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INSTITUTO DE FÍSICA DA UFBA

DEPARTAMENTO DE FÍSICA DO ESTADO SÓLIDO


DISCIPLINA: FÍSICA GERAL E EXPERIMENTAL III (FIS 123)

Circuitos de Corrente Alternada

Considere um circuito com várias malhas e constituídas de resistências, capacitores e indutores.


Em alguma região do circuito é aplicada uma tensão alternada ε = εo cosωt. Para descrevermos o circuito,
aplicamos a lei das malhas e dos nós e encontramos um sistema de equações diferenciais não
homogêneas que, em sua maioria, não são simples resolvê-las. Um caso bem trivial, como o circuito RLC,
envolve identidades trigonométricas que são, para dizer o mínimo, tediosas. Para contornarmos estas
dificuldades e encontrarmos soluções mais elegantes e concisas, faremos uso dos números complexos.
Utilizaremos também uma generalização da lei de Ohm para a corrente alternada, isto é, a lei de Ohm na
forma complexa.
As oscilações que estudamos no capítulo anterior são chamadas de oscilações livres, uma vez que
elas decorrem do fato da fonte externa que fornece a energia ao sistema (carregando o capacitor) só estar
presente no instante inicial. Após o carregamento, a fonte é retirada e as cargas no capacitor e a corrente
no circuito começam a oscilar com uma freqüência determinada pelos valores dos elementos colocados no
circuito. No presente estudo, teremos uma oscilação forçada uma vez que a fonte de tensão não é retirada
e, em todos os instantes, ela força a corrente e a tensão nos elementos a oscilarem com sua própria
freqüência. Em outros termos, se ω é a freqüência angular de oscilação da fonte, a corrente e a tensão nos
elementos oscilarão com esta mesma freqüência, independentemente dos valores dos elementos
colocados nos circuitos.

Definimos, então, uma tensão complexa V = ε o e jωt , onde a tensão física é a parte real de V, isto

é, ε = Re {V} = εo cos ωt. Analogamente, definimos uma corrente complexa I onde a corrente física é a parte
real de I, isto é, I = Re { I }.
Em circuitos de corrente contínua aplicamos constantemente a lei de Ohm ( V = R I ), a qual
apresenta uma relação linear entre a tensão e a corrente. Esta relação é intermediada por uma grandeza
que descreve a oposição à livre passagem dos portadores de carga: a resistência elétrica. Dizemos que
esta resistência é ôhmica e tem sua origem no choque dos portadores de carga com a rede cristalina.
Contudo, em circuitos de corrente alternada existem outros fatores que geram o comportamento resistivo
(no sentido de oposição á passagem dos portadores de carga). Nos indutores, por exemplo, como a
corrente varia com o tempo, surgirá uma força eletromotriz auto induzida que se opõe à esta variação.
Como vimos anteriormente, esta força eletromotriz – e, portanto, o comportamento resistivo - é proporcional
à indutância e à freqüência de oscilação. O capacitor, por sua vez, se opõe à migração dos portadores de
carga de uma placa à outra, pois é preenchido com um dielétrico, obrigando a fonte de tensão efetuar esta
migração ao inverter o sentido da f.e.m. Note que, neste caso quanto maior a freqüência, com mais rapidez
as cargas passarão de uma placa à outra, de modo que a oposição à passagem de carga exercida pelo
capacitor torna-se menor. A grandeza que descreve este comportamento resistivo mais generalizado é
chamada de impedância.

1
Como na lei de Ohm, existe aqui uma relação linear entre a corrente e a tensão complexa.
Chamaremos de Z a impedância complexa do circuito, de forma que a lei de Ohm na forma complexa será:

V=ZI
1. Aplicações Em Circuitos
a. Circuito puramente resistivo
A resistência R neste caso está simbolizando a associação de todas as
resistências do circuito. Usando a lei das malhas, obtemos ε = R I, ou na notação
complexa V = R I. Comparando com a lei de Ohm V = ZI, obtemos ZR = R, ou
seja, a impedância de um circuito puramente resistivo é a própria resistência.
V ε
A corrente complexa será dada por I = = o e jωt enquanto que a corrente
ZR R
ε
εo
I
física será I = Re{I} = cos ωt . Observando a figura ao lado, vemos que os
R
t
máximos, mínimos e zeros tanto da tensão quanto da corrente ocorrem no mesmo
instante. Dizemos então que a corrente está em fase com a tensão.
Tanto a tensão quanto a corrente complexas podem ser representados no plano complexo através dos
vetores girantes ou fasores.
ε
Im Note que V = ε o e jωt e I = o e jωt são números complexos que variam com o
V R
I tempo e, como o sentido de crescimento do ângulo ωt no plano complexo é
ωt antihorário, os fasores também giram nesse sentido. Note que V e I giram ao
Re mesmo tempo, pois estão em fase.

b. Circuito puramente indutivo


dI
A lei das malhas nos fornece ε = L , ou em termos de linguagem dos
dt
dI
complexos V = L (1). Assumimos aqui que a corrente oscila com a mesma
dt
freqüência da fonte, pois se trata de uma oscilação forçada.

Escrevemos então I = I m e j( ωt − φ) , onde Im é a amplitude e φ é a fase da corrente. Assim devemos ter:

dI
= j ω I m e j( ωt − φ) = j ω I
dt
Substituindo na equação (1), teremos V = j ω L I que, comparada com a lei de Ohm, nos leva a

ZL = j ω L .

Podemos escrever esta impedância de outra forma. Basta lembrar que j = e j π 2 , de forma que

Z L = ωL e j π 2 = X L e j π 2 , onde XL= ω L é chamada de reatância indutiva. A corrente será dada por:

2
V ε e jωt ε e j( ωt − π 2)
I= = o = o
ZL XLe jπ 2 XL

εo ⎛ π⎞
Logo, a corrente do circuito será: I = Re{I} → I = cos⎜ ωt − ⎟
XL ⎝ 2⎠
Note que a corrente está defasada da tensão de π/2. Neste caso dizemos que a corrente está
atrasada em relação à tensão . Os diagramas da corrente e da tensão são :
ε Im V
I
ωt
t
Re
I

c. Circuito puramente capacitivo


q
A lei das malhas nos fornece ε = . Diferenciando em relação ao tempo, teremos:
C
C
dε 1 dq dq dε I
= . Usando I = , teremos: = .
dt C dt dt dt C
dV I dV
Em notação complexa devemos ter: = (2). Como V = ε o e jωt , então = jωεo e jωt = jωV .
dt C dt
I 1
Substituindo este último valor na equação (2), obtemos jωV = , ou seja, V= I.
C jωC
1 j
Comparando com a lei de Ohm, chegamos a: Z C = =−
jωC ωC

Lembrando-se que − j = e − j π 2 , então:


1 − jπ 2 1
ZC = e = X C e − j π 2 , onde X C = é chamada de reatância capacitiva.
ωC ωC
εo ⎛ π⎞
A corrente no circuito será I = Re{I}, ou seja I= cos⎜ ωt + ⎟ . Note que neste circuito a
XC ⎝ 2⎠
corrente está adiantada de π/2 em relação a tensão.

ε Im
I

V
t I
ωt
Re

2. Associação de impedâncias

3
a. Em série
Sejam duas impedâncias Z1 e Z2 associadas em série e submetidas a uma
V1 V2
tensão alternada V. A impedância Z1 está submetida a uma tensão V1 e Z2 à
Z1 Z2
tensão V2, onde V = V1+ V2.
Usando a lei de Ohm, teremos V = Z1 I + Z2 I = Zeq I, o que nos leva a:
V
Zeq = Z1 + Z2
N
Se tivermos N impedâncias associadas em série, teremos: Z eq = ∑Z
i =1
i

b. Em paralelo
Neste diagrama é fácil ver que I = I1+ I2. Usando a lei de Ohm,
Z1
I1
I V V V
obtemos: I = + = , onde V é a tensão aplicada em cada
Z1 Z 2 Z eq
I2
Z2 uma das impedâncias. Assim:

V 1
=
1
+
1
Z eq Z1 Z 2


N
1 1
Se tivermos N impedâncias associadas em paralelo, devemos ter: =
Z eq Zi
i =1

3. Circuito RLC em série acoplado a uma f.e.m. alternada


Seja um circuito RLC em série acoplado a uma f.e.m. alternada
V
R ε = ε o cos ωt . De acordo com a lei de Ohm, a corrente será I = , onde
L Z

C V = ε o e jωt é a tensão complexa.

Para a resolução deste problema, devemos calcular a impedância total do circuito. Como os três
elementos estão associados em série, teremos : Z = Z R + Z L + Z C

j ⎛ 1 ⎞
Z = R + jωL − = R + j⎜ ωL − ⎟
ωC ⎝ ωC ⎠

Podemos escrever Z na forma Z = Z e jϕ onde Z e ϕ serão dados por:

2
⎛ 1 ⎞ ⎡1 ⎛ 1 ⎞⎤
Z = R 2 + ⎜ ωL − ⎟ ϕ = arc tg⎢ ⎜ ωL − ⎟
ωC ⎠⎥⎦
e
⎝ ωC ⎠ ⎣R ⎝
A corrente complexa será:

V ε o e jωt ε o j( ωt − ϕ)
I= = = e
Z Z e jϕ Z
A corrente no circuito será I = Re { I }, ou seja

4
ε
I = o cos(ωt − ϕ) , onde Z e ϕ estão acima descritos.
Z

a. Ressonância
. Note que a amplitude da corrente irá depender
Im
εo/R
da freqüência, uma vez que a impedância Z tem
essa dependência. Assim, podemos ter uma tensão
R1<R2
altíssima, mas uma corrente baixa a depender do
R2 valor da freqüência ω. Podemos fazer crescer este
valor usando-se o expediente de variar ω, até atingir
o ponto máximo da corrente Im, o que equivale ao
valor mínimo de Z.
ω=ωo ω
⎛ 1 ⎞ 1
Isto ocorrerá quando XL - XC = 0, ou seja, quando ⎜ ωL − ⎟ = 0 , o que nos levará a ω = ωo = .
⎝ ωC ⎠ LC
Em outras palavras, quando a freqüência da fonte for igual à freqüência natural do sistema, a corrente no
circuito irá oscilar com amplitude máxima Im = εo / R. Chamamos esta condição de ressonância.
Este circuito tem utilidade, por exemplo, nos circuitos de rádio, onde é usado como circuito
sintonizador. Neste caso a antena serve como fonte. Esta capta as ondas eletromagnéticas, transformando
os campos elétricos oscilantes em correntes. Note que antena capta todas as freqüências, mas só irá
oscilar com amplitude máxima naquela que estiver em ressonância. Para sintonizar uma outra estação de
rádio basta mudar a freqüência natural do circuito, alterando-se ou o capacitor ou o indutor.

4. Potência média. Valor eficaz


Como vimos, a corrente assim como a tensão são grandezas que oscilam com freqüência ω,
que podem variar desde alguns Hz - como na rede elétrica - até a ordem de MHz como nos circuitos de
rádio e TV. Assim, para medirmos os valores instantâneos destas grandezas, necessitamos de
instrumentos adequados, tais como os osciloscópios, que respondam com precisão a estas variações. No
entanto, em diversas ocasiões não nos interessamos por estes valores instantâneos, mas sim pelo valor
médio ou valor eficaz. Antes de definirmos estas grandezas, precisamos conhecer como calcular a média
temporal de uma grandeza.

a. Média temporal
Suponha que um veículo percorra uma estrada com velocidade v1 durante um tempo Δt1, com
velocidade v2 durante um Δt2, com v3 durante Δt3 e assim sucessivamente. Para calcular a velocidade
média desenvolvida pelo veículo, simplesmente dividimos a distância total percorrida pelo tempo total de
v 1 Δt 1 + v 2 Δt 2 + v 3 Δt 3 L
percurso. v =
Δ t 1 + Δ t 2 + Δt 3 L
Podemos generalizar este conceito para uma grandeza f qualquer. Seja f(t) uma grandeza que varie
discretamente com o tempo, ou seja, ela assume um valor constante f1 durante um tempo Δt1, f2 durante
Δt2 e assim por diante. Se existe N intervalos de tempo, a média temporal de f(t) será:

5
N

f Δt + f Δt + K + f N Δt N
∑ f Δt
i =1
i i
f= 1 1 2 2 = (3)
Δt1 + Δt 2 K + Δt N N

∑ Δt
i =1
i

Supondo agora que f= f(t) seja uma função contínua no tempo, o valor médio será obtido se fizermos as
somatórias da equação (3) para o limite Δti → 0. Se tomarmos a média entre os instantes to e t1 então :
t1

f=
∫t
f ( t ) dt
o
t
∫t dt
1

Se f(t) for uma função periódica de período T, costuma-se fazer esta média para N períodos.
Mostra-se que se a função não for amortecida, a média para um intervalo de tempo igual a NT será igual a
média tirada em um único período T. Assim, colocando-se t1 = to + T, então:
t o +T


1
f= f ( t ) dt
T
to

Contudo, se f(t) for uma função trigonométrica como o seno ou coseno, a média será nula, pelo
simples fato dessas funções assumirem igualmente em um período, valores positivos e negativos. Por
este motivo, costuma-se definir o valor médio quadrático:
t o +T


1
f mq = f2 ou f mq = f ( t ) 2 dt
T
to

Seja P a potência dissipada em um resistor R em um circuito de corrente contínua. Esse mesmo


valor também pode ser encontrado em um circuito de corrente alternada ao calcularmos a potência média

P dissipada em R. Chamaremos de corrente eficaz e de tensão eficaz aos valores médios quadráticos da
corrente e tensão necessários para produzir aquela potência média em um circuito de corrente alternada.
t o +T
t o +T

∫ ∫
1 1
Assim, I ef = I( t ) 2 dt e Vef = V( t ) 2 dt
T to T
to

t o +T
Suponha que I = I o cos(ωt − θ ) . Assim: I ef
∫ (ωt − θ)
1
2
= I o2 cos 2 dt .
T to

t o +T

∫ cos 2 (ωt − θ )dt =


1 1 Io
Como , obtemos I ef =
T 2 2
to

t o +T
Para a tensão V( t ) = Vo cos(ωt − φ) , teremos Vef
∫ (ωt − φ) dt ,
1
2
= Vo2 cos 2
T to

6
Vo
o que nos leva a: V ef =
2

d. Potência Média
Seja V = Vo cos (ω t − φ ) a tensão e I = I o cos (ω t − θ ) a corrente que passa por um elemento de

um circuito. A potência (instantânea) dissipada neste elemento é dada por P( t ) = V( t ) I( t ) , ou seja:

P(t ) = Vo I o cos(ω t − φ ) cos(ω t − θ ) = Vo I o (cos ω t cos φ + senω t senφ )(cos ω t cosθ + senω t senθ ) .

[
P (t ) = Vo I o cos 2 ω t cos φ cosθ + sen 2ω t senφ senθ + senω t cos ω t (cos φ senθ + senφ cosθ ) ]
t o +T

Usando sen(φ + θ ) = cos φ senθ + senφ cosθ e como a potência média é dada por P =

1
P( t ) dt , então
T
to

⎡ ⎛ to +T ⎞ ⎛ to +T ⎞ ⎛ to +T ⎞⎤
⎜1 ⎟ ⎜1 ⎟ ⎜1 ⎟⎥
P = Vo I o ⎢cos φ cosθ
⎢ ⎜⎜ T ∫
cos 2
ω t dt ⎟⎟ + senφ senθ ⎜⎜ T sen 2
ω t dt ⎟⎟ +∫sen (φ + θ ) ⎜⎜ T senω t cos ω t dt ∫
⎟⎟⎥
⎣ ⎝ to ⎠ ⎝ to ⎠ ⎝ to ⎠⎦

to +T to +T to +T
1 1 1
Usando o fato de que
T ∫ cos 2 ω t dt =
T ∫ sen 2ω t dt =
2
e ∫ senω t cos ω t dt = 0 , chegamos a:
to to to

cos(φ − θ ) .
Vo I o
P=
2
O termo cos(φ − θ ) , que descreve a diferença de fase entre a tensão e a corrente no elemento
considerado, é chamado de fator de potência.
Em um circuito resistivo (φ − θ ) = 0 (pois a corrente e tensão estão em fase) e teremos:

Vo I o
P= = Vef I ef
2 2
o que nos remete para a definição de valor eficaz de corrente e tensão.

BIBLIOGRAFIA
1. REITZ, John R.; MILFORD, Frederick J; CHRISTY, Robert W. Fundamentos da teoria
eletromagnética. Rio de Janeiro: Campus, c1982. 516 p.
2. EDMINISTER, Joseph A. Circuitos elétricos. 2.ed. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 1985, (Schaum)
3. PURCELL, Edward M.., Curso de Física de Berkeley, vol.2, Eletricidade e magnetismo. Sao Paulo:
Edgard Blucher, 1970.

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