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Resumo: Neste texto propõe se discutir o papel critico da comédia na sociedade grega antiga,
como As Nuvens de Aristófanes reflete uma critica a educação de sua época e as implicações
que isso trouxe para a sociedade. O caricato e a zombaria explícita como artifícios de riso e
ironia. A figura cômica de Sócrates como alvo de chacota propositada e a critica a retórica
sofistica como; desnecessária, vazia e desprovida de valores morais, a ser desmerecida pela
sociedade ateniense.
1. Introdução
A história de As Nuvens se passa no século V Antes da Era Cristã, e apresenta a
história de um velho endividado por causa dos caprichos do filho mimado que amava a
equitação. Certo dia determinado a se livrar das queixas e dos processos lançados contra ele
por seus credores Estrepisíades busca no pensatório, uma maneira de aprender um método
para trapacear com o discurso. A maneira como Aristófanes ilustra seus personagens, pode ser
percebido, como nada mais do que uma forma de representar as concepções existentes sobre
as personalidades que permeavam a Grécia antiga e o modo como à sociedade interpretava
suas ideias.
Lá em meio a contestações de Sócrates As Nuvens se apresentam a Estrepisíades
sugerindo que ele se entregue a escola de Sócrates para que este o ensine a alcançar seu
objetivo, mas Sócrates vê em Estrepisíades uma verdadeira catástrofe como aluno, pois não
consegue o velho aprender nada. Talvez a personagem de Sócrates esteja sendo representada
nesse caráter por se haver naquele período alguma ideia marginalizada de que ele fosse algum
tipo arrogante e sabichão. É neste momento que Estrepisíades consegue trazer seu filho
também para o pensatório para que Sócrates o ensine na arte de trapacear com o discurso.
Sócrates lhes apresenta então o Raciocínio Justo e o Raciocínio Injusto, que disputam
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Aluno do curso de Licenciatura em Filosofia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). E-mail:
danielgcunha77@gmail.com. O presente texto foi produzido para a disciplina de Estética I, ministrada pelo
professor Jasson Martins.
entre si, a fim de demonstrar diante da plateia qual é o melhor dos raciocínios. O Raciocínio
Justo representa a tradição, os bons costumes a moral e a civilidade, já o Raciocínio injusto
representa a novidade e questiona os costumes e a educação dos antigos, como sendo
contraditórias e invalidas. Vence na disputa o Raciocínio Injusto e este passa a ensinar
Fidipides o filho de Estrepisíades. Uma disputa entre raciocínios o justo e o injusto que
claramente ilustra a contenda existente entre a tradição antiga dos valores morais e os sofistas,
como a figura socrática aqui é a ironizada, não seria tão cômico se não fosse associado à
figura séria de Sócrates aquilo que lhe causava mais inquietação e incomodo que era a postura
dos sofistas de adequar o argumento independente do fim que se alcançaria justo ou até
injusto. A criatividade irônica de Aristófanes prevalece então sobre uma das figuras mais
ilustres da racionalidade grega. No fim da historia Estrepisíades despacha seus credores que
ficam indignados com as escusas do velho matuto.
As Nuvens então proferem o castigo de Estrepisíades que é espancado por seu filho
Fidipides após uma discussão entre eles, como forma de punição por causa de suas trapaças e
seu desacato à autoridade divina delas. A suspensão da desavença, com fim da história
relatando a discussão entre pai e filho, o castigo de Estrepisíades, encerra com o ar de que a
própria vida é tão cômica quanto trágica e que nestes casos, apesar de querermos em todos os
casos prevalecer, é a própria justiça divina também hilária ao nos recompensar dos atos tolos.
SÓCRATES
STREPSIADES
SÓCRATES
STREPSIADES
Você está olhando dessa cesta os deuses daí de cima, e não a terra, como devia!
SÓCRATES
De fato, nunca eu poderia distinguir as coisas celestes se não tivesse elevado meu
espírito e misturado meu pensamento sutil com o ar igualmente sutil. Se eu tivesse
ficado na terra para observar de baixo as regiões superiores, jamais teria descoberto
coisa alguma, pois a terra atrai inevitavelmente para si mesma a seiva do
pensamento. Ê exatamente isto que acontece com o agrião.
Ao final da peça o velho Estrepisíades empreende sua vingança pelo fim desgraçado
que levou. Vai junto com seus servos queimar o pensatório. Ali pode ser percebido no teor da
critica; a intenção de que os sofistas não apenas trariam desgraça como também sua escola
não deveria perpetuar. Talvez aqui a imaginação de Aristófanes ousasse não só o cômico,
como também apontava para uma sugestão; aquela educação, aquela artimanha sofistica cuja
finalidade é desvirtuar os jovens dos valores tradicionais, não merece outro fim se não o de
queimar, como aponta Gervasio.
Na verdade, Estrepisíades incendeia o Pensatório punindo seus moradores como
atitude que demonstra refreamento e recusa à educação lá propugnada, pois
queimando o local onde poderiam ser feitas descobertas científicas, ele estaria,
então, repondo o tradicionalismo, bem como devolvendo aos deuses a qualidade de
seres superiores e importantes para a formação do povo grego. (GERVASIO, 2011,
P.170)
Aristófanes coloca todo o discurso dos sofistas como vazio, por isso muitas vezes
procura concentrar os diálogos em coisas relacionadas ao ar, pois da mesma forma que as
nuvens são consideradas, as divindades dos que ganham a vida pela palavra, como coisas que
estão no alto, ou superiores, as mesmas também são feitas de ar, da mesma forma que a
flatulência de Estrepisíades (ALMEIDA; POMPEU, 2012, p. 204). Talvez por estas questões
deva se atribuir ao intelecto de Aristófanes, não apenas a graça da comicidade, sua
irreverência na zombaria, mas também; sagacidade e astúcia pelo poder critico que empenhou
na comédia.
4. Considerações Finais
Portanto reafirma se que o proposito da comédia aristófânica é realmente o de criticar
a crise ética e pedagógica vivida naquele período e que em sua opinião é trazida graças à
novidade proposta pela retórica sofista.
Vale salientar que a posição de Aristófanes quanto a Sócrates, parece não ser uma
critica especifica a este filósofo, mas o associa a escola sofista por entender que ele se tornou
a figura proeminente do momento intelectual grego, e que este nada mais era do que também
um adversário dos sofistas. As intenções de Aristófanes vão além da mera ofensa a Sócrates,
se concentram em ofender aos sofistas como desvairados que corrompem a educação dos
jovens e lançam fora a tradição louvada pelo comediógrafo nas Nuvens.
Por fim, as pesquisas apresentadas mostram que não há sequer motivos para se
debruçar unilateralmente quanto ao sentimento pessoal e posicionamento de Aristófanes
quanto a Sócrates, mas que seu intuito no geral era utilizar a comédia como um instrumento
politico.
Referências
LEÃO, Delfim F.: Retrato físico de Sócrates nas nuvens e em Platão — Breve apontamento.
Coimbra, Hvmanitas, Vol. XLVII, 1995.
ALMEIDA, Solange Maria S.; POMPEU, Ana Maria C.: Estrepsíades ri de Sócrates em As
Nuvens. O riso no mundo antigo. P. 197-205. Fortaleza: Expressão, 2012