique os motivos que levaram
Gráfica Editora Aurora, 1958, p. 296 e 297.
imediatas da colônia: i. ;
a~~ito. ' ao prevaltcimento da principal tendên-
cia a que q autor se refere, .
6. "O título de bacharel e de doutor
;;'):
mantinha-se como um sinal de classe, e 4. O au~or escreveu o texto em meados
12 Otium cum dignitam, "ócio com dignidade": expressão indicatiVa do lazer ocupado com atividades intelectuais,

próprio das sociedades em que o trabalho manual é exercido por escravos ou servos, como na Antiguidade ), as mãos dos filhos do senhor de enge- do século XX: discuta com seu grupo
greco-romana e na Idade Média, , • nho ou do burguês dos sobrados con- se a conclusão dele ainda vale hoje em
"'Percnética: conjunto de discursos sobre questões morais e religiosas. tinuavam a repugnar as ca10sidadesdo dia, OU não.
" Paradigma ciceroniano: modelo de retórica e escrita do pensador romano Cícero.
"Ronceiro: vagaroso.

Século XVII:a pedagogiâ realista 169


168 --------H •..•,istária da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil
,
,i
,r,

. '

I
I
---.:.'.....,...;
.....
~.,.';T • ."f"..'- ~-'''-~,~-"':....:-- 'I

i t,';.;!
.Capítulo Século das Luzes~'
,o ideal liberal
de educação

o século XviII, ou Século das Luzes,


caracterizou-se por grande fermentação
intelectual, por conta da fértil produção
dos pensadores ilul(linistas. Nesse perí-
odo ocorreram grandes abalos políticos
.. "\
i
devido ao confronto entre a aristocracia
do Antigo Regime e a burgvesia emer-
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) gente, na Europa, enquanto nas colônias
-, (Câmara Brasileira do üvro, S~ Brasil) , americanas se intensificavam os movi-'
Aranha, Maria Lúda cle Amllla mentos de independência das metrópo-
História da educa~'ào-e doi pedagogia :ger'.l! e les. Na educação, fortalecia-se a tendên-
Brasil I Maria Lúcia de Arruda Aranha. - :I. etl. - cia liberal e laiCa, em que se buscavam
rev e ampl. .....:São Paulo: Moderna 2006. novos caminhos para'a aprendizagem e
Bibliografia a autonomia do educando. Em Portugal,
permanecia o absotutismo "esclar~cido",
1. Educ:l~'iio - História I. Tírulo, 'que orientou a atuação do marquês de
Pombal na reforma do ensino e no estí-
05-8901 , CDD-370.9 mulo à difusão das ideias iluministas, em ,
- meio dJin-úmeras contradições, como ve-
índices po'ra calá/pgo 5istemático: remos. As Fessonâncias desse movimento
'I. Educã~'ão : História 370.9 chegaram até o Bràsil, apesar do estreito
Repr~dução proibida. Art.181 do Código penal e Lei 9.61 Ó de 19 de fevereiro de 1998. controle da metrópole, que proibia a ins-
',' talação da imprensa e de universidade
Todos os direitos reservado~ ( A$ ruinas de São Miguel,-- - no colônIa.
um dos "Sete Povos das
EDITORA MODERNA LTDAt. MisSÕ8S" (RS), testemunhÇlm
Rua Padre Ac!elino, 758 - B~lenzjn~o a grandiosidade desses
São P,lll!o - SP - Brasil - CEP 03303-9Q4 aldeamentos indigenas
Vendas e Atendimento: TeL (0__ 11> 2790-1'500
Fax (0__ 11> 2790-1501
ccfministrados pelos jesuitas
até serem expulsÓs -pêlo - ..
'

I1lQrquêsde Pombal em
,",
"
",-v..'W.moderna.com.br
meados do século XVIII.

Impresso
2011
110 Bmsil, '
.. 171
mesmo) configura o pensamento liberal de 3. O despotismo i1ustrcido
.• p A R T E I um Estado não-intervencionista.
• Na política, as ideias liberais opunham- A ilustração marcou presenç~ inclusive
A ped4gogia liberal ~ laica se ao absolutismo,As teorias contratualistas,
segundo as quais a legitimidade do poder
em países como Prússia, Áustria, Rússia e
Portugal, nós quais persistia o abso1utis:'
.. Contexto histórico o grande acontecimento europeu foi a resulta do pacto entre indivíduos, desde o mo, entãq chamado de despotismo esclarecido.
Revolução Francesa (1789), que depôs os século anterior tinham sido elaboradas por (ou ilustrado), porque .os'reis se faziam cer~
Bourbons. Contra os privilégios hereditá- Locke, como vimos no capítulo anterior. car por p.ensadcirese adotavam tJ discurso
1 . As revoluções burguesas ,No século XVIII, Rousseau retomou a dis-
rios da nobreza, os burgueses defendiam os dos filósofos iluministas, procurando criar
prinCípiosde "igualdade, liberdade e frater- cussão do contrato social numa perspectiva a imagem de racionalidade e tolerância,
Grandes transformações abalaram a Eu-
nidade". menos elitista e mais democrática, o que dissimulava o caráter absoluto do
ropa no século X'VIILA burguesia ocupara,
, • Na moral também se buscavam formas poder.
até então, posição secundá,ria na estrutura'
laicas, que permitissem a n,aturalização do Enquanto para 'o absolutismo clássico
da sociedade aristocrática, cujos privilegia- 2. As ideias.iluminisfasl
comportamento humano. No livro Emílio, do século XVII a legitimidade do poder
dos eram a nobreza e o clero. Os nobres, ,~
sustentados 'por pensões governamentais, O iluminismo ou ilnstração (em alemão, ,i Rousseau propõe uma pedagogia baseada real se fundava no direito divino dos reis -
levavam vida ,parasitária na corte, tinham Ar.ifkliinmg) é uma das marcas importantes 'i no retomo à natureza, à espontaneidade do
sentimento, a fim.cl..eevitar' os preconceitos
premissa que fora rechaçada pela política
isenção de impostos e gozavam o beneficio do século XVIII, também conhecido como J' : liberal dos pensadores contratualistas -, os
de seremjulga,dos por leis próprias. . o Século das Luz;es. Luzes significam O poder<:..:~ que corrompem a vida moral. Ao mesmo déspotas esclarecidos mantiveram o absolu-
:\b.burguesla',:ênriqUecidapelos resultados '.c1,arazão humana de interpretar e reorga-: ••. tempo, os enciclopedistas Diderot e Helve- tismo mas, pelo meno~ na aparência, des-
tius recuperam a importância das paixões
, daRev(jlução(lom~~illltn-tQntraV<!.~~e,n.Qt nizar o mundo. vestido,de seu fundamento relig:1oso:o que
entanto, onerada;cotl"la,~Ç1e .impostos. O otimismo com respeito à razão já era - : ' como vivificadoras do mundo moral.
se defendia era o poder absoluto fundado
o Na religião, o deísmo é uma espé~e de
'e, 'embora tendo'ascendido."ectinomica- anunciado desde o Renascimento, quando no direito natural e, portanto, constituinte
mente pelallJi;mçacom,areal~'" a nova concepção de ser humano valori- "religião natural" em que não haveria lugar
de um Esta:do leigo, secularizado, ciisposto
tà,tesseÍltia.::.'Se~~'mettantilismb;cada vez' zava os poderes do indivídw contra o teo- "-', para os dogmas e fanatismos. Os filósofos
a intervir em diversas áreas, inclusive na
maiS btoqüêadbtêlã'~ua: iniciativa. . centrismo medieval e o princípio da auto- deístas não aceitavam,la revelação divina
educação, até então privilégio das institui-
. Em 1750, a entrada da máquina a va- ridade. No século XVII o racionalismo e a nem rituaiS do culto, admitindo que Deus
ções religio~asou de preceptores particula-
por nas fábricas marcou o ínício da Re- revolução científica acentuar~ essa ten- era apenas o Primeiro Motor, o Criador do
res. Nesse sentido, pregava-se a moderniza-
volução Industrial, que àlterou definitiva- dência, de modo que no Século das Luzes Universo, o Supremo RelojoeirO.
ção do país, a s~r alcançada pelo progresso
mente o panorama socioeconômico com o indivíduo se descobre confiante, como ar- ". Na França, o iluminismo expandiu-se
científico e pela difusão do s~ber dos pensa-
a mecanização da indústria. Tornou-se ~ce do futuro, e não maiS se contenta em com a publicação do trabalho de seusfilóSo-
, dores modernos.
inevitável que a burguesja, já detentora do contemph:tra harmonia da natureza, mas fos, sobretudo a Enciciop~dia, cujos verbetes
foram confiados a diversos autores, como Em Portugal, essas mudanças ocorreram
poder econômico e sentindç-se espoliada quer conhecê-la para dominá-la. no tempo do rei D.J~sé I, por meio da atua-
pela nobreza, reivindicasse para si o poder Era, portanto, uma natUreza dessacrali- Voltaire, D'Alembert, Diderot, Helvetius
Ç~9 de seu primeiro-ministro, o marquês de
~po~tico. zada, ou seja, desvinculada da religião, que e, apesar das divergências com quase todos
estes, também Rousseau. Outro iluminista Põmbal, chamado SebastiãoJosé de Carva-
~o século XVIII explodiram as revolu- reaparecia em todos os campos de discus-
francês de destaque foi Montesquieu. . lho'e Melo (1699-1782). Durante o período
ções burguesas. Em 1688, na Inglaterra, a são no século XVIII.
• 1 Revoit\ção Gloriosa já destronara os Stu- o Na eoonomia, olíberalismo representava
Na Inglaterra, os principais "representan- em que exerceu influência'sobre o rei, de
_J~ c!9J!uminismo foram Newton e Reid, 1750 a 1777, promoveu diversas reformas
arts â-bsolutista5.As ideias hoerais de Locke as aspiraçõesda burguesia desejosade geren;_
herdeiros de Locke e-Hume. _ importantes no sentido de incrementar a
espalharam-se pela Europa e também pelo .ciar seus negócios, sem a intervenção do Es-
Na Alemanha, D movimento ficou co- produção naciQ.l1al,incentivar as manufatu-
Novo Mundo, onde ocorrerarp. movimen- tado mercantilista. Segundo oS.teóricosFrari-
nhecido como Aujkliirung, e dele participa- ras e desenvolver o comércio colonial, além
tos de emancipação, alguns bem-sucedidos, çois Quesnay (1694-1774) e depois Aclaro ,
ram WQlff;Lessing, Baumgarten. Foi Kant, da interferência na escolarização, como já
como a Independência dos Estados Unidos Smith (1723-1790), a distribuição'de rique-
(1776), outros violentamente reprimidos, zas segueleis "naturaiS". A expressão "Laissez no entanto, o filósofo por excelência desse dissemos.
período, e sua obra sistemática marcará a Como veremos, todas essas alterações ti-
como as Conjurações .Mineira (17a9) t:: Jwe, úzissezjlasseT; le monde va de !ui mêrne" 'Peixe
Baiana (1798) no Brasil. fazer,deixe passar, o mundo caminha por s~ filosofiaposterior: veram repercussão no Brasil.

Século das Luzes: o tdealliberal de educação 17,3


172 História da Educação e da Pedagogia'_-=- Geral e "Brasil' -----
Educação ação do ensino na Europa: Além das quei-' -i 3. Reformas na Alemanha pirou a fundação de, colégios semelhantes
< j. 'xas quanto ao conteádo, exCt:SSivamente . em outros locais, o que ajudou a tornar o
, ~ . 1. Tendência liberal e laica literário e pouco científico, as escolas eram. -A situação da educação era um po'uco ensino alemão menos antiquado. ' .
insuficientes e os mestres sem. qualificação diferente nos Estados da Alemanha I, so-
:1 No contexto histórico do iluminismo, adequada. Mal pagos, geralmente não ti- bretudo na Prússia, onde o governo reco- 4: Portugal e a reforma pombalino
t! nham experiência ou permaneciam nessa nheceu a necessidade do investimento em
não fazia mais' sentido atrelar a educação
à religião, como nas escolas confessionais, profissão enquanto não arrumavam outra,;: educação. Inicialmente Frederico I e em se- Na. primeira metade ,do século XVIII
nem aos interesses de uma classe, como melhor. Com formação deficiente, não cori- guida Frederico li, o Déspota Esclarecido, ainda êontinuava a irifluência dos jesuítas,
queria a aristocracia. A escola deveria ser seguiam disciplinar as classes nem ensinar tinham a clara intenção de alcançar os fins com seus colégios espalhados peló. :mundo,
leiga (não-religiosa) e livre (independente grande coisa e ainda abusavam da prática políticos do engrandecimento do Estado embora as críticas a el<!s'se tomasiem mais
de privilégios de classe). de castigos corporais. . pela educação. fortes. Denunciava-se o-dogmatismo da Es-
Esses pressupostos sugerem a defesa de As escolas elementares quase inexistiam, Ao se tornar obrigatório o ensino primá- colástica decadc'rite, maS, nos debates apai-
algumas ideias, nem sempre postas em prá- e as de nivel secundário eram antiquadas e rio, ampliou-se a rede de escolas elementa- xonados, as questões, econômicas e P9líticas

I'
I , tica, como: . serviam às classes privilegiadas. Enredadas res, com especial atenção para o método e se sobrepunham, aos limites estritamente
• educação ao encargo do Estado; no sistema medieval de corporações, as uni- o conteúdo do ensino. Em 1763 o Estado pedagógicos. Os jesuítas foram expulsos de
: • obrigatoriedade e gratuidade do ensino versidades mantinham o ensino escolástico, assumiu o controle-da educação, ao nome- diversos países - de Portugal e, portanto,
'. elementar; alheias ao movimento iluminista. Restavam ar inspetores e instituir um exame no final do Brasil em 1759 - até que o papa Cle-
• nacionalismo, isto é, recusa do univer- as academias; em qúe' os futuros dirigentes do curso secundário para o acesso à. uni- mente XIV extinguiu a Comp~hia de Je- ,
salism~jesuítico; . estudavam matérias mais úteis, como arte ver~dade. • ' sus em 1773 .
••ênfase nas línguas vernáculas, em detri- militar, fortificações, balística, e praticavam AléJ?1das escolas populm:es elementares Já dissemos que, em Portugal, o grande
mento do latim; esgrima e equitação, esportes considerados e das tradicionais, foi criada a Reo1rduúe (Es- gestor da introdução das ideias iluministas
• orientação prática, vol~ para as ciên- I'lobres_ cola Real), com ensino técnico e cientifico, foi o marquês de Pombal, que agiu com
.cias, técnicas e oficios, não mais priv1lt:gian- Apesar dos projetos de estender a edu- onde se ensinavam matemáticas, mecânica, rigor na' reforma do ensino. Ao expulsar
do o estudo exclusivamente humanístico. os jesuítas, instituiu naquele mesmo ano á.
cação a todos os cidadãos, prevaleceu o ciências naturais'e trabalhos manuais. Cou-
Em consonância com as aspira~ões ilu- educação leiga, com responsabilidade total
dualismo escolar, ou seja, uma escola para be, portanto, à Alemanha o mérito de ini-
ministas, o marquês de Condorcet, eleito do Estado. Como se vê, Portugal foi pionei-
O povo e outra para a burguesia. Essa dua- ciar o processo de oposição ao ensino tradi-
~
"
.. deputado' da assemb1eia legislativa france-
lidade era aceita com tranquilidade, sem o cional e exclusivo de humanidades. ro nessa intenção: a estatização qo,ensino
sa após a Revolução, defendi?- os ideais da ocorreu em 1763 na Prússia,. em 1773 na
temor de ferir o preceito de, igualdade, tão Ainda na Alemanha, Basedow (1723-
educação popular. Em 1794, redigiu o Pla- . Saxônia, enquanto na França, mt' década
caro aos ideais revolucionários. Afinal, para 1790), admirador de Rousseau, deu início
no de Instrução Pública (conhecido como de 1790 (após' a Revolução FranC6a), essas
a doutrina lib'eral, se o talento e a capacida- aó importante movimento pedagógico co-
Rapport), que estendia a todos os cidadãos a , ideias ainda eram debatidas na.as"Semb1eia
de não são igualmente repartidos ~ntre os nhecido como jilantropismo2. Em Dessau,
instrução pública e gratuita e ô saber técni-
indivíduos, por consequência, é natural que fundou o instituto. Filantropinum, no qual legislaliva.
co necessário à profissionalização. O plano
est"esúltimos não sejam iguais em riqueza e muitas ideias iluministas foram postas em Pombal'instituiu as aulas régiasr'régias"
não foi aprovado, mas inspirou outros pro-
oportunidades. prática. Para BasedoWj a..educação tem por porque pertenciam ao rei, ao Estado e não
jetos. Em 1793, a pedido de Robespierre,
No periodo napoleônico (início do sécu- fim dar condições para o indivíduo se~feliz, ,à Igreja). Começou estruturando os cha-
Le Peletier apresentou um Plano Nacional
lo XIX), muitas das tendências liberais da por isso a aprendizagem deve ser prática e mados Estudos MmIJTes, que correspondiam
de Edpcação, que daVa realce ao sistema de
ao ensino fundamental e médio (primeiras
educação nacional corno mola mestra do , Revolução Francesa foram abandonadas. agradável e estimular a atividade r:acional e
O Estado demonstrava mais interesse pelo a intuição, mais do que a memória. Dedi- letras e ensino de humanidades). Em 1772
'hovo regime p-olítico e sociaL - . .
ensino médio porque via com desconfian- cou igual interesse pela educação fisicR. 'foi iniciada a segunda fase, com a Reformá
As ideias de educação universal reapare-
dos Estudos Maiores, quando se reestrutu-
cerão com mais força no século x:r?~. ça a iniciativa do ensino particular, cujos Embora. não tenha permanecido mwto
rou a Universidade de Coimbra. Afastada a
programas reviviam o formalismo dos an- tempo na direção da escola, Basedow ins-
2. Dificuldades é10 ensino tigos colégios jesuítas. Por se descuidar da
instrução primária gratuita e popular, aos
, poucos esse segmento foi retamado pelo A unificação alemã ocorreria ap<:nasno século XIX.
i, Apesar das discussões avançadas sobre o I

I ideal liberal da educação, era crítica a situ- clero. ! Filantropia Significaamor à humanidade (do grego pltilos, "amigo"; antropos, "homem").
i 175
.~
-.~-~174-----. História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Século. das Luzes: o ideal liberal de educação

.. _1
-..,.,..""""~--- ..-..,.-- --- .. ~-
'-- .... ,
Companhia. de Jesus, assumiu a Ordem do do Estado. Essa posição foi defendida pelo a
Ao contrário, Diderot, mesmo como um . mocrática do que teoria daquele filósofo
dos mais atiVosorganizadores da Enciclopé- inglês. ~ara Rousseau, .o indi'víduo em es-
Oratório - a qualjá tiriha recebido prote'" francês.La Chalotais no Ensaio de educação
nacional. Como vimds, também era esse o dia, defendia posição mais democrática. Es- taqo de natuI:eza é bom, mas se corrompe
ção do rei em 1740 -, que era conhecida
empenho de Condorcete Le Peletier, au- crevendo à imperatriz Catarina da Rússia, na sociedade, .que destrói sua liberdade:
pela visão mais avançada, aberta às ideias
tores de projetos apresentados à assembleia aconselhava a Universalização da instrução: "O homem nasce livre e por toda.parte en- .
iluministas.'Na reformulação do ensino de
legislativafrancesa. "É bom-que todos saibam ler, escrever e .contra-se a ferros".. Consider.a então. ã pos-
filosofia.e letras, optou-se pela lingua mo-
Agr\J.paremos as contribuições predo-, contar, desde o primeiro-ministro ao mais sibilidade de um contI:ato.socialverdad(:iro
derna (e não olarim), pelas matemáticas e
minantemente teóricas da pedagogia da humilde dos camponeses (... )Porque é mais e legítimo, que reúna o povo numa só von-
ciências da natureza, procedendo-se tam-
llustração em três tendências fundamen- dificil explorar um camponês que sabe ler tade; resultante do consentiinento-qe todas
bém à atualização dos estudosjurídicos.
tais: os enciclopedistas, o naturalismo de do que um analfabeto"'. as pesso<).S..
Em 1772, Pêiriibàlinstituiu o subsídio lité-
Rousseau e a pedagogia idealista de Kant. A concepção política de Rousseau foi
rário, impc.sto destinado a financiar as refor-
Embora Pestalozzi (1746-1827) pertença 2. A pedagogia' de Rousseóu menos elististaque a: de Locke, por conta da
mas projetadas, o que valia também para
'em parte a esse período, preferimos men- cli:ffrentenoção de soberania. Para Rousseau,
o Brásil. Dessa forma, os professores eram
cioná-lo no capítulo seguinte, por repre- O filósofoJeanJacques Rousseau (1712- o cidadão .não escolhe representantes a
selecionados e pagos pelo Estado, toman-
sentar melhor as características do séCulo -1778),natural de Genebra, na Suíça, aban- quem delegar ó poc,ler- como defendiam
do-se funcionários públicos.
XIX. Veremos também os teóricos da edu- donou sua terra natal aos 16 anos. Levou Locke e a tradição liberal -, porque pa:ra
Embora a escola fosseleiga na sua admi-
cação em J,'ortugal. uma vida conturbada, andando por diversos ele só o povo é soberano. Em outras palavras, o '.
nistração, continuava obrigatório o ensino
No espírito do iluminismo, os filósofos lugares, ora por espírito de aventura,..ora pacto que institui o governo não submete o
da re1igião católica e havia severo controle
da Inquisição sobre a.bibliografia utilizada, franceses' Diderot, D'Alembert, Voltaire, e,
.devido a perseguições religiosas. Em PariS, povo a ele, isto os depositários do poder
Rousseau e Helvetius não erampropria- onde passou a residir,conviveu com os enci- não são senhores do povo, mas seus oficiais,
rejeitando-se os "abomináveis princípios
mente educadores, mas encaravam o en- c1op.edistas, tomando-se muito amigo de Di- e apenas executam as leis que emanam do
franceses", sobretudo as idéias republicanas
sino como veículo importante das luzes da derot. Divergia dos demais em muitos pon- povo. Nessr:sentido, Rousseau critica o re-
que solapavam o Antigo Regime e, contra a
razão e no combate às superstições e ao tose teveinúmeras desavenças coin Voltaire, gime representativo e defende a democra-
fé tradicional, a religião natural ou deísmo. .i'
que não lhe poupou severas críticas. cia direta, pois toda lei não ratificada pelo
É preciso não esquecer que o despotismo obscurantismo religioso. '~",

Alguns deles mantiveram um viés aristo- Dentre suas obras destacam-se: Discurso povo é nula.
esclarecido queria modernizar o país, mas
crático, isto é, acreditavam na capacidade sobre a origem da diiigualdade entre os Izom.ens, Do Portanto, o soberario é o povo incorpo-
preservar a monarquia absolutista e a re-
de bem usar a razão como atributo de uma contrato social, ambos sobre política, e Em1J.io rado, o.corpo coletivo que exprime, na lei, a
ligiosidade. A propósito dessa.contradição,
IJU da educayão {1762). vontade geral. Segundo ateori~deRousseau,
veja o cOI,llentáriodo historiador português . elite intelectual. Voltaire dizia em uma car-
ta ao rei da Prússia: ''Vossa majestade pres- Rousseau ocupa lugar de destaque tia fi- a vontade geral não se confunde com a VOB-
Rómulo Carvalho no dropes 3.
.tará um serviço imortal à humanidade se losofia política - suas obras antecipam o tade da maioria, como. o senso comum po-
Veremos no próximo tópico quais foram
conseguir destruir essa infame superstição ideário da Revolução Francesa -, além de deria pensar, porque as decisões não resul-
os mentores intelectuais que teorizaram
[a religião cristã], não digo na canalha, in- produzir uma teoria da educação que nãl!l tam daJipmatória das vontades individuais,
sobre a educação em portugal,. tais como
digna de ser esclarecida e para a qual todos ficou restrita apenas ao século XVIII: seu mas expressam o interesse comum, isto é,
D. Luís da Cunha, Ribeiro Sanches e Luís
os jugos são bons, màS na gente de peso,,3. pensamento CQnstituium marco. na peda- o interesse de todos, como participantes da
,An_'toniq;yeI1:ley. goiía contemporânea. comunidade .
"', "",.;,. Era esse também o espírito que animava a

,.dl: O cidadão, ativo e soberano, capaz de


"

citação do juris~onsulto italiano FIlangieri,


;... "., la A cõncepção política de Rousseau autonomia e liberdade, é ao mesmo tempo
•.:" ~t .
"-,':# -.
transcrita no dropes 2.
um súdito, porq~e se submete à lei que ele
o
1. peniame.nto iluminista Talvez tais posições possam ser com-
Tal com~ Locke, Rousseáu cntlcou o próprio ajudou a erigir. Liberdade e obedi-
preendidas como expressão do ideal libe-
ral, mas voltado para os interesses aa alta absolutismo e .elaborou os fundamentos da ência são polos que devem se completar na
Um d::.saspectos marcantes do lluminis-
burguesia, temerosa de que a educação das doutrina liberal. No entanto, o pensamen- vida da peSsoa em so*dade. Pqr aí já po-
mo, período muito rico em reflexões peda-
massas provocasse o desequilíbrio na ordem to pedagógico de Rousseau não se separa demos antever a importância que Rousseau
gógicas, foi a política educacional facada no
que então se estabelecia. de sua concepção política, que é mais de- deposita na educação.
esforço para tomar a escola leiga e função

4Apud AnibalPonce, Educação eluta de classes. 7. ed. p. 13S.


S Apud Arúbal Ponce, Educação e luta de classes. 7. ed. SàLJPaulo, Cortez/ Autores Associados, 1986, p. ISS.

Século das Luzes: o ideal liberal de educação 177.


176 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil ~
-)
r
.,, !:
Naturalismo e educação negativa

Costuma-se dizer que Rousseau provo-


. . A educação natural co~te~ar:a aoj
intelectualismo,.que leva fatalmente ao en-
sino{ormaI e livresco. Ou seja, a pessoa nio
criança aprendesse a pensar, não como um
processo que vem de fora para dentro, ~o
contrário, como desenvolvimento ~terno e
e por issofoi ameaçado de prisão, precis:im-
do sair de Paris para se ref~giar na Suíça.

.1 cou uma revolução copernicana na peda- se reduz à dimensão in!electual, como se a natural.' Avaliando as críticas a Rousseau
gogia: assim como Copérnico inverteu o natureza pudesse ser apenas razão e refle- •
r
modelo astronômico, retirando a Terra do xão, porque antes da "idade da razão" (15 "; o preceptor: a dialética "liberdade e Não resta dúvida qüârito'ao caráter ino-
centro, Rousseau centralizou os interesses anos) já existe uma "razão sensitiva". Por- obediência" vador d<lSideias de Rousseau,porém muitos
pedagógicos no aluno e nãó mais no profes- tanto, os sentidos, as emoções, os instintos e, não lhe poupam críticas.ou algum,asreser-
sor. Mais que isso, ressaltou a especificida- os sentimentos são anteriores ao pensar ela- É delicada a função do professor na pe- vas;pelo menos. Uma creIasé aaqisação de
de da criança, que não devia ser encarada borado, e essas disposições primitivas são dagogia rousseauniana. Se não deve impor propor uma educação eirtista,já éftl~Emílio
como um "adulto' em miniatu!'a". ' mais dignas de confiança do que os hábitos '" o saber à crian5a, tampouco pode deixá-la é acompan,hado por UII}; p~ecept~t,'proce-
Até então, os fins da educação encontra- de pensamento inculcados pela sociedade. no puro espontaneísmo. Afinal, ela deve dimento próprio dos ricos. Outra refere-se
vam-se na formação do indivíduo para Deus Como amante da natureza, Rousseau. aprender a lidar com os próprios. desejos à separação entre aluno-'esociedáde: neste
ou para a vida em sociedade, mas Rousseau quer retomar o contato com animais, plan- e a .conhecer os limites para se tornar um caso, estaria defendendo uma educação in-
quer que o ser hlunano integral seja educa- tas e fenômenos fisicos dos quais o indiví- indivíduo adulto dono de si plesmo. Seme- dividualista.
do para si mesmo: "Viver é o que eu desejo duo, urbano frequentemente 'se distancia: :; 1,
lhante ao processo de formação da cidada- Mesmo admitindo a procedência des-
ensinar-lhe. Quando sair das minhas mãos, '~ coisas! as coisas! Nunca repetirei bas- .- nia, em que o cidadão se submete à vonta- sas críticas, não convém esquecer qlll~
ele não será magistrado, soldado ou 'sacerdo- tante que damos muito poder às palavras~'. de geral, também a criança descobrirá por Rousseau recorre à abstração _metodoló-
te, ele será, antes de tudo, um homem". Desse modo, valoriza a experiência, a. edu- si própria ~ leis das éoisas e das relações gica de urna relação ideal, hipotética -
Sua obra Emílio relata de forma roman- cação ativa voltada para a vida, para a ação, ;; inteIJ>essoais. semelhante à do contrato social".- a fim
ceada a educação de um jovem, acompa- cujo principal motor é a curiosii:lade. Po; exemplo, se Emílio quebra a vidraça, de formular a tec"ia pedagógica. Ou seja,
nhado por um preceptor ideal e afast~do Além de naturalista, a educação precorti- deixam-no dormir sob o vento. Se a quebra perguntar como s 'ria possível a educação
da sociedade corruptora. O projeto de umã zada por Rousseau é tambéin de início ne- de noVo;é colocado em um quarto semja- . natural de Emílio -:m uma sociedade cor-
"educação conforme a natureza", entretan- gativa. Desconfiado da sociedade constitui. nelas: ''Dizei-lhe secamente, mas sem rai~: rompida significa tratar do mesmo proble-.
to, não significa retornar à vida selvagem ou da, Rousseau teme a educação que põe a . as janelas- são minhas; aí foram colocadas ma da política, quando nos perguntamos:
'" primitiva, e sim buscar a verdadeira nature- criança em contato com os vícios e a hipo- poi meus cuidados; quero garanti-Ias"6. Como é possível estabelecer a vontade
za, que corresponde à vocação humana. crisia: "Se o homem é bom por natureza, Enquanto sucumbe ao impulso, .é. escravo geral em uma sociedade que ainda não é
Vejamos então os possíveis sentidos do segue-se que permanece assim enquanto .do seu desejo e, quando aprende que exis- democrática? Para os filósofos contratua-
conceito de natul'e(.a, a fiin de entender o que nada de estranho o altere. (... ) A educação tem leis, sozinho as descobre: a liberdade listas, o estado de natureza não é uma situa-
significa a pedagogia naturalista de Rousseau. primeira deve portanto ser puramente ne- é, pois, a obediência à lei por ele mesmo ção histórica que exÍstiü no tenIpo, mas.
Ao fazer a crítica do regime feúdal e dos gativa. Ela consiste não em ensinar a virtu- aceita. Assim, Emílio vê-se diante dos atos 'uma -hipótes~.para .su~ntar a argumen-
costumes da aristocracia, Rousseau preco- de ou a verdade, mas em preservar o cora- e de suas consequências. tação sobre o p'acto original .. Do mesmo.
niza uma educação afastada do artificia-' ção do vício e o espírito do erro. (... ) Sem Aprendendo a controlar-se no mundo modo, também não estana sendo propos-
lismo das copvenções sociais. Da mesma preconc€itos, sem hábitos, nada teria 'ele fisicoe nas relações com as pessoas, aos 15 to um ensino centrado apenas na relação
maneira que, na esfera política, o cidadão em si que pudesse contrariar o resultado de anos começa para ojovem a educação mo- professor-aluno.
elabora as leis' da sociedade democrática, vossos cuidados. Logo ele se tornaria, em ral propriamente dita. De posse da verda- Além disso, o fim do ensino não é educar
'também a educação deve buscar a espon- vossas.mãos, o ~ais sensato dos homens; e deira razão, só então ele poderá observar o solitário Erqilio, mas inseri-lo na socieda-
taneidade original, livre da escravidão aos começando por nada fazer, teríeis feito um . as pessoa,s:e suas paixões e também iniciar de. Compreende-se o artificio de Rousseau
hábitos exteriores, a fim de que o indivíduo prodígio de educação"5, . a instrução religiosa, porque falar precoce- . porque, por ser liberal, concebia' a soéieda-
seja dono de si mesmo; agin~~;por interes- mente de Deus com a criança apenas:se lhe de como uma justaposição de in.divíduos,
ses naturais e não por constràngimento ex- RoussealJ não dava muito valor ao co- ensina a idolatria. Rousseau defende a reli- e a crítica ao individualismo só apareGerá
terior e artificial. nhecimento transmitido e queria que a " gião natural, como a do deísmo iluminista, mais tarde, com as teorias socialistas.

5 Jean-:Jacques RDusseau, Emílio ou da eri;:cafào. São Paulo, Dife~ 1968, p. 80. 6 Jean-JacquesRDusseau, Emílio ou da educafão, p. 88.

178 História da Eéfuéação e da Pedagogia - Geral e Brasil Século. das Luzes: o ideal liberal de educação 179..
Ainda a~e fundadas as críticas ao cará- Para Kant, ."0 nosso conhecimento experi- . Agir moralmente é; portanto, agir pelo os aspectos morais sobre os intelectuais na
~era-histórico dessa hipótese, ao Dtimismo mental é um composto do que recebemos dever. Além disso, a ação tem uma yalida- formação dos jovens: "Mandamos, em pri-
~x'agerado da ação da natureza e ao redu- por impressões e do que a nossa própria de objetiva e universal, que se estende para meÍrOltigar, as crianças à escola, não na in-
zido papel do preceptor, lembramos qu;: faculdade de. conhecer de si mesma tira todo ser racional, daí a afirmação de Kant: tenção de que nela 'aprendam alguma'coi-
Rousseau é um opositor da educação do. por ocasião de tais impressões". Ou seja, o ~ ''Âge de' modo que a máxima ~a,tua;,ação sa, mas à fim de que se habituem a observar
seu tempo, extremamente autoritária, inte- conhecimento humano é a síntese dos con- ~; possa sempre valer ao mesmo tempo como pontualmente o que se llies ordene". O que
ressada em adaptar e adestrar a criança e teúdos particiJ.lar~5.dados pela experiência;; princípio universal de conduta". nãosignmca adestrar: a criança à obediên-
que, ao contrário dele, se apoiava na con- e da estrutura universal da razão (a mesma ~~ Decorre 4esse raciocínio que a pessoa cia passiva, mas ensiná-la a agir com planos
cepção de uma natureza humana má. para todos os indivíduos).:{ .não realiza espontaneamente a lei moral, e submeter-se a uma disciplina. Kant quer
Por fim, pode-se ainda criticar a posição f!. mas a tnoralidade resulta da luta interi.or atingir. a obediência voluptária, capaz de
de Rousseau com relação à mulher, que, A consciência moral entre a lei universal e as inclinações indi- reconhecer qu~ as exigências são razoá.veis
segundo ele, deve ser educada para servir viduais. Assim, a verdadeira ação moral, e superiores aos caprichos momentâneos.'
aos homens. Embora fosse essa a concep- Para Kant,' no entanto, a razão não é,:; como resultado de um ato de vontade, tem Mesmo quando, existe, a coerção tem
ção corrente no seu tempo, alguns teóricos, capaz dê conhecer as realidades que não J por fundamento a autono'mia e a liberdade. por finalidade propiciar a liberdade do
como Comênio e Condorcet, já teciam se. oferecem à nossa experiência sensível" A ação moral é autônoma porque o ser sujeito moraL Em última allálise, cabe. a
. considerações sobre a maior participação tais como Deus, a imortalidade da alma, '~;:
humano é o único ser capaz de se deter- cada um proceder a sua própria formação.
da mulher na sociedade. a liberdade e a infinitude du Universo.'; minar segundo leis que a própria razão Ao u,nir educação e liberdade, Kant rtdefi-
.Ou'seja, as. questões metafisicas. não são ~: estabelece (e não' conforme leis dadas ex- ne a relaçãope~ca, reforçando a ativi-
3. Kant e-a P~a9~~~
idealista. acessÍVeis- an',conhecimento.. '.r
:~
ternamente; como na heteronomia): Para dade do. aluno;, que deve 'aprendera :"pen-
O filósofo supera o impasse mostran- " que seja possível a vida morai autônoma, sar por si me~mo".
o alemão Immanuel Kant (1724-1804) do quej além da ato de conhecimento, O 'li porém, é preciso partir do pressuposto da OmesBlo principio da conduta moral
construiu um dos maisimportantes sistemas indivíduo é'capaz .de outra atiyidàde es- " liberdade da vontade. vale para o saber; que também' deve ser um
filosóficosno séculoXVllI, de marcante in- piritual, o exercício da consciência moral, ~' .ato de liberdade. Nenhuma verdade vem
fluência na história do pensamento. por meio da qual rege a vida prática con- t Educação e liberdade de fora (não é transmitida, nem deve ser
A obra Sobre pedagogia resultou de anota- forme 'certos princípios. Estes princípios ;, imposta), mas é construída pelo sujeito.
çéiesdas aulas ministradas em alguns perío- são racionais, mas estabelecidos não pela 'i' A moral formal, constituída a partir do Coerente com o conceito de autono-
dos na Universidade de Kõnigsberg. Mas a razão especulativa (voltada para o conhe- postulado da liberdade e baseada na auto- , . mia do pensar' e do agir, Kant destaca a
importância atribuída por Kant à educação cimento científico), e sim pela razão prá- " nomia, exige a aprendizagem do controle liberdade de credo e valoriza a tolerância
encontra-se fundamentada nas obras mais tica, que orienta a ação humana, a Vida & do desejo pela disciplina, a fim de que a religiosa. Embora tenha sido educado sob
clássicas, Crítica da razão pura, na qual desen- prática e moral. ~;; pessoa atinja seu própriogo'Verno e seja ca- .severa disciplina pietista?, preocupa-se - à
volve a crítica do conhecimento, e Crítica da Analisando os prinápios da consciência :1 paz de autodetermina~o. semelhança de Rousseau - com os m"cos.
razão prática, em que analisa a moralidade. moral, Kant conclui que só o ser human6 ;':~
iih'
Podemos então perceber o elo entre os das s1.!Perstições:inculcadasdesde cedo nas
No livro em 'tJ.uetrata do conhecimento, é moral, por ser capaz de atos de vontade. '" pressupostos da filosofia kantiana e sUa crianças. A pessoa moralmente livre é um
Kant retoma o debate --mencionado no E ~ vontade é verdadeiramente. moral se .i concepção pedagógica. Cabe à educação, fim em si mesmo, e não meio para coisa
capítulo anterior - entre os racionalistas regida por imperativos categ6ricos, isto é, por ao desenvolver a faculdade da razão, for- alguma, para ninguém, nem mesmo para
(representados por Descartes) e os empiris- imposição incondicionada, absoluta, como ';,! mar o caráter moral: "O homem só pode Deus. Com essas afirmações, Kant mostra-
tas (Bacon e Locke).Ao examinar a insufici- .acontece quando' a ação realizada visa ao i? tornm--se homem pe1é\ educação, e ele é -se mais uma vez como representaI!te do
'ência das duas posições, elabora uma teoria dever pelo dever, e não ao dever em troca '"
:.j{.
tão-somente () que a educação fez dele". É Ihllni~Wº, ao b~~ .9s~fimdamentos 5ie
que investiga o valor dos nossos conheci- de um beneficio. Assim, não tem o mesmo < ela que lhe permite atingir seu objetivo ÍI1- uma educação laica, própria do pensamen-
mentos a partir da crítica das possibilidades valor moral dizer: "se você 'quer ser feliz, dividu.ale social. to burguês.
e limites da razão. ajude ao próximo", ou "não mate, senão À semelhança de Rousseau e Basedow, . Os princípios kantianos serão reexarni-
Condena os empiristas, segundo os quais você será' preso", porque são exemplos de dos quais sofreu influência, Kant destaca nados no século XX por .diversos autores
tudo o que conhecemos vem dos sentidos, imperativos hl.potéticos, nos quais o agir é con- ..
i! e não concorda com os racionalis~,para dicionado a uma vantagem desejada ou a 1Pietista: partirlári; do pi£lisma, movimento religioso originário da Igreja Luterana e conhecido pelo J'Ígor dos
j
os quais tudo o que pensamos vem de nós. urna puniçãD a ser evitada.. costumes e fé extremada. .
I

I
180 História da Educação e da Pedagogia .- Geral e Brasil Século das Luzes: o ideal liberal de educaç~o 181.

','"O.
do cariz laic09 do movimento iluminista- em em meio a ambiguidades e contradições, e
na área da moral e da educação, como Pia- com a elite intelectual européia. Com a
PortUgal. Já à partida, demarca-se o terri- muitas vezes a educação ministrada de fato
get, Kohlberg ou ainda Habermas. Esses atenção voltada para aspectos da medi .•
tório do discurso pedagógico, pontqando a desmentia as aspirações teóricas. Apesar dis-
teóricos seguiram rumos diferentes, mas cina social, escreveu Método para aprender e
diferença em relação à metodologia do en- so, álgumas ideias eram aos poucos incorpo-
utilizaram largamente os fecundos parâme- estudar a medicina e, na área da pedagogia, ~:
radas, alimentando sonhos de mudança. .
o sjno jesuítico que acentuava, desde o prin-
tros do filósofo alemão: . . elaborou Cartas sobre a educação da.mocidade. O Século das Luzes expressoú no pen-
cípio do aprendizado, o latim como lingua-
Ribeiro Sandies era cristão-novo (judeu " samento controvertido de Rousseau anseios'
gem fundadora. A proposta de Vemey, ao
4. A pedagogia el ' Portugal convertido) e criticou acerbamente a into~ que animariam as.reflexões pedag6gicas no
contrário, salienta o valor básico da ~amá-
lerâncÍa religiosa que impedia a prosperi- ,~, tica nacional: a língua de origem, como re- período subsequente. Atacando o .ideal de
Já vimos o que significou a reforma do dade de Portugal, bem como a atuação ferência de comunicação verbal, deve cons- pessoa "o em-educada" , de cortesão ou de
ensino em Portugal, sob a orientação Cio compacta da Companhia de Jesus, cujo tituir o princípio dos estudos da gramática. gentil-homem,' Roussea,u: propõe o desen-
pode~ copsiderava excessivo e pernicioso. Ao criticar os castigos corporais, os exercí- volvimento .livre e esponçâneo, re~eitando
marquês de Pombal. Trataremos agora de
Defendia o .ensino público, totalmente cios de memória e as práticas afetadas da a existência concreta clã: criança. "Deste
lembrar alguns teóricos que refletiram so-
administrado pelo Estado. conversação em latim, Verney aborda temas modo, a pedagogia. roiSsseaUniana foi a
bre os novos rUI]1osda ped~gogia. Não que
Luís Antonio Verney (1713-1792) era 'sa- relativos ao aprendizado da retórica, de suas primeira tentativa radical e apaixonada.
se dedicassem exclusivamente a essa temá-
regras e a questões de estilo como veículos de oposição fundamental à pedagogia da
tica, mas se ocupavam com a educação em cerdote formado em direito. Viveu na Itália,
privilegiados de expressão do diseurso"lO. essência e de criação de perspectivas para
decorrência do desejo de implantação das onde escreveu O verdadeiro método de estudar, na .
A esse propósito, Verney critica severamen- uma pedagogia da êxistência", é o que afir-
~d~ias ihuninistas nas novas gerações. Por língua materna e, para evit.ar.represálias, sob
te a estética barroca e teoriza sobre o neo-. ma Bogdan Suchodolski 11.
. 'serem -portugueses que passaram a morar pseudpnimo. A professora Carlota Boto. as- Veremos como as ideias de Rous~eau
clássico (ver leitura complementar 3)~
no exterior - geralmente devido a desa- s~ resume suas propostas: "Verney - como influenciaram as mais diferentes correntes,
. I Além da discussão de temas éticos, Ver~
venças e perseguições, sobretudo da Inqui- D. Luís da Cunha e .Ribeiro Sanches - irá sobretudo as tendências não-diretivas, no
I ney preconiza a educação da mulher, para
sição -, esses intelectuais eram conhecidos atentar para os grandes óbices colocados à século XX. .
que possa aprender bem a língua e ocupar-
I como estra:ngeirados. - . sociedade portuguesa pela ação da Compa-, . se com atividades que não sejam frív04ls. O pensamento de Kant também se in-
!
I
D. Luís da Cunha (1662-1740) viveu no . nhia de Jesus e pela tradição inquisitorial de ;, E ainda porque'as mães sempre são as pri- sere no movimento de critica à educação
tempo de D.João V, a quem serviu como di .•. intolerância religiosa. Sob tal perspectiva, meiras educadoràs. - dogmática, aberto pela ilustração. Embo-
ele sugere; secularização dos tribunais da In- Embora nem sempre essas ideias fossem ra não concebesse as normas e os modelos
plomata em várias capitais da Europa, como
conforme a própria existência concreta
I! Londres, Madri e Paris, sofrendo a influên-
cia das idéias iluministas. Comparando a
quisição pelo poder real; ampliação da defe-
sa dos réús; restrição da tortura; abolição .de
levadas a efeito na prática, muitas delas me~
receram a atenção do governo nas leis que e variável (mas de um sujeito universal),
nem por isso admite o modelo tradicional
estagnação de Pôrtugal com aqueles países autos-de-fe públicos; rejeição.da crença na esboçaram mudanças a serem cumpridas
de ideal, que se imporia exteriormente ao
em que a economia se desenVolvia, analisou possibilidade de pactos demoníacos. Verney . ao longo do século séguinte.
indivíduo .. Para ele são as leis inffexíveis e
suas causas em Testamento político, dedicado ao manifestará, sob tal aspecto, rútidas preocu-
Universais da razão pura e da razão prática
pações quanto à necessidade de re$trição da Condusão
prínêipe herC~ (que seria o futuro D.José que constroem o conhecimento e a lei mo-
1). Acusava a ação intolerante da Inquisição. fisca1ização eclesiástica a propósito da censu- ral, o que significa a valorização definitiva
Temos observado como as mudanças nas
que perseguia judeus e hereges, afastando ra de livros"8. . • do sujeito como ser autônomo e livre) para
relações entre os seres humanos - socíais,
indivíduos produtivos. Além disso, D. Luis Quanto à educação, ao sugerir a forma- o qual tanto o' conhecimento como a. con-
políticas, econômicas - exigem transfor-
considerava os protestantes mais avançados . ção de indivíduos para a pátria e para a re- mações da educação, em vista das diferentes duta são obras suas.
do que os conservadores católicos. ligião, continua Carlota Boto: "Essa conju- Por fim, as ideias pedagógicas dos "es-
metas a serem alcançadas. Desde o Rerias-
RiSeiro Sanches (1699-1783) era'mé- gação entre intentos civis e religio~os parece trangeirados:' levaram para Portugal os
cimento, lutava-se contra a visão de mun-
ser {•.•)atônica predominante da llustração sopros do iluminismo europeu, que deram
dica renomado que atuou na corte da do feudal, aristocrática e religiosa, à qual
portuguesa. Não se pode confundir, então, o substrato teórico para importantl;s refor-
Riíssià e em Paris conviveu com os ilumi- - se opunha a perspectiva burgue~a, liberal e
nistas. A convite de Diderot, participou -as seve~ críticas imputadas ao clero com leiga. Como vimos, esse movimento se fez
o
mas no ensino.
da Enciclopédia, além de se corresponder apressadas e impróprias inferências acerca
9 Cariz laico: aparência secularizada, não-religiosa.
10 ~numinisrno e educação em Portugal: o legado do século xvm'ao XIX", in Maria Stephanou e Maria He-
8"Ilurn1ci=0 e educação em Portugal: o legado do sêcu10xvm a~ XIX", u;, Maria Stephanou e Maria Hele-
l~na Cama.ra Bastos (orgs.),KlStária.r e numória.r da Miucaçãono Brasil, v.I: Siculos XVI-XVIII, p. 166.
na Camara Bastos (orgs.),Histúrias e memórias da ~ no BrasiL Petrópolis, Vozes, 2004, •• I: Sku1Ds m-XVI1l,
11 A pedagogia e as grrmdM CIJf1tTIÚSfilos6ficas. 3. ed. Lisboa, Livros Horizonte, 1984, p. 40.
p.165.
183
.História_daEduc~e da-P.~dagogia.' Geral e Brasil Século das Luzes: o ideallibe~al de educação
182
sensato"doque querer substituí-laspelasnos- sões estranh~ e, para impedirdes que surja
tria, ao resjleit'b às leis, uma instrução- sas;e seria o mesmo exigir que uma criança o mal, não vos apresseis em fazer o bem
Dllopes
que possa facilitar-lhe o progresso na . tiVessecinco pés de altura do que juízo aos porquanto este só o é quando a razão ~
1 - O que ~ o iluminismo? A saída do sua arte, mas ritinéit ürriâirisfiüçãõ ({de'., dez anos. Com efeito, que lhe adiantaria ter ilumina .. Encarai tddas as clilações como.
possibilite a direção dos negócios da' razão nessa idade? Ela é o freio da força, e a vantagens: gaiiliar muito, caminhar p'ara
homem da sua minoridade, da qual é
PáÍria e a administração do' governo .. criança não tem necessidade desse freio. o fim sem nada perder; deixai a infància
ele próprio o responsável. Minorida-
Em resumo, para ~er universal, a edu".;! amadurecer nas ériaI).ças.Alguma lição se
de, isto é, incapacidade de se servir do
cação pública deve ser tal, que todas 'Ponhamos como máxima incontestável faz necessária? Evitãidar-lha desde logo, se
seu entendimento sem a direção de ou-
as classes, todas as ordens do Estado' . .que os primeiros moVimentos da natureza puderdes adiá-la.sem perigo ..
trem, minoridadé da qual-é ele próprio
responsável, jâ que a sua causa reside dela participem, mas não uma educa- são sempre retos: não existe perversidade Outra consideração que confirma a uti-
ção em que todas as classes tenham a" original no coração humano. lidade deste método está no temperamento
nãe num defeito do entendimento, mas
'numa falta de decisão e de coragem de mesma parte. (Filangieri) ,. particular da criança, que é preciso conhe-
se servir dela sem a direção de outrem. A educação primeira deve portanto ser cer bem para saber. que regime moral lhe
"Sapere audeI" Tem a coragem de te 3 - (... ) em 24 de setembrO de 1770, puramente negativa. Ela consiste não em en- convém. Cada espírito tem sua forma pró-
_ servires do teu próprio entendimento. uni edital da Real Mesa Censória tor- 'sinar a virtude ou a verdade, mas em preser- pria, segundo' a qual precisa ser governado,
Eis _~a divisa do iluminismo. (Kar;t). na pública 'un\à listá de livros proibidós •• var o coração do vícioe o espírito-doerro. Se e o êxito depende de ser governado por essa
por conterem doutrina "ímpia, falsa, te~ ; , pudésseisconduzir vosso aluno são e'robusto forma e não por outra. Homem prudente,
,_:-.: até aidade de 12 anoS';-£emque:ele-soubesse: .- atentai'langamente' -para-oa, natureza;ob-
í 2--Aeducação.públicaexige,.para'ser. _ .merfuiar.bl~eroa, ..hetética,ciSmática,.-,'i . ~.-
I universal, cfue todos os indivíduos' da.' ._sedicfusa"ofénsiva':dapaz e sossego:pú- .: ,~; diStinguirsuamão direitade sua mãQ'esquer; . servai' cmdadosamente' vosso. aluno'..antes
sociedad~' participem. dela, ~ cada:- blico". Na longa lista figuram Hobbes, .i: - da, logo.às-vossasprimeiras-liçõesosolhosde. deJhe.dizerdes. a,primei~a palavra; deixai
um de acordo com as circunstâncias Diderot, Rousseau, Voltaire;..La. Fon- : _ l seu entendimento se-ãbririam para a razãó. antes de tudo que o germe de seu caráter se
e com O'seu destino.' Assim; o colono taine; Espinõsa etc~'De. todos oslivros.-'; . 1 Senl preconceitos,.sem. hábitos, .nada teria reveie em plenahberdade,.não exerçaisne-
deve se~instruído para ser colono, e recolhidos e condenados. mantlou o' ~- ele em si que pudesse contrariar o resultado nhumacoerção a funde-mcihor' vê-lo por
não para ser magistrado.' Assim, o ar- Ihâfquês de Pómbal-proceder a grandes' -c -~. de vossoscuidados. Logo ele se tornaria, em inteiro. Pensais que esseperíodo de liberda-
tesão deve receber na inf'anciaUína fogueiras no Terreiro do Paço e na Pra- vossasmãos, o mais sensato dos homens; e de seja perdido para ele; Ao contrário, será
instrução que possa afastá-lo do vício' ça do Pclourinho, em Lisboa. (Rómulo começando por nada fazer teríeis feito um o mais bem emptegado, pois assim é que
e conduzi-lo à virtude, ao amor à P~- Carvalho) prodígio de educação. aprendereis a não perder'um só momento
Fazei o contrário do uso e fareis quase de tão pre.ciosa fase. An passo que se co-o
sempre bem. Como não se quer fazer de meçardes a agir antes de saber como, 1igi-

• Leituras complementares . que reúnem ao redor da criança para de.


, . uma criança uma criança e sim um doutor, . reis ao ácaso; expondo-vos a engano, sereis
pais e mestres nunca acham cedo demais obrigado a voltar atrás; estareis mais afasta-
fendê-la contra a dor, até que,já crescida,;, para ralhar, corrigir, repreender, lisonjear, do da_-tIletado que se tivésseis tido menos
o [A educação de Emílio] continue à mercê deles, sem coragem e sem~, ameaçar, prometer, instruir, apclar para a pressa em: atingi-la. Não façais portanto
. .
Toda a nossa sabedoria consiste em pre-
experiência, que se acredite morrer ,à pri- X.
meira picada e desmaie vendo sua primeira
razão. Fazei melhor: sede sensatos e não ra-
ciocineis com vosso aluno, p~cipalmente
como o avarento, que perde muito porrt.ão
querer perder nada. Sacrificai na primeira
conceitos serviS;todos os noss.osusos não são gota de sangue? f para fazerdes que aprove o que lhe desa- inf'ancia um tempo que recuperareis com
. senão sujeição, embaraço e constrangimen- • grada, pois meter sempre .a razão nas coisas juros em idade mais avançada. O médico
.- to. G homem civil nascei-vi~e e morre na A natureza quer que as crianças sejam '~ desagradáveis é tornar-lha aborrecida, é sábio não receita às to~tas à primeirf- vista,
escravidão; ao nascer, envolvem-no em tun crianças antes de ser homens. Se quisermos .:. desacreditá-la desde cedo num espírito que estuda primeiramente o temperamento do
.cueiro; ao morrer, encerram,'..iOem um cai- perturbar essa ordem, produziremos'frutos t, ainda não está em estado de compreendê- doente antes de prescrever; começa a tra-
xão; enquanto conserva sua figura humana precoces, que não terão maturação nem j; la. Exercitai seu corpo, seus órgãos, seus tá-lo tarde mas o cura, enquahto o médico
está acorrentado a nossasinstituições. sabor e não tardarão em corromper-sej .~ sentidos, suas forças, mas deixai sua alma demasiado apressado o mata.
Sorrei é a primeiia coisa qUe'deve apren- teremos jovens doutores e crianças velhas. 'c, ociosa enquanto for possível. Temei todos Mas onde poremos essa criança para
der e a que terá mais necessidade de Saber. A infància tem maneÍra$ de ver, de pensar, ., os sentimentos anteriores ao julgamento educá-la assim como ser insensível, como
(... ) Que dizer desse amontoado de coisas de sentir que lhe são próprias; nada menos'~ que os aprecia. Detende, sustai as impres- um autômato? Na 'lua, numa ilha deserta?
.,
.- -1-84,----- -_ História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil ~éculo das luzes: o ideal liberal de educação 185
- -, A matéria do estilo humilde não pede ele-
Afastada de todos os humanos? Não terá As máximas são deduzidas do próprio termo próprio, que exprima o que se quer,
ho~em. Deve-se procurar desde oedo in- o qual nem sempre se acha, ou, ao menos, vação de figuras etc., mas nem por isso se
ela continuamente no mundo o espetáculo,
, . e o exemplo das paixões alheias? Não verá culcar nas crianças, mediante a cultura mo- não sem dificuldade, e sempre se quer per- . deve exprimir com aquelas toscas palavras
feita inteligência da língua para o executar. de que usa o povo ignorante. Não é o mes-.
nunca outras crianças de sua idade? Não ral; a idéia do que é bom ou mal. Se se quer. '"
, Além disto, as figuras encailtam o leitor e mo ~stilo baixo que estilo simples. O estilo
verá seus pais, seus vizinhos, sua ama, sua funda'r a moralidade, não se deve purlli. A o"
governanta, seu criado, seu mestre, mesmo moralidade é algo tão santo e' sublime que e
impedem-lhe penetrar -descobriros vícios baixo são modos de falar dos ignorantes e
pouco cultos; o estilo simples,é modo de,
que, afinal, não será um anjo? não se deve.rebaixá-la, nem igualá-la à dis'- que se cobrem com tão ricos vestidos.Não
falar natural e sem ornanlentos, mas, com
Essa objeção é séria e sólida. Mas vos ciplina. O primeiro esforço da cultura mo- assll? no estilo simples, o qual, como não
palavras próprias e putas. Pode um pensa-
terei dito porventura que uma educação ral é lançar os fundamentos da formação ,'(. 'faz pompa de ornamentos, deixa considerar
mento ter estilosublirn~, e não 'ser pensa-
natural fosse uma empresa fácil? Ó ho- do caráter. O caráter consiste no hábito de . miudamente os pensamentos do .escritor.. :
mento-sublime; e pode'àcliar-se um pensa-
mens, será culpa minha se tornastes difícil agir segundo certas.máximas. Estas são, a ~, Isto que digo das expressões comuns e
mento sublime, com esiílo simples.
tudo que é certo? Sinto tais dificuldades, prinópio, as da escola e, mais tarde, as da naturais
'~ 1

deve-se entender com proporção.


confesso: talvez sejam insuperáveis, mas Não quero dizer que um' homem civil fale Luís Antonio Yerney,'O virdadeiro método d, Mlrufar,
humairidade. A princípio, a criança obedec
o fato é que,' procurando aplicadamente como a plebe, ~ que fale naturalmente. carta VI.
ee a leis. Até as máximas são leis, mas sub-
preveni-las, até certo ponto as prevenimos. jetivas, elas derivam da própria inteligência\~;
Mostro a meta. que é preciso atingir, não do homem. '~:.
digo que se possa consegui-lo; mas digo ' .
que quem dela mais se aproximar terá tido Immanue1 ,Kant, Solm a p~rb.gr;gia.Piracicaba, .Ativi~cc1JoG 7. Esçlareça: embora os enciclopedis- .
, o maior êxito. Unimep, 1999, p. aO,e aI. .'
tas Voltaire e Diderot tivessem ideais
I

Q}lestões gerais sem~Ihantes, divergiam sobre a:univer-


!
Jean-Jacques Rousseau, Em{/io ou do. du£açÕ/J. São @) rEstil~ simples] salidade do ensino.
Paulo, Difel, 19Ga,p. 17,59,75, 7a, ao e 81. . 1• Analiseque transformaçõespolíticase
Ao estilo sublime contrapomos o estilo econômIcas oco~eram no séculoXVTII 8. Estabeleça as relações de coerência
<9 [A cultura moral] simples ou humilde. Assim como as coisas .,. e definiram d poder da burguesia. que existem entre as ideias políticas e
grandes devem explicar-se magnificamen- pedagógicas de Rousseau.
A cultura moral deve-se fundar sobre te, assim'o que é humilde deve-sedizer com 2. Que características da e~ucação
máximas, não sobre a disciplinal2• Esta im- estilo mui simples e modo de exprimir.mui do século XVIII são as mesmas do 9. Relacione 'os conceitos de educa-
pede os defeitos; aquelas formam a maneira natural. As expressões do estilo simples são século anterior e quais as principais ção natural e educação negativa em
de pensar. É preciso proceder de tal modo tiradas dos modos mais comuns de falara inovações? . Rousseau. '
que a criança se acostume a agir segundo língua; e isto não se pode fazer sem perfeito .'
máximas, e não segundo certos motivos. A conhecUnento da dita língua. Esta é, segun- ',.;, 3". Relac,'Jne iluminismo, burguesia e 'lO. Analise a concepção petiagógica
disciplina não gera senão um hábito, que do os mestres da arte, a grande cli'ficuldade educação. de Ro1'.tsse.aucomo UIIÍ."'marcona his-
desaparece com os anos. É necessário que a do estilo simples: Fácil coisa é a um homem " tória da ~ti~ção. Discuta também
criança aprenda a-agir segundo certas ma- de alguma literatura ornar o discurso com 4. Quais foram as principais conquis- quais são as ressonâncias atLujisdesse
ximas, cuja equidade da própriâ diStingã. figuras; antes todos propendemos para isso, tas da educação alemã?
pensamerito.
Vê-se. facilmente que é dificil desenvolver _não só porque o discurso se encurta, mas
. tal coisa nas criatlças, e que por isso a cultu- , porque, talvez nos explicamos melhor com 5. Analise as semelhanças e ,diferenças
11. "(...) considerai primeiramente
das iniciativas sobre a educação dos_di-
ramontirequermuitosconhecUnentos;por uma figura do que com muitas palavras.
, versos países com relação <í -Portugal.
, que, querendo fumar Um.homem da
parte dos pais e mestres. Pelo contrário, para nos explicarmos natu-, natureia, nem por isso se trata de fazer
( ...) Explique em que medida as diferença~
~mente e sem figura, é necessário buscar o dele um selvagem, de jogá-le no fundo
se devem ao sistema político em vigor.
da floresta; mas que, entregue ao turbi-
" Para Kant, a disciplina Uéo que impede ao homem de desviai--sedo seu destino, de desviar-se da humanidade, 6. Relacione o Meloped:i.sma francêse sua - lhão social, basta que não se deixe ar-
•através das suas inclinações animais. (... ) Mas a disciplina é puramente negativa, porque é o a:atamento através influência nas concepções pedagógicas. rastar pelas paixões nem ~das opiniões
do qual se tira do homem a sua selvageria; a instrução, pelo contrário, é a parte positiva da educaçãcr". (Sob~ a •
pedagagill, p. 12.)

Século das Luzes: o iáealliberal de ~qu.c_a


__çã_o__ 187
186 História da Educação e da P~dagogia - Geral e Brasil
dos homens; que veja com seus olhos, 16. 'C~ b~e n,? dropes 4, explique qom .base no texto de Verney, res- 8. Embora' o uso do ornanlento,
que sinta com seu coração; que nenhu- quais eram as contradições da llUStra- ponda às questões a seguir. das figurás, não precise ser despre-
ma autoridade õ governe a não ser sua ção em países em"quepersistia o despo- zado, o seu abuso pode indicar pala-
própria razão." A partir dessa citação tismo esclarecido,' 6. Identifiqué no texto. a crítica que vreado vazio.' Discuta cqm seu grupo
de Rousseau, responda sob que aspec- Verney faz ao ensino vigente em seu corria muitos alunos têm dificuldade
to esse filósofo se' revela um pensador 17. O dualismo escolar ~ste até hcije i,
tempo. de esclarecer os.conceitos, Cj,uandci
iluminista e como já expressa também na educação. Discutá com seu grupo se restrigem 'ap'enas aos exemplos
uma crítica ao racionalismo das Luzes. sobre medidas possíveispara superá-lo.
.7. Qual é a diferença que ele estabele- concretos. Nesse. caso, qual seria a
Discuta como essa concepção repercute ce entre estilo simples e estilo baixo? Hoje função do professor?
em dia ainda podemos fazer essa distin-
na sua pedagogia. {bustões'sobre as leituras '
ção~Justifique.
complementares
12. Em que sentido o pensamento de
Kant vincula-se aos ideais iluministas, Com base 'na leitura complemen-
tanto do ponto de vista do conhecimen- tar de Rousseau, responda às seguintes
to como da vida moral?
•. questões.
P A R T E 11
13. Â partir do que vimos sobreKant, 1. Qual é o argum'ento de Rciusseau.
responda à questão,por de mesmo for-
mulada: "Um dos' maiores problemas
contra a ideia da crÍança como adulto
,em miniatura?
o Br-asil na erapombalina
da educação é o seguinte: de que modo
~
.
, unir a submissão sob uma coerção le- Contexto ,histórico
.. ! 2. Identifique os !U"gUIIlentos
que justi- .
gal com a faculdade de se servir de sua, ficam atribuir-se a Rousseau a realiza- Algumas datas do
liberdade? Pois a coerção é necessária! ção de Uma revOhiçao copernicana na No sécnloXVllI, a Europa enfrentava a século XVIII
Mas como posso eu culti~ a liberdade educação. ' :r. crisedo Antigo Regime. Ao absolutismoe ao

sob a coerção?" mercantilismoopUIiham-seos ideaisliberais, • Final do século XVII e meados
Considerando o texto de Kant,.res- que culminariam nas revoluções burguesas. do XVIII - produção aurífera nas
14.
Com base no dropes 1, responda.
panda às questões a seguir, A' Inglaterra, antecipando essas alterações'
às questões: . Minas Gerais.
políticas e econômicas, surgiu como grande • 1720 - em Vila Rica, repres-
a) Por que o ser humano é responsá-
3..Explique com suas ~alavras qual é a potência transformadora da economia euro- são da revolta çleFilipe dos Santos.
vel por sua minoridade?
diferença que o filósofoestabelece entre peia ao iniciar o capitalismo industrial. , " --: 1747 - destruição de uma ofi-
b) Que transformação esse racioá-
"disciplina" e "máxima", Portugàl, que tivera até. então .um po- cina-tipográfica no Rio .deJaneiro.
nio trouxe para a educaçãof •
derio advindo das colônias de além-mar, .! 1759- ..expulsão dos jesuítas
4. Segundo o autor, a disciplina petmi~ achava-se em franco declínio e se subme- d;Ç:Portugale Brasil, por Pombal.
15: Com base no dropes 3, responda
te a punição, mas na cultura moral'da tia a tratados comerciais lesivos para si e • 1772 - implantaÇão do ensino
às questões:
não deve ser usada. Explique por quê, para.a colônia, em troca de proteção da '~ público oficiaL ,
. a) Embora Filangieri se refira ao
Voéê eoncordacom o autor? JuStifique.' Inglaterra. _Q-';£'ratac:!cu!e_~eth_uen, por _ • 1776 - Independência dos Es-
ideal da edu.cação.pública e univer-
sat, identifique as severas restrições • exemplo, obrigava os portugueses a com- tados Unidos, da América ..
que são por ele int,arpostas à sua im- , 5. Forme um grupo de trabalho para . prar a produção dos lanificios ingleses, o • 1785 -proibição de qualquer
plantação. ' discutir sobre o ensino de valores m9- atividade manufatureira no Brasil.
que impedia o desenvolvimento de sua in-
b) Como poderiamos analisar o rais na escola: quais os riscos e quais as • 1789 - Revolução Francesa.
dústria manufatureira e também afetava a
caráter elitista do pensamento do possibilidades. • 1789 - Conjuração Mineira.
colônia:;porqué as riquezas naturais daqui
autor? • 1798 - Conjuração Baiana.
eram levadas à Inglaterra, para pagam.en-
to de dívidás.•

~_S.éc!Jlo das Luz;S: o ideal liberal d~ educaç~~ _ 189


188 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil
Sem acompanhar as tréUl5formações agrária, tornando compreensível a eclosão. auge ocorreu na primeira D').etadedo século versidades na colônia bem como impunha
das forças produtivas na Europa, Portugai, cultural na sociedade das. Crtrais, que nos X-vrn. Nesse período também recrudesce- 'outras medidas cerceadoras de nossa eman-
como vimos na primeira parte, tentava.Sl,l- . legou o barroco das igrejas, a música sacra,. ram as dissidências entre Portugal e EsPa- cipação intelectual. Em 1747, per exe~o,
perar o atraso pelo fortalecimento do Esta- ospoetas da Arcádia Mineira. ••... nh~ sobre as fronteiras das Sete Missões,na foi destruída uma oficinatipográfica instala- .
. do, expresso no despotismo esclarecido do Quando a extração do ouro se retraiu 2 região do Prata, permeada pelas "guerras da'por um padre jesuíta no Rio deJarreiro.• '
rei D. José r. q gestor dessa reorganização sensivelmente, aumentou a opressão do rei- •. guaraníticas". Após a expulsão dos jesuítas, os bens
administrativa e econômica foi o primeiro- no, o que provocou a temível "derrama"" ". Ao mesmo tempo, crescia a animosidade dos padres foram confiscados, muitos li-
-ministro marquês de Pombal, que procu~ :~ ;',

forma de cobrança de impostos instituída contra a Companhia de Jesus. O governo vros e manuscritos importantes destruídos.
rou modernizar o reino a fim de manter o por Pombal, pela qual, sob proteção de temia o seu poder econômico e político, Segundo alguns historiadores, de .início o
absolutismo real. Nesse sentido, combatia tropas, se exigia que a arrecadação de uma exercido maciçamente sobre todas as ca- desmantelamento da eStrutura educacional
toda forma de oposição. cidade atingisse um mínimo estabelecido. :.~ madas sociais ao modelar-lhes a consciên- montad~ pela Companhia 'deJesUs foi pre-
E no Brasil, o que estava ocorrendo? As Esse procedimento arbitrário e violento ~ cia e o comportamento. Ainda mais, desde judicial, porque, de imediato, não se substi-
plantações de cana-de-açúcar d~ Nordeste criou um ambiente de tensão, ampliad().~, os tempos de Nóbrega, a Coroa se compro- tuí\! o ensino regular,por outra organização
sofreram rude golpe com a concotrên~ia pelo desagrado com diversas outras medi. metera a destinar-lhe uma taxa especial de . escolar, enquanto. os índios, entregues à sua
estrangeira, Porém, com a descoberta das das, como a criação das companhias para 10% da arrecadação dos impostos, além da própria sorte, abandonaram as missões.
minas, de ouro, o centro econômico deslo- controlar o monopólio do comércio e a proi-
~".
doação de terras. A ÇJompanhiatomara-se Várias me~das antecederam as prim~i-
Cou-se para o sul de Minas Gerais e região bição de qualquer atividade manufatureira " então muito rica, com. todos esses benefI- ras providências mais efetivas, levadas a
Sul. O período de produçãtl âurífera esten- no Brasil (alvará de 17'85, de D. Maria I, a
o .;~:

cios, sem contar a produção agrária ?as efeito só a partir de 1772, quando teria,sido
deu-se.do final do século xvn até meados Louca). Outro fator de descontentamento missões,altamente lucrativa. implantado o ensino público oficial. A Coroa
do século xvm. . era a crescente centralização político-ad- ", Entre as muitas *gações' políticas às nomeou professores, estabeleceu planos de
Enquanto predominava a cultura ca-
n<rvieira, a estrutura social se baseava na
ministrativa, que distanciava ainda mais a intromissões dos jesuítas, Pombal atribuiu e
estudo inspeção e modificou o curso de
colônia da metrópole. à Companhia o interesse de formar 'um humanidades, típico do ensino jesuítico,
classe dominante dos senhores de engenho, .Não por acaso, também os movimentos' "império temponil cristão" na região das para o sistema de aulas régias de disciplinas
cujo poder se fundava na propriedade da contra a opressão colbnial se manifestaram missões, referindo-se à resistência indígena isoladas, como ocorrera na metrópole. Para .
• terra e na exploração agrícola por meio na região. Em 1720, em Vua Rica, a revolta dos Sete Povosdiante da determinaçao de o pagamento dos professores, o governo ins-
j
de trabalho escravo. Com a mineração, de Filipe dos Santos foi reprimida de forma transferir seus núcleos. tituíu'o "subsídio literário", a fim de gerar
"
surgiu' ump. organização social diferente. violenta, e em 1789 a Conjuração Minei- Quando foi decretada a eXpulsãodosje- recursos que "nem sempre foram aplicados
O processo de urbanização provocou o au- ra não reivindicava' apenas reformas, mas suítas,em 1759, só na colônia a Companhia .na manutenção das aulas", segt!11doSérgio
mento da população nas cidaaes13, dando . contestava o pacto colonial, embora não tinha "25 residências, 36 missões e 17 colé.• Buarque de Holanda.
início a uma pequena burguesia, dedicada conseguísse impor a nova ordem. Seme- gios.e seminários, sem contar os seminários As vantagens proclamadas pelo ensino
. !
ao comércio interno. A administração mais lhantemente, foi sufocado um movirnento menores e as escolas de ler e escrever,insta- .reformado decorriam <da intenção de ofe- .
complexa da cidade exigia a expansão dos mais radical ainda, a Conjuração Baiana, ladas em quase todas as aldeias e povoações recer aulas de lírlguas.modernas, como o
" quadros do seto~ terciárjo ~ojas, armazéns, em 1798. " onde existiam casas da Companhia"l •. francês, além de desenho, aritmética, geo-
hospedarias etc.).
metria, ciências naturais, no espírito dos
Novos ventos sopravam .na éidade, reu- Educação 2. A r~forma pombalina n~ Brasil novos tempos e contra o dogmatismo da
nindo gente de toda parte, desejosa de enri- tradição jesuítica.
quecimento. Notava-se mesmo certa mobi- 1. As aldeias missioneiras Além de sua atuação nas missões, os je-' De acordo com a historiografia tradicio-
lidade social, ou pelo menos uma estrutura. suítas tiveram' influência na educação dos nal, o marguês de Pombal não conseguira
"movediça", como-diz Sérgio Buarque de No. capítulo anterior, vimos como foi filhos dos colonos, cujo foco estava vqltado de imediato introduzir as inovações de sua
Holan~a: Valores mais flexívéis opunham~ a atuação dos jesuítas durante os séculos para o ensino médio, já que o governo de teforma no Brasil, após ter desmantelado a
-se- à ngIdez dos padrões da aristocracià XVI e XVII, sobretudo nas missões, cujo Portugal não permitia a criação de uni- estrutura jesuítica, o que teria provocado o .

l! '~p?pulação da co1ô,nia,do início para o fim qo século XVIII [passou] de 300.000 habitantes para 3.300.000,
na maJ.or parte concentrados nos altiplanos das Gerais". (Nelson Werneck Sodré, Síntert dt lzisi6ria tia cuUwrtbra- H Fernando de Azevedo, A cultura brasileira: introdução ao estudo da cultura no Brasil. 4. ed. 'rev,e amploBrasília,
sileira. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1970, p. 21.)
Ed. UnB, 1963, p. 539.
190,
História da Eooc-ação e da Pedal!jogia - Geral e Brasil Século das luz~s: o ideal liberal de educação 191
-------- _.- --

._---.... "-"--..- ~._~~. '!": __ .'... __ .•••.- y~"


retrocesso de to'ao o sistema educacional A expansão 'das ideias iluministas tam- 3. Ensino profissionalizante Persistia o panorama do analfabetismo e
brasileiro. Ess:'. interpretação pessimista bé.m se exerceu pelas lojas maçônicas 16 e
do, ensino precário, retrito a poucos, uma .
prevaleceu ao ser divulgada na importan- pelas academias literárias, inúmeras delas VilllOS no capítulo anterior (segunda vez que a atuação mais eficaz dos jesuítas
te obra de Fernando de Azevedo (A cultura espalhadas na colônia. Por fim, muitos parte, item 4, r.I. aprendizagl!fT! de ojlcios) que se fez sobre a burgUesia e na formaçãôda,s
brasileira), na qual ele afirma que "a ação desses intel«ctuais conhecedores de biblio- a mentalidade escravocrata depreciava a classes diligentes, além da tarefa dos q:íis-
reconstrutora ,de Pombal não atingiu se- grafia atualizada foram professores das au- atividade manual, considerada "trabalho sionários entre os índios. Umà sociedade
não de raspão a vida escolar da colônia" las régias, sobretudo de disciplinas como desqualificado", e qúe 1)S artesãos não eram exclusivamente agrária,' que não' exigia es~'
e que, após a expulsão dos jesuítas, te- . ciência muderna, filosofia, matemática, preparados em escolas; mas sim pela edu- pecialização e em que o trabalho manual
ria haviçlo "meio século de decadência e retórica. . cação informal.
transição". estava a cargo de escravos, permitiu a for-
Os estudos mais recentes, porém, des-
Já no final do século XVIII, em 1798, o Na primeira metade do século xvrll,
a mação de uma' elite intelectual cujo saber
bispo Azeredo Coutinho abriu o Seminário Companhia de Jesus dispunha ge algumas
cobriram na colônia um movimento mais universal e abstrato voltava-se mais para o
de Olinda, em Pernambuco, sob a inspi- oficinas em que mestres jesuítas, .muitos de-
rico, .embebido com as ideias iluministas. bacharelismo, a burocracia e as'profissões
ração das ideias iluministas que absorvera les vindo do exterior, ensinavam os oficios
As ideias ~'afrancesadas" que já circulavam liberáis. Resultou daí um ensino.predomi-
como aluno da Universidade de Coimbra. mais necessários. Depois, com o desenvol-
em Portugal por meio das publicações dos Nesse Seminário, destinado à formação de nantemente clássico, por valo.rizar a litera-
vimento da economia e a intensificação da
intelectuais "estrangeirados" também tive- padres e educadores, deu-se destaque ao tura e a retórica e desprezar as Ciências e a:
urbanização, aumentou a demanda de ar-
ram sua divulgação no Brasil. Não só pela ensino das ciências, das ünguas vivas e da . atividade manual. Durante esse longo pe-
tesãos (ver dropes 5). VáriaS lojas de oficios
atuação dos formados pela Universidade literatura".m.oderria. Cuidou-se também de ríodo do Brasil colônia, aumentou o fosso

.
- ,
,I

i
de Coimbra, mas: pela difusão entre nós de
obras iluministas, aquelas' recomendadas
uma nova metodologia de ensino, distinta
daquela tradicional baseada em castigos fi~
foram criadas - no final da século XVIll
• havia 631 delas -, seguilldo.o mesmo SÍste-
. ma de. corporações ~tente na.metrópole.
entre o.s letrlidos e a maio.riada população
analfabeta.
por Pombal e também as que foram por ele sicos e na memorização. ESsa tradição de três séculos acentuou o
. Ou seja, os mestres registravam os aprendi-.
condenadas. É interessante lembrar que não podemos gosto pelo "anel de doutor", a pose e o dis-
-zes, que, depois de quatro anos ou m~is, re-
Conforme a descrição da professofil Ma- imaginar al~õs assistindo a aulas em pré- curso empolado. Diz Gilberto Freyre: "Daí
cebíam o certificado de oficiais, após exame
ria Lucia Spedo Hilsdorf, "mesmo sem im- dios escolares, como hoje, porque os luga- a tendência' para a oratória, que ficou no
devidamente supervisionadol7•
prensa na colônia, as ideias circulavam em res de estudo eram improvisados (ver leitu- brasileiro, perturbando-o tanto no esforço
panfletos e cópias manuscritas, em cader- ra completar da segunda parte do próximo de pensar como no de analisar as coisas.
Conclusão
nos de notas, em textos embarcados clan- capítulo). Além da educação doméstica, em Mesmo ocupando-se de assuntos que pe-
.destinameÍlte e vendidos com muita rapidez que os mais abastados pagavam precepto- No século xvm, permanecia grande o çam' ~ maior sobriedade verbal, ~.precisão
para os interessados. (... ) Roberto Ventura res para seus filhos, reuniam-se' as crianças 'de preferência ao efeito literário, o tom de
contraste entre a Europa e o Brasil. Ape:
confirma que a circulação das ideias 'afran- nas igrejas, em salas das 'prefeituras e de lo- conversa .em vez do discurso! a maior pu-
sar das grandes transformações no Velhõ
ÇesCl;das'ultrapassava o âmbito das elites jas maçônicas ou na casa dos professores, . re~a possível de obje~vidade'.1) br~ileiro
Mundo - sociais (ascensão da burguesia),
esclarecidas, pois foram encontrados ca- que podiam ser nomeados pelo governo ou .inSensivelmente levanta a voz e arredonda
econômicas (liberalismo) e poüticas (revolu-
dernos com cópias manuscritas de autores contratados por partiCulares. ções para destituir os reis absolutistas) -, a frase.'Efeito de muito latim de frade; de
franceses proibidos, como Rousseau, entre Ainda mais, outras ordens religiosas o Brasil continJ;liiva com a sua aristocracia muita retórica de padre"IB.
os participantes da Inconfidência Baiana de continuaram atentas à educação, tais agrária' escravista, a economia agroexpor- Embora a reforma pombalina não tivesse
1798, a chamada 'Conjuraçã~ dos Alfaia- como carmelitas, beneditinos e francisca- tadora dependente e submetido à política repercutido de imediato na colônia, foram
tes', que teve grande embasamento e parti- nos, estes últimos bem informadÇls sobre colonial de opressão. lançadas as sementes de um nqvo processo
~pação das cama$ias populares" 15. as ideias iluministas. AS consequênciaS para é\ cultura e a edu- que iria amadurecer aos poucos a partir do
cação. são previsíVeis e já foram arialisadas. século seguinte. .

15 HIStória da educa;iúl brasileira: leituras. São Paulo, Pioneira Thomson 1earning, 2005, p, 31.
16 A Maçonaria é um' tipo de sociedade secreta, cujo ingresso depende de rituais iniciáticos. Desemp~ou
importante papel no século XVIII, com a divulgação das ideias iluministas que culminaram com as revoluções
._' -. • burguesas, embora os próprios maçons fossem de certa manei1a conservac!ores.Existe ainda hoje, com o obje-
tivo principal de de~envolvera fratcrnidade e a filantropia.
17

15
Consultar Silvia Maria Manfredi, Educação frrofissiónalna Brasil. São Paulo,Cortez, 2062. p. 70.
Sobrndos e mocambos. São Paulo, Nacional, 1936, p. 269. '-.
-19-2 História da Êducação. e da Pedagogia - Geral e BrAsil Século. das Luzes: o ideal Jiberal de educação 193.
. :

a Maraia de I>irceu, de Tomás Antônio cias de observação e pelos conhecimen- , prestação de serviços aos funcionários
tos sobre a natureza, que, aperfeiçoados do Estado, comerciantes e seus empre~ .
Gonzaga, (Nelson Werneck.S()dr~) -.",',:"1"(
ern"Viagens'deestudos pelos principais gades. (... ) Instalaram.se olarias, caiei.'
..),'
, • Por iniciativa da Academia dos ras paia a fabricação de cal a partir das ;
'

centros científicosda Europa, lhe permi-


Seletos e de seu presidente, umjesuíta,
3 • No Brasil as ideias "afrartc~âdaS" ". ostras de sambaqUis,'cerâmicas para ;r
tiram tornar-se um grande óllnerálogista
chegam com os alunos que estudavam: "
o padre Francisco de Faria, fundou-se e um'dos mais cuItós brasileiros de seu fabricaçãó de ladrilho~ e,.artefatos do-
fora da colônia. Com seus estudos cim- "
no Rio de Janeiro, no século xvnr, a de
tempo. (Femandó A:z:evedo) mésticos (moringas e louças), curturnes
tíficosmodernos pós-reforma, Coimbra:"
primeira oficina tipográfica, destruí- e oficinas para ~:fabri~ção dos mais
era a universidade mais procurada, pC:" .'.'
da mais tarde por ordem do governo
dendo ser cónSidérada 'cómo uma ver;
5 '.- A intensificação das atividades diferentes produtos necessáricisàs ativi-
portugUês (Carta Régia de 6 de julho econÔmicas, o crescimento das vilas e . dades de cultivo, da ~Íleração, trans-
dadeirâ.matriz'de toda tirtla geração de "
de 1747), que "mandóu sequestrar e núcleos urbanos, ao longo do litoral, porte,.comércio, cons1:rctçãode eclificios
intelectuais e cientistas que iniciaram ó i
remeter para Portugal as letras de im- e á necessidade de defesa da colônia rurais e urbanos, e artefatos para a vida
cultivo das ciências natUrais e exatas:';;
prensa, proibindo que se imprimissem fizeram aumentar a importância, nas cotidiana nas fazendas e'cidades. (Luiz
O historiador R. Maxwell diz que nos'.;
livros, obras ou papéis avulsos e comi- cic41des",da burocracia do Estado (a Antônio Cunha) .'
iletivos dd? 86 e 17.87forammiL..;
à:iJ.ds
nando a pena de prisão para o reino". administração, o EKército, a Justiça).
triculados nos cursos de 'Coimbi'a,tes-' ;,.
(Fernando de Azevedo) Gerou-se, assim,uma noVademanda de
pectivamente, 27 e 19brasileirbs, sendo : 19 Torêutica: arte de cinzw.;. metais, marfim ou
artesãos de todos os tipos para a cons.. madeira. O cinzel é um instrumentodec~~tal
2 ••& artes plásticas conseguem, nas 12 e dez mineiros, o que exíJlicaparii f' trução, reparação de equiparpentos e com uma das extremidades cortante.
ele b envolvimento de Minas nalnconfi.:
Minas Gerais em particular, por essa
dência de 1789~94.E por que hávia essa
época [século XVllI], pela priroeira
grande porcentagem de mineiros indo
vez, algo especificamente nosso, reno-
estudár na Cóimbcirefonnada? Pro- o Leitura complementar finais do século XVI, para que os tutores
vando velhos modelos metropolitanos,
vavelmeJ;).te porque, entre 1699 e 1750, ;
o
fizessem as meninas aprender a costurar
de influência jesuítica quase todos,ge-
com a produçã()do~'oüiô;:Miíi~àpré~!t' . e outras prend~ domésticas e os meninos
rando uma' arte com traços originais, [A educação da mulher]
, senta outra composição social, com- ' a ler, escrever e contar. Pela análise dos
como .0 barroco brasileiro ..
Nas Minas Gerais, precisamente plexa, com bastante mobilidade, éom Desde o início da colonização, a educa- testamentos femininos se observa que a
atividades econômican:1iversificadas e ção formal destinava-se apenas aos meni. quase totalidade das mulheres da Capita-
quando a mineração declina, surgem a
w.:banizadas e' maior riqueza..cultural;' nos e, mesmo esses, nem sempre recebiam nia de São Vicente, depois Capitania de
torêutica , a escultura e a arquitetura
l9
não é' patricarcal. como a "sociedade os cuidados de um mestre. Pode afirmar-se São Paulo, eram incapazes de assinar seu
religiosa, que fixaI-ão os nomes de ,al-
do açúcar" nem sofreu a influência da.: que a instrução e a leitura constituíram o 'nome, o que não sigb1fica que elas não
guns artistas excepcionais, todo~ el~'de
presença dos jesuítas ou ~útras ordenS quinhão de uma mino~ de crianças e jo- solibesliem ler algumas frases, pojs leitura
origem. populax; particularmente dois:
Valentim da Fonseea e Silva- o grande religiosasnos séculos XVI e XVII. vens. Desde o século XVI, os colégios dos e escrita não possuíam::a mesma dificulda-
.Mas outros centros de e~cio das jesuítas visavam d()is objetivos principais: de de aprendizagem.
Mestre Valentim -, desenhista e enta-
modernas ciências náturais em~dicas' Escapavam a esta situação de analfabe-
lhador; e AntôniõFraiJ.cisco Lisboa - o ensinar a ler e escrever aos pequenos índios
- Como Edimourgo, PariS e M6nt- isoladosde suas famílias e arrancados à cul- tismo as menjnas que eram enviadas, muito
Aleijadinho -, artista plástico de méri-
peIlier~ eram também mUitoprocur'a- " .jovens, para os conventos. de Portugal ou
to mconfundível. E é ain:danas.Minas tura indígena; e formar os quadros para a
dos. (Maria Lucia SpedoFIilsdôrt) ";,'~, das ilhas atlânticas. .
_Gerais queapli-ieçe iirh gx:upo~~ poetas própria Companhia deJesus no Brasil. o

qúe, por àli terem vivido na época e are 4 . Ná Universidade de Cqimbra em


( ...) (.:.)
juntos participado de aconte~entos É preciso 'contudo ressaltar que, mes~o O fluxo de jovens da colônia para a me-
que estudou (1784-1790) e de que .veio . no periodo em que os jesuítas dominavam trópole, a fim de ingressarem em mostei-
políticos, deram motivo à qua.m1cação
a ser, mais tarde, .professor da cadeira o ensino na colônia, existiam outros mes- ros, não encontrou inicialmente qualquer
do conjuilto come ",EscolaMineira". O
documento politiCQdesses poetas ;ão as de metalurgia, adquiriu José Bonifácio tres que ensinavam as primeiras letras aos impedimento que não fosse de ordem eco-
Cartas cmimas; o documento literário é [de Andrada e Silva] o gosto pelas ciên-
, . meninos, como se pode constatar pelas re- nômica (despesas com a viagem e o dote
comendações dos juízes dos órfãos, desde religioso). Depois, sobretudo em regiões de

Século d~s Luzes: o ideal liberal de educação 195


194 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil
povoamento recente, esta sangria de jovens de". Para virem ã bem desempenhar estas
passou a ser considerada excessiva, com.o funções, as meninas deviam ser retiradas AtividadeS tica deJosé Bonifácio de Andrada e Sil-
escrevia [ao reI1 o governador de Minas das casas paternas, onde sua formação era va, o Patriarca da Independência.
Gerais (... ): "Se Vossa Majestade não lhe d~scuidada, para serem educadas no reco-
puser toda a proibição, suponho que toda IhinJ.ento. Os vícios da educação doméstica
7. ,~iacióneo 'çlesenvolwnento ini-
mulher do Brasil será freira". eram descritos pelo bispo de Pernambuco
1. Considerando.a mudança do eixo cial do ensino profissional com aS mu:
( ...) em torno do conceito de ociosidade. Tendo,
~c;onômico do Nord~te para a região danças econômico-sociais' do seculo
Mas será preciso esperar até finais do sé- serviçais, logo a menina pensava estar isen-
aJiríf~ ,dervEnas Gerais, explique que XVIII. "
ta do "trabalho das mãos" e, sem ter nada
culo XVITI para depararmos com um reco-
que fazer, dormia demais, o que a tornava
, ,~~p¥~:eeoIie)1niCas ocorreram comoe
lhimento claramente fundado em objetivos
mole e "mais exposta às rebeliões da caro '
reperê:utii:amnáp~ de edu~o. 8. ,Consulteliwos de litedtura sobre o
educativ'1s. ~(.o,

ne". Adquiria uma "perniciosa sensibilida- Brasil calamar para fazer um ievanta-
Os Estatutos do recolhimento de Nossa
de para os divertimentos e espetáculos" e
2~'~e n~ historiografia umá. polêmi- menta da produção do arcadismo mi-
Senhora da Glória, do lugar da Boavista,
ca,em torno' dos problemas decorren- neiro e identifique:
foram redigidos por D. José Joaquim, de uma grande curiosidade pela vida alheia,
tes da ,exptllsão dos jesuítas do Brasil, a) os elementos estranhos à nossa re-
Azeredo Coutinho e publicados em Lisboa procurando saber "tudo o que se diz e o
eIIk;meíidos,doSéculo XVITI. Explique alidade e que resultani do' neocla:ssicis-
em 1798. (... ) O bispo obteve aprovação ré- que se faz".
(00 .)
cOn\:õ as pesqUisas atuais desfazem a mo presente no arcadismo;
• Wa para este projeto e chamou a si a tarefa
'crença, de um vazio educacional de
de redigir as regras a serem observadas na Seu plano de estudos adequava-se aos b) o nascente s~n:timento nativista.
meioséculó.
,instituição. papéis femininos, na sociedade de então:
A primeiradáusula que chama a aten- as meninas limitar-se-iam a aprender a ler, . Questões sobre A: leitura.
escrever e contar, al~m de coSerem e bor- ,3. Indique quais {oram as metas da re-
com.pkmenta.r
ção é o número restrito de recolhidas, 12,
darem, pois isso baStaria para o governo de" forma pombalina no Brasil. Identifique
que se dedicariam à adminiStração da insti-
suas casas, no futuro. Pode parecer pouco, tarnbén), quais fOTam as GOnJ:ra.Qiçõesdo
tuição e ao ensino das educandas ali recebi- 1. Reveja na primeira parte do ~pítu-
mas na sociedade colonial, onde eram raras despotismo esclarecido ao tentar intro-
das. Pela primeira vez, se nota num recolhi- 10 a discussão' a respeito do desenvolvi~
as mulheres que sabiam assinar seus nomes dum as i~eiaS iluministas emPortugal e
mento a separação nítida entre recolhidas e mento de uma ~ociedade clisciplinar em
e escrever uma carta, o programa do bispo quais foram as precauções a esse respei-
educandas, ássumindo as primeiras o papel que a escola era um dos pilares. Discuta
, de mestras. (... ) Azeredo Coutinho representava um passo to com relação ao Brasil.
- como. esse controle era. mais -rigoroso
~
";'11
. Quanto às educandas, todas as regras a importante na educação feminina.
d 4. Com baSe 'no dropes 2 e a partir . para as mulheres e por quê.
j elas referentes àssenta:liam no principio da'
Maria Beatriz Nizza da Silva, '\<\ educação da dos elementos vistos no capítulo (sobre
.••.' I necessidade da educação das meninas, dado 2. Retome com o seu grppo as passagens
~ mu1heI"eda criança no Brasil colônia", in Maria Stc- a nova organização social), explique o
~ "c grande influxo que as mulheres têm no phanou e Maria Helena Camara Bastos (orgs.), !flS- deste livro que se referem à eduG4ção fe-.
1 que possibilitou as expressões artísticas
bem, ou no mal, das sociedades". Os pa- tórias 8 memórias da 8dUt:afão 71!1 BmriL Petrópolis, Vozes, IÍlÍninaao longo da história e analise se
a que Nelson Werneck Sodré se refere.
péis ferW.ninos eram Claramente defulldos: v. 1; SkJdo.rXVI-XVIII, 2004, p. 131 a 135. até o século XVIII as- mudanças foram
"elas têm uma casa que governar, marido
que fazer feliz, e filhos que educar na virtu-
5. Gom base no dropes 3, explique significativas.
o que significa dizer, como Gilberto
'1'" ••.. ,~ Freyre, que a ConjuraÇão Mineira. ,iroi 3. Compare os motivos em que se ba-
uma revolllção de bacharéis". seia a defesa (ou a exclusão)àaescola-
'rização das ml:~ Comente-quais
6. Com .base no dropes 4; pesquise em foram as danças de orientação a partir
um livro de história a importância poli- do século xx. Explique por quê. -, 1

.";'~<.,_. ,
c.-,.,:_"", 196- -- História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Século das Luzes: o ideal,liberal de educação 197
"

Capítulo . Século' XIX-.


.
a educação nacionql

,o fenômeno da urbarti"Zação acelera-


daI decorrente do capitalismo industriat
'. criou forte expectativa com respeito à
educação pois a complexidade do tra-
l

balho exigia melhor qualificação da mão-


de-obra.
Desde o século XVIII Comênio preconi-
.Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) zava ensinar tudo a todos i mas apesar
II
ll
l

(Câmara Brasileira do' ÜYra S~ Brasil) I das tentativas de univer.salizoção do ensi-


no no século seguinte, apenas no século
AJ:anha, Maria LÚL1aele Arruela
História c.!;l e
educã<,'ào e ela petlagogia : geral
XIXesse proieto começou a se concretizar l

Bra,~il / Maria Lúcia cle Atnlda Aranha. - 3, ed. _ com a intervenção cada vez maior do Es-
rev e ampl. - São Paulo: Moderna 2006. tado para estabelecer o escola. elementar
universal laica, graiuilo e obrigatória.
I

Bihliogrnfia
O desenvolvimento' do capiloJismo indus-
1. Edul'al,'ào - História I. Titulo. trial estimulou a'criação de escolas poli-
técnicas. A discussão "sobreos metodolo-
gia in~n~ifjcou-se. '
05-8901 . CD[)o.370.9 Na P7meira parte deste capítul~ vere~
mos como se, processou esse- proleto na
fndices eara .catálogo sistemático: Europa e nos Estados Unidos, enquanto
'1. Educação : História 370.9
na segunda parte examinamo~ a situação
Reprodução proib}pa. Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998. do'Brasil, que passava de colônia a Impé-
• k faculclêlcfesde Direito rio mos enfrentava sérios problemas cotn
l
Todos QS direitos reservados .. da$~cicfàõsdeRHifee~de a escolarização sobretudo pêlo fCítode
l

Sôo Paulo surgiram em aqui aH'lda persistir um m~elo de .econo-


EDITORA MODERN-t. LTDA. 18211 p~c1êncio tarclia se mia agrário-comerciol com tentQtivasde
l
Rua Padre Adelino, 758 - aelenzinho considerarmos a impfanta~éro industrializoçãoapenas no final do século.
São Paulo - SP - Brasil - CEP 03303-904 de cursos superiores nas
A grande massa da população constituí- l
Vendas e Atendimento: Te!. (0_ :11l 2790-1500 . no~ões- europeias e m~slJlo
Fax (0__ 11> .2790-1501 na América. (Igrela Sôo da de escravos e pessoas do campoI não
Vvww.mod-ema.com.br Francisco e Faculdade ele reivindicava a escolarização e a taxa de
l

2011 DireitD, São Paulo, 1863.) analfabetismo mantinha-se alta.


_ •••••• .L..' ---------------------';;:9;;:;"9.
_ Impressu 110 Brasi!
.~"

particulares, mediante legislação que bus- 2. Educação ~Ieinã


,. P A R T E I
cava uniformizar o calendário escolar, o
controle do tempo, o curriculo, os proce- Desde à época de Lutero (século XVI),
.A organização da educação públic.a dimentos, criando os "sistemas educativos . a Alemanha dera atenção à educaçãoele-'
nacionais", Nesse periodo, verificou-se mentar. Porém, a derrota infligida por Na~
Contexto histórico çães, ainda na primeira metade do século uma nítida separação entre os pedagogos, poleão aos alemães, no começo do século
XIX, eles lutavam contra as forças reacio- ou teóricos da educação, e os educadores XIX, prejudicou" bastante a organização
No século xvm, a Revolução Industrial nárias da nobreza desejosa de restauração e propriamente ditos, que exerciam seu mis- escolar, cujã reconstrução coube ao mi-
- .~ começou a alterar a fisionomia do mundo só a partir de 1~48 se instalaram no poder .ter nas salas de aula, nistro da Prú"ssia, WIlhelm vori Humboldt
do trabalho, enqu~to no século seguinte em toda a Europa. Deu-se uma grande expansão da rede (1767-1835), filósofo e linguista. Suas refor-
será percebido o impacto dessas mudan- O contràste entre a riqueza e a pobrezá escolar, não só em número de escolas, mas mas enfatizaram a integração dos graus de
ças. era cruel nesse século em que a jornada de na ampliação da escola elementar, da rede ensino, visando a uma escola unificada, que
As novas máquinas ~odificaram. pro- trabalho se estendia de 14 a 16 horas, inclu- deveria ser aberta e acessível a todos.
secundária e superior, além da novidade da
fundamente as relações de produção, com sive com mão;de-obra infantil e feminina. A reforrnulação da escola -elementar
pré-escola.
o' desenvolvimento do sistema fabril em Para enfrentár essas dificuldades, o proleta- sofreu a influência do suíço-alemão Pes-
I. Na reÇlrganização da rede secundária,
grande escala e a divisão do trabalho. Na riado fortaleceu-se como a classe revolucio- ., talozzi, enquanto a secundária manteve o
mantinha-se a dicotomia que destina à elite
agricultura, a introdução de novas técnicas .nária, opondo aOs interesses burgueses suas caráter nitidamente humanista e erudito .
• • burguesa a formação clássica e propedêuti-
próprias reivindicações. Os movimentos O coroamento do processo completou-se
e a aplicação de conhecimentos científicos ca, enquanto para o trabalhadordíferencia-
dos trabalhadores se inspiraram nas ideo- com a criação da Universidade de Berlim
ampliaram a produtividade. Deu-se tam- do da indústria e do comércio é reservada a em 1810, símbolo da nova cultura germâ-.
bém uma revolução nos transportes, com logias c.riticas do liberalismo burguês, como~." instrução técnica. No. ensino universitário, oica. Grandes pensadores, como Fichte,
o navio a vapor, a constrUção de rodovias o socialismo utópico (prouclhon), o ~ar- ampliado e reformulado, foram criadas as Schleiermacher dela fizeram parte, impri-
e ferrovias. Novas fontes de energia, corno quismo (Bakunin) "e o socialismo científico
escolas politécnicaS para atender às necessi- mindo-lhe forte tendência para a discussão
o petróleo e a eletricidade, substituíram o (Marx e Engels).
dades decorrentes do avanço da tecnolõgia. filosófica e a cultura geral.
carvão. Acentuou-se o processo de deslo- Na' onda do nacionalismo do século
Inicia~os por Froebel, surgiram os 'jardins Hurnboldt esperava que todos tivessem
camento da população do campo para as XIX, a Eurapa-presenCiOüã iIDiIieaÇão da
da inIancia", O interesse pela educação es- direito e acesso à escola de formação geral
cidades, que passaram a concentrar grande Alemaclw._~a da.Itália~a:rn,bâS_~~~r8Z9; na
tendeu-se às escolas normais, denominação e que a procuradas escolas profissionais de-
massa trã.balhadora. América, as colônias espanholas e portu-
genérica dada aos cursos de preparação pendesse apenas da vontade de cada um.
. A"partir de 1870, o aumento da produ- gu~sa (Brasil) tornaram-se independentes.
para o magistério. . No entanto, essa possibilidade não existia
çãoalterou o capitalismo liberal, que substi- de fato. Ainda as~im, era boa a oferta de
Os cuidados com a metodologia, que se
I
tuiu a livre concorrência pçlo moderno ca- Educação .escola. profissionais, destinadas a preparar
. --~ açen~avam desde a Idade Moderna, to-
pita¥smo dos monopólios, com a formação para as tarefas da oficina, do comércio e
maram contornos mais rigorosos em virtu-
de trustes poderos~s e eficientes no campo 1 . Car:acterísticas,gerais da agricul1;Ura. Inclusive os patrões eram
de das novas ciências humanas, sobretudo
empresarial, bem como forte monopólio obrigados a facilitar o horário de trabalho,
da psicologia .
dos bancos. . . .Enquanto o Estado se .esforçavã para para permitir que os operáii.os pudessem
Ao lado da expansão da rede escolar,
Em busca de matéria-prima e visando a oferecer a escola gratuita para os pobres, é freqüentar os cursos.
outro objetivo dos educador~ no século
garantir mercado para a absorção dos ex- bem verdade que os ricos ainda proCuravam
XIX era formar a consciência nacional e
a
Esse período culminou com unificação
cedentes da indústria, o capitalismO"expan- as"escolas tra~cionais religio~~." De fato! a • dos Estados alemães em 1870, sob. a lide-
diu-sl: dando início ao imperialismo colo- -urbanização-~a-in~ o' ~tri6tica do cidadão. Até então a educa-
rança da PIÚssia. Até o final do século XIX,
nialista. Nessa fase, países como Inglaterra, fenôm;no das criaIiçaS na rua, e havia a ne- ção tivera um caráter geral e universal, mas
o
inúmeras e efetivas reformas conduziram a
Frarl.;a, Bélgica, Itália e Alemanha retalha- cessidade de "controle-docorpÕ-infantil",a; agora se dava maior ênfase à formação ciO'
Alemanha a um ensino secundário eficien-
ram a África e a Ásia em colônias. fim de evitar os prSblemas sociais' quê dai vica, .certamente em razão das tendências te, rig~roso e disciplinado, com baixo nível
O lléculo XIX representou o peItado da poderiam derivar. nacionalistas da época. Veremos adiante de analfabetismo e invejável posição de
. consolidação do poder dos burgueses, que - -- ÀpeSar--das ~crlticãs-do5iêligio~os' à como a emergência do movimento român- pro~sso técnico e administrativo. o

até então tinham sido. os opositores !io re- educação laica, lentamente os governos .; tico na Alemanha repercutiu na pedagogia E bem verdade" que se tratava de uma
gime aristocrático e feudal. Após as revolu- conseguiam intervir inclusive nas escolas daquela época. esco~ excessiVamente autoritária e discipli-

200 Hist~riada-Educação e da Pedagogi/ •.-: Ger ~> 'Sécul~ XIX:a educação nacional 201"""
;,f. -
nar, que mereceu a critica, sem efeito na- a Alemanha. Além da atenção à formação cada pelo anglicano Bell (1753-1832)e pelo pode imaginar, já que os monitores eram
quele momento, dos defen..ores da liberda- de profess?r~ foi reorgaIDzado o ensino. qtlakcrl Lancaster (1778-1838), em suas res- escolhidos entre os alunos. Assim comenta
de e da 'autonomia na educação. té~co, diante .da necessidade de formar ,pectiv!Lsescolas destinadas a. crianças po- a professora Maria Helena CamaraBastos:
"chefes de oficina e bons operários". "~ bres.Adotaram o sistema de monitoria, em '1\8 criticas formuladas ao método monito- .
3. França Naquele período a'universidade liberou-" que o professor não ensina todos os alunos, rial/mútuo centram-se na incompetência
-sé do monopólio instaurado ainda no tem- mas prepara apenas os mélhores, que por dos'monitores, na maioria das vezes inca-
Desde a Revolução de 1789, os franceses po de Napoleão e os Cllrsosse tornaram sua vez atendem grupos de colega!>.A di- pazes de fornecer explicações complemen-
já defendiam a educação pública e gratuita. mais didáticos (deixando o estilo de prele- visa de Lancaster era: "Um só mestre para tares, ou de adaptar-se ao nível dec9mpre-
No começo do século XIX, porém, Napo- ções para ouvintes,' como era antes), com fnil alunos". ensão de seus 'colegas;no sistem~çmpíricoe
leão adotou uma política autorimria e"cen- sensíveis mudanças pedagógicas e conse- -..' .O Sistemaconsistia em reunir um gran- prático, baseado em procedimentos ~mecânicos,
tralizadora do ensino. Voltou sua atenção quente aumento do número de estudantes. de número de alunos em um galpão - Lan- portanto, desprovido d~: valor edllcativo;
sobretudo para a universidade~e o ensino caster chegou a reunir mil - e agrupá-los de na inculcação de fórmulas e reCeitas; na
secundário (os liceus), deixando o ensino 4. Inglaterra acordo com o seu adiantamento em leitura, transtnissão de conhecÜÍ1entossuperficiais e
elementar a cargo das ordens religiosas e, ortografia e aritmética. Antes das aulas, o sem valor, que não leva os alunos à reflexão e
I portanto, sem a gratuidade tão defendida Na Inglaterra, a situação foi um pouco professor ensinava os mais adiantados, que não desenvolve a inteligência. O aluno é a
~;
no século anterior. diferente. Devido à tradição de pequena in- ;, seriam os monitores e deviam se incumbir grande vítima da mecânica do ensino mo-
Após a queda de Napoleão, quando fo- tervenção do Estado, a educação continuou.
',/ dos diversos grupos de acordo com O' seu nitorial/mútuo: está preso a um verdadeiro
ram res.tabelecidas relações com a Inglater- como funçãe da sociedade ciVil, subvencio... ~f nível de conhecimento. À medida que cum- sistema militar, que o leva a agir somente
ra, .os franceses aproveitaram-se das técni- nada por igrejas ou fundações particulares.. priam uma eta~a, eram transferidos para mediante uma ordem e a submeter-se a um
• cas do ensino mútuo, ou ~onitorial (que A partir de 1830 o Estado implantou ~ o grupo de grau mais elevado e assim por condicionamento destinado a torná-lo um
descreveremos melhor no próximo item); uma série de medidas para exercer maior . diante. As :'dasses" não eram as mesmas cidadão dócil e obediente. Foucault consi-
a fim de atender às reivindicações de edu- controle sobre o ensino público,. criaRdo,. para leitura e aritmética, porque um aluno dera o ensino mútuo uma máquina de que-
cação para as crianças da classe trabalha- então as puhlic schools, que de início foram "";'" podia estar mais adiantado em uma delas e brar os corpos e as intelig~ncias-"2.(A este
dora. Essa experiência de ensino elementar mais frequêntadas por crianças das classes não na o~tra. propósito, ver a leitura complementar 2
de massa teve momentos de pleno sucesso ricas. Em meados do século XIX, auxiliou- Para que o sistema funcionasse, havia desta primeira parte.)
(de 1815 a.1820, abriram-se mil escolas essas escolas e pronunciou-se sobre a obri- "" rígida disciplina. A en~da era em fila or- Em todo caso, a ideia entusiasmou muita
mútuas, reunindo 150 mil alunos). Depois gatariedade do ensino e a elCÍgênciade gra- ,'. ganizada, após o toque do sino, e um apito gente por algum tempo, tainbém fora da In-
de algum recesso e de novo florescimento, . tuidade. Mesmo assim, o papel do Estado :... chamava a atenção dos indisciplinados. Fa: glaterra, como na França, nos Estado~Uni-
o projeto acabou por se extinguir por voltà se restringia com frequência ao apoio eco- lava-sebaixo, havia cartazes e quadros bem dos e inclúsive no Brasil, onde várias leis de
da década de 1870. nômico e à supervisão das atividades peda- como cartões de sinalização, para indicar a diversos estados estimul~ a adoção do
Um pouco antes, em 18ô5, o industrial gógicas. Em 1899 foi criado o 1\1inistépoda '.-0 sequência dos trabalhos, que todos da mes-~ -método, durante o periodo monárquico.
francês Godin, inspirado pelas ideias so- . Educação (Board oi Education). . ma "clasie" deveriam cumprir ao mesmo
cialistas de Fourier, fundara uma escola ao Em outra linha de atuação, o socialista tempo. O único professor, .do altõ de um 5. Estados Unidos da América'
lado de um núcleo habitacional, chamado utópico Robert Owen (1771-1858), impres- < estrado, supervisionava O andamento das
familistbio. Essa' experiência, exemplo raro sionado com as condições de vida dos ope- ,' aulas:e interferia quando necessário. A instalação da escola pública norte-
de atendimento a filhos de operários, sofreu rários ingleses, fundou escolaspara os filhos t Esse processo barateava os custos e con- -americana, bem no início do seculo XIX,
pesadas criticas de liberais temerosos da in- dos trabalhadores. ' seguia.impor rígida disciplina, mas {)s re- atingiu inçlusive o ensino universitário, com
I,
fluência socialista. ' . r sultados não-eram das- melhores, como se a fundação da primeira universidade estatal
Após a derrota da França pela Prússia, oensino mútuo ou monitorial
.4-
no período conhecido COI!';irl Terceira Re- ~~
pública, os franceses retomaram a discussão Dada a necessidade de ampliar a alfabe- t'
sobre a necessidade da escolapública e mui- tização em uma sociedade em pleno cres- I Qg.akm e anglicanos são membros de diferentesramos da Igreja Protestante na Inglaterra. O anglicanismo é a

to elogiaram o mestre-escola alemão. Uma cimento industrial, surgiram propostas as religião oficial daquele país desde ~que VIII, no século xV1. Os quakm surgiram no século XVII e propa-
I:
I
lei de 1882 instituiu de novo a escola laica, mais diversas., É singular a experiência do i'
garam sua crença também nos Estados Unidos.
2"0 ertsmo monitorial/mútuo no Brasil (1827.t854-)", in Maria Stephanou e Maria Helena Camara Bastos
II gratuita e obrigatória, tendo como modelo ensino mútuo (ali sistema monitorial) apli- "
;."! (orgs.),Hist6rias Ul1tmúrias da meação 110BrasiL Petrópolis, Vozes, 2005, v. lI: Século XIX, p. 40.
:1 ",-'-:

202 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil j .~.Século~o..na~ci~on~a~I--_ 203.,'


II
-~, --_-...--.-... _."'_.-'-- ..•.
_._. -- - ..• -~~ _.".'"'. -""'- ,------ ..•.-&._ .. _.
..
de Vrrgínia, em 1819, exemplo seguido por certa forma: ao racionalismo iluminista. En- • Os materi.ali.stas (Feuerbach), criticos do do po~ causas das quai~ não pode escapar,
outros estados. quanto na lluStrãção a razão é tudo, para idealismo, influenciaram a vertente socia- como a raça (de~erminismo biológico), o
Desde 1820 inúmeras instituições poli..: os românticos ela é apenas' um dos aspectos lista, representada sobretudo por Marx e meio (determiniSmo geográfico) e o mo-
técnicas destinadas í\o ensino profissional da força espiritual humana, que se compõe" Engels. mento (determinismo histórico).
orientado para a indústria, a agricultura e também.da imaginação, da incerteza, do ,;,' >(, Se o positivismo considerava os priIi:cr.
o comércio ajudaram o crescimento econô~ contraditório. 2. Positivismo e ciência pios da experimentação e da matematiza-
mico do país. Na década seguinte, a âtenção Nascido na Alemanha, o romantismo ção inerentes ao conceito de' ciência, era
concentrou-se no ensino primário e, por estético espalhou-se depois pela Europa, '~, O francês Augusto Comte (1798-1857), de espe$ que esses princípios também se
volta de 1850, no secundário. Naquela épo- exaltando os sentime!1tos, a individualida- .j~ , iniciador da corrente positivista, partiu do aplicassem àS ciências humanas, caso' estas
ca, vários estados posstÚam departalnentos de; a espiritualidade, a vida nos sellS aspec.. :!o; pressuposto de que a humanidade (e o pró- quisessem ser .reconhecidas como ciências.
,f,
para organizar e supervisionar a educação; tos de-paixão, tragédia, heroísmo e misté-, prio indivíduo, na sua trajetória pessoal) Ou seja, a sociologia, a psicologia, aecono-
Horace Mann (1796-1,859),ao se tornar rio. Influenciou igu~ente a exploração.! passa por diversos estágios até alcançar o mia deveriam usar um método semelhante
,.'
superintendente 'de educação no estado de _ de temas como povo; história, nação, ou ji: estado positivo, que.se caracteriza pela matu- ao das ciênéias da natureza, a fim de alcan-
Massachusetts em 1837, criou escolas urba- seja, o conjunto dos indivíduos unidos pela' ridade do espírito humano. çar rigor e objetividade.
nas e rurais, escolas normais, bibliotecas e mesma língua e por laços de origens, cren-". , O termo posit:àJo designa o real, em opo- Da perspectiva positivista; Comte defi-
incentivou a expansão da educação pública ças e tradições. sição às formas teológicas ou metafísicas de ne a sociologia como uma.fisica social, apli-
além do seu estado. Na: pedagogia, o romantismo alemão explicação do mundo, que predominavam cando a ela os modelos da biologia para
Segundo Mann, a empreitada abriria ho- alargou a noção de Bíldu:ng, conceito com- na :filosofiaaté ejltão. Para Comte, "todos explicar a sociedade como um organisrno
rizontes otimistas para as classesoprimidas: p1exoque representa mais do qv.eo simples os bons espíritos, repetem, desde 13acon, coletivo. Submetido à consciência coletiva,
'1\ educação, mais do que qualquer outro significado literal de "formação". Bildung que somente são reais os conhecimentos resta ao indivíduo peq1.\ena possibilidade
instrumento de origem humana; é a grande pode corresponder à ampla v:tsã!Jde um de- que repousam sobre fatos observados". Isso de intervenção nos fatos sociais. Na mesma
igualadora das condições entre os homens senvolvimento-espiritual por meio da cultu- significa que, por meio da observação e do linha, ao desenvolver o método sociológi-
- o eixo de equili'brioda maquinaria social ra. Voltaremos a este tema mais adÍê.nte. raciocínio, o indivíduo é capaz de'descobrir, co, Durkheim ---, que veremos no próximo
(... )". Como veremos, essas ideias divulga- Vimos que no séculCJoanteriorKant de- as relações invariáveis entre os fenômenos, capítUlo - recomenda que os fatos sociais
I •

1 vama crença na fi.mção equalizadora da senvolvera importãnté reffexãéf ã' respeito ' ou seja, suas leis efetivas. sejam observados como coisas.
"

, educação, que mais tarde animou os adep- das possibilidad~ e liJ;nit~sc!a~.9.Êãia " O positivismo exprime a exaltação pro- Igual intenção orientou o método da psi-
tos da Escola N óva. conhecer a realidade, e como suas ideias ' vocada no século XIX pelo avanço da ci-, cologia, ainda que o próprio Comte admi-
Corp. a 'criação de escolas normais esta- .. repercutiram na definição do projeto edu- ência moderna, capaz de revolucionar o tisse ser impossível contornar o seu caráter
tais para a formação demestr:es, delineava- cacional Voltado para a construção de.um mundo com uma tecn'Ologiacada vez mais subjetivo. Apesar disso, li; psicologia experi-
-, -se o quadro da educação norte-americana,
já bem configurado em meados-do séclho,
agir e pensar autônonios. ' eficaz: "Saber ê poder'. Esse entusiàsmo
desemb9Cou no r:ientiji.&isrrw, visão reducio-
, mental surgiu no final do século' XIX. Os
, Os filósofos do século,XIX interpreta- primeiros psi~ólogos abandonaram as espe-
XIX. . ram de mui~ formas'~ pensamento kan- nista segundo a qual a ciência seria o único culaçõe~de caráter filosófico:- sobre a ori-
tiano. Por questões didáticaS: destâCá.reriiõs' -conhecimento válido. Desse modo, o mé- , gem, o destino ou a natureza da alma ou do
Pedagogia três das principais tendências: todo cIas ciências da natureza - baseado conhecimento, por exemplo - e, seguindo'
• Os pasitiuistas (Comte) levaram às úl. na observação, experimentação e materna- a tendência naturalista do positivismo, apli-
1. O ideário do século XIX timas consequênciás as criticas kantianas tização - deveria ser estendido a todos os caram o método experimental voltando-se
à metafuica, afirmarido.que nã-o ~beao campos de indagação e a todas as ativida- para os aspectos do comportamento qu;e
Além de sofrer a influência das altera- filósofo teorizar sobre .''id~sem- oonteú~ __de humanas. podiam ser verificados exteriormente.
ções econômicas e sociais a qtÍejá nos refe- do". Assim, reduzem o trabalho ,da filo- Outra decorrência do positivismo é a Os pioneiros da psicologia experimen-
,.. rimos, o pensamento pedagógico do século sofia: à mera síntese dàs-diversas- ciências-, concepção determinista, que atribui ao tal'foram os alemães Weber, Fechnet; HeI-
; , XIX precisa ser compreendido a partir do particulares. comportamento humano as mesmas rela- • mholtz e Wundt, este último responsável
estágio em que se encontravam naque- • Os idealistas (Fichte, Schelling e Hegel) ções invariáveis de causa e efeito que presi- pelo primeiro laboratório de psicologia ex-
le momento a filosofia e as ciências, bem destacaram a eapaôâàaequeKãi1t ati1buía dem as leisda natureza. Por exemplo, para perimental em Leipzig, em 1879.•
I
como da revolução. cu1tural_-earaétérizada à razão de impor fOl"lIla& a priari ao conteú- Tain"e,um dos seguidores de Comte, o ato Só depois surgiram teóricos de outra
I
I
pelos ideais românticos que se opunham de do dado pela experiência. humano não é livre, já que é determina- tendência -:- genericamente chamada de

204 História da Educaçã(l-l~_daJ~edagogia - Geral e Brasil • SéculoXIX~~_educação nadonal 205


Para explicar a realidade em constante livre, Por.isso,.a educação não se restringe
humanista -, que, ao criticar o positivismo, enfatizar a importância das ciências sociais a formar "alguma.coisa no homem", mas o
processo, Hegel não utiliza a lógica tradi-
procuravam garantir a especificidade do como a história, a economia, o direito etc. "homem ele mesmo".
cional, aristotélicil, inadequadlj. para com-
objeto das ciências h~as,distinguindo- Sempre interessado em melhores condições ,, Envolvido com as questões políticas do.
preender o movimento, mas estabelece os
as das ciências da.nature~a. Voltaremos à de vida, destacou-se como batalhador da '\'f' seu tempo, após a derrota infligída pelos
princípios de uma outra lógica: a dialética.
questão no próximo capítulo. . -. causa feminina .. fráIlceses aos prussianos, nos famosos e in-
Da abordagem dialética deriva um novo .
O positivismo atuou de forma marcante' ., flamados Discursos à n(Jfão alemã, Fiçhte des-
conceito de razão e de história: enquanto
Posítivismo e educação no ideário das escolas estatais, sobretudo na taca a educação corno indispensável para o
osfilósofosanteriores estavam preocupados
luta a favor do ensino laico das ciências e renascimentO' e .a granâeza da'1\lemanha.
em afirmar ou rejeitar a capacidade'da ra-
Augusto Ccimte I;stava convencido' de contra a escola tradicional humanista re. : ~il
Para ele, era tarefa dcy'EstadeflDStaurar a
zão para alcançar a verdade eterna e imutá-
que a edueação' deveria levar em conta, Iigiosa. No século XX ainda permaneceu escola nacional e unífiêada. :"',,:-
vel,Hegel argumentava que a razão é histó-
em cada individuo, as t;tapas que a huma- viva essa influência. Por exemplo, a psicolo- :/ Alem de Fichte, os filósofosSdíieierma- •
rica. Nesse sentido,.o presente é visto como
nidade percorrera: o.pensamento fetichista gia comportamentalista de Watson e Skín- cher e Von Humboldt e os pQetás'Goethe
resultado de longo e dramático processo.
da cnança seria superado pela concepção ner (behaviorismo n.orte-americano) serviu e Schiller representam. a pedagogia do
A história não se faz linearmente, como
metafisica, e esta, finalmente, pela positivis- de base a milita teoria pedagógica. No Bra- neo-humanisI'no, Segundo o historiador
acumula-çãoejustaposição de fatos no tem-
ta, no momento em que atingisse a idade sil,o positivismo influenciou as medidas go- t; da educação Franco Cambi, "O terna pe-
po, mas por verdadeiro engendramento,
vernamentais do início da República e, na dag,ógico dominante nesses autores é o da
madura. Cl~O motor interno é a contradição. Essa
O positivismo permeou de maneira década de 1970, por ocasião da tentativa de Bildung (ou formaçã? humana) que aponta
transformação se processa por tese, antítese
eficaz a pedagogia daí em diante, ora de implantação da escola tecnícista. na direção de um ideal de homem integral,
e síntese, os três momentos da dialética.
maneira explícita, ora camuflada. Entre os Hegel atribui ao Estado uma importân- capaz de <::onciliardentro de si sensibilidà-
seguídores mais próximos, dois se interes- 3. O idealismo de e razãó, de desenvolver a si próprio em
ciamuito grande, afirmando que, em deter-
saram especificamente pela éducação: Her- minado momento do processo, ao superar plena liberdade interior e de organizar-se,
bert Spencer eJohn Stuart Mill. Em filosofia, o conceito de idealismo não a contradição entre ó privado e o público, mediante uma viva relação com a cultura,
Spencer (1820-1903), além da influên- se confunde com o sentido comum do ele se torna unIa das mais altas sínteses do como personalidade harmônica" (ver L~i-
cia positivista, incorporou o evolucionismo termo, que identifica a atitude de pessoas Espírito objetivo, o que permite a supera- tura complementar 1)..
I I
de Darwin. Portanto, para de a educação, com um grande ideal moral ou intelectu- ção da subjetividà.deegoísta, para vivermos
como tudo no mundo, sofre um proces- alo Do ponto da teoria do conhecimento, 4. As ideias socialistas
melhor em sociedade.
50 evolutivo em que o ser revela suas po- idealismo é o nome genérico de diversos sis- - .
tencialic].ades.Essa convicção baseia-se na temas filo1lóficossegundo os quais o ser ou . Idealismo e educação Com o desenvolvimento do capitalismo,
idéia de progresso, cara ao ideário positivista, a realidade são determinados pela consci- .a classeproletária crescéu em taniáIiho, ma~
que parte do pressuposto segundo o qual as ência: são as ideias que produzem a retili- s
Para Hegel, a educação é um meio de es- sem acesso aos benefielos da noVa ordem
coisas têm em germe aquilo que elas serão, dade, porque' "ser" significa "ser dado na piritualização humana, cabendo ao Estado econômica. Ao contrário, eram ternveis as
I: bastando existir condições para se~ d~- consciência" . condições de moradia das farnflias amon-
incentivar esseprocesso. Dii Hegel: "Só no
II! sencadeadas. Imbuído da concepção cien- Hegel (1770-1831), o mais important!:: Estado tem o homem existência. racionah toadas nos arrabaldes das grandes cidades,
tificista, Spencer escreveu a obra Edu.cação, dospensadores idealistas do séculoXIX, de- Toda educação se dirige para que o indiví- depois de enfrentai extensa jornada de tra-
que obteve milita popularidade. Nela consi. senvolveu a filosofia do devir (do movimen- duo não continue a ser algo subjetivo, mas balho mal pago e em locais insalubres.
dera o ensino das ciências o centro de toda to, do vir-a-ser). Ao explicar o movimento No século XIX, surgiram as organiza-
se faça objetivo, n9 Estado". .
I:
I
. educação, não Só em termos de transmis- gerador da realidade, Hegel desenvolve a Contemporâneo de Hegel e conh~cido ções de trabalhãdores, criadas para defen-
são dos conl}ecimentos; comu da formação~ dialética idealista, em que a racionalidade "é nos meios intelectuais.europeus antes dele, der seus interessl:s contra a exploração dos
mesma do espírito científico. Entre as ciên- o próprio tecido do real e do pensamento". • O filósofoidealista FiCbte (1162-1814) valo-
donos do capital. Esses movimentos foram
.cias, a física, a 'química:I.:a biologia seriam as O mundo é a manifestação da ideia, e por rizava sobremaneira a educação. Ele parte fecundados pelas ideias 1locialistas,inicial.
mais importantes. Na sua obra prevalece o esse movimento a Razão passa por todos da ideÍa de que a natureza humana não nos mente pela produção teórica dos chama-
interesse pelas questõ~s!=ltilitárias,em franca . os graus-, desde a natureza inorgânica, a é dada, mas nos humanizamos na medida dos socialistas utópicos (Saint-Simon, Fourier,
oposição ao ensino humanista tradicional. ' . natureza viva, a vida humana individual, em que nos afirmamos como sujeitos,'ca- Proudhon, Owen), que, embora percebes-
John Stuart Mill (1806-1873) am~nízou a social até as mais altas manifestações da pazes de consciência de si e de atividade sem o antagonismo das classes,propunham
em parte o cientifícismo spenceriano ao cultura.
207.
SéculoXIX:a educação nacional
---------HistéFia-da-Educaçãoe da Pedagogia - Geral e Brasil
206
.,. --l

meios paternalistas para a emancipação da da matéria. Como se vê, Marx e Engels i~- dade igualitária. Antes de alcançar esse ob- Além de Marx, também se ocuparam
classe oprimida. vertem a perspeetiva idealista. jetivo, ela precisa conhecer a própria forç~, com a nova educação os socialistas utópicos,
O britânico Robert Owen, por exem- Para exemplificar, lembramos' :que a . tomando consciência da alienação a que como o francês Fourier (1772-1837), que des-.
plo, tinha convicção de que a ip.strução abordagem idealista da história, assimilada está submetida e da ideologia que a impede tacou a importância da formação integriJ.j,e
. seria um lUeio para restituir a dignidade pelo senso comum, explica seu movimento de perceber que age com valores impostos o britânico Owen, empenhado em preparar
aos operários. Já no seu tempo, fez a criti- pela ação dos "grandes homens", das gran- pela classe dominante. os'filhos de operários, CoInojá Vimos.
ca da divisão do trabalho, que começava des ideias ou, às vezes, até pela intervenção Na mesma linha de crítica ao sistema ca- .. Entre os anarquisl4s, o espanhol Francis-
a ser aplicada nas fábricas, acusando esse divina. Para Marx, diferentemente, 'no lu- pitalista e à exploração da classe proletária co FerrerGuardia(1859-1909) fundou uma
procedimento de causar fraqueza fisica e gar das ideias,' estão os fatos materiais; no pela' burguesia, destaca-se 'o anarquismo, escola em moldes antiautoritários, equipa-
mental. Propõe, em contraposição, a ins- lugar dos heróis, a luta de classes..A história' movimento iniciado por Bakunin (1814- da de biblioteca cóm livros especialmente
trução geral para toda criança, o que "a
tornará apta para os fins' da sociedade",
se faz com os fatores materiais, econômicos
e técnicos que correspondem às condições
,i -1876). Os libertários (como .são conheci- ,
dos os anarquistas), inicialmente próximos
escritos ou ~daptados para aimp[a~ta.ção
das ideias libertárias.
uma vez que faria surgir""uma classe tra- em que os indivíduos se reÚIÍempara pro-', a Marx, dele se distanciaram por divergên-
balhadora cheia de iniciativas de úteis co- duzir sua existência por meio do trabalho. cias em pontos fundamentais. Repudiam 5. Principais pedagogos
nhecimentos". De maneira ingênua, por Nesse processo, surgem contradições no , toda forma de poder e autoridade e buscam
't-i~
achar que a educação teria a capacidade seio da sociedade, que no tempo de Marx, ~, fundar "a ordem na anarquia". Criticam o Os principais pedagogos cujas ideias
de mudar a sociedade e contando com a e ainda hoje, resultam dos interesses anta- Estado, a Igreja, e'todas as instituições hie- fertilizaram o século XIX. foram Q StÚÇO-
boa vontade do dono do capital,. afirm~: gônicos do capitalista£:.do proletário. i rárquicas, inclusive a escola autoritária. -alemão Pestalozzi e os alemães FroebeI e
• "Se a invenção das máquinas multipli- Marx não nega que o ser humano tenha ,_o: H~bart;Além deles, no final do século, os
cou a capacidaae de trabalho'em muitos ideias, mas as explica a partir da estrutu- i;: Socialismo e educaçõ~
, . filQ.gofosDiLthe.ye.Nietzsche anteciparam a
campos com evidentes vantagens de pri- ra material da sociedade em que vive. Para crítica à escola tradicional.
vados, enquanto agravou a condição de ele, as ideias de uma sociedade, expressas '7 As ideias socialistas provocaram grandes
muitos outros, a minha é uma invenção na filosofia, na moral, na ciência, no direi-:: alterações nas concepções pedagógicas. Do Pestalozzi
que, com sua introdução e sua rapidís- to, nas artes, na pedagogia, constituem a ponto de vista epistemológico, rejeitam os
sima- élifusão, multiplicará lo"go,incalcu- superestrutura e dependem da infraestru- :; pressupostos idealistas e ao materialismo Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827),
lavel.mente; as forças fisicas e men'tais da tura, as condições materiais ou eco:r;tômicas ":~~,' tradicional contrapõem a dialética. Do suíço-alemão nascido em Zurique, atraiu a
sociedade inteira sem prejudicar. a nin- dessa sociedade. 'i ponto de vista político, denunciam a explo- atenção do mundo como mestre, diretor e
,l guém". Sua tentativa em concretizar es- Do ponto de vista dialético, porém, os ração de uma classe por outra e defendem, fundador de escolas. Suas. obras principais
sas ideias fracassou. fenôme~os materiais são processos (nada a educação universal e politécnica. ms-
são Lerma:rdo e Gertrudes t I781) e Gertrudes
Os utópicos foram criticados por Marx é estático), e o espírito não é sonsequência i Segundo o mateiialismo dialético, é ilu- ,.t:rui. seusftlJws (IHGl). Embora as suas ativi-
(1818-1883) e Engels (1820-1895), ao es- passiva da ação da matéria. A consciência ',_ sório pensar que a educação seja capaz por dades tenham se iniciado no. século XVIII,
tabelecerem as bases do que eles mesmos humana, ao tomar conhecimento dos de- ,(, si só de transformar o mundo, porém exis- elas aJJ;ladurecerarn no começo do sécu-
denomin~am sõcialisrrw, cientifico. A teoria terminismos, pode agir sobre o mundo, I' tem tarefas para os educadores enquanto lo XIX, por, isso preferimos abordar suas
marxista, ou materialismo histórico-dialéti- transformando-o, inclusive pela revolução. não se realiza a ação revolucionária. Por ideias neste capítulo.
co, foi elaborada com a influência e a criti- Em politica, a ação revolucionária tem por ~empill: . Estudioso de Rousseau e Basedow, Pes-
ca de diversas tendências. objetivo a transformação radical.do status r;. • a luta pela democratização do ensino talozzi sempre se interessou pela educação
~';;
Como Hegel, Marx parte da concepção quo, com a alteração da estrutura econô. " (universal)e pela escola única (não dualis- elementar, sobretudo das cn.anças pobres.
~.--,-históriea-e dialética do real, mas nãocon- mica, política e social. Pressupõe também ,i ta), isto é, sem distinção entre formar e pro-,. . E;m 1774, fundou em Neuhof uma escola
sidera o mundo material a encarnação da - um confronto em que as novas ideias são fissionalizar; em que recolhia órfãos, mendigos e peque~
"ideia- absoluta", da "consciência", como impostas pela violência. • a valorização do pensar e do fazer,em nos ladrões. Com avançada concepção, que
os idealistas. Ao contrário, para o materia- Para Marx e Engels, a classe operária, que o saber esteja voltado para a transfor- aliava formação geral e profissional, tentou
lismo, o moVimento é a propriedade funda- organizando-se num partido revolucioná- mação do mundo; reeducá-los recorrendo a trabalhos de fia~
mental da matéria e existe independente- rio, destruiria o Estado burguês e, supri-",' • a desmistificaçãoda alienação e da ideo~ ção e tecelagem. A experiência durou ape-
mente da consciência; pottanto, esta é um mindo a propriedade privada dos meios de [agia, ou seja, a conscientização da classe nas cinco anos, porque o jovem educador
dado secundário, derivado, já que é reflexo produção, haveria de instau:ar uma socie- / oprimida. não conseguiu mantê-la financeiramente:.

208 História da Educação e da "pedagogia - Geral e Brasil Século XIX: a educação nacional 209
Em 1799, em um castelo perto de Berna, A família constitui a base de toda a edu- ~ pertar a representação ~ forma,. da. cor, é preciso examinar alguns' aspectos da sua
fundou um iD~ernato, depois tr-ansferido ca.Çãopor sei o lugar do afeto e do trabalho do movimento e da matena. O pomelro e psicologia.
para Yverdon, onde funcionou de 1805 até comum. Também é positiva à experiência i mais univers;U "dom" é a bola; o segundo, a Rejeitando a clássica doutrina das facul-
1825. De toda a parte estudiosos. e autori- religiosa íntima e não-confessional, 'que diz .,Ii bola, o cubo e o cilindro; o terceiro é forma- dades isoladas da alma, Herbart compreen-.
dades vinham conhecer esse trabalho. respeito à" Ressoa e, portanto, não se sub. ,i'" do pela divisão dos cubos desmontáveis. de a vida psíquica .como uma lUlÍdade naS
Pestalozzi é considerado um dos defen- mete a dogmas nem a-seitas. Em outras pa. . Aléni aos i:lons, FroebeI destaca as ocu- suas operações básicas de conhecer, sentir
sores da escola popular extenSiva a todos. lavras, despertar o sentimento religioso na pações,de modo especial a tecelagem, .a e querer. Assume, porém, uma posição in-
Reconhecia firmemente a função social do criança não significa fazê.la memorizar o "i' dobradura e o recorte. O canto e a poesIa telectualista, que privilegia o conhecimento
ensino, que não se acha restrito à formação catecis,mo. l,' .também são prestigiados, sobretudo para ao consid~rar'o sentir e~Óquerer funções se-
do gentil-homem. Além disso, ao povo não Pestalozzi exerceu profunda influência . ~i
;;' facilitar a educação moral. e religiosa. cundárias e derivadas cIÕ processSi ideativo.
se destina apenas a simples instrução, mas em vários países da Europa, e suas ideias " Embora a fundamentação teórica dà sua Esse processo pode ~ser nlaiS~em en-
sim a formação completa, pela qual cada 1
chegaram até os Estados Unidos. .,j, psicologia tenha sido objeto de críticas se- .tendido se levarmos enf conta â:'ribvidade
um é levado à plenitude do seu ser. 'Z:~I
.~I.,,, veras, é inegável a influêrrcia da pedagogia introduzida por HerbJri nos c~nceitos de
Como bom discípulo de Ro~seau, estava Froebel de Froebel, expressa na Glifusão dos jardins consciência, limiar da consciencia e inconsciente.
convencido da inocência e bondade huma- ,i de inf"anciaespalhados pelo mundo. Para ele, o fili'"{oda consciência é oscilan-
nas. Por isso, é tarefa do mestre compreen- Friedrich FreebeI (1782-1852) nasceu na 'ti te, já que várias representações dos objetos
der o espújto infantil, a fim de estimular o Turingia, região da Alemanha. Aprendeu J~ Herbar.t '. permanece¥1.algum tempo na consciência,
desenvolvimento espontâneo do aluno, ati- com".9s filósofos idealistas e, no. campo da .;.' com intensidade diferente, algumas no li-
tude que o distancia do ensino dogmático e' pedagogia, segui\! muitas ideias de Pesta. ~",
autoritário. A psiC;Ologiaproposta por Pesta.
o alemão Johann E Herbart (1776- miar, subindo para o foco de atenção ou de-
lozzi. Uma visão mística marca seu pe'nsa- -1841) t;rouxcgTande contribuição .para a saparecendo depois, temporariamente, no
lozzi era áinda incipiente e ingênua, mesmõ mento e obra. pedagogia como ciência, buscando o maior inconsciente. A gr .nde massa submersa não
porque no seu tempo essa. disciplina ainda Sua principal contribuição pedagógica rigor de método. Pode-se ainda dize;r que é esquecida, pode. Ido voltar à cpnsciência
não tinha se corntituído como ciência, mas resulta da atenção para com as crianças na Herbart foi o precursor de uma psicologia a qualquer momeI.to e, aliás, está sempre
a sua tentativa indica uma direção que seria fase anterior ao ensino elementar, ou seja, experimental aplicada à pedl1!50gia. Mesmo tentando voltar. O esforço para retornar à
constante na pedagogia daí em diante. _a educação da primeira infancia. Pioneiro, que essa psicologia apresentasse resquícios consciência provoca os sentimentos de pra-
Para Pestalozú, o indivíduo é um todo fundou os Kintúrgal'fen Gardins de inf'ancia), .,. de metafisica e utilizasse uma matematiza- zer ou dor, que resultam do aparecimento
cujas partes devem ser cultivadas: a uni- em alusão ao jardineirq que cuida da plan- j .."
çã~ de valor discutível, constituiu um a~- ' daquelas representações ~a consciência ou
dade espírito-coração-mão corresponde ta desde pequenin~ para que cresça bem, çe- sobre seus antecessores. Vejamos então da submersão no inconsciente.
ao importante desenvolvimento da tríplice pressupondo ql!e os primeiros anos são bá-" Processa-se dessa forma o "qrculo de
a psicologia herbartiana, a teoria de edu-
atividade conhecer-querer-agir, por meio sicos para a formação humana. /"
cação da vontade e o método de instrução. ..pensamento": "dos ~nsarrientõs saem
da qual" se dá o aprimoramento da inteli- FreebeI privilegia,,:a a atividade lúdica" .~esse pensador que estava consciente de ter sentimentos e, ..des~es, princípios e modos
gência, da moral e da técnica. Daí a impor- por perceber o significado funcional do : de ação". Assim o desejo é transformado
elaborado uma pedagogia copto ciência da
tância dos métodos para a organização do jogo e do brinquedo para o desenvolvimen- 1 educação. em volição~ isto é, em possibilidade de sua
tragalho manual e intelectual: segundo ele, to sensório-motor e inventou métodos para concretização. Ora, se os sentimentos e as
deve-se partir sempre da Vivência intuitiva, aperfeiçoar as habilidades. Estava con- A psicologia herbartiana volições derivam secundariamente do con-
para só depois introduzir os conceitos. vencido de que a alegria do jogo levaria a .~ flito entre as. representações, torna-se enor-
A criança tem potencialidades inatas, criança a aceitar o trabalho de forma mais .1 Herbart desenvolveu uma pedagogia me a importância do professor, que educa
qúe serão desenv9lvidas até a maturidade, trm~a. ~ social e ética com finali9ade d!:.Jorrnar-º--_os sentim~tos_ e, os desejos dos aluno~ por
tal como a semente que se transforina em A fim de estimular os impulsos criado- 'i caráter moral por meio do esclarecimento meio do co~trole de suas ~de.ias (ver•.a~ante
árvore, Semelhante a um.jardineiro, o pro- res na a~vidade lúdica, inventou cuidadoso -i!, da vontade, que se .alcança pela instrução. a noção de mteresse). Dal a rmpo:mnoa da
fessor não pode f"!>rçaro aluno, mas minis- equipamen~o, de acordo com a fase em que Como é possível perceber, para ele, a edu- instrução, caminhõ paraa moralidade.
trar a instrução "de acordo com 9 grau do se encontravam as crianças. As construções cação moral (fórmação da vontade) não se .Por isso Herbart critica ~usse~u e to~os
poder crescente da"criança". Ou seja, o mé- da primeira série foram por. ele chamadas • separa da instrução (esclarecimento intelec- os pedagogos que desva1o~~ a tnstruç,:o,
todo para educar funda-se em um princípio doTlS, como s~ fossem "dádivas divinas" .• tual) O que supõe uma unidade das ativi- da mesma forma que recnnnna a educaçao
simples: seguir a natureza. , •. .., til
Os 'dons são materiais destinados a' des- dades mentais (querer e pensart Por isso, tradicional por ensinar mUlta COISamu

210 Hístóri~ da Educação e da Pedagogia - Geral e Bra~i1 211


Século XIX: a edu~çã..9Jl_ª_ci_o_n_a_I . ,
.
para a ação. Reconhece. então a necessida- Os interesses de um médico estão na me- Para evitar o insucesso, Herbart propõe os a indução, isto é, o caminho do raciocínio .
de de utilizar o rigor .de um método para a. dicina e na' cirurgia; os de um banqueiro, "; cinco passos formais, que propiciam o desen- . que vai do concreto.para'o abstrato. Os cin-
~ducação da vontade. no dinheiro; os de um teólogo, na religião.. volvimento do aluno: co passos revelam também os pressupàstos
A diferença de conteúdo mental é devida -li'''' • preparação: o mestre recorda ojásabido, epistemológicos do empirismo, subjacentes
A educação da vontade áo fato de que, através ç!qsaI!0S,cada um '~ a fim de que o aluno traga à consciência a ao método de Herbart. Para ele, o conh~-
vem construindo' uma diferente massa de ,~' massa de ideias necessária para criar inte-
,li',
ciÍnento é oferecido pelo mestre ao aluno,
Segu'r).doHerbart, a conduta pedagógica ideias"3. . .•~ ressepelos novos conteúdos; que só posteriormente u aplica à experiên-
segue três procedimentos básicos: o governo, P~a Herbart, a instrução é compreen_",,'i • apresentação: o conhecimento novo é cia vivida.
a inst:rução e a disciplina. dida como construção (aliás, é este o sen- . apresentado, sem esquecer a clareza, que Sua psicologia, no entanto, sofre as res-
O governo é a forma de controle da agi- tido etimol6gico do termo), o que o leva a' para Herbart significa sempre partir do trições .a que já nos referimos no irúcio.
tação infantil, le'-'éldoa efeito inicialmente não separar a instrução intelectual da mo- concreto; Ainda que tenha corretamente refletido so-
pelos pais e depois pelos mestres, a fim de ral, porque uma é, condição da outra. Se • assimilação (ou associação ou compa- bre a unidade da vida psíquic1l, exagerou
submeter a criança às regras do mundo formar moralmeI!te uma criança significa' ração): o aluno é capaz de compat:ar o ao admitir que impulsos e desejos possam
adulto' e tornar possível o irúcio da instru- educar sua vontade, é preciso maior clarifl- ".c novo com o velho, perceber semelhanças nascer das ideias. Dai a crítica que seus
,'!
ção. Além da vigilância constante, .caso cação das representações e crescimento das e diferenças; . pósteros fazem (sobretudo a Escola Nova)
necessário, pode-se recorrer às proibições, idéias. É assim que Herbart julga possível • generalização (ou sistematização): além ao caráter excessivamente intelectualista do
. ameaças e punições, evidentemente com trazer à mente, com frequência, as repre- das experiências concr~tas, o aluno é ca- seu projeto. Considerar a possibilidade de
as devida.s recomendações para evitax..ex- sentqções mais adequadas, visando ao con-. paz. de abstrair, chegando a concepções controlar o sentir e o querer, afinã:t,supõe
çessos contraproducentes. É preciso ainda trole.do interesse. Convém ainda. estimular '. g~rais; esse passo é importante sobretudo depositar otimismo demasiado no poder da
combinar autoridade e amoT,além de man- o aparecimento de interesses múltiplos para . '.,- na aclolescência; . educação, Este mesmo poder significa,.de
ter a criança sempre ocupada.' que a 'educação seja completa. É essa a fi- • aplicação: por meio de exercícios,o alu- certo ponto de vista, a diminuição do cam-
A in.rtruyão, procedimento principal da nalidade dos cinco passõs formais examina- , no mostra que sabe aplicar o que aprendeU . po de atuação livre do educando. A questão
educação, supõe o desenvolvimento dos. . dos mais adiante. em exemplos novos; só assim a massa de é: tanto controle tornaria viável apassageni
interesses. O conceito de interesse adqui-. Além do governo e da. instrução, a dis- ideias adquire sentido vital, deixando de ser do governo para a disciplina? Vejamos, a
re em Herbàrt um sentido básico e muito ciplina é o terceiro procedimento básico da mera aC1.ÚIlulação inútil de informação. seguir, como o pensamento de Nietzsche é
específico, a partir da já referida tendên- conduta pedagógica que mantém firme a crítico desse tipo de educação. .
cia íntima do indivíduo de trazer ou não vontade educada no propósito da virtude. Avdliação da pedagogia
'um objeto de pensamento à tona. O mo- Enquanto o governo é exterior e heterôno- herbartiana 6. Educação e cultura: a crítica de
vimento de retorno à consciência pode ser mo, mais usado com crianças 'pequenas, a Niefzsche
estimulado pelas leis da frequência e da disciplina supõe a autodeterminação ca- Numa rápiCIa avaliação da teoria de
associação, que levam à formaçã'O do há- . racterística do 2,.'nadurecimentomoral, que Herbart, é' preciso reconhecê-lo como o Friedrich Nietzsch~ (1844-1~OO) usou
bito. Por isso, o interesse é um'poder ativo leva à formação do caráter propo~ta. primeiro a elaborar uma pedagogia que em seus. escritos o recurso dos aforismos,
qu1: determina quais ideias e experiências pretendia ser uma Ciência da educação. O ca- cuja força está no conteúdo questionado r e
receberão atenção. Método de instrução ráter de objetividade de análise, a tentativa . provocativo. Aliás, é assim, de forma con-
Assim explica Frederick Eby: '1\ supre- de psicometria, o rigor dos passos seguidos tundente e. crítica, que Nietzsche examina
ma arte do educador é, por conseguin- Insatisfeito com a precária assimilação e a sistematização são aspectos que deter- a cultura de seu tempo e lamenta o' estilo
te, trazer constantemente para a atenção do que se ensinava nas escolas, Herbart minam a sua grande influência no pensa- de educação: em toda a.sua obra condena
aquelas ideias que ele deseja que dominem atribuía a causa à aplicação inadequada to-pedagógico.. a erudição vazia, a educação intelectualiza-
a vída de seu aluno. Controlando, assim, a dos métodos, incapazes de relao.onar os Os cinco passos formais marcaram de da, separada da vida.
experiência da criança, o instrutor constrói conhecimentos àdquiridos com a experiên- maneira vigorosa o ensino expositivoda es- Vejamos a primeira'parte de Assimjàlou
massas de ideias que, por sua vez, se desen- cia do indivíduo, o que resulta em material cola tradicional, que adquiriu um cã.ráter Zaratustré ~'Das três transmutações"), em
. volvem pela assimilação de novos materiais. inutilmente memorizado e logo esquecido.' de rigor por emprestar do método cientifico que ele cita as mudanças possíveis do espí-
..
, HIStória da .riucOfão mntkrna: teoria, organização e prática edu~onais. Porto Alegre, Globo, 1962, p. 412.
.
• + Zaratustra (ou Zoroastro) foi um reformador religiosO persa que teria vivido no século VI ou VII aC.

212 História da Educação ê da Pedagogia - Gerab,]lasiJ Século XIX:a educação nqçIonal.. 213
rito humano, que de camelo pode se fazer nossos impulsos vitais. Agimos'de'acordo da. natureza infantil, justificava a vontade Além disso, ao nacionalizar-se, a educa-
leão, e de leão se transformar em crian<;a. com ó "yocê deve" e não com o "eu que- de aplicar a psicologia à educação .. ção demonstrava interesse de formar o ci-
Descrevendo o espírito como camelo, ro". A posição reativa do leão:é intermedi- . Mesmo que tenha persistido a tendên- dadão. Pensadores socialistas, como Owen
Nietzsche diz: "O que é pesado? assim per- ~a porque. ousada; mas'negativa: o leão .'",
cia individualista, própria do liberalis- e Fourier, destacaram a neéessidade dã.edu~
~"
gunta o espírito de carga; assim ele se ajoe- apenas conq~staa 'liberdade de criação, mó, surgiram nítidas preocupações' com cação integral e politécni,a e a,de democra-
.{
lha, igual ao camelo e quer ser bem carre- .continuando 'ressentido e niilista (no latim os :fins sociais da educação e a necessi- tização do ensino.
gado. (... ) Todo ess pesadíssimo o espírito nihill, "nada"). Quem pode criar, no en- dade de preparar a criança p~a a viill!- No entanto, em pleno século de valori-
de carga toma sob! si: igual ao camelo, tanto, é a criança .
"1"1'.

em sociedade. Enfatizou-se a relação entre- zação das ciências, do progresso e da exal-


. que carregado corre para o deserto, assim Assumindo O tom profético de Zaratus- . educação e bem-estar social, estabilidade, tação da' técnica, vozes dissonantes, como
ele corre para seu' deserto. I Mas no mais tra, Nietzsche quer destruir a antiga or- progresso e capacidade de transformação. a de Nietzsche, advertiam' sobre (, excesso
solitárifJ deserto ocorre a segunda transmu- dem que aprisiona o espírito, mas não sem :f Daí o interesse pelo ensino técnico ou pela de discipUna e os risco~'d~ uma..~vilização
tação: em leão se torna aqui o espírito, li- apresentar a esperança da criação de novos expansão das disciplinas científicas: excesSivamentepragmática. ..
berdade quer ele conquistar, e ser senhor de valores que sejam "afirmativos'da vida": ad
seu próprio deserto". criança simboliza o começo, a possibilidade
Adiante, diz: "Meus irmãos, para que de recuperação das energias vitais que fo- ,j,~
é preciso o leão no espírito? Em que não olhávamos para o mapa, 'pois'só agora
ram abafadas pela longa trajetória da edu-:,
" basta o animal.d~ carga, que renuncia e é cação greco-judaica-cristã. havíamos adquirido a capacidade de in-
respeitoso? I Criar novos valores - dis- Ao criticar os "homens cultos" da Ale- I .Para os primeiros elementos de geo- terpreti-Iocorretamente. (Relato de um
so nem mesmo o leão ainda' é capaz: mas manha, Nietzsche os vê imbuídos q,e uma grafia éramos levados âo ar livre. Co- ' aluno de PeStà.J.ozzi, apud E Eby)'
criar liberdade para nova criação - disso ~ultura livresca - que não passa de um. .. meça-:am por.' conduzir nossos passos
é capaz a potência do leão. I Criar liber- "verniz", de um adorno -, os quais aC1;l- na direção de' úm vaIe' afastado, perto- 2. Nós filósofos não temos a lib~rdade
dade e um sagrado Mio, mesmo di.a.o.tedo mulam conhecimentos alheios e imitam de Yverdun, ao longo' do qual flui o de separar entre alma e corpo, como
dever: para isso, meus irmãos, é preciso ser modelos de modo artificial. Condena tam- Bfuon. Devíamos olhar para esse vaIe . o povo separa, e menos ainda temos a
o leão". bém a escola utilitária e profissionalizante, como um todo em suas diversas partes, liberdade de separar, entre alma e es-
. Finalmente, completa:. "Mas dizei, meus bem como os riscos de um ensino submeti- até que tivéssemos dele uma impressão pírito. Não somos rãs pensantes, nem
irmãos, de que ainda é capaz a criança, de do à ideologia do Estado. Mais ainda, acusa exata e completa. Então nos era dito, aparelhos de objetivação e máquinas
.que nem mesmo o leão foi capaz? Em que de "filisteusS da cultura" aqueles que a tor- a cada um de nós, que devíamos cavar registradoras .com vísceras congela-
o leão rapinante tem ainda de se tornar em certa quantidade de barro, que havia das - temos ÇQ,nstanteÍnentede pa-
nam venal, ou seja, que transformam toda
criança? .1 Inocência é a criança,.() esque- produção cuItüral em mercadoria, objeto em camadas de um lado do vaIe, come, rir nossos pensamentos de nossa dor e
cimento, um começar-de-novo, um jogo, isso,enchíamos grandes folhas depapel, maternalmente transmitir-lhes tudo o
de 'venda, de cons~mo.
uma roda rodando por. si mesma, um pri- trazidas para esse fim. . que temos em nós de'sangue, coração,
meiro movimento, um sagrado dizer-sim. Conclusão Quando chegávamos à escola, éra- fogo, prazer, paixã,o, tormento, consci-
I Sim, para o jogo do criar, meus irmãos, mos postos ao redor de grandes me- ência, destino, fatalidade. Vwer - as-
é preciso um sagrado dizer-sim: sua vonta- .sas, que eram divididas, e cada criança sim se chama para nós, transmudar
No decorrer do século XIX, com a ex-
de quer agora o espírito, seu mundo ganha devia, com o barro, construir, na par- constantemente tudo o que nós somos
papsão das escolas públicas, o Estado assu-
para si o perdido do mundo". te que llie fora destinada, um modelo em luz e chama; e também tudo o que
miu, cada vez mais, o encargo da escolari-
De que fala Nietzsche? Que a educação do vale que havíamos recentemente nos atinge; não podemos fazer de outro
zação. Outro fato importante é a atenção
_tem -.!.125 transformad,o em camelos cheios observado... Então; e somente então, modo, (Nietzsche)
dada à educação elementar, contrária à •
de conhecimentoo desligados da vida ::- tendência até então voltada para o nível se- !
,' para e1:~, "o erudito é um eunuco do sa- cundário' e superior. O cuidado côm o mé-
ber" - e obedientes, prontos para negar todo de ensino, baseado na compreensão .
"
. ,

I F"~teu: no. sentid •• literaJ, povo que ocupou 'aoPalestina mi Antiguidade; no sentido figurado, "burguês de
espmto estreito e vulgar".

214 História da Educação e da Pedagogia -" Geral e Brasil Século XIX: a educação nacional 215
• Leituras complementares ~de e fundamental inspiradora de todo ,£l1;fumlouco, um doente, um condenado, físicas, coações materiais. Apenas um olhar. ..
processo formativo. Em Schiller;a arte vê- ull1operário ou um estudante. Devido ao . Um olhar que vigia e quecada.um, 'sentin-
O [A Bildungalemã] '. -se assim reconduzida a wn comportamen .. efeito de contraluz, pode-se percéber ,da do-o pesar sobre si, acabará por interiori-
to universalmente humano, o do jogo que, torre, recortando-se na luminosidade, as zar, a ponto de obseivar a si mesmo; sendo'
A pedagogia do neo-humanismo, elabo- enquanto atividade que se organiza segun-; peq~enas silhuetas prisioneiras nas celas • assÍIn, cada Umexercerá esta vigilânciaS'8~
rada na Alemanha por Friedrich Schiller, do finalidades livres, é fixado como uma ;; , da periferia. Em suma, inverte-se 0- prin- bré e contra si mesmo. F6ririula maravilho-
Wolfgang Goethe e WJ.1heImvon Hum- . disposição essencial do homem, capaz de <C; cípio dá rr;asmorra; a luz e o olhar de um sa: um poder contínuo e,de custo afinal de
boldt, apresenta-se como uma referência permitir-lhe um crescimento mais harmo-';;' vigia captam melhor que o escuro que, no contas irrisório,. '
moso e completo. .);
explícita ao humanismo dos séculos XV e .t 'fundo, protegia .
(... ) o olhar vai exigir muito pouca des-
XVI e desenvolve-se como uma reflexão
orgânica em torno do homem, bem como me::~~~n;~~:u:a::c::;:en;:d~~ j pesa. Sem necessit¥ de armas, violências
Michel Foucault, MlCTOfisica do podf!/'. Rio .de]anei-
ro,Graal, 19.79,p.210 e 218.
da cultura e da sociedade em que ele de- vários problemas educativos, mas man- ~;'
veria idealmente viver, O Ú:mapedagógic9 ' tendo-se (à parte Humboldt que tentará j
°
dominante nesses autores é da Bildung (ou realizar uma reforma escolar inspirada .:G
nesses princípios) num plano de reflexão ~\
Ativieléleles ção, enquantq O 'restante da sociedade
formação humana) que aponta na' direção é ignorante e pobre, pouco importa o
de um ideal de homem integral, capaz de filosófica, geral e idealizante, dando vida a ,~~. nome que dermos à relação entre uns e
W Questões ger.ais
conciliar dentro de si sensibilidade e razão, uma utopia pedagógica que teve um papel ~ outros; em verdade e de fato; os segun- '.
.\
dede'senvolver a si próprio em plena liber- profundamente inovador no âmbito das",
teorizações educativas. i 1. Considerando o crescimento indus- =i:fus serno os dependentes servis e sub-
dade interior e de organizar-se, mediante trial e o fenômeno da urba.D.Íz%ãono jugados dos primeiros. Mas, se a edu-
uma viva relação com a cultura, como per- século'XIX,discorra sobre as decorren- cação for difundida por igual, atrairá
Franco Carnbi, História da pdc.gogia., Sãó Paulo,
sonalidade harmônica. A Bildung é tensão Ed. Unesp, 1999, p.420 e 421. tes necessidades da educação. ela, corri a mais forte de todas as forças,
esplritual do eu, contato profundo com as posses e bens, pois nunca atorltecl:;U'e
várias esferas da cultura e consciência de @ [O Panopticon] 2. Que fatores econômicos estimulam . nunca aconte'ceráqüe 'Uincorpo de ho.-
; um crescimento interior para formas de
_,:J o ~teress~ pelas escolas politécnicas? . mens inteligentes e práticos venha a se
personalidade cada vez mais complexas e No final do século XVIII, O jurista:frremy BI!n- conservar permanentemente pobre".
Que tendências filosóficas justificam a
harmônicas. Para realizar esse modelo de tham imaginou zana consl:rução a que dl!nominou necessidade dessa procura?
"formação humana"; é necessário reapro- Panopticon, que significa "ver tudo". O fil6sofl 6. "Realizaçõ~ belas-artes, belles-let-
ximar-se da cultura dos clá,ssicosgregos e frr.rru:ês MiChel Foucault retomou, no século xx, 3. Discorra sobre a impo:Ftânciadas re- tres, e todas estas coISasque, co~o nós'
revivê-la, já que foi justamente na Grécia esse relato, eonsi.derarulo-o iruii&atioo do processo dizemos, constituem o florescimento.da
formas educacionais na Alemanha. ,
que a harmonia entre instinto e razão, en- iniciado na Idade Moderna pelo qual se constituiu 'ç:ivilizaçâ.o,deveriam estar totalmente
tre individualidade e cultura/sociedade foi a soci.edtuIe disciplinar, baseada no controle e uigi-
mais plenamente atingida, mas é também
4. Déscreva o ,método monitorial (ou s:UbQrdinadas àquele conhecimento e
láru:ia (nafábrica, na escola, na prisão) no Iwspícia, disciplinã--w,bre os quais a civilização
mútuo) e identifique os interesses so-
oportuna a tendência a superar aquelas no exército).
ciais e econômicos, subjacentes à sua repousa. AssiÍD.como ocupam a parte
ciSões radicais que caracterizam a cultura O princípio é: na periferia, uma cons-
implantação. de lazer da vida, assim deveriam ocu-
ocidental moderna (cristã.e burguesa) en- trução em anel; no centro; uma torre; esta par a parte de lazer da educação." Com
tre sentimento e intelecto, entre espírito e possui grandes janelas que se abrem para
corpo, entre destreza e conhecimento. Daí
$. Identifique, nesta citação de Horace base na citação de Herbert Spen.cer;
a parte interna do anel. A construção pe: responda: .
.1
o papel central que esses autores atribuem Mann, ~ esperança que movia sua atu-
riférica é dividida em celas, cada uma ocu-
'ação ped"agógicanoestado dê Massa- a) Qual seria a espécie de cooheâ,
à arte: nas pegadas do Kant da terceira pando toda a largura da construção. Estas, ::,
cllUsetts:"Nada, por certo, salvoa edu- mento"sobre o qual a ci\Iilização re-
Critica [A C1Ítica do juíZo], identificam justa- celas têm duas janelas: uma abrindo-se '1'
cação universal, pode cC1ntrabalançara pousa"?
mente na atividade estética o fulcro dessa para o interior, correspondendo às jane- "
tençlência à dominação do. capital e à b) Identifique o pressuposto pqsi-
educação harmônica e integral. A arte ela- las da torre; outra, dando para o exterior, \t<i
, servilidade do trabalho. Se uma classe tivista do pensamento de acordo. com
bora, por meio da fantasia, um equilibrio permite que a luz atravesse á cela de um~'
possui toda a riqueza e, toda a educa- esse tipo de subordinação.
de necessidade e de libeldade, de intelecto e lado a outro. Basta então colocar um vi- :'~:
gia na torre central e em cada cela tranca-
-'-', sentimento e, enquanto tal, deve torllar-se a

216 História da tducação e da Pedagogia - Geral e Brasil Século XIX:a educação nacional 217.
i , 5. Lémbrando como era o ensino antes, os el~mentos que justificam a critica de
j c) Que programa de ensino ésta con- 12•.Qual é a diferença entre governo e ;Foucault. . .
do Renascimento, que alterações ocor-
cepção costuma estabelecer?, discíp~a,'para Herbart? ..•', ,"',#, reram e~tão "nadisciplina escolar?
. 8. Baseando-se no conceito de class~',
I
I
7~Em que aspectos as correntes socia- 1~.Qual foi a importância de Herbart: 6. O que o autor quer dizer com a "in- - social, como um:sociali~tacriticariússà '
listas contrapõem-se à concepção bur- para o fortalecimento da escola tracü":'
teriorizaçãõ'\ .do olhar do outro?' interionzação do ol,hardo outro?
guesa de pedagogia? cionai? ' ,:

7. Identifique na educação do século 9. E Ni~tzsi::h~,:


.
que critica
. .faria?"
~
8. Que elementos da pedagogia de Pes- 14. Releia o dropes 2 e responda: XIX e sobretudo no método monitorial
talozzi o aproximam de Rousseau? a) Que tipo de dicotomia do pensa-
mento tradicional está sendo criticado'
9. "Eu eramteiramentecontrário a . por Nietzsche?
.solicitar ojui.gamento das crianças apa- b) Como essa divisão prejudicou o

I
rentemente maduro antes, do tempo, modo de ensinar do seu tempo? [
atespeito de qualquer assunto,mas
, preferia contê-lo ao ináxitno, até'qué Questões sobre às leituras,
I. elas tivessem -realmente visto; com: seus complem.enta1'es _]!rasil: de colônia a Império
próprios olhos, o objeto sobre o qual
deveriam se manifestar." Com base na Cornbase na leitura complemeI1tar
citação dePestalozzi, responda: de Franco Cambi, responda às questões Contexto histórico 1. A mudança da Corte para o Brasil
a)Qué Crítica Pestalozii está fazen-
.
a segurr.
'

Em 1808, devido aos atritos da Corte


do ,à pedagogia tradicional?
portuguesa com Napoleão, a família real
b) Em oposição, qual é a novidade Duove CC'ollJ0Io!}õen ~
da sua proposta? ' , ' - , mudou-se para a colônia, sob a proteção
[aoll'Íodlo da Inglaterra. A cidade do Rio de Janeiro
c) Compare o teor dessa citação
2. Tendo em vista a formação integral,. .. ,precisou adaptar-se rapidamente ao gran-
, .com o rélato de um aluno de Pestalozzi, • 1808 - vinda da família real 'de número de cortesãos que invadiram
transcrito no dropes 1. qual é a importância da arte? para o Brasil. suas casas e as ruas antes 'pacatas. A yida
• 1817 - Insurreição Pernàm- em Vila Rica, .Salvado-r e Recife também
10. FroeheI foi uni pioneiro da educa- 3. Explique como esse ideal'da forma-:-,.,.,; bucana. . sofreu alteraçõ~ graças às nov~ exigências
ção da primeira inf'ancia. Discuta çom • ção integral não se consuma na socie- " •• 1822 - Independência do administrativas.
seu grupo a importância atual desse dade contemporânea,excessiv~ente'- ' Brasil.
'rb!.. C~m a.vinda de D.João VI,. o Brasil pa!i-
tema e quais as facilidadeaque ,temos tecnológica e pragmática. :~ • 1822-1831- Primeiro Reina-
~ sou por modificações consideráveis: a.aber-
hoje' e faltavam na época em que ele do (D. Pedro 1). tura dos portos e a revogação do alvará que
VIVeU. Com 'base na leitura complententar -: • 1831-1840 - Período Regencial. proibia a instalação de manufaturas signifi-
de Fqucault, sem deixar derelembra,r ,~ . • 1840.1889 - Segundo Reina:- caram, de certa forma, a ruptura do pacto
11io Justifique' ai natUrezainte1etfualiS: , a~eetôsjáestndad~nos,(jà~tulos ki.~' do (D. Pedro ll). colonial. Eram alguns passos sugestivos em
. ta da pedagogia de Herbart contida na tei1oresrefer(;ntes: à ,formação da bur- '" '1864-1870--;-GuerradoParaguai. direção à Independência, embora tenh~
citação: "-O valor do homem não está guesia, reSponda às questões aseguir.;: • 1888 - Lei Áurea (abolição da
, , . ' '" ficado mais nítida e direta a dependência
• em seu sabex;mas em ,seu quêreI'.'Mas " esc:ravatura). brasileira ao governo britânico. Corno ve- .
:- não existe algo como uma faculdade in- 4. Por que a disciplina passou a cons- , • 1889 - proclamação da Re. remos adiante, importantes trimsformações
.dependente de vontade: A volição tem titiÜr,Um elemêIítb .unportante para a.: pública. culturais resultaram da instalação da im-
suas raízes no pensamento". ' implantação da economia burguesa?
.
prensa, museu, biblioteca e academi~.

---i~:_ História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil


Século XIX:a equçação nacional ,21,9
'i,
.
2. Brasil Império . . tivona década de 1870, substituindo aos
poucos a mão-de-obra escrava.
Embora a República tenha sido procla-
mada no final do século XIX, abordaremos
•Museu 'Real (1818), depois Museu Na-
cional: começou com material fornecido
•.
Medidas ecoIi.ômicasadotadas beneficia- A atuação do barão de Mauá imprimiu a última'dé~ada ~o capítulo 11. pelo rei, depois tecebeu a coleção minera-
vam a aristocracia rural, que, no entanto, se pequeno surto industrial. com a produção ~,; lógica deJosé Bonifácio e várias coleções de .
achava excluída.das decisõespolíticas, esfera de navios a vapor, construção de estradas . Educa~ão. zoologia doadaS por natur~tas.estrang'ei-'
em que os ricos comerciantesportugueses ti- de ferro, instalação de.telégrafo e abertura :\.. . ros.em viagem pelo Brasil.
nham melhor trânsito. A tensão entre esses de bancos. Embora o processo de.industria-. 1. Período joanino o Missão cultural francesa (1815): foram

doissegmentosdá sociedade,a alta taxação de lização não tenha sido levado a bom termo, c~nvidados artistas fra:nc~es, como Lebre-
impostos e asideias iluministascontra o abso- devido às falências, as cidades cresceram e . De modo geral, podenios dizer que no ton, Debret, Taunay, Monttgny e outros,
lutismoreal criaram um climade animosidade a sociedade tornou-se mais complexa com século XIX ainda não havia uma política que influenciaram a criação da Escola
que preparoü a Independênciado Brasil. o aumento dos quadros da pequena bur- ;~ de educação sistemática e planejada. As Nacional q.e Belas Artes. Apesar do valor
Devido a turbulências em Portugal, guesia urbana. • . mudanças tendiam a resolver problemas dessa obra; convém lembrar que a estética
D. João VI retornara à melTópole, deixan- Em 1870 terminou a Guerra do Para- imediatos, sem encará-los como um todo. e.strangeira se firmou à revelia do estilo bar-
do aqui o príncipe, que proclamou a Indé- guai, cujas consequências desastrosas afeta-:" Quando a família real chegou ao Btasil, roco brasileiro, interrompendo a tradição
pendência em 1822, assumindo o nome de ram osjá abalados alicerces da monarquia. .e' existiam as aulas régias do tempo de Pom- da arte colonial.
D. Pedro 1. Esse movimento significou a vi- . Em 1888, deu-se a abolição da escravatura, . bal, o que obrigou o rei a criar escolas, so- As primeiras medidas a respeito da edu-
tória do partido brasileiro, dos moderados, e em 1889 foi proclamada a República. bretudo superiores, a:fim de'atender às ne- cação tomadas por D. João VI assim que
constituídopelos grandes proprietários de ter- A propósito" do conservadorismo bra- cessidadesoQ.o_momento;,, chegou.aoBrasil,ém1808,foram.a criação
ra, defensores da.mant.ttençãada escravismo; .' sileiro, diz SérgidBuarque: de Holanda: Além das.adaptações administrativas ne- . de' escolas'de nível superior para"atender às.
bem como deliberais conservadores. Assim, '.~ democracia no Brasil foi sempre,uni la- cessárias-,houve'oincrementodas ativida-.. necessidades do momento; ou sej'a,formar
enquanto na Europa o liberalismoCaminha- mentável mal-entendido; Ufua .ai1stocracia des culturais, antes inexistentes ou simp1es- oficiais do 'exércitO'e' ~marinha (para a'
~i,
va a passos largos:para a industrialização, no rural e semifeudal importou-a e tratou de. '~ mente.proibidas~ Essas iniciativas estavam defesa da colônia)~ ~enheiros militares,
Brasil a reforma política não propiciou mu- acomodá-la" onde fosse"possível,'aós 'seus - de.acordo como movimento iluminista que ~. médicos; e a:aberturade cuisos especiais.de
danças econôrIÚcasesociaissignificativas. direitos ou privilégios"osmesmos privilégios já aniadurecera na.Europa. . caráter pragmático. Vejamos algumas des-
Em 1831, D. Pedro I abdicou (para assu- que tinham sido, no Velho Mundo, o alvo da sas realizações. •
mir a Coroa em Portugal, como Pedro IV), luta da burguesia contra os aristocratas.E as- Transformações culturais e criação de o Academia Real da Marinha (~808) e
e, devido à minoridade de seu filho, o Bra- sim puderam incorporar à situação tradicio- cursos.superiores Academia Real Militar (1810): .após 1832
sil foi governado por regentes desde aquela nal, ao menos como fa~da ou decoração foram anexadas; compondo Uma institui-
data até 1840, quando começou o Segundo externa, alguns lemas que pareciam os mais • No penodo joanino, foram as seguintes ção. de engenharia militar, naval e civil;
Império, com n Pedro lI. acertadospara a época e eram exaltados nos . as inovações no campo.cultural: . com sucessivas junções e desmembramen-
Na segúnda metade do século XIX, ul- livrose discursos". Em seguida, o autor nota o Imprensa Régia (1808): até então as 'tos, a Escola Militar organizou-se em 1858
lTapassadaa crise econômica decorrente da .que movimentos como a Independência e publiCações eram proibidas; surgirám 'sob' e a Es.çolaPolitécnica em 1874, codo ins-
queda da produção de açúcar e de algodão, a República partiram de cima para baixo. proteção oficial: a Gazeta do Rio de Janeiro tituiçõ~ .que prepâravam para a ~ _
o cultivo do café expandiu-se, reativando-o Cita, então, o testemunho de AristidesLobo (1808) e, na Bahia, A ú{ade de ouro no Brasil militar e formavam t?igenheiros civis, res-
comércio. Além disso, os Estados Unidos . - um dos integrãntes da conspiração que (1811); já o Correio BrtWlimse, impresso em pectivamente ..
consumiam mais da metade da exportação provocou a queda do Império - a respeito Londres, era o único jornal de oposição à • Cursos médico-cirúrgicos:.a partir de
cafeeira. Dessa maneira, ao lado do modelo dos acontecimentos de 1889,segundo o qual p~lítica de nJoão VI. '. 1808, na Bahia e no Rio; visavam à forma-
agrária-exportador dependente, teve início a ~on- o povo teria aSsistido a tudo "bestia1izado, o A biblioteca (181O), ~tura Biblioteca ção de ~édico~ para a marinha e o exérçito.
solidação do modelo agrario-camercial-exparta- atônito, surpresq", mesmo porque, nãquele Nacional: composta por 50 mil volumes o Divirsós cüriós -aVúlsósdeecoDornia,

dar deperuJ.mte. momento, "a cor do govern(4"era "pura- trazidos por D.João VI; em 1814:foi fran- .química e agricultura, tambéInna Bahia e
O trabalho assalariado de milhares de mente militar."e "a colaboração do elemen- queada ao público. • . no Rio. ' -, -
imigrantes também já se tornara significa- to civilfoi quase nula"6. , o Jardim Botânicodo Rio (1810):incentivou As faculdades propriamente ditas, tais
os estudosde botânica e zoologia,fez o levan- como as de ensinojurídico, foram criádas
,~ento das vari~dadesde plap.tase animais, já no período d~ Primeiro Império, corrio
• Rtzí<:esda Brasil. 23. ed. Rio deJanei:-o,José Olympio, 1991, p. II9 e 120. bem como estimulouexpediçõescientificas. veremos mais adiante.

220 Histól'la da Educação e da Pedagogia - Ger91,e Brasil SéciJlo XIX: a educação nacional 221., .

--'-----~.,,~~i
,'.' I
1t .' 2. Império: os três níveis de ensino vam a um sistema nacional de instrução pú-. deveria esperar o tempo necessário para ser sua forma original ou geralmente mesclada
• ~.:,
blica que resultou em lei nunca cumprida. resolvido satisfatoriamente, muito embora a outros métodos.
A Assembleia Constituinte foi dissolvida .~: fosse inConcebíve~na sua ausência, o fun- O fracaSsoda experiência deveu-se a vá- .
Ao examinarmos os três níveis de ensino
e a Constituição, outorgada7 pela Coroa. ,~.; ciq,namentode novo regime constitucional. rias causas. A necessidade de salas bem anl-,
nos periodos do Primeiro e do Seguijdo Im- • plas'Para.abrigar grande número de alunos
pério, notamos as dificuldades de sistl!mati- Mantiveram-se o princípio de liberdade ,~ E,'muito discutido e emendado, o primeiro
de ensino sem restrições e a intenção de ;~ projeto apresentado pela Comissão de Ins- certamente não foi contemplada, porque 'os
zação dos dois primeiros níveis, por conta
dos interesses elitistas da monarquia, que "instrução primária gratuita a todos os ci- F trUçãofoi engavetada e esquecido antes de prédios usados, sempre de improviso; não
dadãos". 'Finalmente, foi instituida a lei de ;:~ ser aprovado"9. Comõ veremos adiante, a eram apropriadas. Fal~va, ainda, materiai
não se importava com a educação da maio-
1827, "a única que em mais de um século .:: .postura dos deputados diante da criação de adequado, tais como bancos, qUo.éIros,fi-
ria da população, ainda predominante- .j;
se promulgou sobre o assunto para todo o faculdades foi bem outra. chas, si~etas, compêndiqs etc. Apesar de te-
mente rural. O ensino secundário também
foi conturbado na medida em que se confi- país e que determina a criação de escolas 1; Por isso, embora já na Constituição ou- rem sido criadas escoláf normais em vários
de primeiras letras em todas as cidades, vi-'~ torgada de 1824 houve~se referência a um estados para a instruçã~~o ~étodg mútuo,
gurava propedêutico, portanto atrelado aos
.," ".
lase lugarejos (art. lll)e, no art. XI, 'escolas ':::'. "sistema nacional de educação", esse pro- os professores, alé~ de'descontentes COJ;l1
interess~s do ingresso nos cursos superiores.
de meninas nas cidades e vilas mais popu- i' jeto não foi contemplado ,em 1827. Sem a a remuneração, nem sempre estavam bem
, Veremos, em cada um dos níveis (elemen-
tar, secundário e superior), as medidas do losas'. Os resultados, porém, dessa lei que £. exigência de conclusão do curso primário preparados. . , .
fra,cassou por várias causas, econômicas, para o acesso a outros níveis, a eliteeducava E lamentável notar qu~, no texto da nos-
Decreto Imperial de 1827, a descentraliza-
técnicas e políticas, não corresponderam seus filhos em casa, com preceptores. Ou- sa primeira lei sobre instrUção pública ~e
ção de 1834 e, finalmente, as décadas após.
aos intuitos do legislador"8. -: tras ve~es,os pais se reuniam para contratar 1827, havia. a seguinte explicitação: "Para
. ~870, c.uja fermentação de ideias gestava
Aquele ideal do ensino para todos logo professores que dessem aulas em conjUnto as escolas de ensino mútuo se aplicarão os
não só os ideais abolicionistas e republica-
foi considerado inexequíve1, e o Decre.to~. para seus filhos em al$UffiÍugar escolhido. edificios,que houverem com suficiêncianos
nos, mas também novos horizontes para a
Imperial de 1827 reservou para o ensino Portanto, sem vínculo com o Estado. lugares delas, arranjando-se com utensílios
educação.
elementar algo' muito menàs ambicioso. L Para os demais segmentos sociais,resta- necessários à custa da Fa7,~.ndaPública ... _
".&"
Os professores que não tiverem a necessária
o ensino elementar Assim comenta a professora Maria Elizabe- va a oferta de poucas eScolascuja ativida-
instrução deste Ensino, irão instruir-se em curta
te S. P. Xavier: 'í\. necessidade e a urgência de se restringia ,à instrução elementar: ler,
da criação de um sistema de instrução pú- escrever e contar. Segumio o relatório de prazo e à custa das seus ordenados nas escalas das .
A situação era bastante caótica no ensi-
blica foram, durante todos os debates, di- Liberato Bar.roso, apoiado em dados ofi- capitais. [grifo nosso]". Como consequência,
no elementar. Embora o modelo econômico
retamente associadas ao caráter do regime ciais, em 1867 apenas 10% da população os .r~sultados da experiência foram medí-
brasileiro, predominantemente agrário, ti-
político nacional e liberal: educar homens ,,~ em idade escolar se matriculara nas escolas ocres e artificiais, principalmel1~eporque,
vesse sofrido algumas alterações na segunda
livres, capazes de sustentar o novo sistema . primárias. além de tudo, esse método se ancorava na .
metade do século XIX em razão do incre-
representativo". No entanto, a execução " Uma experiência 'realizada foi a implan- atividade de monitores,.os-pr.óprioScolegas
mento do comércio e, mais para o final, de-
do .projeto foi protelada porque. se argu- li tação do método de ensino mútuo ou moni- de 10 ou 12 anos, incllIl1bidosde repassar o
~vida ao pequeno surto de industrialização,
mentou que antes deveria haver mell,1or 1. torial, copiado do pedagogo inglês Lancas- aprendido aos demais. ::;, .
esse modelo não favorecia a demanda da
conhecimento de nossa realidade, além de ter (ver parte I deste capítulo) e que tinha Pela feforma de 1834>, o ensino elemen-
educaçãõ, que não era vista como meta prio-
uma base teórica que exigia a reElaçãode o objetivo de instruir o maior nÚInero de tar, o secundário. e o de formação de pro-
ritária, apesar da grande população rural
um "Tratado da Educação Brasileira".,Em alunos com o menor gasto possível.Desde fessor~- foram descentralizados, passando
analfabeta composta sobretudo de escravos.
continuidade à citação anterior: 'í\. procIa- 1819 surgiram algumas tentativas de .sua para a iniciativa e responsa:bilidade das
Logo após a Independência, já na As-
ma~a urgência do problema nãq implicava aplicação; e na continuidade dos debates, províncias. Só o curso superio.rficaria a en-
sembleia Constituinte de 1823, as discussões
a tomada de decisões apressadas e inade- nõs qUais geralmente ~ exaltadas suas ~rgo do poder central. Veremos no próxi-
voaram alto demais. Motivados pelos ideais .
quadas. O problema da instrução popular vantagens, o método foi adotado por decre- mo item como na verdade se tratou de uma
da Revolução Francesa, os deputados aspira-
• to em 1827. Arrastou-se sem muito sucesso pseudo descentralização quanto ao ensino
provavelmente até 1854, e, mesmo depois~ secundário e quais os problemas d~corren-
, A Constinrição é aprooalia quando os deputados da Assembleia Constin.rlnte a submetem à aprovação do Coo- .~ ainda era aplicado em alguns lugares, na tes dessa determinação.
gresso. Ela é outorgada quando elaborada por outros que não os deputados eleitos e imposta de forma autoritária . 'i,
à~. •
o .Fernando de Azevedo, A cultura brasileira: intrd'dução ao estudo da cultura no Brasil. 4. ed. n:v. e ampl. Brasília,
Ed. UnE, 1963, p. 564. 9 Podir políJico 'eeducllfão ik eli~. 3. ed. São Paulo, Cortez/ Autores AsslÍciados, 1992, p. 59-6l.

História da Educação e da ~edagogia - Geral e Brasil Século XIX:a educação nacional


Na segunda metade ao século XIX, dis- sores improvisados, incompetentes e, devido parcelados para ccrnferir'grau de bacharel, Leôncio de càrvalho -- "o inovador de
cutiu-se acerca' da necessidade de prédios aos baixos salários, obrigctdosa se dedicar a indispensávelpara.o asesso aos cursos supe- - ensino IJ.lais-audaciosoe radical do pericrdo
adequados para o enooo, com muitas crí- outras atividades ao mesmo tempo. nores. Essa disto~ fez com queo ensincr do Iihpério", segundo Fernando de Aze-
ticas em jpmais e nas assembleias sobre a Não havia vinculação entre.os currícu- .•. secundário se desinteressasse da fcrrmação Vedo- estabeleceu normas para crensino,
precariedade das instalações oferecidas aos los dos diversos níveis, aliás, nem sé poderia global dos alunõs, tornando-se ainda mais primário, secundário e supenor na reforma'
alunos (ver dropes 1).No último quartel do falar propriamente em currículo, em razão propedêutico. 'Como agravante, crsdemais. de '!a'79. Nessa lei, defendia a liberdade de'
século XIX recrudesceu, na sociedade e da escolha aleatória de disciplinas,sem ne-. liceus provinciais precisavam adequ~ seus ensino (mclusive sem ;a: fiscalizaçã<ldo go-
nas instâncias do governo, o debate sobre nhuma exigência de se completar um cUrso programas aos do colégio-padrão, inclusive vemo), de 'frequência, de credo religioso
a educação, sobretudo a respeito dos novos para iniciar outro. Ao' contrário, eram os . usando os mesmos livros didáticcrs.Muitas (os não-católicos .ficavam desobrigados de
métodos aplicados em outros países. Ape- parâmetros do ensino superior que deter- vezesnem chegava a haver-currículo nessas assistire~ às aulas de religião" a criação
nas depois da proclamação da.Repúblicaé . minavam a escolha das disciplinas do ensi- esccrlas,mas sim aulas avulsas das discipli- _ de' escolas. normais. e o fim da proibição
que começaram a ser construídos os "gru- no secundário, obrigandO-'Oa se tornarpro- nas que seriam objeta de exameó ' de matricula deeseravos. Estimulou ainda
pos escolares" e intensificaram-se as discus- pedêutico, destinado a preparar os jovens Como vimos na segunda parte do ca- ' a organização de colégios ccrm propostas
sões pedagógicas já iniciadas no período para os cursos superiores, pítulo anterior, o Seminário de Olinda, . divergentes, como, por e..xemplo,osde ten-
pré-republiC<IIlo. O golpe de misericórdia que prejudicou Pernambuco, fundado ainda em 1798pelo .dência positiviSta,que, valorizando as ciên-
Fernando de Azevedo nos informa que a de vez a educação brasileira veio, no entan- bispo Azeredo Coutinho, constituía notá- GÍas,pudessem superar o ensino acadêmico
taxa de analfabetismo no Brasil atingia em to, de lHIla emenda à Constituição, o Ato vel exceção à tradição humanista e literá- e humanista da tradiç~o colonial. Teve a
1.890a cifra:de 67;2%, herança da penada Adicional dd83,hEssa:reforma~descentra"- ria. Sob ainspiraçãcr. das ídeiasi1uminis:tas;. iniciati~'desugerki . ::t,ada<tãO'_ d'O-;métoci'F-
imperial que .a República nãmconseguiria . lizotl crensino;~tribUin<hà Coroadimção .• que.impregnavanrasreformas;pombalfuas. -"intuitiw> 0U, de;'lições de'.ooisas;;(êomo"ve-
reduzir. senão a 60,1%, até1920; de promover eregulamentaró'ensino.SlI~ .. n<t"Universidade de. 8oinlbn;-:aquele co-o -remos-mFtóPiC(vPedagõgia!;'Mà:s~ nem todas
perior, enquanto às províncias-(futuros-es- 1égiodestacava"o ensino das-ciências, das essaspropostaS seefetivaiãiii:. -"
o ensino secundário' tados}foram destinadas"a' escola elementar línguasvivas.e de literatura: moderna:; sem A refurma,dê,~ôncio de'Carvalhcr, em-
e a secundária. Desse.modo; a ed'llcaçàocia' se.-descuidaTdeaplicar uma nova:metodo- 'bora' radical, esteVe.em vigor,'por-pouco
Segundo Fernando de Azevedo, "a edu- elite ficou a cargo do 'poder central e a do logia. Para ValnirChagas., o Seminário de tempo, mas é\ discussão ~obre a:interferên-
cação teria de arrastar-se, através de todo povo, confiada às províncias. Olinda foi "o germe da verdadeirã esco- cia ou não'do EstadO-GOntmiolotkaCesã:.-J?or.
o século XIX, inorganizada, anárquica, in- A descentralização impedia a Unida- la secundária brasileira,~porem cõnstitciu exemp[ê>,-RUi-Barbosa>atriõUía";ao~do--ã. ..
.cessantemente desagregada. Entre o ensino de crrgânica do sistema educacicrnal, com uma exceção brilhante-e efêmera". Dian-' obrigãção -detomar parã stõs-êtlÍâãâõS'com -.-
primano e o secundário não há pontes ou o agravante de deixar o ensino elementar te da gran.de influência do Seminário de .. a educação, porque, entre outras coisas, as
articufaçÕes:são dois mundos que se orien- para a incipiente iniciativa das províncias, Olinda:,Fernando de Azevedo admitia que esccrlasparticulares se orientavam pelas leis
tam, cada um na sua direção" lO. Essefracio- com' suas múltiplas e-precárias orientações;. as raízes da Revoluçãa.Pernambttcana de' ' do mercadO'; Essallwseussâesrepercutiriam
namento, sem úm eixo unitário, com uma Como resultado, muitos decretos e projetos 1817 se encontravam na difusão das ideias de maneirà mais efétiwnos. primeircls-ànQs
dualidade de sistemas, em tudo era prejudi- de lei.apresentados às câmaras legislativas liberais. . '. da República. . _
cial à educação. Enquan,to outros países ca- transformavam-se rapidamente em letra , Ncr mesmo espírito inovador; Azeredo A tendência de criar-es.colasre1igi~sas'no. -
minhavam em direção oposta, promov~ndo morta. Coutinho fundou o primeiro.colégio para" Brasil do século XIKera opoS'1;a~,d?resto: .
a educação nacional, nosso ensino perdia N() que se refere ao- ensino secundário, aS meninas de casa-grande e de sobrado, do murido, cuja laicização se tornava "tada
ainda mais a unidade de ação. porém, ocorreu uma pseudo descentraliza- isto é, para as filhas de senhores de engenho vez mais frequente. Entre nós, predomina-
O precário sistema de tnbutação torna- " ção, pois em 1837 foi fundado no Ricr de . e para as da elite urbana. • va ajuda a ideologia religiosa, sob-retudo a .
va a falta de recursos um crônico empecilho Janeiro o Colégio D.'Pedro lI, que ficou sob A partir de meados ,da década de 18~0_ católiGa:J-('()_~odô_de 1'8_6JLa18~ â1jli:'~
'1 para qualquer realização, seja a construção a jurisdição da Coroa. Destinado a educa,; novcrsdebates tomaram conta- das assem- ciativa particular organizou-se, criaJ:1doím-
de escolas,seja a preparação de mestres, ou a' a eliteinteleetual e a servir de padrão de en- bléias e da sociedade, no sentido de impri- portantes colégios,j,J:lêlu~vedejesuítas, que ..
sua remuneração mais decente. Por isso,não sino para os demais liceus do país, esse colé- mir nas escolas 6 viés mais liberal em im- retornaram oitenta an~s à:Póssua eXpulsão.•. ~:--
era boa a qualidade do ensino, com profes- gio era o único autorizado a realizai-exames plantação nos Estados Unidos, de defesa Um exemplo foi o dólégio' São-Lui5, fúü~ ~.:
das ideias de h'berdade de ensino e de cons-- dado na-cidade de--ItU,-€ID-l861-(e-depóis, • '
ciência, bem como as novidades pedagógi- tranSferidopara São PaUlo, em.1917): Ou- .
10 A cultura Imzsileirc;:introdução ao estudo 'da cultura no Brasil. 4.ed. rev. e ampL, p. 568. cas que circulavam no exterio't. tro. o Colégio câraÇà,. érn Minas GeraiS,
.
~." - ~ 1. '" ~_

224 ~istória da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Século XIX:a educação nacional T ',,225 ...

." - ..
" ~,~

~, .~'"' .'' ,' ': ;:.;,<;';:::',',;, :'


vidade jurídica, mas para ocupar funções mútuo -, iria predominar ainda por muito
.. fundado em 1820, passou em 1856 para a
direção dos padres fra.fJ.ceseslazaristas, de
Neste càpítulo já nos referimos a alguns
CJ¥'Sosde nível superior iniciados no Brasil administrativas e.políticas ou dedicar-se ao tempo, em decorrência da concepção "ar-
metodologia avançada. ainda no període joanino, cuja instalação li- jornalisri:J.o.
Além disso, o diploma exúcia tesanal" da formação do p'rofessor,
Também os protestantes trouxeram ino- gava-seintimamente à defesamilitar da colô- "t uma função de "enobrecimento". Letrados Aliás, era grande a distância entre o dis- .
vações dfl'educâção americana para o Colé- ._nia.e ao atendimento dos i:qteressesda família e eruditos, com ênfase na formação huma- curso, que valorizava a profissão docente,'e'
gio Mackenzie, em São Paulo (1870),'0 Co- real aqui sediada. Apenas depoisda Indepen- nística, cada vez mais se distanciavam do a sua prática efetiva, porque o próprio go-
légio Americano, em Porto Alegre (1885), o dência é que foram criados os doiscursosju- trabalho fisico, "maculado" pelo sistema verno pagava mal e não oferecia adequado
escravista. apoio didático às escol1iS.Além disso, sele-
Colégio Internacional (1873),em Campinas ridicos:um em São Paulo (no Largo de São
cionava os mestres em c~ncursQs'e. exames
(estado de São Paulo), entre outros. Francisco)e o outro em Recife.Ftmdados em
3. A formação de professores que dispensavam a formação profissional.
Destacaram-se, no entanto; importantes 1827,passaram a faculdadesem 1854.
Segundo Leonor Maria~Tanuri, nesses exa-
iniciativas leigas, como é o caso da Socieda- Os cursos superiores, mesmo quando
de Culto à Ciência, deCmnpinas, São Pau- transformados em faculdades, permanece-Para melhorar à formação de mestres, mes - que por não tere.m a devida publici-
lo, fundada por maçons. Com pressup'ostos ram como institutos isolados, sem que hou- foram fundadas as escolas normais. A pri- dade eram pouco disputaaos -, o candida-
de inspiração positivista, oferecia o estudo vesse interesse-na formação de universida- meira delas foi a Escola Normal de Nite- to deveria mostrar que ~'lêcorrentemente,
de ciências, menosprezado pela tradição des (que só surgiriam no século XX). De ,.; rój (1835), capital da província do Rio de escreve com maior ou menor apuro caligrá-
human1stica. No Rio deJaneiro e na Bahia qualquer forma, a atenção especial' dada". Janeiro. Funcionava precariamente com fico, efetua.as quatro operações fundamen-
surgiram outras escolas leigas, criadas ge-' ao ensino superi9r reforçava o caráter eli- •• um só professor e poucos cilunos.Fechou tais da aritmética, às vezes com dificuldad~
ralmeJ:ite por iniciativa Q.emédicos e enge- tista e aristocrático da educ,açãobrasileira, em 1849 por falta de alunos, para retor- e alguns erros; a parte teórica não é devida-
nheiros, com extremo cuidado na contrata- que privilegiava o acess?aos nobres, aos nar mais tarde às atividades. Em seguida, mente aprofundada. Em Religião, recita de
ção de mestres de valor. proprietários de terras e a uma camada in-o surgiram várias outras escolas normais nas cor as orações principais da Igreja: respon-
. Os colégios leigos da época eram os mais termediária, surgida da '!IDpliaçãodos qua- diversas províncias, tais como em Minas de a uma ou outra pergunta, 'sem contudo
progressistas e renovadores. Acrescentando- dros administrativos e burocráticos. Gerais (1836, instcilada em 1840), Bahia dar provas de que Cabalmente compreende
-se a estes osjáreferidos colégios religiosos, Na continuidade.dos comentários da,. (1836, instcilada em 1841) e São ~au10 os principios' e a doutrina"!2.
percebe-se que grande parte da elite se di- professora Maria.Elizabete S. P. Xavier, a (1846). Por volta.das décadas de 1860, 70 Outra causa que agia contra a formação
rigia às escolas particulares. Além disso, ospropósito do engavetamento do projeto do e 80 QUtrastantas foram criadas. No en- adequada de mestres era o costume de no-
poucos liceus provinciais fundados pela ini- ensino elementar, como vitIl0santeriormen- tanto, tinham duração instável, fechando mear funcionários públicos sem concurso,
ciativa pública enfrentavam dificuldades di- te: "O mesIno não ãconteceu cõm o projeto e retornando às atividades, como'''plantas devido à troca de apoio, forma de cliente-
yersas, decorrentes da falta de organização e de criação de Universidade, apresentado,;' exóticas [que] nascem e morrem quase no lismo que sempre existiu- e continua exis-
. tindo - no Brasildos l~s de família e dos
de recursos, corpo docente mal-habilitado e discutido e aprovado sem muitas delongas. i mesmo dia". .
até de insuficiente número de altmos, o que A finalidade e viabilidade imediata do pro- O descaso pelo preparo do mestre fazia favores que estimulam ~ yrálica de nepotis-
levou rn.uitosa f~charem as'portas. jeto foram tomadas como premissas. Não s~nti.doem uma sociedade não comprome- mo e protecionismo.
. se questionou seriamente da necessidade tida em prior;izar a educação elementar. Geralmente as escolâs normais ofere-
O ensino superior ou :finâlidade de Universidades em um país-, Além disso, prevcileciaa tradição pragmá- ciam apenas dois a três ~os de curso, mui~
:- destituído de educação elementar; e não se:, rica de acolherprofes~9Í'es sem formação, tas vezes de nível infenor ~o secundário.
cogitou da possibilidade de um adiamento a partir do pressuposto de que não havia Para ingressar, bastava saber ler e escrever,
No capítulo anterior, vimos que, para
até ocasião mais propícia"lI.? necessidade de nenhum método pedagógi- ser brasileiro, ter 18 anos de idade e bons
frequentar os cursos superiores, os jovens costumes. De início, atenqiam apenas rapa-
brasileiros deviam atravessar o Atlântico Os cursos jurídicos eram os que mais' co elipecífico.Essa tendência, embora co-
I. e dirigir-se às instituições europeias, so- atraíam os.jovens D.a_~egtmda ~e!ade; do ~~se a ser.criticada pelo governo -:.. a zes: a primeira escola normal de São Paulo,
só trinta anos depois de fuildada, passou a
bretudo Coimbra e
Évora, em Portugal. século"XIX,
cl.~oprestígio
época de ouro
vinha.sobretudo
do bacharel,
do uso da;-
• Escola
1835
Normal
para que
de Niterói fora fundada em
os mestres aprendessem a oferecer uma seçãopara mulheres, e, com o
Aqui havia, sim, cursos superiores, como tempo, a clientela tornou-se predominante-
os seminários, mas destinados à formação tribuna. A camada intermediária procu- aplicar o método laRcasteriano do ensino
rava esses cursos, não só para seguir a ali-
de padres.
..
12 ReMa Bro.rileira de Edu&afãa, Campinas, Autores Associ;J.doslAnped (Associação Nacional de Pós-Graduação

e Pesquisa em Educação), n 14, maio ;J.agosto de ZOOO,p. 65.


Q

11 Pot'!7' pol:í!ico~educafão de ~lites. 3. ed.

: Século XIX:a educação nacional 227


226 História da Edlic.a~º e da Pedagogia - Geral e Bras~

.. _J. .,~._- ---~ - ••••• " __ ~ 'M •• _, ,_~ _.. ••


mente féminina. Essa ferninização deveu-se desinteressava da educação popular e tam- Como os homens livresaesprezassem es- Em 1825, D. Pedro I autorizpu o funcio-
em parte à lenta entrada da mulher na esfe- bém da formação técnica, privilegiando as ses oficios,o governo usou de subterfiígios namento do Seminãrio.de Educandas de
ra pública, e porque a profissão do magisté~ profissõesliberais destinadas à IIÚnOria.Da para conseguir formàr artífices, confinando São Paulo (ou Seminário da Glória), que
rio era uma das poucas que permitiam con- mesma forma, até pouco ú:mpo a historio- desocupadose miseráveispara a aprendiza- diferia dos antigos asilos para meninas ór-
ciliar C901 as.obrigações doméSticas. Além grafia voltava as atenções para a formação gem compulsória nas guarnições militares fãs ou desamparadas pelo fato de que aÍnÍ-
'disso,constituía uma atividade socialmente 'das elites políticas e intelectuais, e menos e navais. ciativa não cabia às ordens 'religiosas, mas
aceita, por se pensar que estava ligada à para esse segmento da educação. Entre 1840 e 1856, as Casas de Educan- ao Estado. De início, na verdade, ahrigava
experiência maternal das mulheres - de Nossa tradição humanística, retórica e dos Artífices,caractenzadas pela disciplina as filhas.de rnilltares em' serviço, bem como
novo o aspecto artesanaL da educação -, literária, distanciada da realidade concreta militar, foram criadas em dez provínciàs. as órfãs daqueles que haviam morrido nas
e, por fim, mas .não por illtimo, trat~va-se vivida, não valorizava a educação atenta Um dos estabelecimentos de destaque foi o lutas da Independência. Mas também fazia
de um oficio cuja baixa remuneração era aos problemas práticos e econômicos. Alia- Asilodos Meninos Desvalidos, em 1875, no. a guarda das:meninasque precisavam ser
a~eita mais resignadamente. por elas. va-se a isso a mentalidade escravocrata; que qual se recolhiam crianças de 6 a 12 anos afastadas temporariamente das famílias. Aí
Por volta das décadás de 1860 e se- desprezava o trabalho feito com as mãos, (verdropes 5).. aprendiam a ler, escrever, contar; bordar,
guíntes, quando o interesse pela educação tendo-o como humilhante e inferior. É pre- Organizações da sociedade civil esti" cozinhar e eram "protegidas dos vícios" e
recrudesceu nos debates da sociedade, a ciso ficar claro, porém, que a desvaloriza- mulavam a aprendizagem de oficios, ge- da "depravação dos cost1:unes".
formação de professores adquiriu maior ção d~s oficios com os quais os escravos se ralmente com apoio do governo para tais . Mas foi com a lei de 1827 que pela
relevo, ~o lado de inúmeras outras provi- ocupavam~como carpinteiros, ferreiros,pe- empreendimentos. Foi o caso da fundação primeira vez se determinaram aulas re-
dências para melhorar,a-ensino: Segundo-. dreiros;:tecelões'etc:) e~~devida.::não"~t(} ,/ dos Liceus cle:.Artese Oficios: o primeiro gtdares para' as- meninas;' embora -airrda'.-'.
Tanuri, se daquelasescolas-.:nor~s cria- pelo tipo de.trabalho,em'sí,mas.peloJato ; deles.surgiuem.1858'noRio deJaneiro, de"'. se justificasse ~ue s~a educação tinha por
.~;!
i
I
das na&.déeadas.de,J,33O:~e...1MO,.haviam_, decesses...oficios...estaremsemprerelaciona-. ", . país.vieram o deSalvador.(1872} ecode São objetivo O m~hor' ex~rcíGio,das.~'funç.€ies
, restado apenas quatro em i~67, já~' dos à condição social inferior de quem os, Paulo (1882), até se ê:ompletárem oito dcles maternais" que elas hél;veriam.t:1mdia de
1883 enéontravam-se 22 delaS funcionan- exercia.' no país. . exercer. Essas aulas deveriam sermiuistra-
do em todo o Brasil. Vrmos, na segunda parte do capítulo ~. . Além de formação para o trabalhoquali. das por "senhoras honestas. e prudentes",
Dessa feita, o. que se propunha era pre- anterior, que, até a primeira metade do sé-i ficado, essasesc-olasexpressavam um cunho das quais não se exigiriam grandes conhe'-
parar o professor para'''sa.her_se:portar,''sa:~ 'culo XVIII, os jesuítas ofereciam oficinas #: assistencialistaque não se desvinculava do cimentos, uma vez que; em aritmética,'
ber o que ensinâr e saber como"ensinar": .• para a formação de artífices, mas com a .~\
interesseem disciplinar os segmentospopu- por exemplo, bastava ensinar as quatro
Por exe~plo,' ápóssua reatiVação~a Escola"' suá expulsão, embora es.saatividade con-1 .lares;devido ao temor que a elitesentia com operações. O problema, porém, decorria
Normal de Niterói teve como diretor, no tinuasse precariamente por iniciativa par- o exemplo dos movimentos de oposição à da impossibilidade de conseguir mulheres
periodo de 1868 a 1876, o bacharel e jor- ticular ou de outras ordens religiosas, ela ordem'política, então frequentes na Europa. que tivessem o mínimo preparo, e, q;lian-
nalista Alambary Luz; que trabalhou com . demorou a ser tratada com mais atênção .~.; do tinham pelo menos um pouco, podiam
.a intenção de tornar aquela instituição uma - pelo Estado. ~ ~ 5. A educação Cla mulher não ser aceitas se não soubessem as "artes
escola-modelo. Nesse períQ(jo~o currículo De fato, isso só ocorreu por ocasião da .~ da agulha". Segundo dados de 1832, "por
foi ampliado e ennquecido, ê a-aprenâíZa- ' 'vinda da família real para o Brasil. Como .A maioria das mulheres no Império vivia falta de professorado idôneo, não atraído
gem da metodologia pedagógicamoderni- vimos, as primeiras medidas de D.João VI em sítu~o de dependência e inferior-ida- pela remuneração parca", em todo o Im.
zou-se, acatando as novidades da Europa privilegiaram cursos de formação superior, de, com pequena possibilidade de instru- pério. o número de escolas p"itra meninas
e dos Estados Unidos, que enfatizavam o a não ser o Colégio das Fábricas, criado ção. Em algumas famílias mais abastadas, não chegava a vinte.
• ensino intuitivo. Aindacom esse pz:opó.sito, em 180Q e destinado a ensinar oficios aos às vezes elas recebiam noções de leitura, . Com a criação da seçãõ feminina na
, Alambary Luz' importolLlIl~teriaLclidátiC!L.-ó.t@9s~qus:_ aqw._chegaramcom a comitiva mas se dedicaw,m sobretudo às prendas do- Escola Normal da P~ovíncia, em.l875, as.
próprio para a aplicação do método {que. rea! e aprendiam com artíficesque também mésticas,à aprendizagem de boas maneiras moças poderiam se profissíonalízar na car-
veremos adiante)., - .. - -' -,-_ vieram de Portugal. O ensino não ocorria e à formação moral e religiosa. O objetivo rerra do magistério. Mas, dada a precarie-
em escolas, mas nos próprios locais de tra- y era sempre prepará-Ias para o casamento e, dade desses cursos qUll,conforme já vimos,
4. Outros cursos proHssionalizantes balho, como cais, hospitais, arsenais milita- ~ quando muito, procurava-se dar um "ver- ora abriam, ora fechavam, o resultado era
--,' - - .. res e da marinha. Só mais tarde é que estes ~. niz" para o convívio social, daí o empenho. ruim, insatisfatório. Além de que apenas no
O ensino téccico no penado do Impé- se dedicarap:1também a ensinar as primei-, em lhes ensinar piano e línguas estrangei- final do século a classe docente começou a
._~ .:~~.
rio era bastante incipiente. O governo. se. ras letras a eSsesjovens.

HiStória da Educação e' da Pedagogia - Geral e Brasil


ras, sobretUdoo francês.
..
Século XIX:a educação nacional
se tornar predomÍnanlemente feminina,

.229.
Devido à falta' de"ensino públicosecun- reformas sociais, imbuídos de que "a cren- resultaram da lenta passagem de uma socie- dos métOdOSpossíveis,eram discutidos as-
dário para as. moças, quando elas tinham ça inabalável do poder da educação como dàde rural-agrl\ola para urbano-comercial.. s~tos diversos, tais como higiene escolar,
posses, frequentavam as atilils em escolas fator de mudança' social, de um lado, e, de As forças .conservadoras de uma tradição castigos corporais, atuação do Estado na
particulares confessio.nais protestantes ou outro, como fator de justiça social, consti- ..• agrária sustentada por escravos resistiam educação, formação de professores, esco~á
católicas. tuía, por assim dizer, a qüestão-chave de às ideias "liberais implantadas na Europa, popular etc:
De qualquer forma, as mulheres acha- cuja solução dependia, o progresso da sacie. onde a "economiacapitalista se encontrava ". . Àssim diz Maria Helena Camara. Bas-
vam-se excluídas da possibilidade de acesso dade brasileira" 13• em expansão. tos, em um artigo que; não por acaso, se
aos cursos superiores, mesmo que se pre- Aos poucos foram surgindo e"scolas,50- :';:1, De fato, vimos no tópico Contexto histórico chama '1\ educação c~mo espetáculo": '~
parassem adequadamente em escolas par- bretudo dirigidas por instituições de reli.. .,i que no último quartel do'século XIX ocor- conferências'populare$, públicas, .literárias,
ticulares ou com preceptores. Isso porque giosas francesas, voltadas para a educação. .t reram diversas mudanças significativasno pedagógicas ou 'de p~fessores são recanhe.
para tal nio se exigiam diplomas, mas era feminina. Se em 1832 havia vinte escolas .:.'~, .lt,"
Brasil: surto industrial, fortalecimento da cidas corno fator re!e~te para o progres-
necessário fazer os exames preparatórios primárias femininas em todo o Império, em burguesia urbano-industrial, aceleração da so e melhoramento d.ainstrução primária.
~;
aplica dós pelo Colégio D. Pedro TI,destina- 1873 apenas aprovínciade.são Paulo con. " política imigratória, abolição da escravatu- Têm caráter educativo e modernizante de
dos exclusivamente ao público masculino. tava com 174 unidades. ':ú ra e por fim a queda da monarquia e á pro- vulgarização 9.0 conhecimento; têm uma
Consta que a primeira mulher a se matri- Merece destaque o Colégio Piracicaba- £. clamação da República. perspectiva de atualização, de.continuação
cular na Faculdade de Medicina do Rio de no,internito. feminino fundado. em 1881 ;.',~ No campo das ideias, o então dominante dos estudos depois da formação, de vulga-
Janeiro foi Dona Ambrozina çleMagalhães, no interior da província de São Paulo e di- .~! pensamento católico começava a enfrentar .rização e aperfeiçoamento dos métodos de
em t881. No ano seguinte, mais duas se rigido por Marta. Watts, missionária norte-~; a oposição do positivismo e da ideologia li- ensino das diferentes matérias, língua fran-
matricularam - uma delas assistia às aulas -americana que implantou um enSinoavan-.: beralleiga, que exerceràm forte influência cesa, cálculo, métodos de leitura e escrita,
acompanhada pelo pai e a ou~ por uma .çado. D~ origem leiga, destaca-se também .'1:: na libertação dos escravos e na proclama- métodos de geografia e hÍstória"H.
senhora idosa, o que demonstrava o temor o Colégio para Meninas, em São'Paulo, sob '1., ção da República. No campo educacional, Outras medidas focam tomadas, tais
que a emancipação feminina (ou a sua ex- a direção de Ràri.gelPestana, que ali impri- ..~. a orientação positivista do ensino intensm. como o Congresso da Instrução, em 1883,
posição pública) provocava. miu o ensino das lições de coisas: "": cava a luta pela escola pública, leiga e gra- por iniciativa do própno imperador Pe.
No entanto, a educação feminina espe- tuita, bem como'pelo ensino das ciências. dro ILA abertura.de debates estava sendo
rou a fase pré-republicana do final do sécu- Pedagogia Não se pode negar, portanto, que nas comum nos países mais adiantados, bem
lo para começar a despertar maior interes- ,"
.~";
últimas três décadas do século XIX tenha como as exposições pedagógicas e a ins-
se, quando então, no burburinho das ideias 1. ReAexães pedagógicas no final do fermentado o debate sobre questões pro- talação de- mUseus. Também aqui foram
inovadoras, se começou a falar em coedu- Império priamente metodológicas. Esse pro€esso criados inúmeros museus de educação,
. cação, o que supunha oferecer também às começou com a reforma Couto Ferraz, em não só para os mestreli; mas tanlbém para
mulheres os estudos antes reservados aos No século XIX ainda não havía propria- ) 1854, que visava a regulamentar a instrU- . o público em geral. }!'toliotecas, publica-
rapazes .• Apesar disso, a controvérsia era mente o que poderia chamar-se pedagoi-a ção primária e secundária do M~~cipio. ções diversas e livros propunham dissemi-
grande: os mais conservadores, temendo o brasilei:ra. No entanto, alguns intelectuais, da Corte. Nessa ocasião foram instittÍídas nar questões edu~aciQnais. A divulgação
desmonte do sistema patriarcal e a dissolu- influenciados pelas ideias europeias e nortc- ~. as coriferê7lcias pedagógicas, com a intenção de das noVas'ídeias era feita também pela im- -
ção da família, usavam como 'argumentos -americanas, buscavam novos rumos par,a;, difundir as ideias novas para professores, prensa comprometida com o objetivo de
a "natureza" inferior da inteligência femi- . a eduçação, apresentando projetos de leis, bem como para o público interessado. No ampliar a instrução popular, tais como os
nina e seu destino doméstico; outros, mais criando escolas, além de promoverem signi- entanto, as conferências foram realizadas jornais A Província de S. Pauto (fundado por
liberais, destacavam a importância da sua ficativodebate abertO para a sociec;1,ade civil. apenas a partir de 1873. Até l886,.apenas Rangel Pestana.e hoje O Estado de S: Paula)
educação para o exercício das funções de Tratava-sê de uma atuação ii:regular, na Corte organizaram-se nove delas, mas e a Gazeta de Qa1}1.pin~ _ _._ . ._._.
esposa e mãe; os mais avançados, como fragmentária e quase nunca com resulta- i diversasoutras províncias também apresen- Poucb antes, em 1882, o conselheiro Ro-
. Tobias Barreto e Tito Lívio de Castro, po~ dos satiSfatórios, devido à distância &ntrea} taram as conferências a um público ávido dolfo Da,ntas apresentara ao parlamento
rém, percebiam que a educação da mulher teoria e a .prática efetiva. Isso se devia às , das novidades dos paises adiãntados. Além um projeto de reforma, estudado por uma
exercia o papel central de um programa de situações, ml1itas vezes contraditórias, que f.

.•• ']\, educação como espetáç1.l1o",iÍ1Maria Stephanou e Maria Helena Garoara Bastos (orgs.), frlStórias e memó-
13 Helleil;th l. Saffioti, A mulher na sociedade de classes: mito e realidade. São PaUlo, Quatro Artes, 1969, p. 223. rias da tduca;ílo IW Brasil, v. II: Séaúa XIX, p. 117.

História da r:"dui:âção e da Pedagogia __ .Geral e Brasil'~ Século XIX: a educação nacional 231
230
.",)00

comissão especialniente nomeada, cujo re- A ênfase do método está no reconheci- Em VeZ de educar no estudante os senti- nas estruturas sociais,na perspectiva de que
lator era Rui Barbosa. O extenso parecer mento de que os sentidos.são a porta para dos, de industriá-loem descobrir e pensar, a educação equivalia a 'progresso' "'5.
em que ele analisa a situação do ens~o no todo conhecimento. Ao contt:ário da tradi- a escola e o liceu entre nós oêupaÍn-se ex-
Brasilficoufamosopelaerudiçãoeeloquê.n- ção, que valoriza o ensino discursivo, que '#0"" clusivamente em criar e desenvolver nele Conclusão
cia. Apesar de fazer também um levanta- atua por raciocínio lógico 'e, pórtantà, é t. os-hábitos IP~câI¥cos de decorar, e' repetir.
mento cuidadoso do ensino nos paíSesmais. abstrato, busca-se começar a instrução pri- ~ A ciência e o sopro científico não passam .Eram muitas as contradições sociais e
adiantados, resultou daí "um plano ideal e .. mária educando a sensibilidade, pela qual ..~ por nós". políticas de um país cuja economia conso-
teórico", distante da realidade brasileira, percebemos cores, formas, sons, luz etc.. l' Outros livrosforam traduzidos e também lidava o IJlodelo"agrário-comercial e fazia
portanto incapaz de soluções eficazes. É esta que prepara e antecipa a intuição~~' . escritospor pedagogos brasileiros, como foi as primeiras tentativas de industrialização.
De qualquer forma, essa fermentação de intelectual; quándo então percebemds as o caso de João Kopke. Esse educador, c0It1 Debatiam-se os segmentos renovadores -
ideias alimentou durante. muito tempo as relações (de igUaldade, causalidade etc.) en- experiência em sala de aula, abriu escolas que aspiravam aos ideais liberais e positi-
esperanças de transformação da sodedade tre ascoísas. Ou seja, rejeitando a educação inova40ras, cujo ensino se baseava na àpli- vistas da burguesia europeia - e as forças
por meio da educação universal, no espírito livresca, a criança deveria aprender a ler o.. caçãç do método intuitivo, e eScreveutrata- retrógradas da tradição ..agr:ária escravo-
que mais tarde iria caracterizar o otimismo' mundo visível,pela observação e percepção dos de pedagogia e livros pata crianças. crata.
da Escola Nova, confiante no caráter de de- das relações entre osfenôrrienos. De modo sintético, a professora Maria Como vim'os, o poder. da rp.àçuo man-
mocratização ~a educação. Embora a expressão "lição de coisas"ser- Helena Camara Bastos diz: 'í\s ideias que teve o privilégio de classe ao valorizar o
vissepara indicar o método intuitivo aplica- i, circularam no Brasil, através das conferên- ensino superiox>emdetrimento dos demais
2. O método intuiflVo do em todas as disciplinas, com frequência.' cias pedagógicas, das conferencias papula: níveis, sobretiléfo'o elementar e o técnico,
ela'designava o ensino elementar das ciên-. res, do Congresso de Instrução, da exp9si- sem falar evidentemente da' desprezada
Depois do fracassO na implantação do' - cias da natureza,. isto éirestringia-se.a uma: ção pedagógica e escolar, da museu escolar educação da mulher.
J método monitorial 1ancasteDanç>,na pri- das disciplinas do C:1irriculo.Buisson mes- e pedagógico, dos impressos, faziam 'Parte Ainda que no final do Império surgis-
I, meira metade do século XIX, a grande m.o reconhecera essas duas possibilidades, de um. movimento internacional, no qual sem algumas esperanças de muàança no
discussão pedagógica na segunda metade mas ressaltava ser importante comp.reender'" a elite intelectual brnsileira procuravainte- quadro educacional, por conta de intenso
desse século deu-se em torno do método in- "lição de coisas" como método constituin- grar-se e vivenciá-Iona sua realidade social. debate sobre a educação, a situação do en-
tuitivo e lições de coisas. Essas ideias surgiram te iie todo programa de ensino. Rui Bar- An mesmo tempo que partitipa~ ~o~E"s: ~-sÍi1ocontinuava muito precária. Deixamos
na América Latina sobretudo pela divulga- bosa considerava importante a divulgação ~do, favorece!1doa s:l!~IE:an?t~~o, ~eSsc:~ _. ~ an.~se da educação da Primeira Repú-
ção do pensamento dos franceses Célestin do método intuitivo entre os profeSsorese, intelectuais preconizavam transformações. blica para o capítulo 11.
Hippeau (1808-1883) e Ferdinand Buisson para tanto, traduziu Pri.meiras lições de coisas,
(1841-1932). Ao participar da Exposição do norte-americano Norman Calkins.
de Paris, em 1878, Buisson se referia aos Em R4ôrma do ensino seCU1Úló.Tio e superior, . .ló '~ educação {;Orno espetáculo", in Maria Stephanou e Maria Helena Camara Bastos (orgs.), Hut6rias t memó-
riastÚl educaç~ IW BrasiL v. II: Slculo XIX, p. 130. .' . _ • ~ . .
antecessores desse método: os empiris- Rui Barbosa avalia o ensino do seu tempo:
tas Locke e'Condilac; a defesa da "razão "Perceber os fenômenos, discernir relações,
sensitiva" de Rousseau; a v;alorização da comparar as analogias e as dessemeIhanças,
educação popular po.r Pestalozzi, que de- classificaras realidades, e in.dtlziras leis, eis
fendia o desenvolvimento espontâneo do a ciência; eis, portanto, o alvo que a educa-
ção tem em mira. Espertar na inteligência
Dropes tovelas e tomar notas, um pote e uma
aluno, baseando-se na intuição psicológi-
caneca,. e aí temos armado o alcatifa-
ca; o'equipamento lúdico para o desenvot- nascente as faculdades' cujo concurso se re-
q1iernesses processos de descobrir e assimi- :
"1 • Corilo o professor é pobre ~ ~scass9.. do palacete da i.Iistrução. Agrupam-se
vimento sensório-motor das crianças. na
Õ órdenado~ i.nstalã-aescolã.-numa sa- ai dentro 20, 3Uóu~tfOcrianças, tend~
primeira ÍIÜancia inventado por FreebeI. lar a verdade, é o a que devem tender oS
leta qualquer, contanto que sett:barata' por único horizo~te as frestas sombrias -
Mas Buisson reconhece 'em Marie Pape- programas e os métodos de ensino. Ora, os'
e lhe,não absorva o'ordenado. A tÚul; -de wna r6tulã16 e durante quatro (iu
Carpentier a popularização mais recente nossos métodos e os nossos programas ten-
de mobilia procura doisóu três bancos cinco '~oras diárias martirizam os ou-
do método e a criação de material didáti- dem precisamente ao contrário: a entorpe- .
de pau, uma cadeira para si,-uma mesa __~vidas ~ s:s cordas vocais da laringe em
co, como a Caixa de Lição de Coisas e a cer as funções, à atrofiar as faculdades que
onde ao menos possa encost<[ros co- insólito berreiro, respirando ar viciado
Lanterna Mágica, aparelho para projetar habilitam o homem a penetrar o seio da
figuras com forte apelo visuaI. natureza real e perscrutar-lhe os segredÕs.

232 História da Edu~ação e da Pedagogia - Geral e Brasil Século XIX: a educaçã=à~n=ac=io~n=al~- ---'- ~_ 233'
-l
• í o Leitura cori1plemen~r os grupos de convívio. Tal representação
-I era articulada na confluêilcia de diversos
e póeÍra, arruinaqdo a saúde, cansan- vez com três anos de curso, iI. 2 de agosto
[Escolas de improviso] fatores, dentre os quais queremos destacar
do a inte1igênci,a, matando a vontade de 1880,(Fernando de Azevedo)
-, """; os de ordem político-cultural, pedagógica;
de aprender, a natural. Curiosidade in- científica e administrativa. . - ' '
4 • Nessa sociedade, de economia ba- A questão do espaço para abrigar a es-
fántil' e a paciência (... ). O resultada 'No que se refere ao~ primeiros, há que
seáda no latifUndio e na escravidão, e à cola pública primária começou a aparecer
é t~rnar-se a escoli- o mau sonho das se considerar que a instituição e o fortale-
qual, por isso, não interessava a educa- especialmente a partir da segunda década
crianças. (Editorial de A prou£ncia de S. cimento do Est~do Imperial eram fenôme-
ção popUlar, era para os ginásiose as es- do século XIX, em algumas cidades da en-
Paulo, 13/01/1876, apud. Maria Lucia nos, também, político~culturais.Relaciona-
colas superiores que afluíam os rapazes tão colônia, e, posteriormente à Indepen-
Hilsdorf) dência, em -yáriasprovíncias do Império, do a isso estava o fato de .que a escolariza-
do tempo com possibilidades de fazer os
quando intelectuais e políticos puseram em ção, rio mundo moderno como um todo
2 • Em 1836, havia na cidade (São Pau- estudos. As atividades públicas, admi. ;' circulação o debate em torno da necessida- fazia parte dos age'u~iameIitos de dar ~ ~
lo) apenas dois professores de primeiras nistrativas e políticas, postas em grande
de de se adotar um novo método de ensino ver e de fortalecer -as ~strutuJ'as de poder
letras, um da freguesia da Sé e outro na realce pela vida' da .corte e pelo regí-
nas escolas brasileiras: o método mútuo. estatais, podendo, mesmo, ser considerada
de Santa Ifigênia, (... ) ambos parlidá- me parlamentar, e os títulos concedidos
(... ) Todos reconheciam que para abrigar como um dos momentos de realização dO';
.rios' dos castigos corporaiS como meio pe16imperador contribuíam ainda mais
dezenas ou, mesmo, centenas de aprendizes Estados modernos. (... )
para valorizar o letrado, o bacharele 'o -,,;
de manter a disci,plina. Numa. repre- fazia-se necessária a construção de novos Em segundo lugar, as discussõespedagó~
sentação dirigida à Câmara Municipal, doutor~(Fernando de Azevedo)
espaços escolares. _ gícas, sobretudo aquelas referentes às pro-
-pediam "a concessão de alguns castigos .~,.
(00.) A solução aos problemas espaciais, postas metodológicas, foram demonStrando
fisicos em suas escolas a.fiID de melhor
5 • Os "meninos desv:ilidos" [do Asilo 'o,
a.necessid~de de que se construíssem espa-
dõs Meninos Desvalidos] eram os que, entretanto, foi muitas vezes associada ao
ensinarem e corrigirem os seus alunos, uso de prédiosjá existentes. - .ços própnos para a escola, como condição
de idade entre 6 e 12 anos, fossem en-
por isso que esses nenhum caso fazem (,.. ) A realidade material e espacial da mesma da realização de ,sua função social
contrados-érn tal estado de pobreza: que,
dos castigos moiais, mofando mesmo de escola brasileira continuava como tema espeófica. Assim, os defensores dométo-
além da falta de roupa àdequáda para ,o,

seus mestres", (Fern~ndo deAz~v7d.0) _ em. debate passados 30 anos. Na década do intuitivo, da mesma maneira que os do
frequéntâi"'escalas'coínuns,-vlvessemna" método mútuo no início do século XIX,
de 1870, os diagnósticos dos mais diferen-
3 • Em 1846 é criada (.oo} a primeira mendicância. ESses meninos eram en": tes profissionais que atuavam na escola ou argumentavam a necessidade de o espaço
escola nomiã.I de sãO Paulo, _destina- caminhados pela autOridade policial ao da sala de aula permitir que as diversas
na administração dos serviços da instrução,
da somente a homens, e com um único asilo, onde recebiam instrução primá- classes pudessem realizar as liçõ~ de coisas.
~uainda políticos e demais interessados
professor, ManuelJosé Chaves, catedráti- ria e apreitdiam os oficios de tipografia, Somava-se a isso que a escola foi, sobretu-
..- na educação do povo (médicos, engenhei-
'
o

co de filosofiae moral no curso anexo-à encadernação, alfaiatarià, carpintaria,_ , do ao final do século $pC, sendo invadida
ros... ), e~ unânimes em afirmar o estado
.:;,..,
Faculdade de Direito; essa escola funcio- marcenaria, tornearia, entalhe, funilaria, : por todo um ~enal inovador de materiais
de precariedade dos espaços ocupados pe-
nau numa sala do C~ido, contígua à Sé ferraria, seITa1heria,courearia ou sapa-- , -didáticocpedagágícos (globos, cartazes, co-
las escolas, sobretudo as públicas, mas não
Catedrai, e foi suprimida em 1867,tendo taria. Concluída a aprendizagem, o artí- somente essas, e advogavam a urgência de leções, carteiras, cadernos, livros...) para os
formado cerca de 40 professoresem perto fice permanecia mais três _anos no asilo, ,~ se construírem espaços específicos para ~ quais não era possívelmais ficar adaptando ~ -
(..1 • 'dia ) () trabalhandó nas oficinas, com o\duplo ,os espaços, sob pe-na de não colher, desses
d e 20 anos \uOls;emme , por ano. o" realização da educação primária.
Em 1874 é criada na capital de São Pau- fim de pagar sua aprendizagem e formar': ( .• o) Sobretudo no último quartel' do materiais, os reais beneficios 'que podiam
lo uma escola normaI,comum cúIso de um p'eo:w?, q~e lhe :x:-entr~gue ao llfIl século XIX, foi-se, paulatinamente, refor- trazer para a instruçâõ.
_do tnenio._~wz Antômo Cunha)
dois anos, que se instalou.--em.1.8.75-COIl:L'.- - 'C~ ~:~ . çando a representação de quo a constru-
"
Também o .desenvolvimento dos sabe-
33 alunos. numa sala dei curso anexo à ção de prédios específicospara a escola era res científicos, notadamente da medicina e,
Faculdade de Direito~Também esta, por
falta de verba para a instalação e custeio, 16 Rótula:grade de madeirascruzadasque ocu-
se fechou em 1878;para se abrir, e desta. pa umvãodejanela. - ai
imprescindível a uma ação eficaz junto às
crianças, indicando, ass~ o êxito daqueles
r l'
que defendiam a superioridade e a especifi-
dentro dessa, da higíene, e a aproximação
desses do fazer pedagógico infiuíram de-
cisivamente na elaboração da necessidade
de um espaçp especifico para a escola (o. ,).
f'~
cidade da educação escolar diante das ou-
tras estruturas sociais de formação e socia-
o

lização cSJnioa família, a Igreja e, mesmo,


. Ao mesmo tempo que elaboravam uma
contundente crítica às péssimas condições

~_.._\ :_..__~~~~,._. _. .~~--"_,=


I -~-------'~--
Educaçãoe da Pedagogia- Gerale Bra'l
:i-
Sé<uloXIX: a educai'o nacional
235
das moradias e dos demais prédios para a tiva das verbas com pagamento do àl\lguel
saúde da população em geral, os higienistas da casa de escola. e do professor. Dessa forma, dêutico?Justifique sob que aspectosessa 13. Analise algumas diferenças entre a
acentuavam sobremaileira o mal causado, os professores não eram controladõs, os da. afirmação ainda é verdadeira e quais os educação'no resto do.mundo é no Brasil,
às crianças, pelas péssimas instalações es- dos estatísticos eram falseados, os professo- ".,prejuízos para a educação integra1'd~ do século XIX.
colares. Além disso, expunham o quanto res misturavam suas atividades de ensino ,'aluno. DiscutiL.se, ao contrário, já sen-
a falta de espaços e materiais higienicamen- a outras atividades profissionais e, em boa timos avanços nesse setor. . 14. Quais foram as modificações eco.-
te concebidos era prejudicial à saúde e à parte das vezes, as escolasnão funcionavam
rtômicas e sociais' que deterIIiinilram .
aprendizagem dos alunos. literalmente. 8.' Disc~f~s~b~y os prejuízos para a maior interess'e ,pela' educação e peJa .
Finalmente, a falta de espaços próprios ',edUcação ElecQrrentes' das precárias pedagogia? . . '
.para as escolas era vista, também, como condiçõeSdaS.escolasnormais, de acor-
um problema administrativo na medida em Luciano Mendes de Faria Fúho e Diana Gonçalves
que as instituições escolares, isoladas e dis- Vida!, "Os tempos e os espaços escolares no processo
docómo'quefoi visto no capítulo e nos 1S. Explique o que eram as confe-
de institilcionaliz:ação da escola primária no Brasil", dropes 1 e 2. E hoje em dia,asmudan- rências pedagógicas e e~ que medida
tantes umas das outras, acaba~ não sen- ças são substanciais? .
in Rtuista Brasileira dt Eductlfão. Campinas, Autores representaram um Iiovo interesse dos
do fiscalizadas, não oferecendo indicadores Associadosl Anped (Associação Nacional de Pós. 'brasileiros pela educação.
confiáveis do desenvolvimento do ensino e, -Graduação e Pesquisa em Educação), nQ 14, maio a 9. No século XIX, ~pliilJ-~e Q aten-
além do mais, consumindo parte significa- agosto de 2000, p. 22-24.
dimento escolar para a educação de 16~''Lição de coisas" e "método intui-
__ .L,.....
'. oficios. e:lÇpUquepor que e identifique tivo": conceitos sinônimos ou há dife-
co~op0dêmoS:'Í"econheC€N'fessas ini- renças entre eles? .
ciativas, UIllcunho. assistencialista e
j Allvlelaeles para O abandono daquele projeto e a: diSciplinador: 17! Releia o dropes 1 da primeirà par-
I priorização das faculdadesjurídicas. ,
! . . te do capítulo, que se refere ao método
Questões gerais
---1 5. Releia, na. primeira parte do capí~ .
n~~:,",:e~uc?~.~,mulhe: semIJrefoi.
I»"eténda,deV1doa concepçao que as so-
de :PestalozziJe explique p()r que lá. se
encontra o germe do chamado ensino
1. A vinda da fanu1ia real ,para o Bra- ,tulo,""quais.eram ,a&camcteristicas.clo' .~ cied:<tdestrafdlcionaissempre tiverám a intuitivo.
""sil provocou algumas mudanças do msino mútuo (ou monitorial) e explique"; respeito do papel feminino. Ideri,tifique
ponto "de vista da cultura. Identifique como foi implantado no Brasil, qual era \ as mudanças no final do século XIX.
'. 'algurÍlas delas, discutindo 'sÇ>bresua
'18. Qpe alteração o pensamento posi-
a intenção inicial e por que não se con-, tivista provocou 'na educação no Brasil?
importância. cretizou,de fato. 1 t. EXamine os aspectos movad(}res
"''': ':'. ~ r
"
dos projetos de Leôncio de Carvalho no Questões sobre a leitura
• 2. No período joanino foram criadas 6. Considerando que no Iptpério foi ..1Ç âril1n~da educição.
--'o \ compkmentar
algumas escolas superiqres. Explique ~\.... ".•...
. distribuídapor lei a responsabilidadedos , .

qual foi o critério de privilegiar essa es-


três segmentos.da educação, responda: 12. Na última "fa,la da trono", profe- 1. ~fatores deterniinaram o inte-
co1hà.
,{ a) O que ficou a cargo da Coi"?ae o rida na abertura solene do parlamento ressepela c~?tstruçãode prédios especiais
,
I

alguIis meses an~ de a República ser


que era incumbência das provínci3$? para as escolas !1q, final do século XIX. ';,'.:
3. No Império, desde cedo houve a in- procl~ada> D.. Pedro n se referia às
b) Como essa divisão prejudicou o Identifique os de ordem políliCo-cultural,
tenção de criar um "sistema nacional
ensino élementar? , . necessidades de um .ministério destina- pedagógica, científicae admfuis1iatiVa.
, de educação", Explique por que não foi •. • , .• ., - ~., . ..ij

c) Porque no ensino sei::undário'! doà.mstmção púbÍica,esçélas t6::nicas,


___ ' ".• i:mR~1:£.do,__
.d\iastWiv~es, umanÇ)norte;outI(J. 2. Diifcuta ~comseus colegasem'qne
houve, na verdade; unia pseud6deseeD.-..
no sul do país, e de difundir a. instniçãà medida o
padrão da arqUitetura da-
_4. Apesar da intenção inicial de valo-o ~ação e quais QS prejUízospara esse
primária e secundária. Em que sentido queias escotaSvemsofrendo mt.difi-
rizar o ensino elementar; esse projeto setor?
podemos analisar essa "fala derradeira" cações hoje em dia. Quais as pii.nci-
não se .realizou. Analise as dificuldades
. como a aspiração não realizada da edu- pais mudanças ,que ainda preciaam
- 'alegadas e discuta quais foram as causas 1. Pademos dizer que até hoje prevale- caçãcino Império? ' . ser implementadas?
~1 econômicas e so?ais que prevaleceram ce a ideia do ensino secundário prope-
I
-"1
I. 236 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Século XIX:a educação nacional 237,
-,
Capítulo Educação 'para
a democracia ',0

Neste capítulo, vamos tratar da educa-


" ção geral, reservando o próximo apenas
para a do Brasil, uma vez que o século
XXfoi bastante rico em experiências edu-
cacionais e no pluralismo: de teorias pe-
dagógicas. Procuramos continuar esta-
belecendo a separação entre as práticas
Dados Internacionais de Catalogação nâ Publi~a'ção(CIPj educativas e as reflexões pedagógicas,
/Câmara Brasaeira do livro, SP,Brasiij nada. impedindo que o leitor procure es-
tabelecer a devida complementação en-
Aranha, Maria LúLia tIe ArmtIa tre os dois tipos de abordagem didática
Histól1a tlà etIu<:açào e da pedagogia: geral e
Brasil I Maria Lúda tle Arruda Ar-anha. - 3. etI. -
do nosso objeto de estudo.
rev e ampl. - SàÇl Paulo: Moderna 2006. Os tempos atuais, em que compreen-
demos,o século XXe o começo do século
Bihliografia xxr, adquiriram tal complexidctde que
L Edut'a<,;àO - História 1. Título.
se torna sempre diRei!:resumir "em:pou-
. "
cas páginas os inúmeros vetores quE!~S
carocrefÍZam. Nesta introdução destaca-
05_-8901 , CDD-370,9 mos os ArinCipaisaspectos da educ:ação.
( No turbulentO século XX no mundo que serão an&d'isadosno capt
indices para calólogo:51stemático:
'I. Educa'ião : História 370 ..9
vivemos duas guerras tulo, segundo as três abordagens: con-
mundiais e inúmeros texto histórico, educação e pedagogia. '
,Reprodução proibida Art.184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1996. confIitos-, mas este -
Diferentemente dos capítulos anteri9res,
também foi.o século das
_ _ Todos os direitos reservados reMi1di~aÇões de muitos,.
preferimos abrir um capitulo novo:paro o -1
baneÍeircls' - do feminismo, Brasil, dada a amplitude que também en-
EDITORA MODERNA LTDA. do poder iovem, de tados tre nós assumiu a questão educacional.
Rua Padre Adelino. 758 - B~lenzinho
as minorias silenciadas par Na cronologia da h'istária costumamos.
milênios -, provocando chamar de' época contemporânea o pe-
São Paulo - SP - Brasil - CEP 03303-904
mudanças comportam~n.tais
Vendas e Atendimento: TeI. <0__ 11) 2790-1500
significativas. (Manifestação
ríodo iniciado em 1789, com a Revolu-
Fax (0__ 11> 2790-1501 .
de estudantes em Paris, maio o ção Frdncesa. Esta revolução burguesa
"'!~'W.modema.com.br de 1968.) sinalizou a queda' do - Antigo Regime,
2011
239
Impresso no Brasil

.' -~~--'-~ --~,~--.. - "--:------.----


_" ..•.. _._-.- ..•..._.-
que primava pela visão aristocr6tica da ção da União Soviética. Foi o tempo q~e Veremos como todas essas ambigui- 1. ConAitos dó século XX'
realeza e seus súditos, para desenvolver sofreu a crueldade do totalitarismo, que, dades têm mobilizado e desaBado os es-
lentamente as conquistas dá' cidadania . mesmo vencido na metade do século, ain- tudiosos da educação . Ao analisar' a história do século XIX
na construção das democracias atuais. da nos ameaça com manifestações neC- . " vimos que a coloniiação da África e d~ .
-,
Vimos que esse movimento social se fez nazistas. Sob esse aspecto, as grandes éontexto histórico' Ásia decorreu. çla.p'olitica imperialista dG'
a partir da sobreposição dos ideais li- migrações de populações empobrecidas" capitalismo. No continente europeu, no iní-
berais da burguesia sobre a çoncepção que buscam os centros mais desenvolvi- cio do século XX,, a livre concorrência foi
aristocrática do absolutismo dos reis. E dos,têm acirrado a intolerância xenófobo ,j;' substituídapelo,capitalismo de monopólios,
que, embora inicialmente o liberalismo Breve cronologia cio acentuando a' concentração de renda e as
daquel~s grupos'l di':;:
fosse muito elitista, por privilegiar os pro- Esse roi o sécu o a uta contra o apor. 'periocló 'consequentes disparidalies 5ocims. Os cho- .
prietários e excluir a grande massa, aos theid, com inúmeras conquistas dos direi. r~. ques entre, as potências imperialistas cul-
poucos foram introduzidos mecanismos, tos de negros e indígenas. Mas também '~i '. Primeira Grande Guerra minaram no conflito armado da Primeira
de maior participação popular, ainda recrudesceram os ódios étnicos, seja dos ':;: (1914-1918) Grande.Guerra (1914-1918).
gue, devamos reconhecer, muitas vezes radicais islâmicos responsáveis pelo' ter- • Revolução Russa (1917) Durante a guerra, outro fato-importante
de maneira formal e nem sempre efetiva. rorismo, seja das nações ocidentais ditas ,~. • Fascismo na Itália (1922-1945) abalou o mundo: com a Revolução Russa de
Como exemplo, lembramos que uma das civilizadas",'que respondem com a yio-t
1/
• Quebra da Bolsa de Nova York 1917,instaurou-se o primeiro governo socia-
principais reivindicações da cidadania lência da guerra' e a ameaça d.e desres- (1929) lista, após a deposição do czar NiCQlauTI.
- a escola leiga, gratuita e universal - peito a direitos humanos fundan'lentais. , • Portugal: ditadura de Salazar No período posterior à Primeira Guerra, .
ainda constitui um projeto inalcançável Esse foi o século dO,tlvanço das ciên- .(1932-1968) tornou-se marcante a influência econômi-
para a grande maioria dos países peri- cias e da tecnotogia, em que o progresso • Nazismo na Alemanha (1933- ca dos Estados Unido~, inclusive .na Euro'-
féricos. " e o conforto se expressaram pelo reR. -1945) pa. Por esse motivo, o impacto mundial- da
Apesar disso, vale' destacar, que a namento da racionalidade técnica. Ao • Brasil: Estado ,1':0\'0 (1937- crise gerada pela quebra da Bolsa de Nova
ambiçãO dos pensadores do Iluminismo mesmo tempo, uma racionalidade que -1945) , York em 1929 provocou falências, retração
do século XVIIIfoi a da emancipação despreza os valores vitais, quando,deixa • Espanha: ditadura de Franco de mercado e desemprego em m~a, bem
humana, do sujeito com autonomia de prevalecer o interesse econômico e a vi. • (1939-1969) como a pauperização da classe média e,
pensar e agir, sustentada pela garantia são estritamente utilitarista e consumista. • Bomba atômica - Hiroshima maior degradação do proletariado. '.
dos direitos conquistados. No século XIX Esse foi o século que produziu as ~as- e Nagasaki (1945) A gravidade da depressão econômica da
vivemos o tempo das rupturas, das lutas sas, tanto nos projetos de reivindicação • Criação da ONU (1945) década de 1930 obrigou o Estado a intenrir
revolucionárias para a construção de como nos, de lazer, como protagonistas ,. Repúbli~a Popular da China na economia e substítuir o capitalismo libe-
uma sociedade mais justa e democrática, dos movimentos de rebeldia ou de frui- , (1949) . ral pelo capitalismo de organização: Afim
incluindo-se aí não só o anseio de liber- ção hedonista. No entanto, como diz • Revolução Cubana (1959-) de ev;.tartanto o perigo do nazismo como a
dade, mas.também de igualdade. Franco Cambi, "a contemporaneidade • Desco1onizáção da África e da tentação do comunismo, os Estados.Unidos
Bem ou mal, esses projetos foram im- Ásia criaram o Estado de bein-estar social (~ifà"e
produz OS mossas, mas também os me-
plementados FfÕ' século XX pelo sufrágio • Guerra do Vietnã (1963-1973) . State), pelo.;;qualo EstaCÚJ benfeitor implantou
canismos para o seu controle, -desde as
universal, ao estender às mulheres e aos • Golpe niilitar no Brasil (1964- medidas de controle da economia, de estí-
ideologias até as associações, a propa-,
analfabetos o direito de voto nas socie- -1984) mulo à produção, garantindo a 'distribuição
ganda, o uso do tempo livre, os meios de i~;
dades democráticas. Aliás, nesse século • Queda do Muro de Berlim de beps e serviçossociais.
comuniê:ação;e neste binômio dinômico
intensificou-se a defesa dos direitos do (1989) Em ~"1l..'1S países, o_clima, de. insegu~ __ ,_'__
de massificação e de regulamentaçã<l
cidadão, da mulher, da criança, do tra- • Desagregação dos Estados so- rança e insatisfação a~ou a expansão
• das massas se exprime uma das caracte-
balhador, das: etnias, das minorias, dos cialistas (a partir de 1991) de ideologias de extrema .c1àreita:na Itália,
rísticas mais profundas, mais COnstantes
animais e da natureza. • Atentado terrorista em Nova o fascismo' triunfou em 1922 çom Benito
do tempo presente"l.
O século XXfoi a época das revoluções York (11-9-2001) Mussolini, e em 1933 Adolf ,Hitler fortale-
socialistas - ainda que muitos dos Pro- • Guerra do Iraq~e (2003-) ceu o nazismo na Alemanha,' A partir de
ietos tenham fracassado quase na última t HlSIóri.a do. pttlagogia. São Paulo, Ed. Unesp, 1999,
• 1936, a guerra civilna Espanha resultou na
década, por exemplo, j:om a desagrega- p.380. ' imposição da ditadura de Francisco F~co,

240 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil , Educação para a democracia 241.
madas as práticas do neoliberalismo - e, 2. Movimentos sociais de contestação
enquanto Portugal sucumbia sob a ditadura do Norte (1945), a Coréia do Norte (1948),
portanto, o ideal do Estado minimalista-,
• de Antônio Salazar. Ecos dessas mudanças a China de.Mao Tsé-Tung (1949), o Laos À margem da politiC4oficial, desde me-
retirando-se do governo as funçõesassisten-
se fizeram sentir no Brasil com a Ação In- e o Camboja (Campuchea). Em 1959 foi a ados do século XX "grupos divers'osagita,
cia.Jistasassumidas pelo Estado de bem-es-
tegralista e, mais tatde, s9b alguns aspectos, vez da adesão de Cuba, com Fidel Castro. ram a sociedade civil com variadas formas
ta.rsocial.
com o 'Estado NQvOda era getulista. Mes- OutrQ açontecimento importante do de contestação. Uma das mais significativas
Daquela época até a transição do sécu-
mo diferentes, essas tendências criticavam 'periodo pós-,guerra foi a paulatina descolo- foi representada nos movimentos de contra-
lo, muitas foram as mudanças. Citaremos
tanto o liberalismo como o comunismo. En- nização da Africa e da ÁSia,processo pelo cultura. Na década de 1950, os beatniks (da
apenas algumas delas. O neoliberalismo ex-
quanto Itália e Alemanha representavam o qual muitas das antigas colônias, ao se li-
. pandiu-se por meio da economia globaliza- beat gene:rations norte-americana) ê. nos élllOS
chamap.o totalitarismo de direita, na União bertar, aderiram ao socialismo.Já nos refe- de 1960 os hippies opuseram-se -"-.cada ten-
da, favorecendo acordos entre nações: um
Soviética o totalitarismo de esquerda surgiu rimos à necessiçlade de éxpansão inerente dência a seu modo - aos valores'da socie-
~uando Lênin foi substituído por Stálin, a ao capitalismo. Com a
descolonização, o exemplofoi a União Europeia, que instituiu
o euro como moeda única. Outros blocos dade industrial e de consumo. N:i:Y"final da
partir de 1925. irp.perialismo tomou outra forma. A partir
têm buscado favorecer laços no mercado década de 19.70aparece:ram ospunks, e, na
Depois da Segúnda Grande Guerra ç10 fortalecimento do capitalismo de orga-
internacional. Por .outro lado, por privile- sequência, inúmeros outros grupos têm ep-
(1939-1945), foi fundada a "organização nização, as multin<icionais representaram a trado em confronto com os valores de uma
giar os interesses dos países hegemônicos,
. das Nações Unidas (ONU), organismo que nova,estratégiadeinstalarindústriasempaí- sociedade massificada pelo consurnismo e
a globalização recebe critica de grupos da
visa a manter a paz mundial e defender os ses não-desenvolvidos a fim de explorar a pela visão pragmática da tecnocracia.
socie.dadecivil, na defesa de uma solução
dÍreitos humanos. Dentre seus diversos ór- mão-de-obra barata, agravando o problema A partir da década de 1960, tornou-se
alternativa, mais democrática, que não se
gãos especializados, destacamos a Organi- das economias de base agricola. Estes.eram marcante a mobilização das minorias, en-
curripra à custa do~países periféricos, como
zação das Nações Unidas para a Educação~ os países que compunham o entã~ chama- tendidas como ~egmentos da. sociedade
Ciência e Cultura (Unesco), por ter um dos
2
do bloco do Terceiro Mundo e procuravam a -tem ocorrido.
Essas alianças não existem apenas no destituídos de POl 'er: o movimento negro,
seus focos na educação. . emancipação a duras penas, d.i.fieultadape- o estudantil (seu n omento crucial ocorreu
campo da economia, mal[ também da po-
No pós-guerra os Estados Unidos assu- . los laços de dependência econômica e até
miram posição hegemônica na economia. política. No Brasil, por exemplo, os Estados
lítica, na tentativa de se instituir uma gover- . . em maio de 1968, em.
Paris, com irradiação
nança global em.que os Estados-nação não mundial) e o fenUnista (ou de gênero, que
mundial, reforçada pelo poderio atômico Unidos interferiram diretamente no golpe se desenvolvia desde o começo do século e
percam sua soberania, mas organizem foros
_ demonstrado no lançamento da bom- militar de 1964 e, no campo educacional, recmdesceu naquela década), a revolução
internacionais de discussão - por exemplo,
ba atômica em Hiroshima e Nagasaki - e dirigiram o rumo das reformas realizadas sexual, os movimentos contra a discrimi-
já existe o Parlam~nto europeu. Isso vale
pelo crescimento' da indústria bélica, que por meio dos acordos MEC-Usaid, como nação do homoerotismo, em prol da pre-
para a resolução comum de problemas que
desencadeou' a corrida armamentista. No Veremosno próximo capítulo. senlação das populações inclígenas, enfim,
afetam a todos, bem como para o comba-
outro pólo, a União Soviética expandia sua Quando (, bloco. dos países comunistas pela defesa dos direitos' huma.nqS.Os gru-
te articulado de crim~ como narcotráfico,
zona de influência, também com ~eu po- começou a apresentar rupturas, os problê- í pos pacifista!, que atuavam havia tempo,
Iavagern~e dinheiro, atentados aos direitos
der bélico e ~tôInico. O confronto das duas .. mas. culminaram com a queda do Muro ~. intensificaram suas atividades por ocasião
humanos, crime internacional organizado,
potências gerou a Guerra Fria, que deixa- de Berlim, em 1989. Em .1991 a própria f' 1errorismo. . da Guerra do Vietnã (1963-1973).
va em suspenso a ameaça constante à paz União Soviéti~ desintegrou-se, incapaZ di:- .:; Entre essas mobilizações, não h~ como •
mundial. manter unidas as Repúblicas consti~das fi Resta lembrar que, ao contrário do sécu-
lo XIX, marcado pela visão do trab~h~ e desconsiderar a arregimentaçãO da classe
A tensão entre as duas potências aumen- por diferentes nacionalidades. li.,

dos trabalhadores nos movimentos sindi-


da poupança, o século XX construiu o.ide-
tou com a expansão do socialismo.Além das Enquanto isso, nos países de economia cais, na organização de greves para as mais
al.da sociedade de lazer, ancorado na ilusão
democracias populares da Europa centro-' capi~1lista, como Estados. Unidos e Ingla- diversas reivindicações e conquistas. A par:
do mundo do co~umo. Para não sofrer os
-oriental, aderiram ao comunismo o Vietnã terra, desde a d~cada de 1980-foram reto- rir da década de 1970, os grupos de defesa
efeit03perigosos dessa ilusão, convém que
comecemos a preparar nossos jovens para da-ecologia intensificaram sua atuação não
o desfrute ao lazer criativo. só diante da ameaça de wna guerra nuclear
2 Terr:eiroMwuio era a designação dada aos países subdesenvolvidos, que estavam à margem do Primeiro e Segun-
do Mundos, constituídos pelos países ricos capitalistas e do bloco socialista. Após o desmantelamento do "socia-
lismo real", passou-se a considerar as desigualdades entre os ricos do Norte e os pobres do Sul, ou seja, entre os 3Becágmeration: literalmente "geração gasta, corroída". Essesgrupos, formados por intelectuais e artistas, despre-
países ce"ntrois (e hegemônicos) e os p~s. Vale lembrar que entre os chamados países ricos não encontramOS zavam a sOcledade mitcrialista e utilitarista contemporânea. BeaJJtiks designa o diminutivo de beaL
sequer uma dezena entre as 170 nações do globo. . .
24~
242 .
História da Educação e daPedagagia=.GeraLe_Br.a.sil-J.,,
...;
__ Ed!lcação para a democracia
- que significaria a destruiçãOda humani- século,foram introduzidas novidades da ro- a pedagogia estão em crise, mas a 'pr6pria quando esta foi posta a serviço da doutri-
dade - mas devido ao temor cotidiano d~ botização. Sob os efeitos da Clbernética, a' humanidade. encontra-se na transposição nação pelos Estados totalitários (fascismo:
acidentes, bem como do efetivo desequilí- sociedade industrial encontra-se em trans- de uma nova era, que exige a co~ção de nazismo, stalinismo), para exercer a função
brio ecológico já constatado, como resulta-o formação para a pós-industrial, caracteri- oujros valores e paradigmas. Voltaremos a de plasmar e controlar crianças ejovens. '.
do da inad~quada intervenção humana na iada pela p~edominância das atividades do esse assunto no capítulo 12. Além dissó,ainda hoje a escola procura ó
natureza. setor de serviços. Diante de uma sociedade tão complexa prumo entre as duas orientações da educa-
No item anterior vimos como o renome- Mais ainda, incrementou-se o setor de e cheia de contradições, podemos imagi- ção para o trabalho e a educação humanis-
no da globalização da economia tem susci- entretenimento e lazer, fazendo surgir o que nar o papel importante que representa a ta, que têm configurado o dualismo escolar,
tado a crítica ao modelo neoliberal C; pro- se pode chamar sociedade da lazer, ainda que implantação de um adequado sistema de responsável pelá. perpetuação da. desigual
vocado a defesa de uma globalização mais em contradição com o desemprego estrutu- educação, antecedido por :r:efiexõesrigo- repartição dos saberes. Ou, ao contrário,
democrática, desencadeando movimentos ral, os bolsões de pobreza nos países ricos e rosas sobre seus fundamentos e objetivos, diante de uma soci.;:dadetecnocrática, a es-
de contestação no início do século )QCI em a miséria em países periféricos. Na virada ou seja, uma reflexão pedagógica. Por ser cola é mantida como prisioneira do objetivo
cidades como Gênova. (Itália), Seattle (Es- do século, as diferenças sociais se açentu- uma sociedade plural, veremos como têm de preparação para o mercado de trabalho,
tados Unidos) e Porto Alegre (Brasil), entre aram no mundo capitalista, e o problema sido inúmeras as indagações e respostas a descuidando-se da formação integral e'da
outras. da fome recrudesceu. Além disso, como já essas questões. Assinalamos aqui algumas consciência critica..
A partir da década de 1980, essesgrupos dissemos, graves questões, como o terroris- tendências que veremos a seguir. Outro 'aspecto importante a ressaltar foi
críticos, formados na sociedade civil,' co- mo, o narcotráfico, o erime organizado, a Vimos que desde o sécUlo XVIII já se a ampliação do leque dos sujeitos educati-
'meçaram a ft.mdar as 'organizações não-goue'l"- violência urbana, desafiam os esquemas de esboçava o ideal da escola laica, gratuita vos, que desde a Antiguidade se restringia
. namentois (ONGs), chamadas de terceiro seto'l" llegurança. e universal, sob a responsabilidade do Es- à criança do sexo masculipo. Agora, tam-
por não representarem nem o Estado nem O fenômeno da. globalização e da so- tado. Diante da sua importância, cada vez bém se coloca êniàse na <;ducaçãoanterior
as empresas, mas por buscarem a solução - ciedade da informação, estimulado pelos mais a educação assumiu caráter político, às primeiras letras (o 'Jardim de inf'ancia"),
de problemas que afetam determinadosseg- avanços tecnológicos, ao mudar a face do devido ao seu papel na sociedade. como na educação da mulher (emancipad?, .de
mentos da sociedade que não mereceram os' mundo, provocou alterações no trabalho, instrumento. de transmissão da cultura e sua condição subalterna), do deficiente
devidos cuidados do governeicentral. nafamilia e, consequentemente, exigiu um formação da cidadània: formar o cidadão, (f!Sicoe mental, visando. a sua integração
novo tipo de escola. ou seja, o sujeito político que conhece seus social), das etnias até então excluídas (pelo
3. Unia rnudança vertiginosa . direitos e deveres. reconhecimento da importância do diálogo
Educação Nesse sentido, os projetos educacionais com o diferente).
Do ponto 'de vista da çiência e da tecno- passaram por um período de otimismo, em Era de esperar que tal gama de projetos
logia foram notáveis as transformações do 1. Tempo de crise: tempo de mudanças' que a escolareprésentava a esperança de de- educacionais exigisse em contrapartida
sé,culoXX: novas fontes de' energia (elétri- mocratização da so.ciedade;Depois, alguns .maior rigor da reflexão pedagógica, o que
ca, petrolífera, nuclear); crescente processo No esboço sobre o contexto histórico do teóricos destacaram o caráter ideológico da se fez pela sua articulação com as ciên-
de urbanização; automação. nas fábricas e século xx, constatamos notáveis transfor- escola, como lugar de inculcação das ideias. cias, -tais como a psicologia, a sociologia,
no campo; desenvolvimento da medicina mações no' carnpo~ na cidade e na menta- da classe dommante; o que realçava apenas a antropologia, a linguística, a psieanáli.
avançada, sobretudo a bioengenharia (se- lidade, de tal forma que podemos identifi~ o seu caráter reprodutor dQjistema. Entre se,.a estatística, a biologia, a cibernética e
quenciarnento do genoma, experiências car a.crise por que passa a humanidade na esses.dois polos, foi tecida a rede entre edu- assim):>or-diante. Por isso mesmo,- a peda-
com clonagem e células-tronco); revolução transição do milênio. cação e sociedade, para destacar não só seu gogia se desvencilha da antiga orientação
nos transportes e nas comunicações (telé- A palavra de origem grega crise refere-se papel integra dOI;mas também de uma pos- metafisica que se baseava em um mo'delo
. grafo, telefone, rádio, cin~a,' -televisão, _. a-situação diftcil, a desafios,mas tem a mes-. sívelcrítica e inovação. Se a educação "não universal de humanidade a ier plasma-
fax, micro,copputador pessoal, internet, ma raiz de julgamento e, portanto, de crítica. pode tudo", mesmo assim ela tem uma fun- da. A recusa da pedagogia metafisica não'
celular); e o inipacto dos meios de coml!ni-- Significa, por conseguinte, a constatação ção importante à desempenhar, porque ela significa, po~ém, de~1)rezopela filosofia.
cação de massa.' Vivemos a época da socie- do envelhecimento de alguma coiSa que não só instrui socializando, como pode ser Ao contrário, a re£exão filosófica per-
dade de informação. não serve maís, e ao mesmo tempo o esfor- emancipadora, ao abrir espaços para a des- manece como indagação sobre o rigor
Q}.1antoao crescimento-induSiriã1;à-sé- ço para entender, julgar e escolher - ou mistificação da ideologia. epistemológico da pedagogia e sobre os'
cul~ XX proporcionou o estímulo à produ- melhor, inventar - na.voscaminhos. Com Também nesse Mtimo século vimos a de- valores e os fins que orientam qualquer
ção e ao consumo em massa. No final do. isso queremos dizer que não só a escola ou . turpação do uso da polí~ca na educação, prática educativa,

244 ---H~istOOa-da-Educaç-ão-e-da-P.edagogia=- ~ral e Brasil Educação para a democracia 245

- ; '::':'.~ í'j"
,flli;:!:"., -~_ ..
"'~."Ii1'i~"""l
,.;";,,,-,,
para uma escoia pertencer ao movimento, Destaca-se a contribuição de Lênin
Apesar disso, cOntinuava a ilusão qe que (1870-1924), cujo trabalho teórico não Sé
A fim de melhor avaliar esse "momento deveria cumprir pelo. menos qois terços de-
a educação pudesse garantir- mobilidade separava do ativismo exercid.o camo líder
de passagem", retomare~os mais adi~- les. Segundo esse padràq, eram as s~guintes
social e sucesso profissional. Para essa con- da facção bolchevique. Contrapondo~se
te alguns pontos, pela ótica das teorias as prjncipais características da Escola Nova:
cepção de educação, corno instrumentq de às teses revisionÍstas, Lênin restabeleceu a .
• pedagógicas. edueação integral (intelectuai, moral, física);
democratização da sociedade, muito con- ortodoxia da concepção de Marx e Engels,
educação ativa; educãção prática, com obri-
tribuiu o ideário da Escola Nova. . com o que a ,doutrina. oficial passou a ser
2. A expansão do ensino gatoriedade de trabalhos manuais; exercício.
conhecida como marxismo-leninismo. Após o
de autonomia; vida no campo; internato;
. 3. Realizações da Escola Nova sucesso da 'revoll{ção, Unin OCup?~ o po-
De maneira gera as propostas educa- coeducação; ensino individualizado. .
cionais do século XIX reafirmaram, no sé- der a~é Sl,lamorte prec;oce; quando-foi subs-
O escolanovismo resultou da tentativa de ESse projeto exige métodos ativos, com tituído por Stálin.. .. ' ':'
culo XX, a necessidade da escola pública,
superar a escola tradicional excessivamente m¥s ênfase nos processos do conhecimento A União Soviética tiãnsfor~6li::'se em
leiga, gratuita e obrigatória. Esta exigência rígida, magistrocêntrica e voltada para a do' que propriamente no produto. Para tal1-
tornou-se mais premente devido ao cresci- uma'potênciÇl industrialidàda, coris~indo
memorização dos conteúdos. Desde a Re- to as atividades são centradas nos alunos,
mento das indústrias e à explosão demográ. resólver problemas sociais .como moradia,
volução Industrial a burguesia precisava de e a criação de laboratórios, oficinas, hortas
fica. Apesar da efetiva extensão dos progra- saúde e educação. Sem nos esquecermos
uma escola mais realista, que se adequas~e ou até imprensa, conforme a linha a ser se-
mas de atendimento, as medidas tomadas das condições sercifeudals da Rússia pré-'
ao mundb em constante transformação. guida, deve ter em vista a estimulação da
pelos governos ainda são insuficientes, prin- -revolução, é surpreendente constatar como
Os pedagogos Fe1tre, Basedow e Pesta- iniciativa. todos os países socialistas conseguiram er-
cipalmente nos países em desenvolvimento. lozzi -foram de certo modo precursores da Tentando superar o viés inte1ectualista
Abundante legislação procura sanar as defi- radicar o analfabetismo.
Escola Nova, por .'Preconizarem métodos ." da escola. tradicional, são valorizados os Se a democracia socialista se des~acou
ciências, mas nem sempre de modo eficaz. ativos deeaucação, tendo em vista também .:," jogos, 'os exercicios fisicos, as práti~as de
A ampliação dos três níveis de ensino . pela distribuição mais justa dos bens, no
a formação global do aluno. A partir do fi-' desenvolvimento da motricidade e da. per-
entanto a liberdade individual foi sÜfocada
(fundamental, secundário e superior). da nal do século XIX e início do xx,porém, cepção, a fim de aperfeiçoar as mais diver-
no direito de cada um expressar e difundir
rede escolar, inclusive com a' proposta de é que se configurou definitivamente o mo- sas habilidades. Também se voltam para a
melhor integração entre eles, deveu-se à a informação. Na política, o partido único
virnento escolanovista. compreensão da .natureza psicológica da
expansão da indústria e do comércio, à impedia o pluralismo, impos~ibilitando a
A escola pioneira, a de Abbotsholme, criança, o que orienta a busca de métodos
diversificação das profissões técnicas e dos crítica ao sistema. .:.
surgiu na Inglaterra em 1889, seguida de para estimular o interesse sem cercear a es-
quaclios burocráticos na administração e
outras espalhadas pela França, Alemanha, pontaneidade. IA educação na União Soviética
organização dos negócios. Bélgica, Itália e Estados Unidos. Etn alguns Mais adiant~ no tópico Pedagogia, vere-
Desde ó final do século XIX até a década países, os novos métodos foram adotados.. mos os preCÜrsores eos representantes da
de 1940, em decorrência da ampliação das . Em qualquer um dos:.paísesçITi ..•que se
nas escolas públicas, como os de Cousinet ( '. i~ Escola Nova.' . realizou a revolução sociàlista; ()o. ínteresse

r I..t~;4. A educação' de . inspiração .


oportunidades de es1udo, verificou-se maior
e Freinet na França e o de Kerschensteiner ! pnóritáJio foi a educaçãô'populàr; tanto em
mobilidade e ascensão social, sobretudo na Alemanha. Várias cidades norte-ameno socialista
para a classe média. Segundo a expressão termos de' elaboração di teodas fundadas
CaI).astambém realizaram. experiências imo J, 11:'
do sociólogo americano Wright Mills, sur-
giu uma "nova classe média" formada pelos
portantes nesse sentido. . 1 ~.: VIIDos.I10capítulo anterior como o anta-
no marxismo, como pela garantiáda
versalização da escola elementar, gratuita e
uni-

C~mo veremos no tó~i:o .Pedagogia, fo- { ~;'; go~o de classes a~u seu ponto ~tico obrigatória. Logo de início, toda a socieda-
wmte collars, "colarinhos brancos", ou seja, ram unportantes as expenenCla5 de educa-l f;,~ no secu10 XIX, mobilizando os proletànos e ~e foi regirneRtada para o 75forço comum
gerentes, vendedores, empregados de escri- dores e pedagogos comQ Maria Montessori, i r ':'
os intelectuais que desenvolveram as conc~p- de alfabetização. Também se valorizou o .
tório e profissionais liberais assalariados. na Itália, e Deeroly, na Bélgica. 1. '1', \
ções socialis~ em oposição ao liberalismo. trabalho coletivo" a auto:.organiZação' dos' --
Em dado momento, porém, principal-
Em 1899, por iniciatiVa de Adolphe Fer- j f :,: Os teóricos que repensaram Marx e En- estudantes, a ligação entre escola e vida e ~
mente nOs países desenvolvidos, o número riêre (1879-J0961), foi fundado o Bureau"\1:' gels no século XX o fizeram a partir da ex-
de empregos oferecidos passou ~ ser inferior entre trabalho intelectual e manuãl. ~
Internacional das Escolas Novas, sediado \ ~::.: periênêia concreta da Revolução Russa de Após a Revolução de 1917, ainda no pe-
ao de diplomados, gerando uma política de em Genebra. Devido à criação deinúnle. ¥i 1917, quando não mais se tratava de ela- ríodo do governo de Lênin. e antes do en-
contenção na demanda de educação. Além ras escolas novas com tendências diferen- i L
borar um projeto de revolução e sim de en- durecimento da gestão stalinísta, a União
disso, muitas pessoas formadas, ao encon-
tes, em 1919 o Bureau aprovou trinta itens: l,., frentar problemas decorrentes da implaata- Soviética passou por um momento decisivo
trar pequena oferta de emprego, tiverâm o
básÍços da nova pedagogia; de modo que, t ção do socialismo.
salário pressionado para baixo. ~.. l."" 247 .. '
___________ ----------------------- ~ f
246 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil .', ~ '.c . Educação para a democracia

'L
• 1. ~

~ , .... ~--_ ..
na sua história. Predominava. um entusias- . O embate das ideologias continuemos a USaro termo para nos re- em 1981 reduziu-se a 1,9%. A divisa do
mo pela educação diante da necessidade ferirmos a momentos em que recrudesce a movimentIJ era: "Si sabes, enseiia, si no •
de fotmar o novo cidadão da sociedade No período da Guerra Fria, as duas po- . paranóia diante da "ameaça do inimigó", sabes: aprende" .
revolucionária. Lênin ligou a pedagogia a t~nc;ias- Estados Unidos e União Sovié- fazendo cercear as liberdades e instaurar Foram criados semi-internatos corri bol-
uma estratégia política revolucionária que, . tica - se defrontaram, determinanfl~, de • a~'censura.No começo do &,éculoXXI, por sas'e alojanieI?-tos;ensino técnico e profu-
se por um lado defendia a importância de ambos. os lados, Úm viés nianiqueísta no exemplo, vemos ressonâncias desse temor sional; creches para acolher as crianças de
não se desprezar a cultura do passado bur- esforço ~ difundir um. modelo de socie- no confronto da Guerra do Iraque: não mães trabalhadoras;. escolas para deficien-
guês, sobretudo as conquistas da ciência e dade e, portanto, de humanidade. A esse por acaso, epítetos como "Eixo do Mal" tes fisicos e mentais e formação de profes-
da tecnologia, por outro lado devia refor- respeito, diz Franco Cambi: "Na luta entre (como os radicais de cá designam os áraqes) sores, e~ todas as provincias. À reformula-
çar a consciência da luta de classes e prio- civilizações que maJitinhám a Guerra Fria e "Grande Satã" (como os de. lá veem'os ção dos cumctilos apoiou-se na discussão
ridade da instrução politécnica, voltada (dada corno luta m'lrtal, pelo menos no cur- norte-americanos), só fazem incrementar a entre grupos de professores e em função
para o trabalho. so dos anos 50) opUnham-se Oeste e Leste, onda de intolerâpcia e xenofobia. da perspectiva socialista. Além disso, os li-
Nessa fase, destacaram-se o ministro Democracia e Socialismo, Liberdade e To- vros e os demais materiais didáticos foram
da Educação Lunatcharski, junto com . talitaristno (ou alienação e emancipação, Outros país~s socialistas barateados .
N adeska K. Krupskaia (companheira segundo a frente marxista), Capitalismo e Os países' soçialistas do Leste Europeu
de Lênin), e, mais tarde, os educadores Economia Planejada; opunham-se o Ver-' A China, após a revolução de 1949 lide- (Hungria, Albânia, Alemanha Oriental,
Anton Makarenko e Mbisei Pistrak, que dadeiro e o Falso, o Bem e o Mal, segundo rada por Mao Tsé-Tung, também dedicou Romênia, Bulgária, Tchecoslováquia, Iu-
introduziram profundas alterações nas um dualismo testemunha de uma ideologia ", e~ecial atenção à educação. O .processo goslávia) em geral seguiram<de ÍDÍciGas
concepções pedagógicas, a fim.de enfren- elementar e pI'Qpagandística"~. radicalizou-se após a chamada "revolução orientações da União Soviética, mas de-
tar o des'\Íio de uma nação cQm 80% de É evidente que essas duas visões de cultural" de 1960, pela qual se pretendia pois passaram por diversificações, diante
analfabetos. O objetivo era criar o novo mundo antagônicas determinariun de ma- ';.' evitar qualquer influência burguesa, con- das necessidades de cada um deles. Na
cidadão', 11.0 transformar a sociedade se- neira forte a orientação pedagógica dos' " siderada desagregadora da nova sociedade
.;.~,. Polônia, país de tradição de fé cristã,' o pe- .
mifeudal em um país industrial moderno. diferentes blocos, conforme estivessem ali-"", revolucionária. .dagogo Bogdan Suchokolski defendia um
Durante a implantação da política edu- nhados ao capitalismo liberal ou ao socia- Em Cuba, após a revolução 'castrista de- humanismo sociaJ.ista que primasse pela for-
cacional, o ensino religioso foi suprimido, fumo. Se a Leste a doutrinação da juven- 1959, o Estado passou a oferecer condi~ . mação ética, baseada na cooperação.
prevalecendo uma orientação' exclusi- tude adquirira forte caráter de adesão aos ções de acesso à escola a todos. Dce.início, Na África; na"década de 1970, ao mes-
vamente voltada para a doutrinação do valores socialistas, a Oeste, em que pese a: devido a problemas econômicos, 20 mil es- mo temp'o que se descolonizavam, vários
I marxismo-leninismo.
Na: época de Stálin ocorreram mudan-
influência da Escola Nova, som 'seu ideal
de autonomia e individualidade, os países
tudantes secundáristas, professores e fun-
cionários foram deslocados para a colheita
países aderiram ao socialismo e introduzi-
ram processos semelhantes de reforrnula- .
ças significativas. O ideal da relação estrei- capitalistas se ressentiram do impãcto da da cana-de-açúcaI;' ao mesmo tempo que . ção da educaÇão. Entretanto, sofreram di-
-I I
ta entre trabalho e educação foi de certo
modo descuidado pela prioridade dada
ideologia anticomunista, que teve seu auge .~.
durante o período do màcartiSIIÍo.O ter-
se intensificavaJI).as atividades escolares.
Com a universalização da .escola ele-.
ficuldades decorrentes da extrema miséria,
da vari~dade de dialetos e das diferenças
à formação cultural e científica. A escola mo macartismo vem de joseph McCarthy, mentar, em U!l1 só dia foram abertas mais culturais entre as trioos que compunham
voltava a ser infelectualista, adequand.o- senador norte-americano que na década • ,.,.~ de 10 mil salas de aula, para atender 90% cada nação.
se ao modelo tradicional com horários, de 1950 desencadeou um movimento de das crianças de 6 a 12 anos. Era grande à . O pedagogo brasileiro Paulo Freire e
programas, provas, disciplina, manuais. perseguiçãó aos supostos comunistas in- diferença da época do ditador Fulgêncio .sua equipe viveram essa experiência na
Assini, voltou a. prevalecer o du~o es- filtradps, inaugurando urna época cinzen- Batista, quando metade da população de ex-colônia portuguesa da Guiné-Bissau,
colar, com a criação de escolas "profissio- ta de intimidações, delações, verdadeira crianças em idade escolar permanecia fora .,\}nde-o-projeto de alfabetização foi pre- .
nais" separadas das escolas de formação. "caça às bruxas" que atingiu funcionários da:escola. O Estado construiu mstalações cedido .por íntenso trabalho de conscien-
Mais tarde, na era Kruchev,.tentou-se re- públicos, artistas e intelectuais. escolares, além de converter quase seten- tização e-elrboração crítica do fazer dos
tomar o ideal da união entre trabalho in- Ainda que o macartismo tenha ficado ta quartéis militares em escolas. Mediante trabalhado'i~s.
telectual e manual. testrito àquele penodo, nada impede que a arregimentação de professores volun- Na Nica~<t, em 1978, quinze dias
tários, a educação foi levada' aos lugares.. apos a Vitória sândinista sobre o governo
mais dtst~tes. Em um ano a taxa de anal- de Somoza,já se iniciavanl,.osestudos para
• HlStúria dtzpedagogia, p. 60 I. fabetismo desceu de 23,6% para 3,.9%, e <lo. erradicação do analfabetismo.

248 História da Educação e da P~dagogia - Geral e Brasil Educação para a democracia ~-------------_._-_.~------ - 249.

Mesmo que Gentile tenha feita uma apro- meio da adesão a. organizações extraes-
Após a queda do Muro de Berlim a homogeneização do campo social. Desse
priação indevida e apressada dos conceitos colares, que administravam o tempo livre
modo, o Estado interfere na totalidade da
do idealismo h(!geliano, a ex,acerbação da. dos jovens e os condicionavam à obediên-
Conforme estatísticas5, os paíse~ do 'Leste atividade humana: na vida familiar, escolar,
idéia de Estado como a suprema e mais cia e à hierarquia. Em todas as atividq.des.
Europeu, que inicialmente enfrentaramgra- econômica, intelectual,. religiosa, de lazer, "o

peneita realidade favoreceu a implantação da comunidade predominavam as técnicas


ves proplemas.com i11lalfabetismo, tinham nada ~stando de propriamente privado e
do ideal totalitário. Tanto é que o filósofo, de ..psicologia coletiva, que promoviam a
alcançado os seguintes índices: União So- autônomo.
ao dar-se conta dos caminhos tomados por manipulação das mas~as: slogans, sírÍlbolos,
Viética, Alemanha' Oriental e Tchecoslová- O nazismo eo fascismo são avessos à teo-
Mussolini, se afastou do govemo que apoia- repetição, .discursos elo quentes e inflama-
quia apresentavam taxa insignificante; Po- ria, e se vangloriam de um anti-intelectua-
ra de início. dos, violência sensoriàJ (g~d~s .paradas
lônia, 0,8% (em 1983); Bulgária,.O,5% (em lismo fundado no primado da ação. Mais
Antes, porém, em face dos interesses militares, símbolos do regime reproduzidos
1980); Romênia, 4,2% (em 1983); Hungria, do que ideias, a eles interessam a retórica
ideológicos comuns, Geritile, nomeado por em enormes painéis, músicas dó" partido).
1% (em 1984). e seus efeitos de doutrinação, que levam
Mussolini ministro da instrução pública de Em tudo, as emoções eiacerbadaS ao má-
Em 1989, com a queda do Muro de Ber- à obediência e à disciplina. É .possível, no
1922 a 1925, procedeu a uma reforma do ximo facilitavam a adesãÜ".quaS~illiica aos
lim, o socialismo real entrou em colapso. entanto, encontrar a influência. de alguns
ensino que acentuou o dualismo escolar "ideais coletivos". .'
Acelerou-se o processo de d~sagregação teóricos, como Carl Schmitt. Em 1928 este
(separação entre formação humanista e Nas escolas propriamente di~as, valori-
das reI:úblicas socialistas, que pouco a pou- jurista alemão acusava o liberalismo de ser
escola profissionalizante), na verdade, um zavam-se as. disciplinas de .moral e cívica,
co adernam à economia de mercado. Após incapaz de evitar a fragmentação da so- .<;:i
retrocesso na tendência em outros. países para formar o .caráter, a força de vontade,
. a derrocada, a sÍtuação difícil que'já se ar- ciedade civil calWlda pelos conflitos indi- i'.
de universalização da escola pública de a disciplina e f) excessivo amor à pátria.
rastava na década ael980 tendia a piorar, . vidualistas. Em contrapartida,. procurava
qualidade. Especial atenção era dedicada 1educação
com inflação, desemprego, fome e rápida justificar a preeminência do todo sobre o
Ainda mais, com a instituição do exame fisica, para a~ender aó ideal de corpos sa-
perda dos beneficios sociais, como moradia indivíduo.
de Estado para avaliar os alunos ao final do 'dios e rígidos (o endUrecimento do corpo
e educação. Ainda que mais tarde os nazistas recu-
curso, tornou o ensino secundário cada vez . exige rigor militar). Por outro 1ado, preva-
sassem a teoria de Schmitt, ela serviu para
mais seletivo, o que correspondia à inten- lecia evidente desprezo pelas atividades in-
5. O desvio do totalitarismo: nazismo, colocar o Estado como instância hierarqui- ,
ção de criar "poucas escolas, mas boas". telectuais e por qualquer teoria, lembrando
fascismo e stalinismo . camente superior à comunidade, sem pre-
Essas medidas faziam sentido no contexto que o primado da ação consistia .em meta
cisar de nenhuma legitimação para exercer
explícita de Mussolini. ~
No penodo entre as duas.Grandes Guer- . SlJ.a soberania absoluta: Para ele,' o Estado >, mais geral, que se baseava na concepção
Nada disso pode ser considerado edu-
não se funda no direito, mas, ao contrário, o aristocrática de privilegiar a formação da
ras (déc~?as de 1920 e 1930), di~diram- cação propriamente dita, no sentido
direito procede do Esfado, cuja vontade po- .~ classe dirigente.
se na Europa as ideias que levaram à im- pleno da palavra, maS sim doutrinação
lítica se exp:ressa no chefe, que é a afrna do \ Enquanto' a Escola Nova teve por ideal
plantação do totalitarismo: fascismo na Itá- e adestramento, cujos efeitos~ 'nefastos
todo. Aliás, os epítetos de Hitler e de Musso- •. educar para a liberdade, no sentido de pos-
lia, nazismo na Alemanha, totalitarismo de atingiram o movimeritÓ da Estola Nova.
lini, respectivamente F'uhrer e Dua, têm o . sibilitar a autogestão dó educando e a cons-
esquerda na' União Soviética (stalinismo). O gov:erno italiano determinou o fecha-
mesm9 signifi~ado de "condutor", "guia". -, trução da sociedade democrática, as escolas
Na Península Ibérica, as ideias naziflascistas mento das escolas montessoriaÍlas; na Es-
Na Itália, Giovanni Gentile (1875-1944) nos govérnos totalitários representaram um
inspiraram a ditadura de Salazar,em Por- panha.. do general Franco exigiu-se maior
participou de um grupo de estudiosos neo- desvio e um retrocesso, além de evidente
tugal, e o governo do general. Franco, na rigidez no ensino;", na' França de Pétain
hegelianos. Como vimos no capítulo ante- .violência simbólica.
Espanha. (sob a ocupação alemã) foram suprimidas
rior, Hegel desenvolveu a dialética idealis- O totalitarismo de direita fazia a crítica
Apesar das diferenças locais, em todas a escola única e a gratuidade do curso
ta, pela qual o Estado realizaria a síntese ao comunismo e ao caráter inqividualista
essas êxperiências prevalecia a exaltação do Sec11~dário. Valorizou-se 'aÍnda ao~ultura
da totalidade dos interesses contraditórios do ~beralismo. Desprezava a democracia,
poder do Estado, que tudo aglutinavasob fisica em detrimento da intelectual, com
. entre os individuos. em uma realidade co; valorizando, ao contrário, o papel do mais
as ordens do partido único rigidamente Of- ". maior imposição das ideias' de hie~rrquia
letiva . .ou seja, o Estado representaria a;': .. forte, da eh"te dirigente. A educação assu-
ganizado e burocratizadó,' sem tolerar con- e obediência. /
unidade final e mais perfeita que superava miu caráter privilegiado de controle e difu~
fronto. É o partido que promove a identifi- AJJ findar a guerra, em 1945, depois de
~ cont:Io;di~o entre o privado e o público. ' são da ideologia oficial.
cação entre o poder eo povo, pr9cessando tão rigoroso adestramento ocorreu. lento
Fora da escola, procedeu-se à manipula-
ção das consciências, buscando .enquadrar processo de descondicionamento, não só
a juventude na ideologia do regime, por dos alunos, como também dos professores.
l FoUza de S.Paulo, 10-03-1990, caderno especial '~uropa do Leste", p. 4 e 5.
251
- ~"--- --- ..•.
II j.stéria-cla-Edtleação-e-da Pedagogia - Geral e Brasil Educação para a democracia
250 H

• . -,r.
,
~~
Já vimos, no item sobre educação socia- A solução desses e de outros problemas
,. desceu com os protestos contreia separação da .sociedade, passando .por outras propos- .
lista, que na época de Stálin a União Sovi- exige providências no plano político e eco- dos alojamentos femininos, o que significa-' tas alternativas, até a ênfase dos tetricos
. ética viveu um governo totalitário. Além de nômico, a fim de evitar que continuem exis- va também reivindicação de liberdade se- criFico-reprodutivistas, posta no caráter
serepl abandonados os ideais socialistas da tindo as causas sociais que levam à barbá- xpal e critica à morálidade burguesa. ideol&gicoda educação, como veremoS' rio ,.
educação politécnica, tanto a escola corno rie. Se nesse contexto a educação não chega . Ao se ampliar, o conflito atingiu a Sor- tópico Pedagogia.
o controle do tempo livre encaminhavam a exercer um papel decisivo; convém não bonne e, em seguida, o famoso Quartier .' Os grandes inspiradores da "revolução"
as crianças e os jovens para a formação do 'desconsiderar sua relevância. Por isso, toda Latin, onde os estudantes enfrentaram a de maio de 1968 foram o filósofo francês
"cidadão comunista", o que significava a escola deve dar condições para a discussão polícia com ~arricadas de carros tombados, Jean-Paul Sartre e o alemão Herbert Mar-
imposição da ideologia a fim de evitar as dos valores que levem à conscientização e à
. dissidência,s. árvores, paralelepípedos, caixotes incendia-' cuse. Este pertenceu' ao grupo ,da Escola
autorreflexão critica.
dos. Recebeu a adesão de operários, e os de Frankfurt e, ao radicar.se nos Estados
Na' contramão das tendências' totalitá- sindicatos deflagraram uma greve que pa- Unic1.os,elaborou d~a crítica à sociedade
Um alerta para o futuro rias, outros educadores desenvolveram te- ralisou a França. Tomando proporções ini- burguesa em suas obras Eros e ciuili<.açã~ e
orias antiautoritárias e criticaram inclusive magináveis, o movimento atingiu a maior -1 ideologia da sociedade industrial, a partir do
As atrocidades cometidas pelos governos a escola tradicional, considerada excessiva- parte dos países, inclusive o Brasil. pensamento de Marx ede Freud.
totalitários se exerceram n!JSmais diversos mente impositiva. Defendiam uma e'duca- Os intéI}Jretes da famosa "revolução" . Mais do que uma "revolta juvenil", maio
campos: a doutrinação na escola, a censu- ção não-diretiva,' cujo método visava antes recusam reduzir as explicações à exigência de 1968 significou uma "revolução cultu-
ra na cultura, o silenciamento.focçado dos de tudo a deslOCaro aluno para o centro do de educação menos arcaica e de melhor. ral", Basta lembrar que, concomitantemen-
int~0uais, a barbárie perpetrada pelas processo educativo, como sujeito, livrando- adequação do ensino à oferta de empregos.... ,-te a esses eventos, se desenvolvia a contra-
polícias llecretas, o genocídio' de judeus e' -o do papel controlador do professor. .Mesmo que inúmeras criticas fossem dirigi- cultura juvenil. l:Jm de seus exemplos era
ciganos nos campos de concentração da Deixamos para examinar, no tópico Pe- das à educação, parece que a revolta cori- o movimento dos hippies, que, ào defender
Alemmilia, o confinamento de dissidentes dagogia, as diversas teorias pedagógicas an- testava profundamente os alicerces da vida. . "paz e amor", divulgavam a cultura da
nos gulags soviéticos. . liautaritárias,' sejam as' do' Ih1.o-diretivismo moderna, a civilização do bem-estar e do não.violência e da recuperação do erótico
Pensadores como Hannah Arendt, bem de cunho liberal, sejam-as anarquistas. consumo. As acusações orientavam-se para na vida cotidiana.
CcmlO' os filósofos da Escola de Frankfurt,
a sociedade produtivista, aparentemente
entre 'outros, refletiram sobre as causas do 6. Paris: maio de 1968 racional, mas que exigia um trabalho em- '7. A es~ola e a.sociedade da informação
totalitarismo, na tentativa de compreender
brutecedor, alienante e se sustentava na re-
e evitar que a hUmanidade passasse de novo A partir da Segunda Guerra, a univer- pressão dos desejos. É possível perceber tal É sempre controvertida a discussão sobre
por esse horror. sidade européia enfrentou PI'?blemas de- inconformismo nos inúmeros grafites por o Uso.das modernas técnicas na educação.
Em linhas muito gerais, é preciso estar- cotrentes do processo de massi:fi.cação,que toda a Paris (ver dropes 1).
mos atentos às massas atomizadas facilmen- De um lado, uma postura conservadora re-
. fizera crescer enormemente a populaç$o Os eStudantesreivindicavam maior par-
te manipuláveis, aos destinos de uma socie- siste a qUalquer inovação técnica como se
estudantil. A situação tornou~se mais agu- ticipação na educação e nos diversossetores
d~e burocratizada e hierarquizada, que a fosse incompatível com a natureza ~iritl.l-
da na década de 1950, sobretudo porque o da política. Denunciavam o afast~ento do
fim de manter a ordem está sempre pronta al do processo educativo, e, por outro, há o
maior acesso à universidade não significou cidadão comum dos centros de decisão, daí
para aderir a um "pai" forte. E atentos tam- risco do tecmcisrno: da exaltação desmedi-
verdadeira d<;Flocratização,já que o mero as palaVI'llS-chaveserem autonomia, auto-. da da técnica.
bém à sociedade injusta em que predomi- cada de trabalho .não conseguia assimilar gestão e diálogo. '
na. a exclusão, que relega seus membros à Os recursos da tecnologia são utilizados
adequadamente os diplomados. As alterações realizadas nas universida-
impotência .e, portanto, ao conformismo. tanto nos modernos designs do mobiliário
A "revolução" de maio de 1968,'aconte- ". des em razão dessa crise, nb entanto, não como na arquitetura escolar (antes as' es-
- Essas-questões.tornarn-se mais complexas cimento marcante do século xx, teve iní- ocultavam urna rachadura mais funda,
atualmente com o empobrecimento das colas mais pareciam casernas ou prisões).
cio na Universidade de Nanterre, em Paris, enraizada nos alicerces da nossa socieda-
populações periféricas, .que migram para Outras inovações tentam superar a indi-
e em parte foi reflexo dessa criSe.De cunho de industrial. Mais ainda, não se exigiam
, os países adiantados e aí encontram os gru_ gênci:; dos tradicionais manuais escolares e
anárquico e, portant'o, antiautoritário, esse apenas reformas momentâneas mas, antes,
pos racistas em plena -expansão. Basta ver o dirigismo da didática magistrocêntrica.
movimento espontâneo provavelmente te- era questionada a própria estrutura escolar:
a -atUação de neonazistas na Alemanha, na Na segunda metade do século XX, re.
ria começado com questões internas de cri- Não por acaso, na década de 1970 aparece- cursos audiovisuais já se ach~vam dispo-
Áustria, além de expressões de..xenofobia tica ao sistema de exames, estendeu-se em ram as mais virulentas análises, desde a de níveis em sala de aula: retroprojetores,
de cid.lldãoscomuns da França. razão da punição de alguns alunos e reçru- Ivan lllich, que propôs a desescolarização diapositivos, filmes, discos, fitas, ,ideocas-
'. 252 -- - História da Educação e da Pedagogia":'" Geral e Brasil Educação para a democracia 253"
setes, gravadores, televisão, aparelhos para A utilização dos recursos da iécnica ele- . mais incisiva do que a da família, uma vez compreender o mundo transformado pela
1
laboratórios de línguas, instrumentos que trônica, porém, nem sempre foi regular em que nem sempre os pais acompanham de técnica e atuar sobre ele de maneira critica ..
foram sendo refinados à medida que o mer- muitas escolas - sobretuOO nos países em perto a.formação dos seus filhos. Mais ainda, aprender ~~ m;do cQntínuo -
cado oferecia outros produtos, como CDs, desenvolvimento - devido a diversos fato- Sabemos que a mídia exerce um poder tanto o aluno corno '0 professor -, já que.
DVDs, computadores etc. res, tais como gasto dispendioso de instala- de padronização de comportamentos, de essas transformações'continuarão ocorren~
. Um interesse maior, portanto, revela-se ção, di:f1cu1dade de adaptação ao esquema estímulo ao consumismo, além de valorizar, do .de modo vertigihoso.Voltaremos a esse
na grande revolução tecnológica daquele rigido de horários escolares, além do des-. pela cultura de massa, uma produçãg ra- tema no capítulo 12.
século: a cibernética. Essa revolução nos in- preparo de professores ou' até de sua re- refeita voltada para o entretenimento. Não
troduziu na chamada sociedade da informação. sistência às inovações. A propósito do alto vamos aqui entrar na já antiga polêmíca en- Pedagogia ,!I ..

O computador entrou nos mais diversos custo dessa tecnologia, existe o desafio de- tre "apocalípticos e integrados": os primei-
campos do mundo contemporâneo, e cer- mocrático de diminuir 'aporcentagem esta, ros - cujos representantes principais são os Nest~ ~ópico sobre a pedaiogia con-
. tamente na era da informática a escola não tística de analfabetos digitais, pela ampliação teóricos da Escola de Frankfurt ~ acusam t~mporânea, retomam'6s algwis,;':assuntos
tem corno permanecer a.I1esanal nem ficar do acesso a esse tipo' de informação. Ainda a indústria cultural de promover a evasão, anteriormente abo.rdados do :~pOnto de
à parte, reclusa, em plena época de globa- mais, o uso da moderna tecnologia aplica- a alienação e de atrofiar a- imaginação e vista da experiência educacional efetiva,
lização da informação. São de grande va- da ao ensino não é'bem explorado, uma vez a criticai os segundos - em um primeiro para então examinaras ,teorias que funda-
lia pa;ra os usuários ós bancos de ç1ados, as que frequentemente a intenção se restringe momento representados por McLuhan - mentam aquelas práticas, que as criticam,
bibliotecas eletrônicas facilmente acessadas à quebra da monotonia das aulas, com o dão' destaque ao caráter informativo e de ou ainda as que propõem mudanças nes-
por meio da internet, o q:ue exige a rápida objetivo de motivar o aluno e não como ins- ampliação da sensibilidade. provoca9,o pela ses procedimentos.
adaptação da escola aos tempos marcados trumento fundamental e revolucionário de mídia, fatores importantes para o enrique-
pela vclocidade da mudança e pelo volume aprendizagem. cimento da ~tura, o que significa, p0f!an- 1. A contribuição das ciências
crescente de informação .. A questão da técnica também se coloca a to, uma visão otimista desses meios.
No. momento, estamos no iz:.k:io desse propósito de outros desafios. decorrentes do Aqui,pretendemos àpenas levantar essa, Observamos na produção pedagógica
processo em que o computador vem sen- avanç~ tecnológico no século :Xx, porque, questão que afeta de modo fundamentar o . c~nteinporânea forte influêricia das ciên-
do usado nas escolas, ora como requin- ao alteral as atividades das indústrias e do ~i trabalho do educador e do pedagogo dian. cias humanas, ênfase que varia conforme'o'
tado meio de armazenamento de dados, campo, as modernas máquinas da robótica te da criança precocemente exposta a esse- autor. O interesse pela natureza da crian-
ora como linguagem a ser.aprendida em exigem mudanças na maneira de ensinar. grande volume de informações, abrindo ça, pelos processos de aprelídizagem e pela
um mundo de computadores. Além dis- Aliás, a necessidade de alfabetização' em espaços na escola para a discussão sobre busca de métodos ~.dequados encontra na
so, já existem linguagens de computação massa já decorria da exigência cada vez essa influência. A esse propósito, poderia- psicologia preciosa au.'<iliar. Evidentemen-
criadas com finalidades educacionais, o maior de trábalhadores especializados para mos lembrar o filósofo Montaigne, que, no te, a abordàgem tem sido feitaçle acordo
que, com certeza, alterará o processo da . assumir os desafios ªo mercado de traba- século XVI, já preconizava uma educação com as tendências - natur~st9-oi.t huma-
aula tradicional~ lho. justamente essa orientação para o tra- que fizesse uma "cabeça bem-feita" e não . nista, corno veremos ..•....que. os ps1col'eda-
Aliás, os processos massivos da indústria balho preocupa os pedagogos, porque eles uma ,"cabeça bem cheia". Edgar Morin re- gogos .imprimem em suas pesquisas. Daí a
cultural tornaram obsoleta e ineficaz a ve- se veem diante do conflito permanente en- -:. toma essa ideia quando diz: "Uma cabeça diferença de orientação de pedagogias ceR-
lha aUla de saliva e giz, pelo menos para tre duas linhas de educação que deveriam " • benfeita é uma cabeça apta a organizar os tradas na contribuição do behaviorismo, da _
transmitir informações. É nesse sentido . estar ligadas na escola unitária, aquela que conhecimentos e, com 'isso, evitar sua acu- gestalt,' da psicanálise, entre outras ciências. ' .
que poderá vir a mudar a função docen- visa tanto à formação humanística como '( mulação inútil" . Do mesmp modo, a sociologia ajuda a
,""
te. Diante. da necessidade de democratizar à educação para O trabalho, a fim de que O problema edu.caciçmãI não está, por- compreender melhor a educação como
-- - o- ensn;o .e ampliar a rede escolar, havei'â sua tarefa não se reduza apenas a preparar tanto, apenas em utilizar a tecnologia comp instrumento de desenvolvin]ento da socie-
economia de esf~rços e melhor aproveita- mão-de-obra para o mercado, mas cida- instrumento avançado no ensino, acompa- dade, quer para formar bons' cidadãos e
mento do professor, que, liberto das funções .dãos conscientes e criticos. nhar a sua evolução no mundo do traba- prepará-los para a partici~ção produti~a
de informação e repetição, poderá desem- Outra questão candente com que se de: lho, ou ainda estabelecer a interação entre nas atividades sociais, quer para discutir
penhar melhor um papel que é só seu e que fronta a escola contemporânea é ~ influ- a escola e a educação informal dos meios outros modos de recusa do conformismo.
jamahi será transferido para máquina argu- ência dos meios de comunicação de massa de comunicação de massa, mas questionar Daí o interesse não só pelo ensino técnico,
ma: a discus~o, interpretação e critica das sobre as crianças e osjovens, exercendo ine- como deve ser daqui em diante uma peda- mas pela educação para o trabalho, 'O .s:J.ue
informações. gável educação inf?rma1, muitas vezes até gogia que realmente oriente o cidadão para supõe inclusive a critica à escola dualista.
. História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Educação para a democraàa
----t--- .1.í~------- -
-.
I
Tal como no caso da psicologia, varia o uso
que os pedagogos fazernda sociologia, con- .
forme se apoiem na perspectiva positivis~•
à visão filosófica idealista e individualista.
Durkheim introduz a atitude tkscriJ:iva, vol-
tada para o exame dos elementos do fato da
. Veremos adiante como a sociologia;
comprometida com a crítica à ideologia,
auxilia a pedagogia a teorizar sobre cami-
Muitas foram as .controvérsias, sobre-
tudo devido. ao caráter. mecanicista dess~
processo e à programação excessivamente .
1
ta de Durkheim, na dialética de Marx, na educação, aos quais aplica o método cien- rih~s alternativos, que não sejam apenas de rígida. Essas criticas foram dos psicólqgos .
teoria crítica dos pensadores da Escola de tífico. Como sociólogo, enfatiza a origem adaptação e conformidade. . que destacavam a funçã<;> glo~alizante da
Frankfurt, no neokantismo, na linha crítico- social da educação, daí a sua clássica defi- aprendizagem e por isso recusavam a ex-
reprodutivi,sta e assim por diante. nição: '1\ educação é a ação exercida pelas. Psicolc:>gia:o behaviorismo plicação associacionist.ado comportamento
A pedagogia do século xx, além de ser gerações adultas sobre as gerações que não levada. a efeito pelo behavionsmo.
tributária da psicologia, da sociologia e de se encontram aiÍlda preparadas para a vida No século XX, a psicologia contin)lou a Várias tilosofiasse opuseram ao positivis-
outras ciências, como a economia, a lingJlÍs- social; tem por objeto suscitar e desenvol. sofrer a influência dã. tenaência positivista, mo, criticando o seu reduçionism9. O po- .
tica, a antropologia etc., tem acentuado a ver, na criança, certo número de estados fi- sobretudo o behavjorismo norte-americano sitivismo é.cientificista ao eleger.o método
exigência que vem desde a Idade Moderna, sicos,intelectuais e morais, reclamados pela (behauiour, em inglês, signifiCaconduta, com- das ciências da natureza corno modelo de
qual seja, a inclusão da cultura científica sociedade política no seu conjunto e pelo portamento). O método dessa corrente de cientificidade, reduzindo o objeto próprio.
corno parte do conteúdo a ser ensinado. meio especial a que a criança, particular- psicologia privilegia os procedimentos que das ciências à realidade observável, ao fato
mente, se destine"6. levam em conta.a exterioridade do com- positivo. Além' disso, a defesa do compor-
2. Positivismo e pedagogia Para Durkheim, "a educação satisfaz, portamento, o único considerado capaz de tamento condicionado supõe admitir que
antes de tudo, as necessidadés sociais", e ser submetido a controle e experimentação o indivíduo deve adquirir conhecimentos e.
Corno vimos no capítulo anterior, o posi- "toda educação consiste num esforçocontí- objetivos.. . comp~tências para se adaptar ao meio so-
tivismo surgiu no século XIX, com Augusto nu{)para impor à criança maneiras qe ver, O behavioqsmo é tributário das desco- cial em que vive.
Comte, cujas ideias exprimem a confiança de sentir e de.agir às quais.a criança não bertas dQ.russo Pavlov (1849-1936) sobre o Já na passagem do século XIX para o
no conhecimento científico, por ele consi- teria espontaneamente chegado". mecanismo do reflexo condicionado. Suas xx, O' filósofo alemão Wilhelm Dilthey
dera.do o único capaz de descobrir as leis A vantagem da perspectiva durkheimia- experiênçias foram ampliadas e aplicadas (1833.1911) criticava a tendência naturalis-
do universo. na está no mérito de ter acentuado o cará. nos Estados Unidos por John B. Watson ta das ciências humanas, inclusive na peda-
Adaptando-se às transformações dos ter social dos fins da educação. Além disso, (1878-1958) e posteriormente por B. Frede- gogia. Para ele, os fatos espirituais não se
novos tempos, o positivismo interferiu vi- instituiu a pedagogia como disciplina autô- rich Skinner (1904-1990). A contribuição assemelham aos processos naturais, por se
vamente na concepção de mundo e sobre- noma, desligada da filosofia,da moral e da de ainbosinfluenciou fortemente a pedago- . referir ao mundo humano da significação e
tudo constituiu o pressuposto filosóficodas teologia. Os limites dessa abordagem en- gia. Baseado na teoria do reforço (positivo do valor. Por isso não podem ser retirãô.os
ciências humanas de tendêqcia naturalista, contram-se na sua parcialidade. Ao enfati. e negativo), Skinner desenvolve.a técnica do seu contexto histórico, nem é possível
êomo a sociologia de Durkheim e a psico- 0'- zar a origem social da educação, Durkheim da instrução programada, pela qual o texto formular leis objetivas sobre eles, mas sim
logia behaviorista. Vejamos como es~ in- desenvolvéu uma concepção determinista, apresentado ao aluno tem uma série.de es-. compreendê-los e interpretá-los:
fluenciaram a educação. segundo a qual a sociedade impõe os pa- paços em branco para serem preenchidos, . Filós6fos da linha fen.omenológica, além
drões de comportamento. . em crescente grau de clificuldgde. Se for e
dos f:rankfurtianos muitos outros, critica-
Sociologia: Durkheim De lá para cá, tem sido grande a contri- dado um reforço a cada passo do processo ram os presstlpostos positivistas que subja-
buição da sociologia,'nãó só à análise das e imediatamente após () ato, o aluno pode zem na metodologia das ciên~ humanas.
Coube a Émile Durkheim (1858-1917) relações entre escola e meio social, como conferir o erro ou acerto de stra resposta. O
desenvolver a ciência da sociologia sob di- também à melhor compreensão .dos pro- processo foi desenvolvido para .cnar a má- o tecnidsmo: tecnocracia na
versos a5-pectos,i:çtclusiveinovando ern,sua blemas educacionais. E, por fim, situa ~ quina de ensinro;a que já nos referimos. organiza.ção ~scolor
obra Educação (J sociologia. escola não apenas em determinado contex- AI6m das.obras científicas, Skinner des- - -------
Antes de Durkheim, a teoria da edu- to social, mas a vê ~omo um grupo social . creve, no romance Walden lI, uma socieda- O mundo contcmporâneo muittJ deve
cação assumia çrientaçãõ predominan- complexo, cuja estrutura interna precisa ser de utópica em que as pessoas são educadas ao desenvolvimento da ciência e da téçnica,
temente intelectualista, por demais presa estudada. de modo científico, por meio de reflexos que determinaram um.modo novo de pen-.
.condicionados. sar e agir sem similar em toda a história da
.O behaviorismo também está nos pres- humanidade. Com o capitalismo industrial,
6Émile Durkl1eim, Educarão! sociologia, 4. ed. São Paulo, Melhoramentos, 1955, apud Luiz Pereira e Marialice
M. Foraccm (orgs.), Educarão e sociedade: leituras de sociologia da educação. 12. ed. São Paulo, Nacional, 1985, supostos da orientação tecnicista da educa- a ciência deixou de se comprOIpeter ape;
p.42. çãQ)como veremos. nas com o puro conhecimento, voltando-se

256 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Educação.para a democrada 257 ..



para o desafio de "dominar a natureza", trou as esperanças hela depositadas. 'Co- atual momento de globalização da econo- Exemplificando; segundo a t~rapia reRe-
sonho que, desde Francis .Bacon, no início meçou então, a partir das décadas de 1960 mia e de fortalecimento do ideária neolibe- xológica behaviorista, a reeducação de uma
da Idade Moderna, fascinava o ser huma- e 1970, a se esboçar a tmdêruia temicista, de ral, continua existindo o risco de encarar a criança manhosa consiste em:desrondicio-'
no. Hoje, bem sabemos, a ~áxima "saber influência norte-americana, cuja proposta educação como uma técnica de adaptação nar a resposta manha e substituí-la por qu-.'
é poder" tornou-se uma c~nvicção perigosa tinha o intuito de tornar a aprendizagem . humana ao mundo do mercado. tro comportamento socialmente adequado.
para orientar os destinos da humanidade. "mais objetiva';;' pla."nejamento e organi- Na análise fenomenológica, ao contrário, a
O avanço da tecnologia exigiu a for- zação racional da atividade pedagógica; 3. Fenomenologia e pedagogia manha não é, mas sigP.ifica, e pela emoção
mação de técnicos especializados e, mais. operacionalização dos objetivos; parcela- a criança se exprime na totalidade do seu
ainda, de urna organização do trabalho mento do trabalho, com a especialização A fenomenologia é urna filosofia e um ser, "dizendo'" coisas com o choro,;que por
voltada pãra o' aumento da produtividade, das funções; incentivo ~ várias tecnicas e método que surgiram no final do século isso mesmo precisa ser interpretado. Desse
eficiência e eficácia. Para tornar possível instrumentos, como instrução programada, XIX. Foi Edmund Husserl (1859-1938),no modo, à relaçãC'mecânica entre estímulo e
essa meta, teóricos propuseram técnicas de ensino por computador; máquinas de ensi- entanto, quem formUlou suas principais li- resposta estabelecida pelo behaviorismo, a
a
racionalização, tais como do norte-ame- nar, telensino. . nhas, abrindo caminho para. filósofoscomo fenomenologia contrapõe a cliStinçãoentre
ricano Taylor, que no início do século XX Outra' influência na tendência tecnicista Heidegger;Jaspers, Sartre, Merleau-Ponty sinal e símbolo. Enquanto o sinal faz parte
teve o seu projeto de trabalho parcelado aplicada à educação encontra-se na Teo- e Martin Baber. do mundo físicodo s'er,o símbolo pertence
'aplicado com sucesso nas fábricas, dando ri'à.'do'Capital Humano (TCH), divulgada A fenomenologia contrapõe-se à filosofia ao mundo humano do sentido.
origem ao sistema da linha de montagem sobretudo por Theodore Schultz, ll,utorde positivista,presa-demais à ilusão de alcan- Diversospsicólogos utilizaram o método
típica do fordisrno. O taylorismo foi acei; O valor econômico da educação. Para ele, "as çar o conhecimento objetivo do mundo. fenomenológico, imprimindo na pedagogia
to em diversos países, independentemente escoláS podem ser consideradas empre-. Enquanto o positivismo quer garantir um uma linha contraposta à tendência ernpiris-
• de ideologia, inclusive por Lênin, na União sas" especializadas em produzir instrução . conheCÍn1entocientíficocada vez mais neu- ta e positivista. São os casos de Dilthey e
Soviética. . A adaptação do ensino à mentalidade em- tro, despojado de subjetividade e distante dos gestaltistas.
No início da década de 1940,já se podia presarial tecnocrática exige o planejamento do humano, a fenomenologia propõe a "hu- Dentre os norte-americanos destacam-
falar em uma "era dos organizadores", em e a orgarnzação' racional do trabalho peda- manização" da ciência, estabelecento uma -se Rolia May (1909-1994)e Carl Rogers
que se estabeleceu uma nova hierarquia gógico, a operacionali~ção dos objetivos, nova relação entre sujeito-objeto e homem- (1902-1987). Este último, também pedago-
social decorrente do poder de coordenar o o parcelamento do trabalho com a' devida mundo, considerados polos inseparáveis. go, foi responsável pela tendência centrada
conjunto e dirigir o todo, já que "os seres especialização das funções e.a burocratiza- Se examinaimoso conceito de fenôme- "
no aluno, que privilegia o método não-di-
humanos são instrumentos de produção ção. Tudo para alcançar mais eficiência e no, que em grego significa"o"que aparece", retivo, em que a interferência do professor
tão importantes quanto as máquinas e é produtivIdade. .~ compreenderemos"melhor que a fenome- é reduzida a~ mínimo, como veremos no
preciso saber manejá-los"7. Essa tendência Como todo proces~o em que predomi- nologia trata dos objetos do conhecimento item 7.
baseia-se em pressupostos positivistas, e, nam piáticas administrativas, a tendência como aparecem, isto é, como se apresentam . A fenomenologia tarpbém está na base
em nome de um saber científico pretensa- tecniç-:..sta. privilegia as funções. de plane- à consciência. Como doadora de sentido, do existencialismo francês, cujo maior
mente neutro e objetivo, na verdade exerce jar, organizaz; dirigir e controlaz; in,tensifi- como fonte de significadopara o mundo, a nome foi Jean-Paul Sartre. Suas reflexões
uma função de controle e, portanto, ocul- caudo a burocratização' que leva à divisão cmisciênciãnão se restringe ao mero conhe- filosóficasrevelam a busca de um outro mé-
ta um significado político de dominação. do trabalho. Os técnicos tornam-se então cimento intelectual, mas é geradora de in- todo para as ciências humanas, não mais
"~l
Isso é evidente quando nos damos conta responsáveis pelo planejamento'e controle,. . tencionalidadesnão só cognitivas como afe- •cEmiprometido com o positivismo e suas
de que uma minoria controla e o restante o diretor da escola é o intermediário entre.}! tivas e práticas. O olhar sobre o mundo é o concepções deterministas, negadoras da
é controlado. '. eles, e.os professores reduzem-se a simples ato pelo qual.o experienciamos, percebendo, liberdade humana. Em suas obras, Sartre
. O processo organizacional, típico das ~ecutores. Com isso, o plano ped!lgógico .. j -imagínando,julgando; amando; temendo. ocupa-se com a~estão crucial da liberda-
emp'resas de indústria e serviços, acabou submete-se ao administrãtivo. . ..' Para a fenomt:nologia não há fatos Com de, justamente o que distingue o ser hurna-
por se estender à escola quando~ por volta Contudo, não convém situar essatendên- .""" a objetividade pretendida pdo behavioris- . '£'1
no dos amma.IS.~",om a afirmaçao
~d e que " a
da metade do século, a Escola Nova frus- cia apenas até a década de 1970,.porque no mo,já que não percebemos o mundo como existência precede a essência", Sartre quer
um dãdo bruto, desprovido de significados. dizer que "o homem primeiramente existe,
O mundo é \¥TI mundo para mim, daí a im- se descobre, surge no mundo; e só depois se
1James Burnham, a~ud FrançoisChâtelet et ai., História das idei.aspoiUicaJ'. Rio deJaneiro,Jorgc Zahar,1985,p';': portância do se.ntido, da rede de significa- define. (... ) O homem não é mais que o que
336. ções que enVolvemos objetos percebidos. ele faz". Por isso, o inqivíduo não pode ne-

. 258 História da Educação e da Pedagogia.=- Geral e Brasil ducação- para..ademocracia 259 ..


- - --_.- .. _. -~._~_ •••.."' ~ -".7-"- ..-... ..•.•


~ •••.",",,"~
__ ...-. _
uma de suas conferências: ".o termo [prag-
..
espírito religioso, desenvolveu o pragmatiS-
gar o impulso pelo qual ele próprio constrói é função do conjunto. Isso significa que
a existênciá, sob pena de tomar sua vida .0 objeto não é percebido em suas partes, matismo] deriva da mesma palavra grega, mo para aplicá-lo à .eligião. .
inautêntica, o que ocorre quando vive de para depois ser organizado mentalmen- prágma, que significa ação, do qual vêm aS Mesmo que as crenças não se fundem
. acordo com valores dados e não escolhidos. te, como quer o associacionismo, mas se nossas palavras 'prática' e 'prático'. Foi in- em bases lógicas e racionai~, ninguém du-'
Ao contrário, deve enfrentãr' o desafio de apresent~ primeiro .na sua totalidade, na troduzido pela primeira vez em filosofiapor vidá da sua utilidade na vida prática, como'
construir seu próprio destino. ~ale lembrar sua forma, na sua configuração (na sua Charles Peirce, em 1878. (... ) Peirce, após guia da ação. No campo moral das relações
que Sartre não queria reduzir o existen- gestalt, em alemão), e só depois são perce~ salientar que nossascrenças são, realmente, humanas são valiosas as forças da simpatia,
cialismo 'ao individualismo, pois a decisão bidos os detalhes. regras de ação, dizia que, para desenvolver do amor ç, ao.contrário da tradição racio-
supõe a responsabilidade, o que significa KõWer fez diversas experiências com .0 significado de um pensamento, neces- nalista da filos'ofia,WilliamJames considera
"responder" por todas as pessoas. chimpanzés, a fim de observar como o ani- sitamos apenas determinar que conduta normal e benéfica a manifestação do desejo
O método fenomenológico. e afilosafia mal consegue resolver o problema de pegar está apto a produzir: aquilo é pa,:,a'nós o e da vontade, por determinar escolhas con-
existencialista muito aUxiliaram a discussão . uma banana colocada fora de seu alcance. seu único significado".E mais adiante: "O forme as exigências da vida prática.
contemporânea sobrê a metodologia das Ao contrário das explicações por ensaio 'e pragmatismo volta as costas resolut'amente'
ciências humanas. Ao se colocarem contra erro, Ki:ihler atribui a solução encontrada e de uma vez por todas a uma série de hábi- Dewey e a escola progressiva
a tendência positivista, essespensadores in- ao insight Qntuição, iluminaçao slibita) que tos inveterados, caros aos filósofos'profissio-
terferiram diretamente em diversas concep- ocorre quando o ammal percebe como um nais. Afasta-seda abstração e da insuficiên- O filósofo e pedago'go John Dewey
ções pedagógicas. Ao reconhecer o educan- todo o espaço onde se encontra;' ao relacio- cia, das soluçõesverbais, das más razões a (1859-1952), influenciado pelo pragma-
do como o criador da sua própria essência, .nar, num mesmo campo, a fruta e o bambu priori, dos princípios firmados, dos sistemas tismo de WIlliam James, preferia usar. as
cabe ao' educador despertá-lo para assumir usado pa."raalcançá-la. . fechados, com pretensões ao absoluto e às expressões insl:rummtalismo ou júnci!lnalismo
sua liberdade, combatendo as forças alie- As ~Iicações das descobertas gestaltistas origens. Volta-separa o concreto e o ade- para identificar a sua teoria. EscI'e~euMini,
nantes da cuJ.turaque o desumanizam e o na educação são importantes por recusarem quado, para os fatos, a ação e o poder. (... ) credo pedagógico, A escola e a criança e, entre.
encaminham para a vida inautêntica. o exercicio mecânico no processo de apren- Ao mesmo tempo não pretende quaisquer . outras, sua melhor obra, Drmr.ocTacia e educa-
. A marca fenomenológica e existeI!cialis- dizagem. De nada adiantam as memoriza- resultados especiais: É somente um méto- ção. Tomou-se um dos maiores pedagogos
ta na pedagogia contemporânea encontra- çôes.por simples repetição, se não houver do. (... )As teorias, 'assim, tornam-se instrumentos, americanos, contribuindo de forma mar-
-S(:, portanto, nas questões antropológicas esforço do aluno para compreender a sittt- e não respostas aos enigmas, sobre as quais podrmr.os cante para a divulgação dos princípios da
decorrentes da concepção de que cada pes- ação vivida. em seus múltiplos aspectos. As descansa:r'B. Escola Nova. ..
soa é única, deve se .f.azera si mesma em situações que ocasionam experiências ricas Em outras palavras, uma proposição Para Dewey,o conhecimento é uma ati-
comunicação com as outras, com as quais e variadas é que levam o sujeito ao°amadu_ é verdadeira quando "fup.ciona",isto é, vidade dirigida que não tem um fim em
estabelece a intersubjetividade. recimento e à-emergência do insight. permite que nos orientemos na realidade, si mesmo, mas está voltado .para a expe-
levando-nos de uma experiência a.outra.riência. As ideias são hipóteses de ação e,
Crítica ao natufcihsmo': a gestalt 4. O pragmatismo A verdade não é, desse modo) rigidamente como tal, são verdadeiras à medida que
estabelecida de uma vez por todas, mas está funcionam. como orientadoras da ação.
A fenomenologia serviu de fu.D.damen- O pragmatismo desenvolveu-se princi- sempre se fazendo. E, como tudo se baseia Ifortanto, têni valor instrumental para re-.
fÓ para a gestalt ou psicologia da forma, cujos palmente nos Estados Unidos e na Grã- 'na experiência, nada é estável, mas está em . _ solver os problemas colocados pela experi- .
representantes furam os alemães Wolfgang -Bretanha, apresentando pontos de con- constante movimento. . ência humana.
KõWer (1887-1967) e Kurt KofIka (1886- . vergência com diversas outras correntes Quando o pragmatista reduz o verdadei- Ao fundar urna escola experimental na
-1941). Estes psicólogOs criticaram a ten- do nosso tempo. Opõe-se a. toda .filosofia ro ao útil, compreende a utilidade em sen- UniversicIàde'dt:ChiCago,no final do século
dência empirista, dominante no seu tcmpõ; - ideatisfa e aocoMeciménto contemplativo, tido amplo. Não só a utilidade como satis- XIX, Dewey desenvolveucurta experiência
segundo a qual as ideias resultariam da as- puramenteteóricoo É anti-intelectualista, façãõ das necessidadesma!eriais, mas como concreta, pela qual pretendia estimular a
sociâção de percepções, ç estas,por sua Vez, RriVilegiando â prática e a experiência. tudo quanto sirva para o desenvc:{'.'Ímento atividade dos alunos para que eles apren-
seriam formadas pelas sensações. do ser humano e da sociedade. Nésse senti- dessem fazendo. Para isso enfatizou o tra-
Os gestaltistas recusam a concepção "C WiUiam Jomes do, a religião é verdadeira: WilliarnJames, . balho, dando realce especial às atividades
ato mística t; associacioDÍstada percepção,
ao afirmar que não há excitação sensorial O principal representante dO"pragmatis-
isolada, mas complexos em que o parcial mo, William James (1842-1910), disse em 8 Pragmalismo e ~Ulros ensaies. Rio de Janeiro, Lidador, 1967, p. 44-48.
~
260 '---História da Educação e da Pedagogia---<iera~e-Brasil Educação para a democracia 261

.
~, manuais, porque apresentam pronlernas
concretos para serem resolvidos, tais como
lução copernicana" preconizada pela edu-
cação ativa desde Rousseau - e, portanto,
adaptação do aluno à sociedade, que, como
tal, não é questionada em momento.algum.
risseao educando aprender po; si mesmo, e
aprender fazendo.
cozinhar, ou ocupar-se com tecelagem, fia- oferecer espaço para o desenvolvimento dos Trata-se de uma teoria que representa ple- Desse modo, a ênfase da educaç'ão não
ção e carpintaria. Além disso, o trabalho principais interesses da criança: "conversa- namente os ideais liberais, sem colocar em está na acumulação de conhecimentos, ln'J.s'
favorece o espírito de comunidade, e a di- ção ou comunicação", pesquisa ou a desco- xeque os valores burgueses. 'Por txemplo, na capacidade de.~plic~~losàs situações Vi~.
visão das tarefas estimula a cooperação e o berta das coisas", "fabricação ou a constru- sua noção de trabalho não ãpresenta as ca- vidas.A pedagogia de Dewey foiimportante
espírito social. ção das coisas" e "expressão artística". .. racterísticas fundamentais que aparecem para a divulgação dtssas ideias, sobretudo
Dewey fez severas criticas à educação Desse modo, também muda o pa- nas pedagogias socialistas, como veremos. entre o~anos de 1920 e 1940. Pessoalmente,
tradicional, sobretudo à predominância do pel do 'professor, que deixa de ser central Apesar disso, a pedagogia de Dewey é visitou vários'países,prore~qo;pãlestras ou
intelectualismo e da memoriz,!-ção.Rejeita para acompanhar o trabalho dos alunos e rica em aspectoS"inovadores, e sua princi- permanecendo em lon~ Çstadas,.tã! como
a educação pela instrução defendida por animar as atividades escolares. Segundo pal marca.encontra-se na oposição à escola na China,. em que viveu mais de.:qoisanos.
Herb.a.rt, opondo-lhe a educação pela ação. Dewey,o professor "não está na escola para tradicional, na relação estreita entre teoria Esteve também no MéXicó,'na Turquia, no
O fim da educação não é formar a crian- impor certas ideias à criança ou para for- e prática, na valorização das ciências expe- Japão, na 1!nião Soviétic~,em vlriõs países
ça de acordo com modelos, nem orientá-la mar nelá certos hábitos, mas está ali como " rimentais, não só para fundamentar a psi- europeus, além de que sua obra foi bastan-
para uma ação futura, mas dar condições membro da comunidade para selecionar cologiainfantil, mas também como conteú- te traduzida, fecundando. as mais diversas
para que resolva por si própria os proble- as influências que' agirão sobre a crianç~ e do cognitivo importante para as atividades aplicações práticas de seus prmcípios.
mas. Considerando a noção central de ex. para ajudá-la a reagfr convenientemente a escolares. Dewey desemperihou ainda um Vários desses seguidores iniciaram os
pfJrÍência, Dewey conclui que a escola não essas influências". papel notável como pedagogo e educador estudos com a pedagogia diferencial (com
pode ser uma preparação para a vida, mas Ao contrário da educaç~o tradicional, inCansj.vele até sua morte, aos 92 anQs, crianças deficientes), depois estendendo •
é a própria vida. Por isso, vida-experiência- que ~oriza a obediência, :Qeweydestaca o ç.ontinuavaa receber os discípulos em sua suas descobertas para um universo maior
-aprendizagem não se separam, e a função espírito de iniciativa e independênci~, que residência. Para WIlliam Kilpatrick (1871- . da educação.
da escola está em possibilitar a reconstm- leva à autonomia e ao autogoverno, virtu- -1965), um dos seus mais importantes se-
ção continuada que a criança faz da expe- des de uma sociedade democrática. Nesse guidores, o principal foco da educaç~o en- Montessori e Decroly
riência. A educação progressiva consiste jus- sentido, a democracia não é apenas.um re- contra-se na formação para a democracia
tamente no crescimento constante da vida, gime de governo, mas uma forma de vida, em uma sociedade em constante mutação. , A italiana Maria Montessori (1870-1952)
à medida que aumentamos o conteúdo da em que, pela educação, criamos significa- Mais adiante, no item 15, veremos as ~i a primeira mulher formada em medicina
experiência e o controle que exercemos so- dos coletivos, em um processo que nunca ressonâncias atualizadas do pensanlento de pela Universidade de Roma. Nesta mesma
bre ela. termina. Marcado pelos efeitos da Revo- . Dewey na reflexão de Richard Rorty, prin- universidade tornou-se assistente na clínica
São também~osas as reflexões de lução Industrial e pelo ideal da democra- ripal representante do neopragmatismo. neuropsiquiátrica, experiência q,*:-esultou
Dewey .a respeito do interess~, na tentativa cia, Dewey queria preparar' o aluno para a .em um interesse pela editcaçãh decnanças
de superar a velha oposição entre interessei sociedade do desenvolvimento tecnológi- 5. A Escola Nova éxcepcio:J.aige deficient6 mentáis, o que
esforço e interessei disciplina. O esforço e a co e formar o cidadão para a convivência lhe pet:r:nitiufazer observações importaJ1tes
disciplina são para ele produtos do interes- democrática. A escola seria o instrumento Já vimos,no item 3 do tópico Educação, as sobre a psiéologia infantif." -
se. Por isso é importante para o educador ideal para estender esses OOneficiosa,todos, realizaçõesda Escola Nova, um movimento' Conciliando espírit{)científico e misticis-
a descoberta dos reais interesses da criança indistintamente, caracterizando a função que defendia a educação ativista, á partir mo - era católica fervorosa -, escreveu
e só avançar na ampliação de seus poderes democratizadora da educação de equaliz.ar da "renovação da pesquisa pedagógica,. na extensa obra, que difundiu seu método no
apoiando-se nessesinteresses. Apenas assim as oportunidades. busca teórica dos fundamentos filosóficose mundo inteiro. Em 1907 abriu em Roma a
a experiência adqwre valor educativo e não Veremos como resultou daí a "ilusão libe- científicos dê uma prática educativa mais pcimeira Casa. dei Bambini (Casa das Crian:-_
se reduz a um artificialismo inócuo. Decor- ral" ou o "otimi~mo pedagógico" da Escola eficaz. Ao lado de uma atenção especial ria ças),para atender filhos de operários,
re daí a valoriza~o das ciências humanas Nova Nesse sentido, o projeto de Dewey formação do cidadão em uma sociedade f?Empenhada na individualização do ensi-
auxiliares da pedagogia, para melhor com- seria utópico ;'0 imaginar a escola como democrática e plural - que estimulava o Jó, Montesson- estimulava a atividade livre
preender o mundo infantil, tão diverso do um território neutro, quando na verdade" processo de socialização da criança -, ha- copcentrada, com base no princípio da au-
mundo adulto. ele está permeado por todas as contradi- via o empenho em desenvolver a individua- toeducação. Nesse método marcantemente
A escola, segundo. Dewey, deve ter a ções sociais e políticas do seu contexto. De • lidade, a autonomia; o que só seria possível ativo, o aluno usà o material na orçlem que •
criança como C"•••tro - le.tpbrar a "revo- certo modo, na sua pedagogia é reforçada a em uma escola não-autoritária que permi- quiser, cabendo ao professor apenas dirigir.

262 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil "Educação para a democracia 263..

l"-._-_-_-:::::::~---------------------------~.ê;. ""'~.
..•
"'f-.- ..
..",--...
,..=~
:::::o=======
'M_ --'-~'~-~,;'7~ ~':."".~, ..~~ .._.~ .,..•.•.
...- .•• _:""~. -.,' "c,"" ~""""-\"""''',~_" •••._ ,~,~ ,''''!- ~ ••••_. -""",,"'~'1l' '. ""","",,,,,,,,_
••,:",,"~_._ .. _.'._"'_. _. _~'.~-
a atividade, e não propriamente ensinar. ça tende para as representações globais, desenvolvimento do interesse por meio da a expressão escrita. Para a montagem do
As crianças cu.i;damda higiene pessoal e da de conj1.mto,isto é, percebe os fatos e as aquisição das técnicas elementares de ler, texto a ser impresso, 'são feitos os cálculos
limpeza das salas, recolocando em ordem coisas como um todo. Além disso, o indi- escrever e calcular, desde que se destaque a n~cessá.riose as ilustrações. Além disso, as
todo o material usado. A atenção ao ritmo víduo apr~nde como uma totalidade que 'ltividade manual em primeiro plano. Criti- comunicações diversas, trocadas entrcalu"
de cada um, no entanto, não se contrapõe percebe, pensa e age conjuntamente. Tais ca as abordagens dile~tistas.oo trabalho, nos de classes diferen~es a propósito d~
à socialização, antes facilita a integração no ideias mantêm uma afinidade com .a teoria por considerá-lo f1Indamenta,lpara o au- pesquisas, estimulam a correspondência
grupo. da gestalt e se contrapõem às tendências as- tocontrole e autoexame de quem"o exerce interescolar.
A pedagogia montessoriana dá destaque sociacionistas da aprendizagem, inclusive a com seriedade.
ao ambiente, adequando-o ao tamanho das montessoriana. O trabalho. na escola, no entanto, não . Avaliação do escolanovismo
crianças (mesas,estantes,quadros, banheiros Enquanto o ensino da leitura ~ feito se red~z a simples profissionalização, mas
etc.). O rico e abundante material didático tradicionalmente por meio <le letras isola- se insere numa propo~tá. de formação hu- Muitas. críticas foraor feitas' à Escola
acha-se voltado para a estimulaçãosensório- das, depois reunidas na formação de pala- mana mais abrangente,. voltada para os 1'{ovae voltaremos a elas ao discutirmos as
-motora: cores; formas, sons, qualidades tá- vras e, após iSso, na construção de frases, valores individuais e, sobretudo, sociais. teorias critico-reprodutivistas, que revela- .
teis, dimensões, experiênciastérmicas, sensa- Decrolr inverte 6 processo, sugerindo a ini- Para Kerschensteiner, as três tarefas da es- ram o caráter excessivamente otimista do
ções musculares, movimentos, .ginásticarít- ciação à leitura por frases inteiras. Ornes. cola são: a edu!:ação profissional; a mora- . projeto escolanovista.
mica com a clara intenção de alcançar maior mo procedimento acompanha a escolha da lização da profissão e, consequentemente, Resta lembrar outros riscos dessa pro-
domínio do corpo e percepçãOdas coisas. programação montada em torno de centros a moralização da sociedade. . poSta: se a escola tradicional era magis-
Aléin disso, Montessori dava atenção . de interesses, que visam à apreensão globa- Célestin Freinet (1896-1966) escreveu troGêntrica, por valorizar demais o papel
prioritária à escrita, que, segundo ela, ç!e- lizadora: a criança e a família, a criança e a A educação peln traba1Jzo. Na longa ativida- do professQr, o esco1anovismo minimiza-
veria preceder a leitura, já que esta última escola, a criança e-o.mundo animal e assim de como professor primário, lutou contra va esse papel - quase uuro' nas formas
supõe maior abstração. Já a escrita começa por diante. . . as práticas tradicionais do ensino público mais radicais do não-diretivismo -, para
com a preparação da mão e dos sentidos francês. Pela preocupação com a educação tender ao puerilismo (ou pedocentrismo),
em geral, de modo que o desenvolvimento Escola do trabalho: Kerschensfeiner e popular, bem poderia ser colocado ao lado que supervalorizava a criança; a preocu-
da psicomotricidade evite qualquer apren- Fre.inet deis pedagogos 'socialistas. O fato de não paç!o excessiva com o psicológico inten-
dizagem mecânica. ter conseguido melhores resultados com sificavao individu~mo; a oposição ao'
Recebeu algumas críticas daqueles que Uma das características da Escola Nova seu método deve.se sobretudo às limita-. autoritarismo da. escola tradicional resul-
consideravam exagerada a atenção dada a é a preocupação com o trabalho. Alguns ções do ambiente em que suas experiên- tava em ausência de disciplina; a ênfase
esses aspectos, o que teria tomado a teoria educadores 'enfatizaram sobremaneinl- esse cias eram levadas a efeito. no processo descuidava da transmissão
montessoriana baseada em uma concepção aspecto, como o alemão Kerschensteiner e Para Freinet, a verdadeira fraternidade do conteúdo.
sensualista, at~rnística e associacionista da o francês Freinet, cujas experiências seriam é a que nasc~ do trabalho. Por isso valori- Em que pesem essas criticas, sem dú-
aprendizagem. Ou seja, ao privilegiar a aproveitadas também na escola pública ~e . za a atividade manual. e a 'de grupo, por vida foi valiosa a contribuição da Escóla
educação -dos sentidos, Montessori criou seus países. estimularem a cooperação, a iniciativa.e a Now,.para o enriquecimento e a discus.
materiais que iso!avam as.sensações,o mes- . Georg Kerschensteiner (1854-1932) so- participação. • são dos métodos ped;"gógicõs. É preciso
mo acontecendo com a aprendizagem da freu a influência"de Pestalozzi e de Dewey . A aprendizagem da. gramática e dos reconhecer que os estudos de psicologia,
escrita, que partia de letras isOladas,ou da e criticou severamente o ensino da escola conte&dos' a serem pesquisados era feita ôe medicina neurológica, de biologia re-
aritmética, que requeria o uso de pauzinhos tradicional por ser livresco e voltado para de maneira original, porque seu método alizados pelos escolanovistas. muito auxi-
de diversas cores. . . a memorização. A ele opôs a escola ativa, . estava centrado no projeto de imprensa na liaram na 'introdução de projetos didáti-
O belga Ovide Decroly(1871-l932) tam.., cujos pilares são o trabalho, a cooperação e escola. Eijminados os' manuais escola~s, -cos stistentados-em-bas'e- mais rigorosa e
bém era médico e inicialmente interessou- '0 autogcivemo. Para ele, como para Dewey, aprende-se a composição para a imprensa científica.
se pelas crianças excepcionais. Auxiliado a educação é um produto da sociedade e e cultiva-se a expressã:::por meio do texto A influência da Escola Nova estendeu-
por sua mulher, fundou em 1907 a Escola tem função social. Apesar disso,deve-seco- livre. Supondo que ciconhécimento verda- s'e até o Brasil, como veremos no próximo
da rua do Errnitage. meçar pelo desenvolvimento da individu- deiro é sempre recriação, FreÍllet estimula capítulo, estimulando fortemente as nossas
Decroly observou, de maneira perti- alidade e do cultivo dos valores espirituais a exploração da curiosidade, a coleta de pnmeiras - reflexões mais sistemáticas em
nente, que, enquanto o adulto é capaz de que caracterizam o se~ humano. Propõe informações ~ tanto pelos alunos como . pedagogia a part:il das décadas clt: 1920 e
analisar, separar o todo em partes, a crian- . então um método baseado nos estágios do .pelos professores -, o debate e, por fim, 1930.

264 História da Educação e da Pedagogiil- Ger~1e Brasil ____________ ~"_265.•


Educação para a democracia

6. As teorias socialistas tes, sem que isso significasse, no- entanto. individualidades gerava conflitos nos quãis É interessante notar que a pedagogia de
desvalorizar o papel do professor. _ . imperava a lei do mais forte. Esta vi'Jlência, Makarenko seguia na çontramão das ideias
Nesse processo, a educação para o traba- porém, deveria ser superada, pois a mtenção escolanovistas, devido ao rigor militar 'im-
No item 4 do tópico Educação, vimos
lho aparece como fundamental. A proposta explícita era levar o grupo a formar uma co- posto ao ritmo dos trabalhos e às exigências .
como os países socialistas imprimiram mo-
de' superação da dicotomia entre atividade munidade. Por isso, a autoridade do profes- com a disciplina, o que o dist?-llciava da'
dificações nas suas escolas. Aqui voltaremos
intelectual e ~anual, no entanto, só se tor- sor deveria ser firme e não arbitrária, reedu- educação centrada no educando.
a atenção paia alguns teóricos, examinan-
na possível com a teoria pedagógica soci3.l; cando para a vida em uma coletividade, na Mais adiante, no segmento sobre o cons-
do os seus princípios co"muns, bem como
que acompanha dialeticamente a prática qual os principais valores eram o tra.1:ialho,a trutivismo, -veremos a importância das teoria~
algumas diferenças de orientação.
educativa. Em outras palavras, essa teoria disciplina e o sentimento do çlever. de VygotsJ...1'e Luria, tarribém _..•.J"riarxistas.
:," ..•.. ,.
De modo geral, as teorias socialistas. re- .,~

lacionam dialeticamente educação e socie- ainda não estava escrita, e, segundo Pistrak, Nas condições históricas revolucionárias
dade, isto é, não separam a educação do "só agora é que ela começa a surgir para vividas por Makarenko, a edu~ação exer- Gramsc.i
indivíduo de sua inserção na sociedade .. nós, no contexto da nossa prática escolar cia importante papel de politização. Ainda
Reconhecem ainda a estreita ligação en- guiada pelo marxismo". - mais, diante do imperativo da transforma- No campo teóric.o, ~. italiaJõ Á.ntonio
Ao contrário de muitas escolas que se uti- ção industrial do país, a formação politéc- Gramsci '(1891-1937), como crítico dO'
tre educação e política, não só para estlmu-
lizavam do trabalho p'ara :finspedagógicos, nica era valorizada, mas não como estreita marxismo oficial, desenvolveu importan-
lar a crítica à alienação eà ideologia,' como
Pistrak adyerte que o trabalho deve ser real profissionalização, e sim na tentativa de tes reflexões para a compreensão do papel
tmnbém para estimular a práxis revolucio-
e não simbólico e que tatnbém não estives- unir o pensar e o agir. Ou seja, à medida do intelectual na cultura em geral e espe-
nária nos países em que o socialismo teria
se apenas ao lado da teoria, procedimento que trabalhavam, os alunos tepam condi- cificamente na educàção. Durante' onze
chances de ser implantado, ou para man-
tê-la ativa naqueles que já haviam passado que mantém a dicotomia pensar-fazer. Não ções de conhecer as bases científicas das . anos esteve preso pela ditadqra fascista de
se trata de qualquer" trabalho, mas daquele principais atividades produtivas. Mussolini e, mesmo. no cár~ere, .até mor-
pela revolução.
socialmente útil, objetivado nas mercado- Apesar desse controle externo aparen- rer, escreveu muito. Suas principais obras
Outro aspecto a destacar é a centralida-
rias produzidas e pelo qual se estabelecem .temente severo, o projeto de Makarenko são: Concepção dialética da hist6ria, Os intelec-
de do trabalho, como elemento fundamen-
tal para a formação humana. Diferente- . as relações humanas. Sugere vários tipos de era promover a autogestão educativa e 'as- tuais e a organização da cultura e Literatura e
mente das escolas ativistas, o trabalho nã~ trabalho, como o doméstico, o das oficinas sim foi reconhecida sua atuação. Segundo vido. nacional.
ô agrícola e o chamado trabalho iinprodu~' G. Lapassade, o pedagogo soviético foi um Uma de suas contribuições originais
significa apenas uma atividade em classe,
exemplo do que se poderia chamar para- está no conceito de hegemonia, que etimolo-
para desenvolver a habilidade manual do tivo '(ativ;idades burocráticas). A condição
doxalmente de "autogestão autoritária", gicamente significa dirigir, guiar, conduzir.
estudante, mas trata-se do trabalho real, em explícita é que tudo esteja a serviço do'es-
tudo sobre o trabalho e, ao mesmo tempo, "porque os modelos institucionais de fun- Segundo Gramsci, uma classe é hegemô-
oficinas. Desde 'que, obviaIlfente, seja uma
seja útil e necessário. cionamento eram propostos de cima, mas nica não só quando exerce a dominação
atividade produtiva conjugaqa com forma-
Anton Makârenko (1888-1939), outro ainda aSsim autogestão, já CWe esses mo- pelo poder coercitivo, ~ãs tam.bhü quan-
ção çultural.
.delas possibilitavam a gestão da instituição do o faz pelo consensó, peta persuasão.
importante pedagogo soviétiw, foi encar-
por parte da própria coletividade". . Essa t-a,refa cabe aos intelectuais, que ela-
Pistrak e Makarenko regado, em 1~20, d~ dirigir a Colônia de
De fato, nas colônias criadas por Maka- boram um convincentê sistema de ideias
Trabalho Gorki, instituto de reabilitação
renko, os alunos trabalhavam quatro horas pelo -qual se 'conquista a adesão até _da
Moisei Pistrak (1888-1940) realizou ati- de adolescentes delinquentes, que abrigava
diárias .e dedicavaIIt cinco horas às ativi- classe dominada. Basta constatar que a'es-
vidade pioneira na Escola Lepechinsky e, órfãos de guerra, toxicômanos e desempre-
dades escolares. Por conta disso, as insti- cola burguesa é classista. Além de prepa-
apoiado nessa experiência, escreveu Fun- gados. Entre outros escritos, defendeu suas
tuições. que ele dirigia tornavam-se autos- rar seus intelectuais, infiltra-se nas classes
damentos da etcota do trabalho, obra em' que ideias em sua obra mais famosa, Poema pe-
--dagágiar. ~- - suficientes, porque o produto .do trõ,balho populares para cooptar os melhores ele-
apresenta sua teoria pedagógica social, -cuja
efetivo - trabalho real, sem artifícios para mentos, que, assimilados, passam a aderir.
contribuição se destaca no contexto da Re- Embora ~ua pedagogia estivesse centra-
a aprendizagem apênas escolar - eff ven- aos valores burgueses.
vOlução"de 1917 na União Soviética. Para da em uma proposta democrática, de início
dido, ainda sobrando o que era encalhinha- A classe dominada, por sua vez, sem
melhor desempenhar o papel destinado ao Makarenko exerceu uma autoridade nãd va-
conseguir organizar sua própria visão de.
mestre, buscava o engajamento dos alunos cilante. Asvezes "enfrentava os alunos corpo do para os cofres do Estado. Em uma das
mundo, permanece desestruturada e passi-
e' o estudo da atualidade. Defendia a esc~la a corpo e não ráro 'recorria a castigos ~icos. comunas chegou a montar uma fábrica de
furadoras elétricas e outra de câmeras foto- va, e por isso as eventuais rebeliões tornam-
dinâmica, ativa, que prepara para a ação, Justificava o caráter momentâneo da vio-
gráficas Leika. -se ineficazes. Gramsa conven~eu-se de
baseada na auto-organização dos estudan- ~ncia por entender que o choque entre as

266 - ---H-istwoo-&ltte~ão-e--üa-Pedagogia - Geral e Brasil Educação para a democracia 267



-' ~>
que esses elerrientos precisavam' continuar A ênfase nos conteúdos delineia o novo quando induz a criança a agir como ele capitalista. S,ofreu influência de WJ.1hem
organicamente ligados à sua origem social, humanismo. socialista, diferente do huma- quer, COIr. persuasão, sem deixar espaços. Reich (1897-1957), psicanalista alemão que
de maneira que elaborassem, coerente e nismo greco-latino tradicional, na medida pàrà a atividade do aluno. concilia Freud e Marx, para criticar as for-
criticamente; a experiência proletária. Só em que, segundo Gramsci, a escola unitária Nas teorias não-diretivas o professor mas atuantes 'de.repressão da vida sexual.
assim os dominados teriam os seus próprios visa à "cultura geral, formativa, que saiba deve acompanhar o aluno sem dirigi-lo, o Em. 1921, Neill fundou a escola Sum., .
intelectuais orgânicos. . dosar justamente o desenvolvimentoda ca. que significadar condições para que ele de- merhill, na costa sul da Inglaterra, onde re-
A consciência de classe do intelectual pacidade de trabalhar manualmente (... ) e sen,:olvasua experiência e se estruture .por cebia crianças do mlip.qointeiro, experiên-
orgânico pode ser mais bem desenvolvida o do desenvolvimento das capacidades do conta própria. Sua função é a de facilitador cia relatada em seu livro Liberdade sem medo,
entre os grupos de pressão formados na so- trabalho intelectual". .da.aprendizagem: usando a linguagem da seguidoposteriorÍnente por. outrci~I.j.berdade
ciedade civil, como os sindicatos e o parti- O historiador italiano Manacorda, um ; .química, o mestre se restringe a ser o catali- sem excessos, a fim de explicar qúe a éscola
do dos trabalhado:es, que, capazes de criar de seus seguidores, explica: "Ele (Grams-.' sador do processo. que criara \1ão.era uma comunidade: sem.
uma contra-hegemonia, resistem à incul- ci] pode assim falar de 'unifica.çãocultuo . .. ."
Asteorias antiautoritárias, sejam liberais, regras. Na verdade, ele confiava na possibi-
cação. ideológica da escola' e podem atrair raI do-gênero humano', onde a unificação sejam anarquistas, fornecem vasto material lidade de desenvolver.a capacidade de au-
intelectuais até então comprometidos com (... ) não é massificação, mas é a elevação de reflexão a respeito dos desvios do poder. torregulação individual e de autogoverno
o sistema. . comum de cada indivíduo ao mais alto ní. Denunciam também as formas camufladas coletivo.
Isso não significa, porém, desconsiderar vel de consciência crítica e de capacidade .,~' pelas quais uma autoridade a.n:ônitna,dissi- Ao todo, a escola reunia cerca de seten-
o imporfante papel da escola no projeto produtiva atingido pela humanidade na sua mulada, se introduz nas relações humanas ta alunos, na época de sua fundação. Esse
de democratização. da cultura e do saber.. históri~'. do mundo contemp~râneo. número variou pouco nO correr. dos anos e
A educação propusta por Gramsci está cen- Gramsci exerce até hoje grandeinflu- • persiste até hoje nessa instituição, que se en-
tradá no valor do trabalho e na tarefa de su- ência' na pedagogia, e a teoria progressista,. Representantes da .tendência contra sob a direção de Zoe Redhead, filha
perar as dicotõmias existentes entre o fazer que veremos a,diante, deve a ele seus fun- antiautoritária de NcilL Muitos alunos vivem em ,sistema .
e o pensar, entre cultura erudita e cultura damentos. de internato, poucos moram nas redonde-
popular. Pará tanto, a escola classista bur- Nos Estados. Unidos foi importante a zas, e o motivo principal da procura dessa
guesa preos~ria ser substituída pela escola 7. As tendências não-diretivas contribuição de GarI Rogers (1902-1987), escola deve-se ao fato de os pais admirarem
unitária, oferecendo a mesma educação psicólogoque transplantou para a pedago- a orientação pedagógica de Neill.
para todas as crianças, a fim de desenvol- A primeira metade do séculoXX viu de- gia as técnicas utilizadas em terapia. Suas Os exames e a obrigatoriedade de assistir
ver nelas a capacidade de trabalhar manual sabrocharem inúmeras teorias pedagógicas observaçõesse baseiam na dinâmica de gru. às aulas foram suprimidos, e não se dá ênfa-
e intelectualmente. Nesse caso, entrar em não-diretivas, que levaram às últimas .can- po do T-group (útrirring groUP), em que dez a se à instrução. As questões de disciplina são
contato com a técnica do .seu tempo não sequênciai a critica ao autoritarismo da es- quinze pessoas interagem sob a observação resolvidas pela Assenibleia Geral daEsco~
sigDificadeixar de lado a cultura geral, hu.- cola tradicional, exacerbado, nesse mesmo ._ .deum monitor, com a função de intervir o em que os 'próprios alunoS'decidem sobre
manista, formativa. 'período, pela experiência nazifascista e do menos possível, dissolvendo as relações de as regras da comunidade. Algumas vezes a
Sob esse aspecto, G~ci faz ~ critica totalitarismo soviético. autoridade que decorrem da compulsão de escola enfrentou dillculdades com o gover-
das teses marxistas: concorda que o traba- Já vimos que, no século XVIII, Rous- mandar ou obedecer. no inglês, devido à ausência dos parâmetros
lho é um fator central na edu~o, o que seau foi o primeiro a promover a "revolu- Segundo Rogers,' é a propria. relação exigid9s pela lei. ,,..
não significa, porém, tornar a escola uma ção copernicana", pela qual a criança se . entre as pessoas que promove o crescimen- Avessoàs maneiras de sufocar os instintos
fábrica, e sim o local privilegiado da ativi- desloca para o centro da aprendizagem, em to de cada uma, ou seja, o ato educativo .é e as emoç.ões, Neill ocupou-se mais "com o
dade pedagógica. Dito de outra maneira, que sempre. se fixara o professor. O filósofo essencialmenterelacional e -não individual. co~ação do que com a cabeça": o que justi-
.preparar o homem novo-süpõ~ primeiro a genebrino, ao admitir a bondade original O intercârnQioenriquece as experiências,e o fica a pouca atenção dada ao conteúdo das
construção da "hegemonia;' cultural e só do ser humano, -considerava o ensin<?tra.. ~~ grupo, incluído aí o professor,transforma-se informações é a consequente valorização
depois a hegemonia política, e não vice- dicional como depravação da natureza e ;,~.em uma "comunidade de aprendizagem". dos processos que encaminham as crianças
-versa.' A hegemonia C1l.ltu.ralse constrói inibidor da espontaneidade infantil. Nes- Na Ingl~cerra, destacou-se a longa e po- para a vida mais livre e mais feliz.
por me~o._das. instituições edúcativas, que sa linha, as teorias não-diretivas rejeitam lêmica experiência do escocês Alexander Seus livros foram traduzidos em vários
transmitem criticamente a hérança da cul- o autoritarismo por temer o risco sempre S. Neill (IM3-1973). Pedagogo sensível à idiomas, e entre as décadas de 1960 e 1970
tura histórica e científica, a fim de preparar presente de' doutrinação que assalta até o temática socialista, Neill reconhecia o viés a fama .de Neill foi tão grande que houve
o intelectual hegemônico. professor "compreensivo", "bonzinho", autoritário da escola inserida no sistema época.em que chegou a solicitar que não se

'- 268-----------.Históriada Educaçãoe da Pedagogia- Gerale Brasil Educação


paraa democracia 269
visitasse Summerhill, tal era o número de de obrigar outra a frequentar uma reunião. em paz com seus semelhantes, mas as in~- Para esses teóricos, a questão da auto-
•• pessoas que desejavam conhecer aquele.ex- Também significa o direito de qualquer tituições autoritárias deformam e atrofiam gestão é fundamental. Não. propriamen-
perimento ímpar e alternativo. pessoa, de qualquer idade ou. sex0,:de con- suas tendências cooperativas. Para inverter te como é pensada entre os pedagogos da'
" ..• "
Outro pedagogo radical foi Ivan lllich vocar uma reUIDao , a pirâmide de poder que o Estado repre- . não-diretividade, ~in que o Erofessor se
(1926-2002), austríaco radicado no México, O recurso ao computador seria indispen- senta, propõem uma descentralização, bus- afasta para que o aluno desa~roche' por ;i
que escreveu em 1970 o livro Sociedade sem sável,por facilitar o encontro de parceiros a cando modos mais diretos de relação, .pelo !!lesmo as faculdades que lhe seriam natu-
escolas. Em meio a tantas críticas à'escola, partir de interesses comuns, inclusive cqm contato "cara a cara". A responsabilidade rai.s.A liberdade no conceito anarquísta é
lllich se pergunta por que não "desescola- . acesso a bibliotecas ou consulta a educado- surge a partir dos núcleos vitais das relações uma meta a ser àprendi~a e constfl:lidapor
rizar" a sociedade. Nesse mundo institucio- res em geral, então despojados de seu auto- .sociais,tais como no local de trabalho, nos meio das reIáções entreps indivíduós. Nes-
nalizado em que saúde, nutrição, educação, ritarismo e limitados ao importante papel de bairros e, no caso dos educadores anar- se caso, o professoi intéfYérnp~r~ alcançar
'transporte, comunicação etc. se encontram aconselhamento e orientação. Haveria tam- quistas, na escola. O importante é manter essepropósito, uma vez.-quea çrià.-Àçaé um
nas mãos de especiaJistase tecnocratas para bém o auxilio do sistema de correios, bem a participação, a colaboração, a consulta ser inacabado, em formÍtção. Po.rta:p.to,para
"proteger" e "orientar", 'cada. vez mais os como de uma rede de boletins informativos direta entre as pessoas envolvidas. os anarquistas, se a escota não é~fu~ção do
indivíduos perdem a capacidade de decidir ou anúncios classificadosdejornais. Nesse sentido a tendência anarqUista Estado, ela dependerá sempre da responsa-
por si próprios. . .caracteriza-se,na eduGação,como uma das bilidade da comunidade.
T\focaso da educação, não é verdade que .A educação anarquista linhas antiautoritárias, cujos teóricos mais
as crianças aprendem na escola, que cria significativosforam os franceses Michel Lo- Avaliação da educação não-diretiva
.expectativas prejudiciais, ao PI'?meter o O anarquismo é um movimento que sur. brot, Fernand Oury, Aida Vásquez e Paul
que não é capaz' de cumprir. Afastada da giu paralelamente ao socialismo de Marx e Robin e o catalão Franci~co Ferrer i Guàr- Segundo alguns autores, as teorias an-
realidade da produção, a escola vive o pa- Engels, no século XIX, mas que dele se dis- di,!-A principal'diferença entre estes e os tiautoritárias são de certa forma ingênuas
radoxo de querer preparar para o mundo tingue pela recusa do processo preconizado pedagogosliberais está na certeza. de que a e românticas, por sonnar. com uma "or-
ao mesmo tempo que corta os contatos com por aqueles pensadores, segundo os quais escola antiautoritária depende também da dem natural" e.m que tudo seguiria seu
ele. Embora reconheça que a vida em so- a instalação. do comunismo deveria passar ação revolucionária mais ampla, capaz de curso espontâneo, como se fosse possí-
ciedade seria impossívelsem as instituições, primeiro pela chamada ditadura do pro teta- implantar a nova ordem política. Por esse vel deixar as crianças livres de qualquer
Illich faz uma distinção entre as instituições riaÓJJ. Ao contrário, os teóricos anarquistas motivo, o espanhol Ferrer i Guàrdia (1859- constrãngimento.
. manipulatWas e as co11.l1Í1Jiais. As primeiras - entre eles Bakunin e K.ropotkin - são -1909), depois de fundar a Escola Moderna Nessesentido,o pedagogo francês Georges
são'as que merecem suas críticas,'.por não contra o Estado, seja burguês, seja socialis- de Barcelona, enfrentou dificuldades com Snyders critica a proposta de Ivan Illich de
estarem a serviço das pessoas, mas contra ta, uma vez que a tendência do poder em os setores reacionários que culminaram' . desescolarizar a sociedade. É ilusão supor
elas, voltadas que se acham para os inte- toda instituição é perpetuar-se. com o seu fuzilamento. que a criança, livre diante dos seus desejos,
resse ecemômicôs de alguns privilegiados. Portanto, os anarquistas (ou libertários) Significativo, e com repercussões no seja capaz de enfrentar,sozinha, os precon-
As segundas seriam interativas, permitin- criticam o Estado, a Igreja ê todas as ins- Brasil,foi o trabalho de Paul Robin (1837- ceitos e condicionamentos ideológicos da
do o intercâmbio entre os indivíduos com tituições hierarquizadas, inclusive a escola -1912),que, na direção de um orfanato nos cultura a que pertence ..fJém 9JgSO, o que
a condição de que todos mantenham sua autoritária, e pretendem implantar "a or- arredores de Paris, transformou-o em Urna prevalece é uma visão estreita do conceito
autono~. dem na anarquia". Para tanto, as organiza- escola libeitária, Seus preceitos de educa- de liberdade, que conduz a uma percepção
lllich chama de conviviali.dade a criação ções anarquistas recusam as relações huma" ção integTalciJmpreendiam a educação in- muito individualista do mundo e das reIa-
de "redes de comunicações culturais" que nas coercitivas e se pautam pela cooperação telectual, a. educação moral e a eduçação çõeshumanas.
facilitariam o encontro de pessoas interes- vol~ntária, peIa autodisciplina e pela auta- '.f fisica.O.primeiro aspecto sustentava-se no O ideal de convivialidade, segundo o
_sada'LnQ mesmo assunto Então, o inverso
L gestão. i' processo de indagação e confronto com o. qual ao desigualdade existente no nosso sis-
da escola seria possível. Essas redes não se- A tese anarquista da negação do Estado saber já soci<ilizado,enquanto a educação tema de escolarização seria substituída peIo
riam-escolas - por não terem programas não deve nos levar'a pensar que se trata de moral se voltava para o~~estímuloà coo- ensino em rede igualitária, repousa na in-
preestabelecidos nem reconstituírem a'figu- uma proposta individualista, do salve-se peração e à vivênvia cofétiva responsável. genuidade de supor que o sistema de redes
ra do professor - e proporcionariam ape- quem puder, porque o conceito de organi- A educação fisicanão se re~a apenaSa escaparia à pressão e às contradições dos
nas a troca àe experiências, com base na zação não-coercitiva se funda na coopera- jogose recreação, estendendo-se a atividades interesses estabelecidos.
aprendizagem autoIIl0tivada. "Desescolari- ção e na aceitação da comunidade. Para os manuais,inclusivecom instalação de oficinas O granqe risco ao
não-diretivismo e
zar significa abolir o poder de uma pessoa Iibertários, o ser humano é.capaz de viver para a educação profissionalpolitécnica. do ideal de convivialidade decorre de

711 _ História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Educação para a democracia 271

---- ----,~-------_.~ --- __ •• '"" R .•••• ~ __ •• _ , .••• _.,~. _ •••.•••. -, .••• fi!
abandonar os alunos a maneiras de pensar Essa crítica atinge também a sociedade Como explicar a barbárie dos Estados tOta- do as estatísticas de qualquer país, mesmo
e viver impregnadas da ideologia dominan- .cfJ,pitalista altamente tecnicizada e burocra- litários, ainda mais quando lembramos que. os mais adiantados, aqueles teóricos co.nsta-
te. Para evitar isso, apenas um corpo do- tiz~da. VIIDOS, a' propósito, como o movi- o nazismo surgiu na Alemanha, tão culta e tavam persistirem altos índices de exclusão,
cente critico e experiente teria condições de mento estudantil de maio de 1968 iniciado educada? . . evasão e repetência.
provocar um questionamento radical, ain- na França sofreu influência direta de Her- Para os frankfurtianos,. no entanto, cri- _ Ôs sOclólogos franceses Pierre .B.ourçlkú
da que demorado. bert Marcuse. ticar ã razão não significa enveredar pelos (1930-2002) eJean-Claude Passeron (1930)
As tendências não-diretivas, ao descuidar A Escola de Frankfurt é responsável pela caminhos do irracional, mas recuperá-la escreveram juntos Qs herdeiros eAreprodução.
intencionalmente da transmissão da cultu- formulação da teoria crítica da sociedade. Seus para o serviço da emancipação humana. Segundo a noção de violência simbólica, o
ra, provocam sérios problemas que preci- principais temas de natureza sociológico-fi- Essas candentes discussões interessam à sistema de ensIDo institucionalizado e. bu-
sam ser avaliados de modo mais cuidadoso. . losófica são a autoridade, o autoritarismo, o reflexão pedagógica e muito c~ntribuem rocratizado permite que a ação pedágógi;-
Um dos riscos é abandonar à sua própria totalitarismo, aJamília, a cultura de massa, para a avaliação do papel. da educação na ca, sustentada pela autoridade pedagógica,
sorte os segmentos populares e excluídos,. o papel da ciência e da técnica, a liberdade. sociedade contemporânea~ justamente por- imponha a cultura da class~ dominante a
sem condições de superar a situação de de- Seus representantes partem da convicção que é preciso recuperar o indivíduo autô- .todos os segmentos sociais ..
pendência em que se encontram. de que os ideais da razão emancipado- nomo; consciente dos fins a que se propõe. Isso se faz pelos /zabitus, inculcados desde
No entanto, se para muitos as pedago- ra sonhados pelos filósofos iluministas do ' E isso.só será possível se for resolvido o con- a infància, interiorizando em cada indiví-
gias não-autoritárias não se aplicariam tal século XVIII não foram ainda 'atingidos. flito entre a autonomia da razão e as forças duo as normas de conduta desejadas pela
qual foram pensadas, não resta dúvida de Ao contrário, sofreram desvios perve~sos na obscuras que invadem essa mesma razão. sociedade. Como as escolas trabalham com -.
que elas podem nos.dar elementos precio- sociedade em-que, a ciência'e--a.témiease os hábitos típ~coa das famílias burguesas,. as
so~ para discutir, questões como autorita" - encontrim' á. serviço' do capitaLe..em que se.' 9. Teoriascótico:reprudutivistas .., crianças: vindas dos segmentos,desfuvoreci~
rismo;doutrinação,_índividualismo; ..que .. procede à dominação da natureza~e'do. se!' __• dàsenfri::ntam dificuldades que as levam ao
freqüente!D-ente prevalecem na herança humano para fins lucrativos. . O~ principais representantes da tendên- insucesso. Essas desigualdades, no'entantoj
da escola tradicional, impedindo a demo- Os frankfurtiànos criticam a . exaltação .. cia crítico-reprodutivista deveriam estar no são dissimuladas pela autoridaâe pedagógi:
cratização da escola, não so "na ampliação fcita ao progresso e desmistificam esse con- item sobre as teorias socialistas. No entan- ca, que, em .última:.anáIise,. aplica sanções
do seu alcance (uma educação igual para ceito, que dá a ilusão de aperfeiçoamento to, essa classificação seria correta para as e obriga ao reconhecimento da pretensa
todos) como na sua própria gestão (uma au- espontâneo, quando na verdade, em cer- teorias. de Alt.husser. e de Establet e Bau- "universalidade" doa valores da cultura do-
togestão pedagógica). tas circunstâncias, pode estar nos encami- delot, mas não para Bourdieu e Passeron, minante.
nhando para a barbárie. Esse risco surge que nelas não se ajustariam. Esses teóricos Em 1969, Q filósofo francês Louis Al.
8:
Teoria crítica: a Escola de Frankfurt toda vez que os fins propriamente humanos têm erricomum, porém, a análise d~s efei- thusser (1918.1990) publicou Ideologia e
apareUws ideolágicos de Estado. Partindo clã te-
são substituídos por outros que excluem a tos da sociedade dividida sobre a educação.
A Escola de Frankf~, surgida na Ale- • compaixão e levam ao ódio primitivo e à A partirdas décadas de 196Q-e 1970, por oriamarnsta, demonstra que a exploração
manha em 1923, tem como representan- violência. diferentes caminhos, chegaram à seguinte de uma classe por oum,é. mascarada pela
tes Max Horkheimer, Theodor Adorno, No mundo "desencantado" -:... porque conclusão: a escola está de tal forma éon- ideologia, por meio da qual os valores da
Herbert Mareuse, Walter Benjamin e Eri- regido pelo cálculo! pelo lusro, pelos negó- dicionadâ. pela sociedade dividida que, em classe dominante são universalizados e as~
ch Fremm. O filósofo Jürgen Habermas, cios - impera a razão instrumental, sem vez de democratizar, reproduz as difere,nças similados pelo proletariado. Para ele, além
embora tenha participado do grupo, dele lugar para os afetos, as paix~es,a. imagi- sociais, perpetuando o status quo. de criar um aparelho repressivo que asse-
se distanciou posteriormente. Partindo da nação, enfim, para a subjetividade. Ora, Essas teorias são conhecidas como cr£ti- gura a ordem capitalista por -meio da vio-
teoria marxista, aqueles filósofos desenvol-. como pode ser concebíver a civilização da co-reprodutiuiltas,justamente por denunciar a lência (exército,. política. tribunais, prisões
verarri um pensamento original afastado opulência, tão desenvolvida na sua ciência ingenuidade das concepções vigentes para etc,), o Estado possui aparelhos ideológicos,
da ortodoxia e critico dos rumo~ tomados e técnica, permitir a coexistência de tantos as quais a ampliação das oportunidades de constituídos 'por instituições da sociedade"
pela implantação do socialismo da União excluídos, condenados à fome, à ignorân- escolariza.ção seria a esperança de demo- civil que impõem os valores vigentes. São
Soviética: cia e submetidos à violência de toda sorte? cratização da sociedade. Ao contrário, para os aparelhos ideológicos: religioso, escolar,
os .crítíco-reprodutivistas a escola não de- familiar, jurídico, político, sindical, de in-
.'
mocratiza, mas reproduz a desigualdade. formação e o cultural.
Aliás, tinha sido essa a "il1;1SãoliDeraj" da Dentre estes, PJthusser destaca a esco-
9 Consultar Qlgária Matos, A Escola de Frrmijiat. luzes e sombras do iluminismo. São Paulo, Moderna, 1994-
(Coleção Lagos). . Escola Nova. Longe desse otimismo, segun- la, por desempenhar o papel de inculcar a

-_._.,-'---- -
272 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil Educação para a démocra~ia

".~.",-----_._,,, _---.---, ~-"-,'--
•.
mensão da escola tradicional tão criticada de modos diferentes no decorrer do tempo.
• ideologia e impedir iguais chances a todos, 10. Teorias progressistas
pela Escola Nova. Apenas é preciso ressal- , A hi.,'i:ória é entendida como a experiência
reproduzindo a divisão social.
var que essa recuperação se faz pelo viés 'da pessoa ou do grupo de modo quei ao
Roger Establet e Christian Baudelot . São considerados precursores da teo-'
. socialista, que recusa todo saber abstrato, surgirem fatores novos, as antigas estruturas
(1938), também franceses, são marxistas ria progressista os soviéticos Makarenko
lógicas ~e desfazem, para em seguida alcaJ;l-"
da linha maoÍsta. Escreveram, em '197!, e Pistrak e o italiano Gramsc.i (que vimos
desvinculado do vivido. Ao contrário, a de-
cisão sobre cr que saber, o que fazer e para çar nova 'equilibração. Em outras palavras,
o liVI'ÇlA escola capitalista na França, 'no qual no item 6). Postenormente, acrescenta-se a
que fazer depende da compreensão das os construtivistas recusam a concepção de
critica.riJ. o fato de a "escola única" ser, na contribuição do francês Georges Snyders;
necessidades sociais, analisadas sempre de uma natureza humana. universal, essencial
verdade, uma escola dualista. Para eles, há do polonês Bogdan Suchodo1ski e de ou-
acord.o com a situação histórica. e estática, herança dameta5sica "tradicio-
duas grandes redes de escolaridade chama- tros como Bernard Charlot, Henry Giroux
Segundo Snyders, diante da força da ide- nal, já que o ser humâho se faz e"'se refaz
das SS (secundária'supeÍior) e PP (primária Mario A. Manacorda e Michel Lebrot., '.
ologia não convém deixar os alunos à mer- pela interação social e~poi sua ação sobre
profissional), que correspondem à divisão Não é fácil estabelecer as linhas de for-
cê de sua espontaneidade. Por isso, cabe ao o mundo. . ' .'.
da sociedade em burguesia e proletariado. ça desse movimento, que apresenta as mais
mestre encaminhá-los "a noções,.a formas Do ponto de vista epistemológico, para
Os . burgueses têm acesso' à escolarização diversas nuab.ças . .A própria denominação'
de ação e a atitudes às quais eles não chega- os construtivistas, o 'conhecimento resulta
completa, incluindo a formação superior, progressista, inspirada em um dos livros de
riam por si mesmos" , de uma construção contínua,. eRtremeada
enquanto o proletariado é encaminhado Georges Snyders, não foi assumida por
Outro desafio proposto pela teoria pro- pela invenç~o e descoberta, Essa explic(tção
~ para à'profissionalização preCoce. todos os que, porventura, possam se apro-
gressista está na superaçjtq, ela clássica dico- difere das duas tendências que marcaram
A principal crÍtiéa destes autores prende- ximar das características dessa tendência.'
tomia entre trabalho manual e intelectual, a modernidade, o racionalismo e o empi-
se ao fato de que a divisão das duas redes é No próximo capítulo, veremos a fecunda
buscando não só maneiras de ensinar as rismo. Sabemos que desde a Idade Moder-
determinada.desde o início da escolariza- repercussão dessa teoria no Brasil.
técnicas do seu tempo, mas a compreensão na perdurava entre os filósofos a discussão
ção. Isto. é, a escola impede que os filhos dos Georges Snyders (1917), filósofo e edu-
- mais ampla desses procedimentos. sobre a origem, a natmeza e os limites do
proletários continuem os estUdos, já que es- cador'francês, escreveu Pedagogia progressista,
conhecimento hur. ',ano, Assim:
tão destinados a contribuir para a formação , Escola, classe e luta de classes e Para onde vão as
'11, Teorias construtivistas • Segundo a .t~ndência racionalista;
da força de trabalho. pedagogias rtão-diretivas? Nestas obras faz a
herdada de Descartes, prevalece o inatis-
É evidente que a radicalização de tal' critica da escola contemporânea e constrói .:
As teorias construtlVlstas representam mo, pelo qual o sujeito que conhece seria
crítica levaria a um pessimismo imobilis- uma pedagogia social e critica. Contra as
ta, retirando da escola qualquer potencial pedagogias não-diretivas, defende o papel'
um esforçota busca de caminhos que o polo mais importante no processo do
deem éonta da complexidade. do processo conhecimento.
transformador. Não há; porém, como ne- do professor, a quem atribui uma função
de conhecimento. Por isso. apoiam-sê em • Segundo a tendência emp'irista, inicia-
.gar a importância dessas. teorias para a politica. Condena' 'também a proposta de
pesquisas científicas - da psicologia, da da com Bacon e Lodre; b sujeito que co-
comp.reensão dos mecanismos da escola desescolarização de Ivan Illich, demons-
psicologia social, da psicanálise, da medici- nhece é passivo, recebendo de fora - da
na sociedade dividida em classes. A cóns- trando que a escola e os mestres têm uma
.experiência - os elem~ntôs para a elabo-
ciência disso certamente poderá orientar os tarefa importante. a cumprir. Na mesma t na, da biologia, da cibernética, lia linguísti-
ca, entre outras - para melhor compreen- ração do conteúdo mental.
professores para uma atuação' mais critica linha, embora reconheç.a a crítica, dos teó- ~
der o funcionamento da mente infantil e do Os coílStrUtivistas superam essa dicotomia
dentro do sistema. ricos reprodutivistas, ressalta o caráter con- $.. ao admitir que o conhecimento é construí-
Segundo Georges Snyders, se o operário desenvolvimen~o cognitivo. -
traditório da escola, que pode desenvolver .
• . Embora osconstrutivistas tenham atu- do: não é inato nem apenas dado pelo obje-
não consegue de imediato uma consciên- a contraeducação, evitando assim a mera ~~ to, mas antes se forma e se trar).Sforma pela
,;
, . ado em locais e épocas diferentes, perco r-
cia inteinimente lúcida da realidade social, reprodução do sistema. Critica a Escola
.~ '.» rendo caminhos origú;lais, é possível estabe- interação entre ambos. Daí o construtivismo
nem por isso estará reduzido a um joguete Nova, por ser-excessivamente preocupada
;,; '_re~er:~~Jinhas comuns, sobretudo se também ser visto como uma concepção intera.
passivo de .mistificação. Do mesmo modo, com o processo e não com o conteúdo, re-
./. examinarmos os pressupostos filosóficos de CÜJnista da aprendizagem. Como consequên-
, os conhecimentos adquiridos na escola, por forçmdo a necessidade da tra.nsmissão da
1... '. suas teorias. cia para a educação, a-eriança não é passiva
mais dirigidos que sejam, também podem cultura dominante, convencido de. que a
.~ Do ponto.'de vista antropológico, para nem o professor é simples transmissor de co-
ser reelaborados à luz de' outras experi- emancipação das crianças do povo passa
os construtivisias o ser humano tem uma nhecimento. Outra característica desse mo-
. ências. Geralmente essa retomada critica pela apropriação do saber burguês. ;~;..
existência histórico-social que determina a delo epistemológico decorre da constatação
torna-se possível nos segmentos mais pro- Por isso, UI!! dos pontos de destaque da .}'
maneira de se situar no mundo, por meio de que o conhecimento se produz a partir
gressistas da sociedade civÍl, cuja ação pode . teoria progressista revela-se na ênfase aos l'
de um processo dinâmi~o que se expressa . do desenvolvimento por etapas ou estágios
dinamizar a escola e outras instituições. conteúdos do ensino, resgatando uma di-

Educa ão ara a defIl.oq,àci~__ • 275


274 História da Educação e da Pedagogia - GefaJ.e Brasil ..;a' "'-~

.I~.,.,-••..•.•.
_ ..-.
sucessivOs,riosquais a criança organiza e re- Entre as mais significativas,destacamos in- A contribuição de Piaget para a pedago- . Ao a~alfsar os fenômenos da linguagem
organiza o'pensamento e li afetividade. trodução à efJirte!nologia genética, O.fuko m'lTal gia tem sido; até hoj~, inestimável, sóbre- e do pensamento, busca compreendê-los
Es'sa nova atitude, portanto, recusa o na criança, A construção do real na criança, Seis tudo devido às indicações sobre o estágio dent:rô do processo sócio-histórico como
oh.ieti.uismo" porque o mundo que conhece- estudos de psicolo{j.a. adequado para serem ensinados determi- "internalização das atividades socialmen- ,
mos não aparece tal como é, mas depende . Segundo Piaget, b processo ~âmico da nados conteúdos às crianças; ~em desres- te enraizadas e historicamente. desenvol-'
de como nós o vemos; recusa'o realismo (o inteligência e da afetividade supõe uma es- peitar suas reais possibilidades mentais, ou vidas". No processo de internalização é
pensamento não é o eSpelho d~ mundo); trutura co~cebida como uma totalidade.em seja, de acordo com seu desenvolvimento fi.mdamental a interferência do outro ~ a
aceita o princípio da auto-organi.<.açãn: todo equihbrio. À medida que a influência do intelectual e afetivo. mãe, ôs companheiros' de brincadeira e es-
conhecimento resulta de organizações e -re- meio altera esse equilíbrio, a~teligência, tudo, os professores-para que Gs:concei-
organizações sucessivas'em níveis de com- 'lue exerce função adaptativa por excelên- Yygotsky: pensamento e linguagem. .tqs sejam construídos e sofram constantes
plexidade cada vez maiores. cia, restabelece a autorregu1ação. transformações;
O construtivismorealça:juStamente a ca- As mu<;lançasmais significativasocorrem Lev SemenoYÍch Vygotsky (1896-1934) Para' explicar as operações superiores,
pacidade adaptativa da inteligênciae da afeti- na passagem de um estágio para outro, o nasceu na Rússia czarista e com Luria e . Vygotsky usa o conceito de mediação, se-
vidade, dando condiçõespara que o processo que Piaget analisa ao descrever a construção Leontiev desenvolveuuma teoria original e gundo o qual a relação do 'indivíduo com o
de amadurecimento não seja ilusório, o que .. ,do realna criança nas fases do processo do fecunda. Foi um intelectual de ampla for- ' mundo não é direta, mas mediada pelos sis-
acontece quando resulta de pres;ões externas desenvolvimentomental. A passagem de um mação: além do curso de direito, estudou temas simbólicos. A lliterferência do outro
sem a "gestação" por parte do sujeito. estágiopa:nt-outroé possívelpelo mecanism<Y• filosofia, filologia, literatura~ pedagogia e - por exemplo, a mãe - é fundámental
Dentre os rep;resentantes c1ássicos.dessa de orgcmil:;ação.e:.adaPlafão. Aadaptação",por
- .,I
l'
tendência, .destacamos JearrPiaget; Emilia' sua vez,~supõe doÍsprocessos interIiga:dosia
psictl10giato que o 1eYoua se dedicar ao en-
sino,.à pesquisa e a organizar'o Laborató-
para a aprendizagem dos signos socialmen-
te elaborados. '
,
Ferreiro;.Lev:Yygotsky." InúmeroS'outroS'fa~ . assimiiaçãoe.aacomadayãn. PeIa'assimila'Çãa,a . "rio de Psicologiapara Crianças-Deficientes: A mediação tamb~ é importantt' com
zem parte dessa orientação, como o francês, realidade externa e interpretada por meio de . Sempre preocupado com o estudo das ano- . relação ao pensamento e 'à, .linguagem.
HenriWallon, 05 russos Alexander Luria e algt!ffitipo de significadojá existente na or- malias fisicas e mentais, Vygotsky cursou O entendimento entre as mentes é impos-
Alexei Leontiev,'estes {l1timosdivulgadores ganiZaçãocognitiva.do indivíduo, ao mesmo. também medicina. Apesar de ter morrido sível sem' a expressão-mediadora da fala
do sócio-construtivismo, colaboradoreõ e tempo que a~coÍnodação realiza a alteração muito jovem, aos 37 anos, produziu volu- humana, cujo componente essencial é o
continuadores de Vygotsky. dessessignificadosjá existentes. mosa obra escrita, além de ter se aplicado significado, que supõe a generalização. Por
Mais recentemente, embora seguindo ca- As mudanças mais significatiVasocor- em múltiplas atividades. exemplo, a palavra casa não é um som va-
rninhosdiferentes, vemos Lawrence Kohl- rem na passagem de um estágio para outro, Os acontecimentos políticos da Revolu- zio que pode ser identificado.apenas a uma
. berg, Edgar Morin, Phillippe PerrenoudJá quando se desfaz o equíhbrio instável e bus- ção Russa de 1917 foram importante~ para determinada casa concreta, mas se aplica à
em uma linha pós-construtivista, o francês ca-se nova equilibração. Assim, os quatro o seu perisamento, car~erizado pela influ- noção de casa em geral.
Gérard Vergnar.tdparte das concepções de está.gi.os- sensóno':'motor; iÍltuitivo, das ência marxista do método dialético..Tomou Geralmente . cóstumamosavaliar' as
Piaget, Wallon e Vygotsky, mas vai além .operações concretas e das operações abs~ conhecimento das experiências da psicolo- ~crianças pelo seu deserwoWimen.ta real. Além
deles, ao enfatizar a aprendizagem' como t!atas - repTeSentamo desenvolvimento: gia dagestalte foi crítico da tendência natu- desse,nível, porém, existe um estágio ante-
fenômeno grupal. • da inteligência (da lógica); que eVolui ralista das ciênciashumanas, principalmen- rior, que Vygotskychama de zona de deserwol-
da simples motricidade do bebê até o pen- te da.behaviorismo. uimento proximal (ou potencia~, au<tcterizado
Piaget:a epistemologia genética samento 'abstrato do adoiescente; D~sejando ir mais além na discussão das pela capacidade de resolver problemas sob
• da afetividade, que parte do egocentris- caracteri:rticasda inteligência humana, pri- a estimulação de um adulto ou. em colabo-
Jean Piaget (1896-1980), nascido na Suí- mo infantil até atingir a reciprocidade e a vilegiou o estuda das operações superiores, ração com 05 colegas.A ênfase nesse estado
ça, embora não fossepropriamente pedago- c~operação, típieas da vida-adultá; . tais como o pensamento abstrato, a atenção potencial, em que uma função ainda não
go, exercéu significativainfluência na peda- • da consciência morai, que resulta de • voluntária, a memorização ativa e as àções amadureceu, mas se encontra em processo,
gogia do século XX. Suas primeiras obras uma evolução que parte da anomia (au- intencionais. Segundo Vygotsky,o nÍvel su- é de grande valia para o educador, porque •
surgiram na década de 1920 e logo tiveram sência de leis), passa pela heteronorÍJa perior da reflexão, do conhecimento abs- o auxilia a enfrentar mais eficazmente os
grande repercussão, sobretudo as que abor- (aceitação da norma externa) até atingir trato do mundo, tem início com as intera- desafios da aprendizagem.
dam a psicologia genética, que investiga 'a autoDoÍJÜliou capacidade de autodeter- ções sociais cotidianas, desde as atividades Além disso, a fase de colaboração. traz
o desenvo1vimeJ!.tocógnitivo da criança minação, que indica a superação da moral práticas da criança até tornar-s.e capaz de a vantagem de estimular o trabalho coleti-
desde Q nascimento até a adolescência. infantil . formular conceitos. . vo, necessário para transformar uma ação
••
276 História da Educação-e..da-Eedagogia - Gerale..Brasil_---: _ .. Educação para a democracia 277.
• - I'
interpessoal - portanto social - em. um . 'A alfabetização levanta, antes de tudo, .12. Kohlberg e a educação de valores a felicidadeou o interesse:não se faz o bem
processo intrapessoal,isto é, de interna1Íza- um problema epistemológico fundamen- para ser felizou para merecer o paraíso, nem
ção. A importância dessa passagem é alcaJi- tal: "Qual é a natureza da relação entre A questão do ensino moral sempre es- se-dei.'rnde fàzer o mal para evitar castigo..
çar a independência intelectual e afetiva, já o real e a sua representação?". Essa ques- 'tev.ede maneira implícita embutida n~ ati.vi- Nas palavras do prÓprio Kant '1\ja de ~
que a discussão constitui uma etapa para o tão provocou a revolução conceitual da dade docente.Vários pedagogos se Í1].teressa: forma que a' norma de s~.a.açãp.possa valer
desenvolvimento da reflexão. alfabetização. raro gelo assunto,mas até hoje essaproposta como principio uhiversalde conduta"; '1\ja
Além dos teóricc.. analisados, destaca-se Realizando diversas experiências com .pedagógicapermanece um desafio,uma vez sempre de tal modo qlle trate a Humanidade,
a contribuição do me 'ico neurologista e psi- crianças a fim de investigar a psicogênese que são altos os riscos de doutrinação, de tanto na sua pessoa COl;nO na do outro, como
cólogo francês Henri Wallon (1879-1962). da escrita, Etnilia Ferreiro percebeu que. .. imposição de valores.Jean Piaget, em 1930, fim e não apenas.como;):neio". .
Com base na concepção dialética marxista, elas de fato reinventam a escrita, no sentido publicou O jJ1gamento ~al da criança, obra A partir dessemodo de pensar kantia-
orienta suas observações sobre as anoma- de que precisam inicialmente compreender :jue influenciou diversos pensadores, volta- no, Kohlberg conclui que a educação moral
lias psicomotoras de crianças doentes. De- seu processo de construção e suas regras de dos para a indagação a respeito do desenvol- não se baseia nain.cufçação de "virtudes",
senvolve então uma teoria para explicar o produção. virrientomoral da criança e do adoleséente. porque para ava)iar' ~ aínadurecimento
processo que se faz desde os movimentos Mesmo antes do ensino formal, a moral das pessoas não basta verificar a e){-
O que, por consequência, leva à indagação
mais simples até o ato mental, desde o mais criança já construiu interpretações, ela- terioridade da sua ação. Issoporque, embo-
sobre a viabilidadeou não do ensino moral.
automático reflexo, passando pelos gestos borações internas, que Rão dependem da ra agindo de maneira idêntica, as pessoas
Em caso afirmativo,qual seria o melhor ca-
de apelo dirigidos às pessoas, pela rnímese, interferência do adulto e não devem ser minho, a fim de evitar os riscos de doutrina- podem estar movidas por critérios diferen-
até chegar à ideia. entendidas como confusões perceptivas. tes caso visem a escapar de uma punição,
ção moral? Como educar para a autonomia?
As garatujas nunca são simples pbiscos Aqui veremos a contribuição do psicólo- atender a um interesseparticular, garantir a
Emilia Ferreiro: a psicogênese da sem nexo, por isso cabe ao prof~sor ob- go norte-americano Lawrence Kohlberg 'l ordem social, ou, ainda, para serem justas.
escrita servar o que'o aluno já sabe, atento para o . (1927-1987), um seguidor de. Piaget que Esclarecer esses pressupostos é in,lportan-
modo como ele interpreta os sinais ao seu . investigouo comportamento moral de gru- te na identificação do nível de consciência
Emília Ferreiro (19.37), argentina radica- . redor e não para aquilo que a escola pensa pos os mais diversos,em escolas de cliferell- . moral, por serem indicativos de diferentes
da no México, estudou na Suíça com Pia- que ele deve saber. tes segmentos sociais, em prisões, quartéis e . estágios evolutivosde moralidade.'
get. Assim como o mestre, procurou evitar Diz Emilia Ferreiro: "É necessário ima- Jibut<:.(colôniascoletivas em Israel). Acom- Assim, agir por temor à punição ou
o "adulto centrismo", que erroneamente ginação pedagógica para dar às crianças panhou por vários anos os diversos grupos por desejo de elogio é indicativo do e~tágio
compreende a criança à semelhança do oportunidades ricas e variadas de intera- entrevistados em que aplicava seus'mLemas de heteronomia, típico do comportamento
adulto. Ao analisar a construção do conhe- gir com a linguagem escrita. É necessário . miJrai.s. Além disso, em escolas àlternativas, infantil, enquanto g11iar-sepela justiça é ad-
. cimento, destacam-se seus'valiosos estudos formação psicológica para compreender participou da experl'encia nas "commúda- mitir um princípio étiÇQsuperior.{la escala
de linguística para observar como se realiza as resporots e as perguntas das crianças. desjustas", que visavam a promover a par- . do aprimoramento mOlal.
a construção da linguagem escrita. • É necessário entender que a aprendizagem Para avali<.<r
as reSpostasdadas aos dile-
ticipação democrática e a maturidade mo-
Muitos educadores explicam as dificul- da linguagem escrita é muito mais que a ral de seus membros. . maSmorais, Kohlberg estabeleceu ~ níveis •
dades e insucessos da alfabetização pela aprendizagem de um código de transcri- O re~do teórico de suas pesquisas de moralidade: o pré-conVencional,o conven-
ineficiência dos próprios mestres, pela ine- ção: é a construção de um sistema de repre- .. nos ofereceuma filosofiamoral baseada em cional e o pós-convencionaLEm cada um de-
ficácia dos m~todos ou do material didáti- sentação" 10. pressupostoskantianos.De fàto,para o filóso- leshá doisestágios(portanto,seisao todo),por
co. Ernilia Ferreiro,. no entanto, desloca a As teorias de Emília Ferreiro foram fo alemão Immanuel Kant a vontade huma- meio dos quais é avaliadoo amádurecimento
questão para outro campo. Primeiramente, desenvolvidas em .conjunto com Ana Te- na é. v~te moral quando regida moral desde a irúànciaaté a idade adulta.
se a invenção da escrita alfabética resultou 'b~rosJ...."y,
pedagoga de Barcelona, e pio- O nível pré-cúMencional caracteriza-se
pElrimptratÍ1Jos categ6ricos, isto é, por principios
de um processo histórico que envolveu a duziram um efeito revolucionário nas pela .moral heterônoma; as regrai morais
éticos incondicionados (não-hipotéticos),ab-
humanidade por longo tetnpo, isso nos faz propostas de superação das dificuldades (;Qlutos,voltados para a realização da ação derivam da autoridade, e á ação tem em
reconhecer como é clificilpara a criança enfrentadas por crianças com problemas ~endo em vista o dever. Por exemplo, a ação vista evitar punição e inerecer recompensa.
perceber com rapidez a natureza da escrita. de aprendizagem. . moral não se vincula a condicionantes como Da perspectiva sócio-moralprevalece o pon-

10 R4faõ1!S sobre a{/àbeti<.ação.São Pa.ulo, Cortez, 1988, p. 102. 11 sugerimos multar Angela Biagio, l..awmlJ:e Kok/berg: ética c educação moral. São Paulo, Moderna., 2002.

- -~ - ~ 278 História da Educação e da Pedagogia - Geral e ~rasil Educação para a democrac!a



""'---_ ...-, -'_._---.- --,.. ...• - -_ ..._ .. ..., ~. ..•.
'
de um estágio a outro. É importante supe- do homem: para uma nova antropologia, Ciên- Diante dessa crítica, Morin preconiza
to de vista egocêntrico (o indivíduo está cen-
rar o comportamento infantil, egoísta, inte- cia caT[lconsciência, A cabeça berifei.ta: repensar a.
não a recusa das disciplinas, mas um outro
trado em Si mesmo). À medida que se socia-
resseiro, individualista (pré-convencional), reforma, reformar o pensamento, e sua obra olhar do éducã.dor e do educando: é pre-
liza, passa a reconhecer os interesses dos ou-
para em seguida ser capaz de valorizar as prin.cipal, O método, em quatro volumes. ciso "ecologiza( as disciplinas, "levar em.
tros, mas ainda prevalece o individualismo.
relações interpes.soais, agindo com os outros Morin' encontra-se atento às caracterís- conta tudo que lhes. é contextuaJ, inc1usiYé
No nível convmcional é superada a fase
ti~ do final do século XX, rias quais' se as',condições culturais e sociais, 'ou seja, ver
anterior, ao ser valorizado o reconhecimen- do modo que gostaríamos ~ue eles agissem
conosco (convencional), e por fim perceber, percebe o questionamento do pensamento em que meio elas nas~em, levantam proble-
to do outro em campos cada vez mais am-
no nível pós-convencional, que pode existir racionalista, cientificista e, portanto, re-. mas, ficam esclerosadas e transformam-se.
pliados (grupo, família, nação). Portanto,
conflito entre as leis e os princípios: se de-; . dutor, típico do paradigma que surgiu na (... ) É preciso que uma disciplina seja, ao
passam a predominar expectativas inter-
Idade Moderna. Agora; a nova epistemo- rpesmo tempo, aberta.e fechada" l:i.
pesso3ls, e, em um estágio mais avançado, vemos obedecer (de modo autônomo, evi-
dentemente) às leis e nm, adequamos 'às ins- logia descarta as certezas absolutas, para Rompe];' com a ideia do saber parcelado
as relações individuais.são consideradas. do
viver as contradições, a imprevisibilidade nos coloca diante da relação entre o toáo e
ponto de vista do sistema, das instituições, tituições, às vezes é pr~ciso reconhecer que
os princípios valem m~ quando visam a e os elementos de incerteza c0II!0 parte de a parte, que pode ser compreendida na no-
das leis que garantem a manutenção da or-
garantir a justiça, a vida, a dignidade e hãó um outro modelo de concepção de mundo. ção de complexidade. Em latim, tomplexus é
dem na sociedade.
Nesse sentido, Morin se refere a uma crise o que abrange muitos elementos ou várias .
O P6s-coTlJ)tml:Í.onal é o mais alto uiveI, podem estar subordinados a valores meno-
res como propriedade, sucesso, poder etc. planetária que nos coloca diante de perigos partes: o todo é uma unidade complexa, o
por. isso mesmo pouquíssimas pessoas são
que exigem nossa atuação, não no sentido que não quer dizer que o todo seja a simples •
capazes de .atingi-lo. Nessa fase percebem-
de negar a incert(4:a, o caos, a desordem; soma das partes. Porolltro lado; também as
-se os conflitos:entr.e.as regras. e os sistemas; l~. Moriné o pensamento' complexo
mas. para incorporá-los. como elementos .. partes, se reconhecermos' nelas a Sl1a.siiJ.gu- .
entre o direito eos princípios morais, ~or
. Não éfácildar as:grandês"linhas:-dopen- constituintes do conhecimento~ . laridadee especificidade,Jllodificam-se na
exemplo, .como conciliar as leis do' apar-
samento do francês Edgar Morin (1921), No que se' refere â educação, Morin ob- relação com o todo. Um exemplo simples
thM como princípio moral da digrúdade
intelectual que não pode, ser enquadrado serva o risco 'que representa o conhecimento é a múSica, cuja complexidade não se reduz
humana? Como. aceitar leis injustas como
em .uma só linha teórica, tal a multiplici- compartimentalizado, ; cuja' expressão ..mais . a um amontoado de notas distintas, mas
a escravidão, diante do princípio moral da
clara é a divisão. do curríCulo em disciplinas resulta: daCQin,bí:b.ação feita entre os sons a
liberdade? Nesse nível prevalece o princí- dade de interesses que orienta,m suas pes-
estanques e incomunicáveis. Assim, explica.:' partir do ritmo; da melodia e da harmonia.
pio de que as pessoas não podem ser meios, quisas e atuações. Aindajovem, Morin ma-
mas apenas fins e que, portanto, leis injustas triculou-se na Sorbonne simultaneamente '1\5 crianças aprendem a história, a geografia, O mesmo ocorre. com o sujeito: cada
nos cursos de história, geografia e direito, a química e a física dentro de categorias iso- indiVíduo tem sua singUlaridade, como
precisam ser mudadas.
ladas, sem saber; ao mesmo tempo; que a his- também as semelhanças com sua etnia, a
No entanto, a passagem de um está. tendo frequentado também as disciplinas
tória sempre se situa dentro de espaços geo- sociedade e a cultura em que vive. Portan-
. gio a outro não é automática, antes necessita de ciências políti~ sociologia e filosofia.
gráficos e 'lue. cada paisagem geográfica é to, a concepção do "'eu" é complexa, por-
da intervenção educativa. A partir de expe- Naépoca da Segunda Grande Guerra, par-
fruto de wna história térrestre; ,em saber que que para se constituir ele precisa do "tu",
rimentos aplicados,. Kohlberg verificou, por ticipou da: Resistência na França ocupada
a química e a microfisica têm o mesmo obje- assim como :'nós" pertencemos ao mundo.
exemplo, que, nas prisões, muitos agem sem pelos alemães, fez parte durante um tempo
to, porém, em escalas diferentes. As crianças Dizendo de outro modo, as qualidades das
levar em conta as normas. do sistema, o que do Partido Comunista Francês e, de 1973 a
aprendem a conhecer os objetos isolando-os, partes, inicialmente virtuais, apenas se atu-
sigrúfica um comportamento do nível pré- 1989, Rarticipou dos trabalhos do Centro
quando seria preciso, também, recolocá-los alizam por meio das inter-relações com ou-
-convencional. Mas também podemos iden- de Estudos Transdisciplinares (sociologia,
em seu meio ambiente 'para melhor conhecê- tras pessoas e com o ambiente.
tificar ações típicas desse nível infantil em antropologia e-política) da École de Hautes
los, sabendo que todo ser vivo só pode ser co- Assim explica a profess:ora Izabel Pe-
pessoas que defendem a lei de Ú1ião ("olli.o Études -de Sciences Sociales (Escola de Al-
por olho, dente por dente"; "bateu / levou"; tos Estu~os de Ciências Sociais).
nhecido na sua relação com o meio que o cer- traglia: ~n
ser _humano_~-ª «-()I:lStrução
ca, onde vai buScar 'energia e organização" 12. dê sua própria identidade, que pressupõe.
atoma lá / dá cá"), que param o catto em Fazemos essa introdução para apresen-
fila' dupla ou agem sempre de forma egocên- tar essa figura multifaQ1,~da, cuja teoria do
trica: para essas não houve o descentramen- pensamento comp~o deixa entrever o cami- 12 Edgard Morin, Le dnigt dans l'Emik: notes éparses pour um Emile' cootemporaio (O dedo 00 Emílio: notas
to necessário à vida moral, ocasião em que nho singular por ele percorrido. Além das esparsas para um Emilio contemporâneo), apud Izabe1 Cristina Petraglia, Edgar Morin: ~ educação-e a comple-
descobrimos em. cada pessoa um outro-eu. inúmeras conferências (muitas delas no xidade do ser e do saber. Pe~olis, Vozes, 1995, p. 68 e 69. .' •
A educação para os valores supõe dar Brasil), entrevistas e artigos, escreveu vários " Edgard Morio, Â ~eça b~.frita:repensar a reforma, reformar o pensamento. 7. ed. Rio deJaneiro, Bertran~
oportunidades para que o indivíduo passe livros, dentre os quais destacamos: O tmigma Brasil, 20(J2, p. 1\5.

Educação para a democracia 281.


280 História da Educação e da Pedagogia":" Geral e Brasil.

',r _ ~,,,.....<1' , •• ~. ••••• • ':.- ->:'- ••••••.. '. ",',i"'" -..... ••
..
I
•• J a liberdade e a aUtonomia, para tornar-se su- 14. Perrenoud e a construção de situaçõesque são sempre singulares,daquele . Resta dizer que as ideias de Perrenoud
,\ tiveram ampla divulgação no Brasil, tendo
jeito', a partir das dependências que alimenta, compet~ncias doente concreto e não de.outro. O médico
. necessita 'ou tolera, como, por exemplo, da deve "fazer relacionamentos, interpretações, . : influenciado' sobreman~ira na elaboração
farpília, ~a escola, da linguagem, da cultu- O sociólogo suíço Philippe Perrenoud interpolações, inferências, invenJfões, em dos Parâmetros C<tmculares Nacionais.
ra, da sociedade etc.". O grifo é nosso, para (1944) interessou-se pela. pedagogia na ten- suma, complexasoperações mentais.cujaor- Apesar disso, alguns criticos veem a adap- .
realçar a contradição -:. que devemos as- tativa de entender por que a escola mantém .questração só pode construir-se ao uivo, em tação das suas ideias nos Parâmetros como
sumir - entre liberdade e dependencia do a desigualdade e é responsável pelo fracas- . função tanto de seu saber e de sua perícia uma aproximação da IJ.oçãode competên-
sujeito. so, constatado pelos altos índices de evasão quanto de sua visão da situaç.ão". cia aos princípios' do mercado, estabeleci-
Retomando a ideia de que vivemos uma e de repetência. Dizendo de outra maneira, para desen- dos na atualidade: em p~es que assumem
"crise pianetária';, Morin explica que essa Tal como Morin, Perrenoud retoma a volvermos as competências na escola, .é políticas. neoliberais. Ou
seja, estiinula-se
agonia não é só a soma de conflitos.tradi- expressão do filósofo Montaigne, que já no preciso construí-las à medida que as exerci- uma "orientação que d~s.considerao enten-
cionais, mas "é um todo que se nutre desses lo~quo século XVI comentava em seUs tamos em situaçõescomplexas. No entanto, dimento do currículo cd,mopolítica cultural
. ingredientes conflituais, de crise e. de pro- Ensaios: "mais vale uma cabeça benfeita do não se trata de propor aos alunos problemas .e ainda reduz seus princípios à inserção so-
blemas, englobando-os, ultrapassando-os e, qúe uma cabeça bem-cheia". O mesmo fi- artificiaise descontextualizados. Tampouco cial e ao atendimento às demandas do mer-
por sua vez, alimentando-os". Se ci desen- lósoforefletia também que ao avaliar as pes- insistir no sistema de séries anuais, em que cado de trabalho"H.
volvimento da ciência e da tecnologia nos soas "cumpre indagar quem sabe melhor e as avaliações são feitas muito rapidamente. Na leitura complementar. 1 do capítulo
propiciou conforto e bem-estar, por outro não quem sabe mais". Portanto, Pertehoud Perrenoud propõe a criação. de ciclos pIt.!- 12, a professora Isabel Alarcão faz outras
lado, .as pessoas se tornaram egocêntricas, se pergunta: "para que serve ir à escola, se rianuais de aprendizado: "trabalhar uma referências a Perrenoud.
individúalistas, perdendo a capacidade de não se adqui.e nela os meios para agir no e competência requer visar a uma continui-
solidariedade: É nesse sentido que a educa- sobre o mundo?". dade do processo durante, no mínimo, três 15. Rorty e o r]eopragmatismo
ção surge como importante processo para A partir-desse impasse, Perrenoud afirma anos".
que façamos a reflexão sobre a complexida- que "o desenvolvimento mais metódico de Outra advertência é que trabalhar com No século XX, o neoprã.oomatismoteve
de dessa realidade que vivemos. Complexa, competências desde a escola pode parecer situações-problema S'lPÕ~ mudar o sistema. seu principal expoente em Richard Ror-
por admitir que "o todo tem suas qualida- uma ~a para sair da crise do sistema edu- de aula professoral e instigar as atividades ty (1931), norte-americano cuja teoria foi
des próprias", que "o todo está também cacional". Desenvolve então .0 conceito de em grupo e a realização de projetos. Isso construída a partir de Dewey, Heidegger e
em cada parte", que "distinguir e aSsociar" c0711/Jetên.ciacorno a capacidade de mobilizar significa superar de alguma maneira a tra- Wittgenstein. Além disso, Rorty tem debati-
não. é o mesmo que "disjuntar e reduzir" diversos recursos cognitivos para enfren- dição das disciplinas ~ue fragmentam o do com filósofosde diversas tendências nas
e que "enriquecer-se pelo'sistema" nã.o sig- tar situações novas. As competências não currículo escolar,buscando I110dosde inter. quais predorÍlina a problemática epistemo-
nifica "ser :reduzido ao sistema". Em todo são, portanto, saberes Ou atitudes, mas elas -relacioná-las, atenuando as divisõesrígidas lógica, tais como Donalcrpavidson, eJürgen
momento, MoPn lembra a importância da "mobilizam, integram e orquestram tais que costumam existir entre elas. J{abermas. . •.
ética, para que não se percam'as preocupa- recursos". Para evitar mal-entendidos, P'er-' Do mesmo modo, desenvolver compe- No seu livroAfilosofia e o I!Jpe1Jr.oda nature<;a,
ções consigo mesmo, com o outro e com o renouti lembra, .em Om,;trui.r as. competências tências não é um objeti\lO apenas para os publicado em 1979, Rorty recusa-se a bus-
meio. desde a escola, que desenvolver competências alunos: mas é de supor que também os pro- car a "verdade objetiva", criticando a episte-
É bem verdade que a atuação dos pro- não significa desistir de transmitir informa- fe;sores desenvolvam "competências para mologia tradicional, segundo a qual a mente
fessores, no momento de crise em que vive- ções, mas trabalhá-las a fim.de privilegiar ensinar", inventário que Perrenoud faz em humana teria a capacidade de espe!Jzar a na-
mos, supõe o enfrentamento de um desafio um "pequeno número de situações flrtes eficundas seu livro Dez novas competências para ensinar, tureza e atingir a sua representa~o precisa.
de mudar a mentalidach: da escola, quandp que produzem' aprendiza~os e giram em no qual pretende "orientar a formação Propõe uma nova concepção de filosofia,
eles própriqs fÚnda sofrem o impacto da.s torno de importantes'conhecimentos". -- contínua [para o oficio de professor] para antiplatônica por excelência, porque não-es:
contradições do modelo antigo. Assim, um bom médico identifica ê mo- torná-lá coerente com as renovações em sencialista tampouco sistemática do conhe- .
Na leitura complementar 3 deste capítu-' biliza conhecimentàs cientificosem uma si. ~ andamento no sistema eduai.tivo". cimento. Para de, ao contrário, o significado
lo veremos uma reflexão de Morin sobre o tuà.çãoconcreta: se, por um lado, os conhe.
todo e as suas partes. No capítulo 12 volta- cimentos adquiridos -dé £sica, biologia,
remos a essa temática da crise de paradig- anatomia, fisiologia,farma~orogiaetc.- são li Alice Casimiro Lopes, "Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino médio e a submi,são ~o mundo
mas, para. examinar outro conceito caro ã importantes, por outro, não são suficientes produtivo: o caso do conceito de contextuallzaçào", in Revista Educllfiio e SotÚdade, n" ao, v. 23, EspeCIal,2002, .
Morin, qual seja o de transdisciplino:ridade. para que~e faça um diagnóstico diante de p.399.

HIstória -d-a-£dttC~ção-e-cla-PeOOgegia-Geral e Brasil Educação para a democracia 283


282
está sempre em aberto, mantendo-se assim
•.
interferência e possibilidade de esperança. taleceu~secom o recrudescinlento do ideá- a Escola Nova até às mais contemporâneas
por meio da reflexão que não dispensa o di- Usando expre:.sõesde Rorty,assim diz Ghi- rio neolio.erale o proCe;lSOde globalização. teorias. No entanto, além das tentativas de
álogo permanente na "grande conversação" raldelli: "O que a educação devetransmitir, Desse modo, as promessas feitas no século mudanças metodológicas, é a própria insti.
capaz de buscar as no~ crenças e novas como Rorty a entende, é 'mais a esperança XI4 para a implantação de uma escola tuição escolar que se ácha em crise. Me'sm?
d"escriçõesde um mundo em mutação. que a verdade'. E ele acredita que na so- públiGa,única e universal, não se cumpri- porque, nesse inicio do século XXI, o nbs-
Quais as consequências desse posiciona- ciedade liberal é 'razoavelmente fácil reunir ram de fato. Ao contrário, persiste o risco somodo contemporânea de pensar, sentir
mento para a pedagogia? Segundo o pro- o ensino dos fatos históricos com o ensin(') da educação ficar atrelada aos interesses do e agi~ está posto em .questão,o que exige,
fessor Paulo Ghiraldelli Júnior, tradutor e da esperança social"'. Assim,os professores capital, preparando indivíduos pouco críti- sem dúvida, profundas moc!if1cações,na pe-
divulgador das ideias de Rorty entre nós, podem. conciliar socialização e individu- ,cospara exercerem suas funções no merca- dagogia e naSformas de educar.
podemos 'entender a sua' filosofia "como alização, ao acenarem para "o desejo de do de' trabalho. Para examinar ainda .que brevemente
uma filosofia da educação". E concorda mudanças e de aperfeiçoamento moral e Para completar, o modelo da escola tra- essas questões, voltaremos ao assunto no
. com autores que situam essa teoria numa social". Aliás, essa ideia serve para toda a dicionalpassou por inúmeras críticas, desde capítulo 12.
transição de. paradigmas: '''a passagem de vida do indivíduo, já que, ao se considerar
um paradigma epistemológico - a filoso-, o ser humano fundamentalmente plástico,
fia como fundamentação do conhecimento a educação. é um processo contínuo, que
- para um paradigma pedagógico - a fi- nunca termina. Dropes ricas e para manter abertos aqueles pro-
losofia como conversação contínua e plural blemas de estrutura (... ) que ainda hoje
• • Como herdeiro do pragmatismo, Rorty
visando à edificação das péssoas"15. 1 • Veja alguns grafites representati- a atravessam: a oposição entre escola
não busca a pretensa "objetividade" da ver-
Ao pensar a educaçàb, Rorty enfatiza.a vos da "revolta" estudantil de 1968; de ,massa e escola de elite, entre esco-
dade, mas para ele o ser humana está sempre
socialização e a indivi..dualização"que, para É proibido proibir; Não mude de em- la.aetodos e escola seletiva; a oposição
aberto à intersubjetividade,.pe1aqual encon-
ele, são ambas importantes, como duas for- prego, mude o emprego da sua vida; entre escola.de cultura (desinteressada)
tramos soluçãespara 9S problemas, para em
ças igualmente valiosas, uma que visa à in- A barricada fecha' a rua" mas abre o e escola profissionalizante (orientada
seguida nos encontrarmos diante de novps
tegração e outra à crítica. Sua posição se caminho; Sejam realistas, peçam o para um objetivo); a oposição entre es.
problemas que aguardam novas soluções.
~-11 distingue de teónêos para os quais essesdois impossível; .O sonho é a realidade; cola livre (caracterizada pela liberdade
.
movimentos estão separados dependendo Sou marxista, tendência Groucho de ensino, como quer uma instância de
Conclusão
da faixa etária, cabendo ao educador da es- (obs.; Groucho Marx foi um famoso verdadeira cultura na escola) e escola
cola elementar proceder à socialização do humorista do cinema norte-america- conformativa(a papéis sociais, a papéis
~ dillcil faier uma síntese da educação
aluno' a partir das verdades que devem ser no); A felicidade é o poder est1!dantil; produtivos). são, justamente, proble-
e da pedagogia no, mundo contemporâneo,
inculcadas nas novas gerações, enquanto ao Nosso modernismo não passa de uma mas abertos, que ainda caracterizarão
período marcado por transf{)fmações tão
educador universitário caberia estimular o lIlodernízação da' política; Limpeza por muito tempo a escola nos decê.
--' intensas que noS.envolve~ em ambiguida-
processo de critica do sistema, para garan- des, ~OIitradiçõese perplexidades. = Repressão; Levemos a revolução a nios vindouros (... ), e que devem ser
tir.a individualização. sério, mas não .nos levemos a sério; enfrentados' sem exclusivismos e sem
Se reexaminarmos as observações ini-
Rorty, porém, reconhece que esses dois Construir uma revolução é também fecharrientos, com a nítida consciência
ciais da Introdução e .do Contexto histórico des-
paIos da educação - socialização e. indi- romper todas as correntes interiores; de que aeSçola contempoi:ânea é, ain-
te capítulo, poderemos constatar as verti-
vidualização, ou seja, integração e crítica A imaginação no poder . da, uma escola em transformação, que
•ginósas mudanças econômicas, 'politicas,
- são indissociáveis e, portanto, devem procura dar resposta a situaçõ~s sociais,
morais que sacodem nosso tempo. Vimos
animar o tempo todo a ação de qualquer as revoluções que implantaram o socialis- 2 • A escola contemporânea parece culturais e de mercado de trabalho pro-
professor, desde' o-"-ensirio-J)áSlcõ-:-:Desse (... ) dividida por esses quatro aspectos fundam~te novas, e, ~ contínuo de-
. mp e-também a sua d~rrocada, sem que
modo, um professor de hist6ria, por exem- problemáticos que, no curso dos decê- venir. (Franco Carilbi) .
pudéssemos, ao mesmo tempo, aplaudir o
plo, pode mostrar às crianças -que os fatos liberalismo com') mentor de um plano ca- nios, entrelaçaram-se e acentuaram-se
ocorrem em Um processo não aca~ado, de maneira variada, mas também mar- 3 . Marco Polo descreve uma ponte,
paz de democ~tizar a sociedade, inclusive
sempre resultaI!do ,um espaço pessofU.de charamjuntos para dar à escola o perfil pedra por pedra. .
a educação. Mai;; ainda, o capitalismo for-
complexo que lhe é próprio nassocie- - Mas q~ é a pedra que sustenta a
dades industriais avançadas e democrá- ponte? - pergunta Kublai Khan.
___ ..i
1$ Ridumi RIlI'!Jr. a filosofia do"Novo Mundo em busca de mundos novos. Petrópolis, Vozes, 1999, p. 67 e seguintes.
.' . . ,
~84 Hi5tória-daEetúcação eda Pedagogia - Geral e Brasil Educação pará a democracia 285 .

- -~-_.,~-- _-~--------~._.-
.. ~
condiçõessociaisé organizar a educação de ria para fazer-se sábios se farão sábios, ao
modo' que as. tendências ativas naturais se . passo que os que só têm capacidade para
- A ponte não é sustentada por esta seja dito a um professor, diria eu que é ser varredores irão varrer as ruas".
.. empreguemplenamente na feitura de algu-
ou aquela pedra - responde Marco -, o primeiro grau da liberdade, é o grau Mas, pessoalmente, eu penso que o dese-,
-', ma coisa, alguma coisa que requeira obser-
mas p'ela curva do arco que estàsformam. niáiil baiiO da]iberdádê. ........,
vação, a aquisição de' conhecimentos infor- jo da criança não é a voz da natureza; o de:
Kublai Khafi permanece em silên- Para mim, conforme as palavras de seja da criança é o resultado do seu mãdo
mativos e o uso de uma imaginação cons-
cio, refletindo. Depois acrescenta: Marx, "a verdadeira liberdack consiste, de vida; é â resultante. de muitas influências
trutora. Oscilar entre exercícios seriados e
- Por que' falar das pedras? Só o para cada um, em ver em cada homem que sobre ela se exercem; em grande parte,
intensivospara se conseguir a eficiênciaem
arco me interessa. não a limitação maS a realização da süa .
-atos exteriores'sem o cóncurso da inteligên- o desejo e~tá ém relaçãó com a classe social
Pala responde: liberdade". Aliberdade 'é a união de to:" '
cia, e uma acumulação de conhecimentos da criança. Os filhos d~_Óperáriosindiferen-
- Sem pedras o arco não existe. dos nós para criar um mundo mais li-
que se supõebastarem-se a si mesmos,signi- ciados não têm imediíllamente os mesmos
dtalo Calvino) vre. Mas é um sentimento de libádade
ficaque a educação aceita aspresentescondi- desejos que os filhos dos.engenheiros ou dos
a que a criança não pode chegar por si .
çõessociaiscomo definitivas e por essemeio médicoS'.O desejo de estudar álgebra não
4 • Esta ideia da liberdade - não me . própria, não o alcançará sem uma lon-
assume a responsabilidade de perpetuá-las. se'reparte igualmente por toda população.
incomodes que eu também não mco- ga e tOnstárité intervenção do adulto.'
Uma reorganização da educação de modo É por isso que eu tenho grandes reticên-
modo:aoti-,seja isto dit~ a um colega, (GeorgesSnyders) . .."'." , I

que a instrução se efetue em conexão com a cias quanto à pedagogia não-diretiva; não é
inteligenterealização deativ5,dadescom um por ela ser demasiado revolucionária, mas
escopo será um trabalho lento. Ele só pode sim porque, querendo ser revolucionária,
o Leituras complel!'entares da educação superior. Contribui para a ten- efetuar-se aos poucos, dando-se um passo não Oconsegue e mantém-se no confomUs-
dência a isolar as matérias intelectuais até de cada vez.Mas isto não é' uma raZãopara mOjpois, se tomarmos como fio condutor o
ClJ [Õemocracia e educação] os conhecimentos tornarem-se escolásticos, aceitarmosnominalmente uma filosofiaedu- . desejoda crianÇf.,as crianças que vivem num
acadêÍIlÍcosou técnicos e para a convicção . cacional e adotarmos outra na prática. Será meio onde ning1lémou qU<1Se ninguém se in.
(.. :) a' maioria dos seres humanos ainda dqminante de que a educàção liberal é con- antes um incentivo para empreendermos o teressa, digamos, pela l~itura de livros, devi-
nto goza de liberdade econômica. Su.as trária às exigências de uma educação que trabalho de reorganização animosamente e do às condições de vida, à superexploração,
ocupações são escolhidas pelo acaso e pela atenda aos reclamos da vida prática. neleprosseguirmoscom perseverança. às condiçê\esdo frabalho etc., essas crianças
premência' das. circunstâncias; não são a Mas, por outro lado, esseestado de coisas hão de vir a ter pOl1cavontade de ler.
Jolm Dewq, Demoml&ia e educação: introdução à Eu creio que uma pedagogia realmente
expressão normal de suas aptidões .em atu- . contribui para definir o problema particular
filosofia da educação. 4. ed. São Paulo, Nacional,
ação recíproca com as necessidades e recur- da educação hodierna. A escola não pode progressista é uma pedagogia capaz'de des-
1979, p. 149 e 150.
sos do ambiente. As nossas condições eco- refugir.cliretamente aos ideais implantados mistificar o próprio desejo da criança, capaz
nômicàs ainda reduzem muitos homens a pelas anteriores condições sociais.Mas a e5- de explicàr-lhe por que.é que ela tem esse
€) As pedagogias não.diretivas
uma condição servil. A consequêncià é não cola pode contribuir para a melhoria dessas desejo, de onde file vem essa limitação dos
ser liberal a inteligência daqueles que são os condições, por meio do tipo de mentalida- seus de"Sejo~,capaz de â:auxiliar a Ultrapas-
A pedagogia não-diretiva, e a pedagogia
senhores da situação, na vida prática. Em de iJ:1telectuale sentimental que formar. sar os seus desejosprimeiros e dirigir-separa
". de Neill, especialmmte, assenta na ideia
vez de pugnarem resolutamente pela sub- E justamente neste ponto as verdadei- ;1~ desejos cultiíi-aisque, de outro modo, fica-
de que o desejo da criança serve de fi.mda-.
missão do mundo aos fins humanos eles ras concepções de 'mteresse e disciplina são riam a ser monopólio da classe.dirigente.
mento a todo o edifício.' É uma espécie.de
dedicam-se a utilizar-se dos outros homens da máxima importância. As pessoas cujos primeiro termo, eq diria quase uma voz da
para fins tanto mais anti-humanos, quanto interesses se ampliaram e cuja inteligência .~ Georges Snyders, "Pedagogias não-diretivas", in
natureza; é o termo do qual tudo depenãe'e Georges Snyders et.aL, Comntts atuais da pedagogia. Lis-
- mais êgóístas.--' - - -- • foi exercitada ao contato com coisas.~fatos, que de nada mais depende. Vou ler um tr(:- boa, Livros Horizonte, 1984, p. 19 e 20.
Semelhante estado de coisas e.'qllicamui- em ocupáções ativas com finalislade(seja no cho de Neill: "deixada em liberdade, longe
tos fatõs de nossas tradições históricas edu- _jogo, seja no trabalho), poderãC;com mais de qualquer sugestão adulta, a criança pode (!) O todo !em suas qualidades
. cacionais; projeta luz sqbre a contradição de probabilidades escapar às altetnativas de desenvolver-setão completamente quanto
;. li
próprias
objetivos entre as diferentes partes do SÍ5te- uma cultura puramente acadêmica e ocio- as suas capacidades nàturais lhe permitam;
rna escolar, sobre a natUreza.estreitamente sa, de uma prática dura, áspera, acanhada Summerbill é um lugar onde os que têm (... ) para mim, o pensamento sistêmico é
utilitarista da educação element:a1:e sobre o de vistas e simplesmente "prática". Aquilo capacidades naturais e ~ vontade necessá- um pensamento-chave; o pensamento que
eaIáter,estreitamente disciplinar ou cultural que mais precisa ser feito para melhorar as
Educação para a democrada 287
'- --2-86 - História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil
°
se funda sobre conhecimento complexo . Essas qualidades do todo que emergem &
daquilo que quer dizer a palavra siStema. ret:Dagem. também sobre as parte;;;. Por
citação, o anarquista francês Pierre:Jo- entre trabálho intelectual e trabalho
Um sistema não é simplesmente um todo exemplo; nós, seres sociais,fazemosparte de manuàl?' .
seph Proudhon critica a educação gra-
constituido de partes; um sistema é qual- uma sociedade, mas a sociedade só pode se tuita oferecida'pelo Estado. Responda:
quer coisa - como sabem muito bem os constituir pelas interações entre os indivídu- a) Pór que Proudhon acha que a es- 8•. "05 estúdossecundários são, por>-
sistêmicos ~ que tem qualidades, proprie- os que somos. Dessas interações nasceram cola gratUita não é de fato gratuita? suà própria natureza, aristocráticos, rio
dades que não existem no nível das partes qualidades.emergentes, a cultura, a educa- b) Explique o qu~ os anarquistas pen- . sentido ótimo da palavra;'.estudos pata
isoladas. Ou seja, o todo é mais que a soma das ção, e são elas que fazem de nós verdadeiros sam sobre o Estado e outras institu,ições. poucos, para os melhores, pªrque pre-
partes. Mas, há também - e eu me permito indivíduos..ou seja, se não houvesseesta ro- c) Diante dessa crítiça, cOqlOd~ve- param para uma formação. etesinteres-.
insistir nisso - qualidades e propriedades tação dos indivíduos para a sociedade e da , ria ser a escola segundo a concepção sada, à. qual nió podem' çorresponder
das partes que são freqüentemente inibi- sociedade para os indivíduos, nós seríamos anarquista? senão aqueles poucos que esti,í:pdestina-
das pelo todo: portanto, o todo é também mmos apep.as primatas de última linha, nós não dos de fato, pela sua capacida~e ou pela
que a soma das partes. Dessa'forma, o que há poderíamos desenvolver nossas qualidades 6. "Tinha ratão aquele que, quançlo sua sifuação familiar, aO'cUltodos mais
de notável num sistema é que ele tem suas individuais. As qualidades emergentes, por- perguntaao em que idade deve iniciar a altos ideais humanos." A partir da cita-
qualidades próprias, que chamamos emer- t~to, não são observadas somente no nível educação da criança, respondeu: quan- ção de Giovani Gentile, re.spond~:
gmtes; essas qualidades só emergem quando do todo, elas intervêm também no nível dos ~ ..
do nasce seu avô." A partir dessa frase a) Quais são as' Características da
• o sistema se constitui. Quando a vida surge, indivíduos e das partes. . ;
"1'
;~:.
de Ferrer i Guàrdia, responda: . educação que Gentile defende?
por exemplo, as partes são macromoléculas
\",
. a) Que relação o pedagogo catalão b) Explique por que essa concepção
Edgar Morin, "Pour une réforme de la pensée", en.
.,oi~~ffi estabelece entre a crian~e sua família, está de acordo com O ideal fascista.
agrupadas umas às outras, mas as proprie- .~ ';....f •
trevista de Cahiers Pedagogiques n" 268, in Izabel Cristina ,~:,t. ou comunidade? •
dades do todo é a reprodução, a possibilida-
Petragüa, Edgar Murin: a educação e'a complexidade do b) Em que seJ;ltidoessa posição di- . .9. "Suspeito que a barbárie exiSte em
de de se mover, se alimentar etc. ser e do saber: Petrópolis, Vozes, 1995, p. 81 e 82.
fere 'de outras propostas de pedagogia toda parte em que há uma regressão à
não-diretiva, por exemplo, a de Neill? violência fisica primitiva, sem que haja
uma vinculação transparente com obje- .
7.' ''Não é o trabalho em si mesmo, o tivos racionais na sociedade, onde exista
Ativ.ela"es 3. Que relações Dewey estabelece en- trabalho abstrato,' como se fosse dotado portanto a identificação com a erupção
tre educação e sociedade? Qual é a im- de uma virtude educativa natural e in- da ,,!olência física. Por outro lado, em
QJ.restões gerais portância de sua contribuição? Quais dependente de seu valor social, que deve ~cias em que a violência.$:<>n-
são seus limites? servir de base para o ensino do trabalho. duz inclusive a situações berâ. constran-
.J!,
1. Explique por que o sééulo XX apre- manual. (... ) Não, a base da educação gedoras em contextos transI?arentes
senta característicasúnicas que determi- 4. Explique de que maneira os países comunista é antes de tudo o trabalho ,-para a. geração de cons:liçõesÍIumanas
naram mudanças radicais no processo de socialistas encararam a educação e co- imaginado na perspectiva de nossa vida tariis dignas, a violência não Pode. sem
educação. mente se nos país~s Capitalistaso empe- moderna, o trabalho concebido do pon- màis--nem menos ser condenada como
nho tem sido semelhante ou não.Justifi- to de vista social,na base do quàl se fozja barbárie!"A-partir da citação de Theo-
'"2. A respeito da EscolaNÇ>Va,
responda: inevitavelmente uma compreensão de- -.dor Adorno, responda:
que sua resposta.
terminada da realidade atual, o trabalho a) Seggndo o autor, nem toda vio-
a) Q1ais são as criticas feitas pela Es-
que introduz a criança desde o início na lência é barbárie. O que as distingue?
cola Nova à escola tradicional? . 5. "Gratuita! Queres dizer, pa~ pelo a.rlvidadesocialmente útiL" A partir da
b) Comp~re ás diversas tendências b) Em outro texto, Adora0 diz:
Estado. Mas quem pagará ao Estado?
-- -"- --
da Escola Nova e selecione o que há de O pOvo.Já vês por aí que a educaç~o
citação de Pistrak, responda: "Aexigência que Auschwitz [campo de
.a) Explique que critica o autor faz extermínio de judeUs] não se repita é
comum entre elas. não é gratuita. Mas isso não é tudo.
às teorias pedagógicalr burguesas que a primeira de todas para a educação".
c) Analise a característica que você Qu~m se aproveitará mais da educação recomendam a introdução do trabalho Estabeleça a relação entre esta afir-
considera mais importante no movimen- gratuita, o 'rico ou o pobre? Evidente- na escola. . mação e a citação anterior. Relacio-
to escolanovista ejustifique sua escolha. mente será o rico: o pobre está conde- b) Em que sentido a proposta de ne também com a questão do totali-
nado ao trabalho desde o berço." Nessa Pistrak visa à superação da dicotomia tarismo.

---- ----~288 História da Educação e da Pedagogia - Geral e Brasil 289.


• .___"'l

You might also like