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Avaliação da circulação arterial pela medida do índice tornozelo/braço em doentes de

úlcera venosa crônica


* Artigo original no idioma Português Brasileiro.

Resumo
Fundamentos: As úlceras venosas dos membros inferiores são freqüentes e têm grande
impacto na qualidade de vida e produtividade do indivíduo, além de alto custo para a
saúde pública.

Objetivos: Detecção de alterações arteriais em pacientes de úlcera venosa crônica dos


membros inferiores com emprego de método não invasivo, de modo a discriminar
aqueles em que estaria contra-indicado o tratamento compressivo.

Métodos: Foram estudados 40 doentes portadores de úlcera venosa crônica, com o


intuito de se avaliar a presença de doença arterial periférica pela medida do índice
tornozelo/braço por doppler-ultra-som.

Resultados: O índice tornozelo/braço mostrou-se alterado (menor que 1) em 9/22


(40,9%) doentes com úlcera venosa crônica e hipertensão arterial concomitante, e
apenas em 1/13 (7,7%) doentes de úlcera venosa crônica sem hipertensão arterial.

Conclusão: Doentes de úlcera venosa crônica e hipertensão arterial concomitantes


devem ser submetidos rotineiramente à medida do índice tornozelo/braço para detecção
de possível insuficiência arterial periférica associada.

Palavras-chave: Arteriopatias oclusivas; Ultra-sonografia doppler; Úlcera varicosa

INTRODUÇÃO
As úlceras dos membros inferiores são muito freqüentes em todo o mundo e têm grande
importância médico-social, pois, sendo extremamente incapacitantes, afetam de modo
significativo a produtividade e a qualidade de vida dos indivíduos, além de determinar
gastos significativos para os serviços de saúde.1

Os três principais tipos de úlceras dos membros inferiores são as úlceras venosas, as
úlceras arteriais e as úlceras neuropáticas.2 As úlceras venosas são as mais comuns,
representando 80% das úlceras de pernas, com prevalência global que varia de 0,06 a
3,6%.3 - 6 A causa mais comum e importante das úlceras dos membros inferiores é a
insuficiência venosa crônica, seguida da doença arterial, que representa de 10 a 25% de
todas as úlceras e que pode coexistir com a doença venosa.2 - 4

A maioria das úlceras venosas é tratada com alguma forma de compressão (bandagens
compressivas/bota de Unna), e, portanto, se houver algum grau de insuficiência arterial
nesses doentes, esse tipo de tratamento tão utilizado na rotina médica poderá, além de
ser pouco benéfico, retardar a cicatrização da úlcera e causar danos maiores, como
maior isquemia do membro acometido.
Existem escassos estudos avaliando o comprometimento arterial em doentes com
úlceras venosas, e nenhum publicado no Brasil até o momento, justificando-se, portanto,
a realização deste trabalho.

CASUÍSTICA E MÉTODOS
Este trabalho foi realizado no ambulatório de Dermatologia do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da USP de 2003 a 2004.

Foram estudados 40 doentes (Tabelas 1, 2 e 3) com úlcera venosa crônica, tendo como
critério de inclusão a faixa etária acima de 45 anos, pois o intuito era avaliar nesses
pacientes a presença de doença arterial periférica, cuja prevalência se amplia com o
aumento da idade, sendo praticamente inexistente abaixo dos 40 anos.7 O trabalho foi
desenvolvido durante a troca semanal de curativos, quando se aplicou aos pacientes um
questionário sobre fatores de risco para insuficiência arterial periférica e se realizou
exame clínico das úlceras, anotando-se, no questionário, seu número, tamanho,
localização, recorrência, início das lesões e presença concomitante de alterações da pele.
Em seguida, foi realizado exame físico para avaliação arterial, com palpação dos pulsos
arteriais pedioso, tibial posterior e poplíteo e dos pulsos arteriais dos dois braços para
identificação do pulso mais forte à palpação. A seguir, colocou-se o gel de contato do
ultra-som e mediram-se as respectivas pressões tanto braquial como do tornozelo
(Figura 1) para a obtenção do índice tornozelo/braço (I T/B) (Quadro 1). A medida da
pressão sistólica de tornozelo/braço foi feita por ultra-sonografia de 5MHz, sendo
considerado normal o índice de pressão sistólica tornozelo/braço maior ou igual a um.

Foram confrontados o grupo de doentes considerados com insuficiência arterial (índice


T/B <1) e o grupo de doentes com o índice T/B normal (I T/B > ou = 1), em relação aos
dados clínicos e fatores de risco para doença arterial periférica, analisando-se todas as
características clínicas referentes às úlceras venosas, já comentadas.

Este estudo foi realizado com métodos não invasivos, portanto, sem risco para os
doentes, e aprovado pelo Conselho de Ética do Hospital das Clínicas da FMUSP.

Quanto à análise estatística, foram utilizados, para os cálculos das tabelas e estudo das
variáveis, o teste de Fischer e o teste Qui-quadrado.

RESULTADOS
Dos 40 doentes estudados (Tabelas 1, 2 e 3), 32 (80%) eram do sexo feminino, e oito
(20%), do sexo masculino. Com relação à idade, dois (5%) doentes tinham entre 45 e 50
anos, nove (22,5%) entre 51 e 60 anos, 14 (35%) entre 61 e 70 anos, 14 (35%) entre 71
e 80 anos, e um (2,5%) mais de 80 anos de idade. Quanto à cor, 29 (72,5%) doentes
eram caucasóides, e 11 (27,5%) negróides. Com relação à localização das úlceras, 10
(25%) doentes apresentavam úlcera na região lateral do tornozelo, 12 (30%) na região
medial, dois (5%) na região anterior, um (2,5%) na região do pé e 15 (37,5%)
apresentavam mais de uma localização (múltipla). O tamanho das úlceras estudadas
variou de um a 5cm em 24 (60%) doentes, de seis a 10cm em sete (17,5%) e foi
superior a 10cm em nove (22,5%).
Quanto ao número, as lesões eram únicas em 25 (62,5%) pacientes e múltiplas em 15
(37,5%). Com relação à recorrência das úlceras, 22 (27,5%) doentes tiveram mais de
uma recorrência, 11 (55%) apenas uma, e em sete (17,5%) nunca houve cicatrização.

A duração das úlceras foi de menos de um ano em três (7,5%) doentes, de um a cinco
anos em cinco (12,5%), de seis a 10 anos em sete (17,5%), de 11 a 15 anos em seis
(15%), de 16 a 20 anos em nove (22,5%), e de mais de 20 anos em 10 (25%). A análise
de fatores de risco para DAP mostrou que 25 (62,5%) pacientes apresentavam
hipertensão arterial, seis (15%) já haviam feito infarto agudo do miocárdio (IAM) e/ou
angina, cinco (12,5%) eram ou tinham sido tabagistas, quatro (10%) eram portadores de
diabetes mellitus, e nenhum apresentava dislipidemia. Com relação à medida do índice
tornozelo/braço para a detecção de insuficiência arterial, 10 (25%) doentes mostravam
algum grau de insuficiência arterial (IT/B < 1), 25 (62,5%) apresentavam IT/B normal,
e em cinco (12,5%) não foi possível fazer a medição.

Os resultados da análise do I T/B em relação às variáveis sexo, idade, cor, localização,


tamanho e número de úlceras, número de recorrência e tempo de início das úlceras,
história de angina/infarto, presença de diabetes mellitus e de tabagismo não
demostraram diferença estatisticamente significante entre as proporções.

Em relação à hipertensão arterial (Tabela 4), o I T/B se mostrou alterado em 40,9%


(9/22) dos doentes que tinham hipertensão arterial (HA) e em apenas 7,7% (1/13) dos
doentes que não tinham HA, havendo, portanto, diferença estatisticamente significante
entre as proporções.

DISCUSSÃO
O índice tornozelo/braço é método não invasivo, usado na prática médica para a
detecção de insuficiência arterial.3, 8 Esse exame baseia-se na medida das pressões
arteriais do tornozelo e dos braços, utilizando-se um esfigmomanômetro e um aparelho
de doppler-ultra-som manual e portátil.

Os doentes com valor de I T/B maior ou igual a um são considerados normais e, em


geral, assintomáticos; aqueles com I T/B entre 0,7 e 0,9 são portadores de grau leve de
insuficiência arterial e podem apresentar quadro clínico de claudicação intermitente;
pacientes com I T/B entre 0,5 e 0,15 demonstram grau moderado a grave de
insuficiência arterial e podem apresentar clinicamente dor ao repouso; doentes com I
T/B abaixo de 0,15 apresentam grau grave de insuficiência arterial com presença de
necrose e risco de amputação do membro acometido. Utiliza-se o I T/B < 0,8 como
valor de corte para se contra-indicar a terapia de alta compressão sob risco de necrose
do membro acometido.9,10 Este valor de I T/B de 0,8, apesar de arbitrário, tem sido
aceito por inúmeros autores como ponto de corte para contra-indicação para terapia
compressiva.9, 10 Cornwall,10 um dos responsáveis pelos primeiros estudos que
propuseram a associação entre o I T/B e a indicação ou não de terapia compressiva,
considerou que qualquer úlcera em um membro com I T/B < 0.9 deveria ser considerada
isquêmica.10

Nelzen,4 em um estudo populacional, encontrou I T/B < 0.9 em 185 (40%) úlceras de
pernas, e Scriven,11 em 14%.
No presente trabalho, dos 40 doentes portadores de UVC, detectou-se, pelo uso do I
T/B, em 10 (25%), a presença concomitante de DAP, isto é, proporção inferior à
detectada por Nelzen (40%),4 mas superior às detectadas por Anderson (24,5%),12
Scriven (14%)11 e Callam (21%).13 Portanto, pode-se considerar que a detecção da
concomitância entre úlcera venosa crônica (UVC) e doença arterial periférica (DAP) foi
freqüente na casuística estudada.

Neste estudo, foram analisadas diversas variáveis (sexo, idade, cor, número de úlceras,
localização, recorrência, tempo de início e fatores para DAP) de 40 doentes com úlcera
venosa crônica em relação ao I T/B com o intuito de verificar a existência de indícios
clínicos da associação entre DAP e UVC.

Em relação às variáveis sexo, idade, cor, número de úlceras, localização, recorrência,


tempo de início, presença de tabagismo e de diabetes mellitus e história angina/infarto,
não houve diferença estatisticamente significante entre as proporções.

Em relação à análise da hipertensão arterial e à alteração do I T/B, foi encontrada


associação estatisticamente significante entre os doentes com úlcera venosa crônica (p=
0,05). No grupo com presença de HA, 40,9% (9/22 doentes) apresentavam índice < 1 e
no grupo sem HA, apenas 7,7% (1/13 doentes) dos doentes apresentaram índice < 1,
havendo diferença estatisticamente significante entre as proporções.

Pode-se observar da análise dessas múltiplas variáveis que a casuística foi relativamente
fragmentada e que, ainda que os métodos estatísticos utilizados tenham sido adequados,
é obrigatório considerar a possibilidade de que a ampliação do número de casos
estudados possa levar a correlações estatísticas significativas entre as características
clínicas da UVC e a presença de DAP como indicadores da possibilidade de associação
entre UVC e DAP.

CONCLUSÕES
A análise dos resultados deste estudo permitiu chegar às seguintes conclusões:

- a presença de DAP detectada pela medida do I T/B em doentes com UVC foi
significativa, ocorrendo em 25% dos doentes;

- não houve diferença estatisticamente significante entre as seguintes variáveis em


relação ao I T/B medido nos 35 doentes com úlcera venosa crônica: sexo, idade, cor,
localização, tamanho, número, recorrência e tempo de início das úlceras, história de
angina/infarto, tabagismo e diabetes; a análise desses fatores não permite inferir quanto
à presença de DAP nos doentes com UVC;

- houve associação estatisticamente significante ao se avaliar o I T/B (p= 0,05), em que


40,9% dos doentes com HA apresentaram I T/B < 1 e no grupo dos doentes sem HA,
apenas 7,7% apresentaram alteração do I T/B;

- a correlação positiva observada entre HA e I T/B recomenda a obtenção do I T/B e a


avaliação de DAP em doentes com úlcera venosa crônica associada à hipertensão,
evitando-se o tratamento compressivo.
Índice Tornozelo Braço no Estudo da Função Arterial:
Será a Correcção à Superfície Corporal Necessária?

Pereira T., Maldonado J.


Instituto de Investigação e Formação
Cardiovascular, Escola Superior De
Tecnologia da Saúde, DCIB, Coimbra,
Portugal

Introdução
As doenças cardiovasculares constituem um conjunto de patologias com
uma enorme incidência e prevalência em todo o mundo, sendo responsáveis
por uma elevada percentagem da mortalidade global verificada, sobretudo
nos países ocidentais. A mortalidade cardiovascular, por seu lado, é
primariamente determinada por situações clínicas que expressem o
envolvimento do sistema arterial. Como tal, a implementação de estratégias
preventivas a este nível constitui uma exigência incontornável face à
realidade actual.

Uma das metodologias mais utilizadas para a o estudo não-invasivo da


integridade arterial consiste na avaliação da distensibilidade segmentar da
aorta, através da determinação da Velocidade da Onda de Pulso Carotídeo-
Femoral (VOP CF) [1,3], parâmetro reconhecido pela sua sensibilidade [4],
reprodutibilidade [2] e inquestionável significado prognóstico [2,11].

O estudo da fisiologia vascular permitiu reconhecer a presença de um


gradiente de pressões ao longo do leito arterial, com um normal incremento
da pressão arterial com o aumento da distância relativa ao coração,
situação que deriva da elevação verificada na impedância com a redução do
diâmetro arterial e da maior proximidade da onda de pressão relativamente
aos pontos de reflexão [12].

Partindo deste pressuposto, a medição da pressão arterial sistólica (PAS) na


artéria umeral e tibial posterior, mediante técnicas de Doppler ou com um
esfigmomanómetro, poderá facultar-nos informações relevantes sobre a
integridade do sistema arterial, sendo suposto que uma tendência para a
igualização das pressões traduzirá uma maior rigidez arterial e uma mais
precoce reflexão das ondas distais. O índice tornozelo-braço, ou índice
braço-pé (IBP), tem sido amplamente utilizado como indicador de
integridade arterial. Esta metodologia assenta no princípio hemodinâmico
da amplificação da pressão, segundo a qual a pressão sistólica aumenta à
medida que consideramos territórios arteriais mais distais.
Consequentemente a este princípio, é plausível que diferenças na estatura
corporal, implicando diferentes distâncias relativas entre os territórios
arteriais, resulte em diferentes IBP em indivíduos com uma integridade
arterial semelhante. O objectivo deste trabalho foi avaliar os benefícios
relativos da correcção do IBP à superfície corporal (SC).

Métodos
Amostra
Um total de 230 sujeitos saudáveis foram incluídos no estudo. As
características sócio-demográficas encontram-se resumidas na tabela I.
Todos os sujeitos foram submetidos a determinação do IBP e da velocidade
da onda de pulso carotideo-femoral (VOP). A pressão arterial casual bem
como outros dados antropométricos relevantes foram também
considerados.

Tabela 1: Caracterização clínica da amostra


Legenda: IMC – Índice de Massa Corporal; FC – Frequência
Cardíaca; PAS – Pressão Arterial Sistólica; PAD – Pressão
Arterial Diastólica; VOP-CF – Velocidade da Onda de Pulso
Carotideo-Femoral; VOP-CR – Veocidade da Onda de Pulso
Carotideo-Radial; IBP – Índice Braço-Perna

Índice Braço-Pé
O Índice Braço-Pé (IBP) foi determinado a partir da avaliação da pressão
arterial nos membros superiores e inferiores. Para o efeito recorreu-se a
dois esfigmomanómetros automáticos, validados e devidamente calibrados
[13], com detecção simultânea, por oscilometria, das pressões da artéria
umeral direita (PA dos membros superiores) e da artéria tibial posterior
direita (PA dos membros inferiores), por dois operadores independentes e
experientes, sendo os valores tensionais validados pela identidade das
frequências cardíacas nos dois locais de avaliação. O procedimento realizou-
se com o sujeito em decúbito dorsal e após um período de repouso de 10
minutos. O procedimento foi repetido três vezes para cada sujeito.

O IBP foi calculado pela divisão do valor da PAS dos membros inferiores
pelo valor mais elevado da PAS nos membros superiores. O IBP é
normalmente considerado como o mais reduzido dos valores obtidos [14].
Considera-se que IBP normais oscilarão entre 1 e 1.4. Dada a relação da
amplificação da pressão com a estatura corporal, o IBP foi corrigido à
superfície corporal (SC). A SC foi calculada a partir da equação de Mosteller
[15].

Distensibilidade Aórtica
A distensibilidade aórtica foi avaliada em todos os sujeitos através da
determinação da Velocidade da Onda de Pulso Carotideo-Femoral (VOP-CF)
com o aparelho Complior® (Colson, Paris) [2] de acordo com técnica
previamente descrita. Resumidamente, a VOP-CF foi calculada pela relação
distância/tempo (metros/segundo), com avaliação simultânea da onda de
pulso na artéria carótida direita e na artéria femoral direita [3]. As
determinações da VOP foram realizadas pelo mesmo operador e a qualidade
dos registos foi avaliada por dois observadores independentes com grande
experiência nesta metodologia. A reprodutibilidade destas estimativas no
nosso laboratório, previamente determinada, compreende coeficientes de
correlação superiores a 0,9 (0,98 e 0,95 respectivamente para diferenças
inter e intra-observador).

Análise Estatística
Os dados relativos aos sujeitos da amostra foram informatizados e tratados
com recurso ao programa SPSS para Windows, versão 13.0. A distribuição
das variáveis foi testada, quanto à normalidade, pelo teste de Kolmogorov-
Smirnov, e quanto à homogeneidade das variâncias, pelo teste de Levene. A
análise estatística dos dados recorreu a análises de regressão múltipla em
stepwise, complementadas com análises de correlação bivariada (R de
Pearson), bem como a correlações parciais controlando a idade (covariante
importante da VOP). O critério de significância estatística utilizado foi um
valor de p ≤ 0.05 para um intervalo de confiança de 95%.

Resultados

A idade média da amostra foi de 20±5,64 anos, a pressão arterial foi


121±10,77 e 67±8,67 mmHg, respectivamente para a sistólica e diastólica.
Uma análise de correlação bivariada entre o valor absoluto do IBP e a VOP
não revelou qualquer associação entre as variáveis (p=NS) (figura 1).

Figura 1: Análise de regressão linear entre o


IBP bruto e a VOP CF
Legenda: IBP – Índice braço-pé; VOP-CF –
Velocidade da onda de pulso carotideo-femoral
A mesma análise utilizando o IBP corrigido revelou uma forte correlação
inversa com a VOP (r = -0,5; p<0,001), demonstrando uma concordância
substancial entre os dois índices vasculares (figura 2).

Figura 2: Análise de regressão linear entre o


IBP corrigido à SC e a VOP
Legenda: IBP – Índice braço-pé; SC – Superfície
Corporal; VOP-CF – Velocidade da onda de
pulso carotideo-femoral

Conclusões
O IBP tem sido então utilizado como um indicador importante para o
diagnóstico de DAP, sendo estudado sobretudo em populações idosas com
grande incidência de doença aterosclerótica clinicamente relevante. Neste
sentido, esta patologia pode ser definida por um IBP <0.90, tendo
este valor uma sensibilidade de 94% e uma especificidade de 99%
para o diagnóstico angiográfico de DAP [16]. Um IBP <0.9 associa-se
a um risco aumentado de mortalidade e morbilidade cardiovascular
[17, 20] e a uma elevação de 2 a 4 vezes na mortalidade global [21].
Um baixo IBP associa-se igualmente a um maior risco de patologia
cerebrovascular [22], a uma maior gravidade de doença coronária
[23,25], a uma melhor predição de acidentes coronários agudos [26],
a uma maior prevalência de aterosclerose [27,28], a um maior risco de
doença arterial em diabéticos [29] e a um maior declínio da função renal ao
longo do tempo [30]. Por outro lado, são observadas esperadas relações
directas entre o IBP e o tabaco e a ingestão de gorduras e inversas com a
actividade física [31]. Poucos estudos, contudo, utilizaram esta metodologia
no diagnóstico precoce da patologia arterial, situação que seria
potencialmente importante para o reconhecimento da instalação da doença
hipertensiva. Esta possibilidade parece-nos muito estimulante sob o ponto
de vista conceptual, atendendo à associação existente entre este índice e
formas sub clínicas de doença cardíaca e carotídea [33], com marcadores
inflamatórios e hemostáticos [34] e, eventualmente, com a velocidade da
onda de pulso carotídeo-femoral [27].

A forte associação entre o IBP e a VOP reforça a convicção de que também


o IBP poderá dar indicações importantes em fases precoces de disfunção
arterial, embora estudos prospectivos sejam necessários para avaliar as
implicações a longo-prazo da sua integração clínica. No entanto, os
resultados enunciados apenas se tornaram aparentes quando a superfície
corporal foi tido em consideração, situação lógica, na medida em que a
amplificação de pressões evidenciada nos dois territórios vasculares será
sempre condicionada pela dimensão do segmento arterial presente. A
correcção à superfície corporal deste índice emerge assim como um aspecto
metodológico importante, podendo aumentar a capacidade discriminativa do
teste, embora sejam necessários mais estudos para avaliar o verdadeiro
impacto clínico deste.

Conclui-se assim que a correcção do IBP à SC poderá constituir um aspecto


metodológico fundamental, com implicações práticas significativas que
aconselham a sua consideração em qualquer tentativa de estudar a
dinâmica e função arterial.

A medida das pressões segmentares com Doppler ultra-som, auxilia na determinação do grau de
isquemia pelo índice tornozelo/braquial (relação entre a pressão arterial sistólica ao nível do
tornozelo e o braço). Este índice é normal quando for igual ou superior a 1,0. Quanto menor for
este índice, pior a isquemia, sendo caracterizada isquemia leve em pacientes com índice entre
0,7 e 1,0, isquemia moderada entre 0,7 e 0,4. Nos casos de isquemia grave, com risco de perda
do membro, o valor deste índice é igual ou inferior a 0,3.

A ultra-sonografia dúplex colorida (dúplex scan ou mapeamento dúplex) atualmente é muito


utilizada, pois permite a avaliação da morfologia da parede do vaso e do seu conteúdo (diâmetro
do vaso, características da placa de ateroma ou da parede do vaso, presença de trombo) além da
análise das velocidades do fluxo para determinação dos graus de estenose ou de obstrução.

Havendo dúvida quanto à etiologia, recorremos a arteriografia que pode fornecer dados
importantes para o diagnóstico diferencial. A oclusão da artéria com imagem em "taça invertida"
e presença de artérias lisas (sem lesões ateromatosas) é típica de embolia arterial. A presença de
lesões parietais ateromatosas difusas e circulação colateral mais desenvolvida são características
de lesões arteriais crônicas, ou seja, da trombose arterial.

Muitas vezes a comprovação da fonte embolígena é decisiva no diagnóstico de embolia, sendo


necessário então exames complementares para diagnóstico de cardiopatia (eletrocardiograma,
RX de tórax, ecocardiografia) ou de aneurismas arteriais (ultra-som, tomografia
computadorizada e ressonância magnética).

Escrito por Dra. Ana Paula Dinis*


04-Abr-2006
O desenvolvimento científico no âmbito das ciências médicas verificado nos
últimos anos contribuiu de forma significativa para o conhecimento da
fisiologia da cicatrização. Aliado a esse conhecimento, e ao desenvolvimento
tecnológico, começaram a surgir na década de 80 materiais de penso de
especificidade crescente.

Assim, presentemente estão disponíveis uma grande diversidade de pensos,


cujas características permitem prevenir e tratar diferentes tipologias de
feridas.

Constitui pois, um desafio permanente para os profissionais de saúde,


seleccionar o material de penso mais custo-efectivo adequado aos diferentes tipos de feridas a
tratar, tornando-se imperativo, o conhecer das propriedades dos diversos tipos de material de
penso actualmente disponíveis no mercado.

Nesse âmbito este artigo tem por objectivo sistematizar, classificar e caracterizar os materiais de
penso actualmente disponíveis.

Breve perspectiva histórica…

O recuo na história permite verificar que o registo mais antigo de um penso data de 1.700 a.c. e
refere como curativos - graxa, mel, fios de linho para sutura, carne fresca e óleo fervente.
Desde então, o empirismo ao serviço da medicina levou à aplicação das mais variadas
substâncias de origem animal, vegetal e mineral em lesões cutâneas – resina, mel, açúcar,
malaquite, vinagre, terbintina, gema de ovo, etc.
Nos anos 60, o clássico trabalho de George D. Winter, (publicado em 1962), revolucionou esses
conceitos tradicionais e empíricos no tratamento de feridas ao demonstrar que feridas de porcos
com perda parcial de tecido, cobertas com filme de polietileno, evitavam a formação de crosta e
mantinham o leito húmido, epitelizando quase duas vezes mais rapidamente do que aquelas
mantidas em exposição ao ar, ou seja, secas.

Essa percepção mudou o rumo do desenvolvimento do material de penso, sendo que esse deixou
de constituir apenas uma barreira mecânica protectora, passando então a estabelecer interacção
com a ferida e por isso actualmente muitas vezes designado por Material de Penso Interactivo.
Assim, a após alguns anos decorridos desde as experiências de Winter e de muitos estudos
experimentais efectuados chegou-se ao consenso de que um ambiente húmido e uma temperatura
amena na superfície da ferida são factores essenciais ao processo de cicatrização. E foi
precisamente com base nesses estudos que Turner, em 1982, estabeleceu as principais
características que um penso deve possuir de forma a tratar uma lesão:

1. Manter o ambiente húmido na interface ferida/penso;


2. Remover o excesso de exsudado e componentes tóxicos;
3. Permitir trocas gasosas;
4. Manter a temperatura a 37ºC, permitindo a actividade dos macrófagos e a mitose durante a
granulação e epitelização;
5. Ser impermeável às bactérias;
6. Permitir a remoção sem causar traumatismos;
7. Ser isento de partículas tóxicas.

Além desses, outros aspectos devem ainda ser considerados como sejam:

Esterilidade;
Conforto para o doente;
Capacidade de adesão à pele circundante;
Protecção contra o trauma;
Disponibilidade;
Variedade de tamanhos;
Resistência à manipulação e humidade;
Conformação e flexibilidade;
Facilidade de manuseio;
Custo-efetividade.

Estando disponíveis na actualidade diversos materiais de penso que obedecem as esses


pressupostos.

Caracterização e Sistematização do Material de Penso

A crescente emergência de novos materiais de penso torna necessária a sua sistematização de


forma a facilitar uma selecção racional. Dessa forma, e atendendo às características desses
pensos, podem ser classificados em:

Material Absorvente

Como o próprio nome indica estes pensos caracterizam-se primariamente pela sua capacidade de
absorção e/ou gestão dos exsudados. Dentro deste grupo podem-se incluir:

Alginatos

Os alginatos são constituídos por fibras derivadas do ácido algínico, extraído a partir algas
marinhas da espécie Laminaria.
Quando colocados na ferida, actuam por troca iónica entre os iões cálcio presentes no penso e os
iões sódio dos tecidos, processo esse, associado à absorção do exsudado por capilaridade. Em
contacto com o exsudado o alginato transforma-se num gel viscoso criando um ambiente húmido
na superfície da ferida, o qual favorece a sua cicatrização, alivia a dor (por humedecimento das
terminações nervosas evitando assim uma propagação de estímulos de grande intensidade),
facilita o desbridamento autolitico do tecido necrosado e permite ainda as trocas gasosas.
Por esse motivo os alginatos estão indicados em feridas altamente exsudativas infectadas ou não,
nomeadamente úlceras de pressão e da perna (venosas e/ou arteriais), queimaduras do 1.º e 2.º
graus e ainda zonas de enxertos.
Apresentam-se sob a forma de apósitos (ver Figura 1) de diversas dimensões e sob a forma de
tiras (ver Figura 2) para feridas estreitas e profundas.
Para fixação ao local da ferida requerem a aplicação de um penso secundário (ver Figura 3 A, B e
C).
O tempo de permanência na ferida é variável podendo ir de 1 a 7 dias, sendo que a sua mudança
está dependente da quantidade de exsudado.

Aginatos comercializados: Algisite M® (Smith & Nephew); Askina® Sorb (B.Braun); Askina®
Sorbsan Plus (B.Braun); Kaltostat® (Convatec); Sorbalgon® (Hartmann); Suprasorb A®
(Novamed); 3M Tegagen (3M).

Figura 1 – Apósito de alginato de sódio.

Figura 2 – Tira de alginato de sódio.

Figura 3 – Aplicação
de um apósito de alginato.

Hidrofibras

Compostas por fibras de carboximetilcelulose, caracterizam-se por apresentarem um mecanismo


de absorção vertical, sendo o exsudado absorvido para o interior da fibra, a qual se transforma
num gel criando dessa forma, uma ambiente húmido favorável ao processo cicatricial, sem no
entanto macerar a pele circundante à ferida.
A sua capacidade de absorção é bastante elevada sendo cerca de 25 vezes superior ao seu peso.
Esse factor faz com que as hidrofibras estejam indicadas em feridas muito exsudativas, tais como
úlceras de pressão ou vasculares, abrasões e lacerações, incisões, zonas dadoras de enxertos e
queimaduras do 1 e 2.ª graus.
À semelhança dos alginatos requerem um penso secundário para fixação à zona lesionada e
existem sob a forma de apósitos (de diferentes dimensões) e tiras.
A frequência de mudança é em função da quantidade de exsudado (ou situações clínicas
especificas), podendo permanecer na ferida de 1 a 7 dias. Ocasionalmente poderá ser necessário
irrigar a ferida com uma solução salina para remover algum gel residual sem danificar o tecido
de granulação.

Hidrofibras comercializadas: Aquacel® (Convatec)

Hidrocolóides

São constituídos geralmente por duas camadas, uma interna (que contacta directamente com a
ferida), composta por substâncias hidrofilicas – carboximetilcelulose, pectinas, gelatina - e uma
externa à base de espuma ou filme de poliuretano, oclusiva ou semipermeável (dependendo da
marca comercial) aos gases, líquidos e bactérias.
Em contanto com o exsudado da ferida, este é absorvido formando um gel que se expande
paulatinamente em direcção ao leito da lesão, aplicando firme pressão sobre sua base,
especialmente em feridas mais profundas, estimulando assim a produção de tecido de granulação.
Além disso, promovem o desbridamento do tecido necrótico e auxiliam na remoção dos
componentes tóxicos provenientes da destruição celular e bacteriana, actuando na limpeza por
autólise. De salientar que o gel formado apresenta um cheiro característico, normalmente
desagradável.
Nesse seguimento, têm várias indicações, profiláticas e terapêuticas, que vão desde as lesões em
estadios iniciais até aos mais avançados, com baixa a moderada quantidade de exsudado. Assim,
podem ser utilizados em úlceras de pressão, vasculares ou diabéticas.
Estão no entanto contra-indicados em feridas infectadas e naquelas com exposição de tendões ou
ossos.
Existem comercializados sob a forma de apósitos (ver Figura 4) de dimensões várias e com
diferentes formas anatómicas adaptadas a zonas corporais específicas (ex. sagrada) com ou sem
rebordo e ainda, de pastas especialmente indicadas para feridas cavitárias.
Desenvolvimentos recentes apresentam materiais de penso hidrocolóides associados a alginatos,
permitindo a sua utilização em feridas muito exsudativas.
A aplicação destes pensos é fácil, podendo permanecer na ferida de 1 a 7 dias, dependendo da
quantidade de exsudado. Na altura da remoção essa facilidade mantém-se, sendo atraumáticos.

Hidrocoloides comercializados: Askina Hydro® (B.Braun); Askina® Biofilm Paste (B.Braun);


Hydrocoll® (Hartmann); Suprasorb® H (Novamed); Varihesive® Gel control (Convatec);
Varihesive® Pasta (Convatec).

Figura 4 – Apósito de hidrocolóide.

Espumas

Fisicamente apresentam-se com estruturas multilaminares. A camada mais interna, que contacta
directamente com a superfície da ferida, é adesiva e perfurada, a camada intermédia é composta
por uma espuma hidrocelular à base de substâncias hidrofílicas com capacidade de absorção de
exsudados, e finalmente a camada mais externa é à base de poliuretano sendo impermeável às
bactérias mas permeável ao vapor de água e ao oxigénio.
As espumas mantêm o isolamento térmico, mantêm um ambiente húmido e são confortáveis para
o doente.
Estão indicadas como penso primário em feridas pouco a moderadamente exsudativas, em
especial com tecido de epitelização e/ou granulação, e como penso secundário em feridas
cavitárias previamente preenchidas com outro material de penso (pasta, pó, gel) destinado a tratar
infecções ou tecido necrosado.
Apresentam-se sob a forma de apósitos com ou sem rebordo (ver Figura 5), com diferentes
formas anatómicas adaptadas à região do calcâneo ou à região sagrada (ver Figura 6) ou em
“estruturas esféricas” para feridas cavitárias profundas (ver Figura 7).
As espumas de poliuretano podem permanecer na ferida até um máximo de 7 dias, sendo que a
frequência de mudança está dependente da quantidade de exsudado.

Espumas comercializadas: Allevyn® (Smith & Nephew); Allevyn® Cavity Circular (Smith &
Nephew); PermaFoam® (Hartmann); Suprasorb® P (Novamed); Tielle® (Johnson & Johson);
3M Foam (3M).

Figura 5 – Apósito de poliuretano com rebordo.

Figura 6 – Apósito de poliuretano anatomicamente adaptado à região


sagrada.

Figura 7 – Pliuretano “Cavity” para feridas cavitárias.

Carvão Activado

Os apósitos de carvão activado são constituídos por duas camadas (interna e externa) de tecido
não tecido no interior das quais existe uma camada intermédia de carvão activado. Este
caracteriza-se por apresentar uma elevada capacidade de desodorização uma vez que adsorve à
sua superfície as moléculas responsáveis pelo mau cheiro. Para além dessas moléculas, absorve
água, bactérias e outros componentes presentes no exsudado.
Essas propriedades fazem com que estes apósitos estejam indicados em feridas com mau odor,
infectadas ou com quantidade moderada de exsudados nomeadamente úlceras de pressão e de
perna (de origem vasculares ou diabética), bem como em feridas oncológicas.
No caso de feridas pouco exsudativas o penso pode aderir à pele pelo que, pode ser aplicado
hidrogel na ferida previamente à aplicação do penso.
Para que o carvão permaneça activo durante mais tempo alguns pensos associam ao carvão
activado alginatos e carboximetilcelulose (ex. Carboflex®) para absorção de exsudados. Outros
pensos associam ao carvão activado prata, a qual tem propriedades bactericidas (Actisorb
Silver®).
Estes apósitos não devem ser cortados, devido ao risco de dispersam das partículas de carvão na
ferida constituindo corpos estranhos.
Requerem um penso secundário e a sua mudança deve ser diária em feridas infectadas, podendo
permanecer mais tempo nos casos e feridas pouco exsudativas.

Apósitos de Carvão Activado comercializados: Askina Carbosorb® (B.Braun); Vliwaktiv®


(Novamed).

Material Desbridante

Como o próprio nome indica, este material de penso caracteriza-se primariamente pela sua capacidade de promover o
desbridamento de tecidos necróticos responsáveis pelo atraso do processo de cicatrização. Dentro deste grupo podem incluir-se:
Desbridantes autolíticos
Desbridantes enzimáticos

Desbridantes autolíticos

São compostos essencialmente à base de água (cerca de 80%), a qual é responsável pela hidratação dos tecidos secos, favorecendo
assim, a sua dissolução e consequentemente a autólise pelo próprio organismo.Dessa forma, estão indicados em primeira linha em
feridas secas com ou sem necrose, ou pouco exsudativas.
O facto de fornecerem humidade à ferida, contribui para a promoção da angiogenese e re-epitelização, sendo ainda responsáveis
pela diminuição da dor por humedecimento das terminações nervosas.
Esse material existe comercializado sob duas formas de apresentação – gel amorfo e apósito (ver Figura 1).
Figura 1 – Hidrogel sob a forma de apósito.

O gel deve ser aplicado sobre a ferida com um mínimo de 5 mm de espessura (ver Figura 2) e posteriormente coberto com um
apósito secundário - gaze, película semi-permeável ou poliuretano (se existir algum exsuaddo).

Em relação à apresentação sob a forma de apósitos, estes podem ter rebordo ou não, sendo que neste caso, requerem um penso
secundário. Ambas podem permanecer na ferida até um máximo de 3 dias, dependendo das suas características (presença de
exsudado, infecção, etc.)
Figura 2 – Aplicação do hidrogel amorfo.

Actualmente, estão disponíveis geles compostos por alginatos, pectinas, carboximetilcelulose entre outros compostos, que para
além de fornecerem água aos tecidos, fazem a gestão dos exsudados, diminuindo dessa forma a maceração dos tecidos e da pele
perilesional.

Desbridantes autoliticos comercializados:


Geles amorfos – Askina® Gel (B.Braun); Intrasite® gel (Smith & Nephew); Nu-gel® (Jonhson & Jonhson); Varihesive® Gel
(Convatec).
Apósitos - Intrasite® conformable (Smith & Nephew); Hydrasorb® (Hartmann); Suprasorb® G (Novamed).

Desbridantes enzimáticos

São assim denominados, devido ao facto de serem compostos por enzimas proteolíticas responsáveis pela quebra das pontes de
colagénio que prendem o tecido necrosado à base da ferida (ver Figura 3). Os péptidos resultantes da degradação do colagénio, têm
um efeito quimiotatico sobre os macrofagos e fibroblastos, atraindo-os para a base da ferida com a consequente estimulação do
processo de granulação.

A colagenase é a única enzima comercializada em Portugal e está disponível sobre a forma de pomada, estando indicada no
desbridamento enzimático dos tecidos necrosados ou fibrinosos, sendo que a sua eficácia depende da penetração na crosta. É pois
por isso recomendada, a realização de alguns cortes na mesma para facilitar a penetração da pomada através dos tecidos necrosados
secos.
Figura 3 – Quebra das fibras de colagénio pelas enzimas (representadas a vermelho e verde) que prendem o tecido necrótico à

ferida.

Previamente à da aplicação da pomada, a ferida deve ser devidamente limpa, tendo o cuidado de não utilizar soluções ou pomadas
que contenham metais pesados (ex. iodo, prata, zinco) uma vez que podem destruir a enzima, e posteriormente coberta com um
penso adequado, o qual deve ser refeito pelo menos uma vez por dia.

Desbridante enzimático comercializado: Ulcerase® (Smith & Nephew)

Material Impregnado

De uma forma simplista, pode definir-se material impregnado como todo aquele que é composto por uma gaze impregnada por uma
substância dotada ou não de efeito terapêutico.
Assim, e uma vez que neste grupo podemos incluir uma variedade enorme de pensos disponíveis, é importante subdividi-los em dois
grupos: as gazes impregnadas com substâncias sem efeito terapêutico e as dotadas de efeito terapêutico.

Material de Penso Impregnado com Gordura

Dentro do primeiro grupo incluem-se as gazes gordas, que podem ser compostas por uma compressa primária natural, à base de
algodão hidrófilo, ou sintética de celulose ou viscose, impregnada por uma substância gordurosa – vaselina, parafina ou lanolina -
cujo efeito é proteger a aderência da compressa ao leito da ferida, evitando desse modo a destruição dos tecidos neoformados
aquando da substituição do penso (ver Figura 4).
Estão por isso indicadas em feridas na fase de granulação, secas ou com baixa quantidade de exsudado, como sejam as
queimaduras de 1.º ou 2.º graus, abrasões, enxertos, úlceras, entre outras.

Figura 4 – Compressa impregnada de substâncias gordurosas.

As várias marcas existentes no mercado diferem quanto ao tipo de compressa (natural ou sintética), tamanho da malha (mais aberta
ou fechada) e ainda à substância gordurosa.
Convém ainda salientar que as de algodão deixam mais tecido aderente à ferida e absorvem menos exsudado do que as sintéticas.
Estas compressas são aplicadas directamente sobre a feria previamente limpa podendo permanecer durante 1 a 3 dias.

Em caso de necessidade podem ser cortadas à medida, de forma a ajustarem-se ao tamanho da ferida.

Material de Penso Impregnado com Gordura comercializado:


Adaptic® (Johnson & Johnson); Atrauman® (Hartmann); Grassolind® (Hartmann); Jelonet® (Smith & Nephew); Lomatuell®
(Novamed).

Material de Penso Impregnado com Iodo

O iodo bem como os seus derivados (ex. iodopovidona), apresenta um elevado espectro de actividade contra bactérias gram
positivas, gram negativas, fungos, vírus, esporos e protozoários, tornando-o bastante útil no tratamento e profilaxia de infecções,
nomeadamente de lesões cutâneas.

Encontram-se comercializadas dois tipos de material de penso com iodo - compressa impregnada com iodopovidona a 10% e gaze
impregnada com cadexómero de iodo. Ambas permitem uma libertação controlada do iodo, contribuindo por esse facto, para um
aumento da sua eficiência.

No que concerne à compressa impregnada com iodopovidona, esta consiste numa viscose impregnada com polietillenoglicol (PEG)
contendo 10% de iodopovidona equivalente a 1% de iodo activo. Quando em contacto com o exsudado da ferida, a iodopovidona é
libertado da base de PEG para o leito da ferida. Em relação ao cadexómero de iodo, esta consiste numa matriz polissacarídea
(amido) biodegradavel na qual está inserido o iodo. Em contacto com o exsudado da ferida, a pasta de amido absorve-o e liberta o
iodo para a ferida formando um gel.

Este material de penso está no entanto contra-indicado no caso de hipersensibilidade ao iodo ou à iodopovidona, em doentes com
tiróidite de Hashimoto, doença de Grave nodular não tóxica, em mulheres grávidas ou em período de aleitação, devendo ainda ser
usado com precaução em doentes com história de doença da tiróide ou com alterações graves da função renal.

Previamente à aplicação de qualquer um desses materiais, a ferida deve ser limpa e a selecção de um ou outro deve ser
fundamentalmente efectuada em função da quantidade de exsudado - se baixo deve ser usada a gaze impregnada com
idodopovidona, se abundante o cadexómero de iodo.

Ambos requerem um penso secundário e podem permanecer na ferida até um máximo de 3 a 4 dias, dependendo da presença de
infecção e do grau de exsudado.

Material de Penso Impregnado com iodo ou derivados comercializado:


Inadine® (Johnson & Johnson); Iodosorb® (Smith & Nephew).

Material de Penso Impregnado com Clorohexidina 0,5%

A clorohexidina é um anti-séptico com espectro de acção inferior ao iodo, tendo apenas actividade sobre bactérias gram positivas e
gram negativas.
O seu uso está portanto indicado na profilaxia e tratamento de feridas infectadas.
A gaze impregnada com clorohexidina deve ser aplicada directamente sobre a ferida previamente limpa requerendo um penso
secundário que a fixe. A frequência de mudança está sempre dependente das características da ferida. No entanto se esta estiver
infectada, deverá ser diária.
Na figura 5 pode-se ver um exemplo desse tipo de compressa.

Figura 5 – Aplicação de uma compressa de clorohexidina a 0,5%.

Material de Penso Impregnado com clorohexidina comercializado:


Bactigras® (Smith & Nephew).

Material de Penso Impregnado com Prata

A prata é um potente agente antimicrobiano, que actua por ligação aos grupos sulfidrílicos, carboxílicos, fosfatados, aminados,
levando à alteração físico-química das proteínas e eventualmente à sua precipitação causando assim alterações estruturais na parede
e membranas bacterianas.

Devido à sua acção bactericida, a prata tem sido usada desde tempos remotos no tratamento de várias doenças incluindo a epilepsia,
infecções venéreas, acne, úlceras de perna, etc. Foi utilizada primariamente sob a forma de nitrato de prata e mais tarde, em 1960
como sulfadiazina de prata de grande utilidade no tratamento de queimaduras infectadas, sendo que o seu uso ainda se mantém na
actualidade.

A sua eficácia contra Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus, Candida albicans entre outros microrganismos, associada
ao baixo teor de resistências, suscitou o interesse da indústria farmacêutica para o fabrico de vários materiais de penso. Assim,
existem hoje disponíveis vários materiais (ver Quadro 1) com capacidade de gestão de exsudado, mantendo um ambiente húmido na
interface ferida/penso e que simultaneamente combatem ou previnem a infecção. Convém no entanto salientar que, a infecção de
uma ferida ou dos tecidos subjacentes deve ser devidamente comprovada e o seu tratamento requer muitas vezes antibioterapia
sistémica, constituindo nesses casos o material de penso com prata um adjuvante.

Quadro 1. Material de penso actualmente comercializado em Portugal contendo prata.

Material de Penso Nome Comercial Composição


Alginato com prata Calgitrol® Ag Alginato com prata iónica com uma
camada de espuma.
Hidroalginato com prata Silvercel® Alginato e fibras de carboximetilcelulose
com prata iónica.
Carvão activado com prata Actisorb® Silver 220 Carvão activado com prata
Compressa com prata Atrauman® Ag Compressa não aderente com prata iónica.
Hidrofibras com prata Aquacel® Ag Carboximetilcelulose com prata metálica.
Prata nanocristalina Acticoat® Polietileno com nanopartículas de prata
reactivas.

Como se pode verificar no Quadro 1, são diversas as apresentações com prata, as quais aliam as propriedades dos vários materiais
já anteriormente referidos.
A sua selecção deve ser feita em função do estádio ou da quantidade de exsudado da ferida.

Na sua grande maioria, a prata está disponível na forma iónica (a mais activa), sendo cedida de forma controlada para o leito da
ferida. O penso de carvão activado com prata (Actisorb® Silver 220) constitui uma excepção, uma vez que, quando aplicado na
ferida adsorve toxinas, produtos de degradação da ferida, compostos voláteis e as bactérias que são posteriormente inactivadas no
próprio penso, como se pode verificar na figura 6.

Figura 6 – Fibras de carvão activado com as bactérias adsorvidas.

Particular chamada de atenção para o penso com prata nanocristalina, no qual a prata é reduzida a partículas muito pequenas (ver
figura 7) o que vai permitir um aumento da superfície de contacto e assim uma maior actividade.

Figura 7 – Nanoparticulas de prata.

Embora a maior parte desses pensos mantenham uma actividade microbiana durante vários dias, a frequência de mudança depende
das características da ferida e da quantidade de exsudado, sendo que, de um modo geral as feridas infectadas devem ser analisadas
diariamente.

Para uma utilização correcta de cada um desses materiais, é recomendado o conhecimento das características de cada um, que
podem ser facultadas pelo Laboratório.

Promotores da cicatrização

Os promotores da cicatrização devem ser utilizados apenas quando a ferida se apresenta estagnada, ou seja, sem evolução,
permitindo estimular a angiogénese ou a granulação. Normalmente mimetisam produtos endógenos que por motivos vários não
exercem a sua actividade convenientemente (casos do ácido hialurónico ou do colagénio).

Ester do ácido hialurónico

O ácido hialorónico é de um hidrato de carbono que existe na matriz extracelular da pele, joelhos, olhos - entre outros órgãos e
tecidos - e está implicado na migração e proliferação celular, nomeadamente na formação e orientação do tecido de granulação, na
modelação da resposta inflamatória e na estimulação da angiogenese.

Assim, a sua utilização tem por objectivo ajudar a reproduzir o ambiente natural da cicatrização. Na presença do exsudado da ferida
forma-se um gel que proporciona um meio rico em ácido hialorónico capaz de promover a cicatrização, estando indicado em feridas
crónicas – úlceras de pressão, do pé e da perna, livres de tecido necrosado e infecção.

O apósito deve ser colocado directamente sob a ferida limpa, requerendo um penso secundário (ex. gaze, espuma) e pode
permanecer na ferida até um máximo de 3 dias. Assim que a epitelização se tiver iniciado, a sua aplicação deve ser suspensa.

Material de Penso com Ácido hialurónico comercializado: Hyalofill® (Convatec).

Colagénio

O colagénio é uma proteína endógena presente na pele e que está implicado na divisão e migração dos fibroblastos e no crescimento
dos queratinócitos.
O colagénio comercializado é obtido a partir da cartilagem da traqueia dos bovinos e, apresenta-se sob a forma de pó altamente
higroscópio, capaz de manter um ambiente húmido na interface ferida/penso favorável ao processo de cicatrização. Estimula ainda a
angiogénese e o crescimento dos fibroblastos, promovendo a proliferação e migração dos fibroblastos e criando uma barreira
protectora contra as infecções bacterianas.
Está indicado em feridas crónicas sem evolução, isentas de tecido necrótico ou fibrinoso e de infecção, previamente limpas. A sua
aplicação deve ser realizada de forma uniforme sobre a área lesada requerendo um penso secundário (ex. gaze, espuma). Atendendo
a que se trata de uma substância biodegradável, a sua remoção deve ser realizada com soro fisiológico.

Material de Penso com Colagéneo comercializado: Catrix® (ICN Portugal).

Colagénio com Celulose Regenerada Oxidada

Consiste numa matriz seca congelada e estéril de colagénio (55%) e celulose regenerada oxidada (45%). Na presença de exsudado
da ferida, a matriz absorve-o formando um gel biodegradavel que se liga às proteases – metaloproteases, elastases e plasminas -
enzimas que produzidas em excesso degradam as fibras de colagénio, impedindo desse modo a cicatrização. Para além disso, têm
ainda capacidade de ligação a factores de crescimento protegendo-os.

Assim sendo, está indicado em feridas crónicas (úlceras de pressão, vasculares e diabéticas) isentas de tecido necrosado ou infecção.
Como penso secundário pode ser utilizada gaze, hidrocolóide ou poliuretano, podendo permanecer na ferida 1 a 3 dias dependendo
da quantidade de exsudado.

Material de Penso com Colagéneo e celulose regenerada oxidada comercializado: Promogran® (Johnson & Johnson).
Filmes

Neste grupo incluem-se as películas semi-permeáveis, ou seja, permeáveis ao vapor de água e aos gases, mas impermeáveis à água e
aos microorganismos. Podem ser compostos por diversos tipos de materiais, dependendo da marca comercial – poliuretano, silicone,
hidrocolóide, copolímero acrílico com ou sem álcool, oxido de polietileno com água.

Podem ser usados como apósitos primários na fase final do processo de granulação e epitelização em feridas com pouco ou mesmo
nenhum exsudado ou ainda para proteger a pele sã de fricções. Podem igualmente ser usados como apósito secundário na fixação de
outro material de penso.
Caracterizam-se pela sua transparência (ver Figura 8) permitindo pois a visualização da ferida, podendo permanecer nesta até um
máximo de 7 dias.
Estão no entanto contra-indicados em feridas infectadas.

Figura 8 – Apósito sob a forma de filme de hidrocolóide.

Filmes comercializado:

Poliuretano: Alevin Thin® (Smith & Nephew); Hydrofilm® (Hartmann); Tegaderm® 3M (3M); Omiderm® (JMV); Opsite® (Smith &
Nephew); Suprasorb® F Thin (Novamed);
Silicone: Silon TSR® (Expomédica);
Hidrocolóide: Varihesive® Extra Fino (Convatec); Askina® Biofilm Transparente (B. Braun); 3M Tegasorb® Thin (3M); Suprasorb®
H (Novamed);
Copolímero acrílico com álcool: Band-Aid Spray (Johnson& Johnson);
Copolímero acrílico sem álcool: Calilon (3M);
Óxido de polietileno com água: 2nd skin (JMV)

Considerações Finais

A selecção adequada do material de penso é um processo complexo dependente de vários factores entre os quais se destacam o tipo
de ferida a tratar (etipologia, extenção, localização, presença de exsudado, de infecção, etc.), o estado de saúde do doente bem como
do conhecimento das características de todos e cada um dos materiais disponíveis. Assim, é importante definir um plano de
tratamento que passa primariamente pela avaliação da ferida, posteriormente pela definição da prioridade do tratamento, à qual se
segue a definição do objectivo do material a utilizar e finalmente deverão ser consideradas as diferentes opções.

Para que essa selecção seja rigorosa, deve assentar em critérios científicos baseados em informação fidedigna, objectiva e rigorosa
mas, também em critérios económicos, sendo ainda de primordial importância a experiência e os conhecimentos de todos os
profissionais envolvidos.
Assim deverá sempre que possível existir uma equipa multidisciplinar – médico, enfermeiro, farmacêutico, nutricionista - em torno
deste complexo assunto, de forma a que a conjugação do saber de todos possa contribuir para a saúde e bem estar do doente

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