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Universidade de São Paulo — FFLCH — Departamento de Filosofia

Teoria do Conhecimento e Filosofia da Ciência


Prof. Valter A. Bezerra
Exemplos de contextos intensionais e extensionais

Exemplo 1: Contexto intensional gerado pelo operador de crença


(a) "Acredita-se que o autor de Hamlet é o autor de Rei Lear" (enunciado que quase
todas as pessoas considerariam verdadeiro)

“O autor de Rei Lear” → “William Shakespeare"


(b) "Acredita-se que o autor de Hamlet é William Shakespeare" (enunciado que
muitas pessoas considerariam verdadeiro, menos aquelas que aceitam a existência
de um ghost-writer do Bardo)

“William Shakespeare” → “Christopher Marlowe"


(c) "Acredita-se que o autor de Hamlet é Christopher Marlowe" (enunciado que
algumas pessoas considerariam verdadeiro)
(d) “Acredita-se que Christoper Marlowe é o autor de Rei Lear” (enunciado que
algumas pessoas relutariam em tomar como verdadeira — por exemplo, porque se
acredita, entre alguns leitores e críticos, que Marlowe escreveu Hamlet porém não
escreveu Rei Lear)

Exemplo 2: Contexto extensional no cálculo proposicional


(a) "A V B" (possui um certo valor de verdade)
"A <-> C" (equivalentes, mesma extensão)
(b) "C V B" (possui o mesmo valor de verdade de (a))
"B <-> D" (equivalentes, mesma extensão)
(c) "C V D" (possui o mesmo valor de verdade de (a) e de (b))

Exemplo 3: Contexto intensional em História da Ciência gerando anacronismos


(i) «Newton acreditava que "Existe um poder de gravidade afetando todos os corpos,
proporcional às quantidades de matéria que eles contêm; e a força de gravidade
dirigida às várias partículas de qualquer corpo está reciprocamente como o
quadrado da distância dos lugares das partículas" (Newton, Principia, Livro III,
Proposição VII e Corolário. Cf. tb. Livro I, Proposição LXXIV e Corolário)»
(ii) «Descartes acreditava que "A esta substância extensa chamamos propriamente
corpo ou substância das coisas materiais; A natureza da matéria ou do corpo em
geral é apenas a de uma substância extensa em comprimento, largura e altura; A
mesma extensão que constitui a natureza do corpo também constitui a natureza do
espaço; O lugar designa mais expressamente a localização do que a grandeza ou a
figura, e nós, inversamente, pensamos mais nestas quando se fala do espaço;
Nunca distinguimos o espaço da extensão... mas às vezes consideramos o lugar
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como se fosse interior à coisa que está situada, e outras vezes como se fosse
exterior." (Descartes, Princípios da Filosofia, I, 2, 4, 11, 14, 15)»

Fazendo as substituições, temos:


(iii) «Newton acreditava que "Existe um poder de gravidade afetando todos os
corpos, proporcional às quantidades de <substância extensa> que eles contêm; e a
força de gravidade dirigida às várias partículas de qualquer corpo está
reciprocamente como o quadrado da distância <das localizações, não das extensões
ou espaços> das partículas"» é FALSO
(iv) «Descartes acreditava que "Existe um poder de gravidade (!) afetando todos os
corpos, proporcional às quantidades de <constituinte dos corpos, os quais são
dotados de extensão, dureza, impenetrabilidade, mobilidade, um poder de inércia e
um princípio de gravitação mútua> (*) que eles contêm; e a força de gravidade (!)
dirigida às várias partículas de qualquer corpo está reciprocamente como o
quadrado da distância dos lugares das partículas"» também é FALSO
(inclusive porque, para Descartes, “força de gravidade”, “poder de gravidade” e
“princípio de gravitação mútua” são conceitos de extensão vazia).
(*) Cf. Principia, Livro III, “Regras do raciocínio em Filosofia”, Regra III.

Exemplo 4: Contexto intensional com indivíduos


(a) "Sabe-se que Mário de Andrade morava na rua Lopes Chaves na Barra Funda
em um sobrado com um piano" é VERDADEIRO
(b) "Mário de Andrade é um dos personagens retratados no poema 'A visita' de
Carlos Drummond de Andrade" (Note o predicado “ser um personagem”)
(c) "Sabe-se [resp. acredita-se] que um dos personagens retratados no poema 'A
visita' de Carlos Drummond de Andrade morava na rua Lopes Chaves na Barra
Funda em um sobrado com um piano" pode ser FALSO
(d) "Mário de Andrade dá nome à Biblioteca Pública Municipal de São Paulo"
(e) "Sabe-se [resp. acredita-se] que aquele que dá nome à biblioteca pública
municipal de São Paulo é um dos personagens retratados no poema 'A visita' de
Carlos Drummond de Andrade" pode ser FALSO (e/ou pode ter grau de crença bem
diferente de (a) para algum sujeito)

Exemplo 5: Contexto intensional com nomes de indivíduos


(a) "Mark Twain é Mark Twain" (verdade necessária, analítica)
(b) "Mark Twain é Samuel Langhorne Clemens" (enunciado sintético, contingente à
biografia, pode ser objeto de crença com grau diferente de (a); os dois nomes têm a
mesma denotação ou extensão)
(c) “Ele gosta de Mark Twain” pode ser VERDADEIRO ao passo que “Ele gosta de
Samuel Langhorne Clemens” pode ser FALSO

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Exemplo 6: Contexto intensional com nomes de indivíduos
(a) "Malba Tahan é Malba Tahan" (verdade necessária, analítica)
(b) "Malba Tahan é Júlio César de Mello e Souza" (enunciado sintético, idem ao
exemplo 5; os dois nomes têm a mesma denotação ou extensão)
(c) “Ele gosta de Malba Tahan” pode ser VERDADEIRO ao passo que “Ele gosta de
Júlio César de Mello e Souza” pode ser FALSO

Exemplo 7: Contexto intensional com indexicais


(a) "Aquilo está quebrado" (note o indexical “aquilo”)
"Aquilo é um móvel semidestruído"
(b) “Um móvel semidestruído está quebrado” (V)
"Aquilo é um carro zero quilômetro sem defeitos"
(c) “Um carro zero quilômetro sem defeitos está quebrado” (pode ser F mesmo com
(b) verdadeiro)

Exemplo 8: Contexto intensional em percepção musical


(a) "A nota Ré # da escala é identificada como o acréscimo de um semitom ao Ré, e
é percebida como igual ao Mi b da escala, que é identificado como o decréscimo de
um semitom do Mi" (Note as expressões “é percebida como” e “é identificada como”)
(b) "A escala convenciona-se como a escala de temperamento igual em doze
semitons onde Ré # é uma terça menor (×1.189207) acima do Dó 1 e Mi b é uma
sexta maior (×1.681793) abaixo de Dó 2" (Note a expressão “convenciona-se como”)
(c) Nesse caso, "A nota Ré # da escala é identificada como o acréscimo de um
semitom ao Ré, e é percebida como igual ao Mi b da escala, que é identificado como
o decréscimo de um semitom do Mi" é VERDADEIRO
(d) "A escala convenciona-se como a escala de entonação justa onde Ré # é uma
terça menor (×6/5 = 1.2) acima do Dó 1 e Mi b é uma sexta maior (×5/3 =
1.666666...) abaixo de Dó 2"
(e) Nesse caso, "A nota Ré # da escala é identificada como o acréscimo de um
semitom ao Ré, e é percebida como igual ao Mi b da escala, que é identificado como
o decréscimo de um semitom do Mi" é FALSO

Exemplo 9: Contexto intensional em nomicidade de leis científicas


(a) «É uma lei natural que “Todos os seres humanos são organismos capazes em
princípio de reprodução, tranformação de energia e crescimento, com geração de

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descendentes que compartilham grande parte da informação genética do genitor”» é
VERDADEIRO

Extensão (“eleitores que votam no partido PXYZ”) ⊆ Extensão (“ser humano”)


Fazendo a substituição, resulta:
(b) «É uma lei natural que “Todos os eleitores que votam no partido PXYZ são
organismos capazes em princípio de reprodução, tranformação de energia e
crescimento, com geração de descendentes que compartilham grande parte da
informação genética do genitor”» é FALSO (ainda que o enunciado interno possa ser
verdadeiro)
(pois ainda não há uma teoria unificada multiníveis, biologia-antropologia-sociologia-
ciência política, que tenha este enunciado como uma LEI)
(c) (A mesma perda do caráter nômico se constata ao se substituir, por exemplo,
“ser humano” por “indivíduo capaz de pensar abstratamente e que é residente em
algum lugar” ou por “pessoa física ou passível de ser considerada pessoa física”)

Exemplo 10: Contexto intensional com identidades


(a) “Lois Lane está procurando o Super-Homem” é suposto como VERDADEIRO

“Super-Homem” → “Clark Kent”


(b) “Lois Lane está procurando Clark Kent” pode mesmo assim ser FALSO

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